UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE - UNIVALE
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS – FHS
CURSO DE PSICOLOGIA
Adriano Aparecido de Oliveira
PEDOFILIA:
a distinção entre o abusador preferencial e o oportuno
Governador Valadares
2009
ADRIANO APARECIDO DE OLIVEIRA
PEDOFILIA:
a distinção entre o abusador preferencial e o oportuno
Monografia para obtenção do grau de
Bacharel em Psicologia, apresentada à
Faculdade de Ciências Humanas e
Sociais da Universidade Vale do Rio
Doce.
Orientador: Roberto Jório Filho
Governador Valadares
2009
ADRIANO APARECIDO DE OLIVEIRA
PEDOFILIA:
a distinção entre o abusador preferencial e o oportuno
Monografia apresentada como requisito
para obtenção do grau de Bacharel em
Psicologia, pela Faculdade de Ciências
Humanas e Sociais da Universidade Vale
do Rio Doce.
Governador Valadares, 03 de junho de 2009.
Banca Examinadora:
____________________________________________
Professora Kelly Prata Silva
Universidade Vale do Rio Doce
_____________________________________________
Professora Valéria Chequer de Miranda Trindade
Universidade Vale do Rio Doce
Dedico esse trabalho ao Mestre
Roberto Jório Filho, pela simples
amizade, pelos meus valores que
sempre aumenta, por minha fé que
alimenta, pela presença nesse grande
momento, por repreender-me quando
estou errado, por tudo isso e muito
mais eu te agradeço e te digo, Deus
te abençoe amigo, a cada instante.
AGRADECIMENTOS
A presente conquista não é resultado apenas dos últimos cinco anos de
dedicação acadêmica, mas do imprescindível esforço de meus pais, por toda uma
vida, que com perseverança, coragem e fé, conduziram minha educação. Por isso
agradeço a Deus pelas suas vidas e pela enorme felicidade de poder concluir essa
etapa. Meu carinho aos meus irmãos, que contribuíram de forma efetiva para essa
vitória, em especial à minha irmã Sueli que mesmo de longe se fez presente.
Obrigado por estarem do meu lado em todos os momentos!
A felicidade aparece para aqueles que choram, para aqueles que se
machucam, para aqueles que buscam, para aqueles que tentam sempre e para
aqueles que reconhecem a importância das pessoas que passaram por suas vidas.
Neste percurso encontrei força e fé bastantes para fazer das adversidades
momentos doces, dificuldades para tornar-me mais forte, tristezas para fazer-me
mais humano, perseverança e resignação para seguir em frente e esperança
suficiente para realizar um sonho.
Agradeço aos Mestres por compartilhar o seu conhecimento, pela dedicação,
persistência e paciência no exercício da arte de educar, em especial aos professores
Roberto Jório, Kelly Prata e Valéria Chequer.
RESUMO
Segundo a literatura revisada, um indivíduo que tenha cometido crime sexual contra
criança para ter o diagnóstico de pedófilo, deve preencher os critérios previstos no
Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais – DSM-IV-TR (2000) e na
Classificação Internacional de Doenças, CID 10 (1983). Sendo assim, nem todo
indivíduo que comete crimes sexuais contra menores de idade é pedófilo, pois os
crimes sexuais podem ser situacionais ou preferenciais e nem todo pedófilo é
necessariamente criminoso, pois ele pode desenvolver o transtorno e contudo não
passar ao ato, sendo necessário portanto que se façam as devidas distinções. Tratase de um tema relevante para a sociedade, pois poderá contribuir com legisladores
na elaboração de leis específicas para cada caso e por colocar o conhecimento
produzido pela psicologia e psiquiatria como ferramentas para identificar estas
diferenças e fornecer os indicativos necessários à justiça para uma punição
adequada, bem como estabelecer os melhores critérios para o tratamento do
abusador. Além de esclarecer sobre o transtorno parafílico do tipo pedofilia, justificase perante a generalização produzida através dos meios de comunicação do
conceito de pedofilia, ao cunhar este conceito simplesmente por nomear quaisquer
“crimes contra os costumes” que envolvam menores de idade, de pedofilia. Através
do presente trabalho de pesquisa bibliográfica, pretende-se conceituar as parafilias e
caracterizá-las dando ênfase à parafilia do tipo pedofilia, com o objetivo de distinguir
o abusador pedófilo (preferencial), do abusador oportuno (situacional). A Monografia
encontra-se nas áreas da Psicologia, da Psiquiatria e do Direito, organizada através
dos fundamentos metodológicos da revisão bibliográfica, que utilizou os diversos
desdobramentos do problema, para proporcionar uma melhor resposta à mesma.
Palavras-chave: Pedofilia. Crime Sexual. Psicologia. Direito.
ABSTRACT
According to the literature review, an individual who has committed sexual crimes
against children to have the diagnosis of pedophilia must meet the criteria of
Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders - DSM-IV-TR (2000) and the
International Classification of Diseases, CID 10 (1983). Therefore, not all individuals
who commit sexual crimes against children under age is pedophile, because the
sexual crimes can be situational or preferential child molester and not all necessarily
be criminal, he may develop the disorder and it does not pass the act, and therefore
need that will be necessary distinctions. This is an issue relevant to society, it could
help with legislators in the drafting of laws specific to each case and to put the
knowledge produced by psychology and psychiatry as tools to identify these
differences and provide the indicators needed to justice for punishment appropriate
and establish the best criteria for the treatment of the abuser. In addition to clarifying
the type of paraphilias disorder pedophilia, it is produced before the general through
the media of the concept of pedophilia, to coin this concept by simply appoint any
"crimes against the customs" involving children under age of pedophilia . Through
this work of literature is to conceptualize the paraphilias and characterize them
emphasizing the type of paraphilias pedophilia, with the aim of distinguishing the
abuser pedophile (preferred), the abuser appropriate (situational). The monograph is
in the areas of Psychology, Psychiatry and the Law, organized by the methodological
foundations of the literature review, using the various ramifications of the problem, to
provide a better response to it.
Keywords: Pedophilia. Sexual Crime. Psychology. Law.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 8
2 CONCEITUAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO NOSOLÓGICA DAS PARAFILIAS .......... 13
2.1 CONCEITUAÇÃO DAS PARAFILIAS .......................................................................... 13
2.2 CLASSIFICAÇÃO NOSOLÓGICA DAS PARAFILIAS .............................................. 17
3 CARACTERIZAÇÃO E CONTEXTO HISTÓRICO DA PARAFILIA DO TIPO
PEDOFILIA ............................................................................................................................. 21
3.1 CARACTERIZAÇÃO DA PARAFILIA DO TIPO PEDOFILIA ................................... 21
3.2 CONTEXTO HISTÓRICO DA PARAFILIA DO TIPO PEDOFILIA .......................... 26
4 PEDOFILIA ENQUANTO TRANSTORNO E CRIME ................................................... 30
4.1 PEDOFILIA ENQUANTO TRANSTORNO .................................................................. 30
4.2 PEDOFILIA ENQUANTO CRIME ................................................................................. 33
5 POSSÍVEIS CAUSAS E SUGESTÕES TERAPÊUTICAS PARA O TRATAMENTO
DO TRANSTORNO PARAFÍLICO DO TIPO PEDOFILIA ............................................. 39
5.1 POSSÍVEIS CAUSAS DO TRANSTORNO PARAFÍLICO DO TIPO PEDOFILIA 39
5.2 SUGESTÕES TERAPÊUTICAS PARA O TRANSTORNO PARAFÍLICO DO TIPO
PEDOFILIA ............................................................................................................................. 42
8
1 INTRODUÇÃO
O presente trabalho de pesquisa bibliográfica, pretende caracterizar a parafilia
do tipo pedofilia com o objetivo de distinguir o abusador pedófilo (preferencial), do
abusador oportuno (situacional).
Esclarecer sobre o transtorno parafílico do tipo pedofilia, justifica-se perante a
generalização produzida através dos meios de comunicação do termo pedofilia, ao
cunhar este conceito simplesmente por nomear quaisquer crimes sexuais que
envolvam menores de idade, de pedofilia.
Trata-se de um tema relevante para a sociedade, pois poderá contribuir com
legisladores na elaboração de leis específicas para cada caso e por colocar o
conhecimento produzido pela psicologia e psiquiatria como ferramentas para
identificar estas diferenças fornecendo assim os indicativos necessários à justiça
para uma punição adequada, bem como estabelecer os melhores critérios para o
tratamento do indivíduo abusador.
O tema em questão merece amplitude no seu debate por ter emergido de
modo significativo após a democratização e acesso aos meios de comunicação e a
facilidade e velocidade das notícias, não se mantendo restrito a pequenos grupos e
seguimentos.
O termo parafilia surge com a psiquiatria em substituição à expressão
“perversão sexual”. O conceito “perversão” aparece pela primeira vez em Freud, nos
“Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” (1980). Esse conceito será explicitado
no decorrer do trabalho para melhor compreensão do leitor.
De acordo com a Classificação Internacional de Doenças, CID 10 (1983), as
parafilias (pedofilia, urofilia, coprofilia, necrofilia, sadismo, masoquismo, etc.), se
caracterizam por impulsos sexuais intensos e recorrentes, modulados por fantasias
e padrões de comportamento não convencionais que podem provocar alterações
desfavoráveis na vida social, familiar e ocupacional da pessoa, sendo este um
comportamento que se caracteriza pela repetição, como em um quadro compulsivo.
De acordo com Meyer (1999), o fato de um indivíduo mostrar preferências por
determinadas partes do corpo, acessórios e objetos, não necessariamente
caracteriza uma parafilia e em muitos casos não existe risco para que possa
determinar uma conduta criminosa.
9
O termo “pedofilia” nas suas origens designava o amor de um adulto pelas
crianças (do grego antigo paidophilos: pais = criança e phileo = amar). No entanto, a
palavra tomou outro sentido sendo designada para caracterizar uma parafilia, qual
seja a atração sexual preferencial de adultos para crianças em idade pré - puberal,
ou seja, crianças que ainda não adquiriram os caracteres sexuais secundários.
A pedofilia segundo a Classificação Internacional de Doenças, CID 10 (1983),
é definida como Preferência sexual por crianças, meninos ou meninas, geralmente
pré-púberes. O DSM-IV-TR (2000), conceitua pedofilia como uma desordem
psicológica, na qual há preferência sexual por crianças pré-púberes e para que se
configure o transtorno pedofílico, o indivíduo deve preencher determinados critérios
diagnósticos.
Além da pedofilia, um número significativo de pedófilos encontra-se
concomitantemente envolvido, ou já esteve, com exibicionismo, voyerismo
ou estupro. Embora não seja classificado como uma perversão no sentido
estrito, o incesto está superficialmente relacionado à pedofilia, pela
frequente seleção de uma criança imatura como objeto sexual, pelo
componente sutil ou declarado de coerção e, ocasionalmente, pela natureza
preferencial da ligação adulto-criança (KAPLAN, 1993, p. 471).
Para a Organização Mundial da Saúde (OMS), a pedofilia é classificada como
uma desordem mental e de personalidade do adulto e também como desvio sexual.
A Convenção Internacional sobre os Direitos das Crianças aprovada em 1989
pela Assembléia Geral das Nações Unidas no seu artigo19, define que os países
signatários devem tomar todas as medidas legislativas, administrativas, sociais e
educativas adequadas à proteção da criança, inclusive no que se refere à violência
sexual.
O contexto histórico da parafilia do tipo pedofilia encontra no antigo Egito
relatos de envolvimento entre faraós e infantes. Na Grécia antiga cabia ao chefe da
família conduzir os jovens à iniciação sexual, desenvolvendo-se a partir daí a prática
da relação sexual entre homens e a pedofilia. Existem também relatos do
envolvimento de adultos com crianças nas Sociedades Romanas, no Mundo Árabe
no Extremo Oriente e na Europa.
A partir do século XVIII importantes transformações ocorreram. As crianças
passaram a ser vistas como indivíduos com características específicas para sua
etapa de desenvolvimento.
10
O século XIX é marcado por um avanço significativo das ciências. Desde
então os desvios sexuais passaram a ser tema de estudos da medicina, da
psicologia e das outras ciências.
Os crimes sexuais de acordo com o Código Penal Brasileiro (2006), são
definidos como “crimes contra os costumes”, dos artigos de 213 a 224 e de 233 a
234 que incluem estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude,
atentado ao pudor mediante fraude, corrupção de menores, rapto violento ou
mediante fraude, rapto consensual, presunção de violência e outros. Neste mote o
indivíduo que comete crime sexual contra menores de idade não necessariamente é
pedófilo, pois a motivação para o crime poderá ser situacional e não preferencial.
É erroneamente diagnosticado como pedófilo todo aquele que abusa
sexualmente de crianças, pois esta parafilia implica, como dito
anteriormente, a preferência sexual por crianças. Diversas situações e
estados mentais podem contribuir para o abuso sem que o indivíduo possa
ser caracterizado como pedófilo. Mesmo o comportamento pedofílico pode
variar conforme a idade e os estressores, apesar do curso ser geralmente
crônico. Uma forma muito difundida atualmente é a pornografia infantil pela
internet, situação em que o sentimento de anonimato pode estar revelando
tendências que de outro modo ficariam reprimidas. Nesses casos, é
importante a distinção entre os verdadeiros pedófilos, os consumidores de
pornografia em geral, os curiosos e os que procuram satisfazê-los por
interesse pecuniário (DUQUE 2000, p. 300).
No Código Penal Brasileiro (2006), não existe “Crime de Pedofilia”, sendo a
pedofilia o transtorno parafílico e não o crime. O que configura crime é a prática da
parafilia pedofílica envolvendo menores de idade. Os pedófilos que passam ao ato
podem ser acusados e sentenciados por crimes que variam de atentado violento ao
pudor a estupro, agravados pela presunção de violência e seus atos são
considerados crimes hediondos pela lei 8.072/90. Existem no momento projetos de
lei em tramitação no Congresso Nacional, que objetivam tipificar os crimes sexuais
cometidos por pedófilos, a fim de aumentar a pena para quem os comete, tentar
inibir tais práticas e assim proteger os menores de idade contra este tipo de abuso.
Segundo Duque (2000), é necessário ressaltar que a pedofilia enquanto
desejo, tendência ou preferência não é crime, que nem todos os diagnosticados com
o transtorno de pedofilia passam ao ato e que alguns procuram situações que os
coloquem em contato com crianças como escolas e creches, não apenas para
satisfazer os desejos e sim para mediante mecanismo de sublimação, poder
controlá-lo e evitar sua atuação.
11
O autor acima citado ressalta ainda que as causas do comportamento
pedófilo são desconhecidas e diferentes estudos têm sido realizados no sentido de
definir relações causais deste tipo de comportamento. Pensava-se que o histórico de
abuso sexual na infância era um fator importante para determinar a causa da
pedofilia, porém pesquisas recentes não encontraram relação causal, uma vez que a
maioria dos infratores adultos relata não ter sido vítima de abusos sexuais na
infância.
