III SEMINÁRIO POLÍTICAS SOCIAIS E CIDADANIA
AUTOR DO TEXTO: Miguel Rodrigues Netto
Dilemas e desafios do sindicalismo brasileiro frente ao Estado Neoliberal
RESUMO: O Estado brasileiro apresentou ao longo de sua história republicana diversas
facetas que, a exemplo de outras nações, refletiram um estágio de maior ou menor
organização dos trabalhadores. Nossa república experimentou poucos períodos
democráticos e experiências como a do Estado de Bem-Estar Social ocorrida em diversos
países após a segunda guerra, não tiveram plenitude e universalidade no Brasil. Nosso
recorte busca contextualizar o sindicalismo brasileiro fazendo um breve relato sobre suas
origens e evolução até chegar aos marcos do Estado Neoliberal, discutindo sobre as
tendências contemporâneas do movimento e apontando os desafios frente ao atual
modelo de Estado brasileiro.
Palavras-chave: Trabalhadores, neoliberalismo, sindicalismo.
Caracterização do sindicalismo brasileiro
A Revolução Industrial ocorrida na Europa do século XIX colocou o sistema
capitalista em um novo patamar de organização. As bases para o processo de
mundialização da economia que nos dias de hoje parece incomodar muitos Chefes de
Estado estimulando-os a impor diversas barreiras à entrada de produtos e mesmo de
pessoas de outros países em seus territórios, teve na revolução industrial iniciada na
Inglaterra seu nascedouro.
Com o fortalecimento e modernização das indústrias e o crescimento do comércio
mundial, a população fabril composta por operários cresce consideravelmente e a partir
desta expansão e da necessidade de uma produção mais dinâmica que atendesse a
crescente demanda do mercado, vai se construindo o clima para o surgimento de
organizações de trabalhadores que pudessem organizar o contingente de operários para
reivindicar mudanças no cotidiano das fábricas.
A jornada dos trabalhadores era desumana, além de permanecerem por 16 horas
no interior das fábricas, não havia preocupação com segurança e muito menos com a
higiene dos locais. Em muitos casos, as famílias eram todas formadas por trabalhadores,
desde pai e mãe às crianças menores, sendo que todos permaneciam o mesmo tempo
desempenhando atividades laborais.
No Brasil, a pequena classe trabalhadora urbana também buscava se organizar
contra as más condições de trabalho. E depois de ações mais isoladas, os trabalhadores
conseguem organizar em 1906 na cidade do Rio de Janeiro, então capital da república, o
primeiro Congresso Operário Brasileiro que lança as bases para uma organização
nacional – a Confederação Operária Brasileira – COB, fundada em 1908 e também se
solidariza com os operários de outros países.
A grande combatividade é marca dos primeiros momentos do sindicalismo
brasileiro, que desde suas origens lutou contra a degradante situação no ambiente de
trabalho, pelo aumento de salários, redução de jornada laboral semanal e por direitos
que só foram conquistados muitos anos mais tarde já após o período da república velha.
A solidariedade aos companheiros estrangeiros que foram perseguidos e até extraditados
do Brasil por sua movimentação política era grande e demonstrava uma consciência de
classe revolucionária.
Em 1913, a COB realiza o II Congresso Operário Brasileiro, com a presença de
mais de cem delegados de quase todos os estados do Brasil. Era um momento de
extrema instabilidade mundial já às portas da primeira grande guerra e no Brasil crescia
e se espalhava a mobilização dos trabalhadores ainda sob forte influencia dos ideais
anarquistas.
O auge deste período foi a greve geral de julho de 1917, que paralisou a cidade
de São Paulo durante vários dias. Os trabalhadores em greve exigiam aumento de salário
sendo que este quadro de total exploração do início do século XX foi propício para a
organização dos trabalhadores em sindicatos.
Os sindicatos surgem como entidades de defesa dos interesses dos trabalhadores,
buscando combater a precarização das condições de trabalho, bem como reivindicar
direitos, que ao longo da história verificar-se-á que muitos foram atingidos.
O período pós Revolução Russa e 1ª Guerra Mundial caracterizou por uma onde de
greves como relata Antunes.
