Curso de Eletrônica
Parte Analógica
Ademarlaudo Barbosa
III – Dispositivos semicondutores
Os átomos de um material semicondutor são dispostos em uma rede
cristalina. Enquanto em um átomo isolado os níveis de energia acessíveis a um
elétron são discretos, quando ordenados na rede os níveis se subdividem
(degeneração) a tal ponto que para o cristal podemos identificar bandas de
energia. A chamada banda de valência é ocupada por elétrons ligados aos
átomos e a banda de condução contém os elétrons livres para circular pela
rede cristalina. Entre as bandas de condução e valência existe a banda
‘proibida’, no sentido de que não há probabilidade para que um elétron do
cristal tenha energia de valor dentro desta banda. Conforme mostrado na Fig.
21, esta noção de bandas permite classificar genericamente os materiais como
isolantes, condutores e semicondutores.
∼ 1 eV
∼ 6 eV
ISOLANTE
Valência
SEMICONDUTOR
Condução
Proibida
CONDUTOR
Intersecção
Fig. 29: Classificação de materiais em termos da estrutura de bandas.
Num isolante praticamente não há elétrons na banda de condução, e a
diferença de energia entre as bandas de condução e valência é relativamente
alta, de modo que a, temperatura ambiente, um elétron não tem energia
suficiente para ‘saltar’ para a banda de condução. Num condutor as bandas se
interceptam, e os elétrons podem se mover livremente pelos átomos do
material. No semicondutor a diferença de energia entre bandas é pequena, os
elétrons podem facilmente passar para a banda de condução deixando um
buraco na banda de valência.
3.1 Semicondutor intrínseco, dopado e junção
Na rede cristalina de um semicondutor puro (também denominado
intrínseco) a temperatura ambiente, existe uma probabilidade não nula para
que elétrons passem para a banda de condução, de modo que pares elétronburaco são constantemente gerados. Em condições de equilíbrio elétrico e
térmico a concentração ni de elétrons ou buracos pode ser expressa por:
ni ≈ T
3/ 2
e
−
Eg
2 kT
Onde T é a temperatura e Eg é a diferença de energia entre bandas a 0o
K. Para os semicondutores de fato utilizados em componentes eletrônicos, o
valor de ni a 300 K é de aproximadamente 2.5 x 1013 /cm3 (silício) e 1.5 x 1010
/cm3 (germânio). Essa concentração é pequena relativamente à densidade do
próprio semicondutor ( ∼ 1022 átomos/cm3).
O semicondutor intrínseco pode ser dopado com uma impureza que
tenha um elétron de valência a mais ou a menos. A Fig. 22 mostra o resultado
da adição de um átomo de impureza na rede.
Tanto silício quanto germânio são átomos tetravalentes. A substituição
de um dos átomos da rede por um átomo pentavalente equivale a acrescentar
um elétron à rede, enquanto que a substituição por um átomo trivalente
equivale a acrescentar um buraco. Segundo este critério os semicondutores
dopados são referidos como ‘tipo-n’ e tipo ‘tipo-p’. Nos semicondutores tipo-n a
corrente elétrica é principalmente determinada pelo movimento de elétrons, e
nos tipo-p pelo movimento de buracos. As impurezas tipicamente usadas são:
fósforo, arsênio, antimônio, gálio, índio e boro. Note-se que no semicondutor
dopado o equilíbrio elétrico é mantido, já que o átomo acrescentado também é
eletricamente neutro.
Elétron em excesso
Buraco em excesso
(a)
(b)
Fig. 30: Dopagem de semicondutores: (a) impureza tipo ‘n’, (b) impureza tipo ‘p’
Uma junção p-n é obtida quando se fabrica um semicondutor tipo-p
justaposto a um tipo-n. Na região de interface entre os dois, haverá tendência
dos elétrons a migrar para a região tipo-p, e dos buracos a migrar para a região
tipo-n. Dessa forma a região tipo-n torna-se carregada positivamente por haver
capturado buracos, e a região tipo-p torna-se carregada negativamente por
haver capturado elétrons. Um campo elétrico portanto se estabelece, com uma
diferença de potencial tipicamente da ordem de 1V.
3.2 Diodo semicondutor
O dispositivo resultante de uma junção p-n, como descrito em 3.1, é
chamado de diodo semicondutor. Ele pode ser polarizado de modo a favorecer
ou a bloquear a passagem de corrente, como mostrado na Fig. 31.
Se aplicamos uma diferença de potencial entre os terminais p e n, de
modo que do lado n o potencial seja inferior ao do lado p, estaremos
favorecendo a migração de portadores de carga através da junção. Haverá
portanto passagem de corrente pelo diodo. Aqui notamos que o movimento de
elétrons é oposto ao que convencionalmente adotamos para simbolizar a
direção da corrente elétrica (do potencial positivo para o negativo).
Invertendo a diferença de potencial, ou seja, aplicando ao lado n um
potencial superior ao do lado p, estaremos confinando ainda mais os elétrons à
região p e os buracos à região n. Neste caso somente uma pequena corrente
residual passa pela junção, em direção oposta à anterior. A magnitude desta
corrente residual depende da temperatura, da concentração de impurezas p e
n, e está também relacionada com as características do material semicondutor.
Sob polarização reversa, a região de interface da junção p-n fica desprovida de
portadores de carga. Quanto maior a diferença de potencial reversa, maior a
região desprovida de portadores de carga, chamada de ‘região de depleção’.
p
n
n
p
Fig.31: Polarização do diodo:
À esquerda: polarização favorável ⇒ passagem de corrente;
À direita: polarização reversa ⇒ aumento da região de depleção.
O comportamento da corrente, I, em função do potencial aplicado, V,
pode ser estimado e resulta em:
 eV

I = I o  e kT − 1




Io
(64)
eV
− kTo
= Ke
Onde Vo é a diferença de potencial presente quando a junção está em
equilíbrio (sem potencial externo aplicado) e K uma constante determinada
pelas propriedades geométricas da junção e pelas características do
semicondutor. Io é a corrente residual mencionada acima,
chamada de
‘corrente de saturação’. Vemos que para o diodo o comportamento de I em
função de V não é linear, como era o caso para resistores, capacitores e
indutores. Na Fig. 32 está esboçado um gráfico qualitativo de I(V).