Percebe-se assim, que a respeito das possíveis causas para a pedofilia não
há concordância entre os pesquisadores, pois segundo Looman apud Serafim
(2007), as possíveis causas destes comportamentos estão associadas à história de
abuso físico, sexual, exposição à violência familiar durante a infância e uso de álcool
e outras drogas durante a adolescência.
De acordo com a presente pesquisa bibliográfica, verificou-se que diversos
estudos têm sido realizados em centros de referência e universidades na busca de
explicação para o comportamento pedófilo, além de estudos que visam encontrar o
mais adequado modo de tratamento, o que será melhor explicitado posteriormente
para facilitar o entendimento do leitor.
Os parafílicos raramente procuram tratamento por conta própria, uma vez
que a parafilia é vivida como uma tentativa de solução dos conflitos
internos, especialmente a dificuldade de satisfação por outros meios, o que
justificaria o recrudescimento dos sintomas em períodos especialmente
estressantes (DUQUE 2000, p. 308).
Sendo assim, o objetivo desta pesquisa bibliográfica, é esclarecer o
transtorno pedofílico a fim de responder ao seguinte problema: Como fazer a
distinção entre o abusador preferencial e o oportuno?
O debate amplia-se para as áreas do direito penal, da psiquiatria e da
psicologia. O Congresso Brasileiro tem discutido o tema através da instituída
Comissão Parlamentar de Inquérito, CPI da Pedofilia. Trata-se de um tema relevante
que merece amplitude no seu debate, visto que tal fenômeno apresenta-se com
freqüência significativa na atualidade.
A Monografia encontra-se nas áreas da Psicologia, da Psiquiatria e do Direito,
organizada através dos fundamentos da metodologia do tipo revisão bibliográfica.
12
Assim, buscou-se correlacionar o entendimento dos diversos autores pesquisados, a
fim de entender o transtorno parafílico do tipo pedofilia e seus desdobramentos na
sociedade atual.
O primeiro capítulo deste trabalho de revisão bibliográfica terá como objetivo
conceituar as parafilias de acordo com o entendimento médico-psiquiátrico e
classificá-las nosologicamente através da Classificação Internacional de Doenças,
CID 10 (1983), do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais DSM-IVTR (2000) e de conceitos da psicologia, dando ênfase à parafilia do tipo pedofilia.
No segundo capítulo, será caracterizada a parafilia do tipo pedofilia de acordo
com os conceitos obtidos através dos diversos autores estudados. Além dos
conceitos serão evidenciados os aspectos históricos e culturais que envolvem a
pedofilia, entendida em determinadas épocas e locais como uma normalidade.
O terceiro capítulo versará sobre os aspectos legais referentes aos crimes
sexuais, fazendo a distinção entre o criminoso sexual preferencial e o criminoso
sexual situacional, além de esclarecer aspectos importantes como por exemplo, o
pedófilo que não passa ao ato portanto não comete crime, e o criminoso sexual que
tenha abusado de crianças e não necessariamente é pedófilo.
No quarto e último capítulo serão elencadas as possíveis causas da pedofilia
e as diversas sugestões terapêuticas para o tratamento do pedófilo, segundo
estudos da psiquiatria e da psicologia.
13
2 CONCEITUAÇÃO E CLASSIFICAÇÃO NOSOLÓGICA DAS PARAFILIAS
2.1
CONCEITUAÇÃO DAS PARAFILIAS
Na atualidade, segundo classificação de Holmes (2001), que segue os
padrões do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, DSM-IV- TR
(2000) existem três tipos de transtornos relacionados ao sexo:
a) As denominadas disfunções sexuais que envolvem desejo ou estimulação
insuficientes e problemas com o prazer (orgasmo);
b) As parafilias, gênero daqueles que buscam a satisfação de estímulos sexuais
através de meios inapropriados, dentre as quais se encontram práticas como
o exibicionismo, fetichismo, necrofilia, coprofilia, masoquismo, sadismo,
pedofilia e outros;
c) Os transtornos de identidade de gênero.
Dentre os três tipos de transtornos acima citados relacionados ao sexo, nos
deteremos aos transtornos denominados “parafilias”. Entende-se por parafilia, um
conjunto de transtornos relacionados à sexualidade humana anteriormente referidos
como perversões, conceito este que aparece pela primeira vez em Freud, nos “Três
Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade” (1980).
De acordo com Corrêa (2006), a palavra perversão em sua origem está
carregada de juízo de valor. Segundo o autor, o substantivo perverso já nomeia
adjetivando, pois este “Verso” é de verter, verter para o caminho errado, sair do que
é direito e bom. Literalmente, o perverso é contrário aos padrões aceitos, ou o que é
ainda mais forte, contrário à direção do juízo ou à lei.
De acordo com o DSM-IV-TR (2000), quando o comportamento individual de
excitação sexual somente se dá em resposta à objetos ou situações diferentes das
tidas como normais e quando esse comportamento interfere na capacidade do
indivíduo de ter relações sexuais e/ou afetivas tidas como normais, dá-se o nome a
essa disfunção de parafilia.
As parafilias, (assim como os transtornos da identidade de gênero), eram
chamadas “perversões sexuais”, termo que tende a ser abandonado, já que
14
na linguagem leiga a palavra “perversão” é rapidamente assimilada à
“maldade”, “ruindade”, “erro moral (DALGALARRONDO, 2000, p. 221).
A etimologia da palavra “parafilia” segundo Corrêa (2006), diz respeito à
“para” de paralelo, ao lado de, e “filia” de amor à, apego à. Portanto, para
estabelecer-se uma parafilia está implícito reconhecer aquilo que é convencional,
para em seguida detectar-se o que estaria “ao lado“ deste convencional.
Culturalmente se reconhece o sexo convencional como sendo heterossexual, coital,
com finalidade prazerosa e/ou procriativa.
Pelo exposto no DSM-IV-TR (2000), o diagnóstico de Parafilias entre as
várias culturas ou religiões é complicado pelo fato de que aquilo que é considerado
um desvio em um contexto cultural, pode ser mais aceitável em outro. O que foge ou
extrapola o convencional pode ser considerado parafilia desde que preencha
determinados critérios. As características essenciais de uma parafilia consistem de
fantasias, anseios sexuais ou comportamentos recorrentes, intensos e sexualmente
excitantes, em geral envolvendo:
a) Objetos não humanos;
b) Sofrimento ou humilhação próprios ou do parceiro;
c) Crianças ou outras pessoas sem o consentimento, ocorrendo durante um
período mínimo de seis meses (critério A).
Em alguns indivíduos, as fantasias ou estímulos parafílicos são obrigatórios
para a excitação erótica e sempre incluídos na atividade sexual. Em outros casos as
preferências parafílicas ocorrem apenas episodicamente, como por exemplo durante
período de estresse, ao passo que em outros momentos o indivíduo é capaz de
funcionar sexualmente sem fantasias ou estímulos parafílicos. O comportamento, os
anseios sexuais ou as fantasias causam sofrimento clinicamente significativo ou
prejuízo do funcionamento social, profissional ou em outras áreas importantes da
vida do indivíduo (critério B). Portanto, somente está configurada a parafilia quando
há necessidade de se substituir a atitude sexual convencional por qualquer outro tipo
de expressão sexual, sendo este substitutivo a preferida ou a única maneira da
pessoa conseguir excitar-se.
Tanto no DSM IV, quanto na CID 10 (Classificação Internacional de
Doenças-Organização Mundial da Saúde, 1993), as parafilias (fetichismo,
transvestismo fetichista, exibicionismo, voyerismo, necrofilia, pedofilia, etc.),
se configuram como uma sexualidade caracterizada por impulsos sexuais
15
intensos e recorrentes, modulados por fantasias e manifestações de
comportamentos não convencionais, provocando alterações desfavoráveis
na vida familiar, ocupacional e social da pessoa por ser um padrão de
comportamento caracterizado pela repetição como um quadro compulsivo.
As fantasias geralmente compreendem desejos sexuais ou comportamentos
recorrentes, intensos e sexualmente excitantes, podendo envolver objetos
não-humanos, sofrimento ou humilhação próprios ou do parceiro, crianças
ou outras pessoas sem o seu consentimento (MEYERS e BLASHFIELD,
1997, apud SERAFIM, 2007 p.1).
Para Meyer, apud Serafim (2007), o fato de um indivíduo apresentar
preferências por determinadas partes do corpo, objetos e acessórios, não representa
necessariamente uma parafilia e em muitos casos não há risco para condutas
sexuais criminosas. Segundo esse autor, para que este funcionamento preencha
critérios para uma parafilia deve-se considerar no seu portador os seguintes
aspectos:
a) Caráter opressor, com perda de liberdade de opções e alternativas. O
parafílico não consegue deixar de atuar dessa maneira;
b) Caráter rígido, significando que a excitação sexual só se consegue em
determinadas situações e circunstâncias estabelecidas pelo padrão de
conduta parafílica;
c) Caráter impulsivo, que se reflete na necessidade imperiosa de repetição da
experiência.
Os aspectos acima segundo afirma o autor, evidenciam a marcante presença
de um quadro compulsivo.
Os indivíduos que não dispõem de um parceiro consensual com quem
possam atuar suas fantasias, podem recorrer aos serviços de prostituição
ou atuar suas fantasias contra a vontade de suas vítimas. Os indivíduos
com uma parafilia podem escolher uma profissão ou desenvolver um
passatempo ou trabalho voluntário que os coloque em contato com o
estímulo desejado, por exemplo vender sapatos ou roupas íntimas
femininas [fetichismo], trabalhar com crianças [pedofilia], ou dirigir uma
ambulância [sadismo sexual]. Eles podem ver, ler, comprar ou colecionar
seletivamente fotografias, filmes e textos que enfocam seu tipo preferido de
estímulo parafílico (DSM-IV-TR, 2000, p. 496).
Segundo o DSM-IV-TR (2000), alguns indivíduos relatam que seu
comportamento parafílico não lhes causa sofrimento e que seu único problema
decorre da disfunção sexual resultante da reação de outras pessoas a seu
comportamento. Outros relatam extrema culpa, vergonha e depressão pela
necessidade de se envolverem em uma atividade sexual incomum que é
16
socialmente inaceitável ou que eles próprios consideram imoral. Existe o prejuízo
por não ter uma atividade sexual recíproca e afetuosa, podendo ocorrer distúrbios
sexuais. Distúrbios de personalidade também são freqüentes, podendo ser
suficientemente
severos
para
indicar
um
diagnóstico
de
Transtorno
de
Personalidade. Sintomas depressivos podem desenvolver-se em indivíduos com
parafilias, podendo acompanhar-se da freqüência e intensidade do comportamento
parafílico.
A prevalência das parafilias pelo exposto no DSM-IV-TR (2000), encontra
suporte no amplo mercado da pornografia e da indústria dos objetos parafílicos. Os
problemas apresentados com maior freqüência em clínicas especializadas no
tratamento de parafilias são: pedofilia, voyerismo e exibicionismo. O masoquismo
sexual e o sadismo sexual são vistos com uma freqüência muito menor.
Aproximadamente metade dos indivíduos com parafilias vistos em clínicas, são
casados.
Para se fazer o diagnóstico diferencial, deve-se considerar o uso não
patológico de fantasias sexuais, comportamentos ou objetos como estímulo para a
excitação sexual em indivíduos sem parafilia. Fantasias e objetos são parafílicos,
apenas quando levam à prejuízos e sofrimentos clinicamente significativos.
Para Kaplan (1993), definir a sexualidade normal é difícil e não é prática em
termos clínicos. Mais fácil seria definir a sexualidade anormal. No caso das parafilias
as fronteiras entre o normal e o patológico são bastante arbitrárias, uma vez que
entre o gostar e integrar determinada fantasia ou prática em meio à atividade sexual
geral, e o fixar-se de forma intensa a um padrão sexual exclusivo e potencialmente
lesivo para si e para os outros, nem sempre é fácil a discriminação.
Em casos de retardo mental, demência, alteração da personalidade devido
a uma condição médica geral, intoxicação com substância, episódio
maníaco ou esquizofrenia, pode haver redução do julgamento, habilidades
sociais ou controle de impulsos que, em casos raros leva a um
comportamento sexual incomum. Estes casos específicos podem ser
diferenciados de uma parafilia por serem atos isolados, quando não são o
padrão preferido ou obrigatório das práticas sexuais daquele indivíduo
(DSM-IV-TR, 2000, p. 497).
Pelo exposto no DSM-IV-TR (2000), o curso de alguns dos transtornos de
ordem sexual podem se iniciar na infância ou nos primeiros anos da adolescência,
mas tornam-se mais definidos e elaborados durante a adolescência e início da idade
17
adulta. A elaboração e a revisão das fantasias parafílicas podem continuar ao longo
de toda a vida do indivíduo. Há uma tendência à diminuição das fantasias com o
avanço da idade, porém os comportamentos poderão aumentar em resposta a
estressores psicossociais, em relação a outros transtornos mentais ou com o
aumento das oportunidades de envolvimento na parafilia.
Sendo assim, na parafilia os meios se transformam em fins e de maneira
repetitiva, configurando um padrão de conduta rígido no qual na maioria das vezes,
acaba por se transformar numa compulsão opressiva que impede outras atividades
sexuais, podendo causar prejuízos significativos para o indivíduo ou para os outros.
2.2
CLASSIFICAÇÃO NOSOLÓGICA DAS PARAFILIAS
O quadro abaixo demonstra a classificação nosológica dos transtornos de
ordem sexual, com base nas informações contidas no DSM-IV-TR (2000) e CID 10.
Segundo o DSM-IV-TR (2000), as parafilias são diferenciadas com base no foco
parafílico característico. Se as preferências sexuais de um indivíduo satisfizerem os
critérios para mais de uma parafilia, todas deverão ser diagnosticadas. Os códigos e
termos diagnósticos são os seguintes:
DSM-IV-TR (2000)
302.4 Exibicionismo,
OMS- CID-10 (1993)
F65.0 Fetichismo
302.81 Fetichismo,
F65.1 Transvestismo Fetichista,
302.89 Frotteurismo
302.2 Pedofilia
302.83 Masoquismo Sexual
302.84 Sadismo Sexual
F65.2 Exibicionismo
F65.3 Voyerismo
F65.4 Pedofilia
F65.5 Sadomasoquismo
F65.6 Transtornos Múltiplos de
Preferência Sexual
F65.8 Outros Transtornos de Preferência
Sexual
302.82 Voyerismo
302.3 Fetichismo Transvéstico
302.9 Parafilia Sem Outra Especificação
F65.9 Transtorno de Preferência Sexual
não Especificado.