Foi o caso da greve geral de 1917 em São Paulo, iniciada numa
fábrica de tecidos, e que recebeu a solidariedade e adesão inicial
de todo setor têxtil, seguindo-se as demais categorias. A
paralisação foi total, atingindo inclusive o interior. Em poucos dias
o número de grevistas cresceu de 2000 para 45000 pessoas
(ANTUNES, 1994, p.41).
Vale ressaltar que se no início do século XX, os primeiros sindicatos receberam
influência anarquista, proveniente dos imigrantes italianos que constituíram o mais
numeroso contingente de operários, sobretudo em São Paulo; após a greve de 1917 e
com a fundação do Partido Comunista no Brasil em 1922, o campo socialista ganha força
e passa a exercer certa hegemonia em diversos sindicatos.
Com a subida de Getúlio Vargas ao poder em 1930, inicia-se uma nova fase para
o movimento sindical brasileiro, isto porque o presidente busca várias formas para
controlar os sindicatos como a implantação dos “sindicatos oficiais”, que pelo decreto
19.770 de 1931 definia estas organizações como órgãos de cooperação do Estado, além
de controlar o dinheiro em caso de greve e impedir atividades políticas e ideológicas no
interior dos sindicatos.
As entidades que não se enquadraram nestas normas passaram a ser tratadas
como clandestinas e seus dirigentes foram perseguidos. Mas mesmo com essas
represálias, os primeiros anos do governo Vargas foram marcados por diversas
mobilizações que levaram em 1935 à formação da Aliança Nacional Libertadora – ANL,
dirigida pelo Partido Comunista Brasileiro – PCB.
Mas a reação de Vargas não demorou a chegar e com a sanção da Lei de
Segurança Nacional em 1935, que proibiu o direito de greve, o movimento sindical
obteve temporária derrota perdendo sua autonomia.
Durante o período ditatorial do Estado Novo, Getúlio Vargas outorga a
Constituição de 1937 que introduz outras mudanças na estrutura sindical brasileira com o
ideário corporativista conforme explicam Rossi e Gerab:
Tal corporativismo concebe que capital e trabalho, patrão e
empregado, assim como seus sindicatos, fazem parte do mesmo
corpo social, devem viver em harmonia pelo bem geral da nação. É
o conceito de colaboração de classes se contrapondo ao de luta de
classes (ROSSI & GERAB, 2009, p.37).
Outra medida tomada por Vargas vai ter importante impacto sob a trajetória dos
sindicatos no Brasil conforme relatam Rossi e Gerab:
Em 1940, é criado o imposto sindical – cada trabalhador paga,
anual e compulsoriamente, o equivalente a 8 horas de salário e os
sindicatos são obrigados a prestar assistência médica e social aos
seus associados. É esse assistencialismo que vai gerar a
dominação ideológica e financeira dos sindicatos. Com muito
dinheiro, os sindicatos não necessitam de muitos associados para
viver. Ao contrário, quanto menor seu quadro „social‟, menor seu
gasto e mais dinheiro para elevar o padrão de vida de seus
diretores: cria-se o pelego1 oficial (ROSSI & GERAB, 2009, p.37).
Esse modelo de sindicalismo que nega a luta de classes e está alicerçado na
negociação em detrimento da luta muda radicalmente o perfil revolucionário que se tinha
até então. Não se trata mais de buscar alternativas para superar o capital, e sim aliar-se
a ele e buscar conquistas setoriais e específicas para a categoria: é esse o embrião do
sindicalismo de resultados do período neoliberal.
Porém, com o fim da ditadura do Estado Novo em 1945, a luta sindical retomou
sua trajetória de ascensão. É sintoma dessa reorganização a criação do Movimento
Unificador dos Trabalhadores – MUT em 1945 e a fundação da Confederação Geral dos
Trabalhadores do Brasil em 1946.
Durante o governo de João Goulart os sindicalistas deram um grande passo em
nome da unidade somando suas forças em torno de uma única organização sindical: o
Comando Geral dos Trabalhadores – CGT.
