UNIVERSIDADE METODISTA DE PIRACICABA
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO
SENTIDOS DA INDISCIPLINA EM REUNIÕES DE HTPC
COM PROFESSORES DE ENSINO MÉDIO
LÚCIA ELENE DORIGUELO
PIRACICABA, SP
2011
SENTIDOS DA INDISCIPLINA EM REUNIÕES DE HTPC
COM PROFESSORES DE ENSINO MÉDIO
LÚCIA ELENE DORIGUELO
ORIENTADORA: PROFA. DRA. RENATA CRISTINA OLIVEIRA BARRICHELO CUNHA
Dissertação
apresentada
à
Banca
Examinadora
do
Programa de Pós-Graduação
em Educação da UNIMEP
como exigência parcial para
obtenção do título de Mestre
em Educação
PIRACICABA, SP
2011
BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Renata Cristina Oliveira Barrichelo
Cunha (orientadora)
Prof. Dr. Guilherme do Val Toledo Prado
(UNICAMP)
Profa. Dra. Roseli Pacheco Schnetzler (UNIMEP)
Dedico este trabalho
Aos meus pais Ângelo e Madalena,
pelo estímulo, amor dedicado, ajuda e paciência.
Às minhas filhas
Beatriz (in memorian)
Andreza, pela compreensão, orgulho e curiosidade.
- E aí mãe, quantas páginas escreveu?
Hoje você conseguiu
escrever, mãe?
Daniela, pelo afago, carinho e, às vezes, o choro de saudades
Às minhas irmãs
Luciane e Liliane pelo companheirismo, orgulho e estímulo
- Tudo vai dar certo, Lu! Calma!
Às amigas
Priscila, Jamile e Márcia pela dedicação, amizade e ajuda em todas
as horas de aflições.
AGRADECIMENTOS
Muitas pessoas fazem parte da minha trajetória de vida a qual esta dissertação se
vincula. São inúmeros os agradecimentos. Em especial, agradeço:
Em primeiro lugar, à querida Renata Cristina Oliveira Barrichelo Cunha, minha
orientadora, a quem sou extremamente grata por todos os momentos compartilhados
nos últimos anos, e que, sem dúvida, muito colaboram para minha formação acadêmica
e, fundamentalmente, para minha formação enquanto ser humano. Muito obrigada pelo
carinho e pela confiança; por incentivar-me em minhas buscas; por estimular-me e por
acreditar, embora as dificuldades no percurso de pesquisa.
Aos professores Dra. Roseli Pacheco Schnetzler e Dr. Guilherme do Val Toledo Prado
pela atenção e pelas contribuições dadas a este trabalho, no exame de qualificação,
traduzidas em forte estímulo para que eu pudesse concluí-lo.
Às professoras Dra. Roseli Pacheco Schnetzler, Dra. Maria Nazaré da Cruz, Dra.
Josiane Maria de Souza, Dra Luzia Batista e Oliveira Silva e Dra Maria Inês Bacellar
Monteiro pelos diálogos instigantes.
Á professora Dra. Anna Maria Lumardi Padilha por fazer parte da Banca Examinadora.
Ao apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - CAPES –
Brasil, pelo qual foi possível realizar este trabalho.
Aos professores da Faculdade de Educação da UNIMEP, por todo o aprendizado
nesses dois anos.
Á diretora da instituição educativa que permitiu a realização da pesquisa e
principalmente, aos professores que aceitaram fazer parte dessa investigação que muito
contribuiu para a minha formação profissional e humana.
A todas as funcionárias da secretaria de Pós-Graduação da FE/UNIMEP.
Agradeço, ainda, aos queridos colegas do grupo de pesquisa “Formação de
Professores”, do PPGE/UNIMEP, pelos projetos, angústias e sonhos compartilhados.
A todos os amigos que tenho e que compartilharam de inúmeras facetas da minha
trajetória até o momento. Em especial, agradeço as amigas Jamile, Priscila, Renata,
Branca e Juliana, por todos os gestos de carinho e pelas discussões.
Reconhecer o valor formativo do ambiente de trabalho, tornando – o
objeto de reflexão e de pesquisa pelos que nele estão implicados,
consubstancia-se em uma alternativa par irmos além do pensamento
dicotômico que coloca em um lugar o aprender e em outro o fazer e
favorecemos a transformação de algumas de nossas situações de
trabalho em situações de formação ( FERREIRA, 2010, p. 53)
RESUMO
Este trabalho discute os sentidos atribuídos pelos professores do Ensino Médio à
indisciplina escolar no contexto de formação do Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo
(HTPC), em uma escola da rede estadual paulista da região de Piracicaba. O tema das
discussões entre os professores, mediadas pela Professora Coordenadora e pesquisadora,
foi a indisciplina, sugestão do próprio grupo de professores participantes da investigação. A
pesquisa de campo envolveu quatorze professores do Ensino Médio, que se reuniram ao
longo de seis encontros, no 2º semestre de 2009. Os dados foram construídos com base
nas discussões audiogravadas durante os HTPCs, posteriormente transcritas, e com base
em reflexões escritas pelos professores. As discussões foram encaminhadas a partir da
reflexão sobre filmes que a Professora Coordenadora reproduziu (Pro dia nascer feliz, 2006;
Entre os muros da escola, 2008; e Escritores da Liberdade, 2007), com o intuito de estimular
e fomentar as reflexões sobre o tema e responder a questão da pesquisa. Os filmes
escolhidos tinham em comum a proposta de retratar o universo da escola e a indisciplina
dos alunos, sob diversas perspectivas. Para a problematização dos sentidos da indisciplina
foram consultados vários autores, em especial Rego (1996) e Vasconcelos (2004). Zeichner
(1992), Azevedo (2004), Silva (2006), Imbernón (2010), Christov (2008), entre outros
autores, subsidiaram a discussão sobre a formação continuada dos professores no contexto
da escola. Compartilhar no HTPC as experiências e perspectivas sobre a indisciplina, no
diálogo alimentado pelos filmes, permitiu que esse grupo de professores explicitasse e
ressignificasse não só os sentidos atribuídos à indisciplina mas, também, os sentidos da
escola e da profissão docente, tomados como eixos de discussão do trabalho. A dissertação
defende que a formação continuada centrada na escola pode, no contexto do HTPC, a partir
de discussões e reflexões, instigar, apoiar, criar e potencializar a reflexão docente sobre
suas práticas pedagógicas nas escolas. Favorecendo o desenvolvimento pessoal e
profissional dos professores de modo a contribuir, sobretudo, com a construção de uma
escola responsável pela humanização, socialização e ampliação da cultura dos estudantes.
Palavras-chave: Indisciplina, Formação Continuada de Professores, Trabalho Pedagógico
Coletivo.
ABSTRACT
This work argues the directions attributed for the professors of High School to the pertaining
to school indiscipline in the context of formation of the Collective Pedagogical Work, in a
school of the São Paulo state, Piracicaba´s region. The subject of the quarrels between the
professors, mediated for the coordinating and teacher´s researching, was the indiscipline,
suggestion of the proper group of participant professors of the inquiry. The research´s field
involved fourteen professors of High School, who had congregated throughout six meetings,
in second semester of 2009. The data had been constructed on the basis of to the quarrels
recorded during the Collective Pedagogical Work, later transcribing, and on the basis of
reflections written for the professors. The quarrels had been directed from the reflection on
films that the Coordinating Teacher reproduced (Pro dia nascer feliz, 2006; Entre os muros
da escola, 2008; e Escritores da Liberdade, 2007), with intention to stimulate and to foment
the reflections on the subject and to answer the question of the research. The chosen films
had in common the proposal to portray the universe of the school and the indiscipline of the
pupils, under diverse perspectives. For the direction´s problem of the indiscipline some
authors had been consulted, in special Rego (1996) e Vasconcelos (2004). Zeichner (1992),
Azevedo (2004), Silva (2006), Imbernón (2010), Christov (2008), among others authors, had
subsidized the quarrel on the continued formation of the professors in the context of the
school. Sharing the experiences into the Collective Pedagogical Work and perspectives on
the indiscipline, and feeding the dialogue for the films, allowed that this group of professors
not only explain and be sure about the directions attributed to the indiscipline but, also, the
directions of the school and the teaching profession, taken as axles of work quarrel. The
dissertation defends that the centered continued formation in the school can, in the context of
the Collective Pedagogical Work, from quarrels and reflections, to instigate, to support, to
create and make potent to the teaching reflection on its practical pedagogical in the schools.
Promoting and favoring the personal and professional development of the professors in
order to contribute, over all, with the construction of a responsible school for the
humanization, socialization and magnifying of the culture of the students.
Key-words: Indiscipline, Continued Formation of Professors, Collective
Pedagogical Work.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...........................................................................................................11
1. INÍCIO DO CAMINHO: Tecendo os fios...............................................................16
2. CAMINHOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
2.1 Formação continuada de professores................................................................25
2.2 Formação no Contexto da Escola......................................................................29
2.2.1 Formação no Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC) ..................34
3. A INDISCIPLINA NA ESCOLA: Perspectivas....................................................... 40
4. A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA .......................................................................52
5. SENTIDOS DA INDISCIPLINA, DA ESCOLA E DA PROFISSÃO DOCENTE:
ANÁLISE DOS DADOS............................................................................................ 58
5.1 Análises das discussões dos HTPCs..................................................................59
5.2 Análises das reflexões escritas dos professores ..............................................................68
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................73
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS..........................................................................80
Introdução
Este trabalho de investigação de mestrado discute os sentidos atribuídos por
professores do Ensino Médio à indisciplina na escola, no contexto dos encontros do
Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPC, em uma instituição escolar da
rede pública estadual de uma cidade na região de Piracicaba-SP. A pesquisadora,
enquanto professora coordenadora no grupo, acompanhou as discussões dos
professores nos HTPCs, no 2º semestre de 2009, produzindo dados audiogravados
e escritos que foram tomados posteriormente como material de análise.
Os HTPCs são considerados nesse trabalho como oportunidades de
formação continuada com vistas à promoção do desenvolvimento profissional dos
professores e da qualidade social da educação.
A qualidade social da educação no interior da escola, segundo Silva (2009),
implica a organização do trabalho pedagógico e de projetos escolares; formas de
interlocução da escola com as famílias com ênfase no diálogo; a promoção de um
ambiente saudável; uma política de inclusão e de respeito às diferenças; o trabalho
colaborativo nos colegiados e/ou conselhos escolares.
Em outras palavras,
a escola de qualidade social é aquela que atenta para um conjunto de
elementos e dimensões socioeconômicas e culturais que circundam o modo
de viver e as expectativas das famílias e de estudantes em relação à
educação; que busca compreender as políticas governamentais, os projetos
sociais e ambientais em seu sentido político, voltados para o bem comum;
que luta por financiamento adequado, pelo reconhecimento social e
valorização dos trabalhadores em educação; que transforma todos os
espaços físicos em lugar de aprendizagens significativas e de vivências
efetivamente democráticas (SILVA, 2009, p.225).
Essa escola de qualidade social, portanto, supõe uma formação continuada
que contemple a democratização da relação professor - educando, a relação entre
os educadores e seus dirigentes, desses com a comunidade e, por sua vez, com a
sociedade, formando uma rede conectiva que favoreça a democratização do saber
(CORTELLA, 2004).
11
A palavra “formação”, em seu sentido etimológico, conforme Veiga e Viana
(2010), significa dar forma, colocar-se em formação e desenvolver-se. Portanto, está
vinculada à nossa história, preparando-nos para atuação pessoal e profissional.
Assim, a formação é permanente, progressiva e histórica. Envolve diversos recursos
e instâncias, apoiada em diversos modelos de formação inicial e continuada.
Nesse trabalho, que enfoca a formação continuada de professores do Ensino
Médio que ocorre no HTPC e valoriza a reflexão sobre a prática pedagógica, a
experiência está sendo tomada como ponto de partida para essa formação que
acontece na escola.
Larrosa (2002) afirma que experiência é algo que nos toca, nos transforma e
os (de) forma, ou seja, nos atravessa. Para que isso ocorra é necessário uma
interrupção que requer pensar, olhar, escutar, sentir o que nos acontece.
Correia (2003) enfatiza que a formação por meio das reflexões sobre as
experiências dos professores contribui para desenvolver o sentido da escuta para a
interpretação das experiências passadas e dos saberes a ela associados para
possibilitar a rearticulação e recontextualização que as projete para o futuro, sendo
que essas formas variam e são dependentes do contexto histórico. A discussão com
e entre os professores sobre as experiências com a indisciplina na escola permite
conhecermos os sentidos atribuídos ao tema destacado, acompanhando esse
movimento de rearticulação de sentidos.
Alarcão (2000, 2001, 2003) destaca a escola como espaço reflexivo,
valorizando – a como local de aprendizagem para o educando e para o professor. A
autora entende que escola reflexiva é uma organização que pensa nela própria de
forma continua, na sua função social e no desenvolvimento da atividade formativa, a
qual é incumbida.
Nesta perspectiva, Silva (2002), Alarcão (2001, 2003), Barroso (2003),
Azevedo (2004) e Abdalla (2006) concebem que o aprender e o agir profissional
precisam acontecer por meio de trabalho coletivo, por meio de uma cultura
colaborativa, com objetivos comuns, de modo que os desafios sejam compartilhados
e enfrentados no trabalho, para que as mudanças ocorram de fato.
A formação continuada centrada na escola, contexto e objeto de discussão
dessa pesquisa, é defendida por Silva (2002) como aquela que acontece dentro do
12
serviço ou na própria escola em que o docente atua. Esse processo visa favorecer a
reflexão sobre a própria prática e fortalecer os fundamentos teóricos que podem
contribuir com o crescimento pessoal e profissional dos educadores e promover o
êxito no processo de ensino e de aprendizagem.
Christov (2008) reforça essa perspectiva afirmando que a teoria e a prática
estão sempre juntas na experiência do professor. Para ela, construímos teoria
quando lemos as nossas experiências, as questionamos, interrogamos os motivos,
as dúvidas, consequências ou problemas de cada ação, colocando-as em relação
com as contribuições teóricas dos autores.
Na mesma perspectiva, Azevedo (2004) acredita que os educadores, ao
trocarem experiências, constituem uma poderosa maneira de aprender a serem
professores, uma vez que buscam compreender o outro nas redes culturais. Esse
compreender não está no sentido de concordância e sim no de entender como o
sujeito tece suas redes de significação com os muitos fios das observações e
informações da trajetória da sua vida.
Bozzini e Oliveira (2006) complementam que a formação, quando ocorre no
ambiente do trabalho, valoriza a escola como espaço para a construção do trabalho
docente,
oportunizando
trocas
de
experiências
que
contribuem
para
o
aperfeiçoamento do professor quando estas são utilizadas para a reflexão da prática
pedagógica.
Os trabalhos de Cunha (2006), Orsolon (2009), Clemente (2009) e
Domingues (2009) afirmam que o professor coordenador (PC) tem relevante papel
na formação continuada do docente. É o agente responsável pela promoção das
condições para a formação no HTPC. O trabalho desempenhado pelo PC no HTPC,
como ressalta Garrido (2007), é o de facilitador e articulador dos professores que
precisam criar propostas para ir ao encontro dos desafios da escola.
Assim, tendo o HTPC como contexto de investigação e a temática da
indisciplina como eixo norteador das discussões dos professores, a questão
orientadora da pesquisa é: Quais os sentidos atribuídos pelos professores à
indisciplina dos alunos?
13
A pesquisa objetiva conhecer e discutir os sentidos atribuídos pelos
professores à indisciplina dos alunos do Ensino Médio no decorrer das reuniões do
HTPC e compreender o processo formativo que acontece nesse espaço.
Importante destacar que a indisciplina como tema das discussões nos HTPCs
foi sugestão do grupo de professores participantes dessa investigação por ser uma
preocupação constante.
Aquino (1996, 1999), Rego (1996), La Taille (1996), Garcia (1999), Alves
(2002), Vasconcellos (2004), Franco (2003), Souza e Placco (2006), entre outros
autores, reconhecem que a indisciplina é um obstáculo no processo de ensinoaprendizagem e motivo de conflitos entre as escolas e as famílias, entre professores
e gestão escolar (diretor, vice-diretor e professor coordenador). A indisciplina na sala
de aula produz impacto e conflitos na vida dos professores, que enfrentam
dificuldades para administrar as relações e criar alternativas de intervenção para que
se possam contornar as situações com os estudantes indisciplinados.
O conceito e os motivos para a indisciplina estão longe de ser consensuais
devido sua complexidade e multiplicidade de interpretações, o que nos permite
afirmar que seu conceito não é estático, uniforme e muito menos universal. Ela está
relacionada aos conjuntos de valores e expectativas ao longo da história, nas
diferentes culturas dentro de uma mesma sociedade, nas diversas instituições.
Para atender à questão e aos objetivos dessa pesquisa, a apresentação do
trabalho está organizada da seguinte forma:
Capítulo I: O Início do caminho: tecendo os fios - apresenta um breve memorial do
percurso formativo da professora coordenadora e pesquisadora, justificando a
construção do problema e da questão da pesquisa.
Capitulo II: Caminhos da Formação de Professores – discute a formação
continuada dos professores no contexto da escola, notadamente a importância dos
Horários de Trabalho Pedagógico Coletivo (HTPC).
14
Capitulo III: A Indisciplina na escola: perspectivas – introduz a discussão teórica
sobre o fenômeno da indisciplina sob diversas perspectivas, apresentando autores
que ajudarão no diálogo com os enunciados dos professores.
Capitulo IV. A Construção da Pesquisa – apresenta a metodologia do trabalho,
descrevendo o percurso da investigação.
Capitulo V – Sentidos da Indisciplina, da escola e da profissão docente: análise dos
dados - apresenta os eixos de discussão anunciados no título do capitulo com base
no material produzido nos encontros de HTPC.
Capitulo VI - Considerações Finais.
15
Capítulo I – O INÍCIO DO CAMINHO: Tecendo os fios
Acordava ainda no escuro, como se ouvisse o sol chegando atrás das
beiradas da noite. E logo sentava-se ao tear. Linha clara, para começar o
dia. Delicado traço cor da luz, que ela ia passando entre os fios estendidos,
enquanto lá fora a claridade da manhã desenhava o horizonte. Depois lãs
mais vivas, quentes lãs iam tecendo hora a hora, em longo tapete que
nunca acabava. Se era forte demais o sol, e no jardim pendiam as pétalas,
a moça colocava na lançadeira grossos fios cinzentos do algodão mais
felpudo. Em breve, na penumbra trazida pelas nuvens, escolhia um fio de
prata, que em pontos longos rebordava sobre o tecido. Leve, a chuva vinha
cumprimentá-la à janela. Mas se durante muitos dias o vento e o frio
brigavam com as folhas e espantavam os pássaros, bastava a moça tecer
com seus belos fios dourados, para que o sol voltasse a acalmar a
natureza.Assim, jogando a lançadeira de um lado para outro e batendo os
grandes pentes do tear para frente e para trás, a moça passava os seus
dias (Marina Colasanti, 2004, p.1-2).
A escolha dessa epígrafe me remete às lembranças do Curso de Gestão
Escolar, o qual muito acrescentou em minha formação continuada. Precisamente,
lembro da disciplina “A Avaliação Educacional e Institucional”, quando a professora
introduzia sua aula lendo trechos de textos de diversos autores, os quais traziam
discussões pertinentes aos assuntos que seriam discutidos no decorrer da aula.
Dos excertos lidos, o conto “A Moça Tecelã”, de Marina Colasanti, tocou-me
profundamente. Ao retomá-lo, emprego-o para narrar a constituição da minha
formação pessoal e profissional como quem borda um enorme tapete.
Nesse tapete muitos fios. Coloridos e escuros. Os momentos nublados foram
pouco a pouco sofrendo transformações. Aprendizagens importantes ocorreram e,
aos poucos, os fios escuros se tornaram mais claros, iluminados pelos dourados, do
brilho que representavam os momentos felizes.
Tecer/escrever pensamentos e conhecimentos exige cuidado, paciência,
determinação, pois precisa ser construído, desconstruído e reconstruído muitas
vezes para que esse se torne cheio de vida e de riquezas.
Ao traçar o “risco do bordado” recuperamos momentos de nossas vidas e a
atividade da escrita potencializa a leitura do desenho. Admito, escrever é um
processo que envolve muitos elementos, é doloroso, contudo, prazeroso. Por meio
da escrita agregamos valores, conhecimentos, crescimento intelectual. É um saber
16
inicial que possuímos e, aos poucos, desenvolve-se na roda de conversa que
estabelecemos com outros sujeitos. Para Marques (2006, p.15), “escrever é isso aí:
iniciar uma conversa com interlocutores invisíveis, imprevisíveis, virtuais apenas,
sequer imaginados de carne e ossos, mas sempre ativamente presentes”.
O bordado desse tapete começa numa pequena cidade do interior do estado
de São Paulo chamada Rafard, onde nasci. Morávamos em um pequeno sítio,
distante da cidade, longe de tudo e de todos. Passei meus doze primeiros anos
nesse local.