Quadro 1 – Classificação Nosológica das Parafilias
18
Exibicionismo: O foco parafílico envolve a exposição dos genitais a
estranhos. O individuo pode se masturbar enquanto se expõe. Ao agir com o foco no
anseio de se exibir, não existe qualquer tentativa de uma atividade adicional com o
estranho. Em certos casos o individuo está com o objetivo de chocar o outro,
surpreendê-lo ou excitá-lo. O início acontece geralmente antes dos 18 anos de
idade, porém pode começar mais tarde. Poucos indivíduos de faixa etária mais
avançada são detidos, o que sugere uma condição menos severa após os 40 anos
de idade.
Fetichismo: Envolve o uso de objetos inanimados, chamados fetiches. Os
objetos de fetiche mais comuns são calcinhas, soutiens, meias, sapatos, botas ou
outras peças do vestuário feminino. O indivíduo com fetichismo se masturba
enquanto esfrega ou cheira o objeto do fetiche ou pode pedir que o parceiro use o
objeto em seus encontros. Os objetos em geral podem ser exigidos ou preferidos
para a excitação sexual, podendo os homens em sua ausência apresentar disfunção
erétil. Uma vez estabelecido, o fetichismo tende a ser crônico.
Frotteurismo: A excitação sexual está relacionada ao esfregar-se e tocar em
uma pessoa sem seu consentimento, ocorrendo em locais de grande concentração
de pessoas, como por exemplo, calçadas muito movimentadas ou veículos coletivos.
Geralmente a parafilia inicia-se na adolescência, sendo que a maior parte dos atos
referentes a esse transtorno ocorre quando a pessoa está entre 15 e 25 anos. Após
esta idade observa-se um declínio gradual dessa freqüência.
Pedofilia: Envolve a atividade sexual com criança pré-púbere, geralmente
com 13 anos de idade ou menos. Os indivíduos com pedofilia geralmente relatam
uma atração por crianças de uma determinada faixa etária. Alguns preferem
meninos, outros meninas, e outros possuem atração por ambos os sexos. Alguns
indivíduos sentem atração exclusivamente por crianças (tipo exclusivo), outros
sentem atração tanto para crianças quanto para adultos (tipo não-exclusivo).
Masoquismo Sexual: Possui o foco parafílico no ato real de ser humilhado,
espancado, atado, ou submetido a formas de sofrimento. Os atos masoquistas
podem ser buscados por conta própria, por exemplo, atando-se a si mesmo,
picando-se com alfinetes ou agulhas, auto-administrando choques elétricos
mutilando-se, ou com o envolvimento de um parceiro incluindo colocação de vendas,
palmadas, espancamento, açoitamento, choques elétricos, cortes, perfurações e
humilhação, como por exemplo, receber do parceiro sobre si a urina ou as fezes, ser
19
forçado a rastejar, latir como cão, ou ser submetido a abuso verbal. O transvestismo
forçado pode ser usado como forma de humilhação, o indivíduo pode ter o desejo de
ser tratado como bebê indefeso e usar fraldas, (infantilismo). Há ainda uma forma
perigosa de masoquismo sexual chamada “hipoxifilia”, que envolve a excitação
sexual pela privação de oxigênio obtida por meio de compressão toráxica, ataduras
ou sufocação com saco plástico. O masoquismo sexual geralmente é crônico, com
tendência de repetição do mesmo ato por muitos anos. Outros aumentam
gradativamente seus atos, podendo causar ferimentos ou até mesmo a morte.
Sadismo Sexual: O indivíduo se excita com o sofrimento físico ou psicológico
da vítima. Neste caso a fantasia envolve o completo controle sobre sua vítima.
Outros atuam com consentimento de seu parceiro em sofrer dor ou humilhação.
Nestes casos o sádico pode atar, vendar, dar palmadas, espancar, chicotear,
beliscar, bater, queimar, administrar choques elétricos, estuprar, cortar, esfaquear,
torturar, mutilar ou matar a vítima. O sadismo sexual geralmente é crônico e
geralmente a gravidade dos atos sádicos aumenta com o passar dos anos.
Fetichismo Transvéstico: O foco parafílico do fetichismo transvéstico
envolve vestir-se com roupas do sexo oposto. Geralmente, o homem com esta
parafilia mantém uma coleção de roupas femininas, que usa intermitentemente. O
indivíduo se masturba enquanto usa roupas femininas imaginando-se tanto como
sujeito masculino quanto como objeto feminino de sua fantasia. Este transtorno tem
sido descrito apenas em homens heterossexuais. Este transtorno porém, não é
descrito quando o vestir-se com roupas do sexo oposto ocorre exclusivamente
durante o curso de um transtorno de identidade de gênero. Alguns homens usam
apenas uma peça do vestuário feminino como cinta liga sob suas roupas
masculinas, outros usam inteiramente suas roupas e usam maquiagem.
Voyeurismo: Ato que envolve a observação de indivíduos, geralmente
estranhos, sem que estes suspeitem que estejam sendo observados. O ato de
observar tem a finalidade de excitação sexual, e geralmente não há a tentativa do
estabelecimento de contato sexual com o observado. O orgasmo, através da
masturbação, pode acontecer durante a observação ou mais tarde, em resposta à
lembrança do momento observado. Em sua forma severa, o ato de observar
constitui uma forma exclusiva da atividade sexual. O curso tende a ser crônico.
Estudar as Parafilias é importante para conhecer as variantes da sexualidade
e do erotismo em suas diversas formas de estimulação e expressão. Estabelecer um
20
banco de dados que classifique todas as parafilias tem se tornado muito difícil
devido à crescente variabilidade percebida no que se refere às práticas sexuais.
Muitas “fantasias” podem passar à ordem de parafilias, dependendo do grau de
dependência e recorrência de tais práticas. Por outro lado, conceituar a sexualidade
normal, tem-se tornado também muito difícil, pois o que é considerado normal em
uma cultura pode não ser em outra.
21
3 CARACTERIZAÇÃO E CONTEXTO HISTÓRICO DA PARAFILIA DO TIPO
PEDOFILIA
3.1
CARACTERIZAÇÃO DA PARAFILIA DO TIPO PEDOFILIA
Segundo Verhoeven (2007), o termo “pedofilia” nas suas origens designava o
amor de um adulto pelas crianças (do grego antigo paidophilos: pais = criança e
phileo = amar). No entanto, a palavra tomou um outro sentido sendo designada para
caracterizar uma parafilia, qual seja a pedofilia, uma atração sexual preferencial de
adultos para crianças em idade pré-puberal, ou seja, crianças que ainda não
adquiriram os caracteres sexuais secundários.
É importante ressaltar que caracteres sexuais secundários são as alterações
na forma do corpo, acompanhadas pela maturação sexual. Nas meninas estas
características são evidenciadas principalmente no crescimento dos pêlos pubianos,
mamilos e com a primeira menstruação (menarca). Nos meninos verificam-se os
caracteres sexuais secundários no crescimento dos pêlos pubianos e axilares,
aparecimento da barda, engrossamento da voz, aumento dos testículos e do pênis e
com a primeira ejaculação. Desta forma, a atração segundo afirma Duque (2000),
está focada na criança como objeto do desejo do pedófilo e não no interesse por
uma relação consensual e de troca.
A pedofilia segundo a Classificação Internacional de Doenças, CID 10 (1983),
caracteriza-se pela preferência sexual por crianças, quer se tratem de meninos,
meninas ou de crianças de um ou do outro sexo, geralmente pré-púberes.
O DSM-IV-TR (2000), conceitua pedofilia como uma desordem psicológica,
qual seja a preferência sexual por crianças pré-púberes e o indivíduo com o
transtorno pedofílico deve preencher os critérios diagnósticos para 302.2, pedofilia,
abaixo relacionados:
a) Ao longo de um período mínimo de 6 meses, fantasias sexualmente
excitantes recorrentes e intensas, impulsos sexuais ou comportamentos
envolvendo atividade sexual com uma (ou mais de uma) criança pré-púbere
(geralmente com 13 anos ou menos).
22
b) As fantasias, impulsos sexuais ou comportamentos causam sofrimento
clinicamente significativo ou prejuízo do funcionamento social ou ocupacional
ou em outras áreas importantes da vida do indivíduo.
c) O indivíduo tem no mínimo 16 anos e é pelo menos 5 anos mais velho que a
criança ou crianças no Critério A.
Especificar se:
Atração Sexual por Homens;
Atração Sexual por Mulheres;
Atração Sexual por Ambos os Sexos.
Especificar se:
Limitada ao Incesto
Especificar tipo:
Tipo Exclusivo (atração sexual apenas por crianças)
Tipo Não-Exclusivo (atração sexual por crianças e adultos)
A pedofilia para Dalgalarrondo (2000), é dentre todas as parafilias umas das
mais freqüentes e perturbadoras do ponto de vista humano. Caracteriza-se pela
freqüência em realizar, ativamente ou na fantasia, práticas sexuais com crianças.
Pode ser homossexual (pederastia) ou heterossexual (pedofilia propriamente dita),
ocorrendo no interior da família e conhecidos ou entre estranhos. A pedofilia pode
incluir apenas o brincar jogos sexuais com a criança (observar ou despir a criança
ou despir-se na frente dela), a masturbação ou a relação sexual completa
(geralmente o estupro).
Segundo Kaplan (1993), a vasta maioria das molestações de crianças envolve
carícias genitais e sexo oral. A penetração vaginal ou anal da criança é uma
ocorrência infreqüente, exceto nos casos de incesto. O autor ressalta ainda que 95%
dos pedófilos são heterossexuais e 50% consumiram álcool em excesso por ocasião
do incidente. Além da pedofilia, um número significativo de pedófilos encontra-se
concomitantemente envolvido, ou já esteve, com exibicionismo, voyerismo ou
estupro. O incesto, de acordo com o autor, está superficialmente relacionado com a
pedofilia, pela freqüente seleção de uma criança imatura como objeto sexual, pelo
componente sutil ou declarado de coerção e, ocasionalmente, pela natureza
preferencial da ligação adulto-criança.
23
Pelo exposto por Dietz et al apud Serafim (2007), a dificuldade no controle
desta compulsão se apresenta como o fator de maior vulnerabilidade para a
ocorrência de condutas criminosas com abrangência médico-legal. De acordo com
Campbell (1995) apud Serafim (2007), outros fatores como nível alto de
testosterona, incapacidade em manter relação conjugal estável, traumatismo crânio
encefálico, retardo mental, psicoses, abuso de álcool e substâncias psicoativas,
reincidência de crimes e transtornos da personalidade, representam também um
escopo de vulnerabilidade para as condutas sexuais criminosas.
Entre os casos legalmente identificados de parafilias, a pedofilia é, de longe,
a mais comum de todas. Dez a 20% de todas as crianças já foram
molestadas, ao atingirem 18 anos. Uma vez que a criança é objeto, o ato é
considerado com maior seriedade, e um maior esforço é realizado para
localizar o culpado do que em outras parafilias (KAPLAN, 1993, p. 470).
De acordo com Verhoeven (2007), os impulsos sexuais direcionados às
crianças são vistos de um modo geral como degradantes, imorais e assim
inaceitáveis pela maioria das pessoas, embora existam grupos ativistas própedofilia, os quais defendem a tese polêmica de que a pedofilia não seria uma
doença ou um desvio sexual, mas sim uma orientação sexual específica, tanto
quanto a homossexualidade ou a heterossexualidade e desejam o reconhecimento
da sociedade neste ponto. Sua pretensão não encontra apoio na comunidade
científica, que condena também as tentativas de "neutralização" dos crimes
praticados por pedófilos.
Segundo Verhoeven (2007), em seu artigo “Um Olhar Crítico Sobre o Ativismo
Pedófilo”, publicado na Revista da Faculdade de Direito de Campos, existem na
atualidade várias dessas organizações ativistas sendo uma delas a NAMBLA,
www.nambla.org, The North American Man/Boy Love Association, baseada nas
cidades de Nova York e São Francisco nos Estados Unidos, que defende
veementemente a legalização da relação sexual entre homens e meninos, sob o
argumento de que as minorias possuem o direito de livremente explorar a
sexualidade.
Em uma investigação da Polícia Federal dos Estados Unidos, Bureau of
Investigation (FBI), foi constatada a existência até 1995 de 1.100 membros somente
na assossiação NAMBLA, acima citada. Segundo a autora, a grande meta das
organizações a favor da pedofilia é acabar com a opressão sobre o relacionamento
24
entre homens e meninos que livremente consintam nessa direção. Estas
organizações clamam também pela adoção de leis que protejam tanto as crianças
que não repudiam determinada relação sexual, quanto à liberdade daquelas que
propõem exercer sua própria sexualidade.
Dentre outras organizações pró-pedofilia, destacam-se também a MARTINJ,
www.martinj.org, associação fundada na Holanda em 1982, a RENE GUYON
SOCIETY com sede na Califórnia, a AMBLA, que não possui mais endereço
eletrônico, a AG-PAEDO, organização expressiva de ativistas pedófilos alemães, os
quais realizam dois encontros anuais, posuem publicações de interesse da
comunidade pedófila e dão suporte para condenados por prática de pedofilia. A
COALITION PÉDOPHILE QUEBECOIS é uma organização que era considerada
extinta, porém sinais atuais indicam a sobrevivência dessa comunidade pedófila no
Canadá e ainda a DANISH PAEDOPHILE ASSOCIATION (DPA), uma comunidade
de ativismo pedófilo situada na Dinamarca, sem muitos dados sobre este grupo de
acordo com a autora.
Em Felipe (2006), percebe-se que um dos aspectos mais preocupantes e que
tem merecido atenção especial do poder público e de várias entidades civis em
defesa da criança e do adolescente, diz respeito à prática da pedofilia,
especialmente aquela cometida através da internet, uma vez que envolve a
produção de material pornográfico utilizando imagens de crianças muitas vezes
submetidas a toda sorte de violência sexual. O Brasil, segundo a pesquisadora
supracitada, ocupa o 4º lugar no ranking de material pornográfico, com pelo menos
1.210 endereços na internet. Um dos nichos desse mercado está na pornografia
infantil, com intuito de abastecer o mercado da pedofilia.
Esta rede como afirma Felipe (2006), se organiza internacionalmente e o
Brasil de acordo com alguns especialistas presentes na Terceira Jornada Estadual
contra a Violência e a Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes, ocorrida em
Porto Alegre em 2005, precisa tratar a questão da pedofilia como uma rede
internacional que envolve o crime organizado, utilizando-se do tráfico de crianças.
Tal rede segundo a autora é composta por “angariadores”, que são pagos para
seqüestrarem crianças com o intuito de utilizá-las em filmagens obscenas.