I
V
≈ 0,6 Volts
Fig. 32: Comportamento genérico da corrente em função
da tensão para um diodo semicondutor
O fato de não haver uma relação linear entre I e V para o diodo implica
que
não
podemos
obter
analiticamente
a
função
de
transferência
correspondente (pelo menos não da maneira como fizemos para R, L e C).
Ademais, conforme veremos a seguir nos circuitos envolvendo diodos, a
resposta a uma oscilação harmônica não é facilmente modelável por uma
função matemática.
3.3 Circuitos elementares com diodos
3.3.1 Retificador de meia onda
Na Fig. 24 está mostrado o mais simples dos circuitos com diodo. Uma
fonte de tensão alternada, de freqüência fixa e amplitude Ve (>Vo) é aplicado à
entrada do diodo. O resistor representa uma carga, e também um limitador de
corrente. Seu valor deve ser tal que a corrente que passa pelo circuito (Vs/R)
seja inferior a à corrente máxima (Imax) suportável pelo diodo. Imax é uma das
especificações fornecidas pelo fabricante.
Como visto em 3.2, haverá passagem de corrente quando a polarização
do diodo estiver no sentido favorável (Ve>0). Isto ocorre a cada meio ciclo de
onda, de modo que a tensão de saída reproduz a parte positiva da tensão de
entrada, a menos da queda de potencial sobre o diodo (Fig. 41). Assim o diodo
cumpre a função de retificar o sinal de entrada, eliminando sua parte negativa.
Ve
t
Vs
Ve
R
Vs
t
Fig. 33: Circuito retificador de meia-onda (esquerda) e sua
resposta a uma oscilação harmônica (direita).
3.3.2 Retificador de onda completa
Ao circuito da Fig. 33 faltaria inverter a parte negativa da tensão de
entrada, para que Vs apresente tensão positiva em todos os ciclos de onda. Isto
é obtido com o circuito mostrado na Fig. 34. O circuito é tal que, para o ciclo
em que Vs>0, corrente flui pelos diodos D1 e D3 , passando pela carga R. Para
o ciclo em que Vs<0, corrente flui pelos diodos D3 e D4, passando também pela
carga R. Nos dois ciclos a direção da corrente em R é a mesma. O efeito final é
portanto reproduzir na saída o valor absoluto da tensão de entrada, a menos da
queda de tensão sobre dois diodos.
Ve
D2
t
D1
Ve
Vs
D3
D4
R
Vs
t
Fig. 34: Circuito retificador de onda completa (esquerda) e
sua resposta a uma oscilação harmônica (direita).
Pode-se agora introduzir um capacitor de filtragem, C, antes da carga R,
tal que o produto RC seja muito maior que o período da oscilação de entrada, a
fim de se obter um nível de tensão na saída Vs. Um filtro LC seria ainda mais
recomendável, desde que os valores de L e C sejam elevados. Como vimos no
capítulo anterior, para ω> ωo o ganho do filtro L-C decresce com 1/ω2, enquanto
que para o filtro R-C o ganho decresce com 1/ω. Escolhendo ωo≈0 (ou seja, L e
C elevados), a filtragem L-C praticamente só permite a passagem de um nível
de tensão constante. A Fig. 35 apresenta um circuito para gerar um nível de
tensão constante a partir de uma fonte de corrente alternada. Foi acrescentado
um transformador para converter a amplitude de tensão de entrada à amplitude
esperada na saída.
D2
D1
L
Vs
Ve
D3
D4
C
C
R
Fig. 35: Gerador de nível de tensão a partir de uma fonte de corrente alternada
3.3.3 Diodo Zener, Fonte de Tensão
Para ser qualificado como fonte de tensão, o circuito da Fig. 35 teria
ainda que assegurar que a tensão de saída não varie. Entretanto, variações da
corrente sobre a carga (R), ou da tensão de entrada, ou mesmo quedas de
tensão sobre os indutores implicam variações na tensão de saída. Para
contornar este inconveniente utiliza-se outra peculiaridade dos diodos.
Em 3.2 notamos que em um diodo polarizado na direção oposta à
condução de corrente, a diferença de potencial tende a aumentar a região de
depleção, confinando elétrons e buracos em lados opostos da junção.
Aumentando esta diferença de potencial chega-se a um limite de ruptura, Vz, a
partir do qual elétrons são desprendidos de suas posições na rede cristalina, e
acelerados em direção ao eletrodo correspondente. Um elétron nestas
condições colide com outros elétrons, que por sua vez colidem com outros e
contribuem em uma avalanche de carga elétrica. Resulta que uma corrente
importante passa pelo diodo (Fig. 36). Esta corrente não é necessariamente
destrutiva. Fabricam-se diodos que podem suportar correntes reversas de até
alguns amperes.
I
Vz
V
Fig. 36: Comportamento da corrente em função
da tensão para um diodo Zener.
Os diodos que funcionam sob este regime são chamados de diodos
Zener (Clarence Zener propôs uma explicação para o aumento acentuado da
corrente na região de ruptura). Eles são indicados para manter fixo um nível de
tensão, Vz, independentemente de variações de corrente. O circuito da Fig. 37
mostra a utilização de um diodo Zener como regulador de tensão. Desde que
Vfonte seja maior que Vz, podemos escrever:
V fonte = IR fonte + V ⇒ I =
V fonte
R fonte
−
1
R fonte
V
O ponto de intersecção da equação de reta acima com a curva I(V) para
o diodo Zener dá a corrente Ifonte que passa sobre o resistor Rfonte. Sobre a
carga passa corrente Icarga = V/Rcarga. Enquanto Icarga for menor que Ifonte, o
diodo atua como regulador de voltagem, ou seja, supre corrente de modo a
manter fixo o nível de tensão Vz. Caso contrário a queda de tensão sobre Rfonte
é muito grande para manter o diodo zener na tensão de ruptura.
