Metodologia para análise de Política Pública:
Programa Minha Casa, Minha Vida.
Saulo Andrade Yamamoto
Programa de Pós Graduação em Arquitetura e Urbanismo, UFES, Brasil.
E-mail: [email protected]
Resumo: O Programa Minha Casa Minha Vida (PMCMV), se propõe a combater o déficit
habitacional no Brasil, estimado em mais de seis milhões de moradias. Por ser uma política pública,
cumpre uma série de etapas de elaboração e execução, sendo a última a sua avaliação. Assumindo
que há um potencial político nessa avaliação, que pode gerar resultados distorcidos ou tendenciosos,
o autor deste trabalho julga ser de suma importância a avaliação independente do programa, o que a
academia realiza de forma extensa e de qualidade. No entanto, percebe-se a falta de uma avaliação
que abarque todo o País, com parâmetros comparáveis e padronizados. Para suprir essa lacuna, este
trabalho apresenta a elaboração e aplicação de metodologia para avaliação do PMCMV, abordado
como política pública, propondo a obtenção de metodologia de avaliação aplicável a todo o território
nacional. A partir desse desenvolvimento, o artigo apresenta os resultados obtidos com sua aplicação
no Brasil e no Estado do Espírito Santo, para aferir a pertinência do método nas diferentes escalas
de estudo. Os resultados indicam que a metodologia consegue realizar uma avaliação que evidencia
pontos de conflito entre o programa e seus objetivos, apontando locais que demandam estudos mais
aprofundados.
Palavras-chave: Política Pública; Metodologia de avaliação; Habitação.
Abstract: The Brazilian housing program called “Programa Minha Casa Minha Vida” (PMCMV),
aims to tackle the housing deficit in Brazil, estimated in more than six million homes. As a public
policy, takes a lot of preparation and execution phases, being the last one its assessment. Assuming
that there is a political potential of this assessment, which can cause distortions or influenced results,
the author of this paper thinks is of great importance the independent program evaluation, which the
academy performs extensively and quality. However, it is realized the lack of an evaluation that
covers the entire country, with comparable and standardized parameters. To fill this gap, this paper
presents the development and application of a methodology for evaluation of PMCMV, approached as
public policy, proposing a methodology applicable to the entire national territory. From this
development, the article presents the results obtained with its application in Brazil and in the state of
Espírito Santo, to assess the relevance of the method in different study scales. The results indicate that
the method can perform an assessment that highlights points of conflict between the program and its
objectives, pointing out places that require further study.
.Key-words: Public Policy; Assessment Methodology; Housing.
1. INTRODUÇÃO
Este trabalho é parte integrante de dissertação de mestrado do mesmo autor, que tem como ponto de
partida e tema central a questão da habitação: incluindo o déficit habitacional no Brasil, o direito à
cidade que a permeia, a influência do Estado e do Capital para o seu agravamento e quais são as
formas de enfrentamento dessa questão. Parte do pressuposto de que ela deve ser encarada como um
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problema de interesse público e que, portanto, demanda uma política pública para seu tratamento. As
políticas públicas delimitam o primeiro recorte da pesquisa, com enfoque nas políticas habitacionais,
em sua escala macro, e em escala mais aproximada, no Programa Minha Casa Minha Vida
(PMCMV), política pública específica, de financiamento habitacional, que suplanta a política
habitacional.
Políticas públicas, segundo Secchi, constituem diretrizes elaboradas para o enfrentamento de um
problema público, no caso, a falta de moradia. Essas políticas possuem etapas de desenvolvimento e
aplicação, que se iniciam com a identificação do problema, passam por todas as etapas de elaboração
da política e culminam com a sua avaliação, que leva à extinção ou renovação da política em questão.
A política em questão, o PMCMV, se constitui em um programa habitacional, inserido no Plano
Nacional de Habitação. Sua meta é o fomento da produção de moradias através de subsídios e
financiamentos para a aquisição da casa própria. Esses incentivos são destinados às famílias de baixa
renda, divididos em três faixas de atendimento. Para a área urbana, foco deste trabalho, essas faixas
são definidas da seguinte maneira: a faixa um é composta por famílias com renda de até R$1.600,00,
que recebem subsídios para a compra de unidade habitacional (UH) no valor de até R$76.000,00,
pagando prestações mensais de até 5% de sua renda ou mínima de R$50,00 durante dez anos; as
faixas dois e três recebem descontos destinados à redução no valor das prestações para a aquisição da
UH, a faixa dois, composta por famílias com renda de até R$3.275,00, concede descontos de até
R$25.000,00, e a faixa três, para famílias com renda de até R$5.000,00, é beneficiada com a redução
da taxa de juros do financiamento habitacional, indo de 5% a 7,16%. Dessa forma, o programa tem
por meta a produção de dois milhões e meio de moradias, de acordo com o Ministério das Cidades
(MCIDADES).