Em 1978, aos meus oito anos, tive meu primeiro contato com o conhecimento
sistematizado na escola que ficava distante da minha residência, aproximadamente
quatro quilômetros. Os quatro primeiro anos
de estudos se deram em escolas
públicas rurais. Nessa primeira escola existia uma única sala de aula onde tínhamos
as quatro séries do Ensino Fundamental. Havia o hábito de ajudar sempre os alunos
que possuíam dificuldades. Leitura de livros de histórias era quase inexistente.
Quando acontecia, a professora saía da sala de aula e sentávamos todos embaixo
de uma mangueira. Nossas mentes viajavam, imaginando a linda história que a
professora deliciosamente dramatizava, o que nos enchia de vontade de tomar o
livro em mãos para lê-lo individualmente. Após concluirmos o quarto ano fomos
estudar na cidade.
Nas favelas, no senado/Sujeira pra todo lado/Ninguém respeita a
constituição/Mas todos acreditam no futuro da nação/Que país é esse?/Que
país é esse? /Que país é esse? ...(Legião Urbana1).
Ao som dessa música recordo-me que, em 1982, fui matriculada na quinta
série, longe de onde morava. O acesso à escola era difícil devido ao transporte,
mas, mesmo assim, foi possível estudar. A nova realidade era totalmente diversa
daquela vivenciada anteriormente: outra organização escolar, exigências de
posturas e cumprimentos de normas. Importantes professores fizeram parte da
1
Que País é Esse? Composição de Renato Russo. Estilo pop Rock. Lançada em 1987. Disponível em:
<http://www.vagalume.com.br/legiao-urbana/que-pais-e-esse.html>. Acesso: 29 Jun. 2010.
17
minha formação, os quais me permitiram o crescimento.
Outra novidade era o
acesso a biblioteca da escola, o que oportunizou a descoberta e o gosto pela leitura.
No percurso do “ginásio” ao então denominado Inciso, que corresponde hoje
ao Ensino Médio, várias pessoas foram significantes em minha formação intelectual
e pessoal. Contudo, não posso deixar de ressaltar a professora de Ciências. Como
esquecer
a
aula
sobre
as
células?
Ver
aquelas
estruturas
marcou-me
profundamente, a ponto de interferir em minha opção profissional.
A partir dessa surge outra fase em minha vida: a Universidade. Novas
canções acompanharam esse período.
Anda, quero te dizer nehum segredo/Falo nesse chão da nossa casa/Vem
que tá na hora de arrumar/Tempo, quero viver mais duzentos anos/Quero
não ferir meu semelhante /Nem por isso quero me ferir/Vamos precisar de
todo mundo/Pra banir do mundo a opressão/Para construir a vida
nova/Vamos precisar de muito amor/A felicidade mora ao lado/E quem não
é tolo pode ver/A paz na Terra, amor/O pé na terra/A paz na Terra, amor/O
sal da Terra(....) (Roupa Nova2).
Quanto ouvir Beto Guedes em meus estudos solitários à noite, na calada da
madrugada... Estudava as disciplinas que compunham a grade curricular do curso
de Licenciatura em Ciências Físicas e Biológicas, com habilitação em Biologia na
Universidade Metodista de Piracicaba - UNIMEP. Cursar Biologia foi extremamente
gratificante, emocionante, algo maravilhoso. Apaixonada literalmente pelo curso.
No inicio do curso de licenciatura, apenas uma coisa me incomodava: a
resistência. Ser professora não estava em meus objetivos, não concebia essa ideia.
Imaginava que os conhecimentos que eu tinha eram insuficientes e que não
conseguiria ter postura para lecionar. O ato de ensinar, em minha concepção, era
compreendido como um “sacerdócio”, um “dom”.
Em 1992, último ano do curso, precisei enfrentar os medos e lecionar em uma
escola pública na cidade de Elias Fausto. Disciplinas que não correspondiam à
minha formação. Lecionei Historia para a oitava série e Educação Moral e Cívica
para as sextas séries. Que desafio! Como lecionar essas disciplinas de forma que
2
O Sal da Terra: Composição: Beto Guedes - Ronaldo Bastos. Disponível em: <http://letras.terra.com.br/roupanova/63883/>. Acesso: 29 Jun. 2010.
18
os alunos entendessem, não decorassem, estimulando-os para aprender e gostar de
aprender?
Recorri a exemplos dos professores do percurso estudantil anterior ao curso
universitário, aos meus mestres, os quais eram referências. Além desses, obtive
ajuda nos estudos dos colegas que cursavam História.
Os planos de ensino eram, aos poucos, construídos, as aulas eram
planejadas. “Botando a mão na massa” foi possível aprender a elaborar o plano de
ensino de acordo com as normas da Secretaria Estadual de Educação, a preparar
aula e fazer registros em diários de classe. Contudo, o mais significativo, foi o
contato com os educandos.
Aprendi com eles a importância de estabelecer a relação dialógica, de ouvilos e dar a oportunidade da fala, pois através dela o plano das aulas foi, várias
vezes, reconstruído e avaliado.
Descobri o desejo de lecionar, a vontade de ensinar, de fazer parte dessa
profissão pouco reconhecida. Nas palavras de Mariano (2006, p.21),
Descobrimos o prazer de atuar, de nos sentirmos parte integrante de um
elenco que faz o espetáculo acontecer. Descobrimos o reconhecimento e os
aplausos advindos da platéia e de alguns colegas de profissão. Quiçá da
equipe dos bastidores. Descobrimos, talvez, o amor à arte...
Dessa forma, vários outros desafios foram acontecendo. Em 1993, lecionei
Matemática para alunos em uma escola da periferia de Capivari. Eram aulas no
período noturno. Outra realidade, classes lotadas. Tínhamos alunos em sua
respectiva idade e série e também alunos com idade/série divergente. Como fazer
da matemática algo menos temido e mais próximo daqueles alunos?
O desafio encontrava-se no planejar as aulas. Foi preciso dedicação,
compromisso, e principalmente, estudo, pois, caracteriza Mariano (2006).
é estudando, ensaiando, atuando... estudando, ensaiando, atuando...
repetindo esse “movimento”, indefinidamente ...A atuação, acompanhada
de ensaio e estudo, é o melhor caminho para mostrarmos que sabemos ler
a reação da platéia, perceber que precisamos buscar foco de luz, que a
peça precisa estar em outro lugar. É a união desses três aspectos – estudo,
ensaio e atuação- que nos permite fazer improvisos, sobreviver, descobrir –
nos, seguir em frente (p 24).
19
Esses dois anos iniciais de minha carreira estimularam a vontade de
aproveitar todas as oportunidades de “capacitação”, de
formação
continuada
daquela época. Nos anos posteriores, as disciplinas lecionadas por mim foram
relacionadas à minha graduação, Ciências Biológicas.
Com a reorganização das escolas, em 1995, fiquei afastada durante dois
anos da educação. O retorno aconteceu na metade de 1998, quando fui convidada a
lecionar matemática para uma oitava série. Essa classe tinha características
peculiares: a maioria dos alunos era repetente, os professores desistiam de lecionar,
problemas disciplinares, muitas dificuldades pedagógicas. Novamente estava
vivenciando todas as complexidades da escola, as dificuldades desses educandos.
Esses obstáculos me fizeram estudar, procurar caminhos, muitas vezes difíceis, os
quais nem sempre deram certo.
No ano seguinte, outro percurso muito interessante aconteceu. Lecionar para
alunos do EJA3.
Outra realidade, outro universo, outro caminhar em busca do
ensinar. Trabalhar com educandos mais maduros possui outro significado para o
fazer docente. Esses buscavam o aprender, pois isso era exigido deles, em seus
trabalhos.
No entanto, as mudanças mais marcantes aconteceram entre os anos de
2001 a 2005. Precisei lecionar em uma cidade próxima, chamada Monte Mor. Fiquei
lecionando e trabalhando em uma escola durante quatro anos. Tive a oportunidade
de trabalhar com professores determinados, críticos e que estudavam e, com eles,
muitas experiências foram
trocadas e muitos projetos desenvolvidos. O projeto
ambiental “S.O.S Preservação” é um dos exemplos. Tinha por objetivo incentivar os
alunos a buscarem conhecimentos e que fossem participativos socialmente dentro
do espaço que habitavam. Era um projeto multidisciplinar, envolvia conhecimentos
históricos,
sociais,
matemáticos,
biológicos,
entre
outros.
Para
o
seu
desenvolvimento tivemos parcerias com uma Organização Não-Governamental e
também com a Prefeitura do Município. Vários trabalhos foram divulgados e a escola
ganhou prêmios e reconhecimento dos pais.
3
EJA: Educação de Jovens e Adultos - forma de ensino da rede pública do Brasil, com objetivo de desenvolver
o ensino fundamental e médio com qualidade para as pessoas que estão fora da idade escolar.
20
No ano de 2003, por conta desse projeto, fui convidada a elaborar um projeto
para pleitear a Coordenação Pedagógica. No início, foram “passos de tartaruga”,
pois não tinha noção de como iniciar, o que fazer e como fazer, uma vez que minha
formação não contemplava esses saberes. Groppo (2008) tem razão quando afirma
que a passagem de docente para professor coordenador desencadeia uma
“turbulência afetiva” devido às divergências encontradas.
Esse aprendizado foi acontecendo aos poucos, com o apoio da direção e
também com a colaboração dos professores. Os Horários de Trabalho Pedagógico
Coletivo - HTPCs eram construídos de acordo com a realidade e necessidades dos
professores.
Com a introdução do “Programa do Ensino Médio em Rede” pela Secretaria
Estadual de Educação, em 2004, os encaminhamentos do HTPC mudaram. O
programa, com características de “efeito cascata”, seguia o modelo de uma rede.
Eram “formados” primeiramente os Assistentes Técnicos Pedagógicos das Diretorias
de Ensino, depois os professores coordenadores nas escolas e esses, nos HTPCs,
“formavam” os docentes. Os temas pertinentes eram: formação do professor
coordenador no programa Ensino Médio em Rede, professores e alunos, currículo
da escola média, o projeto político-pedagógico e o planejamento escolar.
As pautas eram previamente organizadas pelos módulos. Nos encontros,
os professores liam, de forma individual ou em grupos, e discutiam as ideias de
autores como Antonio Nóvoa e Edgar Morin. Juntamente com as discussões, muitas
trocas de experiências ocorriam.
Entendo
que
o
fato
das pautas
serem previamente
organizadas
engessavam o HTPC, uma vez que os assuntos eram únicos em todas as escolas
que desenvolviam o projeto, não privilegiando as características do local do trabalho.
Contudo, eram momentos que nos faziam estudar, ler e pensar sobre a continuidade
de nossa formação. Nesse sentido, o fato da existência do tempo de estudo supera
os pontos negativos. Acredito, portanto, que esses momentos tenham sido um dos
mais ricos vivenciados por mim como professora coordenadora.
Em abril de 2005 mudei de cidade, fui morar em Piracicaba. Também comecei
a atuar na Coordenação Pedagógica em uma escola pública estadual. Encontrei
21
outro grupo de professores extremamente participativo e sensibilizado com a escola
onde atuavam, comprometido em trazer sempre algo de melhor para os educandos.
Nova necessidade de continuar os estudos, pois “não importa onde você
parou, em que momento da vida você cansou, o que importa é que sempre é
possível e necessário recomeçar” (DRUMMOND, 2004). Retornei aos estudos,
busquei a formação na Pós-Graduação Lato Sensu.
O percurso se deu entre 2005 e 2007 no Curso de Gestão Escolar. Sentia que
minha formação não dava mais conta de subsidiar os meus colegas e amigos de
trabalho na função de Professora Coordenadora.
A sede pelo saber potencializou-se gradativamente, sendo impossível, como
disserta Tardif (2002), separar os saberes docentes das outras dimensões do ensino
ou do trabalho realizado diariamente. Esses saberes estão interligados com os
condicionantes: emoções, fatores sociais, políticos, econômicos, entre outros,
conectados com o professor, com a pessoa, com sua identidade, suas experiências
de vida, suas histórias de vivências e o que fazem.
Nesse meu caminho outras oportunidades desafiadoras apareceram, como
ocupar a função de Vice-Diretora em uma escola de Educação Fundamental de
Ciclo I, em 2007. Novas aprendizagens, necessidades de outras leituras, como da
área de Alfabetização. Exigências diferentes das vivenciadas anteriormente nos
Ensinos Fundamental Ciclo II e Médio.
Durante esse período participei do Curso de “Formação de Professores em
Educação Ambiental e Resíduos Sólidos”, oferecido pelo Departamento de
Economia, Administração e Sociologia da Escola Superior de Agricultura ”Luiz de
Queiróz” (ESALQ/USP) e Programa “USP Recicla”, com apoio do Comitê de
Fomento às Iniciativas de Cultura e Extensão Universitária da Pró-Reitoria de
Cultura e Extensão Universitária da USP. Nesse percurso meu olhar voltou-se à
formação docente em relação à Educação Ambiental.
No final do curso foi exigida a elaboração de um projeto ambiental exequível
dentro das escolas. A partir desse projeto entusiasmei-me para prosseguir meus
estudos acadêmicos, agora com um nível de desafio maior. Empenhei-me para
conseguir ser admitida em curso de mestrado que tivesse como foco a formação e o
estudo em relação à Educação Ambiental.
22
Com a indicação de uma professora que lecionava na ESALQ, me inscrevi no
Programa de Pós-Graduação em Educação na UNIMEP. Fui aprovada e constatei
que a carga horária do curso de mestrado impossibilitava a minha permanência na
Vice-Direção.
Recebi um convite para atuar novamente na coordenação pedagógica de
uma escola pública estadual. Elaborei um projeto, realizei a entrevista para
admissão e iniciei novamente o meu trabalho de Professora Coordenadora, agora no
segmento do Ensino Médio. A escola enfrentava diversos desafios, entre eles a
preocupação em aumentar o índice do IDESP (Índice de Desempenho de Educação
no Estado de São Paulo).
Várias inquietações, indagações e preocupações me acompanhavam nesse
momento: como propiciar o estudo e viabilizar o trabalho coletivo para que o trabalho
pedagógico fluísse e as expectativas depositadas fossem atingidas?
Através das disciplinas do Curso de Pós-Graduação, outros questionamentos
somaram-se à experiência como Professora Coordenadora. Contudo, as aulas da
disciplina “Necessidades “Formativas dos Professores”, sob a responsabilidade da
Professora Dra. Roseli Pacheco Schnetzler foram de fundamental importância para
repensar as questões investigativas para meu projeto de ingresso no mestrado.
Durante atividades propostas pela professora me deparei com muitas
inquietações relacionadas à minha prática como professora coordenadora. Certa
vez, conversando com a professora Roseli a respeito de minhas preocupações, no
início de 2009, perguntei-lhe: “- Professora, como fazer esses professores
participarem dos HTPCs? O que faço? Os professores estão apáticos, não
participam, não comentam as leituras propostas. A sensação que tenho é que o
assunto colocado para discussão não tem importância para eles. Ocorrem, às vezes,
alguns pequenos comentários, contudo, superficialmente. Percebo que é uma fala
mecanizada. A maioria da vezes acabo
falando sozinha. Um monólogo, na
verdade”.
Depois de ouvir o desabafo, a professora Roseli pediu para que eu contasse
como aconteciam os HTPCs. Expliquei a ela como eram preparados esses
momentos: escolhia os textos para a leitura conforme as necessidades que eu
acreditava que os professores possuíam (alguns dos textos eram “sugestões” da
23
Secretaria Estadual de Educação) e propunha a discussão, dividindo a pauta com
outros assuntos da escola.
Após o relato, a professora Roseli falou: “- Por que você não muda a forma de
fazer? Chegue para eles e pergunte: O que vocês gostariam que fosse discutido nos
HTPCs? Em que, você, enquanto professora coordenadora, poderia ajudá-los? Do
que eles precisam?”
Resolvi seguir a sugestão e fazer o questionamento aos professores. Assim,
indaguei o grupo de professores com as seguintes questões: Quais eram as
principais dificuldades na parte pedagógica? O que eu, enquanto professora
coordenadora, poderia auxiliá-los na formação continuada e desenvolvimento
profissional, visto que legalmente essa é a principal função do professor
coordenador?
A partir desses questionamentos os professores foram expondo as principais
dificuldades, fizemos uma pequena lista dos assuntos indicados e definimos que o
tema indisciplina era a maior preocupação entre os professores participantes.
Distante da problemática da Educação Ambiental e mergulhada no cotidiano da
escola pública, preocupada com a promoção de uma formação continuada no HTPC
e reconhecendo a necessidade de colaborar com a compreensão do fenômeno da
indisciplina na escola, meus interesses e expectativas de pesquisa foram se
modificando. Uma nova questão orientaria minha pesquisa: Quais os sentidos
atribuídos pelos professores à indisciplina dos alunos?
Desta forma, a pesquisa agora apresentada e intitulada “Sentidos da
indisciplina em reuniões de HTPC com professores de Ensino Médio” passou a ser
construída. Durante o seu processo de constituição e mesmo após sua finalização,
muitas pedras
no caminho foram encontradas, retiradas
e outras apareceram
novamente... Mas como me lembra Fernando Pessoa (2004, p.358), “pedras no
caminho? Guardo todas, um dia vou construir um castelo...”.
24
CAPITULO II – CAMINHOS DA FORMAÇÃO DE PROFESSORES
Forma
Reforma
Disforma
Transforma
Conforma
Informa
Forma
José Lino Grünewald
Este capítulo apresenta uma revisão bibliográfica sobre a formação docente,
destacando a escola como espaço formativo com vistas à promoção da reflexão
sobre as práticas pedagógicas. Está subdividido em: Formação Continuada de
Professores, Formação no Contexto da Escola e Formação no Horário de Trabalho
Pedagógico Coletivo (HTPC).
2.1. Formação Continuada de Professores
A discussão acerca da formação continuada de professores está orientada
pela relação formação/trabalho.
No modelo da racionalidade técnica, as circunstâncias de formação são
exteriores ao trabalho e, como destaca Correia (2003), visam contribuir com a
25
manutenção do equilíbrio do sistema, assegurando a adaptação técnica e a
adaptação psicológica dos indivíduos ao contexto.
Essa formação, pautada pela aquisição de conhecimentos relativos a
princípios, leis e teorias que explicam o processo de ensino-aprendizagem,
estabelece normas e regras a serem cumpridas pelo professor nos momentos da
prática (VEIGA e VIANA, 2010), ignorando a complexidade dos fenômenos
educativos.
Contrapondo-se a esse modelo e apoiada na idéia de que o processo de
aprender a ensinar prolonga-se por toda a carreira do professor, a perspectiva da
racionalidade prática aponta para outro modelo de formação.
Segundo Zeichner (1992), a formação deve ter como base a reflexão sobre a
prática na sala de aula e sobre as condições sociais de sua produção. Essa reflexão
não corresponde a um conjunto de procedimentos padronizados, mas, sim, a uma
forma de encarar e responder às situações-problema. A reflexão, para o autor,
implica intuição, emoção e paixão e três atitudes importantes: abertura de espírito
(ouvir
mais de
uma
opinião);
responsabilidade
(questionar-se: gosto
dos
resultados?); e sinceridade. A reflexão é um processo que ocorre antes, durante e
depois da ação, e possibilita a resolução de situações-problema em contexto.
Gomez (1992) distingue bem essas duas concepções de formação
destacando que, na primeira, o professor é visto como técnico-especialista,
cumpridor de regras e conceitos instituídos pelo conhecimento científico, enquanto
que, na segunda concepção, o professor reflexivo é autônomo e toma decisões
orientadas pela avaliação que faz da sua realidade.
A crítica ao modelo da racionalidade técnica é baseada no princípio de que
não existe uma teoria científica que permita, na prática, uma única escolha de
meios, regras e técnicas para resolver os problemas.
Porque as situações de ensino são incertas, únicas, variáveis e portadoras de
conflitos de valores, as decisões em relação à escola, ao ensino e ao currículo
devem levar em conta os conhecimentos científicos e a reflexão sobre a prática
(GOMÉZ, 1992).
Goméz (1992) destaca que a natureza do processo de reflexão, no entanto,
não é mecânica, nem simplesmente um exercício de construção de novas ideias. A
26
reflexão não pode ser considerada apenas um processo psicológico individual,
independente do conteúdo, do contexto ou das interações. A reflexão implica em
um mergulho consciente do indivíduo no mundo de suas experiências, as quais são
carregadas de interpretações divergentes, valores, correspondências afetivas,
interesses sociais e de cenários políticos.
O sucesso do professor está na sua capacidade de lidar com a complexidade
e de resolver problemas práticos por meio da integração inteligente e inovadora
entre conhecimento e reflexão, denominada por Schön (1992) como processo de
reflexão na ação ou diálogo reflexivo.
Schön (1992) enuncia três níveis de reflexão que integram o pensamento
prático reflexivo: o conhecimento na ação (saber fazer e saber falar), reflexão na
ação (situação de diálogo com a situação problemática) e reflexão sobre a ação
(reflexão que o indivíduo faz após a ação, sobre as características e processos da
própria ação). O autor afirma que esse processo forma o pensamento reflexivo do
profissional e é vital para que ele compreenda os processos de ensinoaprendizagem.
A formação do professor como profissional reflexivo caracteriza uma nova
perspectiva para a formação. De aplicador de teorias, o professor passa a
ser
considerado produtor de conhecimentos sobre a própria prática. A consequência
desse tipo de formação é a mudança profunda na concepção de sua formação e do
processo de desenvolvimento profissional.
Valorizam-se os saberes da prática profissional que têm origem no cotidiano,
os conhecimentos, habilidades, o saber-fazer e o saber-ser (TARDIF, 2002; DUBAR,
2003).
Dessa forma, a formação continuada passa a ser orientada por situações em
que os indivíduos se reconheçam nos saberes produzidos pelas experiências de
formação e por momentos que suscitem indagações sobre as intenções, valores e
maneiras de fazer. Esses questionamentos sobre o como ensinar, como entrar na
relação com os outros, quais os efeitos das ações e dos valores nos quais se apóia,
exigem do docente disponibilidade e capacidade de discernir sobre suas convicções
e ações.
27
O processo reflexivo promove a autoconsciência e a necessidade de uma
formação que contemple as seguintes dimensões relacionadas por Placco e Silva
(2000):