Rfonte
Vfonte
V=Vz
Rcarga
Fig. 37: Regulagem de tensão com diodo Zener.
3.3.4 Modulação e Demodulação de Frequência
Em (59) está expressa uma função I(V) válida para o comportamento do
diodo semicondutor. Esta função é da forma:
f ( x) = K (e x − 1)
Que expandida em série de potências de x leva a:
f ( x) = Kx +
K
2
x 2 + K6 x 3 + ...
Para valores pequenos de tensão (<<1V), podemos então exprimir I(V)
por:
I = a1V + a 2V 2
Suponhamos que seja injetado em um diodo um estímulo composto pela
sobreposição de duas oscilações harmônicas:
V = V (t ) = V1 Sen(ω 1t ) + V2 Sen(ω 2 t )
A corrente de saída será então expressa por:
I=
a2
2
[
(V12 + V22 ) − a22 V12 Cos (2ω 1t ) + V22 Cos (2ω 2 t )
+ [a1V1 + (a1V2 + 2a 2V1V2 )Sen(ω 2 )t ]Sen(ω 1t )
]
O último termo representa uma oscilação harmônica de frequência ω1,
cuja amplitude está modulada pela frequência ω2. Se favorecemos este termo
na saída do diodo, obtemos portanto um circuito modulador de amplitude em
frequência. Isto é feito, conforme vimos no capítulo anterior, com filtros L-C
que selecionam uma frequência específica. O circuito de modulação é
mostrado na Fig. 38.
V(t)=[2+Sinω2t]Sinω1t
3
ω1=10ω 2
2
L1 C1
L1 C1
1
ω1
V(t)
ω1||ω2
0
-1
-2
ω2
-3
0
20
40
60
80
100
t
Fig. 38: Circuito modulador de amplitude em freqüência
(esquerda) e seu sinal de saída (direita).
O funcionamento adequado do circuito requer que a onda portadora
tenha frequência ω1 muito superior a ω2, e que os filtros (L1-C1) estejam
sintonizados em ω1. Note-se que, como ω2<<ω1, de acordo com a função de
transferência para filtros L-C, embora o filtro não esteja sintonizado em ω2 esta
frequência passa à saída com ganho 1.
O circuito da Fig. 38 representa o princípio básico utilizado na
transmissão de sinais de rádio e vídeo. A recepção, ou demodulação, é obtida
por exemplo com o circuito da Fig. 39, onde a constante de tempo do filtro de
saída é escolhida tal que RC >> (ω1)-1. Com esta escolha a onda portadora é
eliminada, e a saída Vs traz apenas a contribuição das frequências ω2<<ω1 que
se pretende sintonizar.
L1 C1
ω1||ω2
RC<<ω1
Vs
Fig. 39: Circuito demodulador de frequência
3.4 Transistores Bipolares
Transistores bipolares são dispositivos semicondutores em que há duas
junções, cada uma delas semelhante à que está presente nos diodos. Há duas
possibilidades básicas de construção, como mostrado na Fig. 40. Três
terminais são disponibilizados em um transistor, conectados a elementos
denominados emissor, base e coletor.
Nos transistores a junção base-emissor é normalmente polarizada de
modo a favorecer a passagem de corrente (≈ 0.6V). Já a junção base-coletor é
polarizada reversamente. Sabemos que para o diodo configurado entre base e
emissor uma pequena variação de tensão na base implica uma variação
proporcionalmente muito maior da corrente (Ver Fig. 41). Esta corrente é
fornecida pela junção base-coletor, ou seja, os portadores de carga requeridos
na junção base-emissor para transmissão de corrente provêm da junção basecoletor.
Um transistor permite portanto o controle de corrente a partir de
pequenas variações de tensão. A corrente efetivamente aplicada à base, Ib, é
pequena em comparação à corrente que passa pelo emissor, Ie, fornecido pela
junção base-coletor. O transistor é tanto mais eficiente quanto maior for a
fração de corrente de emissor relativamente à corrente de coletor.
pnp
npn
Junções
c
c
Símbolo
Circuito
b
b
e
e
c
c
b
b
e
Fig. 40: representações de transistores bipolares
Expressamos esta fração como:
e
α=
Ic
Ie
A corrente total disponibilizada no emissor é dada pela soma da corrente
de base (suprida quando se aplica uma ‘tensão de controle’ à base), mais a
corrente de coletor (suprida pela junção base-coletor). Como Ie=Ic+Ib, podemos
também escrever:
Ic =
α
1−α
I b ≡ βI b
(60)
O valor de α é um número muito próximo da unidade, enquanto que o
valor de β como definido acima tipicamente assume valores entre 102 e 103.
Por isto o parâmetro β é geralmente usado para exprimir a eficiência, ou ganho
em corrente, do transistor.
Entretanto, para que o transistor opere como anunciado acima, deve
haver uma polarização mínima entre coletor e emissor. Ou seja, uma vez
polarizada a junção base-emissor para que haja condução de corrente,
também deve haver uma polarização VCE ( = VC-VE) entre base e coletor para
que a corrente fornecida pela junção base-coletor flua pelo emissor. Este fato
define uma característica fundamental dos transistores e está expresso na Fig.
41.
IC
(VBE)3
(VBE)2
(VBE)1
Região de Operação
VCE
Fig: 41: Curvas características IC x VCE para transistores bipolares
Conforme mostrado na figura, existe uma região de operação para a
qual a corrente de coletor, IC, é praticamente independente da tensão de
polarização VCE. O valor de IC é determinado por VBE ( = VB-VE), a tensão de
polarização entre base e emissor. O comportamento de IC como função de VBE
pode ser avaliado analiticamente. De fato é o mesmo da junção pn definido
pela equação (59), conhecido como ‘modelo de Ebers-Moll’:
 BE

I C = I S  e VT − 1 , com VT =


V
kT
e
(61)
O valor de VT a temperatura ambiente é de aproximadamente 26 mV. IS
é chamado de corrente de saturação do transistor, parâmetro que depende da
temperatura.