Os angariadores freqüentam os lugares onde existem crianças como parques,
praças e escolas. Depois de encontrar crianças com as características solicitadas
pela rede de pedofilia, elas são seqüestradas e em seguida são entregues aos
25
chamados “monitores”. Geralmente a criança é levada a um cativeiro, onde são
realizadas as filmagens envolvendo todo o tipo de violência sexual. Logo após é
assassinada.
Os
sites
colocam
simultaneamente
no
ar
as
imagens
de
violência/abuso sexual ao vivo para o deleite dos pedófilos, que pagam elevadas
taxas para ter acesso a tais cenas. A autora ressalta ainda que outro ponto
importante desse negócio refere-se aos lucros obtidos. Quanto mais nova a criança
mais caras são as imagens. Há registros de imagens feitas com bebês de 4 meses e
crianças de 2 anos.
Para caracterizar a parafilia do tipo pedofilia, torna-se necessário também
definir onde termina a infância e começa a adolescência. As fronteiras exatas entre a
infância e a adolescência podem variar e são difíceis de serem definidas em termos
rígidos de idade.
A Organização Mundial da Saúde, OMS, (1989), define adolescência como o
período da vida entre 10 e 19 anos de idade. Já no Brasil, a definição legal de
adolescência é de pessoa entre os 12 e os 18 anos de idade, conforme o Código
Civil Lei nº 8.069/90, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Considerando os
aspectos acima evidenciados, convém ressaltar que a pedofilia não pode ser levada
a um caráter generalista ao incluírem-se no mote de pedófilos, aqueles indivíduos
que molestam jovens no início da puberdade ou em pleno desenvolvimento de seus
caracteres sexuais secundários, os adolescentes. Esta confusão por vezes é
percebida junto a alguns órgãos da imprensa, ao noticiarem casos de molestadores
de adolescentes como “caso de pedofilia”.
A prática sexual por homens e menores com faixa etária entre 10 e 16 anos
recebe o nome de hebefilia. Os hebefílicos são indivíduos com
características de violadores, com distúrbio de juízo, amiúde incluídos nos
padrões psiquiátricos esquizo-adaptativos (CROCE,1995, p. 592).
Para Croce (1995), a hebefilia é também conhecida como efebofilia do grego
"ephebos", ou seja, pessoa jovem pós-pubescente, ou "hebe" que significa juventude
mais "philia", sendo definida pelo autor como a prática sexual por homens e menores
com faixa etária entre 10 e 16 anos. Já para Correia (2003), há distinção entre
hebefilia e efebofilia. O autor utiliza o termo efebofilia para designar a atração de
adultos por adolescentes pós-púberes (de 13 a 17 anos) e hebefilia para descrever a
atração adulta por adolescentes que já atingiram a puberdade (de 9 a 13 anos).
26
Deve-se ressaltar também que além de se confundirem pedófilos com
hebefílicos e/ou efebófilos, percebe-se nos noticiários de um modo geral, o anúncio
dos casos de pedofilia como crimes de pedofilia. A pedofilia não é o crime. Pedofilia
é o transtorno, ou seja, não existe crime de pedofilia. O pedófilo nem sempre passa
ao ato, sendo assim nem todo pedófilo é criminoso. O indivíduo que possui
preferência sexual por criança e passa ao ato, comete os crimes de estupro,
atentado violento ao pudor agravados pela presunção de violência, e não o crime de
pedofilia como muitas vezes é anunciado.
Um dos desafios de se lidar com parafilias ou crimes delas derivados é
abster-se de julgamento moral, especialmente no que se refere à pedofilia. Portanto,
estabelecer uma distinção entre o pedófilo como um indivíduo possuidor de um
transtorno de ordem sexual visto do ponto de vista clínico e aquele que é repudiado
pela sociedade de um modo geral pelo seu “caráter desviante”, torna-se difícil porém
necessário para que o transtorno seja entendido como um fenômeno psicológico
merecedor de amplitude em sua discussão, notadamente no campo da pesquisa
científica, comprometida com a busca de explicação e solução para o mesmo,
através dos possíveis tratamentos.
3.2
CONTEXTO HISTÓRICO DA PARAFILIA DO TIPO PEDOFILIA
De acordo com a palestra “Pedofilia”, proferida em 03/09/2002, no evento
“AMAZÔNIA 2002”, realizado em Manaus – AM, promovida pela Federação
Internacional de Advogadas – FIDA, extraída do site www.stj.gov.br/Discursos em 17
de fevereiro às 22:23 hs., o contexto histórico da parafilia do tipo pedofilia encontra
no antigo Egito relatos de envolvimento entre faraós e infantes, submetidos aos
caprichos sexuais dos poderosos. Na Grécia antiga, cabia ao chefe da família
conduzir os jovens à iniciação sexual, desenvolvendo-se a partir daí o hábito da
homossexualidade e da pedofilia.
De acordo com dados da referida palestra, a sociedade romana colocou o
pater familias (pai), no comando absoluto da família abrangendo a todos,
responsabilizando-se inclusive pela iniciação sexual do filius (filhos). A prática do
sexo entre o pater familias e o filius estava inteiramente fora do controle do Estado,
27
pois tinha o primeiro, poder de vida e de morte sobre o segundo, agindo como
verdadeiro dominus, (leia-se domínio ou dominador). Assim estava escrito na Lei
das XII Tábuas (450-451 a. C.), reconhecimento que vigorou até Constantino no ano
de 337 d. C.
A história do mundo árabe e do mundo oriental, de acordo com a palestra
acima mencionada, também registra a prática de sexo entre adultos e crianças em
diversas passagens. Basta lembrar a história dos samurais com suas jovens
amantes, mantendo-as como tal até a idade adulta quando lhes era permitida a
emancipação.
Na Idade Média inicia-se na Europa um intenso combate à sodomia, que
dentre suas variações inclui o gosto pela prática sexual com crianças. Por esse
período a prática passou a ser velada e silenciosa, num mundo de dominação onde
os mais fortes subjugavam os mais fracos. Não se sabe a real extensão de tais
abusos, senão por retalhos da história da prostituição infantil já na era da revolução
industrial e pelos contos românticos e sodômicos que a literatura difundiu.
Segundo a pesquisa de Jório (2002), Considerações Teóricas e Práticas
Psicoterapêuticas: Perversão Sexual – Pedofilia, Aixa, uma das mulheres de
Maomé, era uma menina de 8 anos quando teve sua primeira relação sexual com
seu marido que tinha na época 53 anos. O rei David, (aquele que lutou contra
Golias), já era ancião quando fez de Abisag sua esposa, décadas mais nova que
ele.
Ainda segundo o autor acima citado, na Índia antiga, na costa do Nayar, as
práticas sexuais com meninas eram estimuladas antes da primeira menstruação
acontecer. O romance “Lolita” de Vladimir Nabocov, escandalizou a sociedade da
época, pois contava uma (es) história de paixão entre um homem maduro e uma
ninfeta de 12 anos, que na realidade não poderia ser um caso de pedofilia, pois ela
já havia adquirido seus caracteres sexuais secundários, posto que numa passagem
do livro ele a deixa no carro e vai até uma farmácia comprar absorventes para a
Lolita.
Para melhor exemplificar casos como esses, serão apresentados nos anexos
casos ilustrativos do trabalho desse autor. O escritor francês Marquês de Sade, que
viveu na tumultuada França do século XVIII, escandalizou a todos com seus poemas
eróticos. Em suas obras sobre perversidades e prazeres sexuais ligados à violência,
28
(daí a origem do termo sadismo), existem também relatos do envolvimento de
crianças nestas práticas.
No século passado no Brasil, era comum o consentimento de pais para
casamento de suas filhas a partir dos 12 anos de idade. Tais concessões ganharam
um novo enfoque a partir de pesquisas que passaram a determinar a maturidade
sexual e psicológica para práticas sexuais envolvendo crianças e jovens, além de
estudos que buscaram criminalizar tais práticas por entendê-las como agressões ao
corpo e danosas ao processo de desenvolvimento humano, podendo deixar
seqüelas que repercutirão negativamente na vida do indivíduo abusado.
Por muito tempo os desvios de comportamento ligados ao sexo tiveram
somente a conotação de imoralidade. Para Felipe (2006), a partir do século XVIII
importantes transformações ocorreram de modo a afetar as concepções de infância,
bem como sua educação. As crianças passaram a ser percebidas como sujeitos
instituídos de uma “natureza infantil”, possuidoras de características específicas
próprias para a idade.
Esses relatos históricos de culturas antigas evidenciam que o relacionamento
sexual com infantes e entre pessoas do mesmo sexo vem sendo praticado pelos
mais variados povos e em períodos diferentes da história, com tolerância ou mesmo
admiração, dependendo do contexto de cada época. Essas relações podiam ser
conectadas com cerimônias de iniciação sexual, magia, crença e medicina.
Apenas no século XIX é que os desvios sexuais tornaram-se tema da
medicina, da psicologia e das outras ciências. O primeiro a tratar do assunto como
problema médico foi o psiquiatra alemão Richard Von Krafft Ebing (1886/1970) na
obra intitulada Psychopathia Sexualis, que serviu de base para vários estudos
relacionados ao assunto, inclusive para Freud, que em sua obra Três Ensaios Sobre
a Teoria da Sexualidade (1980), procura a compreensão dinâmica do desvio sexual.
Podemos assim concluir que relatos de pedofilia embora sejam antigos,
encontram na atualidade uma prática persistente que se apresenta danosa,
marcando negativamente a vida de crianças e adolescentes.
Percebe-se também que questões sociais como a pobreza tende a aumentar
a prostituição infantil, notadamente em países subdesenvolvidos, fato que expõe a
fragilidade da criança e facilita assim a ação de abusadores, muitos deles pedófilos.
Segundo Pozzebom (2009), a democratização dos meios de comunicação no
caso a internet, considerada o “paraíso” dos pedófilos, permanece sem eficazes
29
modos de controle, onde nela podem desenvolver-se as redes de pedofilia, sendo o
Brasil um dos países que mais usa a Rede Mundial de Computadores para produzir
e distribuir a pornografia infantil, como declara o Senador Magno Malta, relator da
Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Pedofilia, CPI da Pedofilia. A legislação
brasileira ainda caminha no sentido de tipificar os crimes sexuais cometidos por
pedófilos, embora avanços significativos vêem acontecendo.
30
4 PEDOFILIA ENQUANTO TRANSTORNO E CRIME
4.1
PEDOFILIA ENQUANTO TRANSTORNO
Nem todo pedófilo é criminoso e nem todo criminoso que abusa
sexualmente de crianças é pedófilo. Estas são duas afirmações importantes,
com as quais pretende-se responder à questão suscitada no presente trabalho
de pesquisa bibliográfica, qual seja fazer a distinção entre o abusador
preferencial e o oportuno.
A pedofilia se enquadra dentro dos transtornos parafílicos e não requer, e
usualmente não envolve um ato criminoso, visto que o portador de pedofilia
pode manter seus desejos em segredo durante toda a vida sem nunca
compartilhá-los ou torná-los atos reais. Pode casar-se com mulheres que
tem filhos ou praticar profissões que os mantenham com fácil acesso à
crianças, mas raramente causam algum mal (SERAFIM, 2007, p. 3).
Usar o termo pedofilia para descrever indivíduos que cometeram crimes
sexuais contra crianças, é considerado por alguns autores como errôneo,
principalmente se tais criminosos são vistos do ponto de vista clínico. Serafim
(2007), afirma que a maioria dos crimes sexuais envolvendo crianças são praticados
por pessoas que não são clinicamente diagnosticadas como pedófilos, mas realizam
tais atos por diversos outros motivos. Estes são chamados criminosos sexuais
situacionais, por não sentirem atração primária por crianças.
Para Holmes e Holmes apud Serafim (2007), estima-se que apenas 2% a
10% das pessoas que cometeram crimes de natureza sexual contra crianças sejam
realmente pedófilos. Tais criminosos são chamados de pedófilos estruturados,
fixados ou preferenciais. Abusadores que não atendem aos critérios regulares de
diagnóstico da pedofilia são chamados de abusadores oportunos, regressivos ou
situacionais.
Conforme se observa em Serafim (2007), o tipo mais comum de pedófilo é o
indivíduo imaturo. Este, em algum ponto da vida descobre que obtém com crianças
níveis de satisfação sexual que não são possíveis de se alcançar de outro modo.
31
Trata-se de um perfil solitário, onde a falta de habilidade social acaba levando-o a
mergulhos cada vez mais profundos e fantasiosos na pedofilia.
Os autores Holmes e Holmes apud Serafim (2007), dividem os molestadores
de crianças em dois grupos distintos: situacionais e preferenciais. Os molestadores
situacionais segundo afirmam os autores, possuem inteligência inferior, baixa classe
econômica, transtornos de personalidade do tipo antisocial / psicopática, narcisista,
esquizóide, comportamento criminal variado, possuem preferência por pornografia
violenta, são impulsivos, consideram riscos, cometem erros por negligência, são
orientados intelectualmente, molestam espontaneamente ou planejam, utilizam a
disponibilidade de suas vítimas, a oportunidade, ferramentas, comportam-se pelo
aprendizado e possuem padrões de comportamento voltados para a praticidade e
flexibilidade. (ver anexo C)
Já os molestadores preferenciais possuem características bastante distintas
dos situacionais tais como: Inteligência superior, alta classe socioeconômica,
parafilias do tipo pedofilia, voyerismo, sadismo, comportamento criminal focado,
pornografia temática, compulsivos, consideram necessidade e assim cometem erros
pela necessidade, são orientados pela fantasia, são auditivos, repetitivos, utilizam
acessórios, são críticos e rígidos. (ver anexo C)
Para Bradford apud Serafim (2007), existe um caminho da fantasia ao ato
sexual violento, sendo que o processo de fantasia do agressor sexual se configura
em disparador para a violência extrema. As fantasias, de acordo com o autor,
gradativamente vão se transformando em pensamentos cada vez mais fixos,
chegando a um quadro de obsessões.
As obsessões se constituem em idéias, pensamentos, imagens ou desejos
persistentes e recorrentes, involuntários, que invadem a consciência. No
caso dos pedófilos e molestadores, a maioria deles não percebem ou se
preocupam que estas venham a se transformar em uma conduta
problemática (BRADFORD, 2001, apud SERAFIM, 2007, p. 5).
O autor Serafim (2007), ressalta que de acordo com sua experiência como
pesquisador no Núcleo de Estudos e Pesquisas em Psiquiatria Forense e Psicologia
do Instituto de Pesquisas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina –
Universidade de São Paulo (NUFOR), seja no âmbito pericial ou nas vivências de
pesquisas com esses criminosos, também observa-se uma estrutura obsessiva e
compulsiva, bem distinta do quadro de TOC. Nestes sujeitos não se observa
32
arrependimento ou culpa, comumente observados nos pacientes com TOC,
entretanto, o padrão de comportamento deles segue um ritual com hierarquias de
ações que são seguidas rigidamente.
