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PN 848.03-51; Ap.: Tc. Paços de Ferreira, 1º J. (444/97);
Ap.es2: Vítor Manuel de Sousa Monteiro Magalhães, cc Georgina Rodrigues Neves,
Gandarela, Bloco 1, 1º, Centro Dt.º, Freamunde, P. Ferreira;
3
Ap.os : Domingos Moreira da Silva, cc Maria Blandina da Cunha Azevedo Torres,
Gandarela, Bloco 1, 2º, Centro Dt.º, Freamunde, P. Ferreira.
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I.
Introdução:
(a)
Vítor Manuel de Sousa Monteiro Magalhães cc Georgina Rodrigues
Neves, propõem contra Domingos Moreira da Silva cc Maria Blandina da
Cunha Azevedo Torres, a presente acção, concluindo pelos pedidos de
condenação dos RR:
(1)a procederem à realização de todas as obras e reparações necessárias na
sua fracção [autónoma habitacional], pondo termo às infiltrações de água
dali provenientes [e que atingem, por sua vez, a fracção autónoma
habitacional deles AA];
(2)a pagarem-lhes a importância de 3.890,62 EUR (780.000$00), pelos
prejuízos materiais causados na respectiva fracção autónoma, acrescida de
juros vincendos, à taxa legal, desde a data da citação e até efectivo e integral
pagamento;
1
Vistos: Des. Ferreira de Sousa (
); Des. Paiva Gonçalves (
).
Adv.: Dr. José Luís de Barros, Rua D. Nicolau Carneiro, Edifício Pica-frio, 2º. P. Ferreira.
3
Adv.: Dr. Alberto Felgueiras Leão, Rua D. José de Lencastre, 35, 2º Esq., P. Ferreira.
2
1
(3)a pagarem-lhes a importância de 1.496,39 EUR (300.000$00), a título de
indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.
(b)
Alegaram, em síntese:
(1)A canalização da cozinha dos RR verte água, provocando infiltrações e
humidades na fracção dos AA: (i) têm-lhes sido danificados os móveis de
cozinha, em virtude da água que cai; (ii) os móveis de madeira empenaram,
não fechando as portas; (iii) estão totalmente manchados;
(2)Em razão daquelas mesmas infiltrações, as paredes e tectos da cozinha
estão danificadas: as respectivas reparação e pintura, também da dispensa,
hall, corredores, sala de jantar e quarto da fracção orça em cerca de Pte 600
000$00;
(3)Entretanto, os AA estão a ser privados do uso corrente e normal da sua
habitação, nomeadamente da cozinha, em virtude da abundante água que
nesta cai, provocando humidade;
(4)E para quem habita a fracção está instalado um total desconforto, quer
devido à própria humidade quer ao cheiro nauseabundo que provoca, bem
como à degradação dos móveis e objectos existentes no andar;
(5)Todos estes danos causaram aos AA grande desgosto.
(c)
Os RR contestaram, impugnando a versão dos factos trazida a juízo pelos
AA:
(1)As infiltrações de água na casa dos AA, a existirem, não são provenientes
da canalização ou tubagem da casa dos RR, mormente da sua cozinha;
(2)Antes têm origem nos defeitos de construção do prédio em causa.
(d)
Da sentença recorrida:
2
(1)
No caso em apreço, os AA fundamentam o pedido de condenação dos RR
a pagar-lhe os danos sofridos em virtude de uma infiltração de águas no prédio
sua propriedade na responsabilidade civil dos demandados, em razão de a
infiltração ser proveniente da canalização do prédio/fracção dos RR, nada
tendo estes feito, apesar de por várias vezes interpelados, para solucionar o
problema.
(2)
O princípio geral em sede de responsabilidade civil (cfr. art. 483º do
Código Civil) é o de o lesante apenas ser obrigado a indemnizar quando tenha
agido com culpa - dolo ou negligência;
(3)
Nos termos do art. 487º do Código Civil é ao lesado que incumbe provar
a culpa do autor da lesão, e a diligência relevante para determinação da culpa
é a tida por um homem normal em face do condicionalismo próprio do caso
concreto.
