XVII Encontro de Modelagem Computacional
V Encontro de Ciência e Tecnologia de Materiais
Universidade Católica de Petrópolis (UCP), Petrópolis/RJ, Brasil. 15-17 out. 2014
SINCRONICIDADE EM GRUPOS NEURONAIS: UMA ABORDAGEM VIA
ALGORITMOS GENÉTICOS
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Resumo. Baseado na Teoria de Seleção de Grupos Neuronais este artigo investiga a
emergência de sincronicidade em um grupo neuronal composto por neurônios pulsantes de
Izhikevich. Esse modelo é capaz de reproduzir diferentes padrões de disparo de neurônios
presentes no córtex humano por meio do correto ajuste de seus parâmetros. Assim, esse
trabalho descreve um método para se obter uma configuração de um grupo neuronal
composto por três tipos de neurônios excitatórios e dois inibitórios, por meio de um
algoritmo genético, a fim de permitir a auto-organização da rede neural. Experimentos
computacionais foram realizados e os resultados obtidos mostraram ser possível a
reprodução do comportamento síncrono de um grupo neuronal nas frequências de 3.3Hz,
4.4Hz, 5.5Hz e 6.6Hz. Além disso, foi possível observar a similaridade entre as configurações
dos grupos neuronais resultantes com as encontradas no córtex humano.
Palavras chave: neurônios pulsantes, algoritmo genético, grupos neuronais, teoria da
seleção de grupos neuronais.
1.
INTRODUÇÃO
Várias teorias foram propostas na tentativa de explicar o comportamento do sistema
nervoso e dos processos cognitivos. Entre essas teorias, a Teoria de Seleção de Grupos
Neuronais (Theory of Neuronal Group Selection, TNGS) proposta por Eldeman (1987; 1993)
(Clancey, 1997) destacou-se na tentativa de explicar a emergência de grupos neuronais no
cérebro.
Basicamente, a TNGS estabelece que um grupo neuronal é a unidade básica da maioria
da região cortical do cérebro. O grupo neuronal não é formado por um único neurónio, mas
por um conjunto de 50-10000 células neurais que disparam e oscilam em sincronia em uma
frequência pré-definida. Cada um desses agrupamentos é um conjunto células neuronais
fortemente acopladas que começam o seu processo de desenvolvimento na fase embrionária e
continuam até o início da vida, i. e., eles são desenvolvidos durante a filogenia e são
responsáveis pelas funções mais primitivas do cérebro.
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Em geral, redes com modelos comportamentais mais reais são capazes de reproduzir os
padrões de disparos de neurônios encontrados em muitas partes do cérebro e assim prover
modelos com dinâmicas mais realísticas. Assim, Izhikevich (2003) desenvolveu um modelo
que reproduz o comportamento dos neurônios com bastante precisão e com baixo custo
computacional, permitindo a simulação de redes com um grande número de neurônios.
Portanto, pelas características acima citadas, o modelo de Izhikevich foi escolhido para
simular o grupo neuronal nesse trabalho. A Figura 1 mostra a diferença de comportamento
entre uma rede em que os neurônios disparam de maneira assíncrona e uma rede em que os
neurônios disparam de maneira síncrona.
Figura 1 – Diferença entre comportamentos não síncronos (acima) e síncronos (abaixo).
Izhikevich destacou outro fator importante que deve ser levado em consideração na
simulação de redes auto-organizáveis. Ele propôs, baseado em Connors e Barry (1990), em
Gray e Charles (1996) e em Gibson et al (1999), que os neurônios excitatórios presentes no
córtex podem ser dividos em três tipos: Regular Spiking (RS), Intrinsically Bursting (IS) e
Chattering (CH); e os inibitórios podem ser divididos em dois tipos principais: Fast Spiking
(FS) e Low-Threshold Spiking (LTS).
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Considerando que diferentes configurações de grupos neuronais podem ser geradas
mudando-se o número de neurônios excitatórios e inibitórios presentes na rede, a emergência
de sincronicidade numa rede auto-organizável de neurônios pulsantes foi obtida ajustando-se
o número de cada um dos cinco tipos de neurônios por meio de um algoritmo genético.