De acordo com o autor, durante algumas entrevistas com este tipo de
criminoso, observou-se que se algum fator interpelar esse ritual, estes indivíduos
tendem a interromper a ação, sendo a vítima preservada. O mesmo autor afirma
ainda que a violência contra as pessoas por motivos sexuais constitui uma parte
importante de todos os delitos sérios, visto que podem chegar às formas mais
desumanas de assassinato.
Depois de encontrar crianças com as características solicitadas pela rede
de pedofilia, elas são seqüestradas e em seguida são entregues aos
chamados “monitores”. Geralmente a criança é levada a um cativeiro, onde
são realizadas as filmagens envolvendo todo o tipo de violência sexual.
Logo após é assassinada (FELIPE, 2006, p. 211).
Pelo exposto por Felipe (2006) na citação acima, as vítimas de violência
sexual, no caso crianças, podem ser raptadas, submetidas a todo tipo de violência
sexual onde as cenas são vendidas à consumidores de pornografia infantil e em
seguida assassinadas. Porém, de acordo com Serafim (2007), o crime pode
acontecer também por prazer, sendo produto de extremo sadismo e a vítima pode
ser assassinada e mutilada com o propósito de provocar gratificação sexual ao
criminoso, sendo seu prazer adquirido pela violência e não pelo ato sexual.
Como vimos, a pedofilia enquanto transtorno pode assumir as mais variadas
formas de práticas que se diferenciam de acordo com as características individuais
da pessoa, indo desde simplesmente observar uma criança, até as mais violentas
formas de atividade sexual, podendo chegar ao assassinato.
Por outro lado se formos corretos com o conceito, a pedofilia apenas,
enquanto transtorno, observada do ponto de vista clínico não é crime. Nenhum
indivíduo pode ser apenado somente por ter um transtorno de ordem sexual, no
caso a pedofilia. Neste contexto, pedofilia é o termo designado para definir o
transtorno. Os atos praticados por pedófilos é que configuram o crime. Sendo assim,
algumas pessoas ao perceberem uma preferência sexual por crianças podem
procurar tratamento antes que os atos ocorram, podendo permanecer (em
tratamento e/ou com o transtorno) pelo resto de suas vidas. Portanto uma vez que
não passam ao ato não cometem crime.
33
4.2
PEDOFILIA ENQUANTO CRIME
A definição para crimes sexuais segundo Duque (2000) não é simples.
Podemos fazê-la considerando todos os atos delituosos que tenham o propósito de
satisfação sexual como o motivo. (enfoque motivacional)
Os crimes sexuais pelo Código Penal Brasileiro (2006), se enquadram nos
Crimes Contra os Costumes, dos artigos 213 a 224 e de 233 a 234, que incluem
estupro, atentado violento ao pudor, posse sexual mediante fraude, atentado ao
pudor mediante fraude, corrupção de menores, rapto violento ou mediante fraude,
rapto consensual e presunção de violência.
A partir de Duque (2000), percebe-se que há uma tendência em confundir
abuso sexual de menores de idade com pedofilia, por isso é importante caracterizar
o criminoso sexual. De acordo com este autor, o criminoso sexual pode ser
situacional ou preferencial.
O criminoso sexual situacional define-se por sujeito sem transtorno
psiquiátrico, em situações intensa e continuadamente estressantes, ou que lhes
confiram poder absoluto sobre o outro e podem ter dificuldade de controlar impulsos
que seriam mantidos adormecidos sem tais situações. É o caso de indivíduos
encarceirados, de pessoas sob stress intenso em situações de guerras, onde além
da tensão detém poder absoluto sobre os outros, ou de babás que por possuírem
domínio sobre crianças abusam sexualmente delas. Para o autor, na maioria dos
casos não há antecedentes nem persiste o comportamento criminoso após a
modificação ambiental.
Criminosos sexuais sem diagnóstico psiquiátrico – São, na maior parte dos
casos, situacionais, que, em circunstâncias especialmente propícias,
decidiram ou foram induzidos ao crime. É o caso das violências sexuais nos
presídios, na guerra e em situações de absoluto controle sobre a vítima,
como assaltos, seqüestros e torturas em prisão, etc (DUQUE, 2000, p. 304).
Define-se por criminoso sexual preferencial segundo Duque (2000), aquele
que de maneira preferencial e continuada, nas condições de vida habitual e
contando com a possibilidade de satisfação sexual, opta pelo comportamento
criminoso.
34
Criminosos sexuais parafílicos – Pessoas que tem no crime sexual a
satisfação última, preferencial e que preencham os critérios para o
diagnóstico de parafilia. Em relação à primeira parte da formulação do art.
26 do CP, referente ao elemento cognitivo, esses criminosos têm inteira
capacidade de entender o caráter ilícito do ato praticado, pois o transtorno
não lhes confere perturbação da consciência, distorção perceptiva ou do
juízo da realidade. O que, aliás, é demonstrado por fazerem às escondidas,
conscientes que são da ilegalidade e/ou da relação social no caso de
flagrante (DUQUE, 2000, p. 305).
Contudo, estabelecer um banco de dados confiável sobre a prevalência do
abuso de menores na população torna-se difícil. Para Duque (2000), estima-se que
10% das pessoas podem ter sido abusadas antes dos 18 anos, dentre elas cerca de
90% meninas, não raro dentro da própria família. Os dados estatísticos referem-se a
apenas os casos que geram procedimentos policiais e legais, sendo muitos casos
resolvidos em família, não denunciados ou tendo a conivência de pessoas próximas.
De acordo com o autor, dos casos atendidos pelo serviço de psicologia da
Vara Central da Infância e da Juventude do Tribunal de Justiça de São Paulo, entre
1990 e 1998, abrangendo todas as situações que demandassem intervenção
psicológica como guarda, tutela, destituição de pátrio poder, autorização para
viagem, etc., cerca de 17% se referiam à violência sexual doméstica. Destes, 90%
dos agressores exercendo a função paterna, sendo 65% pais biológicos.
Tendo como referência os dados acima, percebe-se a necessidade de
classificação do criminoso sexual, pelo motivo de não colocá-los no mesmo bojo, ou
seja, nem todo criminoso sexual que comete crimes sexuais contra crianças é
necessariamente pedófilo, pois como afirma o autor, podem estes serem criminosos
sexuais situacionais ou preferenciais. Vale ressaltar aqui que o molestador de
crianças, se situacional pode não ser pedófilo, mas pode ter indicativo para pedofilia.
Em Duque (2000), observa-se que nos estudos dos transtornos sexuais, um
diagnóstico não remete obrigatoriamente a uma conclusão médico-legal. Embora
existam linhas gerais, as diversas situações são bastante distintas e algumas
implicam inimputabilidade, outras não, outras semi-inimputabilidade. No caso da
pedofilia, os indivíduos que passam ao ato são de um modo geral considerados
imputáveis, ou seja, tem inteira capacidade de determinação do caráter ilícito do seu
ato, sendo portanto responsabilizados legalmente pelos seus crimes. Caso adverso,
considerado de inimputabilidade, são os crimes praticados por dementes e outros
doentes orgânicos cerebrais.
35
Estados demenciais de evolução lenta apresentavam, em fases em que o
déficit cognitivo ainda não é evidente, exacerbação da sexualidade e
redução da autocrítica. Tem sido relatados casos de pedofilia homossexual
de início tardio associado à hipersexualidade em pacientes com patologias
frontotemporais só identificadas pela tomografia (MENDEZ e COLS, 2000,
apud DUQUE, 2000, p. 307).
A lei brasileira não possui o tipo penal “pedofilia”, assim redireciona a prática
da pedofilia para os crimes contra os costumes. Desse modo, o indivíduo que abusa
sexualmente de crianças, seja pedófilo ou não, é enquadrado judicialmente nos
crimes de estupro, (artigo 213 do Código Penal) e atentado violento ao pudor, (artigo
214 do Código Penal), ambos com pena de seis a dez anos de reclusão e
considerados crimes hediondos, agravados pela presunção de violência, previsto no
artigo 224, “a”, do Código Penal Brasileiro.
Com a aprovação em 1989 da Convenção Internacional sobre os Direitos da
Criança pela Assembléia Geral das Nações Unidas, o combate à pedofilia passou a
ser objeto de interesse internacional e dever de todos os países, que ficam
expressamente obrigados a adotar medidas que protejam a infância e a
adolescência do abuso, ameaça ou lesão à sua integridade sexual. (artigo 19) Pelo
artigo 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), lei nº 8.069/90, “considerase criança, para os efeitos da lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos e
adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade”. O artigo 241 do ECA diz
ainda, que é crime apresentar, produzir, vender, fornecer, divulgar, ou publicar, por
qualquer meio de comunicação, inclusive na rede mundial de computadores
(internet), fotografias ou imagens com pornografia ou cenas de sexo explícito
envolvendo criança ou adolescente.
Em novembro de 2003 a abrangência da lei aumentou incluindo a divulgação
de links para endereços contendo pornografia infantil como crime de igual gravidade.
Percebe-se que mudanças recentes aconteceram no que se refere à punição para
criminosos sexuais, pois em Felipe (2006), afirmava-se que “embora é considerado
criminoso aquele que produz e distribui material pornográfico infantil, a legislação
brasileira não possui leis que punam quem os consome”. Nesse sentido a lei foi
modificada com a aprovação pelo Senado Federal em 11 de novembro de 2008 e
sanção pelo Presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva
em dezembro de 2008, aumentando a punição e abrangência de crimes
relacionados à pedofilia na internet. Além de aumentar a pena máxima para crimes
36
de pornografia infantil na Rede Mundial de Computadores de seis para oito anos, a
lei criminaliza a aquisição, posse e divulgação para venda de material pornográfico,
condutas que não estavam previstas na legislação brasileira, e que já estão vigentes
em outros países.
De acordo com Verhoeven (2007), foi aprovada em maio de 2009 pela
Comissão Parlamentar de Inquérito da Pedofilia do Senado Federal Brasileiro,
projeto de lei que tipifica o crime de pedofilia e estabelece pena de prisão de 16 a 30
anos para quem praticar violência sexual contra crianças e adolescentes, caso a
vítima venha a morrer. Além disso a proposta estabelece que o condenado não terá
direito à progressão de pena e ao regime semi-aberto ou aberto. A proposta ainda
caracteriza o crime de manipulação lasciva, que consiste em manipular a criança
nas partes genitais sem, entretanto, praticar o ato sexual. Nesse caso, o pedófilo
poderá ter até prisão preventiva solicitada e a pena será de dois a oito anos de
prisão, mais multa.
A venda de material pornográfico e a exploração sexual de crianças e
adolescentes também foi incluída na lista de crimes hediondos. O projeto de lei
ainda estabelece pena de dez a quatorze anos de prisão para o crime de estupro
contra criança e para quem cometer atentado violento contra criança. Para quem
praticar conjunção carnal ou ato libidinoso com adolescente em situação de
exploração sexual, de prostituição ou de abandono, a pena estabelecida pela
proposta varia de três a oito anos de prisão. A proposta ainda precisa passar pelas
comissões de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) e de Direitos Humanos e
Legislação Participativa (CDH), antes de ser votada em plenário. Se aprovado pelo
plenário do Senado, o projeto seguirá para tramitação na Câmara dos Deputados.
Atualmente em praticamente todo o mundo, há um forte movimento por parte
de organizações internacionais de proteção à criança, dentre elas a Organização
das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura, UNESCO, e instituições
não governamentais além de governos, no sentido de combater a violência sexual
contra crianças.
No Brasil ações têm sido desenvolvidas no combate à exploração e violência
sexual infantil, através da criação de programas e leis, campanhas de
conscientização, disque denúncia e estratégias de contenção do problema. Em
2001, foi criado e implantado o Serviço de Enfrentamento e Combate à Violência, ao
Abuso e à Exploração Sexual Infantil, o Programa Sentinela, com o objetivo prevenir
37
e combater todas as formas de violência, abuso sexual e a exploração sexual
comercial de crianças e adolescentes.
A partir de 2007, os Conselhos Estaduais da Criança e do Adolescente, com a
coordenação nacional da Secretaria Nacional dos Direitos Humanos, lançou uma
ampla campanha para coibir a prática de crimes contra menores, através de
denúncias anônimas pelo disque 100. Esse número serve não só para denunciar
abusos sexuais contra menores, mas para toda forma de violência contra os
infantes, porém as estatísticas indicam que as denúncias por abusos sexuais
configuram a maioria das ligações.
A Comissão Parlamentar de Inquérito sobre a Pedofilia, (CPI da Pedofilia), faz
parte de uma das estratégias de combate à exploração sexual infantil, criada em
março de 2008 por iniciativa do Senador Magno Malta, escolhido para presidi-la. O
primeiro avanço da CPI da Pedofilia foi a assinatura do Termo de Ajustamento de
Conduta (TAC), entre o Ministério Público Federal e a Google do Brasil,
mantenedora do site de relacionamentos Orkut. Pelo acordo a Google deve
encaminhar à Polícia Federal e ao Ministério Público Federal (MPF), dados sobre
suspeitos de abusar sexualmente de crianças. Segundo a CPI, foram entregues à
comissão no primeiro semestre de 2008 informações sobre 3.261 álbuns do Orkut,
permitindo a identificação de pelo menos 500 pedófilos.
Com base em informações da CPI da Pedofilia, desde 2006 o Orkut é o
campeão de ações do Ministério Público Federal de São Paulo no que se refere à
pornografia infantil. Em 2007, dos 355 novos procedimentos judiciais encabeçados
pela instituição nessa área, 287 eram referentes ao portal. Além das ações acima
relatadas, constam acordos fechados em dezembro de 2008 com as companhias
telefônicas OI TELEMAR , TIM e BRASIL TELECOM, em um termo de cooperação
que prevê maior rapidez no fornecimento de dados de usuários investigados, que
deverão ser fornecidos em até três dias, sendo este prazo reduzido para 24 horas
quando houver risco à vida de menores e para duas horas quando se configurar
risco iminente à menores de idade.
Segundo reportagem do Site Agência Brasil, o Brasil está liderando o
processo de combate à pedofilia. Esta é uma afirmação de Hartmut Richard Glaser,
professor de física da Universidade de São Paulo (USP) e diretor do Núcleo de
Informação e Coordenação do Ponto br, entidade civil que trabalha com segurança
de internet e tem ações voltadas contra a pedofilia na web. Segundo Glaser, o Brasil
38
foi o primeiro país a ter uma decisão judicial que abrisse o sigilo dos usuários da
rede de relacionamentos Orkut da empresa americana Google. "Representantes da
Argentina nos procuraram para saber como conseguimos vencer a Google nos
tribunais", disse Glaser.