A questão da moradia, dentro do PMCMV, é tratada como um déficit de UH que precisa ser suprido.
No entanto, segundo Bolaffi, a identificação do problema e a importância e prioridade que lhes são
atribuídas variam de acordo com as estratégias daqueles que estão no poder.
Os governos e os grupos no poder enfrentam problemas reais, particulares e
determinados, de cuja solução depende a sua possibilidade de manter-se no
poder. Porém, o caráter particular e não universal, desses problemas reais, exige
que a sua verdadeira natureza seja transfigurada para que possam assumir um
significado compatível com a vontade popular. Em síntese, é este o processo
pelo qual a ideologia mascara os problemas do real e os substitui pelos falsos
problemas. Isto é, formulam-se problemas que não se pretende, não se espera e
nem seria possível resolver, para legitimar o poder e para justificar medidas
destinadas a satisfazer outros propósitos. (BOLAFFI)
Temos daí que as avaliações da política pública afetam as considerações e
consequências relacionadas com a determinação de culpa e a reinvindicação de
crédito às atividades governamentais em todos os estágios do processo político,
podendo todas elas ter consequências eleitorais, administrativas e outras para os
atores políticos. (HOWLETT)
Percebe-se, portanto, a importância que a avaliação das políticas públicas toma. Entendendo que as
avaliações realizadas em relação ao PMCMV, dada a sua importância e magnitude junto à população,
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podem ser realizadas visando um reforço de imagem positiva, este artigo busca o desenvolvimento de
uma metodologia de avaliação para ser aplicada ao PMCMV. Fazendo um contraponto à avaliação
oficial realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), uma “pesquisa de satisfação
dos beneficiários do PMCMV”, publicada em 2014, este trabalho prioriza a avaliação da destinação
dos recursos do programa, tanto em relação às faixas de renda quanto à distribuição geográfica em
relação ao déficit habitacional.
Dessa forma, o artigo propõe uma metodologia que apresenta as distorções do programa,
demonstrando que, apesar de se declarar como um programa habitacional, colocando na pauta pública
as demandas sociais, se presta principalmente ao desenvolvimento econômico, por meio do estímulo à
construção civil.
O desenvolvimento econômico, por si só, não é algo ruim. Contudo, por estar associado a um
programa de habitação, em que os resultados quantitativos são o principal objetivo, desconsiderando
todas as outras facetas da questão habitacional, acaba produzindo cidades, ou melhor, “não cidades”,
que, além de não resolver satisfatoriamente a demanda por moradia, geram novos problemas urbanos
e agravam ainda mais a questão habitacional.
Para que a metodologia proposta demonstre essa distorção do programa, de privilegiar o
desenvolvimento econômico em detrimento da cidade, esta pesquisa se baseia em outras avaliações,
realizadas no meio acadêmico, sobretudo nos livros do Observatório das Metrópoles, “Minha casa...
E a cidade?” e “O Programa Minha Casa Minha Vida e seus efeitos territoriais”. A pesquisa
abrange a coleta de dados primários em fontes oficiais do governo e o processamento dos dados
referentes à atuação do programa nos estados brasileiros. Foram considerados dados que pudessem ser
aplicados igualmente a todos os estados, proporcionando uma correlação entre os resultados obtidos,
permitindo a análise comparativa por meio dos mesmos padrões entre eles.
Assim, foram utilizados os seguintes dados, levantados a partir do site do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE), da Fundação João Pinheiro (FJP) e de prefeituras e governos
estaduais:

Municípios contemplados pelo PMCMV,

População total destes municípios,

Produto interno bruto,

Déficit habitacional,

Produção habitacional fomentada pelo PMCMV por faixa de renda,
A partir desses índices, foram estabelecidas análises e comparações, objetivando o confronto entre as
metas do PMCMV – o suprimento de moradias em combate ao déficit habitacional – e a real
efetivação do programa – observando a relação entre as três faixas de renda e a relevância dos
municípios implantados.
