Wagner Dias Ferreira
Direitos Humanos e a justiça de Santo Ivo
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Direitos Humanos e a justiça de Santo Ivo : 2
Direitos Humanos e a justiça de Santo Ivo
O DIA 19 DE MAIO É DEDICADO AO PATRONO DOS ADVOGADOS
Wagner Dias Ferreira
Advogado e membro da Comissão de Direitos Humanos da OAB/MG - Brasil
O século XIII trouxe a existência de universidades que, hoje, são das mais antigas do
mundo. Na Europa, pairava clima de mudança. Era chegada a hora de deixar a idade média
e caminhar em direção a novos ares. E, bem no seio destes novos ares, um homem tecia
singelas contribuições. Das quais, a mais importante era o acesso à justiça para os pobres.
Santo Ivo, que viveu no século XIII, marcou a humanidade pela preocupação com a
defesa dos pobres. Mitos e lendas se desenvolveram em torno deste homem, mas, ninguém
nega que ele seja o patrono dos advogado e que se tornou este padroeiro defendendo
graciosamente os pobres. Inclusive, comemora-se o dia de Santo Ivo no próximo 19 de maio.
Hoje, quando olhamos a advocacia moderna e o poder judiciário, observamos que há
muito por se fazer. O princípio de presunção da inocência, que permite aos poderosos
responder em liberdade os processos criminais, raramente se aplica aos pobres.
Não raras vezes, o usuário de drogas é preso pela polícia militar em flagrante na esquina,
com uma, duas ou três pedras de crack e permanecem presos por cerca de cinco a oito meses
em regime fechado para, após todo este tempo, receber uma pena de tratamento compulsório.
Deste modo, surge o dilema: quando era constitucionalmente inocente, ficou preso em
regime fechado, agora, que está condenado é libertado.
MARIA JOÃO MIMOSO
Âmbito do direito de habitação, detenção, posse e usufruto : 3
Contradições judiciais – Nosso sistema de justiça penal precisa começar a enfrentar suas
contradições e estabelecer outros mecanismos de garantia do juízo que não seja a prisão em
regime fechado. Os juízes resistem em aplicar medidas substitutivas enquanto não se chega
ao termo dos processos, mas isso precisa ser repensado.
Por exemplo, quando um homem pratica um crime de roubo, qualificado com o concurso
de agentes, por ser mais de um ladrão e com uso de arma de fogo, sendo ele de bons
antecedentes, ou seja, está praticando crime pela primeira vez, a pena será de cinco anos e
quatro meses de reclusão em regime semiaberto. Ora, desta forma, é muito injusto que ele
aguarde preso em regime fechado uma condenação que de antemão já se sabe que não será
em regime fechado, isso quando o réu não é absolvido e aí a prisão foi um verdadeiro abuso
do Estado.
O tema é polêmico e difícil de tratar, mas estas nuances precisam ser enfrentadas pela
sociedade, pois, a falta de coerência no nosso sistema de justiça penal impede que a aplicação
da justiça produza o efeito preventivo desejado pelo direito penal.
Veja que a Lei de Execução Penal e a Reforma da Parte Geral do Código Penal são da
década de 80 (século XX). No entanto, até hoje, o Estado não construiu estabelecimentos
capazes de atender aos regimes semiaberto e aberto. Desta forma, os juízes têm que aplicar
a prisão domiciliar como alternativa à falta de estabelecimentos.
O Supremo Tribunal Federal (STF) está inclusive sendo provocado a discutir a aplicação
da prisão domiciliar como alternativa à falta de estabelecimentos de regime semiaberto.
Então, aquela máxima de que muitas vezes a defesa do advogado se restringe a obter uma
redução de pena ou um regime mais favorável não possui efetividade já que não existem
estabelecimentos para o cumprimento destas penas.
Assim, mesmo que o advogado queira promover uma boa defesa para seu cliente,
encontrando mérito nas causas que patrocina, não encontra respaldo nos resultados. Acaba
tendo que se restringir a realizar os atos formais nos processos, não podendo garantir ao
cliente o cumprimento daquilo que foi escrito na lei.
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E é aí que reside a relevância contemporânea de Santo Ivo. A sua preocupação de
defender os pobres não era um sentimento religioso inocente. A defesa dos pobres é a busca
de efetividade do Direito, da Justiça. E, quando esta se faz presente na vida dos mais frágeis
e desprovidos de recursos, o seu potencial de universalidade é muito maior.
WAGNER DIAS FERREIRA
Portal Verbo Jurídico | Maio de 2013
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