Experimentos computacionais foram realizados considerando uma rede com até 4000
neurônios contendo os cinco tipos citados acima.
2.
A REDE
O modelo de neurônio proposto por Izhikevich é uma simplificação do modelo de
Hodkin-Huxley e pode ser descrito pelas seguintes equações diferenciais:
com uma condição de reset auxiliar depois do pulso, dado por:
{
Em que é a corrente recebida de estímulos externos, de outros neurônios ou estruturas, é o
potencial de membrana do neurônio, é a variável de recuperação de membrana, é a taxa
de decaimento da variável , é a sensibilidade da variável para flutuações sub-limiares do
potencial de membrana, é o valor de reset do potencial de membrana após o pulso, é o
valor de reset da variável após o pulso.
Esse modelo é computacionalmente factível (Izhikevich, 2004) e todos os tipos
conhecidos de neurônios podem ser produzidos ajustando-se os parâmetros a, b, c e d
(Izhikevich, 2007).
A Tabela 1 mostra os valores dos parâmetros do modelo de Izhikevich para produzir os
três tipos de neurônios excitatórios e os dois tipos de neurônios inibitórios usados nesse
trabalho, enquanto a Fig. 2 mostra os padrões de disparo de cada um desses neurônios.
Tabela 1 – Parâmetros do modelo de Izhikevich para cada tipo de neurônio.
RS
IB
CH
FS
LTS
3.
a
0,02
0,02
0,02
0,1
0,02
B
0,2
0,2
0,2
0,2
0,25
c
-65
-55
-50
-65
-65
D
8
4
2
2
2
MATERIAIS E MÉTODOS
Na simulação da rede neuronal desse trabalho sinapses, pesos sinápticos e correntes de
simulação foram definidos estocasticamente, sendo possível a obtenção de padrões de disparo
diferentes para uma configuração de rede. Dessa forma, uma desvantagem de se trabalhar com
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redes de neurônios pulsantes é que, devido a saídas não contínuas computadas por esses
neurônios, métodos de aprendizagem baseadas em gradientes ou aproximações hessianas não
são possíveis (Burgsteiner, 2005). Consequentemente, métodos de otimização que requerem
somente um modo de avaliação, como algoritmos evolucionários, funcionam melhor para
esses tipos de problemas.
Sendo assim, nesse trabalho, as simulações foram realizadas usando um algoritmo
genético (Castro, 2006) que ajustou o número de cada um dos 5 tipos dos neurônios
Izhikevich presentes no grupo neuronal, além da intensidade de corrente de estimulação da
rede com o objetivo de produzir sua autorganização.
Experimentos computacionais foram realizados considerando uma rede com até 4000
neurônios de todos os tipos, com os pesos sinápticos definidos de forma randômica no
intervalo de [0, 0.5] para os neurônios excitatórios e [-1, 0] para neurônios inibitórios, cada
cromossomo do algoritmo genético foi representado por um vetor real de 6 elementos como
mostra a Fig. 3 em que N1 a N5 representam o número de neurônios que compõe o grupo
neuronal de cada um dos 5 tipos utilizados de acordo com a equação 4.
Figura 2 – Padrões de disparo de cada tipo de neurônio (Izhikevich, 2003).
N1
N2
N3
N4
N5
N6
Figura 3 – Representação do cromossomo.
De acordo com Izhikevich (2003), a porcentagem de neurônios no córtex humano é de,
aproximadamente, 80% de neurônios excitatórios e 20% de inibitórios. Dessa forma, o
intervalo de possíveis valores de Ni foi definido a fim de permitir uma maior quantidade de
neurônios excitatórios na rede. Os valores estão indicados na Tabela 2
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Tabela 2 – Intervalo de possíveis valores dos parâmetros Ni.