Esses dados foram tabulados e computados, gerando gráficos para facilitar a sua análise, aplicados a
cada estado selecionado para a pesquisa. Para estabelecer a relação entre a população total do estado,
valor dado per capita, e o déficit habitacional, medido em unidades habitacionais, usa-se como base os
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dados do IBGE 2011 (Tabela 1), que estipulam que a média de moradores por domicílio no Brasil se
dá na seguinte proporção:
2000
2010
Brasil
3,75
3,3
Região Norte
4,52
4,0
Região Nordeste
4,15
3,5
Região Sudeste
3,55
3,2
Região Sul
3,45
3,1
Região Centro-Oeste
3,63
3,2
TABELA 1 – média de moradores por moradia. Fonte: IBGE 2011.
Da mesma forma a composição do déficit em cada faixa é estipulada segundo a média do estado
conforme dados da FJP 2013, exemplificado na Tabela 2, para as regiões do país.
Sem
rendimento
0a3
SM
3 a 5 SM
5 a 10 SM
10 ou
mais SM
Brasil
3,9%
62,7%
14,5%
13,1%
5,8%
Região Norte
6,5%
58,5%
15,9%
13,0%
6,1%
Região Nordeste
5,2%
69,8%
12,8%
8,4%
3,8%
Região Sudeste
2,9%
60,3%
15,1%
15,2%
6,5%
Região Sul
2,4%
60,2%
14,6%
16,1%
6,8%
Região Centro-Oeste
4,6%
61,3%
14,3%
12,7%
7,1%
TABELA 2 – distribuição do déficit habitacional por faixa de renda. Fonte: FJP 2013.
A questão habitacional, conforme visto, não consiste apenas da demanda por moradia, mas também
das relações sociais que a cidade oferece, tais como acesso a empregos. Dessa forma, entendendo que
o PIB reflete o desenvolvimento econômico de uma cidade, e a oferta ou capacidade de gerar novos
empregos, esta análise busca identificar se existe relação entre os estados com as maiores
contribuições do PIB com os que mais recebem UH pelo PMCMV, partindo da relação entre
desenvolvimento econômico e atração populacional. Essa relação é posta pela premissa de que os
estados com as maiores populações serão aqueles que terão os maiores déficits habitacionais. Para
corroborar esses pressupostos, a primeira análise realizada é a da distribuição do PIB do Brasil entre
as suas unidades federativas. Simultaneamente, analisa-se a distribuição da população e do déficit
populacional, buscando demonstrar a relação entre o PIB e esses elementos.
A partir daí, a pesquisa prossegue para a distribuição dos empreendimentos PMCMV, dividida em
duas etapas. A primeira consiste na análise da distribuição dos números absolutos de unidades
habitacionais produzidas, apontando quanto cada estado recebeu proporcionalmente. Esta análise,
feita por faixas de renda separadamente, busca determinar se os investimentos são distribuídos
conforme o déficit habitacional.
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O PMCMV, em sua própria definição, busca fomentar a produção de unidades de moradia, para
reduzir o déficit habitacional. Com essa premissa, faz-se a análise da produção habitacional,
observando se as faixas mais carentes são as que mais recebem investimentos.
A segunda etapa, portanto, trás um estudo sobre a efetividade do programa em cada estado, indicando
quantas moradias foram produzidas em comparação ao déficit respectivo. Dessa forma, é possível
verificar se as faixas de renda mais carentes por moradia são as que mais recebem investimentos,
indicando a priorização do combate ao déficit, ou se as faixas de renda com maior potencial de
retorno financeiro recebem maior volume de recursos, indicando prioridade para o crescimento
econômico.
Como piloto, são apresentados neste estudo os resultados referentes ao Brasil e ao estado do Espírito
Santo, com o intuito de verificar a precisão do método, antes de estender a metodologia para as vinte e
sete unidades federativas. Os resultados se mostraram bastante satisfatórios, demonstrando o potencial
de aplicação do método ao conjunto dos estados brasileiros.
2. RESULTADOS
As análises realizadas foram organizadas em três etapas. A primeira etapa apresenta a distribuição do
PIB, da população absoluta e do déficit habitacional. Na segunda, apresenta-se a distribuição dos
empreendimentos PMCMV e na terceira etapa, a efetividade do programa por faixa de renda.