Mais genericamente podemos assumir que IC é uma função das duas
tensões de polarização e escrever:
I C = I C (VBE ,VCE )
∂
∂
dI c = ∂VIBEC dVBE + ∂VICEC dVCE
(62)
Com (62) passamos a tratar as variações das grandezas quiescentes
dos transistores. As grandezas quiescentes, ou estáticas, são as tensões e
correntes de polarização (IC, IB, IE, VB, VC, VE), que definem a região de
operação do transistor. As variações destes valores estáticos são precisamente
os sinais elétricos tratados nos circuitos envolvendo transistores. Convencionase usualmente referir-se aos sinais com letras minúsculas, enquanto que os
parâmetros estáticos são escritos com letras maiúsculas. Assim (62) é
expressa como:
ic =
∂I C
∂V BE
v BE +
∂I C
∂V CE
v CE
Ou, de acordo com (60)
ic = β
∂I B
∂VBE
v BE +
∂I C
∂VCE
v CE
Definindo agora:
r=
∂VBE
∂I B
, eρ =
∂VCE
∂I C
(63)
Chegamos a:
ic = βr v BE + ρ1 v CE
r, β e ρ são parâmetros intrínsecos do transistor que definem suas
características de funcionamento dinâmico. r e ρ têm dimensão de resistência
elétrica. Podemos ver pela Fig. 41 que, na região de operação, ρ equivale a
uma resistência de valor muito elevado, já que IC praticametne não varia com
VCE. Neste contexto, admitindo que a base seja o terminal de entrada, r
equivale a uma resistência de entrada intrínseca ao transistor:
r≈
β
iC
v BE =
v BE
iB
(64)
A partir do modelo de Ebers-Moll podemos também ver que:
V BE
∂I C
I e VT
I + I S IC
= S
= C
≈
∂v BE
VT
VT
VT
A aproximação acima é válida porque IC é tipicamente muito maior que
IS. Note-se que IS, segundo (61), é a corrente residual que permanece quando
a junção base-emissor é polarizada reversamente. Portanto podemos também
estimar que, de acordo com a definição (63):
r≈
VT
IB
≈
26 mV
I B ( mA)
A expressão acima mostra diretamente como a corrente de polarização
da base define a resistência de entrada do transistor.
3.5 Circuitos básicos com transistores bipolares
Conforme apresentado acima, o transistor é um dispositivo com três
terminais. Um circuito genérico pode ser visto como um quadrupolo com dois
terminais de entrada e dois terminais de saída, conforme mostrado na Fig. 42.
No caso mais simples um dos terminais da entrada e um da saída são comuns
e correspondem ao ‘terra’ ou referência de potencial zero. Para o transistor
podemos conceber três modos de funcionamento
básicos que permitem a
exploração de suas propriedades: coletor comum (a), emissor comum (b) e
base comum (c). A seguir avaliamos alguns parâmetros de desempenho que
evidenciam as particularidades de cada um destes modos: ganho em tensão
(Av), ganho em corrente (Ai), impedância de entrada (Ze) e impedância de saída
(Zs). O ganho em potência (Ap) é dado pelo produto dos ganhos em corrente e
em tensão. Outro parâmetro importante é a banda passante, mas este só será
abordado quando considerarmos a influência de capacitâncias sobre o
desempenho de transistores [§?] . Supõe-se que em cada caso o transistor
esteja adequadamente polarizado, ou seja, que IC, IB, IE, VC, VB e VE o
configurem para sua região de operação como indicado na Fig.
41. Esta
configuração requer o uso de resistores de polarização que não estão
mostrados nos circuitos tratados. Tomamos o caso do transistor tipo npn. Os
resultados para o tipo pnp podem ser obtidos pelo mesmo procedimento.
(a)
Base
(b)
Emissor
Coletor
Base
(c)
Coletor
Emissor
Emissor
Coletor
Base
Fig. 42: Possíveis modos de funcionamento de transistores
Coletor comum (a), emissor comum (b), base comum (c)
3.5.1 Modo coletor comum
Neste modo o coletor é comum à entrada e à saída, estando conectado
a uma fonte de tensão VCC, como ilustrado na Fig. 43. Embora não esteja
diretamente conectado ao ‘terra’, para efeitos de propagação de sinais a tensão
VCC representa também uma referência de potencial constante equivalente ao
próprio terra.
Notamos inicialmente que, como existe uma junção ou diodo polarizado
para conduzir corrente entre base e emissor, a diferença de tensão entre estes
dois terminais, VBE, é praticamente fixa e vale cerca 0,6 Volt (Ver Fig. 32). Isto
se deve ao comportamento exponencial da corrente de emissor em função de
VBE.
VCC
ve
Vs
RE
Fig. 43: Modo coletor comum
Portanto a própria polarização do transistor impõe:
V B − V E ≈ 0,6 ≈ constante
Os sinais elétricos de entrada (ve) e de saída (vs) são justamente as
variações de VB e de VE, de modo que podemos afirmar que:
ve ≈ v s
Ou seja, o ganho em tensão é aproximadamente unitário. Este resultado
pode ser obtido de maneira mais metódica. Consideremos as quedas de
tensão deste a base até o terra quando há um sinal de entrada. Vemos que:
v e = ri B + RE i E
Onde riB é a queda de tensão na junção base-emissor devida à presença
da resistência de entrada intrínsica do transistor, r. Como iE=iC+iB, e iC=β iB,
encontramos:
v e = [r + (β + 1)RE ]i B
O sinal de saída é a variação de tensão sobre o resistor RE:
v s = RE i E = (β + 1)RE iB
Portanto o ganho em tensão é dado por:
Av =
vs
ve
=
(β +1)RE
r + (β +1)RE
Lembrando que (β+1)RE é tipicamente >> r, vemos que Av ≈1 e que
Av≤1.