Variáveis
Intervalo
N1
N2
N3
N4
N5
[0, 1]
[0, 1]
[0, 1]
[0, 0.5]
[0, 0.5]
Tipo de Neurônio
Associado
IB
RS
CH
FS
LTS
O último parâmetro do cromossomo (N6, veja Fig. 3) é um fator, no intervalo de [0, 5]
(valores maiores que 5 saturam a rede), que é multiplicado pela corrente com o objetivo de
aumentar sua intensidade.
Levando em consideração os comportamentos da rede mostrados na Fig.1, uma função
objetivo foi definida com o fim de estabelecer a sincronicidade nos grupos neuronais. Como a
porcentagem de neurônios disparando no tempo de uma rede síncrona aproxima de uma onda
quadrada, o ciclo de trabalho e frequência dessa onda dependerão dos tempos de disparos dos
neurônios e a sua altura dependerá da quantidade de neurônios que disparam num certo
momento. Então, a função objetivo usada nesse trabalho medirá a similaridade de dois sinais
usando a função correlação cruzada com lag 0 definida como:
[
]
em que
é o operador de valor esperado. Se a correlação cruzada é calculada com τ = 0
(lag 0), a equação 5 provê uma medida de similaridade entre x e y. Portanto a função objetivo
definida nesse trabalho é a correlação cruzada entre uma onda quadrada de referência e a
porcentagem de neurônios de um grupo que disparam no tempo.
Dois parâmetros da onda quadrada precisaram ser definimos para realização dos
experimentos: ciclo de trabalho e frequência. O menor ciclo de trabalho obtido com esse
modelo foi de 30%, sendo, portanto, definido para a realização dos experimentos. O limite
inferior e superior de frequência que o modelo foi capaz de gerar foi averiguado com o
objetivo de se obter a maior extensão possível de frequências. Tendo isso em mente, os
valores de frequência escolhidos para os experimentos foram: 3.3Hz, 4.4Hz, 5.5Hz e 6.6Hz. A
função correlação cruzada, por sua vez, foi normalizada sendo que valores próximos a 1
indicam forte similaridade. Os valores dos parâmetros do algoritmo genético podem ser vistos
na Tabela 3.
Tabela 3 - Valores dos parâmetros do algoritmo genético.
Parâmetros
Número de variáveis
Número de indivíduos
Número de gerações
Taxa de seleção
Taxa de cruzamento
Taxa de mutação
Valores
5
50
20
98%
70%
0,08%
Métodos
Roleta
Recombinação Intermediária
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4.
RESULTADOS
Nesse trabalho a configuração de um grupo neuronal composto por 5 tipos de neurônios
pulsantes de Izhikevich foi determinada por um algoritmo genético com o objetivo de permitir
a auto-organização da rede. Foram realizados 4 experimentos computacionais, um para cada
frequência sintonizada. Tabela 4 mostra a melhor configuração de cada experimento.
Os resultados mostraram que foi possível encontrar a quantidade apropriada dos cinco
tipos de neurônios para as frequências de 3.3Hz, 4.4Hz, 5.5Hz e 6.6Hz. O número dos
neurônios das redes variou de cerca de 1500 a 2500 neurônios, a porcentagem de neurônios
excitatórios foi de 90% e dos inibitórios foi de 10%. A maioria dos neurônios excitatórios foi
do tipo IS e RS e os inibitórios foram igualmente distribuídos entre os dois tipos escolhidos.
As Figuras 4, 5, 6 e 7 mostram o comportamento da rede após a sintonia realizada pelo
algoritmo genético. É possível observar que em todos os casos a rede apresentou um
comportamento síncrono.
Figura 4 – Grupo neuronal com frequência de 3.3Hz.
Figura 5 – Grupo neuronal com frequência de 4.4Hz.
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Figura 6 – Grupo neuronal com frequência de 5.5Hz.
Figura 7 – Grupo neuronal com frequência de 6.6Hz.
Tabela 4 – Indivíduos mais bem avaliados no algoritmo genético
Frequência
(Hz)
3.3
4.4
5.5
6.6
IB
Número de neurônios de cada tipo
RS
CH
FS
LTS
Total
656
515
424
706
723
265
320
273
2485
1816
1653
1559
776
903
633
408
75
40
201
74
255
93
75
98
Fator de
Corrente
1,06
3,39
2,07
3,26
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5.