Dimensão técnico-científica: necessidade da formação docente no que diz
respeito aos conhecimentos técnico-científicos relacionados à sua formação
básica e flexibilidade para mudanças;

Dimensão da formação continuada: uma vez que o profissional tenha essa
disponibilidade e flexibilidade na formação, é necessário que ele continue
pesquisando, questionando sua área de conhecimento, buscando novas
informações, analisando-as e incorporando-as em sua formação. A habilidade
de busca, o interesse e a motivação são os motores propulsores para que a
formação continuada seja assumida;

Dimensão do trabalho coletivo e da construção coletiva do projeto educativo:
o coletivo de uma escola abrange todos os atores envolvidos no processo
educativo e deve promover, por meio da formação intencionalmente
desenvolvida, a cooperação e a integração relacionadas às necessidades e
às possibilidades da transdisciplinaridade;

Dimensão dos saberes para ensinar: essa dimensão envolve os saberes
produzidos pelos docentes sobre os educandos, nos seguintes aspectos:
origem social do educando, suas experiências e conhecimentos prévios, entre
outras características que possam fortalecer o aprender no âmbito coletivo.
Está presente também nessa dimensão o conhecimento sobre as finalidades
e utilização dos recursos didáticos, assim como outros conhecimentos
relacionados ao afetivo-emocional, aos objetivos educacionais e aos
compromissos do cidadão e do profissional;

Dimensão crítico-reflexiva: importância do processo reflexivo no aprender,
que é indispensável para qualquer processo metacognitivo. O processo
reflexivo do aprender exige disponibilidade e compromisso do formador e do
formando;

Dimensão avaliativa: capacidade avaliativa do docente em desenvolver
habilidades de coletar, trabalhar, analisar, levantar hipóteses a respeito de
dados, encaminhar propostas e soluções para as questões encontradas.
28
Nessa perspectiva, a formação do professor é compreendida como um
processo longo, de construção e reconstrução de conhecimentos da formação e dos
saberes da experiência.
Como afirmam Veiga e Viana (2010), não pode ser
pensada apenas como uma adaptação a uma condição profissional. Deve ser crítica,
catalisadora das trocas entre as diferentes potencialidades de aprendizagem no
exercício do trabalho.
Essa formação passa a ser pensada como intervenção nos espaços coletivos
de trabalho e como possibilidade de reconstrução de identidades pessoais e sociais
dos docentes. Formação que pretende desenvolver a escuta, visando a
interpretação das experiências passadas e dos saberes a elas associados,
favorecendo a sua rearticulação e recontextualização (CORREIA, 2003).
2.2. Formação Continuada em Contexto
Admitindo a importância da reflexão sobre a experiência como condição para
a formação continuada, é importante valorizar aquela que acontece no contexto da
própria escola em que o professor atua.
A formação continuada em contexto, ou centrada na escola, é
composta por três elementos principais: por fazer coincidir o
trabalho/formação no espaço/tempo/pessoas, ou seja, fazer com que o
exercício do trabalho permita aprender a aprender com a experiência,
instituindo um processo de aprendizagem permanente; por organizar sob a
forma de projetos de ação para responder aos problemas identificados no
contexto; e por abandonar a ideia de transferência da formação segundo
uma lógica de aplicação, instrumentalizada, escolarizada (CUNHA, 2006, p.
223).
A escola como espaço de formação dos professores pode favorecer a
reflexão sobre a própria prática, fortalecer os fundamentos teóricos, promover o
crescimento pessoal e profissional dos docentes e o êxito do processo de ensino
aprendizagem.
29
Para Silva (2002) e Abdalla (2006), a formação no contexto de trabalho deve
estar orientada pelos assuntos concretos relacionados ao dia-a-dia da sala de aula,
com suas contradições e desafios. Assim, o desenvolvimento do docente se dá por
meio das trocas de experiências. Argumentam que a formação centrada na escola
necessita de ações inovadoras que contribuam com a renovação dos projetos
educacionais.
A formação no contexto da escola rompe com a visão de professores
cumpridores de programas na medida em que não mais separa aqueles que
concebem os programas de ensino daqueles que os aplicam.
Considerando a escola como esse contexto de trabalho e formação reflexiva,
Alarcão (2000, 2001 e 2003) salienta a importância de um ambiente tranquilo, dos
seus membros terem clareza do que ele significa e do papel que nele devem
desempenhar. Os professores precisam reconhecer o momento de dizer sim e
também de dizer não, promovendo, dessa forma, a prevenção, no sentido de
evitarem as repressões e os possíveis conflitos relacionados ao poder e/ou à
competitividade.
A autora entende, também, que a escola reflexiva é uma organização que
pensa sobre si mesma, sobre sua missão social, sobre sua estrutura, e se confronta,
no desenvolvimento da sua atividade, num processo simultaneamente avaliativo e
formativo. O objetivo desse tipo de comportamento é o desenvolvimento qualitativo
da organização escolar e dos que nela realizam o seu trabalho de estudar, ensinar
ou apoiar a função educativa. Esse desenvolvimento se dá por meio de
aprendizagens individuais e coletivas.
Uma escola reflexiva, em desenvolvimento e aprendizagem ao longo de sua
história, forma-se por meio do pensamento e de práticas reflexivas, resultantes do
desejo de quem dela participa, de compreender a sua razão de ser, as
características que lhe são peculiares, os constrangimentos que a afetam e as suas
potencialidades.
Da visão que se tem sobre a escola, que deverá evoluir de acordo com as
mudanças sociais, deriva seu próprio projeto, interativamente construído por meio do
diálogo entre seus membros, no entrelaçar de estratégias ascendentes e
descendentes.
30
Alarcão (2001) assinala características que definem a escola reflexiva:

A centralidade das pessoas nas escolas e o poder da palavra: os
sujeitos interagem por meio do exercício da palavra, pela qual
expressam, compartilham, demonstram sentimentos, argumentam,
interpretam, entre outras ações;

Liderança, racionalidade de diálogo e pensamento sistêmico: por
meio
desses
mecanismos
constrói-se
uma
escola
interativa,
participativa, reflexiva e democrática;

A escola e seu projeto próprio: a elaboração do projeto educativo
é resultado de todas as interações, reflexões, avaliações do coletivo
escolar na construção dos objetivos, das metas e das estratégias;

A escola entre o local e o universal: a escola é constituída por
meio do seu projeto especifico, de acordo com seu projeto educativo,
no entanto, esse projeto é socializado por meio do diálogo com outras
escolas. Estabelece-se, assim, uma rede comunicativa do local com
outras instituições, o que a torna global;

A educação para o e no exercício da cidadania: a escola vive em
contradição com a sociedade, que é competitiva, individualista e não
solidária. Esses aspectos contrariam as propostas de mundo
globalizado, que tem aproximado as pessoas, possibilitando-lhes
pleitear uma formação para a cidadania, a quem deve compreender a
sua realidade, exercendo sua liberdade e responsabilidade;

Articulação político-administrativo-curricular-pedagógica: essas
dimensões
não
podem
ser
trabalhadas
em
compartimentos
estanques, desvinculadas umas da outras. É necessário que se
compreendam essas dimensões para que o projeto educativo seja
elaborado e aplicado;

O
protagonismo
do
professor
e
o
desenvolvimento
da
profissionalidade docente: diante de toda a complexidade em relação
à profissionalidade docente, o professor, como individuo social,
assume seu papel na política educativa, uma vez que acompanha
31
todo o desenvolvimento da instituição escolar, pois ele permanece
nesse local por muito mais tempo que o aluno;

O desenvolvimento profissional na ação refletida: a atividade do
profissional docente demanda relações com outros indivíduos, de
forma dialógica, interativa e reflexiva, nas instituições escolares, as
quais produzem práticas sociais permeadas por valores, crenças e
conhecimentos. Estas práticas estão impregnadas pelas situaçõesproblemas, exigindo do professor a busca pela continuidade da sua
formação;