Para obter o ganho em corrente basta ver que
i s = i E = (β + 1)i B = (β + 1)ie
Donde:
Ai =
is
ie
= β +1 ≈ β
A impedância de entrada define-se como o quociente entre tensão de
entrada e corrente de entrada, ou seja, para o coletor comum:
Ze =
ve
ie
=
vb
iB
=
[r + (β +1)R E ]i B
iB
= r + (β + 1)R E ≈ βR E
Para a impedância de saída supomos que existe uma carga conectada à
saída do circuito, e definimos impedância de saída como a queda de tensão
devida à presença da carga dividida pela corrente efetivamente fornecida:
Zs =
δv
is
No circuito do coletor comum, como mostrado na Fig. 43, a carga é
representada pelo resistor RE. Caso haja uma carga extra, R, a carga efetiva
será dada pela combinação RE||R (RE e R em paralelo).
Para calcular Zs, podemos notar que o circuito do coletor comum é
equivalente a um divisor de tensão, como mostrado na Fig. 44 (a).
(a)
(b)
r/(β+1)
r
ve (=vB)
vs (=vE)
iB
vs (=vE)
iE
RE
iE
ve (=vB)
iE
RE
Fig. 44: Circuitos equivalentes para o modo coletor comum
Entretanto, como o transistor é um componente ativo, a corrente (iB) que
passa pelo resistor de entrada (r) é menor que a corrente (iE) sobre o resistor
de saída (RE). O transistor pode ser considerado como um gerador de corrente.
Para reduzir o circuito a um divisor de tensão passivo, notamos que a queda de
tensão de ve para vs pode também ser expressa em função de iE. Isto equivale
a supor que o resistor r é dividido pelo fator (β+1), já que iE=(β+1)iB, como
mostrado na Fig. 44 (b).
Podemos então escrever:
vs =
RE
r
β +1
+ RE
ve =
( β + 1 )R E
r + ( β + 1 )R E
ve
A expressão acima reproduz o resultado obtido anteriormente para Av.
Mas a analogia com o circuito divisor de tensão permite-nos visualizar mais
claramente o conceito de impedância de saída. A queda de tensão devida à
carga é a queda de tensão sobre o resistor de entrada, e a corrente fornecida à
carga é a corrente de emissor, iE. Zs pode então ser expressa como:
Zs =
ri B
iE
=
riB
(β +1)iB
=
r
β +1
Ou seja, a impedância de saída é efetivamente representada pelo
resistor r/(β+1) que aparece na Fig. 44 (b).
Um gerador de tensão perfeito apresentaria impedância de saída nula, o
que significaria que o gerador é capaz de manter o mesmo valor de tensão na
saída independentemente da corrente consumida pela carga.
Analisando as características do coletor comum, podemos concluir que é
um circuito recomendável para funcionar como interface entre outros circuitos.
Isto porque apresenta impedância de entrada elevada, portanto não exige
muita corrente do circuito do qual recebe sinais. Por outro lado apresenta
impedância de saída baixa, sendo por isto capaz de fornecer corrente ao
circuito de carga sem muita queda de tensão na saída.
O ganho em tensão praticamente unitário e o alto ganho em corrente
traduzem o fato de o coletor comum transferir o sinal de entrada à saída,
fornecendo a corrente necessária para que não haja queda de tensão.
3.5.2 Modo emissor comum
Neste modo o sinal de saída é tomado no terminal coletor, estando o
emissor conectado ao terra, portanto comum à entrada e à saída, como
mostrado na Fig. 45 (a).
VCC
VCC
(a)
(c)
(b)
RC
RC
vs
ve
VCC
RC
vs
ve
RE
vs
ve
RE
C
Fig. 45: Modo coletor comum, com (a) e sem (b) resistor de emissor, e com
capacitor de desacoplamento (c).
As variações de tensão no terminal coletor correspondem diretamente
ao sinal de saída. Podemos portanto escrever:
VC = VCC − RC I C
⇒ v s = − RC iC
O sinal de entrada é vB, que, conforme vimos na seção anterior, tem
aproximadamente a mesma amplitude que vE :
v e = v B ≈ v E = R E i E ≈ R E iC
Assim chegamos a uma primeira estimativa do ganho em tensão:
Av ≈
− RC iC
RE iC
= − RCE
R
Um circuito emissor comum pode então constituir um amplificador de
tensão, desde que RC>RE. Av tem valor negativo, o que indica que o sinal de
saída é invertido relativamente ao de entrada. O máximo ganho do amplificador
seria obtido quando RE≈0. Essa possibilidade se realiza quando o terminal
emissor é diretamente conectado ao terra, ou quando introduzimos um
capacitor de desacoplamento, como ilustrado nas Figs. 45 (a) e (b). Neste
último caso o resistor de emissor contribui para fixar a polarização do transistor,
mas os componentes espectrais de mais alta frequência do sinal de entrada
são passados ao terra através da (menor) impedância representada pelo
capacitor.
Na prática o ganho é limitado, como podemos notar ao analisar mais
rigorosamente o circuito, incluindo a contribuição da resistência de entrada do
transistor. Mesmo que o emissor seja conectado ao terra, permanece a
resistência interna, r, que implica uma ligeira queda de tensão do sinal de
entrada:
v e = riB + RE iE = [r + (β + 1)RE ]iB
(β )
β
R
i
R
∴ Av = − [r +(βC+1)RB E ]iB = − r +(β +C1)RE
Mesmo nos casos em que RE=0, o valor do ganho está limitado a:
Av ≤ −
β RC
r
O ganho em corrente é dado por:
i s = iC = βi B = βie
⇒ Ai = β
Para a impedância de entrada encontramos:
Ze =
vB
iB
=
[r + ( β +1)RE ]iB
iB
= r + (β + 1)RE
Notamos que Ze pode apresentar valor tanto mais elevado quanto maior
for o valor de RE. Entretanto, já que Av depende inversamente de RE, aumentar
a impedância de entrada implica reduzir o ganho.
Caso RC represente a própria carga conectada à saída do emissor
comum, a variação de tensão de coletor devida à presença da carga tem
origem na resistência intrínseca da junção base-coletor, definida em (63). A
corrente fornecida à carga é ic, portanto:
Zs ≈
− ρiC
iC
= −ρ
O fato de o valor ser negativo significa que a corrente flui da carga ao
transistor.