Neste período centenas de greves movimentaram o país e na pauta de
reivindicações estavam além das bandeiras de melhoria das condições de trabalho e
salários, uma preocupação com questões gerais como reforma agrária, inflação e direito
de voto a todos os cidadãos. O sindicalismo brasileiro começava a adquirir um caráter de
enfrentamento hegemônico e não apenas de defesa da categoria.
O clima de mobilização não era exclusivo das cidades, também no campo os
trabalhadores começavam a se movimentar como afirma Antunes:
No início dos anos 60, através das Ligas Camponesas lideradas por
Francisco Julião e dos Sindicatos Rurais dirigidos pelo Partido
Comunista, intensificou-se a mobilização rural, tendo como
bandeira principal a reforma agrária. No ano de 1963 fundou-se a
Confederação Nacional dos Trabalhadores Agrícolas – Contag, (...)
Desta maneira suas lutas uniam-se as dos trabalhadores urbanos
(ANTUNES, 1994, p. 57).
Com o golpe militar de 1964 os sindicalistas enfrentaram todo tipo de repressão,
sendo colocados na clandestinidade, mas durante este período os sindicatos orientaram
sua política no “chão das fábricas”, contrapondo-se ao regime ditatorial mesmo após o
1
Em (Rossi e Gerab 2009): No sindicalismo, pelego é o dirigente que foi imposto, chegou por
meios escusos à direção do sindicato ou se degenerou durante o exercício de suas funções. Visa
enganar os trabalhadores e trair os seus interesses, favorecendo os patrões ou o governo, tirando
proveitos pessoais disso.
Ato Institucional N° 5. Os sindicalistas tinham a seu favor a grande capilaridade do
movimento, que conseguia se instalar entre os trabalhadores e continuar a luta mesmo
em condições de forte controle e repressão do Estado.
A imensa repressão deste período está relata no trecho de Matos:
[...] tão logo o golpe consolidou-se, o governo militar ordenou a
intervenção em 433 entidades sindicais (383 sindicatos, 45
federações e 4 confederações). A cassação dos direitos políticos e
instauração de inquéritos policiais militares contra os principais
dirigentes sindicais cassados criaram, para os que conseguiram
escapar à prisão imediata, a alternativa da clandestinidade ou do
exílio (MATOS, 2009, p. 101).
Antes mesmo do fim do golpe militar, principalmente a partir de 1979 – ano em
que ocorreram 430 greves envolvendo as mais diversas categorias – e com a anistia aos
presos e exilados políticos, os operários voltam com força à cena organizando grandes
greves. Essas greves tinham no ABC paulista seu principal ponto de apoio, sobretudo nos
setores metalúrgico e automobilístico.
Em 1983, na cidade de São Bernardo do Campo é fundada a Central Única dos
Trabalhadores – CUT, central que, segundo Santiago e Giannotti rompe com a lógica das
centrais então existentes:
A CUT, por sua vez, nasceu em torno do novo sindicalismo, do
sindicalismo mais combativo mais combativo que se constituiu a
partir de meados da década de 70 e aglutina sindicalistas
independentes (isto é, sem militância anterior), setores da
esquerda
católica,
tendências
socialistas
e
comunistas
desvinculadas dos partidos da esquerda tradicional, entre outras
tendências (SANTIAGO & GIANNOTTI, 1997, p. 86).
No mesmo ano de 1983, num congresso em Praia Grande – SP, setores sindicais
vinculados ao Partido Comunista Brasileiro – PCB, Movimento Revolucionário 8 de
outubro – MR-8 e Partido Comunista do Brasil – PCdoB criaram a Coordenação Nacional
da Classe Trabalhadora – CONCLAT, que depois passou a ser denominada CGT. Porem, a
CGT foi se esvaziando ao longo dos anos, perdendo grande parte de sua base que migrou
para a CUT, mas em 1991 surge outra organização nacional denominada Força Sindical –
FS.