Esforços tem acontecido tanto a nível nacional como internacional no sentido
de desenvolverem políticas que venham combater e coibir a exploração sexual de
menores. Todos os Estados da Federação Brasileira tem se comprometido na
operacionalização do Sistema Nacional de Combate à Exploração Sexual InfantoJuvenil. A mídia tem demonstrado notório interesse na informação de casos de
exploração sexual, em especial a pedofilia e a população demonstra indignação
diante dos casos denunciados. Apesar de todos os esforços no combate a este tipo
de crime, acabar com esta prática está longe de ser uma realidade, frente ao desafio
de compreensão da subjetividade humana.
39
5 POSSÍVEIS CAUSAS E SUGESTÕES TERAPÊUTICAS PARA O
TRATAMENTO DO TRANSTORNO PARAFÍLICO DO TIPO PEDOFILIA
5.1
POSSÍVEIS CAUSAS DO TRANSTORNO PARAFÍLICO DO TIPO
PEDOFILIA
As causas do comportamento pedófilo são desconhecidas. Diferentes estudos
tem sido realizados no sentido de definir relações causais deste tipo de
comportamento. Pensava-se que o histórico de abuso sexual na infância era um
fator importante para determinar a causa da pedofilia, porém pesquisas recentes não
encontraram relação causal, uma vez que a maioria dos infratores adultos relata não
terem sido vítimas de abusos sexuais na infância. Segundo Ferreira (2009), no site
www.recantodasletras.uol.com.br, O US Government Accountability Office, (GAO)
órgão de pesquisa, auditoria, avaliação e braço investigativo do Governo Norte
Americano, através de pesquisa realizada, concluiu que a existência de um ciclo de
abuso sexual não foi estabelecida.
A existência de número significativo de abusadores de crianças com história
de vitimização na infância difundiu a idéia do “ciclo vítima-agressor”, cuja
relação não é tão direta quanto possa parecer. Widon e Ames (1994),
estudando criminosos sexuais, não encontraram diferença estatística entre
o abuso sofrido ter sido sexual ou físico, aí incluído a negligência. Estes
autores sugerem que o trauma e o estresse relativos ao abuso ou à
resposta da sociedade ao fato possam ser mais importantes que a própria
experiência sexual do abuso (DUQUE, 2000,p. 303).
Já Looman apud Serafim (2007), ressalta que as possíveis causas destes
comportamentos estão associadas à história de abuso físico, sexual, exposição à
violência familiar durante a infância e uso de álcool e outras drogas durante a
adolescência.
Conforme se observa em Gattass (2009), na última década o estudo do
cérebro ganhou uma técnica de alta resolução espacial, capaz de produzir imagens
de cortes tomográficos do cérebro com resolução de até 50 mm. Esta técnica de
produção de imagens por ressonância magnética tem sido usada na clínica
radiológica para o estudo da estrutura neuroanatômica do encéfalo. Mais
40
recentemente, esta técnica evoluiu para mapear aspectos funcionais do cérebro,
mais especificamente, para mapear o pensamento.
A correlação de imagens por ressonância magnética durante a ação e o
repouso, permitiu o desenvolvimento da ressonância magnética funcional. A
atividade elétrica de conjuntos de neurônios que se expressam em pensamento,
produzem variações de propriedades magnéticas do tecido que podem ser
visualizadas pela ressonância magnética funcional. Estes tipos de exames do
cérebro,
seja
o
exame
da
estrutura
fisiológica
(ressonância
magnética
neuroanatômica), ou o exame do modo de funcionamento frente à estímulos
(ressonância magnética funcional), tem sido usados nos estudos que visam
entender tanto a estrutura quanto o modo de funcionamento do cérebro de pedófilos.
Pelo exposto por Ferreira (2009), recentes estudos empregando exploração
por ressonância magnética foram feitos na Universidade de YALE, localizada na
cidade de New Haven, estado de Connecticut, Estados Unidos, que mostraram
diferenças significativas na atividade cerebral dos pedófilos. O jornal Biological
Psychiatry de publicação da Universidade de Yale, Estados Unidos, declarou que
pela primeira vez foram encontradas provas concretas de diferenças na estrutura de
pensamento dos pedófilos.
O Centro de Vício e Saúde Mental de Toronto, Canadá, em estudo publicado
no Journal of Psychiatry Research, jornal de publicações científicas Norte
Americano, demonstrou que a pedofilia pode ser causada por ligações imperfeitas
no cérebro dos pedófilos. Os estudos indicaram que os pedófilos têm menos matéria
branca, que é a responsável por unir as diversas partes do cérebro entre si.
Os pesquisadores Cantor e Blanchard apud Gattas (2009), começaram a
relatar a partir de 2002, uma série de descobertas relacionando a pedofilia com a
estrutura e o funcionamento do cérebro. Segundo suas pesquisas, homens pedófilos
possuem QI mais baixo, pontuação mais baixa em testes de memória, maior
proporção de canhotos, taxas mais altas de repetência escolar em proporção com as
diferenças de QI, menor estatura, maior probabilidade de terem sofrido ferimentos
na cabeça acompanhados de perda de consciência, e várias diferenças em
estruturas cerebrais detectadas através de ressonância magnética nuclear (MRI, em
inglês).
Os pesquisadores relatam segundo o autor acima citado, que suas
descobertas sugerem a existência de uma ou mais características neurológicas
41
congênitas (presentes ao nascer) que causam ou aumentam a probabilidade de se
tornar um pedófilo. Os autores da referida pesquisa, concluem dizendo que
evidências de transmissão familiar sugerem mas não provam, que fatores genéticos
sejam responsáveis pelo desenvolvimento da pedofilia.
O autor Ferreira (2009), afirma que imagens de ressonância magnética
funcional (FMRI), tem mostrado que pessoas diagnosticadas com pedofilia que
abusaram de crianças, tem ativação reduzida do hipotálamo em comparação com
indivíduos não-pedófilos, ao serem expostos a fotos eróticas de adultos. Um estudo
de neuroimagem funcional de 2008 demonstra segundo o autor, que o
processamento
de
estímulos
sexuais
em
"pacientes
pedófilos
forenses"
heterossexuais, poderiam estar alterados por um distúrbio nas redes pré-frontais,
que podem estar associados a comportamentos controlados por estímulo, como os
comportamentos sexuais compulsivos.
As descobertas podem também sugerir uma disfunção no estágio cognitivo do
processamento da excitação sexual. Os pesquisadores Blanchard et al apud Ferreira
(2009), revisaram a pesquisa que tentou identificar diferenças hormonais em
pedófilos. Os autores concluíram que há de fato alguma evidência de que pedófilos
tem menos testosterona do que aqueles do grupo de controle, mas que a pesquisa é
pobre e que é difícil tirar proposições conclusivas a partir da mesma.
Ainda segundo Ferreira (2009), apesar de não poderem ser apontadas como
causas da pedofilia, diagnósticos psiquiátricos adicionais como distúrbios da
personalidade e abuso de substâncias, são fatores de risco para a concretização
dos impulsos pedófilos.
A respeito do nexo-causal pedofilia / estados psiquiátricos adicionais,
Blanchard et al apud Ferreira (2009), notaram que as implicações teóricas não são
tão claras, pois podem ser os genes específicos ou fatores nocivos no ambiente prénatal que predispõem um homem a desenvolver distúrbios afetivos e pedofilia, ou a
frustração e isolamento causados pelos desejos sexuais socialmente inaceitáveis.
Ou a sua ocasional satisfação é que levam à ansiedade e ao desespero? Os autores
indicaram também, que por terem constatado anteriormente em outras pesquisas
que mães de pedófilos tem maior probabilidade de terem passado por tratamento
psiquiátrico, a hipótese genética é uma das probabilidades da causa do
comportamento pedófilo.
42
Segundo considerações de Kaplan (1993), no modelo psicanalítico, um
parafílico é uma pessoa que não completou o processo evolutivo normal até o
ajustamento heterossexual. O que diferencia uma parafilia de outra é o método
escolhido pela pessoa (geralmente homem) para lidar com a ansiedade causada
pela ameaça da castração pelo pai e da separação da mãe. Não importando quão
bizarra seja sua manifestação, a perversão resultante oferece um escape para os
impulsos sexuais e agressivos que, de outra forma, seriam canalizados em um
comportamento adequado ao gênero. Na estrutura edipiana o filho esta fora da cena
do sexo dos pais. Na explicação psicanalítica, o comportamento pedófilo está
atrelado à imaturidade sexual do parafílico, na medida em que não são as próprias
crianças que escolhem tais práticas e sim o adulto que ficou “congelado” em um
determinado período de desenvolvimento da sua sexualidade infantil.
Tanto os pedófilos quanto os sádicos sexuais têm necessidade de dominar
e controlar suas vítimas, como que para compensar seus sentimentos de
impotência durante a crise edipiana. Alguns teóricos acreditam que a
escolha de uma criança como objeto de amor, por um pedófilo, seria uma
escolha narcisista (KAPLAN,1993, p. 470).
Percebe-se portanto, que o estudo das possíveis causas para o transtorno
parafílico do tipo pedofilia tem sido empregado de diversas formas, porém resultados
significativos que definam a causa ou causas para o transtorno ainda não foram
evidenciados com clareza, necessitando ainda de continuada atenção por parte dos
pesquisadores.
5.2
SUGESTÕES TERAPÊUTICAS PARA O TRANSTORNO PARAFÍLICO DO
TIPO PEDOFILIA
Conforme afirma Duque (2000), a combinação de psicoterapia individual com
o uso de medicamento redutor de testosterona e acompanhamento por profissionais
especializados em readaptação social, tem mostrado maior eficácia na redução de
crimes sexuais. Segundo o autor, comparar os resultados obtidos a partir de
diferentes correntes psicoterápicas torna-se difícil, devido às características de cada
tratamento. Os resultados da psicanálise por exemplo, tem se mostrado impossíveis
43
de se quantificar e tratar estatisticamente. As terapias cognitivo-comportamentais
pelo seu formato (duração, formação do terapeuta etc.) prestam-se mais a este tipo
de revisão.
Em trabalho de revisão de 7.275 criminosos sexuais durante 25 anos,
Maletzky e Steinhauser apud Duque (2000), concluíram que programas de longa
duração com terapia de orientação cognitivo-comportamental produzem resultados
positivos na redução do recidivismo e do risco para a continuidade. Os autores
ressaltam que os resultados foram melhores nos criminosos situacionais, como
abusadores de crianças e exibicionistas, que entre os preferenciais.
Quanto às drogas antiandrogênicas, Duque (2000) observa que as mais
usadas são o acetato de medroxiprogesterona (Depo-Provera), o acetato de
ciproterona, e a triptorelina, cada uma delas com vantagens e também efeitos
colaterais. Convém ressaltar que a lei Brasileira não permite o uso de
antiandrógenos (redutores de testosterona). O uso desses medicamentos varia de
acordo com a legislação de cada país.
Grupos de pacientes que usaram continuadamente a droga associada à
psicoterapia têm mostrado menor índice de reincidência em relação àqueles
que mesmo com aderência ao programa de controle, se recusaram ao uso
da assim chamada “castração química”, permanecendo com psicoterapia e
programas reeducacionais. Quando se suspendeu a droga, os índices de
reincidência aproximaram-se (DUQUE, 2000, p. 312).
O autor afirma ainda que estes estudos devem ser encarados com reservas,
pois as amostras são demasiadamente heterogêneas e viciadas por constar apenas
de indivíduos com implicações legais, portanto selecionados pela “justiça”. Além
disso, a recusa do medicamento pode indicar uma diferença de postura em relação
ao transtorno, o que seria suficiente para alterar o prognóstico. Essas drogas
segundo Duque (2000), não tem efeito específico sobre as parafilias ou atividade
criminosa,
mas
sobre
o
desejo
sexual,
advindo
daí
a
modificação
de
comportamento.
Outro tipo de tratamento é segundo o autor, a associação de acetato de
ciproterona com sertralina, ou seja, a combinação de antipsicótico com
antidepressivo respectivamente, dependendo da tonalidade que a sintomatologia
geral assuma. Acredita-se que essa combinação pode diminuir o comportamento
sexual compulsivo, preservando o comportamento sexual normal.
44
Para o autor, no estado atual do que se conhece a respeito de tratamento
para a pedofilia, não se pode ter expectativa de sucesso com acompanhamento a
curto ou médio prazo.
Em Trindade e Breier (2006), observa-se que pedófilos apenas vão em busca
de tratamento, quando se vêem envolvidos em processos judiciais ou percebem que
estão sendo investigados, notadamente em busca de auto-proteção e benefícios
secundários. Não se percebe um verdadeiro interesse no tratamento, uma vez que
geralmente são indivíduos sem sentimento de culpa. Falta-lhes desconforto
emocional e motivação para mudanças. São envolventes, sedutores e este
funcionamento transportam para a relação terapêutica. Ao receberem algum
benefício secundário, de um modo geral abandonam o tratamento. Segundo o autor,
essas características são responsáveis pelo ceticismo dominante quando se trata de
acompanhamento psicológico.
Como afirma Ferraris e Graziosi apud Trindade e Breier (2006), tratar um
pedófilo com terapia não é tarefa simples e se converte em muito difícil, senão
impossível, com pedófilos crônicos ou afetados por uma deterioração mental.
Face ao generalizado insucesso das abordagens terapêuticas de cunho
psicológico, para as quais os pedófilos apresentam um prognóstico
reservado, e frente ao relativo fracasso no que tange à reincidência crônica,
uma das alternativas tem sido a denominada castração. De um lado, situase a castração clínica, que se dá através da retirada dos testículos, para
impedir a produção de um hormônio, a testosterona, que estimula o desejo
sexual. De outro, existe a possibilidade de uma castração química, a
modificação dos neurotransmissores e a criação de mecanismos de
obstrução do impulso e do desejo sexual. Qualquer das duas modalidades
enfrenta inúmeros obstáculos de ordem ética e mesmo jurídica, carreando
prós e contras, defensores ferrenhos e críticos (TRINDADE e BREIER,
2006. p. 44).
Pode-se perceber a existência de muita polêmica no que se refere ao
tratamento do pedófilo. Alguns autores afirmam que os programas comunitários de
tratamento, associados à psicoterapia e medicamentos, é na atualidade o caminho
que produz mais resultados. Outros são céticos e dizem que o tratamento é
altamente resistente à interferência psicológica.
No momento atual são poucos os estudos descritivos confiáveis tanto sobre a
conduta do pedófilo quanto ao tratamento. Conforme Urra apud Trindade e Breier
(2006), a reincidência para crimes sexuais cometidos por pedófilos é alta e por isso
estes indivíduos precisam de tratamento para o seu bem e de terceiros. O autor
45
adverte ainda, que em face à falta de êxito por parte das diversas abordagens, há
que se ter prudência, sendo a reclusão prolongada um bom preventivo.