CONCLUSÃO
Nesse estudo, a composição de uma rede de neurônios pulsantes foi ajustada por um
algoritmo genético para produzir grupos neuronais com comportamento síncrono. A
composição da rede consistiu de neurônios pulsantes de Izhikevich ajustados para produzir 5
tipos diferentes de padrões de disparo.
Nossos experimentos mostraram que é possível construir grupos neuronais com um
modelo de neurônio com plausibilidade biológica e que rede pode modelar a dinâmica do
córtex de maneira mais realística, pois os padrões de disparos produzidos pelos modelos de
neurônios são os mesmos vistos nos neurônios reais. Portanto, nosso estudo pode resultar num
ganho importante para o entendimento tanto da formação dos grupos quanto da sua dinâmica
de funcionamento. Esperamos que as simulações apresentadas nesse trabalho possam ser
usadas no projeto de outros experimentos numéricos, conduzindo a uma melhor compreensão
da dinâmica das redes neuronais artificiais com plausibilidade biológica.
REFERÊNCIAS
Burgsteiner H. (2005), “Training networks of biological realistic spiking neurons for real-time robot control”, 9th
international conference on engineering applications of neural networks, Lille, France, pp 129–136
Castro, Leandro Nunes de. (2006), Fundamentals of natural computing: basic concepts, algorithms and
applications. Taylor & Francis Group, Boca Raton.
Clancey W. (1997) Situated Cognition: On Human Knowledge and Computer Representations. Cambridge
University Press, New York.
Connors, Barry W., Gutnick, Michael J. (1990), “Intrinsic fire patterns of diverse neocortical neurons”. TINS.
vol. 13, no. 3, p. 99–104
Edelman, G. M. (1987), Neural Darwinism: The Theory of Neuronal Group Selection. Basic Books, New York
Edelman, G. M. (1993), “Neural Darwinism: selection and reentrant signaling in higher brain function”,
Neuron, vol. 10, no. 2, p. 115–125
Gibson, Jay R., Beierlein, Michael, Connors, Barry W. (1999), “Two networks of electrically coupled inhibitory
neurons in neocortex”, Nature. vol. 402, no 4, p. 75-79
Gray, Charles M. (1996), “Chattering Cells: Superficial Pyramidal Neurons Contributing to the Generation of
Synchronous Oscillations in the Visual Cortex”, Science. vol. 274, p. 109-113
Izhikevich E. M. (2003), “Simple model of spiking neurons”, IEEE Transactions on Neural Networks. vol. 14,
no. 6, p. 1569–1572
Izhikevich, E. M. (2004) “Which Model to Use for Cortical Spiking Neurons?”, IEEE Transactions on Neural
Networks, vol. 15, no. 5, p. 1063-1070 (2004)
Izhikevich E. M. (2007), “ Dynamical Systems in Neuroscience: The Geometry of Excitability and Bursting”.
MIT Press, London .
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Synchronicity in Neuronal Groups: a genetic algorithm approach.
Abstract. Based on the Theory of Neuronal Group Selection (TNGS), we have investigated
the emergence of synchronicity in a neuronal group composed of Izhikevich spiking neurons.
The Izhikevich neuron model can reproduce different firing patterns present in the human
cortex through the appropriate selection of the model parameters. From the several types of
neurons found in the human cortex, five can be highlighted and were used in this paper. Thus,
this paper describes a method of finding the configuration (the percentage of each neuron
type and the intensity of the stimulus of a neuronal group) through genetic algorithm in order
to enable the self-organization of the neural network. Computational experiments were
performed and the results obtained showed that was possible to generate synchronous
behavior in the frequencies of 3.3Hz, 4.4 Hz, 5.5Hz, and 6.6Hz. Furthermore, it was possible
to observe the similarity between the resulting configurations of neuronal groups with those
found in the human cortex.
Keywords: spiking neurons, genetic algorithm, neuronal groups, theory of neuronal group
selection.
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