(4)
De todo o modo, a culpa em sentido amplo (para a distinguir da
negligência, também dita culpa em sentido estrito) vem a traduzir-se numa
ligação ou nexo psicológico do facto à vontade do lesante, a extrair dos factos
provados;
(5)
In casu, a ilicitude da conduta dos RR, tal como configurada a causa de
pedir pelos Autores, emerge da violação ou afectação do seu direito de
propriedade, concretizada na existência de infiltrações de água, provenientes
da cozinha da fracção dos RR, em razão de um comportamento desleixado
destes, que, bem sabendo da proveniência das infiltrações, nada fizeram para
as solucionar, o que reconduz a sua conduta a uma actuação dolosa;
(6)
Essencial era, por conseguinte, a determinação da origem das
infiltrações em apreço, posto que a proveniência das infiltrações da cozinha
dos RR e a inércia destes face a esse facto é que integrava a prática pelos
demandados de facto ilícito, cuja ilicitude decorria da lesão ao direito de
propriedade dos AA;
(7)
Contudo, os AA não fizeram a prova, que lhes cabia, nos termos gerais
do art. 342º do Código Civil, e enquanto facto constitutivo do direito à
indemnização, da prática de qualquer facto ilícito pelos demandados; em razão
3
de não se ter demonstrado que os danos sofridos e as infiltrações de água
verificadas fossem provenientes da cozinha dos Réus;
(8)
Acresce que do provado emerge antes o cumprimento dos deveres de
diligência a que os RR estavam obrigados, na sequência da comunicação pelos
AA da existência de infiltrações;
(9)
Falece, desde logo, o primeiro e essencial pressuposto da obrigação de
indemnizar: o da prática de facto ilícito pelos responsáveis, pelo que a acção
não pode deixar de soçobrar, não havendo, por isso, que cuidar do montante
dos danos ou da susceptibilidade de estes serem indemnizados.
II.
Matéria assente:
(1)
Os AA são donos e legítimos possuidores da fracção autónoma,
designada pela letra H, do prédio urbano, constituído em regime de
propriedade horizontal, sito no lugar da Gandarela, bloco 1 -1º centro direito,
na freguesia de Freamunde, concelho de Paços de Ferreira, inscrito na matriz
sob o Artº 1674 e descrito na competente Conservatória do Registo Predial de
Paços de Ferreira sob o nº 00236/090189 e ali inscrito a favor deles.
(2)
Por escritura pública de compra e venda, datada de 22 Setembro de 1992,
lavrada fls 91 verso a 92 verso livro 168 – A do Cartório Notarial Paços de
Ferreira, os AA. adquiriram a dita fracção aos seus anteriores proprietários
João Moreira da Silva e mulher Maria Albertina Moreira da Silva.
(3)
Os RR são donos e legítimos possuidores da fracção autónoma designada
pela letra L, do prédio urbano, constituído em regime de propriedade
horizontal, sito no lugar da Gandarela, Bloco 1 - 2º centro Dtº, na freguesia de
Freamunde, concelho de Paços de Ferreira, inscrito na matriz sob o Artº 1674 e
descrito na competente Conservatória do Registo Predial de Paços de Ferreira
sob o nº00236/090189 e ali inscrito a favor deles.
(4)
Os Réus habitam no mesmo prédio dos AA, no andar imediatamente
acima destes, ou seja, no 2º andar centro direito.
4
(5)
No mês de Dezembro de 1995, começaram a surgir na fracção dos AA
infiltrações de água, na zona da cozinha.
(6)
Os AA instaram por diversas vezes os RR, no sentido de estes tomarem
as devidas medidas, a fim se solucionarem o problema das infiltrações de água,
alegadamente provenientes da sua fracção.
(7)
O problema das infiltrações de água manteve-se, pelo menos até
Fevereiro de 1999, causando graves prejuízos aos AA.
(8)
Os RR têm e tiveram conhecimento da manutenção do problema das
infiltrações de água na cozinha dos AA, tanto mais que o R. marido, em data
não concretamente apurada, mas em um dos meses do início de 1997, se
deslocou à fracção dos AA e verificou que as infiltrações se mantinham.
(9)
A infiltração de água localizada na cozinha dos AA danificou as paredes
e tectos da cozinha.
(10) A reparação e pintura dos danos que a casa dos AA apresenta nas paredes
e tectos da cozinha, dispensa, hall, corredores, sala de jantar e quarto da
fracção orça em cerca de 2.992,79 EUR (esc. 600.000$00).
(11) As infiltrações de água existentes na cozinha dos AA, no tecto desta,
danificaram os móveis de cozinha dos AA, em virtude de a água cair em cima
dos móveis da cozinha dos AA, pelo que os móveis de madeira “empenaram”,
não fechando as portas, estando totalmente manchados, devido à água que caiu
e cai em cima dos mesmos.
