ARTIGO/OPINIÃO
Odontologia nos hospitais: quais as perspectivas?
Cassius C. Torres-Pereira
A
prática da odontologia nos
hospitais não é uma novidade. Muitos dentistas fazem o
seu dia a dia no exercício profissional em
hospitais de grande, médio e pequeno porte. Estes profissionais são em geral oriundos
de diferentes especialidades. Entretanto,
são mais comuns nos hospitais os estomatologistas, os cirurgiões bucomaxilofaciais e,
mais recentemente, também os especialistas no atendimento de pacientes portadores de necessidades especiais.
Os hospitais são estruturas complexas e bastante heterogêneas. Assim como
existe o grande hospital geral, que dá conta
de muitas especialidades e serve de referência para uma macrorregião, também há
o hospital infantil, a maternidade, o hospital
dedicado à oncologia, o hospital voltado ao
trauma, dentre outros. Fica evidente que,
em cada um deles, haverá um perfil profissional de cirurgião-dentista mais apto conforme a carteira de serviços ofertada. Um
dentista que queira trabalhar em um hospital deverá em primeiro lugar, entender qual
é o perfil de atividade do centro em que irá
atuar e assim, capacitar-se nas habilidades
requeridas para a melhor integração com a
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equipe multiprofissional e maior resolutividade aos usuários.
A odontologia praticada nos hospitais deve ser voltada a resolver os problemas
que afetem negativamente o estado de saúde que motiva a internação. Deve ser restrita portanto, a colaborar para a mais pronta
recuperação e alta dos pacientes. Não deve
ser restrita por outro lado, à compreensão
exclusiva de atuação em ambiente de terapia intensiva.
Na III Assembleia Nacional de Especialidades Odontológicas (ANEO) realizada
pelo CFO em 13 e 14 de outubro de 2014,
deliberou-se pela habilitação ao invés da
criação de uma especialidade em odontologia hospitalar. Esta acertada decisão foi
resultado de um entendimento de que o
hospital é um espaço que deve estar receptivo a todas as especialidades odontológicas. A ideia do trabalho de uma equipe de
cirurgiões-dentistas, com especialidades e
habilidades complementares é amplamente
vantajosa e aumenta o alcance e a inserção
dos dentistas nas equipes multiprofissionais
dos hospitais.
É este entendimento que pauta a
atuação da Sociedade Brasileira de Estomatologia e Patologia Oral e Maxilofacial (SOBEP). A comissão de odontologia hospitalar
da SOBEP se fez representar em boa parte
das comissões de odontologia hospitalar
dos CRO’s por entender que é uma interlocutora privilegiada neste assunto. A SOBEP é
uma das entidades com maior representatividade de dentistas com atuação hospitalar
em seu quadro associativo.
É preciso também avaliar o modelo
de formação tanto de graduação quanto
das pós-graduações para atuação na alta
complexidade. Na graduação, é importante
que os docentes ampliem a vivência dos estudantes com o cenário de prática hospitalar. Talvez, isso deva ser conduzido gradativa
e regularmente por meio da oferta de disciplinas optativas e projetos extracurriculares
mas, principalmente, pelo acolhimento do
paciente com histórico médico complexo.
A graduação não pode mais recusar ou se
esquivar do atendimento destes usuários.
Na pós-graduação, há grande oportunidade
de avançar e fomentar as residências multiprofissionais ou de área profissional. Há alguns exemplos interessantes de residência
em atenção hospitalar com participação de
cirurgiões-dentistas tais como a que será
ofertada à partir de 2015 no Hospital de Clínicas da UFPR.
Deve-se olhar com cautela para os
projetos de lei que obrigam os hospitais a
contratar dentistas. Induzir o gestor de um
hospital a manter um dentista por força de
lei pode não ser uma política pública efetiva. É necessário avançar e discutir mais
claramente, baseado em boas evidências
científicas, em que situações a presença do
dentista pode diminuir a morbidade e eventualmente a mortalidade em decorrência de
complicação provocada por manifestações
bucais. Nem sempre a presença de um dentista em uma UTI, por exemplo, significa melhoria das condições de saúde do paciente.
Em uma visão de equipe, importa ampliar a
discussão para considerar se os desfechos
indesejáveis provocados por condições bucais não poderiam ser prevenidos também
por meio de pessoal técnico qualificado tais
como o Técnico em Saúde Bucal ou por melhorias das práticas quanto aos cuidados em
saúde bucal em ambiente hospitalar.
Por fim, é consensual que precisamos de mais dentistas habilitados ao
atendimento em hospitais. Por outro lado,
é necessário continuar amadurecendo e
profissionalizando essa discussão para que
este seja um caminho natural na formação e
prática do cirurgião-dentista. A SOBEP está
disposta e sente -se responsável por liderar
esse processo.
Cassius C. Torres-Pereira é professor, presidente
da Sociedade Brasileira de Estomatologia e Patologia Oral e Maxilofacial (SOBEP) e coordenador
do Programa de Pós-Graduação em Odontologia
da UFPR. Contatos pelo e-mail [email protected] .
www.cropr.org.br
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