Brasil
A primeira análise realizada é sobre o Brasil, de forma macro, aplicando a metodologia aos estados do
país. O país, de acordo com os dados o IBGE, possuía em 2012 um PIB em torno de 4,4 trilhões de
reais. Conforme apresentado na figura 1, o PIB tem grande concentração nos estados do sul e sudeste,
sendo aproximadamente 32% no Estado de São Paulo, seguido pelo Rio de Janeiro com quase 12% e
Minas Gerais com pouco mais de 9%. Esses três estados juntos são responsáveis por mais de 50% do
PIB do País, indicando um alto grau de desenvolvimento econômico na Região Sudeste e, em segundo
plano, a Região Sul, que detém aproximadamente 16% do PIB, seguido pelo nordeste, com 13,5%.
Seguindo este padrão, a população do Brasil, que era de aproximadamente 190 milhões de habitantes
segundo o último censo realizado pelo IBGE, em 2010, também se localiza primordialmente na
Região Sudeste, com mais de 40% da população, sendo que São Paulo concentra mais da metade
desse total. A Região Sul apresenta uma distribuição muito semelhante à do PIB, possuindo em torno
de 14% da população. Já na Região Nordeste está 28% da população, com destaque para o Estado da
Bahia, de grande extensão territorial, localização estratégica no País e grande relevância histórica,
com quase 7,5% da população do País.
Com essa população, o Brasil possuiria um déficit habitacional de mais de seis milhões de moradias,
segundo a FJP. A distribuição desse déficit guarda correlação com a distribuição da população, de
modo que, de maneira geral, os maiores déficits habitacionais estão nos estados com as maiores
populações. O déficit na Região Sudeste é da mesma ordem que a distribuição da população, em torno
de 40%, sendo apenas São Paulo com 22%. A Região Nordeste apresenta os mesmos 28% de déficit,
com destaque negativo para o Estado da Bahia, com 8,4%, e positivo para o Maranhão, que apesar de
possuir 3,45% da população do País, apresenta menos de 1% do déficit. No entanto, algumas
diferenças se destacam, como a Região Sul, que possui pouco mais de 11% do déficit, e o Estado do
Pará, que apesar de pouca contribuição para o PIB e pouco populoso, possui quase 6,5% do déficit do
País.
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Figura 1 – Distribuição do PIB, população e Déficit no Brasil, por estados.
Fontes: IBGE (2010), FJP (2012)
A partir dessas informações, a pesquisa traça uma comparação entre o desempenho do PMCMV e a
realidade do País. Segundo os dados do MCIDADES, o PMCMV contratou 1.521.331 UH, divididas
entre as três faixas de atuação do programa. A faixa um recebeu 52% dessas, ou 790 mil UH, a faixa
dois, 37%, o equivalente a mais de 564 mil UH e, por último, a faixa três, 12%, em torno de 183 mil
UH. Nota-se que, apesar das unidades contratadas ainda estarem muito aquém de suprir todo o déficit
habitacional, e que a faixa um tenha recebido menos investimentos em relação às outras faixas,
quando comparado com o déficit, o PMCMV parece obter bons resultados em sua proposta de manter
a produção voltada para as famílias de mais baixa renda.
Um fenômeno interessante surge quando se analisa a distribuição dos empreendimentos pelos estados.
Conforme expõe a figura 2, a faixa um possui distribuição dos empreendimentos próxima ao do
déficit. Alguns estados, porém, destoam, como São Paulo, que apresenta apenas 11% das moradias
contratadas, ante 22% do déficit, e a Bahia, com os mesmos 11%, ante 8% do déficit.
A faixa dois, por outro lado, apresenta uma concentração nos estados com maior participação no PIB,
com destaque para São Paulo, que contratou mais de 24% das unidades.
Figura 2 - Distribuição dos empreendimentos do PMCMV nos estados e no Distrito Federal por faixa de renda.
Fonte: MCIDADES (2012)
Quando analisada a faixa três, São Paulo concentra 34% das contratações, indicando que, pelo menos
para esse Estado, as faixas de maior retorno financeiro são as que mais recebem investimentos. No
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entanto, a distribuição das contratações pelo País parece fugir do padrão de distribuição do PIB e da
população, demandando investigações mais detalhadas para identificar as razões.