(12) ...Orçando a reparação dos mesmos em 897,84 EUR (Esc:180.000$00).
(13) Em data não concretamente apurada, o R. marido comprometeu-se a
arranjar um técnico especializado no sentido de averiguar da proveniência das
infiltrações e, caso estas fossem provenientes da canalização da sua fracção, a
reparar a avaria, bem como a reparar os prejuízos existentes na fracção dos
AA, causados pelas ditas infiltrações.
(14) Os autores são privados do uso corrente e normal da sua habitação,
nomeadamente cozinha, em virtude da abundante água que cai nesta.
(15) Provocando essa humidade, para quem habita a fracção, um total
desconforto, devido quer à própria humidade, quer ao cheiro nauseabundo que
5
esta provoca, bem como à degradação da mesma fracção, dos móveis e
objectos aí existentes.
(16) Os danos aludidos em 9 a 11 e 14 e 15 causaram aos AA grande
desgosto, pois viram a sua fracção danificada.
(17) O desalento e preocupação sobre os múltiplos problemas de humidade,
infiltrações e maus acabamentos existentes era manifestado pelos adquirentes e
residentes nas diversas fracções autónomas que compõem o prédio em que
habitam os AA e os RR e a demonstrá-lo basta atentar no facto de, por diversas
vezes, os condóminos do prédio ou pelo menos alguns deles se terem reunido,
no propósito de, conjuntamente, tomarem uma atitude contra o dono da obra e
vendedor, por forma a resolver os problemas de humidade, infiltrações e maus
acabamentos que existiam nas várias fracções.
(18) Quanto à proveniência das infiltrações, desconhece-se quais as tubagens
em concreto em que têm origem ou mesmo se têm origem em quaisquer
tubagens.
(19) Os AA esburacaram parte do tecto da sua cozinha, na tentativa de
encontrar o tubo da água alegadamente responsável pela infiltração, o que não
lograram.
(20) É do conhecimento público e nomeadamente dos AA a má construção do
prédio em causa, comprovada, aliás, por diversos pareceres técnicos sobre as
causas destes problemas.
III.
Justificação da matéria assente:
(a)
Globalidade dos depoimentos prestados em audiência4;
(b)
Ponderada a prova documental5;
(c)
Foram tidas em conta a inspecção ao local6, e as perícias7.
4
As testemunhas Marco Silva, José Pinto, Maria Magalhães e Sónia Fernandes revelaram aparente
isenção, sinceridade e principalmente lógica; as testemunhas Maria Carvalho, Nuno Veiga, Carla Ribeiro
e José Silva depuseram com aparente isenção e ilógica.
5
Fotografias do interior da habitação, e orçamentos das obras.
6
Relatório sobre a inspecção judicial:
...........................
6
1.
É evidente que houve infiltração de água na lage do piso entre os dois apartamentos, o que provocou
estragos nos tectos e paredes da habitação dos AA;
2. Quanto à origem da água, embora pareça ter sido um derrame junto ao ciffão d abanca de cozinha
do apartamento dos RR, não tenho elementos suficientes para afirmar sem margem de dúvidas que
esse é o motivo dos estragos, pois só uma análise da água permitiria uma afirmação concludente:
não ponho, no entanto, de parte a hipótese;
3. As manchas de humidade que se espalham por uma grande área da casa dos AA não parecem ser
motivadas só por um derrame localizado; mas como fui informado que a pretensa fuga de água se
terá iniciado em 1995, ponho algumas reservas;
4. ...pelo que me foi dado a observar, é provável que tenha ocorrido um derrame de água, de esgoto ou
não, na casa dos AA, que provocou estragos na casa dos RR que provocou estragos no apartamento
dos AA, contudo as grandes manchas de humidade existentes, podem não ter sido totalmente
provocadas por uma única fuga. O facto de ter decorrido um grande período de tempo entre a
hipotética fuga e a data da observação no local, sem que outras tenham sido feitas em tempo
intermédio, e a ausência de água presentemente, o que facilitaria uma análise onde poderiam ser
detectados elementos como cloro ou detergentes, que me dariam uma pista capaz sobre a origem da
água não me permitem tirar uma conclusão definitiva sobre a situação. Assim, julgo que a humidade
encontrada poderá ter origem num derrame mas também por outras infiltrações, que de momento
não disponho de informação suficiente para localizar com certeza.
7
Reltório de Perícia [António Fernando Ribeiro de Barros, Eng.º Técnico Civil, a solicitação dos RR]:
....................