Caso RC a carga seja representável por uma resistência externa, R,
conectada à saída, a combinação de RC||ρ é responsável pela queda de tensão
devida ao circuito de carga. A corrente de saída é iC. O valor máximo de
corrente efetivamente utilizada por R seria ic, quando R fosse muito menor que
RC. Com isto podemos estimar a impedância de saída:
Zs =
(RC || ρ )ic
iC
= RC || ρ
Os dois casos estão ilustrados na Fig. 46.
ρ
ve (=vB)
iC
iC
vs (=vC)
ρ||RC
ve (=vB)
RC
(a)
vs (=vC)
iC
iC
R
(b)
Fig. 46: Circuitos equivalentes para o modo emissor comum:
(a) RC é a carga, (b) carga externa R.
Como ρ tipicamente apresenta valor elevado (impedância de um diodo
polarizado reversamente) e como RC também tende a ter valor elevado num
circuito amplificador, concluímos que a impedância de saída do circuito coletor
comum é alta. Isto o torna inadequado como circuito transmissor de sinal,
apesar de funcionar como amplificador.
A fim de preservar seu desempenho como amplificador, um circuito em
modo emissor comum deve ser intermediado por outro circuito que apresente
alta impedância de entrada e ganho em corrente, como é o caso do modo
coletor comum.
3.5.3 Modo base comum
Conforme mostrado na Fig. 47, no modo base comum o sinal entra pelo
terminal emissor, e sai pelo terminal coletor. A base é conectada a uma tensão
de referência constante, comum ao coletor e ao emissor.
Caso desprezemos a corrente de entrada em comparação com a
corrente de emissor, chegamos à seguinte avaliação para Av e Ai:
Av = −RRECiEiC = − (ββ+R1C)RiBE iB = − (ββ+R1C)RE ≈ − RRCE
Ai =
− iC
iE
βi
= − (β +1B)iB ≈ −1
Para a impedância de entrada notamos que uma variação de tensão no
terminal emissor (=sinal de entrada) implica uma queda de tensão através da
junção base-emissor, onde passa corrente iB pela resistência interna r. Como
vimos anteriormente, esta situação é equivalente a uma queda de tensão sobre
um resistor r/(β+1), por onde passa corrente iE. Pelo menos uma fração desta
corrente passa pelo resistor RE. Vemos assim que a corrente de entrada é
dividida pela associação de dois resistores, de modo que:
Ze =
( )|| R
r
β +1
E
=
rRE
(β +1)RE + r
≈
r
β +1
VCC
RC
vs
I[emissor]
I[entrada]
VBB
ve
I’
RE
Fig. 47: Modo base comum e representação do nó de correntes na entrada.
I’ é a corrente que passa pelo resistor RE.
Em geral não se pode desprezar a corrente de entrada, Ie, diante da
corrente de emissor, IE. Notamos também que no circuito base-comum a
corrente de entrada pode estar ‘saindo’ do circuito. Nesse caso podemos
escrever:
I E = I ' + Ie
Onde I’ é a corrente que passa pelo resistor RE.
Portanto a tensão de entrada é dada por:
ve = RE i' = RE (iE − ie ) = RE (iE − vZee )
Substituindo o valor encontrado acima para Ze, chegamos a:
ve =
rRE2
rRE + r + RE ( β +1) E
i =
rRE2 ( β +1)
rRE + r + RE ( β +1) B
i
Donde podemos calcular:
Av = vves =
− βRC iB
ve
=
− βRC [ rRE + r + RE ( β +1)]
rRE2 ( β +1)
Para obter o ganho em corrente fazemos
Ai = iies =
v
− Rs
C
ve
Ze
= − vves
+ +
ZE
RC
= − Av
ZE
RC
β+
1)]
E r RE (
⇒ Ai = − [ rR
[ r + RE ( β +1)] RC
Caso a corrente de entrada esteja ‘entrando’ no circuito (em sentido
oposto à corrente de coletor), Av e Ai devem ser invertidos, ou seja, deve ser
suprimido o sinal ‘menos’ em Av e em Ai. Neste caso a montagem coletor
comum não atua como circuito inversor.
Para a impedância de saída vale a mesma análise feita para o caso do
emissor comum, visto que no modo base comum o sinal de saída também é
dado pela variação de tensão no coletor:
Zs = ρ
(se RC é a carga)
Z s = ρ || RC
(se a carga é externa)
Vemos então que o modo base comum é semelhante ao modo coletor
comum, a menos pelo fato de apresentar baixa impedância de entrada e não
prover ganho em corrente. Esta característica é importante quando se
pretenda, por exemplo, converter uma variação de corrente em variação de
tensão.
Os resultados obtidos para os três modos estão resumidos na tabela
apresentada na Fig. 48.
Ze
Zs
Coletor comum
r + (β + 1)RE ≈ βRE
Emissor comum
r + (β + 1)R
Base comum
rRE
(β +1)RE + r
≈
r
β +1
r
β +1
Av
Ai
Ap
(β +1)RE
r + (β +1)RE
β+1≈β
≈β
β
−
ρ ou RC||ρ
− r +(β +C1)RE
ρ ou RC||ρ
±
βR
βRC [ rRE + r + RE ( β +1)]
rRE2 ( β +1)
+ +
β+
1)]
E r RE (
± [ rR
[ r + RE ( β +1)] RC
β 2 RC
r + (β +1)R E
[ rRE + r + RE ( β +1)]2
[ r + RE ( β +1)]rRE2 ( β +1)
Fig. 48: Resumo das propriedades de montagens básicas com transistores bipolares
3.6 Transistores a efeito de campo
É possível obter um dispositivo semicondutor de comportamento
semelhante ao transistor bipolar, com apenas um tipo de junção. O princípio de
funcionamento deste dispositivo é mostrado na Fig. 49.