O desenvolvimento ecológico de uma escola em aprendizagem:
a escola que não quiser desaparecer precisa responder às mudanças
ocorridas no mundo e no ambiente que a rodeia.
Alarcão e Tavares (2003) afirmam que nas últimas décadas a escola veio
assumindo um papel fundamental no processo educativo, o qual perpassa três
níveis:
investigação
educacional,
mudança
educacional
e
desenvolvimento
profissional docente que privilegia a formação centrada nos estabelecimentos de
ensino.
Esse cenário reflexivo com abordagem de formação que atribui aos
profissionais a capacidade de pensarem a sua pratica e de construírem e
reconstruírem o seu conhecimento a partir do campo de ação, caracterizado
por dinâmicas de incertezas e por decisões altamente contextualizada. Essa
situação epistemológica acontece devido à observação reflexiva e de um
diálogo permanente com as situações atuais e com os atores que nela
atuam e na sábia mobilização dos saberes de referência que possibilitam a
compreensão da ação (ALARCÃO e TAVARES, 2003, p. 132).
A escola, compreendida com lugar de aprender e lugar de fazer, precisa
contar com uma gestão participativa e com lideranças (individuais e coletivas)
capazes de compreender as mudanças necessárias para que a formação tenha
como finalidade a inovação e o desenvolvimento organizacional da escola. É preciso
considerar que a principal finalidade dessa formação é estimular e estruturar o
sistema de mudança.
32
A formação deve se orientar no sentido de que os professores sejam capazes
de elaborar diagnósticos sobre os problemas da instituição e mobilizar as suas
experiências, saberes e ideias para encontrar as soluções possíveis. Os professores
precisam conversar entre si e trocar suas expectativas e experiências como ponto
de partida para a construção de consensos.
Embora alguns professores desvalorizem esses momentos de intercâmbio de
idéias ou “contação de casos”, considerando-os como “abobrinhas” e/ou ”troca de
figurinhas”, não se pode ignorar que revelam modos de interpretar as situações
vividas (AZEVEDO, 2004).
Azevedo (2004) argumenta que os educadores precisam trocar experiências e
informações sobre como desenvolvem as atividades em sala de aula, quais recursos
utilizam, as necessidades que contemplam, as dificuldades encontradas, entre
outras. Essa “troca”, segundo a autora, constitui-se em uma poderosa maneira de
aprender a ser professor, uma vez que ocorre entre iguais, é imediata, parte de uma
solicitação implícita ou explícita e tem o intuito de ajudar.
No entanto,
para ser bem sucedido, qualquer projeto de formação contínua precisa que
os educadores sejam valorizados, respeitados e ouvidos - devem expor
suas experiências, ideias e expectativas. É preciso que o saber advindo de
sua experiência seja valorizado; que os projetos identifiquem as teorias que
eles praticam e criem situações para análise, e critiquem suas práticas,
reflitam a partir delas, dialoguem com bases nos novos fundamentos
teóricos, troquem experiências e proponham formas de superação das
dificuldades (FUSARI, 2007, p. 220).
O cotidiano escolar é um espaço de interação e formação, porque nele se dá
a relação com o outro (singular e plural), com o que se sabe e com o que não se
sabe a respeito de si mesmo. Nesse espaço, transitam e são operadas múltiplas e
complexas interpretações e negociações entre as políticas educacionais e as redes
sociais de cada um dos sujeitos nesse processo, incluindo-se aí, as trajetórias
escolares, a formação acadêmica, as expectativas e os desejos.
O “material” dessa formação centrada na escola, portanto, é a experiência
construída pelo professor ao longo da sua trajetória profissional. Para Larrosa
(2002), a experiência é algo que nos toca, nos transforma e nos de(forma).
33
Entretanto, esse processo depende de um tempo reservado ao diálogo, período em
que ocorrem as trocas de experiências que nos mobilizam a refletir (pensar, olhar,
escutar, sentir o que nos atravessa). Os sujeitos atribuem sentidos aos
acontecimentos,
à
aprendizagem
e
ao
conhecimento.
Esses
sentidos
compartilhados podem vir a orientar perspectivas de mudanças na forma de pensar
e/ou de agir dos próprios sujeitos a partir do diálogo no coletivo de professores.
O desenvolvimento profissional do docente está vinculado a projetos
centrados na escola, com os quais esse profissional e todos os demais agentes
estejam, coletivamente, comprometidos e envolvidos, incluindo a construção do
projeto político - pedagógico, que deve estar norteado por uma concepção
democrática. Só assim o projeto permitirá que sejam desenvolvidas capacidades e
potencialidades dos alunos, relativas ao aprender os conteúdos e a construir
conhecimentos fundamentais para a compreensão e transformação da realidade, da
sua inserção e participação na sociedade; enfim, da construção, de fato, da sua
cidadania.
2.2.1 Formação no Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo –
HTPC
O Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo, HTPC, como será referido daqui
por diante, é considerado nesta pesquisa, como espaço formativo privilegiado.
As pesquisas realizadas por Bozzini e Oliveira (2006) e Mendes (2008)
descrevem o processo histórico da conquista desse espaço formativo nas escolas
públicas do Estado de São Paulo.
O HTPC começou a ser implantado no final da década de 1980, no Governo
de André Franco Montoro, devido ao alto índice de fracasso escolar. Nesse período,
era denominado de Horário de Trabalho Pedagógico (HTP) e era dirigido aos
professores do Ciclo Básico, correspondente ao Ensino Fundamental Ciclo I.
O HTP conferia aos professores momentos individuais e coletivos de
formação, visando ao aperfeiçoamento profissional. Segundo Mendes (2008), a
proposta do HTP era de revalorização docente e propunha, como principal ação, o
34
equilíbrio entre as horas-atividade dedicadas à preparação das aulas, à correção de
trabalhos, à coordenação interdisciplinar e pedagógica e à reciclagem e
aperfeiçoamento docente.
Conforme apontam Bozzini e Oliveira (2006), essas ações não foram
suficientes para a resolução dos problemas do ensino enfrentados na época. Havia,
ainda, a necessidade de outras mudanças na escola: novas propostas, elaboração
de novos projetos e posturas de compromisso coletivo dos docentes.
Em 1991, por meio do Projeto da Escola Padrão, que tinha como objetivos a
recuperação da qualidade do ensino, sua modernização e a utilização das novas
tecnologias, o HTP foi proposto para os professores dessas escolas, que
correspondiam a mais ou menos 10% (dez por cento) dos educadores ativos do
Estado de São Paulo. Em 1995, com a Reorganização Escolar das Escolas
Públicas, o HTP foi assegurado a todos os professores e foi criado o cargo de
Professor Coordenador nas escolas estaduais.
O espaço do HTP foi instituído como coletivo e tinha como função a
articulação dos docentes com os demais segmentos da escola e a conexão entre as
atividades desenvolvidas em salas de aula e as diretrizes educacionais (BOZZINI e
OLIVEIRA, 2006; MENDES, 2008).
De acordo com as autoras, o HTP, em 1996, tem sua denominação mudada
para HTPC - Hora de Trabalho Pedagógico Coletivo. Em 1997, por meio das
reivindicações orientadas pelo Sindicato dos Professores do Estado de São Paulo
(APEOESP), o HTPC foi aberto a todos os professores do Ensino Fundamental e
Médio da rede estadual de ensino, tornando-se obrigatório aos professores de 1ª a
4ª séries e optativo aos demais. Em 1998, ele passou a ser obrigatório a todos os
professores que tivessem carga horária igual ou superior a dez horas-aula semanais
como composição da jornada. O foco desses encontros era garantir momentos
coletivos de formação entre os docentes.
Atualmente, o HTPC é obrigatório a todos os docentes, com duração de duas
a três horas, conforme a carga horária do professor. Continua com o objetivo de
formação coletiva entre os docentes, no entanto, é tarefa complexa garantir um
horário que consiga atender o maior número de professores em cada unidade
escolar, devido à organização dos períodos de aula.
35
A mudança horária na grade curricular de cinco para seis aulas, no período
diurno, e de quatro para cinco aulas, no período noturno, tem provocado alguns
contratempos, pois o professor pode lecionar no máximo oito horas-aula diárias.
Essa mudança estrutural promove limitações aos encontros da HTPC, dispersando
os grupos de trabalho e colocando em risco esse espaço já conquistado.
O Comunicado da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (CENP)
da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo (SEE), de 6 de fevereiro de
2009, com o objetivo de estabelecer as bases para o funcionamento das HTPCs,
recomenda aos Dirigentes de Ensino, Supervisores de Ensino e Diretores de
Escolas:
1.
O HTPC é fundamentalmente espaço de formação continuada docente
de cunho pedagógico, destinada à discussão, acompanhamento e avaliação
da proposta pedagógica da escola e do desempenho do educando. Esse
espaço deve proporcionar momentos de estudos, discussão e reflexão sobre
o currículo e sobre questões relacionadas à melhoria da prática docente;
2.
Os HTPCs deverão ser planejados e organizados pelo Professor
Coordenador de cada segmento do ensino fundamental e médio, em sintonia
com toda a equipe gestora, para garantir a integração do coletivo de
professores do respectivo segmento;
3.
O planejamento e organização dos HTPCs devem, sobremaneira,
considerar: as demandas docentes de acordo com as prioridades da escola;
elaboração da pauta, a partir das contribuições dos participantes; divisão das
tarefas relacionadas à reunião, como os registros, escolha de textos e a
organização dos estudos com os participantes; organização das formas de
avaliação das reuniões pelo coletivo participante; pressuposição de formas
de registros das discussões, avanço, dificuldades, intervenções propostas e
decisões tomadas, a necessidade de apoio dos supervisores e da oficina
pedagogia das Diretorias de Ensino;
4.
Cabe ao Professor Coordenador organizar o horário, o qual deverá
assegurar a participação de todos os professores do mesmo segmento em
um único dia da semana, com reuniões, no mínimo, de duas horas
36
consecutivas. Quando existe a impossibilidade desse cumprimento, há
necessidade de se organizar dois grupos permanentes de docentes, em dois
dias diferentes da semana. Se mesmo assim existir impossibilidades, o
HTPC poderá, em caso de absoluta excepcionalidade, justificada e assinada
pelo diretor da escola, com a anuência do supervisor de ensino, ser
organizado em qualquer dia da semana, desde que fique assegurada a
participação dos professores em duas horas consecutivas de trabalho
coletivo pedagógico;
5.
As escolas que têm Professor Coordenador de segmentos de ensino
diferente deverão organizar, sempre que possível, as reuniões bimestrais
envolvendo todos os professores;
6.
As escolas de Tempo Integral devem oportunizar a participação dos
docentes que atuam nas disciplinas do currículo básico junto com os das
oficinas curriculares;
7.
Nas escolas que não comportarem o posto de Professor Coordenador
nos segmentos existentes, essa função ficará sob a responsabilidade do
Diretor da Escola.
Entre algumas dificuldades para a operacionalização do HTPC, Bozzini e
Oliveira (2006) mencionam que algumas dessas reuniões se tornam desgastantes,
uma vez que ocorrem geralmente no final do período de trabalho do professor. Ao
contrário de serem produtivas, contribuem para um clima de cansaço e sobrecarga
das atividades docentes, prejudicando a participação destes.
Os estudos de Mendes (2008) apontam alguns aspectos a serem garantidos
na organização desses momentos: gestão democrática e decisões tomadas
coletivamente; descentralização das decisões; acompanhamento do trabalho
desenvolvido nos HTPCs pelo Diretor da Escola; plano do Professor Coordenador
(PC) apresentar discussões a partir de diversas temáticas, que devem mirar as
necessidades dos professores. Nesse caso, também, o desenvolvimento do projeto
político-pedagógico da escola e as práticas docentes devem ser sistematicamente
trabalhadas por meio do encaminhamento das dificuldades, como parte do processo
de ensino-aprendizagem.
37
Relativo a esse aspecto, Micheletti (2007, p. 22) afirma que
É no Horário de Trabalho Pedagógico Coletivo – HTPC – que os
direcionamentos são dados, visando cumprir as ações escolares previstas,
por meio da discussão, reflexão e avaliação das atividades realizadas.
Trata-se de um espaço especifico no qual desenvolve o trabalho de
formação continuada com vistas à consecução dos objetivos da Secretaria.
Esse trabalho de formação continuada deve ser pautado no desenvolvimento
do trabalho coletivo, na investigação da ação pedagógica, na cooperação a favor do
desenvolvimento profissional e da melhoria do ensino oferecido pelos docentes aos
seus alunos. A formação com essa estrutura requer organização de tempo/espaço
na
escola,
aproximação
às
necessidades
formativas
da
escola,
a
co-
responsabilidade dos professores para o desenvolvimento profissional, e o
investimento no Professor Coordenador, no sentido de proporcionar um tipo de
reflexão para além da socialização das trocas de procedimentos de atividades
(DOMINGUES, 2009).
Nessa perspectiva, a pesquisa de Oliveira (2006) revela que o HTPC pode ser
um espaço de formação contínua desde que seja utilizado para a reflexão e colabore
para subsidiar o professor no desenvolvimento diferenciado de seu trabalho.
O que não significa, necessariamente, uma formação com vistas ao
cumprimento dos objetivos da Secretaria, mas de discussão e proposição de
alternativas coerentes para o grupo de professores.
Nesse sentido, Imbernón (2009) ressalta que as trocas de experiências,
quando compartilhadas dentro de projetos educativos constituídos entre iguais,
potencializam a comunicação na realidade social, possibilitando a formação em
todos os campos educacionais e rompendo com o individualismo e o isolamento
profissional. Para esse autor, a formação vai além de aprender, ela gera
intervenções.
A formação continuada precisa instigar, apoiar, criar e potencializar a reflexão
docente sobre suas práticas pedagógicas nas escolas, permitindo o exame das
teorias envolvidas, estabelecendo um constante processo de autoavalição “do que
faz” e “do porquê faz”. Isso somente será possível quando a escola tiver um projeto
38
educativo que seja peça “chave” na organização da instituição escolar e, também,
base para o processo de formação continuada centrada na escola.
Deve-se
considerar
toda
a
complexidade
da
instituição
escolar,
historicamente constituída e situada, na qual ações são conduzidas por seus
profissionais, dentre eles o Professor Coordenador.
Os trabalhos de Cunha (2006), Orsolon (2009), Christov (2009), Clementi
(2009), Domingues (2009), entre outros, salientam a importância do Professor
Coordenador (PC) dentro da unidade escolar, desempenhando o seu papel em
relação ao seu principal alvo, que deve ser o de mediador da formação de
professores durante os HTPCs.
Silva (2008) compreende que para o PC exercer o papel articulador dessa
formação, ele precisa traçar um plano de ação que envolva a comunidade escolar.
Na concepção do autor, a escola fornece alguns instrumentos que potencializam a
ação articuladora como o Projeto Político - Pedagógico, que simboliza o importante
exercício de autonomia da escola, permitindo o (re)pensar nas dimensões internas e
externas dessa instituição.
Orsolon (2009) salienta que é importante que o PC compreenda que o
trabalho deve ser planejado de forma coletiva, ou seja, com os demais atores
situados naquele determinado contexto escolar. O planejamento visa direcionar as
ações desses sujeitos com a finalidade de explicitar os seus compromissos frente à
elaboração do projeto educativo da escola e para que eles apresentem as
necessidades relativas ao seu cotidiano escolar e suas expectativas e estratégias
em relação a projetos de mudança. Essas ações estão ligadas, de forma subjetiva,
ao saber-fazer, ao saber-ser e ao saber-agir, ações essas que envolvem as
dimensões técnicas, humanas e políticas do PC.
A transformação das reuniões que acontecem na escola em espaço de
reflexão e produção de saberes sobre a docência exige uma metodologia
proposta e dirigida pelo PC, cuja liderança é essencial para que tais
reuniões não assumam a condição de horário de trabalho perdido (BRUNO
e CHRISTOV, 2007, p. 61).
39
Garrido (2007) ressalta que o trabalho realizado pelo PC no HTPC é de
fundamental importância para que, em âmbito coletivo, os docentes criem propostas
para responder aos desafios da escola. É nesse espaço que PC e professores
compartilham suas dificuldades, angústias e refletem sobre suas práticas, formandose reciprocamente.
Orsolon (2009) contribui com seus estudos, no sentido de afirmar que, nos
últimos tempos, vivenciamos desafios mediante os quais, muitas vezes, sentimo-nos
despreparados. Temos constatado indícios de constantes mudanças nos diversos
campos do conhecimento, nas organizações sociais, nas diferentes culturas e
sociedades. Essas mudanças chegam à escola, promovendo questionamentos que
demandam, do seu coletivo, reflexões e discussões.
40
CAPÍTULO III – INDISCIPLINA NA ESCOLA: PERSPECTIVAS
Meu bom senso me diz...
Saber que devo respeito à autonomia, à dignidade e à identidade do
educando e, na prática, procurar a coerência com este saber, me leva
inapelavelmente à criação de algumas virtudes ou qualidades sem as quais
aquele saber vira inautêntico, palavreado vazio e inoperante. De nada
serve, a não ser para irritar o educando e desmoralizar o discurso hipócrita
do educador, falar em democracia e liberdade mais impor ao educando a
vontade arrogante do mestre. (Freire, 2009, p 62).
Este capítulo apresenta perspectivas teóricas que discutem e argumentam
sobre a indisciplina no espaço escolar.
Discutida intensamente no Brasil desde os anos 1990, por diversas
perspectivas teóricas, ocupa, no entanto, ainda nos dias atuais, grande espaço na
produção acadêmica. É considerada um dos principais obstáculos no processo de
ensino- aprendizagem, porque dificulta o diálogo entre professores e alunos, entre
as escolas e as famílias, e entre professores e gestão escolar (diretor, vice-diretor e
professor coordenador).
A indisciplina escolar causa impacto e conflito na vida dos professores e
colabora com os processos de estresse a que comumente esses profissionais são
acometidos, especialmente pela dificuldade em administrarem e criarem alternativas
de intervenção para lidar com as situações geradas na relação com estudantes
indisciplinados (AQUINO, 1996, 1999; REGO, 1996; VASCONCELLOS, 2004;
FRANCO, 2003; SOUZA e PLACCO 2006).
Para os professores do Ensino Médio envolvidos com esta pesquisa, a
indisciplina é um grande desafio e fonte de preocupação, o que justificou seu
interesse pela discussão e estudo do tema durante os encontros de HTPC, contexto
dessa pesquisa.
A discussão sobre a multiplicidade de sentidos conferidos à indisciplina fazse necessária neste momento do trabalho, uma vez que esta pesquisa busca
responder a questão: Quais os sentidos atribuídos pelos professores à
indisciplina dos alunos?
Por meio de levantamentos bibliográficos realizados para a sustentação
teórica sobre o tema, pude constatar um número elevado de autores que tratam do
41
assunto a partir de diferentes pontos de vista. Entre eles, podemos encontrar
estudos apoiados em Piaget, Mafffesoli e Vygotsky.
Aquino (1996, 1998, 1999), Araújo (1996) e Parrat -Dayan (2008) apoiam-se
nos estudos de Piaget, cuja preocupação foi elucidar como o sujeito chega ao
estágio de respeito às regras.
Segundo Piaget, o sujeito passa por diversas fases, divididas em: anomia (o
bebê não percebe que existem regras), heteronomia (a criança já percebe a
existência de regras, mas segue a imposição dos adultos) e autonomia (ela percebe
que existem regras e o respeito é gerado por acordos mútuos) (PIAGET, 1994).
Para Piaget, o sujeito autônomo é aquele em quem a fonte das regras está
em si próprio, em sua capacidade racional de discernir entre o certo e o errado.
Através de sua teoria, ao explicitar o desenvolvimento do juízo moral das crianças
como um processo psicogenético, ele mostra que é impossível o sujeito ser
autônomo sem antes passar pelo estagio da heteronomia (ação de seguir as regras
externas). Defende ainda a autodisciplina, que não é imposta de fora, mas inspirada
pela busca pessoal da necessidade do equilíbrio.
Para Aquino (1996), a indisciplina presente no espaço escolar contemporâneo
é responsável por confrontos, ameaças, muros e grades; e dos impasses que
ocorrem na escola, resultam certos embates entre agentes que compõem esse
espaço de forma direta ou indireta: professor, aluno, corpo gestor, entre outros.
Segundo o autor, a indisciplina é um sintoma escolar que se dá nas relações
educativas, ou seja, ela não existe como algo em si. Assim como não podemos ver a
escola como uma instituição independente e autônoma em relação ao contexto
sócio-histórico. Existe, pois, a dependência entre a escola e a sociedade: uma
dependência histórica.
Nesse sentido, Aquino (1996) tece dois olhares interpretativos sobre o tema: o
olhar sócio-histórico e seus condicionantes culturais, e o olhar psicológico, cujas
determinantes são as relações entre as famílias dos educandos e a escola.
Em seu estudo, o autor constata que a escola promove expectativas
moralizadoras nas práticas pedagógicas, deixando a desejar, muitas vezes, a
objetividade epistêmica fundamental da instituição escolar, que é o trabalho com os
conteúdos escolares. Dessa maneira, entende que três decorrências são reforçadas:
42
desperdício de forças do talento profissional, o desvio da função e a quebra do
contrato pedagógico. Tudo isso gera insatisfação e ambiguidade.
Esses fatores enfraquecem os paradigmas da instituição escolar, o que é
sentido pela instituição familiar, indicando perda de visibilidade dos sentidos sociais
da educação de forma integral. Para Aquino (1996), a indisciplina é um fenômeno
transversal que perpassa todas essas unidades conceituais (professor/aluno/escola).
Araújo (1996) discute as questões referentes à indisciplina, apoiado em
Piaget: “toda moral consiste num sistema de regras, e a essência de toda a
moralidade deve ser procurada no respeito de que o individuo adquire por essas
regras” (p. 103). Dessa premissa, retirou dois temas básicos: o primeiro, a
vinculação entre regra e moral; o outro ponto refere-se à importância que o respeito
às regras (e não a obediência) exerce no desenvolvimento da moralidade, o qual
apresentará como uma forma prática para a ação do educador diante do problema
da indisciplina na sala de aula.
Para Araújo (1996), a autonomia é comumente confundida com “fazer tudo
que se acha certo”, mas, na verdade, o conceito de autonomia para Piaget refere-se
à existência de regras fundamentais, as quais devem ser estabelecidas com a
colaboração mútua dos sujeitos, para que ocorra um acordo entre as partes
envolvidas.
O autor coloca que a indisciplina na escola se refere ao desrespeito às regras
estabelecidas. O autor destaca, no entanto, que é de fundamental importância a
forma como as regras foram construídas: se foram impostas coercivamente ou
construídas de forma democrática. Se a regra foi imposta de forma coerciva,
autoritariamente, o sujeito pode não se sentir obrigado a cumpri-la e, nesse caso, a
indisciplina pode ser uma forma de protesto.
No espaço escolar existem diferentes formas dos professores lidarem com os
enfrentamentos dos alunos e atitudes indisciplinadas. Esses enfrentamentos passam
por posturas permissivas ou autoritárias da escola. Nesse impasse, métodos de
repressão são utilizados, no entanto, eles funcionam apenas com os sujeitos que
têm medo das autoridades ou por elas sentem afeto. Nos casos em que esses
sentimentos não estão em jogo, os indivíduos ignoram as regras, as ordens
impostas e, por exemplo, quanto mais o professor grita, mais os alunos se
43
satisfazem interiormente. De outro lado, estão as escolas permissivas, onde também
há problemas de indisciplina gerados por falta de contratos pedagógicos. Como
solução para essa dicotomia em relação à indisciplina escolar, Araújo (1996)
defende a democratização da escola por meio das relações de respeito mútuo e
reciprocidade.
Aquino (1999) também concorda que a ação pedagógica, para que aconteça,
depende da organização do espaço, do tempo e da presença de regras. Defende
que toda relação institucionalizada se inicia de uma parceria entre sujeitos
específicos em prol de um propósito. Existe um contrato entre esses sujeitos, o qual