Por outro lado, ao ser feita a comparação entre os resultados obtidos pelo PMCMV e o déficit, a
diferença de investimentos se torna evidente. Apesar de a faixa um ter recebido mais de 50% dos
investimentos do programa, 19% do déficit foi suprido. De todos os estados, apenas o Maranhão
supriu mais de 32% do déficit, suprindo 102% do seu déficit. A faixa dois, por outro lado, já apresenta
resultados na ordem de 63% do déficit suprido, sendo que muitos estados produziram mais de 100%
de seu déficit, indicando que os recursos do programa podem estar sendo utilizados mais para o
estímulo da economia do que para o combate ao déficit habitacional, conforme exibido na figura 3.
A faixa três, por outro lado, apresenta índices baixos de produção, suprindo apenas 23% do déficit.
Esses resultados parecem indicar que apenas a redução das taxas de juros não é fator suficiente para
estimular a construção civil, suscitando novas pesquisas a respeito.
Figura 3 – Porcentagem do déficit habitacional suprido pela produção de moradia pelo PMCMV.
Fonte: MCIDADES (2012)
Apresentados os resultados do Brasil, a pesquisa prossegue para uma análise mais aproximada,
aplicando a metodologia aos estados e seus municípios. Neste artigo, a análise refere-se ao Estado do
Espírito Santo.
Espírito Santo.
O Estado do Espírito Santo se localiza na Região Sudeste, sendo o menor dos seus quatro integrantes.
Possui 77 municípios além da capital, Vitória, na região central do estado. De acordo com os dados
do IBGE, o seu PIB é de 107 bilhões de reais, o equivalente a 2,5% do PIB nacional. Do PIB
capixaba, 57% estão concentrados na Região Metropolitana da Grande Vitória (RMGV), composta
pelos municípios de Vitória, Vila Velha, Serra, Cariacica, Viana, Guarapari e Fundão. Também
aparece com destaque a região sul do Estado, ligada à indústria petroleira e ao Rio de Janeiro, e o
entorno de Linhares, na região norte, de forte tradição industrial.
Com uma população de quase quatro milhões de habitantes, em torno de 45% residem na RMGV,
seguido de Cachoeiro de Itapemirim, principal cidade da região sul do Estado, com 5,4% da
população, além de Linhares, com 4% e seu entorno. O déficit habitacional no Estado é de mais de 99
mil moradias, sendo 53% apenas na RMGV, seguida por Linhares, com quase 5% e Cachoeiro de
Itapemirim, com 4,4% do déficit. Com base nessas informações, apresentadas na figura 4, é possível
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afirmar que a distribuição do déficit segue os mesmos padrões da distribuição tanto do PIB quanto da
população.
Figura 4 - Distribuição do PIB, população e déficit habitacional no Estado do Espírito Santo.
Fontes: IBGE (2010), FJP (2012), MCIDADES (2012).
Foram contratadas no Estado 23.765 UH, entre as três faixas de atuação do programa, sendo que a
faixa um recebeu 44% (10.346 UH), a faixa dois 35% (8.369 UH) e a faixa três 22% (5.050 UH).
Nota-se um equilíbrio maior entre as três faixas, em relação à média nacional, sobretudo devido à
transferência de parte dos investimentos da faixa um para a faixa três. Quatro municípios se destacam
na produção para a faixa um: São Mateus, Linhares e Colatina, devido à política local de expansão da
mancha urbana para especulação imobiliária (ALBANI, 2012), e Vila Velha - única cidade integrante
da RMGV, graças a grandes condomínios inaugurados na região de Terra Vermelha, uma região
periférica, distante 15 km do centro da cidade. (figura 5)
As faixas dois e três, por outro lado, apresentam intensa concentração dos investimentos no Município
da Serra, alcançando na faixa dois mais de 50% dos investimentos e 86% na faixa três. Isso se dá na
medida em que a Serra é a principal frente de expansão urbana da região metropolitana, sobretudo
graças à ação de grandes construtoras como a MRV Engenharia (Jornal FOLHA VITÓRIA), o que
explica essa forte concentração.
Tem-se então, de acordo com a distribuição dos investimentos por faixa de renda, que a faixa um
recebe produção principalmente fora da RMGV, detentora do maior déficit, enquanto a maior parte da
produção nas faixas dois e três é realizada dentro dessa região. Essa produção do espaço reforça a
segregação social, levando a população de mais baixa renda para fora dos polos desenvolvidos.