Dois terminais condutores são previstos nas extremidades opostas de
uma região dopada com excesso de portadores tipo n. Entre estes terminais
implanta-se uma região com excesso de portadores tipo p. Os terminais
condutores são denominados ‘fonte’ (referido como S, de source) e ‘dreno’
(referido como D, de drain). O terceiro terminal é implementado na região p, e é
denominado ‘porta’ (referido como G, de gate). O próprio dispositivo é referido
como FET (field effect transistor), por razões que ficarão claras a seguir, e é
simbolizado como mostrado na Fig. 49
D
D
(a)
(b)
n
n
D
p
p
p
G
p
S
S
S
Fig. 49 Esquema para o transistor a efeito de campo com canal n
(a) VGS=0, (b) VGS <0.
Estabelecendo-se uma diferença de potencial entre D e S (VDS)
favorece-se a passagem de corrente de S a D (canal S-D). Entretanto, o valor
desta corrente não varia linearmente com VDS. De fato, suponhamos que porta
e fonte estejam ao mesmo potencial (VGS=0). À medida em que se aumenta
VDS, forma-se uma região de depleção cada vez maior entre G e D, como
mostrado na áreas pontilhada da Fig. 49 (a).
Para valores de VDS muito pequenos o volume da região de depleção é
desprezível, e a corrente nesse caso varia linearmente com VDS. Mas se
aumentamos o valor de VDS, e consequentemente o volume da região de
depleção, a resistividade do canal S-D também aumenta, de modo que relação
de linearidade entre corrente e VDS é gradualmente perdida. Continando a
aumentar a tensão VDS , chega-se a uma situação limite em que as duas
regiões de depleção mostradas na Fig. 49 praticamente se encontram através
do canal. A partir deste limite, incrementos de VDS são contrabalanceados pelo
incremento da resistividade do canal, de tal forma que a corrente permanece
aproximadamente constante para uma ampla faixa de valores de VDS.
O valor de VDS para o qual a situação limite é atingida é conhecido como
tensão de ruptura (pinchoff) do canal. Esta tensão marca o início da região de
operação do dispositivo como um transistor. Além da região de operação, ou
seja, para valores de VDS muito elevados, ocorre ruptura da própria junção pn.
Caso a tensão VGS seja menor que zero a mesma análise é válida, mas
observamos que a corrente obtida na região de operação é menor do que a
verificada quando VGS=0. Isto se deve essencialmente ao fato de que VGS <0
se opõe à passagem de corrente pelo canal (diodo polarizado reversamente).
Nesse caso a região de depleção se estende também em direção à fonte, com
mostrado na Fig. 49 (b).
A Fig. 50 mostra os distintos regimes de funcionamento do transistor a
efeito de campo num gráfico de corrente no dreno, ID, em função de VDS. A
região ôhmica corresponde aos valores muito pequenos de VDS.
Naturalmente a tensão VGS não deve ser positiva. Nesse caso haveria
condução de corrente no sentido oposto a ID no diodo configurado na junção
pn, o que impediria o funcionamento regular do transistor.
ID
Ruptura (pinchoff)
(VGS)1
(VGS)2
(VGS)3
Região de Operação
VDS
Fig: 50: Curvas características ID x VDS para transistores a efeito de
campo com canal n.
Concluímos que VGS define a corrente ID no transistor a efeito de campo,
assim como VBE define IC no transistor bipolar.
3.7 Tipos de transistores a efeito de campo
O comportamento ID x VGS acima descrito para o transistor a efeito de
campo também pode ser modelizado por uma função matemática. Encontra-se
que, para um dispositivo com canal n:
(
I D = I DSS 1 + VVGST
)
2
(65)
IDSS (drain to source with gate shorted) é a corrente obtida quando
VGS=0, portanto corresponde ao máximo valor possível para ID no transistor.
Para ID=0 encontramos VGS=-VT, o que significa que VT
é a tensão de
polarização reversa abaixo da qual não há passagem de corrente pelo canal.
Ou seja, VT é a máxima polarização reversa admissível enquanto o dispositivo
atue como transistor.
A equação (65) é equivalente ao modelo de Ebers-Moll apresentado
para transistores bipolares. Como ID é também determinada por VDS na região
de operação, podemos igualmente generalizar sua expressão matemática e
identificar os parâmetros dinâmicos intrínsecos ao FET:
I D = I D (VGS ,VDS )
⇒ dI D =
∂I D
∂VGS
dVGS + ∂∂VIDSD dVDS
Em termos dos sinais elétricos, podemos re-escrever a equação acima
como:
i D = sv GS + ρ1 v DS
Onde introduzimos as definições:
s=
∂I D
∂VGS
ρ=
,
∂VDS
∂I D
Na região de operação ρ ≈ ∞, pelo que podemos interpretar s como uma
transcondutância, que relaciona tensão de entrada e corrente de saída.
1
s
≈
v GS
iD
(66)
3.7.1 Canal p
O modelo a que se refere a equação (65) é conhecido como ‘FET canal
n’ ou n-FET. Caso substituamos o semicondutor presente no canal por outro
dopado com impurezas do tipo p e o gate por um do tipo n, chegamos a um
dispositivo que também opera como transistor. A diferença é que no FET com
canal p a polarização VGS tem que ser invertida relativamente ao n-FET. A
equação que expressa ID em função de VGS nesse caso muda para:
(
I D = I DSS 1 − VVGST
)
2
(67)
Para o p-FET, de acordo com a argumentação anterior, devemos
polarizar a junção com VGS>0. A Fig. 51 mostra o comportamento gráfico de
(65) e (67).
ID
ID
n-FET
p-FET
IDSS
IDSS
VT
VT
VGS
VGS
Fig. 51: Representação de ID(VGS) para n-FET e p-FET.
3.7.2 MOS-FET, IG-FET
A Fig. 52 mostra um esboço da implementação prática de um FET de
junção (n ou p), como descrito acima. Note-se que o eletrodo gate está em
contado direto com o canal semicondutor.