delimita lugares e funções conforme as regras.
O não cumprimento dessas regras é interpretado pelos professores, segundo
Aquino (1998), a partir de três hipóteses: a primeira é de que o educando seria
desrespeitador porque a escola é permissiva; a segunda hipótese aborda o
educando como “sem limites” e responsabiliza a família pela “má educação”; a
terceira hipótese levantada é de que o aluno seria desinteressado.
Para Aquino (1998), as três hipóteses cometem equívocos desde o princípio,
uma vez que a disciplina não é pré-requisito para a ação pedagógica e, sim, produto
ou efeito do trabalho desenvolvido cotidianamente na sala de aula. O autor destaca,
ainda, que o aluno indisciplinado com um professor nem sempre será com os
demais, além da ideia de que, para se iniciar uma atividade em sala de aula, o
professor precise de silêncio e obediência.
A pergunta que se faz a respeito dessas questões apontadas sobre
indisciplina seria, então: O que fazer para solucionar essa problemática? Aquino
(1998) discorre sobre a possibilidade de a indisciplina ser indício de que a
intervenção docente não está se processando a contento. Ele comenta que, para o
professor, a indisciplina é algo que precisa ser resolvido para que o ensino possa ser
realizado.
Parrat-Dayan (2008) contribui com a discussão acrescentando que a
indisciplina escolar aumentou nesses últimos anos devido a diferentes causas,
sendo a massificação do ensino um dos fatores que colaborou para a emergência da
diversidade dos educandos. Esses educandos pertencem a heterogeneidades
44
culturais e frequentam o mesmo lócus de estudo - a escola. Portanto, a causa da
indisciplina decorreria tanto de fatores externos como internos à escola.
Os fatores externos, de grandes dimensões, referem-se às condições
socioeconômicas desses indivíduos, em uma malha de representações, de valores e
de condições de existência. Já a origem interna pode estar ligada ao ambiente
escolar, às condições de ensino-aprendizagem, às relações entre professores e
educandos, ao perfil do aluno, bem como à sua capacidade de adaptação ao
sistema escolar. Acrescenta-se a essa lista, a falta de motivação do educando, a
ausência de normas que propiciem um equilíbrio de comunicação entre os
envolvidos na relação escolar, a ausência de consideração aos ritmos biológicos dos
discentes e, finalizando, a falta de autoridade do professor.
Nessa multiplicidade de causas, não podemos esquecer que a escola não
está isolada da sociedade. Pelo contrário, ela está inserida no contexto social, do
qual reproduz os problemas.
Guimarães (1996), apoiada em Maffesoli, atenta para a ambiguidade do
espaço escolar. A autora observa que, de um lado, temos ações da escola que
aplicam as leis e as normas determinadas pelos órgãos centrais que uniformizam o
comportamento das pessoas e, de outro, ocorre a dinâmica dos grupos internos, os
quais estabelecem interações, rupturas e possibilitam a troca de ideias, palavras,
sentimentos. Contudo, a escola está estruturada para a uniformização, para que
todos sejam iguais. Isso se exerce por diversos mecanismos disciplinares, com a
imposição de atitudes de docilidade.
Segundo a autora, é preciso construir um projeto político-pedagógico que leve
em conta as características dos educandos de hoje. A organização do ano escolar,
dos programas e das aulas, assim como a estrutura dos prédios e sua conservação
precisam considerar o gosto e as necessidades dos alunos. A autora entende que
quando a escola não tem significado para o aluno, a mesma energia que pode leválo ao envolvimento, ao interesse, pode transformar-se em apatia ou explodir em
indisciplina e violência.
Conforme Rego (1996), a perspectiva vygotskiana pode responder a inúmeros
questionamentos sobre a indisciplina. Embora não faça referências explicitas a essa
45
questão, é possível reconhecer a contribuição dessa teoria a partir da gênese do
psiquismo humano em seu contexto histórico-cultural.
Um dos estudos de Rego (1996) aponta dois aspectos preliminares ligados à
indisciplina: um se refere às inúmeras configurações e enfoques que a noção de
indisciplina pode assumir ou suscitar; o outro diz respeito à tentativa de se analisar
os pressupostos subjacentes às ideias e às explicações sobre o fenômeno da
indisciplina. Este se encontra presente, geralmente, no meio educacional.
Segundo esse estudo, a indisciplina está longe de ser consensual, pois é
complexa e dá margem a múltiplas interpretações, portanto, seu conceito não é
estático, nem uniforme, tampouco universal. A indisciplina está relacionada a um
conjunto de valores e expectativas que variam ao longo da história, nas diferentes
culturas e até numa mesma sociedade, nas suas diversas classes sociais, nas suas
divergentes instituições, ou, ainda, dentro da mesma camada social ou organismo.
Os sentidos dados à indisciplina, no plano individual, dependem da vivência
de cada sujeito e do contexto em que ela ocorre. Assim, os padrões para se
caracterizar a indisciplina, e os atos indisciplinados, foram passando por diversos
processos de transformação ao longo do tempo e, também, estão relacionados às
diferentes dinâmicas sociais.
De acordo com Rego (1996), entre as relações atribuídas à sua origem, há
aquelas que a entendem como manifestação de um indivíduo ou de um grupo de
indivíduos,
os
quais
demonstram
comportamento
inadequado,
rebeldia,
intransigência, desacato; atitudes traduzidas como “falta de educação” ou de
“respeito pela autoridade”. Nessa perspectiva, esses indivíduos teriam incapacidade
de se ajustar às regras ou normas-padrão do comportamento humano. As regras,
nesse caso, seriam imprescindíveis para a manutenção da ordem, e o que se
propõe é o controle e coerção dos educandos. Nessa visão, todo ato de
manifestação de inquietação, de questionamento, de discordância, de conversa ou
desatenção é entendido como indisciplina. A disciplina, ao contrário, é caracterizada
pela busca do silêncio, da docilidade e da passividade.
Rego (1996) comenta que quando a “manutenção da disciplina” está
associada à “tirania”, as diretrizes são encaradas como meio de prática autoritária,
relacionadas à opressão e enquadramento, razão pela qual as regras na escola são
46
subvertidas, abolidas, ignoradas. Nesse caso, a indisciplina seria uma virtude,
coragem de ousar, de desafiar os padrões vigentes.
A autora, no entanto, discute o fenômeno da indisciplina em outra
perspectiva: a de se compreender que a vida em sociedade pressupõe a criação e o
cumprimento de preceitos capazes de nortear as relações, possibilitar os diálogos, a
cooperação e a troca entre membros de um grupo social. Sendo assim, o papel da
escola estaria em fomentar regras e normas orientadoras para o seu funcionamento
e para a convivência entre os diferentes atores que nela atuam.
O modo de entender/interpretar a disciplina/indisciplina acarreta uma série de
implicações à prática pedagógica, as quais fornecem elementos capazes de interferir
não somente nos tipos de interação estabelecidos entre a instituição escolar e os
alunos, e na definição de créditos para avaliar o desempenho da escola, como o
estabelecimento dos objetivos que se quer alcançar.
Se o modo de compreender a indisciplina é inatista, a ação pedagógica se
orienta pela ideia de que as características são inatas, independente das influências
do outro ou dos fatores históricos-culturais; se a perspectiva é ambientalista,
baseada na filosofia
empirista e positivista, o sujeito
é entendido como mero
resultado de modelagem e condicionamento social.
Contrariamente a esses modos de enxergar a indisciplina, a perspectiva
vygotskiana acredita que os indivíduos são formados a partir de inúmeras e
constantes interações com o meio (contexto físico e social), nas quais se incluem
dimensões interpessoais e culturais que estabelecem, desde seu nascimento e
durante todo seu percurso de vida, a constituição significativa e ressignificativa,
responsável pela internalização dos processos externos.
Analisando-se a indisciplina por meio de um quadro mais amplo, temos a
visão abrangente, integrada e dialética dos diferentes fatores que atuam na
formação do comportamento e desenvolvimento individual. Pode-se afirmar, a partir
dessa perspectiva, que as questões relativas ao sujeito indisciplinado estão
intimamente ligadas às suas experiências e ao seu percurso educativo, os quais
trazem as características do grupo social e seu momento histórico, no qual esse
sujeito esteja inserido. Aos traços do comportamento humano e aos valores do
sujeito vinculam-se o aprendizado que se dá por meio de sua apropriação de “ser
47
social”, no seu grupo cultural. Assim, o fato de o sujeito ser indisciplinado está
relacionado à multiplicidade de influências recebidas, do repertório do seu grupo
cultural. Essas influências são internalizadas em um processo ativo e singular de
seu aprendizado.
Rego (1996) explica que o processo de constituição do sujeito se dá por meio
das inúmeras interações sociais, das informações e influências dos diferentes
elementos mediadores que compõem o grupo social e cultural, incluindo pessoas,
instituições, meios de comunicação e instrumentos disponíveis no ambiente.
A autora também coloca que a constituição familiar é de grande importância
na constituição do sujeito que, no entanto, não se reduz a essa experiência. Os
indivíduos interagem com outros indivíduos e com outros ambientes, além do
familiar, os quais também o constituem como sujeitos. Sendo assim, a escola não
pode se eximir da tarefa educativa, no que se refere à disciplina.
Ao se referir a essas implicações na prática escolar, em relação ao confronto
entre o comportamento dos alunos e a expectativa da escola, Rego (1996) coloca
que:
A prática escolar cotidiana deve dar condições para que esses educandos
conheçam essas expectativas, construam e interiorizem valores,
principalmente, desenvolvam mecanismos de controle reguladores de sua
conduta. Para que isso seja possível é necessário que a escola e os
educadores aprendam adequar as exigências às possibilidades e
necessidades dos alunos. Os alunos, por sua vez, mais do que obedecer e
se conformar com as regras estabelecidas devido às punições e ameaças,
precisam ter a oportunidade de conhecer as intenções que as originaram,
assim como suas consequências caso sejam infringidas. O papel de
mediação que o professor exerce é de fundamental importância. É
necessário também aos educadores além de refletirem constantemente
sobre as regras presentes na escola (São coerentes? São justas? São
necessárias? Podem ser negociadas ou flexibilizadas?) busquem uma
coerência entre a conduta e aquela que se espera dos alunos. (REGO,
1996, p. 99).
Vasconcellos (2004) argumenta que um dos elementos que dificulta o
enfrentamento da problemática disciplinar está no fato de o educador não dispor de
uma concepção, de um método, de uma ferramenta eficiente para lidar com ela. O
educador está marcado, de modo geral, pela concepção idealista: ele tem uma série
de ideias bonitas sobre disciplina, mas não sabe o porquê de não conseguir colocá48
las em prática: falta-lhe análise dos fatores determinantes, clareza de objetivos e
mediações concretas. Ele estaria buscando conscientizar a comunidade a respeito
do sentido da disciplina. Mas, como se dá essa conscientização?
Para o autor, essa conscientização se dá pela dialética, na/da ação-reflexãoação. A preocupação estaria em os seguimentos sociais envolvidos na questão
dialogarem a partir de dados da realidade sobre a indisciplina, de refletirem sobre
ela, de forma a se despertar o desejo e o compromisso em construir algo diferente
do que se tem até o momento e buscarem juntos uma proposta que possa
efetivamente ser posta em prática: Para onde vamos? O que realmente almejamos?
Para o que dirigir os esforços e a elaboração das formas de mediação?
Vasconcellos (2004) alerta que é fundamental que o coletivo escolar queira
enfrentar o problema da indisciplina, o que implica na análise do problema em sua
totalidade, para se entender o que de fato ocorre. Essa análise possibilitaria que se
enxergasse a perplexidade dos professores quando estes enfrentam a indisciplina,
embate pelo qual alguns desses profissionais chegam a desistir da profissão.
Juntam-se a esse, os demais fatores que também contribuem para essa “fuga”:
baixos salários, desprestígio social, desrespeito do educando, entre outros.
Dentro dessa circunstância profissional surge a angústia dos educadores
frente à sensação de impotência, de incapacidade de dar conta dos efeitos das
mudanças sociais, que se revelam no ambiente escolar. O professor, hoje, tem se
questionado muito sobre a maneira como deve agir para manter a disciplina em sua
sala de aula, até mesmo por estar, de certa forma, perdido e desestimulado, tanto
pela situação do magistério (formação defasada, salário baixo, sobrecarga de
trabalho/carga horária e desprestígio social), como pela posição da escola, cuja
função está sendo questionada, além de ser acusada de reprodutora do sistema.
Sem preparação para lidar com as necessidades dos alunos, hoje, os professores
tentam impor a disciplina ”custe o que custar” e, para isso, recorrem a formas
coercivas.
Segundo Vasconcellos (2004), a causa da indisciplina pode ser encontrada na
sociedade, na família, no professor e no aluno, que se encontram interligados
também nas justificativas dadas para a indisciplina. É, portanto, por meio da
mediação desses diferentes agentes que se concretiza esse fenômeno. Do mesmo
49
modo, acrescenta o autor, a disciplina não está pronta, ela deve ser uma construção
coletiva, que necessita da participação de todos.
No enfrentamento à questão da indisciplina, há, também, segundo o autor, a
necessidade de nos preocuparmos em construir uma postura comum entre os
educadores e educandos, e a escola precisa estabelecer certos parâmetros a serem
seguidos por todos os seus profissionais, os quais devem trabalhar de fato com o
aluno, no sentido da resolução do problema. As normas instituídas devem estar bem
definidas, claras (o quê, para quê, quem, quando, onde, como, qual a
consequência), colocadas por escrito, para que ajudem a objetivar esse
procedimento.
Vasconcellos (2004) chama a atenção para que o professor assuma a
realidade de seu trabalho, para a necessidade de desalienar a relação pedagógica:
entender que os educandos são problema seu, e não ficar procurando culpados do
outro lado. Esse seria o ponto de partida. O segundo ponto é o de transformar a
realidade, no sentido de o professor sair de uma posição reativa, defensiva e partir
para uma fase de autocrítica e de (re)construção de sua proposta pedagógica.
Segundo Vasconcellos (2004), o professor é um dos principais agentes de
mudança na questão disciplina/indisciplina, por três razões: estar em contato direto
com o educando em um local privilegiado, onde se manifesta o problema; por ser um
profissional da educação; e por ser potencialmente um dos mais interessados em
resolver essa questão, devido ao grande desgaste que ela lhe causa.
Souza e Placco (2006) também contribuem, nesse sentido, para o
esclarecimento da construção dos valores relacionados ao exercício da autoridade.
Elas colocam que a formação de valores se constitui como condição para a
construção das relações que fomentam a educação e a ética.
A autoridade, para essas autoras, está fundamentada pela filosofia de Arendt
(2000) e Elmore (1987) e pela psicologia de La Taille (1999). Na filosofia, a
autoridade é entendida como uma relação de reciprocidade, embasada na
desigualdade. Ela se daria pelo respeito à competência ou ao conhecimento, pela
represália, pela tradição ou pela regra. Na psicologia, o respeito, a hierarquia e a
autonomia constituem condição para a existência da autoridade.
50
Afirmam essas autoras que, ao se obedecer a determinada ordem, não quer
dizer que o mandante tenha autoridade, se ele não tiver respeito e autonomia.
Assim, a autoridade está relacionada ao respeito que é concebido nas relações, e
que pode ser construído de duas maneiras: pela hierarquização nas relações sociais
e pelo reconhecimento e prestigio. Resultam dessas construções dois tipos de
autoridade. Uma diz respeito à autoridade que se constrói nas relações, por meio do
reconhecimento daquele que detém a autoridade, porque possui conhecimentos e
saberes institucionais; e o outro tipo de autoridade é aquela construída nas relações
interpessoais, e que são permanentes.
Ainda sobre a discussão a respeito da indisciplina, Damke (2007) faz um
estudo, baseando-se na perspectiva da percepção social dos professores. Sua base
teórica encontra-se na Psicologia Social e na Sociologia do Conhecimento. A
percepção social, para essa autora, está vinculada ao imaginário social, constituído
pela concepção de mundo, as crenças e os valores compartilhados por um
determinado grupo. Para o campo educacional, a autora salienta que a percepção
social desempenha importante papel, uma vez que busca compreender o processo
de construção social da realidade do docente, por meio da sua distinta percepção e
interpretação dessa realidade.
Damke (2007) afirma que as primeiras impressões que o professor tem do
aluno e de suas posturas podem estar associadas à cultura do ambiente escolar e
ao estereótipo de outros professores em relação à indisciplina, o que distorceria a
sua percepção real do que está sendo vivenciado. Desse modo, ele poderia cair em
uma forma simplista de perceber as relações professor-aluno e os objetos que
permeiam essas relações. Para a autora, o professor constrói sua percepção social
por meio das interpretações, crenças, hábitos e valores compartilhados.
A autora acrescenta que determinações, regulações e exigências culturais de
um determinado ambiente se apóiam em um conhecimento prescrito, o qual fornece
regras de condutas, que são aceitas com a função de construir os papéis exercidos
naquele ambiente, com as crenças e experiências dos docentes que vivem sob sua
influência. Dessa forma, ao compartilhar de suas experiências, crenças, hábitos e
valores, os docentes estão construindo a percepção social da indisciplina.
51
Franco (2003) destaca a importância do Professor Coordenador (PC) junto à
equipe escolar para auxiliar o grupo de docentes nas discussões e nos estudos
referentes à indisciplina. As ações do PC podem ser embasadas em dois de seus
papéis: como investigador da realidade e como proponente de projetos para a
formação
docente,
que
visem
alternativas
para
mediar
a
questão
disciplina/indisciplina.
Na investigação da realidade, o PC pode observar diversos aspectos que
desencadeiam a indisciplina na escola, como a concepção de disciplina dos
docentes, a relação professor-aluno, o conhecimento que os professores tem sobre
da relação entre professor e adolescente, assim como as propostas de trabalho que
o professor faz à sua sala de aula.
A proposta do projeto para formação docente deve apontar a intervenção do
PC por meio dos dados que ele coletou na investigação da realidade. No processo
de intervenção, Franco (2003) destaca que é fundamental a participação de toda a
comunidade escolar, afirmando a importância da construção conjunta do projeto
político-pedagógico, no qual conste o diagnóstico da escola e o planejamento de
ações que mobilizem mudanças.
A formação docente, por sua vez, comenta o autor, está vinculada a um
espaço privilegiado para a formação continuada dos professores, o HTPC, momento
em que os docentes e PC se encontram para, de fato, dar vida ao projeto. É nesse
espaço que o PC realiza a investigação da realidade, que ajudará na condução das
reuniões e nas reflexões que se fizerem necessárias à equipe.
A perspectiva adotada para a interpretação dos diálogos estabelecidos com
os professores envolvidos com essa pesquisa está alinhada com os pressupostos
defendidos por Rego (1996), apoiada em Vygotsky, quando defende que os
indivíduos são constituídos por constantes interações com o meio físico, social e
cultural, estabelecidas desde o seu nascimento, e que continuam durante todo o seu
percurso de vida. Essa constituição - significativa e ressignificativa - se dá por meio
das internalizações dos processos que são mediados por outros sujeitos,
instituições, meios de comunicação e instrumentos disponíveis no ambiente. A
constituição do sujeito é, portanto, atravessada por fatores socioculturais.
52
CAPÍTULO IV - A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA
Poética
De manhã escureço
De dia tardo
De tardo anoiteço
De noite ardo.
A oeste a morte
Contra quem vivo
Do sul cativo
A este é meu norte.
Outros que contem
Passo por passo:
Eu morro ontem
Nasço amanhã
Ando onde há espaço
Meu tempo é quando
Vinícius de Moraes
Este capítulo tem o intuito de apresentar os procedimentos metodológicos
adotados nesta investigação para responder a questão: Quais os sentidos
atribuídos pelos professores à indisciplina dos alunos?
O trabalho de campo da pesquisa aconteceu no segundo semestre de 2009,
com o propósito de discutir os sentidos atribuídos à indisciplina escolar pelos
53
professores do Ensino Médio que participavam dos encontros do Horário de
Trabalho pedagógico Coletivo (HTPCs), durante duas horas semanais, em uma
escola da rede pública estadual da região de Piracicaba - SP, onde a pesquisadora
exercia a função de Professora Coordenadora (PC).
A escola atendia, até o ano de 2009, aos três segmentos da Educação Básica
(Ciclo I e II do Ensino Fundamental e Ensino Médio). Esta escola enfrentava, na
época da pesquisa, inúmeros problemas, tanto na organização geral como nos
aspectos pedagógicos.
Reconhecendo a importância do trabalho coletivo e da formação centrada na
escola,
decidi
fazer
uma
sondagem
das
necessidades
dos
professores,
questionando o modo como eu, enquanto PC, poderia contribuir para o
desenvolvimento do trabalho docente e para a formação continuada desses
professores, no contexto do HTPC.
Quando questionados, os docentes apontaram que sua maior preocupação
era o problema da indisciplina dos alunos, que vinha afetando as atividades
pedagógicas nas suas salas de aula. Assim, o tema “indisciplina” passou a nortear
as discussões com os professores e desencadeou a presente pesquisa, que tem
como objetivos conhecer e discutir quais são os sentidos produzidos pelo
professores de Ensino Médio sobre a indisciplina escolar, no contexto do processo
formativo que acontece nos HTPCs da escola pública pesquisada.
Esta investigação, no início, contava com doze docentes participantes.
Durante seu desenvolvimento, outros dois profissionais somaram-se ao grupo em
função da alteração de carga horária de trabalho, totalizando, então, quatorze
professores participantes. Desse total, sete eram efetivos e trabalhavam na escola
pesquisada há mais de três anos. Os demais eram profissionais contratados em
regime temporário pela Secretaria Estadual de Educação e era seu primeiro ano de
trabalho nessa escola. Desses professores, dois também trabalhavam na rede
particular de ensino e outro na rede municipal. Havia entre eles um professor em seu
primeiro ano de trabalho e uma professora que desenvolvia projetos de
Recuperação Paralela para a disciplina de Matemática e substituía professores que
acaso faltassem. Essa diversidade do grupo permitiu ricas interações e trocas de
experiências, resultando em discussões bastante significativas.
54
Com a escolha do tema norteador das discussões e a adesão do grupo de
professores, sugeri a exibição de filmes para provocar e enriquecer as discussões a
respeito da indisciplina, negociando a forma de organizar os encontros. Foi
combinada a seguinte dinâmica para o uso das duas horas de HTPC: primeiro, nós
assistiríamos um filme com a temática em questão; em seguida, discutiríamos o
filme, tentando responder as seguintes perguntas: O que o filme provocou? Quais os
sentidos da indisciplina dos alunos?
Essas discussões foram audiogravadas, com a intenção de que se mantivesse,
ao serem transcritas, total fidelidade às falas.
Em um terceiro momento, fora do horário do HTPC, os professores deveriam
registrar suas impressões sobre a discussão e entregar esse registro à PC (no caso,
a pesquisadora), antes da exibição do próximo filme.
Cabe ressaltar que esses registros foram solicitados sem indicação de um
formato definido e foram produzidos ora individualmente, ora em duplas, ou até
mesmo em grupo. O intuito da solicitação foi o de potencializar uma atitude de
reflexão frente às discussões, a qual pudesse contribuir com a explicitação da
questão de pesquisa.
Os dados produzidos no processo de pesquisa incluem, portanto: a) as
