SUSHI TUPINIQUIM Passeamos pelo bairro oriental da capital paulista e descobrimos uma tribo pra lá de excêntrica REPORTAGEM: LUIS FELIPE SILVA E RODRIGO PEDROSO
FOTOS: ANDRÉ CRUZ REVISÃO: ARYANNA OLIVEIRA EDIÇÃO: NATHALIE PIMENTA Com o Centenário da Imigração Japonesa, a ser comemorado no ano que vem, a atenção da mídia já começa a ser voltada para os imigrantes japoneses, que desembarcaram no Brasil desde 18 de junho de 1908, o que gerou o 1,5 milhão de descendentes que atualmente residem em terras tupiniquins. O foco principal da comemoração na cidade de São Paulo não poderia ser outro senão o bairro da Liberdade, parte da região central da capital paulista que faz divisa com as regiões Sé e Aclimação. ESQUERDA Feirinha de fim
de semana da Liberdade, SP
Dentre as principais atrações que o bairro oriental oferece aos visitantes, estão a feirinha de comidas típicas, realizada todos os sábados e domingos próxima ao metrô Liberdade, e o Sogo Plaza, shopping center onde podem ser encontradas lojas especializadas em roupas típicas como quimonos e chinelos de madeira, e diversas outras que vendem DVDs de animes (leia‐se animê, os famosos desenhos japoneses). De acordo com os vendedores, essas mídias não podem ser chamadas de piratas, já que nenhuma distribuidora brasileira licenciou a distribuição dos desenhos. Enquanto isso não acontece, os fãs da cultura oriental aproveitam para saírem das lojas carregados de sacolas com, no mínimo, 10 caixinhas de DVDs. Muito foi falado na mídia sobre os desenhos japoneses, que influenciam a garotada na escolha da programação televisiva matutina há um bom tempo. Porém, quem visita o bairro da Liberdade, principalmente nas mediações do metrô da região, percebe uma variedade de grupos de jovens que ultrapassa o pouco que é conhecido sobre os fãs da cultura do Japão. Uma das tribos que cresce exponencialmente é a dos fãs de música ACIMA O shopping center Sogo Plaza, maior centro de compras do bairro
japonesa, mais especificamente do rock japonês, que são chamados pela maioria dos mesmos de j‐rockers. Muita calma, ainda temos mais uma divisão a fazer: dentro do cenário do japanese rock (desdobramento da abreviação j‐rock) existe duas vertentes: o Visual Kei e o não‐Visual. Visual Kei (leia‐se bijuaru kei, que em japonês pode ser traduzido como “linhagem visual”) é um movimento musical e de protes‐to que surgiu no Japão ao final da década de 1970. Impulsionados pelo progresso do país e pela conseqüente competência no mercado de trabalho japonês, as regras de conduta dos jovens ficavam cada vez mais severas. O corte de cabelo tinha que ser curto e reto para os garotos, e longo e reto para as meninas. O uso do uniforme da escola era obrigatório durante qualquer hora, de segunda a sexta. Revoltados com a rígida conduta imposta pela sociedade competitiva, as bandas que surgiram começaram a dar a mesma ênfase que reservavam às letras para o seu visual, enfeitando‐se com maquiagem, cortando os cabelos de modo assimétrico e desfiado, e DIREITA Uma das primeiras bandas de Visual Kei,
usando roupas indescritíveis ‐ veja a foto ao o X Japan, formada no início nos anos 80
lado como exemplo ‐ com o intuito de chocar a sociedade, o que no Japão é chamado de Visual Shock. Os jovens se aproveitaram da “folga” TRILHAS PAULISTANAS 15
do uniforme nos fins de semana para se encontrarem no bairro central de Harajuku, principal distrito de moda alternativa de Tóquio, vestindo‐se com roupas parecidas com a dessas bandas, criando uma contracultura que ainda ganha força nos dias de hoje. E não há outro modo de comprovar isso do que a influência global que está causando: o j‐rock e, juntamente com ele, o Visual Kei, já se firmaram no Brasil. ACIMA Grupo de jovens faz Visual Kei em Harajuku, Tóquio, Japão
Cabelo colorido: pode ser loiro por inteiro, com mechas cinza, verde, rosa, azul; o céu, ou no caso o arco‐íris, é o limite. Piercings, alargadores, muitos colares, pulseiras e anéis (de preferência prateados) e roupas tão indescritíveis quanto à das bandas que os inspiram. A diversidade de estilos no vestuário dos fãs de rock japonês que freqüentam religiosamente o bairro da Liberdade nos fins de semana é tanta quanto à peculiaridade deste grupo. Regata listrada, camisa preta e branca, macacão, saia, calça jeans, preta, rasgada ou não, bota, sapato feito sob encomenda ou o velho Converse All Star. Vale tudo. Ou quase tudo. “Algumas pessoas exageram no visual, vindo para a ‘Liba’ (apelido carinhoso do bairro) com roupas muito exageradas, sem um estilo definido. Acham que estão fazendo Visual, mas só estão pagando mico.” – conta Tadashi, fã de música japonesa e ex‐freqüentador do bairro da Liberdade (saiba mais sobre ele em PERFIL E ENTREVISTA, na pág 19). TRILHAS PAULISTANAS 16
Como toda diversificação, a variedade dentro de tipos e estilos dos fãs da música japonesa acaba criando algumas divergências. “Quem curte j‐rock não curte anime, há hostilidade mútua entre os grupos” – radicalizam Anne e Dana, apelidos de Danielli C. e Annelise L., respectivamente; ambas de 21 anos. “Nas tardes de domingo era mais nosso o pessoal freqüentava. Ultimamente abriu demais, o lugar está muito heterogêneo,” completa a dupla, que há mais de seis anos fazem parte da tribo. ESQUERDA Dana (esq.) e Anne (dir.), na
Liberdade: inspiradas pelo j-rock
Conflitos a parte, o fato é que os j‐rockers são um dos novos grupos mais alternativos e interessantes da cidade de São Paulo. Um perfil no Orkut e uma conta no Fotolog.com são mais do que necessários para se divulgarem e conhecerem outros fãs do mesmo tipo de música. “Todo mundo tem apelido na internet, e geralmente é chamado por ele quando se encontra com os amigos aqui e em eventos de anime,” explicam Anne e Dana. A internet é uma ferramenta mais do que necessária para os j‐rockers. É do Orkut ou de programas de compartilhamento de arquivos que descobrem novas bandas e novos DIREITA O fotolog é uma
ferramenta básica dos jrockers. Ao lado, foto do
acervo digital de Ichi
lançamentos das já conhecidas. Mesmo mostrando‐se originais, o grupo muitas vezes é confundido com outras tribos, e não costumam gostar disso. “Fui chamada de emo hoje,” ri Karura, 14 anos, freqüentadora do bairro oriental e fã de Dir en grey e An Cafe. TRILHAS PAULISTANAS 17
Entretanto, pior do que isso é sofrer preconceito. “Às vezes me confundem com mulher,” conta Tadashi. “Acho que muitos j‐rockers não usam visual por medo de sair na rua e sofrer algum tipo de agressão,” complementa. Esse medo é justificado por fatos recentes que ocorreram na Liberdade. “Semana passada meu amigo levou quatro facadas de um skinhead,” nos revelou Ichi, de 19 anos. “Agressões físicas por parte deles e de punks acontecem sempre. É o principal motivo pelo qual evito freqüentar a Liba ultimamente. Só apareço quando algum amigo que não vejo há muito tempo resolve vir pra cá.” – completa o garoto. Como todo grupo social, há lados bons e ruins. O j‐rock provou ser conseqüência da globalização do século XIX: sem a internet, somente pessoas que já visitaram o Japão poderiam conhecer alguns dos roqueiros japoneses. Mas a propagação da banda larga proporcionou a facilidade de download de discografias e shows de roqueiros japoneses por qualquer brasileiro. E essa mídia ganha espaço, já sendo vendida em algumas lojas da Liberdade e em eventos de anime e mangá (as revistas em quadrinhos japonesas) de São Paulo e do Rio de Janeiro. Para quem deseja se aventurar numa das mais, se não a mais original das tribos que ganha cada vez mais espaço no Brasil, confira o box na pág. 21. Já quem deseja conferir in loco a experiência, os j‐rockers podem ACIMA Vista das mediações do metrô Liberdade
ser encontrados nas mediações do metrô Liberdade a partir das 13 horas dos sábados e domingos. Para os mais tímidos, há a comunidade do Orkut J‐rock e Visual Kei: http://www.orkut.com/ Community.aspx?cmm=9186192 TRILHAS PAULISTANAS 18
PERFIL E ENTREVISTA
Saiba mais sobre j-rockers com Felipe Watanabe
Nome: Felipe Tadashi Watanabe
Apelido: Tadashi
Idade: 17 anos a serem
completados em novembro
Cidade: Santo André – SP TRILHAS PAULISTANAS: O que fez
Procurando pela trilha sonora dos
você gostar de j-rock? desenhos,
TADASHI: Já me interessava por
bandas. A partir daí, foi fácil conhecer
animes
mais coisas sobre j-rock e Visual Kei.
há
um
bom
tempo.
comecei
a
gostar
das
ACIMA Tadashi nas escadarias do metrô Liberdade
TRILHAS PAULISTANAS 19
TP: O que mais lhe chamou a
TP: Qual é o motivo de você parar
atenção no Visual Kei?
de ir até a Liberdade nos fins de
T: O estilo, a originalidade. Nada é
semana?
igual às roupas, a maquiagem e os
T: Quando comecei a ir pra Liba o
cabelos dos membros das bandas.
pessoal
TP: Como você é influenciado por
formávamos um grupo só. Com a
esse estilo?
divulgação do j-rock começaram a
T: Sou inspirado por The gazettE e
aparecer pessoas que conhecem uma
Nightmare (saiba mais sobre elas no
ou duas bandas e já vão falando que
BOX da página seguinte).
são j-rockers. Isso me incomodou,
Mas não
era
mais
restrito;
acho que se deve imitar o visual de
fazendo
uma banda, mas sim montar o seu
outros lugares, como a Galeria Ouro
próprio por inspiração. Pra mim o
Fino, na Rua Augusta. Mas por
cabelo é o item mais importante.
causa dos estudos, ultimamente não
Também dou bastante atenção aos
saio mais. Fico bastante na internet:
acessórios:
no Orkut, Fotolog, MSN e etc...
piercings,
pulseiras,
colares, e às vezes pinto as unhas.
com
que
fossemos
para
TP: Existe preconceito dentro da
tribo?
T: Mais ou menos – pausa – acredito
que
pessoas
esteticamente
financeiramente
e
não-favorecidas
tendem a ser rejeitadas por um grupo
já estabelecido. Se você não tem
dinheiro, não poderá comprar roupas,
acessórios,
e
as
pintar
muitas
o
outras
costumamos
fazer.
importância
da
cabelo
coisas
Por
que
causa
estética,
da
pessoas
consideradas feias ou gordas serão
rejeitadas pelos mais radicais.
TP: O que você pensa disso?
T: Não acho legal. O fato de uma
pessoa não ser aceita esteticamente
não pode impedi-la de gostar do que
gosta. Só não pode fazer uma mistura
“Por causa da importância da
estética, pessoas consideradas
feias ou obesas serão rejeitadas
com
o
guarda-roupa
e
vir
pra
Liberdade achando que está fazendo
Visual Kei. Só é preciso bom senso.
TRILHAS PAULISTANAS 20
DICAS DE BANDAS
Curioso? Saiba mais sobre as bandas mais ouvidas pelos j-rockers brasileiros abaixo:
Dir en grey
The gazettE
Nightmare
An Cafe
Alice Nine
Banda formada
Grupo formado
Conjunto que
Representantes
Grupo formado
em 1997 por Kyo,
em 2002 por
ganhou destaque
do Oshare Kei,
por Shou,
Kaoru, Toshiya,
Ruki, Reita,
no Brasil com The
divisão do Visual
Hiroto, Tora,
World, música de
Kei que dá
Saga e Nao em
abertura do
preferência a um
2004, e tão
anime Death
visual colorido, o
queridinha pelos
Note. Formada
An Cafe é
brasileiros
por Sakito,
formado por
quanto The
Ni~ya, Yomi,
Miku, Kanon,
gazettE e chama
Ruka e Hitsugi.
Takuya, Teruki e
atenção pela
Yuuki
variedade nos
http://www
http://www.
visuais.
.orkut.com/
orkut.com/
http://www.
Community.aspx?
Community.aspx?
pscompany.co.jp
cmm=2245454
cmm=6827674
/alicenine (oficial)
Die e Shinya.
Aoi, Kai e
Recentemente fez
Uruha.
turnê nos EUA e é
Inspirada pelo
considerada a
Dir en Grey, é
mais famosa no
a favorita dos
circuito japonês
brasileiros
atual.
depois deles.
http://www.
www.direngrey.co.jp
pscompany.co.jp
(oficial)
/gazette (oficial)
DICAS DE SITES
Acesse os sites abaixo e fique por dentro das principais novidades do j-rock:
Soulseek
Japan Forum
JaME Brasil
O melhor
Fórum sobre o
O primeiro site
programa de
Japão visitado por
de informações
compartilhament
pessoas de todos
sobre música
o de arquivo
os lugares do
japonesa. A
para encontrar
mundo. A galeria
principal fonte
imagens,
de fotos está
de notícias sobre
músicas e shows
recheada de
as bandas do
de bandas de j-
imagens de
oriente.
rock.
Harajuku.
www.slsknet.org
www.japan
www.jmusic
forum.com
america. com
YouTube
Wikipedia
Dispensa
Outro velho
apresentações.
conhecido dos
Digite o nome de
brasileiros,
uma música ou
contém
de uma banda
informações e
que aparecerão
fichas técnicas
quase todos os
completas de
videoclipes feitos
muitas bandas.
pelos j-rockers.
www.youtube.com
http://wikipedia.org
TRILHAS PAULISTANAS 21
Download

SUSHI TUPINIQUIM - Aryanna Oliveira