A Força Sindical – FS atua na lógica do “sindicalismo de resultados concretos”,
criticando o modelo de sindicalismo executado pela CUT e defendendo um maior diálogo
com os patrões, que inclusive tem a maioria de seus sindicatos filiados à FS. A política de
resultados pragmáticos nega a luta ideológica e contra hegemônica e desassocia do
trabalhador a visão de que a luta de classe é permanente, mesmo nos momentos onde
em negociação salarial o sindicato consegue vitórias junto aos patrões.
Mas o principal adversário da CUT e do movimento sindical brasileiro na
atualidade é a crescente precarização das relações de trabalho aliada ao crescimento do
mercado informal, estes fatores têm contribuído para corrosão de uma significativa parte
da base dos sindicatos. Fatores como avanços tecnológicos diminuem a força de trabalho
nas mais diversas áreas, reduzindo também a representatividade do sindicato e das
centrais. E estes são os efeitos do ajuste neoliberal que vem trazendo o desmonte dos
direitos da classe trabalhadora.
Soares demonstra que a área social foi gravemente atacada pelo ideário
neoliberal:
Queremos destacar que essa ideologia espalhou-se para além dos
limites do setor produtivo, estendendo-se para a área social, como
Saúde e a Educação, em que a “superioridade” do setor privado foi
também apregoada. Durante muitos anos a lógica privatista
dominou esses setores (entre outros) do ponto de vista das
políticas e práticas governistas. Os resultados são facilmente
verificáveis, não causados pelo “excesso” de Estado, e sim, pela
sua privatização interna (SOARES, 2002, p. 40).
A crise atual e o sindicalismo brasileiro na encruzilhada: perspectiva classista x
sindicalismo de resultados
Pelo que se viu mundo afora, podemos dizer que o capitalismo vive hoje a maior
crise desde os anos 1930. A sua emergência, em 2008, situa-se, conjunturalmente, na
fase de prosperidade da economia global e, estruturalmente, nas condições econômicas e
financeiras do pólo capitalista mais avançado, constituído por Estados Unidos, Europa
Ocidental e Japão. A crise tem seu epicentro nos Estados Unidos, de onde emana para
todo o mundo, é sistêmica e estrutural e exibe com nitidez as tendências deletérias do
capitalismo.
A atual crise ajuda a esclarecer os fatos, desvelar a realidade, contestar alguns
mitos. Sucumbem as crenças na flexibilidade e dinamismo imanentes do capitalismo no
que diz respeito especificamente à ilusória superação contemporânea do ciclo econômico
e das grandes crises. A lenda do mercado autorregulado conduziu ao desastre. Para o
marxismo, as crises são inevitáveis. Para os keynesianos, elas são possíveis devido a
falhas do mercado e a outros problemas (perversa distribuição de renda, rentismo,
incertezas e imperfeições na concorrência, tendência ao equilíbrio com desemprego),
porém são evitáveis. Para os neoliberais, as crises deveriam ser uma impossibilidade,
prevalecendo o equilíbrio na economia e a tendência “natural” à expansão.
A crise manifesta-se, em geral, como superprodução relativa de mercadorias e
sobre acumulação de capitais. A superprodução de mercadorias foi mais acentuada na
construção civil e pode ser percebida na evolução das vendas de imóveis, atingindo
patamares históricos em 2005, no auge do boom imobiliário. Em 2006, as vendas
iniciaram uma trajetória de queda, derrubando os preços e desencadeando a crise. A
superprodução foi fomentada pelo crédito e pela inflação (no ramo imobiliário), abrindo
espaço à especulação e estimulando a expansão do capital fictício, evidenciando o
entrelaçamento da circulação e acumulação de capital na chamada economia real e na
esfera financeira.
Esta crise explicita tanto a contradição entre a produção social e a apropriação
privada quanto a anarquia das decisões e competição capitalistas. Reflete-se no próprio
desenvolvimento das forças produtivas, com a incorporação de mudanças técnicocientíficas e a elevação da composição orgânica do capital. Conforme indicam os fatos, a
crise tem caráter cíclico, pelo fato de ela por fim a um ciclo de crescimento do
capitalismo em âmbito internacional – muito celebrado nos últimos anos como prova da
vitalidade do capitalismo – e também ao ciclo de frágil recuperação da economia dos EUA
após a recessão de 2001 com os ataques terroristas em Manhattam.