46
6 CONCLUSÃO
A partir da democratização dos meios de comunicação em especial a internet,
atrelada às garantias previstas em lei de liberdade de expressão e preservação dos
direitos individuais, percebeu-se nos últimos tempos uma crescente utilização da
Rede Mundial de Computadores, no fomento da prática da pedofilia.
A internet é hoje uma ferramenta que pode ser usada de múltiplas maneiras e
uma delas é a comercialização de produtos. O comércio de material pornográfico
pela internet movimenta milhões e onde há consumo há alguém que produz para
abastecer este mercado. No que se refere à produção de pornografia infantil, em
uma ponta deste mercado estão criminosos que usam crianças para a produção do
material pornográfico e lucram com esta prática, em outra estão os consumidores,
geralmente pedófilos. De acordo com a revisão bibliográfica realizada, percebe-se
que existe por traz da pedofilia uma rede internacional organizada de produção e
consumo de pornografia infantil.
Percebe-se que identificar o pedófilo e puni-lo não é suficiente para inibir tais
crimes, sendo assim as leis recentemente aprovadas no Brasil, terão caráter
preventivo como punir quem adquire, armazena e divulga material pornográfico, lei
aprovada e sancionada pelo Presidente da República em maio de 2008.
Foi aprovada ainda pelo Senado Federal em maio de 2009, a lei que tipifica o
“Crime de Pedofilia”. De acordo com essa lei, a venda de material pornográfico e a
exploração sexual de crianças e adolescentes passam a ser considerados crimes
hediondos. A referida lei teve aprovação do Senado e para entrar em vigor precisa
passar pelas comissões de constituição e justiça e cidadania e ser sancionada pelo
Presidente da República.
Ativistas “pró-pedofilia” defendem a idéia de que a pedofilia não é um
transtorno de ordem sexual, mas sim uma orientação sexual. Outros ativistas lutam
pela redução da idade de consenso para relações sexuais, que na atualidade varia
de acordo com a lei de cada país. Alguns ativistas defendem a idéia de que estes
movimentos são senão, uma nova etapa da revolução sexual, por garantirem à
menores de idade a liberdade de escolha do início de sua vida sexual, garantindo
assim o direito às liberdades individuais, previsto nas constituições da maioria dos
países.
47
O grande problema é a falta de entendimento que um conceito trabalhado em
larga escala como a pedofilia, produz. A diversidade cultural existe, em detrimento
do avanço dos meios de comunicação e do processo de globalização. O conceito de
pedofilia e as implicações dele derivados estão longe de ser um consenso em todo o
mundo. Cada país trata do assunto dentro de suas perspectivas culturais, morais e
religiosas. Mesmo dentro de um uma microcultura, divergências em torno do tema
sempre surgirão.
Pelo senso comum, pedofilia é uma doença e também um crime. Apenas por
entendermos assim, já fazemos uma grande confusão, ou seja: Como uma doença
pode ser tratada como um crime? Como uma pessoa doente pode ser considerada
criminosa apenas por isso? Não se trata aqui de defender o criminoso sexual. Tratase de buscar um entendimento para o fenômeno do ponto de vista clínico, a fim de
auxiliar pessoas, tanto os pedófilos em busca de suporte terapêutico para seu
problema, quanto as crianças, vítimas que são dos abusadores, sejam eles
preferenciais (pedófilos) ou situacionais (oportunos).
Pode-se agora afirmar, que nem todo pedófilo é criminoso e nem todo
criminoso que abusa sexualmente de crianças, é pedófilo. Essas são duas
afirmações importantes com as quais se buscou responder à questão
suscitada no presente trabalho de pesquisa bibliográfica, qual seja fazer a
distinção entre o abusador preferencial e o oportuno. (ver anexo A)
A pedofilia é um dos transtornos parafílicos e não necessariamente envolve
um ato criminoso, pois o pedófilo pode manter seus desejos em segredo durante
toda a sua vida sem nunca compartilhá-los com alguém ou torná-los atos reais.
Estes indivíduos podem casar-se, ter filhos, ou escolher profissões que os
mantenham com fácil acesso à crianças, e contudo não passarem ao ato real da
prática de pedofilia, restringindo seus desejos ao nível das fantasias, e utilizando-se
de ferramentas para a satisfação das mesmas, como é o caso do uso da internet
como meio de acesso à material pornográfico infantil.
Os pedófilos raramente procuram tratamento e geralmente só o fazem
quando percebem o risco de serem descobertos. Sendo pedófilos possuem atração
primária por crianças, por isso são chamados pedófilos estruturados ou
preferenciais. Caso venham a cometer algum crime sexual, estes são chamados
criminosos sexuais preferenciais.
48
Sendo assim percebe-se que o que configura o crime sexual é o ato e não a
pedofilia por si só, entendendo-se portanto a afirmação de que nem todo pedófilo é
criminoso, por possuir atração sexual primária por crianças. Se formos corretos
neste conceito, pedofilia por si só não é um crime.
Por outro lado, temos a afirmação de que nem todo criminoso que abusa
sexualmente de crianças é necessariamente pedófilo. O entendimento do que é o
transtorno parafílico do tipo pedofilia oferece suporte a essa afirmação. Considerar
como pedófilo todo aquele que comete crimes sexuais contra crianças, é visto pelos
diversos autores estudados com errôneo, principalmente se tais criminosos são
analisados do ponto de vista clínico. A maioria dos crimes sexuais envolvendo
crianças são cometidos por indivíduos que não são clinicamente diagnosticados
como pedófilos, por não atenderem aos critérios para o diagnóstico previstos nos
manuais de psiquiatria. Estes podem cometer crimes sexuais por diversos outros
motivos e situações e são assim chamados de criminosos situacionais.
Segundo afirma Holmes e Holmes, apud Serafim (2007), Estimativas indicam
que apenas 2% a 10% das pessoas que cometeram crimes de natureza sexual
contra crianças sejam realmente pedófilos. Tais criminosos são chamados de
pedófilos estruturados, fixados ou preferenciais. Abusadores que não atendem aos
critérios regulares de diagnóstico da pedofilia são chamados de abusadores
oportunos, regressivos ou situacionais.
Estabelecer um banco de dados confiável que represente a real prevalência
dos casos de pedófilos e molestadores infantis está longe de ser elaborada em
nossa realidade. Esta dificuldade está diretamente associada ao fato de que as
notificações
desse
fenômeno
respondem
apenas
aos
casos
denunciados
legalmente. Não se precisa por exemplo, os casos que em geral, são
“inadequadamente” resolvidos em família.
Concluindo, temos que ter a consciência de que esta discussão não se
encerra apenas nos caracteres definitórios relativos à distinção entre o abusador
preferencial e o oportuno. Sejam quais forem os crimes sexuais praticados contra
crianças, sejam os criminosos pedófilos ou não, percebe-se na atualidade a tentativa
do uso da garantia dos direitos individuais, como justificativa para o estabelecimento
de novas normas de conduta, como a prática da pedofilia.
As garantias das liberdades individuais estão previstas nas constituições
federais da maioria dos países do mundo, em especial no Brasil no artigo 5º da
49
Constituição Federal (1988), que prevê a livre manifestação do pensamento, a
liberdade de consciência e crença, a atividade intelectual, artística, científica e de
comunicação, a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, a inviolabilidade da
correspondência e de dados das comunicações telefônicas, a liberdade de
locomoção, de associação e de reunião.
Embasados nestas garantias, grupos se organizam através do mundo na
tentativa de instituir um sistema novo de regras (leis), que garantam práticas sexuais
legais com menores de idade, usando ainda a justificativa de que os direitos
individuais devem se estender a todos, e assim incluir as crianças e adolescentes
como sujeitos com pleno direito como cidadãos, às suas liberdades individuais.
Sendo assim, conclui-se que embora “todos”, no sentido mais amplo da
palavra, tenham o pleno direito às suas liberdades individuais, as crianças do ponto
de vista psicológico, são sujeitos em pleno desenvolvimento, instituídas de uma
“natureza infantil” e possuidoras de características específicas para sua idade e
neste sentido carecem de proteção e tutela. Cabe então ao estado e às instituições
representativas, o cuidado na adoção de medidas protetivas que garantam a elas, o
direito de viver naturalmente seu processo de desenvolvimento físico e psicológico
de maneira saudável e com dignidade, direito fundamental da pessoa humana.
50
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53
ANEXOS
54
ANEXO A – ANÁLISE DE CASOS
A seguir serão elencados quatro casos distintos, sendo que a análise dos dois
primeiros contribuem para a resposta ao problema de pesquisa qual seja distinguir
o abusador preferencial do oportuno. Os dois casos subseqüentes referem-se a
outros exemplos de casos de pedofilia. Os referidos casos foram analisados e
periciados pelo Professor, Perito, Psicólogo, Examinador, Roberto Jório Filho e neles
poderemos verificar as características que diferem cada um dos abusadores
sexuais.
Primeiro caso – Criminoso sexual situacional
Com referência ao caso a seguir, o indivíduo cometeu crime sexual contra
uma menor de idade, no entanto não atende à critérios para diagnóstico de parafilia
do tipo pedofilia. Assim, faz-se a distinção entre a parafilia do tipo pedofilia, de
um crime sexual considerado situacional, cometido contra uma menor de
idade com 12 anos, justificando a afirmação de que nem todo indivíduo que
comete crimes sexuais contra menores de idade é pedófilo.
Um sujeito, do sexo masculino, de mais ou menos 40 anos de idade, que
tentou manter relações sexuais com uma menina de nome A.S.B., de mais ou
menos 12 anos de idade.
Mantena – MG, 02 de março de 1999. O réu em interrogatório disse que no dia
02/03/99 por volta das 16h30min., chegou na casa situada na Rua João Pinheiro,
351, onde mora a menor A.S.B., juntamente com seus familiares, com a finalidade
de dar uma informação ao irmão da menor. O réu já era conhecido dos familiares,
motivo pelo qual, tinha certa liberdade com os mesmos. Após dar o recado o réu
saiu da casa, declarando à Polícia, estar alcoolizado, montou em sua bicicleta e no
caminho, sentido Vila Nova, encontrou a menor, sendo que esta lhe abordou e
montou na garupa de sua bicicleta. No caminho, o réu levou a menor para o lixão da
cidade, este afirma que a menor não se opôs a ir ao local. No lixão, o réu afirma que
55
a menor se insinuou e este não se opôs a acariciá-la e praticar atos libidinosos,
sendo que a menor quis aquela situação. O réu tinha conhecimento que seus atos
eram tidos por criminosos, e que foi a primeira vez que um fato dessa natureza
aconteceu. A menor, acompanhada de sua genitora, prestou depoimento a fim de
esclarecer os fatos à Autoridade Policial, dizendo que o réu morava numa casa que
fica nos fundos da casa onde a vítima reside. A menor declara que, precisando ir
numa mercearia comprar produtos para sua mãe, por volta das 17h00min., e como o
réu estava de bicicleta, esta pediu ao mesmo que lhe desse uma carona. Ao invés
de levar a menor até a mercearia, acabou levando-a para o lixão e lá a molestou e
praticou atos libidinosos. A menor, chegando em casa, contou para sua mãe no
mesmo instante do ocorrido, esta chamou a polícia, que deteve e prendeu o réu. Foi
a primeira ocorrência dessa natureza com o réu.
Através da entrevista, exames objetivo e subjetivo, o Perito, Psicólogo,
Roberto Jório Filho, proferiu o seguinte parecer:
“Não apresenta, no momento, nenhum sinal ou sintoma de transtorno mental; tem
um discurso coerente não evidenciando delírios ou alucinações. Esse não é um caso
de pedofilia, pois não se observa os critérios diagnósticos necessários para
caracterizar o mesmo. Foi um ato isolado, não sendo prática recorrente nem
duradoura. De acordo com seu depoimento, tinha consciência de que era crime o
fato. Seria um caso de atentado violento ao pudor. Para se diagnosticar a pedofilia
devemos nos ater aos critérios diagnósticos do DSM-IV-TR (2000)”.
Segundo caso – Criminoso sexual preferencial
O caso clínico a seguir, faz referência à indivíduo com atração sexual por
crianças (pedófilo), do tipo não-exclusivo, ou seja, sente-se atraído por adulto e
criança, com preferência pelo sexo feminino, que não passou ao ato, portanto não
cometeu crime sexual, tendo o transtorno apenas ao nível da fantasia. A análise do
referido caso, faz distinção entre a parafilia do tipo pedofilia dos crimes
sexuais cometidos contra menores de idade e justifica a afirmativa de que nem
todo pedófilo é necessariamente criminoso.
56
Agosto de 2000 – O indivíduo R.M.E., 29 anos, cursando o 1º ano do ensino
médio, infrequente, procurou pela psicoterapia em agosto de 2000, queixando-se
que teve envolvimento com a polícia por ter sido flagrado com uma criança no colo e
por causa de envolvimento com material pornográfico. O Pr. diz ter preferência
sexual por mulheres, possui desejo exagerado por elas, podendo ser de qualquer
idade, neste caso incluindo atração sexual por crianças, que só tem relação sexual
com mulheres na fantasia, nunca tendo orgasmo com elas por contato físico,
masturba-se de três em três dias, já masturbou-se dentro da igreja batista após ficar
perto de crianças (meninas) e dentro da sala de aula. Na atualidade mora com uma
irmã, dois irmãos e os pais, e que desde os quatorze anos se manifesta seu
problema. Na infância tinha relações sexuais com um irmão, teve relações sexuais
com um garoto, depois com uma irmã um ano mais nova que ele. Disse já ter se
confessado com um ministro do evangelho e foi aconselhado que fizesse jejum e
elevasse o espírito com orações, que iria resolver seu problema, e que não seguiu a
recomendação do pastor.
O Pr. não compareceu em seis sessões de um total de dez sessões
marcadas a seguir, sendo que na última sessão de psicoterapia, disse não poder
continuar o tratamento assinando assim, o termo de desistência.
Outubro de 2005 – O proponente, R. M. E., retorna à clínica cinco anos mais
tarde, já com 34 anos de idade, encaminhado pelo pai pelo motivo de morar com os
pais, não trabalhar, já teve “ansiedade”, problemas mentais e não faz tratamento.