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Figura 5 - Distribuição dos empreendimentos MCMV no estado do Espírito do Santo por faixa de renda.
Fonte: MCIDADES (2012)
Além disso, ao se analisar as taxas de produção do PMCMV em relação ao déficit, pode-se notar que
a faixa dois é a mais produtiva, de acordo com a figura 6. Devido à menor participação da faixa um
nos investimentos do PMCMV no Estado, ela acaba suprindo apenas 15% do seu déficit habitacional,
sendo que a faixa dois supriu 65% do seu déficit habitacional. Nesta faixa, em cinco municípios já foi
atendido mais de 100% do déficit dessa faixa, entre eles a Serra, com quase 220% do déficit suprido.
A faixa três, por outro lado, apesar dos mais de 46% do déficit suprido, concentra a maior parte das
casas construídas em Linhares, com 67% do seu déficit suprido, e em Serra, com quase 270%.
Figura 6 - Porcentagem do déficit habitacional suprido pela produção de moradia pelo PMCMV.
Fonte: MCIDADES (2012)
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A partir desses dados, observa-se que a produção para a faixa um, de menor poder aquisitivo, guarda
relação efetiva com o déficit habitacional, mas está longe de alcançar sua eliminação. Já para a faixa
dois, a relação de produção passa a privilegiar a distribuição do PIB, demonstrando maior
preocupação com a lógica de mercado e o potencial de retorno do investimento. Na faixa três, do
mesmo modo que no país como um todo, a produção se concentra nos locais com maior potencial de
retorno financeiro, que, no Estado do Espírito Santo é o município de Serra.
Por fim, comparando as três faixas do PMCMV no Espírito Santo, é possível identificar que o
município de Linhares obteve os melhores rendimentos em todas as faixas, seguido de Vila Velha.
Contudo, o que mais chama a atenção é a produção extrema no Município de Serra para as faixas dois
e três.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Concluídas as análises, é possível afirmar que a metodologia apresenta resultados compatíveis com as
avaliações realizadas pelo meio científico, corroborando a hipótese inicial de que a produção
habitacional é voltada mais para o crescimento econômico do que para o combate ao déficit
habitacional, dada a discrepância de produção entre as faixas um e dois. Os resultados se mostraram
também como bons índices balizadores para pesquisas mais aprofundadas, investigando pontualmente
situações que destoem da média, tais como o Estado do Maranhão, na escala nacional, ou o município
da Serra, no Estado do Espírito Santo. Do mesmo modo, a baixa produção na faixa três, abaixo do
esperado, também se mostra como uma questão a ser investigada, uma vez que, devido ao seu público
de maior poder aquisitivo, haveria possibilidade de maiores retornos financeiros, mesmo considerando
a existência de limitação dentro do próprio programa para o investimento nessa faixa.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALBANI, Vivian. Trajetória do crescimento da cidade de Colatina. Vitória: UFES, dissertação de
mestrado, 2012.
AMORE, C. S; SHIMBO, L. Z; RUFINO, M. B. C. Minha casa... e a cidade? Avaliação do Programa
Minha Casa Minha Vida em seis estados brasileiros. Observatório das Metrópoles: Editora Letra
Capital, 2015.
BOLAFFI, Gabriel. O problema e o falso problema. Comunicação apresentada durante Simpósio
sobre Habitação Popular no Brasil. Belo Horizonte. 1975.
CARDOSO, Adauto Lúcio. O Programa Minha Casa Minha Vida e seus efeitos territoriais.
Observatório das Metrópoles: Editora Letra Capital, 2013.
FOLHA VITÓRIA. MRV bate a marca de três mil unidades construídas em Serra. FOLHA
VITÓRIA. Disponível em http://www.folhavitoria.com.br/economia/noticia/2014/09/mrv-bate-amarca-de-tres-mil-unidades-construidas-em-serra.html#. 01/09/2014.
HOWLETT, M; RAMESH, M; PERL, A. Política Pública: Seus Ciclos e Subsistemas: uma
Abordagem Integradora. Rio de Janeiro: Editora Campus, 2012.
SECCHI, Leonardo. Políticas Públicas: conceitos, esquemas de análise, casos práticos. São Paulo:
Editora Cengage, 2013. 2ª edição.
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