discussões audiogravadas e transcritas; b) o diário de campo da pesquisadora, que
contém suas anotações realizadas durante os momentos de exibição dos filmes; c)
registros escritos pelos professores com opiniões, indagações, compreensões a
respeito dos filmes e sua temática.
Quanto ao encaminhamento dos encontros, ficou acordado entre os
professores que a PC (a pesquisadora) elaboraria um cronograma de trabalho em
torno da discussão do tema indisciplina e selecionaria três filmes como material de
trabalho.
O cronograma para a pesquisa de campo previu dez encontros de HTPC, ao
longo do segundo semestre de 2009, nos quais foram exibidos os filmes e realizadas
as discussões. Contudo, devido a outras demandas da escola na utilização desse
espaço de formação, os encontros se reduziram a seis. Foram organizados, ao
longo do semestre, portanto, três encontros para a exibição dos filmes e outros três
para discussão e reflexão sobre os mesmos.
55
Investindo na possibilidade de que os filmes escolhidos motivassem e
potencializassem a reflexão sobre a indisciplina nas salas de aula, três produções
foram selecionadas: Pro Dia Nascer Feliz (2006), Entre os Muros da Escola (2008) e
Escritores da Liberdade (2007).
Esses filmes, que retratam o cotidiano de diferentes universos escolares, com
suas peculiaridades, tipos de problemas e maneiras de enfrentá-los, promoveram
discussões significativas em relação ao fenômeno da indisciplina. São produções
atuais,
de
nacionalidades
diferentes
(Brasil,
França
e
Estados
Unidos,
respectivamente), que apresentam discussões de questões próximas às enfrentadas
pelos professores envolvidos com esta pesquisa.
Segundo Coutinho (2002), a utilização de filmes como estratégia para
reproduzir a essência da realidade é relevante, mesmo quando as cenas se passam
em estúdios cinematográficos, pois relacionam a obra literária, o mundo imaginário
das personagens e as situações recriadas.
Alves (2001) argumenta que os filmes se constituem de fragmentos da
realidade, embora não possam ser considerados como tal, uma vez que contêm
“técnicas figurativas” que percebem, interpretam e criam o mundo. Esse dispositivo
possibilita outras experiências que deformam (transformam) a postura dos sujeitos
na relação com o mundo, envolvendo, nesse processo, percepções e compreensões
da realidade histórico-social.
Na mesma perspectiva, os estudos organizados por Duarte et al. (2004)
reforçam que a produção dos sentidos, bem como a construção de valores por meio
da experiência com o cinema, partem do princípio de que o sentido do filme não é
dado pela maneira como ele se organiza tecnicamente (construção do roteiro,
imagens, trilha sonora, textos escritos, falas etc.), mas, sim, pela relação entre a
pretensão
do
que
se
quer
transmitir
e
aquilo
que
o
espectador
interpreta/compreende.
Para os autores, a significação dos filmes caminha “entre o universo íntimo e
privado da memória e do imaginário do espectador, e o universo público da memória
social e do imaginário cultural” (DUARTE et al., 2004, p. 4). Esse imaginário permite
o diálogo com os fragmentos dos filmes, os quais marcariam, de alguma forma, a
vida do sujeito, formando uma rede de comunicação que passaria a interferir no
56
modo de “ver”, assimilar, compreender e interpretar os demais filmes com que esse
sujeito viesse a ter contato.
Os autores acreditam, portanto, que esse “museu de imagem” estabelece o
elo entre o filme e o olhar do espectador, o que lhe permitiria fazer a ligação do filme
com o mundo real, considerando, contudo, a fantasia como parte desse processo de
significação.
A proposta desta pesquisa de utilizar filmes que retratem o fenômeno da
indisciplina escolar, com a intenção de fomentar a discussão dos professores,
concorda com esse estudo, quando os autores afirmam que:
Os filmes funcionam como campos de problematizações, pois colocam
valores em discussão para espectadores de distintas origens e tradições
morais e culturais. A apresentação de situações de conflito, em que
determinadas decisões são tomadas tendo como referência estes ou
aqueles guias de valor, esta ou aquela norma de ação moral, leva os
espectadores a analisar (...) suas crenças e pressupostos (...). Filmes
funcionam como campos de problematização porque possibilitam aos
espectadores experimentar situações morais diversas (DUARTE et al.,
2004, p. 48).
Quando assistimos a um filme nos sentimos envolvidos pela trama, pois
enxergamos ali dados da nossa própria realidade e, muitas vezes, temos a
oportunidade de relembrar acontecimentos que dão significado e sentido ao que
estamos vivendo no presente, como também de refletirmos sobre o nosso ser e
estar no mundo, não apenas como testemunhas oculares, mas como alguém que
“vê, percebe, sente, revive momentos e sensações” (ALVES, 2001, p.136).
A opção por assistirmos a filmes que tratavam de aspectos relacionados à
indisciplina para, em seguida, discutirmos o assunto coletivamente, justifica-se,
ainda, pelo fato de que as imagens “trazem informações, nos sensibilizam e nos
emocionam. Nos ajudam a conhecer, decifrar, perceber, nos informar, sobreviver e
também iludir, enganar, dirigir, dominar e controlar” (ALVES, 2001, p. 6) e, dessa
forma, mobilizar o sujeito, corporal, emocional e intelectualmente.
O ato de ver filmes permite se fazer um retrospecto, reviver momentos e
sensações, rememorizar. O ato de ver filmes e discuti-los em seguida
ajudaria a reelaborar repensar, algo que já foi vivido, pela pessoa ou pela
humanidade. Além disso, é uma outra forma de percepção do mundo que
pode alargar o conhecimento (ALVES, 2001, p. 64).
57
Acreditando na hipótese defendida por Vianna e Setton (2004, p. 89), de que
as mensagens trazidas pelos filmes “são carregadas de sentidos, os quais emitem
significados e juízos de valor (...) e que servem como importantes agentes
socializadores”, os filmes foram utilizados como recurso para auxiliar a discussão
sobre os sentidos que os professores do Ensino Médio constroem sobre a
indisciplina.
O documentário “Pro Dia Nascer Feliz”, de João Jardim (2007), aborda a
educação brasileira. Mostra as diversas situações que os estudantes, na faixa dos
14 aos 17 anos, enfrentam dentro da escola pública dos estados de Pernambuco, da
periferia do Rio de Janeiro e da cidade de São Paulo: precariedades, preconceitos,
violência. As diferenças capazes de chocar o espectador aparecem quando o filme
nos permite comparar a realidade destes jovens com as de outros estudantes de
renomados colégios particulares paulistas. Além do foco no aluno, este
documentário também mostra aspectos relativos ao professor, como seus problemas
em sala de aula, seus desejos, suas angústias, a falta de reconhecimento da sua
profissão, entre outras questões políticas e sociais vinculadas à profissão docente
no Brasil.
“Entre os Muros da Escola”, filme dirigido por Laurent Cantet (2008), aborda o
cotidiano escolar para expor a visão francesa sobre o choque entre culturas.
Evidencia as diferenças sociais e culturais entre alunos e entre professores e alunos,
as quais estariam gerando incompreensão e intolerância das partes.
O filme “Escritores da Liberdade” é norte-americano, com direção de Richard
LaGravenese (2007), e foi inspirado na história de vida de uma professora em início
de carreira, interessada em lecionar Língua Inglesa e Literatura para uma turma de
adolescentes que resistiam ao ensino tradicional. O desafio da professora está em
educar esses adolescentes discriminados pelos outros professores, que os
consideram “sem futuro”. Para isso, ela utiliza diversas estratégias e acaba por
inovar o ensino daquela escola.
A construção da análise dos dados da pesquisa implicou a leitura dos
registros escritos dos docentes participantes, a leitura das transcrições dos
encontros e também das anotações do diário de campo da pesquisadora.
58
Nesse processo de construção da análise orientada pela busca das
concepções sobre a indisciplina, foi possível reconhecer que os sentidos atribuídos
pelos professores à indisciplina estavam relacionados aos questionamentos dirigidos
à própria profissão e à função da escola. Assim sendo, os sentidos sobre a
indisciplina, à profissão docente e à função da escola foram tomados como eixos
complementares de análise do material.
CAPÍTULO V - SENTIDOS DA INDISCIPLINA, DA ESCOLA E DA PROFISSÃO
DOCENTE: ANÁLISE DOS DADOS
Aprendi...
Sei da minha responsabilidade em assumir o outro em minha constituição,
bem como entendo o quanto o inverso também pode ser verdadeiro, ou
seja, o quanto se faz importante que o outro se perceba também coresponsável por meu processo formativo. Também sei de todas as
transformações que esse movimento pode carregar. Essa decisão é
singular, mas construída com e a partir do outro, e é potencializada
no/com/para o coletivo. Daí minhas provocações são só perguntas, mas que
carregam em si a vontade de pensarmos nossa profissão com a finalidade
primeira de favorecer a aprendizagem dos estudantes, essencialmente
(VICENTINI, 2010, p. 43).
Começo a tecer as primeiras considerações deste capítulo por meio do
excerto de Vicentini (2010), que discute o processo formativo dos sujeitos
59
ressaltando a importância do “outro” nesse processo, sem se esquecer da coresponsabilidade desses sujeitos. Defendendo a mesma perspectiva da autora,
quando coloca que “essa decisão é singular, mas construída com e a partir do outro,
e é potencializada no/com para o coletivo”, mergulho nos dados desta pesquisa
partindo desse princípio de co-responsabilidade dos professores participantes, ao
debaterem e escreverem sobre o objeto de discussão desta pesquisa: a indisciplina
escolar.
Como mencionado no capítulo que descreve a metodologia, os dados da
pesquisa foram construídos a partir da transcrição dos encontros de HTPC e da
leitura dos registros escritos dos professores participantes de modo a responder a
questão: Quais os sentidos atribuídos pelos professores à indisciplina dos
alunos?
No processo de análise, três eixos complementares foram definidos para
discussão: Sentidos da Indisciplina, Sentidos da Escola e Sentidos da Profissão.
Isso por que a indisciplina escolar, tema das discussões com os professores, foi
apresentada pelo grupo como justificativa para a maioria dos problemas de ensinoaprendizagem no sistema educacional, caracterizando-se, portanto, como um
obstáculo pedagógico. Essa problemática sobre a indisciplina escolar promoveu, nos
professores participantes desta investigação, inquietações em relação à profissão
docente e ao sentido e objetivos da escola. Os sentidos da indisciplina, nas
perspectivas dos professores, portanto, estão relacionados aos sentidos da escola e
da profissão docente.
5.1 Análises das discussões nos HTPCs
As perspectivas assumidas pelos professores, tradução de seu percurso
formativo, estão apoiadas nas suas experiências (CAVACO, 2009; LARROSA, 2002)
e resultam do acúmulo de vivências, de interações entre os indivíduos, ou do sujeito
consigo mesmo (auto-reflexão) no meio em que atua.
Nos seus estudos, Rego (1996) destaca que há múltiplas formas dos
professores compreenderem o fenômeno da indisciplina, caracterizadas como
60
verdades que se originam mais do senso comum e da vivência dos sujeitos e menos
da fundamentação teórica.
A autora chama a atenção para o fato de que a busca para os determinantes
da indisciplina, de acordo com suas pesquisas com professores, tem como
sustentação a visão que atribui à influência de fatores extra-escolares a justificativa
para os comportamentos inadequados dos alunos, como se pode destacar no
fragmento abaixo:
Sílvia: A gente tem que pensar o seguinte: quando o aluno vem pra cá tem um monte de problema: o
pai bateu, a mãe espancou, sofreu abuso; ou o pai bateu na mãe, os pais estão sofrendo, está cheio
de problema. É muito cômodo ouvir tudo isso, né? O problema, traz aqui pra gente e não tem como
resolver. E aí? Quando chega aqui na escola, eles ficam com mais problemas de disciplina ainda. Os
pais dos meninos dizem que são “bonzinhos” em casa.
[A professora Felícia chega nesse momento].
PC: Estamos colocando aqui, Felícia, os comentários sobre o filme [Pro dia nascer feliz]. A Sílvia está
colocando aqui que o filme a instigou tanto que ela quer fazer mestrado sobre indisciplina, né? E que
ela quer saber se é um fator social ou fator...
Sílvia: Ou se o problema é que está dentro da escola
Felícia: Pra mim é social.
Sílvia: Eu tenho uma hipótese. São várias (...). Então, sem eu ler nada, sem analisar nada, grosso
modo, eu acho que seja um problema da escola.
Conforme Rego (1996) e Vasconcellos (2004), a indisciplina está relacionada
à multiplicidade de influências no percurso constitutivo do sujeito. Portanto, a família
tem grande responsabilidade nessa constituição. No entanto, o individuo também se
constitui em outras relações que não apenas as familiares; a escola não pode se
eximir de sua função educativa de fomentar o aprendizado das posturas e de dar
condições ao sujeito para que ele construa e interiorize valores. Para isso é
necessário que os educadores aprendam a adequar as exigências de sua profissão
às possibilidades e necessidades dos alunos.
Segundo Imbernón (2010, p.15), esse aprendizado do professor tem a ver
com o fato de que é necessário “romper essa forma de pensar que leva a analisar o
progresso e a educação de uma maneira linear, sem permitir integrar outras formas
de ensinar, aprender, de se organizar (...) e de escutar outras vozes”. Essa formação
acontece por meio dos problemas práticos vivenciados nas escolas, assim como
61
pelas necessidades reais dos profissionais que atuam nesse ambiente. Dessa
forma, a escola passa a ser foco do processo de ação-reflexão-ação.
Esse processo de ação-reflexão-ação pode promover o reconhecimento, por
parte dos professores, da sua parcela de responsabilidade pela indisciplina na
escola. Esse reconhecimento, de acordo com Rego (1996), seria um alerta para a
busca de outros determinantes para a indisciplina.
A autora aponta que a influência extra-escolar no comportamento dos
educandos ocupa primeiro plano na justificativa de diversos docentes. Segundo essa
visão, as atitudes comportamentais classificadas como indisciplinadas (rebeldia,
desatenção, agressividade, entre outras) seriam características individuais e
resultantes dos fatores inerentes a cada aluno, sendo vistas como consequência das
opressões do universo social (família, televisão, entre outros fatores).
Os enunciados a seguir mostram essas características levantadas por Rego,
que destaca a importância da família no acompanhamento da vida escolar dos
estudantes e na relação da permissividade dada pelos pais às situações
problemáticas “classificadas” como indisciplinadas. A Profª Sílvia tem esse
posicionamento. Acredita que o problema de indisciplina na escola é devido à
ausência das famílias na vida dos educandos.
Sílvia: Sabe Felícia, eu penso assim: antes nós tínhamos a mãe em casa, sabendo ou não ler. Agora,
o pai sai, a mãe sai. Quem educa os filhos somos nós, por isso que falo que o problema da
indisciplina está na escola.
Felícia: Como educar um filho sem punir?
Silvia: Não tem como, mas acabam sendo permissivos, porque falam assim: “Eu não fico com ele”.
Então, falam sempre: “- Deixa, eu nunca fico com ele, agora vou falar não?”. E aí gera tudo isso.
Você fala não aqui, e lá fala sim o tempo todo, e o conflito está gerado.
Cláudio: Mas talvez seja um pouco de cada, Sílvia. O problema não está ali ou está aqui. É um
pouco o problema social que acaba interferindo na escola. A escola não é uma coisa fechada,
apartada da sociedade. Ela interage com a comunidade. A escola acaba também influenciando toda
essa relação.
Mesmo quando os professores admitem a indisciplina associada à escola,
não abandonam a visão de que isso ocorre devido à “ausência” da família. Nesse
sentido, Rego (1996) afirma que as famílias têm sido responsabilizadas pela
62
indisciplina dos estudantes, devido à dissolução do modelo familiar, de educandos
vindos de famílias consideradas “desestruturadas” ou, ainda, pela falta de interesse
dos pais pela vida escolar de seus filhos.
Encontramos a questão da permissividade dos pais como um ponto que
poderia ser motivador da indisciplina, como coloca a professora Sílvia. Para Rego
(1996), os pais permissivos são aqueles pais com bastante dificuldade de controlar
suas crianças/adolescentes. São muito tolerantes diante de uma situação de conflito,
teimosia ou “birra”, não estabelecendo limites e parâmetros comportamentais.
Concordo também com Rego (1996) e com Souza e Placco (2006) sobre o
fato de a indisciplina ser uma questão bastante complexa, alvo de múltiplas
interpretações, e construída a partir de um conjunto de valores e expectativas
variáveis ao longo da história, nas diferentes culturas e até dentro de um mesmo
contexto.
Na interpretação do sentido da indisciplina apresentada pelo professor
Cláudio, essa complexidade de sentidos fica clara. Ele entende que a indisciplina é
causada tanto por motivos sociais externos como por fatores internos à escola. Na
conversa do grupo, algumas práticas e rotinas da escola passam a ser
questionadas:
Felícia: Eu acho que a escola hoje é muito...
Sílvia: Posso dizer o termo certo? Pra mim é falta de limite (...), todo mundo necessita de limite,
gente.
Felícia: Eles pedem limite, né?
Sílvia: Todo mundo precisa de limite, nós precisamos de limite, se nós não precisássemos estar aqui,
estaríamos aqui? (...) Por que estou aqui? Porque tem um limite, porque eu não posso faltar. Tem
uma punição para isso, se eu não vier.
Felícia: E o que acontece com os alunos que não têm limite?
Silvia: Nenhuma.
Felícia: Eles precisam perder alguma coisa.
Sílvia: Quando digo escola, estou dizendo tudo. Eu, os alunos, todos, até aqueles que mandam as
coisas pra gente.
Felícia: Quando eles passam do limite, eles não têm nenhuma punição e ainda podem participar,
como aconteceu essa semana, que achei um absurdo que o aluno “S” foi ao Salão de Humor depois
63
de tudo o que aconteceu, depois do que ele me fez. (...) Mas, espera ai! Você pode fazer “nada” na
sala de aula, pode dormir e você pode ir aos passeios? Não tem “tipo”: você está merecendo?
Silvia: Concordo com ela, é uma forma de limite.
Felícia: É uma forma de limite, você vai porque você está merecendo. Agora, na escola, o aluno faz o
que quer e não quer e tem o passeio e o aluno vai? Como pode?
Cláudio: Espera aí. A visita ao Salão de Humor não é um passeio. É uma atividade.
Felícia: Ah, sim.
Claudio: Que tem que ser aproveitado como conteúdo, não pode deixar nenhum aluno de fora.
Felícia: Para eles é um passeio.
Cláudio: Passeio é Hopi Hari. Esse, sim, é um passeio.
Felícia: Que nesse eles participam mesmo, né?
Claudio: Com esse passeio [Hopi Hari] foram duas sextas-feiras perdidas, fora o tempo para acerto
de contas e toda a balbúrdia que fica por conta dessa excursão. Não tem conteúdo nenhum...
Felícia: Eles vão?
Claudio: Então, esse é um passeio que não tem conteúdo. Qual é o conteúdo?
(...)
Sílvia: Olha, por exemplo: eu quero levar os alunos no Museu da Língua. Não dá para levar todos, eu
tenho duas classes de primeiro ano do EM e duas de oitava [do EF]. Eu quero levar um ônibus, tem
que fazer uma seleção. Qual o critério para selecionar esses alunos? É quem merece. Entendeu? É
isso que a professora está dizendo. Realmente, você tem que começar dar prêmios para quem é bom
e não punir, nesse sentido de castigo...
Cláudio: Até onde entendo a Felícia, é usar como critério de punição para os indisciplinados, é esse
limite. Olha, você não vai nesse tipo de atividade, a sua atividade será dentro de sala de aula.
Nádia: Mas a “Quinta no cinema” é assim que eles estão fazendo, não é? Você não vai. Você vai.
Você não vai por causa de sua indisciplina...
(...)
Laura: Isso estava fazendo falta para a escola. Quando você sai com eles, eles são totalmente
diferentes. Você tem a liberdade de conversar com eles, não só como professor e aluno, né? Mas
eles são outros alunos. Veja o primeiro D, a Natália foi comigo, eles se comportaram. Eu acho que
essas atividades, assim, elas fazem falta para a escola. Eu acho que é por isso que temos tantos
casos de indisciplina na escola.
Silvia: Eu acho que deveria ter mais excursões assim (...). Nossa, seria ótimo, por exemplo, a
próxima excursão seria para o Salão de Humor de São Paulo, porém, com alguns critérios para o
aluno ir (...). Eles iriam pensar: a próxima será para São Paulo, mas para eu ir tenho que ter alguns
critérios... Tem bastante passeio.
No diálogo, observamos que existem diversas formas de entender e
interpretar a disciplina/indisciplina, as quais acabam interferindo nas práticas
64
pedagógicas. Essas práticas pedagógicas estão relacionadas às constituições dos
professores, que se dão por meio das suas inúmeras interações sociais, das
informações e influências que recebem dos diferentes elementos mediadores que
compõem o seu grupo social e cultural, incluindo determinadas pessoas, instituições
e meios de comunicação (REGO, 1996).
Nesse sentido, Abdalla (2006) contribui dizendo que a perspectiva da escola,
tanto no âmbito cultural quanto no político, depende das interpretações dos sujeitos
sobre a situação vivenciada por eles e das orientações políticas que a constituem.
Culturalmente, a escola se apresenta como uma organização complexa, cujos
processos de funcionamento nem sempre estão de acordo com o que é formalmente
estabelecido. Trata-se, pois, de uma realidade socialmente construída, desenvolvida
entre seus membros no contexto de trabalho.
Sobre esse aspecto, Rego (1996) observa que “as trocas” de “experiências”
fornecem elementos capazes de interferir não somente nos tipos de interação
estabelecidos entre a instituição escolar e os alunos e na definição de créditos para
avaliar o desempenho da escola, mas também no estabelecimento dos objetivos que
se quer alcançar de maneira coletiva.
A discussão sobre a indisciplina mobiliza a participação dos professores,
estimulando-os a se responsabilizarem pelo desenvolvimento de estratégias que
possam modificar as práticas pedagógicas. Essas mudanças estariam baseadas na
experiência individual e grupal acumulada, e também nas novas necessidades
afloradas na discussão, como acontece quando os professores Cláudio e Laura
opinam sobre a necessidade da escola investir mais em projetos culturais, que de
alguma forma pudessem minimizar atos de indisciplina.
Essa busca de novas estratégias que promovam ações pedagógicas permite,
antes de tudo, a revisão e a relativização de pontos de vista, num processo de
coordenação de perspectivas, como aponta o diálogo a seguir:
Cláudio: O documentário [Pro dia nascer feliz] mostra a integração com a escola, os alunos
participam da banda da escola, do grupo de dança. A outra mocinha, quando terminou os estudos,
falou que sentia falta da convivência da escola com os amigos, com os professores. Aqui não temos
só alunos indisciplinados, temos alunos super gente fina, temos alunos excelentes. São melhores que
quando eu fui estudante. Isso, com certeza. Tem certo grau de civilização, são finos, são educados.
65
Em vários eventos aí, eles procuram a escola para socialização. Essa escola também dá uma
referência de humanismo para que depois eles apliquem em suas vidas. Tem uma referência familiar.
O problema é que perdemos muito tempo com os alunos indisciplinados. Se nós pudéssemos
desenvolver mais com esses alunos, ficaríamos muito mais satisfeitos
Juarez: Sabe Felícia, fiquei aqui pensando. A questão é simples, Felícia. Quando que a escola não
teve alunos indisciplinados? Quando? Sempre. Então a escola está sempre em mudança. Mesmo o
objetivo da escola está mudando.
Após o exercício de revisar e relativizar as explicações sobre a indisciplina,
outras questões surgiram. A pergunta “quando que a escola não apresentou alunos
caracterizados como indisciplinados?” exige que os professores admitam que este
fenômeno sempre fez parte da realidade escolar e está inscrito em um contexto em
que concorrem fatores sociais, culturais e históricos.
Cada escola está em processo constante de mudança e de constituição de
sua singularidade. O fato de ser singular confere a cada uma a possibilidade de se
diferenciar de outras escolas, conforme sua estrutura organizativa e o tratamento
dado aos seus educadores e educandos.
Silva (2002) observa que quando o espaço permite o estudo dos assuntos
relacionados ao dia-a-dia da sala de aula, com suas contradições e desafios, o
desenvolvimento do docente se dá por meio da reflexão sobre a experiência:
Sílvia: Vou dizer uma coisa para você, Nildo, uma das coisas que vimos nos filmes. Quanto mais
contato com meus alunos... E eu não preciso sair na rua para conhecê-los melhor. Mas como? Por
exemplo, o campeonato que teve a semana passada. Eles se soltam, eles ficam super à vontade e,
imagine você, eles vendo os professores deles jogando contra eles? E eles torciam por nós
professores. Eles apaixonados pelos professores. Só para ter isso daí foi... A professora teve que
colocar a cara a tapa, entendeu? Só que isso é a primeira vez que acontece.
Nildo: Isso aconteceu por quê?
Sílvia: Todos os professores se reuniram e assumimos um compromisso junto com a professora [Ed.
Física].
Nildo: Isso foi bom porque quebrou a formalidade.
Sílvia: A impressão que possuem é de que o professor está num patamar tão elevado, e que o
professor não tem problema, não tem erro.
Nildo: Deixaram de ser alunos para serem iguais.
Sílvia: Agora, precisa de mais coisas como essa? Precisa.
Nildo: Por isso que eu falei que precisa gostar da escola.
66
Conforme Silva (2002), a participação de todos os professores no
desenvolvimento de uma ação coletiva, ou mesmo de um projeto, é de fundamental
importância para que possam aparecer suas inquietações e dúvidas. Assim, terão
oportunidade de construir, juntos, propostas que vislumbrem a compreensão e a
execução do processo de ensino-aprendizagem.
Conforme Alarcão (2000), o cenário reflexivo como abordagem de formação
provoca a necessidade dos profissionais pensarem em suas práticas, e de
construírem e reconstruírem o seu conhecimento a partir do campo de ação,
caracterizado
por
dinâmicas
de
incertezas
e
por
decisões
devidamente
contextualizadas.
Assistir aos filmes, discutir coletivamente e produzir reflexões escritas sobre a
indisciplina permitiram aos professores a oportunidade de questionar a si mesmos, a
imagem da profissão e sua prática como educadores, como se pode observar nos
próximos enunciados:
Felícia: Quando comecei a escrever, pensei: até que ponto estamos sendo educadores?
PC: Por quê?
Felícia: Olha, não sei... Fico tão perdida, às vezes... Da forma que é... Há tanta coisa que a gente se
submete, estou confusa, será que é isso que estamos fazendo?
Sílvia: Ouvi alguém dizendo outro dia: professora é uma empregada doméstica bem paga, ela só faz
o que mandar.
O diálogo acima nos remete ao fato de que o aprender e o agir profissional
docente não podem ser pensados separadamente; para que ocorram mudanças
reais dentro do espaço educativo é preciso um trabalho em equipe, com propósitos
comuns. A escola precisa empreender mudanças por meio de ações apoiadas no
diálogo, na reflexão e na avaliação contínua, critica e construtiva.
No impasse de como fazer para se conseguir práticas pedagógicas
adequadas às exigências relativas às possibilidades e necessidades do educando,
minimizando os conflitos, surge uma questão quanto ao sentido da escola,
evidenciada na reflexão sobre os objetivos e propósitos do ensino:
67
Felícia: Pare agora e pense: e quando eles vão para o SENAC ou SENAI? Eles mudam o
comportamento. Por quê?
Silvia e Felicia: É porque lá tem regras.
Juarez: Devido à “funcionalidade”. No SENAI, o que eles estão em busca ali? O SENAI vai formar um
profissional. Qualquer curso do SENAI. Aqui, a gente não está formando profissional. É formação
humana. E como tem essa diferença, gera conflito no aluno. Então, lá eles estão indo para formar um
profissional, eles estão indo. Aqui, formação humana. Sem esse conflito eles não conseguem
dialogar, gera indisciplina aqui. Por quê? Estou aprendendo filosofia pra quê? Primeira pergunta.
Professor Claúdio vai lá e explica. Se o aluno entendeu ou não, tudo bem. Digamos que não
entendeu. E aí, vou estudar filosofia pra quê? Se durante o ano o professor Claúdio conseguir, em
algum momento, explicar o porquê o aluno está aprendendo filosofia, ganhou o aluno. Se não, vai ter
indisciplina do aluno. Lá no SENAI não. Eu estou aprendendo AutoCAD para quê? Para fazer planta
baixa e acabou. Eles vão lá cientes do que eles estão fazendo. Essa é a diferença.
De acordo com Vasconcellos (2004), a escola deve estar preparada para
responder a pergunta: “Estudar para quê?”. Com esse questionamento é possível
que consigamos chegar ao objetivo da escola, desde que ele esteja de acordo com
o contexto social em que a escola atua.
Outro ponto relevante nessa discussão é a importância a ser dada a todo
novo conhecimento, resultado da tríplice articulação entre o compreender o mundo
em que vivemos, usufruir do patrimônio acumulado pela humanidade e, sobretudo,
transformar esse mundo, qual seja, colocar esse conhecimento a serviço da
construção de um mundo melhor, mais justo e solidário.
Sílvia: Agora, outro ponto é: você tem que dar aquilo que tem representatividade, aquilo que
representa alguma coisa na vida dele, ensinar aquilo que... Você vai ensinar raiz com delta lá? Onde
ele vai usar isso? O que não é significativo pra ele, como pra gente também, você deleta.
Nildo: Mas pra fazer algo diferente, que funcione, ele tem que procurar. Eu acho que plano de
ensino, você fazer plano de ensino, eu acho que é conversa para “boi dormir”. O certo é dar aquilo
que o aluno está precisando. Ele quer falar sobre o quê? Quer falar sobre o sexo dos anjos? Então
vamos falar sobre o sexo dos anjos. Ótimo, ele vai aprender. A Gazeta [jornal da cidade] está fazendo
a ordem cronológica... Eu acho, dar esse conteúdo do caderninho [referência ao material didático
empregado na rede pública estadual paulista], idiota, entendeu? Vou citar um filme, é gostoso de
assistir, que é um dos primeiros a trabalhar a relação professor-aluno que é “Ao Mestre com Carinho”.
Sílvia: Lindo.
Nildo: O que o cara fez? Ali, o cara fez o certo: se eles não estavam querendo ler o que estava
determinado, ele procurou outra alternativa. Eu acho que é o caminho lógico, entendeu? Desculpa, eu
68
vou falar e vou parar, porque já falei demais. Se você tiver algo que não estiver determinado pelo
Estado ou pela Secretaria da Educação, a diretora da escola “pega” você. Então, são essas coisas,
entendeu? Então, acho que você tem que evitar de...
Sílvia: Olha, eu entendo o que você falou, concordo plenamente, só que tem o outro lado da moeda:
Quando vai mudar isso? Como você vê quarenta realidades [quarenta alunos]?
Juarez: Não vendo.
Nildo: Não vejo quarenta realidades, eu acho que você tem que criar uma que seja...
Sílvia: Oportuna para todos.
No exercício de indagar e discutir a indisciplina, conseguimos abranger outros
assuntos que incomodam os professores, como o conteúdo programático indicado
pela Secretaria Estadual de Educação, no que diz respeito a fazer ou não sentido
para o educando.
A discussão sobre o material pedagógico distribuído pela rede estadual
provoca a reflexão sobre a coerência da escola e da ação do professor:
Sílvia: Vejam no meu caderninho de Português da oitava série: sabe qual era o trabalhinho que eles
estavam pedindo do início do ano até o final do ano? A viagem de formatura! Meu Deus, a nossa
escola aqui? A viagem ideal está totalmente fora da realidade deles. Eles não vão nunca numa
viagem de formatura. Só que lá estava pedindo. Como é que vou fazer agora?
Nildo: Aqui? Quem pediu?
Sílvia: Não, foi o caderninho do Estado. Eles tinham que ver uma viagem de formatura. Eles
precisam ir em agências de viagens, elaborar os planos, pegar todas as propagandas de viagens e
convencer a sala a ir naquela viagem que o grupo escolheu.
Nildo: Daí pode, né?
Sílvia: Achei isso o cúmulo: dá volta, dá volta, e o que eu faço? Vamos lá gente, vocês vão escolher
uma chácara para passarmos um dia. Aí se mataram, tiraram fotos de chácaras, aí entra matemática
pra ver quando que custa cada pessoa, a chácara, o aluguel, quantos dias vão, pai e mãe querem,
sabe? Isso sim é a realidade deles. Sabe quantas vezes eu consigo fazer uma adaptação do
caderninho com o conteúdo? Nem sempre eu consigo isso, entendeu? Eu não consigo...
Nildo: É isso que estou dizendo. Eu não acredito nesse conteúdo, fica um bando do alto escalão
fazendo regras pra gente e montam essas viagens. Por que não vem pra sala de aula e verifica a
realidade da escola? E ai fica lá de cima escrevendo um monte de coisa para você fazer.
Ao criticarem o material pedagógico da rede estadual, os professores fizeram
uma análise a partir dos próprios conhecimentos e das suas experiências. Como
69
defendem Cunha (2006) e Correia (2003), são essas referências que funcionam
como pontos de partida para a revisão das ações e possibilitam a transformação de
práticas.
Compartilhar experiências e perspectivas sobre a indisciplina, no diálogo
alimentado pelos filmes, permitiu que esse grupo de professores ressignificasse não
só os sentidos atribuídos à indisciplina mas, também, os sentidos da escola e da
profissão docente.
5.2 Análises das reflexões escritas dos professores
As produções escritas realizadas pelos professores merecem ser destacadas
e analisadas separadamente de maneira a valorizar o exercício da escrita para a
reflexão. Essas escritas funcionaram como “provocação ao pensar, como o suave
deslizar da reflexão, como a busca do aprender” (MARQUES, 2006, p.26).
De acordo com Marques (2006), escrever não possui apenas uma história, mas
simboliza a historicidade do sujeito. A escrita é um ato que produz o próprio campo
simbólico, social e cultural da constituição histórica.
Portanto, não se resume
apenas em uma mera transcrição gráfica da fala, mas, sim, uma relação de sentidos
consigo e com interlocutores virtuais.
Como afirmam Soligo e Prado (2007, p.34): “A escrita documenta. Comunica.
Organiza. Eterniza. Subverte. Faz pensar. A nós mesmos e a nossos leitores”.
Na mesma perspectiva, Rosa (2007, p.253) defende que
Aquele que escreve, ao colocar-se num outro lugar, se transforma. Ao
escrever, seleciona aspectos da prática. Um detalhe aparentemente sem
importância, muitas vezes, revela-se significativo, assumindo um novo
sentido. Durante a escrita de um parágrafo, uma lembrança pode ser
acionada e o que se pensava antes em escrever pode ser redirecionado.
Ao ter que organizar a explicação de uma determinada situação
descobrem-se novos elementos necessários à compreensão do ocorrido.
Será que chegamos ao final da escrita de um relato da mesma forma como
a iniciamos? Será que olhamos para o narrado da mesma maneira?
Nesse exercício de reflexão escrita dos professores pude perceber a
presença de posicionamentos mais políticos, que contextualizam o problema da
educação num panorama ainda mais amplo, argumentando a favor da educação
70
como direito que deve ser garantido por todos os segmentos da sociedade –
responsabilidade comum.
Os registros evidenciam que a discussão e reflexão sobre os sentidos
atribuídos à indisciplina contribuíram para a discussão do sentido da escola e da
profissão docente.
O primeiro registro escrito selecionado destaca a importância de um
entendimento maior a respeito das necessidades educacionais:
O documentário que assistimos no HTPC [Pro dia nascer feliz] do dia 14/10 nos revela o retrato cruel
da realidade educacional em várias regiões do país. Desde a falta de estrutura básica que vai de
transporte a sanitários, passando pelos problemas de ordem social e econômica que a sociedade
enfrenta e que a instituição escolar nada pode fazer, até as exigências colocadas no ambiente das
escolas particulares que servem às elites. Não podemos, nós que vivenciamos o dia a dia da escola e
da sala de aula, perceber que o que ocorre em qualquer sala de aula do país também ocorre
semelhantemente à nossa frente, todos os dias. E assim, é preciso fazer esta conexão: a de que o
problema não pode mais ser tratado de forma localizada ou com remendos. É preciso mais que PCNs
[Parâmetros Curriculares Nacionais, do Ministério da Educação, de 1998], é preciso um compromisso
da sociedade toda com a educação, para que ela não permaneça apenas o apêndice de outras
coisas consideradas mais prioritárias. É preciso mais que avaliações de alunos e professores,
Enem/Saresp [referência ao Exame Nacional do Ensino Médio e Sistema de Avaliação de
Rendimento Escolar do Estado de São Paulo], é preciso comprometimento total do Estado, sob pena
de serem responsabilizados criminalmente pelo não cumprimento desta exigência constitucional –
direito de todos à educação (Natália, Sílvia, Laura).
As professoras Natália, Silvia e Laura, a partir do tema da indisciplina,
puderam relacioná-la a outros fatores, como falta de estrutura física nas escolas,
imposição de currículo mínimo, avaliações externas, entre outros assuntos. A escrita
permitiu a elaboração de pensamentos e conhecimentos que, associada aos
momentos de trocas das experiências entre os professores, propiciou a continuidade
do desenvolvimento profissional.
O registro de Cláudio, logo abaixo, evidencia suas preocupações com o
abandono das escolas, a formação docente, a falta de respeito aos professores, a
necessidade de um projeto político-pedagógico que articule os objetivos da escola à
realidade da comunidade.
71
O filme [Pro dia nascer feliz] nos mostra uma realidade que, apesar de muitas tentativas de
mudanças, ainda temos muito que fazer para reverter o quadro da educação no Brasil. Acredito que
uma educação não se muda do dia para a noite, temos que estimular mais diálogos em salas de
aulas, temos que ter mais capacitações para os professores, prepará-los melhor para saber lidar com
jovens que estão cada dia mais rebeldes e trabalhar também com os pais. Como diz Paulo Freire,
trabalhar mais a realidade desses jovens. Embora as escolas sejam em regiões tão diferentes,
algumas realidades são as mesmas. Vemos as escolas em situações de extremo abandono.
Percebemos uma grande diferença nos alunos. As escolas de Pernambuco, em extremo abandono e
alguns alunos tão interessados em aprender, em se empenhar, mas sem estímulo e motivação da
escola, da sociedade e do professor. Os alunos são vistos como incapazes. Já em São Paulo e no
Rio de Janeiro, os alunos são desinteressados, porém os professores são empenhados. Os
professores são vistos sem respeito algum por parte dos alunos. É um filme que nos faz refletir sobre
a verdadeira função da escola e até que ponto ela está cumprindo o seu papel. Nos mostra como a
escola está defasada para trabalhar com a clientela que está recebendo. Vemos que não há
preparação adequada dos conteúdos, não há um Projeto Político-Pedagógico eficaz que abranja a
realidade das escolas, os professores não são preparados para tal realidade. Observamos que há um
grande distanciamento entre as escolas públicas e as privadas. Concluímos que enquanto não
houver nas escolas um Projeto Político-Pedagógico que seja elaborado de acordo com a realidade de
cada escola e enquanto este não for colocado em prática, a escola não conseguirá cumprir sua
função social. O professor deve estar sempre atento ao comportamento de seus alunos e deve
trabalhar com eles os valores morais para que saibam como agir em determinadas situações de
conflito. O importante é saber valorizar as capacidades que cada um possui e considerar tudo aquilo
que o aluno consegue realizar através de seus esforços e não apenas avaliar seus erros. Muitos
deles só precisam de “uma” oportunidade para vencer. Infelizmente, é a realidade da educação
brasileira. Entrevistas desse tipo nos fazem refletir: "O que estamos fazendo por uma educação
melhor?" (Claúdio).
A reflexão de Cláudio admite a necessidade de valorizarmos os alunos, darlhes uma oportunidade, como possibilidade de diminuirmos a indisciplina. Destaca,
com um foco ampliado, a importância da discussão sobre a função social da escola
no contexto do projeto político-pedagógico.
Fernandes (2010) defende que a contínua revisão do projeto políticopedagógico é uma das ações da educação continuada dos professores centrada na
escola, uma vez que para sua formulação e (re)elaboração é preciso a “articulação
teórica e prática dos conhecimentos. Isso
possibilita o repensar das práticas
pedagógicas, a visualização dos desafios do ambiente escolar, a interação entre os
72
pares no trabalho coletivo, assim como análise do contexto sociocultural” (p.94) no
qual está inserida a escola.
O professor Claudio se faz a pergunta: "O que estamos fazendo por uma
educação
melhor?”.
Esse
questionamento
encontra
eco
nas
significativas
contribuições apresentadas pelo professor Juarez, que nos fazem refletir sobre a
necessidade de repensarmos a tríplice questão: “Por que ensino? Para quem
ensino? Como ensino?”.
Estou colocando aqui meus conflitos enquanto professor recém formado, espero que de alguma
forma possa contribuir. O filme [Pro dia nascer feliz] retrata vários ambientes em que o aluno está
inserido, como na escola pública e escola particular, ambientes de ricos e pobres. Os professores
relatam um pouco sobre o “sistema de ensino-aprendizagem” e os objetivos da escola, que a meu ver
apontam para algumas direções e possíveis tomadas de posições. Acredito que o fazer pedagógico
deve sempre passar por três momentos básicos de reflexão, que são: por que ensino, para quem
ensino e como ensino? E é isto que busco realizar durante minhas aulas. Desta forma, penso que a
indisciplina deve-se, a princípio, pela incoerência entre estes três fatores, afinal, qual é o objetivo
central da escola? Para quem e para que é direcionado este ensino? Para que estudar? É justamente
isto que o aluno vem a questionar com sua indisciplina, seja ela na forma de “bagunça” ou na “forma
de não querer fazer nada”. Como este é meu primeiro ano na rede pública de educação, observo que
existe a tendência de mudanças no ensino, mas, novamente, me pergunto: em qual sentido e
direção? Estou observando que cada vez mais são cobradas posturas, atitudes dos professores, seja
pelo governo, Estado, sociedade, família, diretores, coordenadores... Mas quem dá o suporte para
que, de fato, este ensino aponte para uma direção que beneficie a sociedade? Ainda não sei
(Juarez).
Diante deste registro, é possível constatar que o docente tem convicção do
fazer pedagógico, porém, encontra-se frente a um dilema diante de tal realidade,
exigindo-se do professor resoluções de diversos problemas em relação às
dificuldades em conduzir o processo de ensino-aprendizagem. Isto está relacionado
às etapas de desenvolvimento de seus educandos e o conteúdo a ser desenvolvido,
aos problemas de disciplina e a organização da sala de aula, aspectos relacionados.
Como salientam Rego (1996) e Alves (2002), o professor ao entender/
interpretar as redes de relações estabelecidas na sala de aula, levanta uma série de
implicações e indagações sobre sua prática pedagógica, fornecendo-lhe elementos
para interferir nos tipos das interações estabelecidas com os educandos que
73
influenciam na forma de avaliar seu desempenho, sua autoavaliação, estabelecendo
a partir dos resultados novas perspectivas a serem alcançadas.
Como apontado por Vasconcellos (2004), a situação do magistério
relacionada à formação, salário, carga horária, prestígio social e os questionamentos
sobre a validade da contribuição da escola, acusada de reprodutora do sistema,
gera grandes questionamentos e conflitos nos professores em relação à disciplina, à
escola e à profissão.
A formação continuada centrada na escola pode, nesse contexto, instigar,
apoiar, criar e potencializar a reflexão docente sobre suas práticas pedagógicas nas
escolas, permitindo o exame das teorias envolvidas, estabelecendo um constante
processo de autoavaliação.
De um tema eleito para discussão e reflexão no HTPC – a indisciplina, no
caso dessa pesquisa – pode ser construído um plano de formação que favoreça o
desenvolvimento pessoal e profissional dos professores e que contribua, sobretudo,
para a construção de uma escola responsável pela humanização, socialização e
ampliação da cultura dos estudantes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
74
Escutar é obviamente algo que vai mais além da possibilidade auditiva de
cada um. Escutar, no sentido aqui discutido, significa a disponibilidade
permanente por parte do sujeito que escuta para a abertura à fala do outro,
ao gesto do outro, as diferenças do outro. Isso não quer dizer,
evidentemente que escutar exija de quem realmente escuta sua redução ao
outro que fala. Isto não seria escuta, mas auto-anulação (FREIRE, 2009,
p.119).
Inspirada pela citação de Paulo Freire (2009) remeto-me a um processo de
auto-reflexão da pesquisa realizada reconhecendo a importância de oportunizarmos
momentos de escuta “da fala do outro” nos encontros dos Horários de Trabalho
Pedagógico Coletivo (HTPCs).
A partir da disponibilidade de ouvir e acolher as falas dos professores sobre
suas necessidades e preocupações no cotidiano das salas de aula do Ensino Médio,
a presente dissertação, desenvolvida pela Coordenadora Pedagógica/pesquisadora,
organizou-se como processo de formação coletiva e de investigação.
A investigação desenvolveu-se no contexto de uma dinâmica orientada para a
formação continuada dos professores. Valoriza-se, aqui, uma formação centrada na
escola, em contexto, que permita aos professores a elaboração de diagnósticos
sobre os problemas da instituição e a oportunidade de aprender a aprender com a
experiência no contexto do trabalho coletivo.
Isso porque a formação do professor está sendo compreendida como um
processo longo, de construção e reconstrução de conhecimentos da formação e dos
saberes da experiência.
Os sujeitos atribuem sentidos aos acontecimentos, à
aprendizagem e ao conhecimento. Esses sentidos compartilhados é que podem vir a
orientar perspectivas de mudanças na forma de pensar e/ou de agir dos próprios
sujeitos a partir do diálogo no coletivo de professores.
Nos encontros de formação do HTPC é que os professores puderam apontar
a indisciplina escolar como obstáculo pedagógico que interferia no processo de
ensino-aprendizagem. Com a função de mediadora da formação docente (CUNHA,
2006; ORSOLON, 2009; CHRISTOV, 2009; CLEMENTI, 2009), a Coordenadora
Pedagógica/pesquisadora se propôs a “ouvir” os professores e garantir momentos
de interação e reflexão.
75
Para compreender o problema da indisciplina e reorientar as práticas na sala
de aula era necessário, contudo, investigar como os professores concebiam as
situações de indisciplina. Para propor intervenções na escola se fazia necessária a
interpretação das experiências e dos saberes a elas associados, favorecendo a sua
rearticulação e recontextualização.
O modo de entender/interpretar a disciplina/indisciplina acarreta uma série de
implicações à prática pedagógica, as quais fornecem elementos capazes de interferir
não somente nos tipos de interação estabelecidos entre a instituição escolar e os
alunos, e na definição de créditos para avaliar o desempenho da escola, como o
estabelecimento dos objetivos que se quer alcançar.
Sendo assim, a questão orientadora da pesquisa foi “Quais os sentidos
atribuídos pelos professores à indisciplina dos alunos?”.
Durante seis encontros, ao longo do 2º semestre de 2009, o grupo de
quatorze professores reuniu-se para assistir a três filmes que Professora
Coordenadora/pesquisadora reproduziu (Pro dia nascer feliz, 2006; Entre os muros
da escola, 2008; e Escritores da Liberdade, 2007), com o intuito de estimular e
fomentar as reflexões sobre o tema e responder a questão da pesquisa.
Os filmes escolhidos retrataram o cotidiano de diferentes universos escolares,
com suas peculiaridades, tipos de problemas e maneiras de enfrentá-los,
promovendo discussões significativas em relação ao fenômeno da indisciplina. São
produções atuais, de nacionalidades diferentes (Brasil, França e Estados Unidos,
respectivamente), que apresentam situações próximas às enfrentadas pelos
professores envolvidos com esta pesquisa.
A estratégia do uso de filmes justificou-se como oportunidade para a
problematização da realidade e (re) consideração das próprias convicções e crenças
dos professores acerca do tema. As tramas dos filmes, ao envolverem os
professores, permitiram o reconhecimento de problemas comuns nas diversas
realidades retratadas, oportunizando algumas reflexões sobre as experiências
pessoais e profissionais de cada um.
Tomando a experiência como ponto de partida para a formação dos
professores, os encontros de HTPC valorizaram a reflexão sobre a prática
pedagógica. Assistir aos filmes, discutir coletivamente e produzir reflexões escritas
76
sobre a indisciplina permitiram aos professores a oportunidade de questionar a si
mesmos e sua prática como educadores. O processo de formação que aconteceu
durante o percurso da investigação esteve orientado, portanto, por “um trabalho do
sujeito sobre si próprio, em interação com os outros (...), a partir do seu patrimônio
de experiências” (CAVACO, 2009, p.226). Isso significa admitir a escola como um
lugar de encontro, troca de saberes e elaboração conjunta de resolução de
problemas (CHRISTOV, 2008).
Além do desenvolvimento profissional dos professores, observo também o
meu desenvolvimento na investigação, da qual participo como Professora
Coordenadora/pesquisadora com a função de mediar a escuta e a tomada da
palavra entre os professores a fim de garantir momentos de interação e reflexão.
Entendo que esse exercício de ouvir o outro e considerar suas perspectivas e visão
de mundo torna-se um verdadeiro movimento de “trabalho do sujeito sobre si
mesmo”, o qual foi extensivo, doloroso e complexo.
Reconheço esse movimento de escuta e consideração do outro quando
retomo o meu caminho profissional, já escrito no primeiro capítulo deste trabalho. No
início de minha docência pratico esse exercício de “ouvir” os alunos do Ensino
Fundamental II e afirmo que aprendi com eles a estabelecer uma relação dialógica
para a elaboração do plano de ensino das disciplinas por mim lecionadas.
Vasculhando essas memórias, inclusive, recordo aqui um trecho de Marino (2006, p.
24): “é estudando, ensaiando, atuando (...), repetindo indefinidamente (...), que
precisamos buscar foco de luz (...) que nos permita fazer improvisos, sobreviver,
descobrimos, seguir em frente.”
Como professora coordenadora, iniciei a função na rede estadual de ensino
paulista com essa mesma perspectiva, buscando ouvir os meus pares com o intuito
de identificar as necessidades do meu espaço de atuação. Contudo, no decorrer do
percurso, esse “foco de luz” se perdeu, ficou no “meio do caminho”. Como
mencionado ao longo deste trabalho, pelos caminhos de pedras.
Acredito que o foco na escuta e no diálogo se perdeu nos caminhos das
cobranças sofridas pela profissão, entre os fazeres imediatistas e na “falta” de
momentos para parar, pensar, refletir, buscar alternativas coletivamente, envolvida
77
pelas orientações das prescrições feitas ao professor coordenador pela própria
Secretaria Estadual de Educação.
Embora a Secretaria da Educação destaque que é relevante diagnosticar as
necessidades dos professores em seu ambiente de trabalho, ela não cria
mecanismos para essa atuação do professor coordenador. Pelo que vivenciei,
homogeneíza-se qualquer possibilidade de escuta cuidadosa e diálogo colaborativo
por meio de orientações, pacotes de projetos, metas educacionais a serem
atingidas, não se considerando o que realmente acontece nesse espaço escolar: as
dificuldades encontradas, a falta de estímulo, as carências profissionais, a
desvalorização profissional, entre outros aspectos.
Nos dias atuais, temos como prioridade a melhora do IDESP (Índice de
Desenvolvimento da Educação do Estado de São Paulo) para conquistarmos a
recompensa proporcionada pelo Bônus Mérito. Trabalharmos mergulhados nesse
espaço, com essas cobranças e sem apoio das políticas públicas nos fazem perder
o foco. O coordenador pedagógico imerso nesse contexto fica “adormecido” de tal
maneira, o que o faz pensar que ao desenvolver as normativas, as orientações e as
determinações está promovendo e estimulando a formação continuada dos
professores.
Essa foi a minha experiência e convicção durante anos desempenhando essa
função. Acreditava que estava proporcionando a “formação” dos professores quando
trazia para os HTPCs textos que orientavam o desenvolvimento de uma aula
interessante, “dicas” de como manter a disciplina nas salas de aula, entre outros
aspectos que auxiliariam esses profissionais. Não que tais textos não tivessem sua
importância para os professores, contudo, percebia também que não tocavam esses
profissionais, não os faziam pensar, sequer acredito que “escutavam”. Eu falava
para as “paredes” e não escutava os colegas. Eram leituras avulsas, sem uma
significação para o grupo. Apenas mais um HTPC cansativo, sem propósitos e com
a mesma constatação – “E mais uma vez não resolvemos os problemas da
escola...”.
Essa “rotina” do fazer pelo fazer e a falta de sentido nos HTPs é que
proporcionaram a busca pelo “foco” novamente. Minha mudança de postura como
professora coordenadora foi oportunizada por leituras de textos que traziam a
78
discussão sobre a formação dos professores e por trocas com outros colegas e
professores que não necessariamente vivenciavam o mesmo espaço escolar, mas
que possuíam outras visões da atividade pedagógica do professor coordenador,
possibilitando questionamentos, significação, reelaboração, determinação e novos
desafios para serem enfrentados com “coragem”. Coragem no sentido de perguntar
o que estava errado e estar preparada para ouvir as críticas dos professores
participantes.
Esse ato de escuta sobre as reais necessidades formativas dos professores
provocou mudanças no meu fazer como professora coordenadora e, por
conseguinte, como pesquisadora. No entanto, na revisão final desta pesquisa, ficou
constatado que a minha presença como mediadora das discussões não aconteceu.
A coordenadora que falava “sozinha”, às vezes em monólogos incansáveis, na hora
do diálogo estabelecido com os professores, calou-se. Ficou emudecida perante as
falas dos outros. O motivo não tem explicação única. Na verdade, parece que a
experiência de contemplar os diálogos estabelecidos entre os professores despertou
em mim uma reação de apenas ouvir, sem necessidade de interferir nas expressões
dos professores, talvez por não querer interromper os momentos estabelecidos entre
esses pares.
Aprendi, sobremaneira, que o processo formativo quando acontece no
contexto de trabalho, principalmente nos espaços dos HTPCs, a partir de
problematizações
apoiadas
nos
saberes
experienciais,
potencializa
o
fazer/pensar/ser docente.
E o que aprendi com a pesquisa a partir dos dados produzidos e das análises
realizadas? Quais os sentidos atribuídos pelos professores à indisciplina escolar?
Os professores apontaram, a princípio, a indisciplina dos alunos como
decorrência de fatores extra-escolares: falta de limites e punição, permissividade ou
desinteresse dos pais, problemas sociais, características individuais dos alunos.
Para esse grupo de professores, os sentidos atribuídos à indisciplina
correspondem a comportamentos considerados inadequados, como rebeldia,
intransigência, desacato, “falta de educação” ou de “respeito pela autoridade”, não
cumprimento de regras, desatenção.
79
Os professores esperam que os alunos cheguem à escola com outras
posturas, ignorando, como aponta Rego (1996), que o papel da escola está em
fomentar regras e normas orientadoras para o seu funcionamento e para a
convivência entre os diferentes atores que nela atuam. A constituição familiar é de
grande importância na constituição do sujeito que, no entanto, não se reduz a essa
experiência. Os indivíduos interagem com outros indivíduos e com outros ambientes,
além do familiar, os quais também o constituem como sujeitos. Sendo assim, a
escola não pode se eximir da tarefa educativa, no que se refere à disciplina.
Analisando-se a indisciplina por meio de um quadro mais amplo, temos a
visão abrangente, integrada e dialética dos diferentes fatores que atuam na
formação do comportamento e desenvolvimento individual. As questões relativas ao
sujeito indisciplinado estão intimamente ligadas às suas experiências e ao seu
percurso educativo, os quais trazem as características do grupo social e seu
momento histórico, no qual esse sujeito esteja inserido. Aos traços do
comportamento humano e aos valores do sujeito vinculam-se o aprendizado que se
dá por meio de sua apropriação de “ser social”, no seu grupo cultural. Assim, o fato
de o sujeito ser indisciplinado está relacionado à multiplicidade de influências
recebidas, do repertório do seu grupo cultural. Essas influências são internalizadas
em um processo ativo e singular de seu aprendizado.
Rego (1996) explica que o processo de constituição do sujeito se dá por meio
das inúmeras interações sociais, das informações e influências dos diferentes
elementos mediadores que compõem o grupo social e cultural, incluindo pessoas,
instituições, meios de comunicação e instrumentos disponíveis no ambiente.
Esses fatos foram sendo apropriados pelos professores ao longo do processo
de discussão dos filmes e negociação e argumentação a respeito dos próprios
pontos de vista. Das suas interações com os colegas é que novas compreensões
foram sendo construídas.
Ao longo das discussões e nos registros escritos, eles passaram a revisar e
relativizar suas convicções e posições, ampliando os sentidos que explicariam a
indisciplina: falta de aproximação com os professores, deficiências na estrutura física
da escola, inadequação do material didático, imposição de currículo mínimo,
avaliações externas, falta de compreensão dos objetivos da escola, ausência de um
80
projeto político-pedagógico que articule os objetivos da escola à realidade da
comunidade.
Ao reconhecerem esses outros aspectos, os professores puderam considerar
fatores sociais, culturais e históricos e se responsabilizar por parte das dificuldades
encontradas, estabelecendo relações entre a indisciplina, os sentidos da escola e da
profissão docente.
Assistir aos filmes, discutir coletivamente, compartilhar experiências, produzir
reflexões escritas sobre a indisciplina, permitiram aos professores a oportunidade de
questionar a si mesmos, a imagem da profissão e sua prática como educadores.
Dessa maneira a experiência da pesquisa nos permite afirmar, portanto, que
os sentidos da indisciplina estão relacionados aos sentidos da escola e da profissão
docente e que as discussões e reflexões no HTPC podem instigar, apoiar, criar e
potencializar a reflexão sobre as práticas dos professores e favorecer o
desenvolvimento profissional docente centrado na escola.
81
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ABDALLA, M. F. B. O senso prático de ser e estar na profissão. São Paulo:
Cortez, 2006.
ALARCÃO, I. Escola Reflexiva e Supervisão: uma escola em desenvolvimento e
aprendizagem. In: ALARCÃO, I. (org.). Escola reflexiva e supervisão: uma escola
em desenvolvimento e aprendizagem. Portugal: Porto, 2000.
______. A escola reflexiva. In: ALARCÃO, I (org.). Escola Reflexiva e Nova
Racionalidade. Porto Alegre: Artmed, 2001.
______. O Supervisor e o professor no processo de Supervisão. In: ALARCÃO, I;
TAVARES, J. Supervisão da Prática Pedagógica: Uma Perspectiva de
Desenvolvimento e Aprendizagem. 2ªed. Coimbra: Almedina, 2003.
ALARCÃO, I; TAVARES, J. Supervisão da Prática Pedagógica: Uma Perspectiva
de Desenvolvimento e Aprendizagem. 2ªed. Coimbra: Almedina, 2003.
ALVES, C. M. S. D. (In) Disciplina na Escola: cenas da complexidade escolar. 176
p. 2002. Dissertação (Mestrado em Educação) - Faculdade de Educação.
Universidade Estadual de Campinas.
Campinas. 2002.
Disponível em:
<http://cutter.unicamp.br/document/?code=vtls000257435&fd=y>. Acesso em: 10 jul.
2010.
ALVES, M. A. Filmes na Escola: uma abordagem sobre estudos audiovisuais
(vídeo, cinema e programa de TV) nas aulas de Sociologia do Ensino Médio. 154p.
2001. Dissertação (Mestrado) – Faculdade de Educação, Universidade Estadual de
Campinas, Campinas, 2001. Disponível em: <http://libdigi.unicamp.br/ document/
?code=vtls000243412>. Acesso em: 12 dez. 2009.
AQUINO, J. G. Autoridade docente, autonomia discente: uma equação possível e
necessária. In: AQUINO, L. G. (org.) Autoridade e autonomia na escola:
alternativas teóricas e práticas. 4ª ed. São Paulo: Summus, 1999.
82
______ A desordem na relação professor-aluno: indisciplina, moralidade e
conhecimento: In: AQUINO, J. G. (org.) Indisciplina na Escola: Alternativas
Teóricas e Práticas. 13ª ed. São Paulo: Summus, 1996.
______. A indisciplina e a escola atual. Revista Faculdade de Educação. São
Paulo,
v.24,
n.
2,
p.181-204,
jul./dez.,
1998.
Disponível
em:
<http://www.scielo.br/scielo.php?pid=s0102-5551998000200011&script=sci_arttext>.
Acesso em: 10 jul.2010.
ARAUJO, U. F de. Moralidade e indisciplina: uma leitura possível a partir do
referencial piagetiano. In: AQUINO, J. G. (org.). Indisciplina na Escola: Alternativas
Teóricas e Práticas. 13ª ed. São Paulo: Summus, 1996.
AZEVEDO, J. G. De “abobrinhas” a “troca de figurinhas”. In: AZEVEDO, J. G;
ALVES, N. G (orgs.). Formação de Professores: possibilidades do imprevisível. Rio
de Janeiro: DP&A, 2004.
BARROSO, J. Formação, projeto e desenvolvimento Organizacional. In: CANÁRIO,
R. (org.) Formação e Situações de trabalho. 2ª ed. Porto: Porto Editora, 2003.
BOZZINI, I. C. T.; OLIVEIRA, M. R. G. O professor e a construção do espaço
coletivo Escolar: O Horário do Trabalho Pedagógico Coletivo. Revista Logos, n.14,
p.36-46, 2006. Disponível em: <http://www.feucriopardo.edu.br/logos/artigos /2006b/
ARTIGO4-pag36-IsabelaBozzinieMarciaOliveira-logos-14-2006.pdf>. Acesso em: 12.
jul. 2010.
BRUNO, E. B. G; CHRISTOV, L. H. S. Reuniões na escola: oportunidades da
comunicação e saber. In: BRUNO, E. B. C; ALMEIDA, L. R; CHRISTOV, L. H. S
(orgs). O coordenador Pedagógico e a formação docente. 8ª ed. São Paulo:
Loyola, 2007.
CAVACO, C. Experiência e formação experiencial: a especificidade dos adquiridos
experienciais.
Educação
Unisinos,
set./
dez.,
2009.
Disponível
em:
<http://www.unisinos.br/publicacoes_cientificas/images/.../art04_cavaco.pdf>.
Acesso em: 11 ago. 2010.
CHRISTOV. L. H. S. Teoria e prática: o enriquecimento a própria experiência. In:
GUIMARÃES, A. A et.al. O coordenador pedagógico e a educação continuada.
São Paulo: Loyola, 2008.
83
CLEMENTI, N. A voz dos outros e a nossa voz. In: ALMEIDA, L. R.; PLACCO, V. M.
N. S. (orgs.). O coordenador pedagógico e o espaço da mudança. 7ª ed. São
Paulo: Loyola, 2009.
COLASANTI, Marina. A Moça Tecelã. São Paulo: Global, 2004.
CORREIA, J. A. Formação e Trabalho contributos para uma transformação dos
modos de pensar sua articulação. In: CANÁRIO, R. (org.) Formação e situações de
trabalho. 2ª ed. Porto: Porto Editora, 2003.
CORTELA, M. S. A Escola e o Conhecimento: fundamentos epistemológicos e
políticos. 8ª ed. São Paulo: Cortez: Instituto Paulo Freire, 2004.
COUTINHO,
L.
M.
Diálogos
Cinema-Escola.
Disponível
em:
<http://api.ning.com/files/yNh9uK6lOmgrFJMRJgwTbOtcRIQxQSVd2tFGuq2jduGLN
ByHHtRx*KwWMUhilBAFuQQdS7ADQ8HOhD111nilXYDAWwUktsLG/dialogos_cine
ma_escola.pdf>. Acesso em: 10 mai. 210.
CUNHA, R. C. O. B. Pelas telas, pelas janelas: a coordenação pedagógica e a
formação de professores nas escolas. 272p. 2006. Tese (Doutorado em Educação) Faculdade de Educação, Universidade Estadual de Campinas, Campinas. 2006.
DANKE, A, S. Indisciplina Escolar: percepção social dos professores. 2007.
Disponível
em:
<http://www.pucpr.br/eventos/educere/educere2007/anaisEvento/
arquivos/ CI-242-04.pdf>. Acesso em: 10 jul. 2010.
DOMINGUES, I. O Coordenador Pedagógico e o desafio da formação contínua
do docente na escola. 235 p. 2009. Tese (Doutorado em Educação) – Faculdade
de Educação, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009. Disponível em:
<http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/48/48134/tde.../Tese_Isaneide.pdf>.
Acesso em: 10 out. 2010.
DUARTE, R. et.al. Produção de sentido e construção de valores na experiência com
o cinema. In: SETTON, M. G. J. (org.). A cultura da mídia na escola: ensaios sobre
cinema e educação. São Paulo: Annablume: USP, 2004.
DUBAR, C. Formação, trabalho e identidades profissionais. In: CANÁRIO, R. (org.)
Formação e Situações de trabalho. 2ª ed. Porto: Porto Editora, 2003.
DRUMMOND, C. Recomeçar. In: SARMENTO, L. L; TUFANO, D. Português:
literatura, gramática, produção de texto: volume único. São Paulo: Moderna, 2004.
84
FERREIRA, C. R. Diálogos na/com a formação de professores. In: V SEMINÁRIO
FALA OUTRA ESCOLA, 2010, Campinas-SP.. Anais do V Seminário Fala Outra
Escola. Campinas: FE/UNICAMP, 2010, p. 53.
FERNANDES, M. J. S. O professor coordenador pedagógico, a articulação do
coletivo e as condições de trabalho docente nas escolas públicas estaduais.
Afinal,
o que resta
a essa
função?
Disponível
em:
<http://www.isecure.
com.br/anpae/302.pdf>. Acesso em: 30 jul.2009.
FERNANDES, R. C. A. Educação Continuada de Professores no Espaço-Tempo da
Coordenação Pedagógica: Avanços e Tensões. In: VEIGA, I. P. A; SILVA, E. F. A
Escola Mudou. Que Mude a Formação de Professores! Campinas: Papirus, 2010.
FRANCO, F. C. A indisciplina na escola e a coordenação pedagógica. In: PLACCO,
V. M. N. S; ALMEIDA, L. R. (org.). O coordenador pedagógico e o cotidiano da
escola. São Paulo: Loyola, 2003.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. 39ª
ed. São Paulo: Paz e Terra, 2009.
FUSARI, J. C. A formação continuada de educadores na escola e em outras
situações. In: BRUNO, E. B. G; ALMEIDA, L. R; CHRISTOV, L. H. S. O
coordenador pedagógico e a formação docente. 8ª ed. São Paulo: Loyola, 2007.
GARCIA, J. Indisciplina na escola: uma reflexão sobre a dimensão preventiva.
Revista Paranaense de Desenvolvimento, Curitiba, n. 95, p.101-108, jan./ abr.
1999. Disponível em: <http://www.ipardes.gov.br/pdf/revista_PR/95/joe>. Acesso em:
10 jul.2010.
GARRIDO, E. Espaço de formação continuada para o professor coordenador. In:
BRUNO, E. B. C; ALMEIDA, L. R; CHRISTOV, L. H. S (org.). O coordenador
Pedagógico e a formação docente. 8ª ed. São Paulo: Loyola, 2007.
GÓMEZ, A. P. O pensamento prático do professor: a formação do professor como
profissional reflexivo. In: NÓVOA, A. (org.). Os professores e sua formação.
Lisboa: Dom Quixote, 1992.
GROPPO, C. Passagem de Professor a Professor Coordenador: a dimensão afetiva
em foco. In: Associação Nacional de Pós – Graduação e Pesquisa em
Educação, 31ª Reunião, 2008, Caxambu. Disponível em:
<http://www.anped.
org.br/reunioes/31ra/1trabalho/GT20-4737--Int.pdf> . Acesso em: 30 out. 2009.
85
GRÜNEWALD, J. L. Poesia Concreta e Visível. In: SARMENTO, L. L; TUFANO, D.
Português: literatura, gramática, produção de texto: volume único. São Paulo:
Moderna, 2004.
GUIMARÃES. A. M. Indisciplina e violência: a ambigüidade dos conflitos na escola.
In: AQUINO, J. G. (org.). Indisciplina na Escola: Alternativas Teóricas e Práticas.
13ª ed. São Paulo: Summus, 1996.
IMBERNÓN. F. Formação Continuada de Professores. Porto Alegre: Artmed,
2010.
LA TAILLE, Y. A indisciplina e o sentimento de vergonha. In: AQUINO, J. G. (org.).
Indisciplina na Escola: Alternativas Teóricas e Práticas. 13ªed. São Paulo.
Summus, 1996.
LA TAILLE, Y; OLIVEIRA, M. K; DANTAS, H. Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias
psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.
LARROSA, J. Notas sobre a experiência e o saber da experiência. Disponível
em:
<http://www.anped.org.br/rbe/rbedigital/RBDE19/RBDE19_04_JORGE_
LARROSA__BONDIA.pdf>. Acesso em: 12 out. 2010.
LIMA, E. F. Sobre (as) vivências no início da docência: que recados elas nos
deixam? In: LIMA, E. F. Sobrevivências no início da docência. Brasília: Líber
Livro, 2006.
MARIANO, A. L. S. O início da docência e o espetáculo da vida na escola: abrem-se
as cortinas. In: LIMA, E. F. Sobrevivências no início da docência. Brasília: Líber
Livro, 2006.
MARQUES, M. O. Escrever é preciso: o princípio da pesquisa. 5ª ed. Ijuí: Unijuí,
2006.
MENDES, C. C. T. HTPC: Hora de Trabalho Perdido Coletivamente? 113p. 2008.
Dissertação (Mestrado) - Faculdade de Ciências e Tecnologia, Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho, Presidente Prudente. 2008. Disponível
em: <http://www4.fct.unesp.br/pos/educacao/teses/cintia_mendes.pdf>. Acesso em:
12 jul. 2010.
MICHELETTI, R. C. C. O Professor Coordenador: suas atribuições legais e o
trabalho junto a equipe docente. 160 p. 2007. Dissertação (Mestrado em Educação)
- Universidade Cidade de São Paulo, São Paulo, 2007.
Disponível em:
86
<http://www.qprocura.com.br/dp/81708/O-professor-coordenador:-suas-atribuicoeslegais-e-o-trabalho-junto-a-equipe-docente.html>. Acesso em: 30 out. 2009.
MORAES, A. C. A escola vista pelo cinema: uma proposta de pesquisa. In:
SETTON, M. G. (org.). A cultura da mídia na escola: ensaios sobre cinema e
educação. São Paulo: Annablume: USP, 2004.
MORAES, V. Poética. In: SARMENTO, L. L; TUFANO, D. Português: literatura,
gramática, produção de texto. Volume único. São Paulo: Moderna, 2004.
OLIVEIRA, M. K. O pensamento de Vygotsky como fonte de reflexão sobre a
Educação. Caderno Cedes, Campinas, n. 35, p.9-14, 1995.
OLIVEIRA, N. A. R. HTPC como espaço de formação: uma possibilidade. 2006.
Dissertação (Mestrado em Lingüística Aplicada e Estudos de Linguagem) –
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo. 2006. Disponível em:
<http://www.pucsp.br/pos/lael/lael-inf/teses/noeli2.pdf>. Acesso em: 30 out.2009.
ORSOLON, L. A. M. O coordenador/formador como um dos agentes de
transformação da/na escola. In: In: ALMEIDA, L. R.; PLACCO, V. M. N. S.
O
coordenador pedagógico e o espaço da mudança. 7ª ed. São Paulo: Loyola,
2009.
PARRAT-DAYAN, S. Como enfrentar a indisciplina na escola. São Paulo:
Contexto, 2008.
PESSOA, F. Pedras no Caminho. In: SARMENTO, L. L; TUFANO, D. Português:
literatura, gramática, produção de texto. Volume único. São Paulo: Moderna, 2004.
PIAGET, J. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.
PLACCO, V. M. N; SILVA, S. H. S. A Formação do professor: reflexões, desafios,
perspectivas. In: BRUNO, E. B. C; ALMEIDA, L. R.; CHRISTOV, L. H. S (org.). O
coordenador Pedagógico e a formação docente. 8ª ed. São Paulo: Loyola. 2007.
REGO, T. C. R. A indisciplina e o processo educativo: uma análise na perspectiva
vygotskiana. In: AQUINO, J. G. (org). Indisciplina na Escola: alternativas teóricas e
práticas. São Paulo: Summus, 1996.
ROSA, M. C. C. A escrita dos professores: instrumento de reflexão sobre a prática
pedagógica. In: SOLIGO, R. A.; PRADO, G. V. T. (orgs.). Porque escrever é fazer
história: revelações, subversões, superações. Campinas, SP: Alínea, 2007.
SETTON, M. G. Mídia e educação. São Paulo: Contexto, 2010.
87
SCHÖN, D. Formar Professores como profissionais reflexivos. In: NÓVOA, A. (org.).
Os professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
SILVA, M. O trabalho articulador do coordenador pedagógico: a integração
curricular. In: PLACCO, V. M. N. S; ALMEIDA, L. R. (orgs.). O coordenador
pedagógico e os desafios da educação. São Paulo: Loyola, 2008.
SILVA, M. A Formação do Professor Centrada na Escola: uma introdução. São
Paulo: EDUC, 2002.
SILVA, M. A. Qualidade social da educação pública: algumas aproximações.
Caderno Cedes, Campinas, v. 29, n. 78, p. 216-226, mai./ago. 2009. Disponível
em:< http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 20 nov. 2010.
SOLIGO, R. A.; PRADO, G. V. T. Leitura e escrita: dois capítulos desta história de
ser educador. In: SOLIGO, R. A.; PRADO, G. V. T. (orgs.). Porque escrever é fazer
história: revelações, subversões, superações. Campinas, SP: Alínea, 2007.
SOUZA, V. L. T; PLACCO, V. M. N. S. O coordenador pedagógico, a questão da
autoridade e a formação de valores. In: ALMEIDA, L. R; PLACCO, V. M. N. S.
(orgs.). O Coordenador pedagógico e questões de contemporaneidade. São
Paulo, 2006.
SOUZA, V. L. T de. O coordenador pedagógico e a constituição do grupo de
professores. In: ALMEIDA, L. R; PLACCO, V. M. N. S. (orgs.). O coordenador
pedagógico e o espaço da mudança. 7ed. São Paulo: Loyola. 2009.
TARDIF, M. Saberes Docentes: Formação Profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.
VASCONCELLOS, C. S. Disciplina: Construção da disciplina consciente e interativa
em sala de aula e na escola. 15ª Ed. São Paulo: Libertad, 2004.
VEIGA, I. P A; VIANA, C. M. Q. Q. Formação de professores: um campo de
possibilidades inovadoras. In: VEIGA, I. P. A; SILVA, E. F. A Escola Mudou. Que
Mude a Formação de Professores! Campinas: Papirus, 2010.
VICENTINI, A. A. F. Provocações sobre o (meu?) não entender. In: SEMINÁRIO
FALA OUTRA ESCOLA 5, 2010. Campinas. Anais do V Seminário Fala Outra
Escola, Campinas: FE/UNICAMP, 2010, p. 43.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. 6ª ed. São Paulo: Martins Fontes,
2003.
88
ZEICHNER, K. O professor como prático reflexivo. In: NÓVOA, A (org). Os
professores e sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1992.
Filmografia:
PRO DIA NASCER FELIZ. Direção de João Jardim. Brasil, Copacabana Filmes,
2006. 88 min. (Documentário).
ENTRE OS MUROS DA ESCOLA. Direção de Laurent Cantet. França, Imovision,
2008 128 min. (Drama).
ESCRITORES DA LIBERDADE. Direção de Richard LaGravenese. Alemanha/USA,
VIP, 2007. 122 min. (Drama).
89
Download

sentidos da indisciplina em reuniões de htpc com