G
S
Substrato
D
Canal
Fig. 52: Esboço da implementação de um FET
Há outras possibilidades de implementação em que o gate é fisicamente
isolado do canal. Na Fig. 53 (a) por exemplo está mostrada uma estrutura em
que o gate é separado do canal por uma camada de óxido de silício. Por esta
razão o transistor é chamado MOSFET (metal oxide FET) ou IGFET (insulated
gate FET). Quando se aplica tensão entre gate e source, VGS<0, os elétrons do
canal n são repelidos, gerando uma região em que não há portadores de
carga. Esta região é equivalente à região de depleção formada no FET de
junção. Com isto se reproduz o princípio de funcionamento descrito
anteriormente para o n-FET. A tensão de pinchoff é atingida quando a região
de depleção se estende sobre todo o canal. Também pode ser obtido um pFET. Neste caso a região do canal é formada por um semicondutor dopado
com impureza tipo p, e trabalha-se com VGS≥0.
S
G
D
S
G
D
SiO2
n
p
SiO2
p
Substrato
(a)
Substrato
(b)
Fig. 53: Esquemas para depletion MOSFET (a) e enhanced MOSFET (b)
Suponha-se agora que o canal n é suprimido, como mostrado na Fig. 53
(b) e que o substrato seja um semicondutor tipo-p. Nesta situação, quando
VGS>0 os portadores de carga do substrato (p) são repelidos e começa a
formação de uma região desprovida de portadores de carga na superfície entre
o substrato e o óxido de silício. Acima de uma tensão limite, VGS≥VT, começa a
passagem de corrente entre source e dreno (desde que haja polarização VDS,
ou seja, que o transistor esteja polarizado em sua região de operação).
Transistores operando sob esse regime são denominados enhancement
MOSFETs.
Voltando ao caso da Fig. 53 (a) e supondo que o substrato seja um
semicondutor tipo-p, notamos que para VGS>0 a espessura do canal (n) terá
sido ocupada pela região de depleção, e começa se formar uma região de
depleção (desprovida de portadores de carga) no substrato, pelo mesmo
processo que ocorre no enhancement MOSFET. Portanto pode haver
passagen quando VGS>0. Finalmente são possíveis os três comportamentos da
curva ID(VGS) especificados na Fig. 54.
ID
ID
ID
IDSS
VT
VT
Depletion n-FET
VT
VGS
VGS
VGS
Enhancement
n-MOSFET
Enhancement &
depletion n-MOSFET
Fig. 54: Características ID(VGS) possíveis para FETS.
3.8 Circuitos básicos com FETs
A principal característica dos transistores a efeito de campo é a alta
impedância de entrada. No caso dos MOSFETs, como o terminal de entrada
está fisicamente isolado dos outros terminais, a resistência de entrada atinge
valores altíssimos, tipicamente da ordem de 1014 Ω. Sinais elétricos são
transmitidos devido essencialmente a variações de campo elétrico através do
material isolante presente entre o eletrodo de entrada e o semicondutor. Por
isto é pertinente a denominação “transistores a efeito de campo”. Também no
caso dos FETs em que o gate está em contato com a junção, ou J-FETS, como
os ilustrados na Fig. 52, a impedância de entrada é alta porque a junção
semicondutora gate-source é polarizada reversamente. A junção equivalente
nos transistores bipolares, base-emissor, é polarizada para favorecer
passagem de corrente. Portanto a impedância de entrada nos FETs
é
normalmente muito maior do que em transistores bipolares.
Para efeitos práticos pode-se assumir que a corrente de entrada nos
FETs é nula. Acrescente-se que este fato implica baixo ruído eletrônico na
entrada, o que também representa uma característica importante dos FETs.
Os modos de operação expostos para transistores bipolares podem ser
obtidos também com FETs. Consideremos por exemplo o equivalente à
montagem emissor-comum, como mostrada na Fig. 55.
VDD
RD
vs
ve
RG
RS
C
Fig. 55: FET em modo source-comum.
Notamos que vs=-RDiD, e que ve≡vGS. Como, pela definição (66) iD=svGS,
o ganho em tensão é dado por:
Av = − sR D
É fácil ver que o ganho em tensão é máximo quando VGS=0. Se
tomamos o caso do n-FET:
(
V
s = ∂∂VIGSD = 2 IVDSS
1 + VGST
T
)
No n-FET temos -VT!VGS"0, donde o valor máximo de s e
consequentemente de Av é obtido quando VGS=0.
A impedância de entrada é dada pela combinação de RG em paralelo
com a resistência de entrada do FET. Como esta última é praticamente infinita
porque a corrente de entrada é nula, temos Zin=RG. A impedância de entrada
deve ser fixada externamente pelo resistor RG. Caso contrário o potencial no
terminal de entrada estará flutuando. Tipicamente utilizam-se para RG
resistores de valor elevado ( > Mega-Ω).
Para a impedância de saída vale a mesma análise feita para o emissor
comum. Ou seja, Zs é dada por RD ou por RD|| ρ.
Para os FETs não faz muito sentido definir o ganho em corrente, já que
o sinal de entrada é sempre uma variação de tensão que excita o campo
elétrico a que está sujeita a junção. Por outro lado vimos que a corrente de
entrada é nula, o que indicaria ganho infinito em corrente, embora saibamos
que a corrente de saída é finita e definida pela condutividade do canal.
Um FET pode também ser operado em modo dreno comum, que seria o
equivalente ao modo coletor comum dos bipolares, como mostramos na Fig.
56.
VDD
ve
Vs
RG
RS
Fig. 56: FET em modo dreno comum
A mesma corrente passa por dreno e por source. Portanto:
v s = RS i S = RS i D = RS sv GS = sRs (v G − v S )
Como vG=ve, podemos escrever:
Av = 1+ sRS S
sR
Encontramos então, Av"1, como no caso do modo coletor comum. Mas
sRS é tipicamente menor do que o fator (#+1)RE que aparece para o transistor
bipolar, donde se conclui que a atenuação é maiot no caso do FET.
A impedância de entrada é dada por RG, devido a que a corrente de
entrada no FET é nula. Para encontrar a impedância de saída podemos
retomar a expressão para o ganho:
Av =
vs
ve
= 1+ sRS S ⇒ v s =
sR
RS
1
+ RS
s
ve
Aí vemos que vS resulta de uma divisão de tensão entre os resistores RS
e 1/s, e podemos identificar que a impedância de saída é dada por Zs=1/s,
como fizemos no caso do coletor comum.
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