Queixa-se de exercer atividade braçal com dificuldade, já trabalhou em Belo
Horizonte, porém ficou no emprego apenas dois dias, é muito mole para o trabalho,
tem lentidão de raciocínio, choro constante, tem muita “sensitividade”, é muito
nervoso. Atualmente está freqüentando a igreja batista, não é usuário de bebida
alcoólica, tem “obsessão pelo desejo sexual”, não tem domínio disso, tem
preferência pelo sexo feminino podendo ser de qualquer idade. O Pr. relata ainda,
que nunca teve namorada e que seu descontrole o causou problemas mentais, que
gosta de olhar “bundas”, e que tem atração pela cor rosa. Na sessão seguinte o Pr
relata ter visto muito material pornográfico quando era adolescente, nunca tendo
relação sexual com ninguém e nunca tendo namorado por questões bíblicas, mas
masturba-se e assim fere os “princípios”. Tem muito medo da polícia, já presenciou
muita polícia na casa dele para prender o pai. Deixou uma revista pornográfica com
uma pessoa “de menor” e foi denunciado. A polícia apenas recolheu o material e não
57
sofreu nenhum tipo de sanção por causa disso. Queixa-se de estar meio “paralítico”,
demorando a tomar decisões em relação à saúde e fé. Está freqüentando a igreja
presbiteriana, diz que a igreja o está deixando confuso, pois dizem que o crente
também deve procurar ajuda médica, mas que antes pregavam o contrário. O Pr. diz
não trabalhar devido aos medos que tem, mas não quis falar sobre estes medos,
não quis falar dos lugares que não gosta de ir por ter medos. Na sala da escola
dominical fica inquieto e acha que tem que buscar explicação dos medos no mundo
espiritual. Não quis falar sobre o que são os pensamentos impuros e a natureza
pecaminosa que diz ter, pois tem receio do terapeuta tornar seu relato público. Neste
momento, o psicólogo explicou sobre o sigilo previsto no código de ética. Em
seguida a esta sessão o paciente nunca mais voltou à clínica, retornando apenas em
fevereiro de 2009, quatro anos depois.
Fevereiro de 2009 – O Pr. retorna em busca de psicoterapia, dizendo que
achava que o tratamento era só falar e ficar bem, que não estava conseguindo se
abrir, que gostaria de procurar outra alternativa, que quer voltar quando desinibir.
O psicólogo conclui portanto, que aconteceu o mesmo quando das outras
vezes que procurou por tratamento psicológico ou seja, quando têm que entrar nos
caminhos mais profundos, ele acaba desistindo do tratamento. Assim, o caso foi
arquivado devido à desistência por parte do paciente, assinando o mesmo o termo
de desistência e sendo encaminhado para o psiquiatra.
Terceiro caso – Criminoso sexual preferencial (pedofilia; com atração pelo
sexo feminino; do tipo não-exclusivo e restrito ao incesto)
Um sujeito, J.E.F., de 48 anos de idade, casado, que durante longos anos
manteve relações sexuais com suas filhas de maneira gradativa, ou seja, começou
com a mais velha de nome S.F.E.-1, quando esta contava com mais ou menos 10
anos de idade, depois com a do meio de nome R.F.E-2. e por último com a mais
nova de nome S.F.E.-3. Trocava de filha quando esta assumia os caracteres sexuais
secundários. Tinha também um filho que não foi molestado sexualmente.
Mantena – MG, 24 de março de 2000. O réu J.E.F., natural de Água Doce do Norte –
ES, lavrador, no interrogatório confirmou em parte os atos narrados na denúncia; e
58
diz que em relação à vítima S.F.E.-1, iniciou as relações com a mesma quando ela
tinha 16 anos de idade, e que era ela que procurava o declarante para prática dos
atos, e quanto às vítimas R.F.E.-2 e S.F.E.-3, apenas tentou manter relações
sexuais. Dada a palavra às vítimas no depoimento, a filha S.F.E.-1, esta afirmou
sofrer agressões físicas, ameaças caso contasse a alguém sobre o ocorrido, que o
primeiro contato sexual sofrido por ela ocorreu quando tinha de 6 a 8 anos de idade,
e que os abusos ocorriam quando sua mãe viajava, sendo que na presença da
mesma não ocorria abusos. O réu possuía um quarto filho do sexo masculino, de
nome R.F.E., este não fora molestado, sendo que era violento e quando não gostava
de alguma coisa, batia em todas as filhas, e filho, com socos, pontapés, murros e
arremessava objetos. A filha S.F.E.-3, afirmou que achava que sua mãe não sabia
dos abusos sexuais, isto em razão do tempo que os abusos ocorreram, que a
primeira vez a ser molestada fora com 7 anos de idade, que seu irmão R.F.E., sabia
da situação pois já presenciou o abuso, contudo não sabia qual irmã sofrera a
violência.
O Perito, Psicólogo, Roberto Jório Filho, através da análise processual de
entrevistas e das informações de fontes subsidiárias, das filhas, filho, esposa,
utilizou o teste psicológico PMK (Psicodiagnóstico Miocinético), teste de inteligência
(Raven Matrizes Progressivas escala geral) e teste de peronalidade (HTP), proferiu o
seguinte parecer sobre a personalidade do acusado:
“Apresenta no momento, característica de personalidade primitiva, pouco elaborada,
introvertido, com dificuldade para estabelecer relações satisfatórias com o ambiente.
Ansiedade livre, flutuante, demonstrando tendência à fantasia, ou seja, as
realizações não se apóiam no pensamento (faz mais do que deve ou é capaz).
Descontrolado emocionalmente, com agressividade constitucional alta, mas com
controle atual. Apresenta o nível intelectual abaixo da média devido sua pouca
capacidade de concentração. Sugere um quadro clínico de Personalidade Severa
com Transtorno da Preferência Sexual do Tipo Pedofilia; com atração pelo sexo
feminino;do tipo não-exclusivo e restrito ao incesto”.
59
Quarto caso – Criminoso sexual preferencial (pedofilia; com atração sexual
pelo sexo masculino; tipo exclusivo; com comorbidade psiquiátrica; indicativo
de psicopatia)
Um sujeito de 27 anos, solteiro, que nunca teve envolvimento afetivo sexual
com adultos, estuprou e matou seu sobrinho de 4 anos de idade.
Mantena – MG, 07 de novembro de 1993. O réu residia em Vitória – ES, mudando
para Central de Minas, sua terra natal onde residem alguns parentes, chegando a
Central de Minas foi residir numa casa velha, situada na Rua do Barracão (Rua Boa
Vista). Na manhã do dia 06/11/93, sábado, após ter tomado umas cachaças em
botecos de Central de Minas foi para a casa onde estava morando, que lá chegando,
pegou umas mangas no quintal do fundo, há certa hora resolveu urinar, foi quando
ali chegou seu sobrinho L.H. de 4 anos de idade. Ao ver o menino L.H., o declarante
se excitou, e como estava embriagado resolveu num momento de fraqueza manter
relações sexuais com seu sobrinho, para tanto o despiu e começou a esfregar o
membro no ânus do mesmo, não conseguiu a penetração e com os atos libidinosos
se deu por satisfeito. Então pegou seu sobrinho e o colocou em seus ombros,
passando então a brincar de jogá-lo para cima, até que o mesmo caiu no chão e, ao
que parece, quebrou o pescoço. Após verificar que seu sobrinho estava morto, o réu
apavorou-se e resolveu esconder o corpo para ninguém encontrá-lo, para tanto
colocou o corpo do garoto abaixo do assoalho, aproveitando que a tábua do mesmo
estava solta, cobriu com tijolos e com uma folha de madeirite. O réu confessou o
crime dizendo estar arrependido.
Após análise processual, o Perito, Psicólogo, Roberto Jório Filho, através de
entrevista, teste de personalidade (HTP e Rorschach) e de inteligência (Raven
Matrizes Progressivas escala geral), proferiu o seguinte parecer:
“Apresenta, no momento, características de personalidade primitiva, com baixo nível
intelectual. Procura satisfazer suas necessidades de forma imediata e sem controle
(assalto a mão armada, tráfico de drogas, satisfação sexual seguida de morte, etc.).
Sente-se deprimido devido sua conduta ter sido exposta e não aceita socialmente
(caracterizando indicativos de psicopatia) associado à pedofilia, com atração sexual
pelo sexo masculino, tipo exclusivo (segundo ele, na entrevista, nunca teve relações
sexuais satisfatórias e nem duradouras com mulheres)”
60
ANEXO B – FLUXO DE FANTASIAS À CONDUTA SEXUAL VIOLENTA
Segundo Serafim (2007), o processo de fantasia do agressor sexual se
configura em disparador para a violência extrema. Quando o indivíduo sai da
fantasia para o ato em si, ele experimenta o prazer não mais pelo sexo e sim com o
sofrimento de sua vítima. As fantasias gradativamente vão se transformando de
pensamentos cada vez mais fixos, a um quadro de obsessões (ver esquematização
do processo de fantasia ao comportamento sexual violento). Para Bradford (2001)
apud Serafim (2007), as obsessões se constituem em idéias, pensamentos, imagens
ou desejos persistentes e recorrentes, involuntários, que invadem a consciência. No
caso dos pedófilos e molestadores, a maioria deles não percebem ou se preocupam
que estas venham a se transformar em uma conduta problemática.
Fantasias sexuais,
eróticas a sádicas
Obsessões e
compulsões
Facilitador para as
primeiras experiências
Primeiras experiências
sádicas
Violência Extrema
Primeira Experiência
de Abuso Sexual
Mutilações
Estupro, Mutilações e
Homicídio
Esquema 1 – Fluxo de fantasias à conduta sexual violenta.
(SERAFIM, 2007, p. 6)
61
ANEXO C – COMPARAÇÃO ENTRE CARACTERÍSTICAS DE MOLESTADORES
SEXUAIS SITUACIONAIS E PREFERENCIAIS
Molestador Situacional
Inteligência inferior
Baixa classe socioeconômica
Transtornos de personalidade do tipo:
Antisocial/Psicopática
Narcisista
Esquizóide
Comportamento criminal variado
Pornografia violenta
Impulsivo
Considera riscos
Erros cometidos por negligência
Orientado intelectualmente
Espontâneo ou planejado
Disponibilidade
Oportunidade
Ferramentas
Aprendizado
Padrões de Comportamento:
Praticidade
Flexibilidade
Molestador Preferencial
Inteligência superior
Alta classe socioeconômica
Parafilias do tipo:
Pedofilia
Voyerismo
Sadismo
Comportamento criminal focado
Pornografia temática
Compulsivo
Considera necessidade
Erros cometidos por necessidade
Orientado pela fantasia
Script
Auditivo
Repetitivo
Com acessórios
Crítico
Padrões de Comportamento
Ritual
Necessidade
Rigidez
Quadro 2 – Quadro comparativo entre molestadores situacionais e preferenciais.
(HOLMES E HOLMES, 2002, apud SERAFIM, 2007, p. 4).
62
ANEXO D – CASO EUGÊNIO CHIPKEVITCH (EXEMPLO CARACTERÍSTICO DA
PARAFILIA DO TIPO HEBEFILIA)
O caso a seguir, extraído do site www.jusbrasil.com.br, é característico da
parafilia do tipo efebofilia, que segundo Correia (2003) designa a atração de adultos
por adolescentes pós-púberes (de 13 a 17 anos). De acordo com o mesmo autor
além da efebofilia, o termo hebefilia é por vezes utilizado para descrever a atração
adulta por adolescentes que já atingiram a puberdade (de 9 a 13 anos).
O
caso
Eugênio
Chipkevitch,
ganhou
repercussão
nacional
pelas
características peculiares a ele atribuídas vistas a seguir.
Eugênio Chipkevitch, (Ucrânia, 26 de abril de 1954) é um médico e
psicoterapeuta brasileiro de ascendência ucraniana.
O médico foi acusado de ter abusado sexualmente de seus pacientes adolescentes
em sua clínica em São Paulo, tendo inclusive gravado cenas em vídeo, e por isso
condenado a penas de 114 anos de prisão por atentado ao pudor e corrupção de
menores.
Naturalizado brasileiro, Chipkevitch era um profissional respeitado na área
médica e acadêmica. Formou-se em 1978 na Faculdade de Medicina da
Universidade de São Paulo (USP), foi chefe do Serviço de Adolescentes do Hospital
Infantil Darcy Vargas, na capital paulista, e membro de associações como a Society
for Research on Adolescence (Sociedade para Pesquisa em Adolescência) dos
Estados Unidos.
Mencionado pela Universidade de Cambridge no ranking dos dois mil
cientistas mais importantes do século 20, com direito a verbete na respeitada
publicação Who’s Who in Science and Engineering (Quem É Quem na Ciência e na
Engenharia), ele havia introduzido no Brasil a especialidade médica conhecida como
hebiatria – o tratamento dos adolescentes e de seus problemas.
Em sua clínica, o Instituto Paulista da Adolescência, constava o cadastro de
cerca de dois mil clientes, que pagavam honorários acima da média para serem
atendidos pelo médico conceituado. Seus livros eram adotados em diversas
universidades brasileiras e estrangeiras e estava prestes a lançar mais um, quando
se tornaram conhecidos os fatos que o levariam a ser processado e condenado e a
ter cassado seu registro de médico.
63
Um técnico de uma empresa telefônica encontrou 35 fitas de vídeo numa
caçamba de entulho e, após assisti-las, repassou trechos a emissoras de televisão.
Na noite de 20 de março de 2002, foram ao ar no Programa do Ratinho, no SBT,
imagens de Chipkevitch molestando sexualmente seus pacientes. Nas mais de 15
horas de gravações, das quais apenas uma pequena parte foi ao ar, apareceram
cenas de abusos sexuais cometidos contra cerca de 40 vítimas, todos meninos, com
idade entre 8 e 17 anos. O médico sedava os pacientes, sob o pretexto de aplicarlhes vacina, depois os despia e os acomodava na maca. Enquanto estavam
inconscientes, fazia-lhes carícias, pegava-os no colo, manipulava seus órgãos
genitais. Quando as gravações foram ao ar, a identidade do médico ainda era
desconhecida. Mas, a mãe de um dos pacientes de Chipkevitch assistiu ao
programa, reconheceu de quem se tratava e na mesma noite apresentou queixa à
polícia. No dia seguinte ao programa, o médico foi preso em casa. Começou então o
trabalho policial de identificar as demais vítimas. O caso ganhou rapidamente grande
repercussão na mídia.
Foram apreendidos computadores para se apurar se Chipkevitch divulgava
pornografia infantil pela Internet. Mas nada nesse sentido foi provado, embora fotos
de crianças nuas tenham sido encontradas em seu carro.
Chipkevitch em sua defesa, alegou que as fitas de vídeo mostravam
procedimentos clínicos que poderiam ser erroneamente interpretados como abusos
sexuais. Confessou, no entanto, que era bissexual desde os 27 anos.
Fugindo aos padrões brasileiros, o processo tramitou rapidamente e já estava
definitivamente concluído em 2004. O médico foi condenado em primeira instância a
uma pena total de 124 anos de prisão em regime fechado mais multa por crimes de
atentado violento ao pudor com violência presumida, por se tratar de vítimas
impossibilitadas de defesa. A pena foi agravada pelo fato de ter usado sua posição
de médico para cometer os crimes. Posteriormente, o Tribunal de Justiça reduziu a
pena para 114 anos, mantendo o regime fechado. Ainda em desacordo com os
padrões brasileiros, o médico está efetivamente cumprindo sua pena num presídio
paulista.
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UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE