PARECER TÉCNICO SOBRE O PROJETO NUTRIR – PRODUTO III DO PROCESSO DE
CONSULTORIA
O presente parecer técnico está apoiado no documento Relatório II de Consultoria, no
qual descrevemos o processo de desenvolvimento do Projeto Nutrir, apresentamos
seus principais resultados, suas ressonâncias e aprendizagens e, agrupamos o conjunto
de registros e documentos relativos a esse trabalho.
O Projeto Nutrir foi uma experiência desenvolvida pela Associação Cairuçu, em
parceria com a Secretaria da Saúde – Programa Saúde da Família – da Prefeitura de
Paraty- RJ. Foi implementado no período 2005-2009, na região de abrangência da
Cairuçu, na APA do mesmo nome, nas comunidades: Patrimônio, Quilombo do
Campinho, Independência, Praia do Sono, Ponta Negra, Quilombo do Cabral e na
aldeia indígena Guarani de Paraty Mirim.
O foco do Projeto Nutrir era a ampliação, de maneira sustentável, dos índices de
hemoglobina que as crianças apresentavam, principalmente aquelas que moravam em
algumas regiões rurais e costeiras. Os índices baixos de hemoglobina eram
acompanhados por quadros de graves anemias ferroprivas, que comprometiam o
desenvolvimento físico, cognitivo e emocional das crianças. Esses índices também
mobilizavam, desde 2002, agentes de saúde, educadores e população local, que, com o
apoio da Associação Cairuçu, decidiram enfrentar, o que se sabia eram as principais
causas da anemia ferropriva : a carência de saneamento básico das comunidades; as
deficiências nutricionais das famílias, decorrentes de suas condição de pobreza; e, a
baixa informação e posse de recursos que as pessoas dispunham para encontrar
alternativas e enfrentar a essas questões.
Várias estratégias foram sendo implementadas, ao longo de alguns anos, em algumas
das comunidades – Patrimônio, Quilombo do Campinho, Praia do Sono e Ponta Negra até configurar-se, em 2005, o Projeto Nutrir- Galinheiros e Hortas Comunitárias. O
projeto, utilizando elementos da cultura das populações locais – a criação de galinhas e
o cultivo de hortas - , articulava moradores e profissionais das áreas de saúde, de
educação e de organização comunitária, para o desenvolvimento com e nas
comunidades de um sistema integrado de ações. Essas ações abrangiam: a produção
alimentar (de ovos e verduras); o atendimento em saúde e nutrição ( com assistência
médica e medicamentosa às crianças e orientação alimentar às famílias, prestada pela
área pública ); e, o saneamento ambiental, com informação e educação ( a construção
de banheiros comunitários, o manejo das aves para redução natural do lixo orgânico e
a informação e educação social). Esse sistema integrado de ações contribuiu para, em
dois (02) anos (2005-2007), ampliar, de forma sustentável, os índices de hemoglobina
das crianças e, para produzir nas comunidades um conjunto de efeitos significativos,
no âmbito da percepção e do entendimento das pessoas sobre as questões locais,
estimulando atitudes e ações propositivas, no plano pessoal, familiar e comunitário,
que indicam processos de mudança e, em alguns casos, como parece ser o caso do
1
Quilombo do Campinho, podem indicar o reforço e a ampliação do empoderamento
social da comunidade.1
É importante esclarecer que, os resultados do projeto e os efeitos que acima
indicamos, foram possíveis graças a um conjunto amplo de condições culturais e
político-administrativas que existiram, até um determinado momento, envolvendo as
organizações gestoras ( Associação Cairuçu e Prefeitura de Paraty), as lideranças
comunitárias locais (associações de moradores das comunidades) e a população das
áreas, que, em sua ação, configuraram, ainda que com limites, uma conjuntura local
de governança e participação social e deram sustentabilidade ao projeto. Essas
condições que vinham se alterando ao longo do tempo, viram-se comprometidas, de
forma bastante acentuada a partir de 2008, o que contribuiu para a desarticulação
progressiva dos atores e das relações sociais que sustentavam o projeto e para
comprometer as concepções e os pressupostos originais que lhe davam fundamentos,
gerando, ao longo de 2009, a desativação do projeto.
Em nossa opinião, tratou-se de uma experiência exitosa, que contribuiu, ainda que de
forma diferenciada nas comunidades envolvidas, para o enfrentamento das formas de
anemias nas crianças e para o desenvolvimento das comunidades locais.
A experiência reúne condições para sua replicação, desde que se faça um conjunto de
ajustes de ordem conceitual, metodológico e instrumental, se definam bem objetivos e
metas, se proceda a redução do foco de abrangência do projeto e, a partir de um bom
diagnóstico comunitário, possa se escolher uma área piloto para a ação. No entanto, a
condição principal para pensar uma possível nova implementação do Projeto Nutrir,
como sistema integrado de ações, está vinculada à mudança da conjuntura políticoadministrativa local que, permitisse reunir condições para articular relações de
parceria institucional, propiciando uma gestão compartilhada entre a sociedade civil
organizada ( Associação Cairuçu, e outras organizações locais); o governo municipal
(secretarias de saúde e de educação) e a população local.
Por último, o Projeto Nutrir nos lembra que, se o desenvolvimento que queremos é,
principalmente humano, social e sustentável, ele exige protagonismo local e os
maiores responsáveis por isso são as pessoas da localidade, cabendo a nós educadores
e agentes sociais, a partir de uma organização como a Associação Cairuçu, reforçar a
ação dos sujeitos fortalecendo o seu protagonismo como pessoas e cidadãos.
Paraty, 31 de março de 2011.
Profa. Dra. Mercedes Manchado Cywinski
Consultora em Políticas Sociais
1
Este termo, adotado do inglês empowerment, significa o processo pelo qual indivíduos e grupos se
apropriam de suas potencialidades para conquistar espaço público e social , em particular o poder de
participar de deliberações e decisões que lhes digam respeito.
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