Conclusão
[a] Pela vistoria e análise por mim realizada, e ainda pelas informações prestadas pelo R. [marido] e
pelo dono da obra, dúvidas julgo não ter para poder afirmar que a água eventualmente acumulada no
tecto da cozinha da fracção dos AA não nem pode ser proveniente do cifão dos RR, nem tão pouco [ter
origem em] qualquer anomalia do tudo de drenagem das águas residuais [desta], uma vez que... o mesmo
se encontra em bom estado de funcionamento. [Tanto como]... a existir água proveniente desse local ,a
fuga teria que aparecer obrigatoriamente no dito tubo.
[b] Quanto às manchas de humidade existentes no interior da fracção dos AA, dada a sua extensão e
principalmente devido às diversas localizações, concluo que as mesmas não podem ter sido provocadas
por uma infiltração localizada, porque a distância de uma para as outras é grande e existe um espaço
mediador sem qualquer vestígio;
[c] Aliás, a confirmar tudo isto, basta prestar atenção ao facto de actualmente o alegado local da
infiltração estar seco (sem que para isso houvesse causa justificativa, nomeadamente quaisquer obras
das partes)...;
[d] ...a origem das humidades existentes, e ainda a infiltração em debate, terão como causa principal [o
excesso de tempo que a estrutura do edifício esteve sem estar coberta ou protegida das intempéries,
provocando acumulação e ensopamento de águas nas paredes e placas sem que se tivesse procedido ao
escoamento dos espaço vazios, caixas de ar e blocos de cofragem], e outras que uma mais rigorosa
vistoria poderia fazer aparecer: pelas informações obtidas, o edifício em causa parece ter problemas a
outros níveis.
Relatório de peritagem [Lúcio Manuel Sousa Pereira da Silva, Eng.º Civil, a solicitação dos AA]:
....................
IDescrição da análise
....................
A fracção encontra-se orientada no sentido N./S. A entrada dá acesso a um hall que deriva para a
cozinha e sala situadas à direita, e para os quartos que se situam em frente, no prolongamento do
corredor. Na cozinha o tecto apresenta vários pontos onde existe humidade e uma mancha situada numa
área devidamente identificada e localizada no canto junto da parede divisória entre a cozinha e a
dispensa, afastada cerca de 4 a 5m da parede exterior. Entre a parede exterior e a respectiva mancha
existe uma viga estrutural paralela à parede exterior e afastada cerca de 1 m, não existindo continuidade
da humidade desde a parede exterior até à respectiva mancha. No local onde se situa essa mancha
começaram a cair gotas em grande quantidade, e esta situação aconteceu ela primeira vez no final de
7
IV.
Cls./Alegações:
(a)
O julgador avaliou incorrectamente os factos da presente causa, analisou
indevidamente as provas, maxime o depoimento das testemunhas dos Ap.es8, a
prova documental e os relatórios dos peritos;
(b)
Na verdade, os Ap.es provaram que a água que se infiltrou no tecto da
cozinha da sua fracção advém da fracção dos RR, devendo ser respondido
provado a Q2.9;
(c)
Depois, e aquando do aparecimento da infiltração da água, 12.95, os RR
tiveram conhecimento imediato da infiltração proveniente da cozinha da sua
fracção.
(d)
Mas apesar de diversas vezes instados pelos Ap.es nada fizeram apara
solucionar no mais curto espaço de tempo a referida infiltração;
(e)
O comportamento dos RR traduziu-se então num comportamento
inoperante e desleixado, configurando uma conduta ilícita, porque violadora do
direito de propriedade dos Ap.es;
1995 (de acordo com afirmações do proprietário) embora na data da vistoria o tecto estivesse seco, mas
o local da mancha denotava a presença de água durante um período de tempo e em quantidade razoáveis
IIConclusão
[a] A mancha existente é isolada e apresenta uma diminuição de intensidade conforme o afastamento vai
aumentando a partir do seu centro;
[b] Devido à localização e características desta, ...não é provocada por condensação, falta de
ventilação/arejamento e também não vem do exterior (não existe uma continuidade dos danos ao longo
do tecto desde a parede exterior em direcção à referida mancha);
[c] Esta é resultado de uma infiltração provocada pela ruptura do cifão do pavimento da banca da
cozinha, ou por alguma anomalia na canalização da drenagem das águas residuais da fracção situada
no piso superior;
[d] A água que proveio da cozinha do piso superior provocou e agravou a extensão dos danos
(humidades) nos tectos e paredes da habitação dos AA.
8
Vd. transcrição dos depoimentos de Marco Silva, José Pinto, Maria Rodrigues, José Ribeiro, Sónia
Fernandes, em anexo 1.
Vd. Transcrição dos depoimentos de Maria Carvalho, Nuno Veiga, João Silva, testemunhas indicadas
pelos RR, no anexo 2.
9
Questionário:
..........
Q1. No mês de Dezembro de 19995, começaram a surgir na fracção dos AA infiltrações de água, na zona
de cozinha? Provado;
Q2. As referidas infiltrações provêm da cozinha da fracção dos RR? Não provado;
......................
8
(f)
Ora, devido ao lapso de tempo decorrido entre o aparecimento da
infiltração e a reparação da mesma pelos RR, na fracção deles, foi provocado,
na fracção dos AA, o alastramento de humidade aos aposentos contíguos à
cozinha: dispensa, corredor, sala de jantar, hall, e um dos quartos;
(g)
Tal conduta por parte dos RR merece reprovação e censura do Direito:
agiram com culpa, uma vez que perante os factos podiam e deviam ter agido de
modo diferente, reconduzindo-se deste modo a conduta deles a uma actuação
dolosa (dolo eventual);
(h)
Portanto, ao procederem da forma descrita, infringiram os RR, com a
conduta em crise, e sem razão válida, as regras que se lhes impunham, não
agindo de acordo com os cânones pelos quais se deve pautar o bonus pater
familias;
(i)
Logo provocaram danos aos Ap.es, sendo sem dúvida estes consequência
típica e normal da actuação dos RR;
(j)
Verificam-se pois no presente caso os pressupostos que fazem impender
sobre estes a responsabilidade por esses danos;
(k)
Entretanto, os Ap.es provaram através do depoimento de suas
testemunhas a existência dos danos em causa, nomeadamente nas paredes e
tectos da cozinha, dispensa, hall, corredor, sala de jantar, quarto e móveis da
cozinha;
(l)
Provaram também o montante dos referidos danos, sendo que a reparação
e pintura das paredes e tectos dos cómodos atrás referidos orça em Pte 600
000$00;
(m) Acrescendo ainda o preço da reparação dos móveis da cozinha da fracção
dos Ap.es: Pte 180 000$00;
(n)
Por outro lado, o problema de que os Ap.es se queixaram na presente
acção não é o mesmo problema de que o R. e testemunhas por eles
apresentadas falaram e falsamente fizeram crer ser o mesmo, na audiência de
julgamento;
9
(o)
Todas as testemunhas apresentadas pelos RR10, que habitaram ou
habitam no edifício dos Ap.es, quando questionadas sobre a existência de
problemas de infiltração de água nos tectos das suas cozinhas, e na direcção da
banca e dos móveis, afirmaram peremptoriamente nunca terem sofrido essas
eventualidades;
(p)
As testemunhas apresentadas pelos RR demonstraram um total
desconhecimento, e tentaram falsear a verdade dos factos;
(q)
Pelo que mal andou o julgador quando decidiu a matéria assente da
forma como fez;
(r)
V.
Deve ser revogada a sentença recorrida, e condenados os RR no pedido.
Contra-alegações:
(a)
O julgador fez uma correcta e justa avaliação de toda a prova produzida,
e decidiu em coerência com os factos apurados;
(b)
Os Ap.es insistem contudo em continuar a afirmar que a mera alegação
de a água infiltrada no tecto da cozinha deles ser proveniente da cozinha dos
Ap.os, é bastante para lhes imputar a responsabilidade pelos prejuízos
causados;
(c)
Parece, aliás, aos Ap.os que para os Ap.es é indiferente saber se a água
em causa é proveniente de um qualquer tubo ou cifão, se é da chuva, ou de
qualquer outro motivo;
(d)
Na verdade, parece que para os Ap.es o simples facto de os Ap.os
possuírem uma cozinha por cima do local onde se localiza a citada infiltração,
já é razão suficiente para os responsabilizar;
(e)
Porém, e porque a questão não se resolve dessa forma, os Ap.es
procuraram, logo, encontrar uma qualquer origem para a proveniência daquela
água;
10
Provável lapso de escrita: deverá ler-se AA?
10
(f)
E lançaram dois palpites sobre a causa eventual: ruptura no tubo de
drenagem das águas residuais; um qualquer problema no cifão da cozinha dos
Ap.os;
(g)
No entanto, sabiam já antecipadamente que do tubo relativo à drenagem
das águas residuais isso não era possível, porquanto já haviam procedido a
averiguações sobre o mesmo, colocando-o inclusivamente a descoberto, e
verificando que por ele nenhuma água vertia;
(h)
Quanto ao cifão, quer através de vistoria11, quer ainda da perícia12, ficou
claramente comprovado que o mesmo se encontrava em excelente estado de
conservação e funcionamento;
(i)
Pelo que, e na ausência de qualquer origem em concreto sobre a
proveniência da água, voltaram os Ap.es à sua velha máxima de que a mesma
água é proveniente da cozinha dos Ap.os, como se esta fosse uma verdadeira
fonte de produção de água;
(j)
Entretanto, os Ap.os, através dos elementos de prova que carrearam para
o debate, nomeadamente a testemunhal, contribuíram decididamente para o
verdadeiro esclarecimento da verdade;
(k)
Circunstância que levou a julgadora a considerar como provados os
factos centrais da absolvição;
(l)
Face ao exposto, e porque nunca se poderá considerar os Ap.os como
autores de algum facto ilícito, não podem também haver culpa pela infiltração;
(m) Assim, muito bem andou o tribunal na sentença de 1ª instância, que deve
ser inteiramente mantida.
VI.
Recurso: pronto para julgamento.
VII.
Sequência:
11
12
Levada a cabo pela testemunha dos RR Nuno Veiga, vd. Anexo 2.
Vd. nota 7, 1º relatório.
11
(a)
Sobretudo perante as dúvidas periciais13, de certa maneira corroboradas
pelo conjunto dos depoimentos14, parece não haver reticências quanto ao acerto
da resposta a Q2., que os recorrentes questionam, mas sem êxito. Na verdade,
não podem tirar-se desta dinâmica probatória as conclusões críticas que a
minuta do recurso tenta demonstrar, contudo sem apoio num plano de análise
que interseccione, através de um melhor entendimento das transcrições dos
depoimentos profusamente aditadas, a validade da proposta apresentada sob
legitimidade da livre convicção. Em suma, vistos os depoimentos numa
estimativa a partir do mais extenso consenso pericial, só pode ser atingido, em
boa verdade, um dado adquirido: dúvida insanável sobre a causa da(s)
infiltraç(ões). Ainda assim, o parecer dissidente, pela sua linearidade, também
em nada beneficia desses depoimentos também, mostrando-se inerme no relato
das observações e parco de elementos analíticos15: limita-se a uma descrição do
interior, decalcando depois uma defesa ex catedra da causalidade da
infiltração, apenas enunciativa.
Por fim, os bloqueios ao progresso da descoberta e entendimento das causas
das avarias levadas ao debate em audiência já constituem matéria de superação
vedada ao ofício do juiz, no plano processual em que foi ordenado o exame do
local, visto que a demonstração da tese dos AA lhes competia por inteiro. Aliás
tentaram-na, de seguida, ineficaz (segundo a crítica precedente): também não
há motivo para regresso à fase de julgamento.
(b)
Por conseguinte, tem de ser aceite o acerto da matéria assente16. E por
isso improcede o recurso cuja base não deixa prescindir do ponto de vista
crítico e alternativo ao juízo de facto, mas exangue (justamente aquele que foi
defendido pelos recorrentes), apresentado porém no enfiamento de uma defesa
13
Vd. notas 6 e 7 – 1ª parte.
Vd. Anexo 1 e 2.
15
Vd. nota 7, 2º relatório.
16
Vd. II.
14
12
jurídica afinal sem divergências com a decisão recorrida no plano normativoaxiológico17.
(c)
Tudo visto, pois, decidem manter inteiramente a sentença posta em crise,
e por se não verificar caso de responsabilidade civil, vistos os arts. 483 ss CC,
tal como foi defendido nos fundamentos apresentados em 1ª instância18 para os
quais nos remetemos.
VIII. Custas: pelos Ap.es, que sucumbiram.
17
É inconsistente, na verdade, a acusação da parte contrária, vertida em V.(b): insistem... em continuar a
afirmar que a mera alegação de a água infiltrada no tecto da cozinha deles ser proveniente da cozinha
dos Ap.os, é bastante para lhes imputar a responsabilidade pelos prejuízos causados, vd. IV.(b), que
comanda, no sistema das conclusões todas as restantes.
18
Vd. síntese em I.(d).(1)/(9).
13
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Ap.: Tc. Paços de Ferreira, 1º J. (444/97