A finança, sobretudo com a liberalização, hipertrofia e especulação das últimas
décadas, acarreta uma sobrecarga de incerteza e instabilidade no sistema. A
financeirização expressa a exacerbação do papel e do lugar do capital fictício na
atualidade. A lógica do capital portador de juros – manifestando-se através de imensas
massas e novas formas de capital fictício – condiciona e determina a dinâmica do
capitalismo contemporâneo.
É dialética, contraditória, a unidade entre a acumulação de capital na produção e
a acumulação de capital na esfera financeira. Como não é possível a expansão contínua
da economia, tornam-se inviáveis as expansões de mais-valia em montantes
ininterruptos e crescentes para a remuneração do capital fictício. A especulação e o
parasitismo têm acirrado a polarização entre a miséria e a riqueza.
Assim, trata-se de uma crise abrangente, financeira, produtiva, bancária e
creditaria. Uma crise de âmbito mundial sistêmico e estrutural. Em conseqüência,
agravaram-se as contradições do sistema capitalista, desnudando suas limitações e
trazendo a reflexão de um novo padrão civilizatório, seja para aqueles que defendem sua
superação ou mesmo para os reformistas e neoliberais moderados.
O resultado social desta crise é o crescimento avassalador do desemprego e da
redução salarial que atinge milhões de trabalhadores. E ao primeiro sinal de falência do
sistema de livre comércio, os próprios países centrais da economia capitalista se
apressaram a aprovar pacotes de leis que protegem seus mercados internos contra
produtos extranacionais. E então, onde estaria a defesa da aldeia global nesse momento?
Nestes tempos de crise as contradições e acirramentos dentro do capitalismo
trazem muitas pressões aos trabalhadores. Com isso, chegamos ao ponto de dizer que
grandes ameaças àquela que (ANTUNES, 2007) chama de “classe que vive do trabalho”,
se avizinham.
Porém, aquelas entidades surgidas nos fins do século XIX como defensoras dos
interesses desta classe parecem não estar à altura dos desafios que o capitalismo traz
nessa fase superior ainda mais contraditória e anacrônica.
O movimento sindical brasileiro vive uma crise de identidade que é muito anterior
a essa crise e coincide praticamente com a abertura democrática dos anos 1980. Desde
lá já se via uma tendência ao abandono das grandes lutas e uma perigosa setorização
burocrática.
Muitos sindicatos foram perdendo ao longo das décadas, influenciados pelo ideário
hegemônico, a perspectiva classista e incorporando em seu lugar a lógica corporativista,
que transforma as entidades quase em empresas dos sindicalizados, sendo que no
horizonte passa não mais a existir o antagonismo proletário x capitalista.
É comum vermos hoje trabalhadores de instituições estatais ou privadas,
assumirem e reproduzirem o discurso de que são “colaboradores” ou “parceiros”, como
se em algum momento o processo de produção de mais valia permitisse qualquer
participação real naquilo que é apropriado apenas pelo capitalista.
Vale ressaltar também o surgimento e fortalecimento dos chamados novos
movimentos sociais de orientação pós-moderna, onde a reivindicação não se baseia
numa luta de classes e muito menos numa contradição dialética, esses movimentos
buscam satisfazer demandas setoriais e não a superação da raiz das desigualdades.
Por essa perspectiva o trabalhador é explorado pelo capitalista pela sua condição
de negro, de mulher, de homossexual ou de portador de deficiência; o que faz o jogo dos
capitalistas, que em suas teses sempre retiram o caráter de determinação histórica,
reduzindo os conflitos às esfera da subjetividade e com isso influenciando no modelo de
política pública que o Estado vai então desenvolver: quase sempre focalizada,
emergencial e restritiva.
Esse novo modelo de sindicalismo vai se aproximar muito do conceito sociológico
de estamentos e de classe trazidos por Max Weber onde os estamentos são a esfera
da honra e do prestígio social, não são determinados apenas por fatores econômicos e
podem ter natureza amorfa. Um grupo social que adote um estilo de vida comum pode
formar um estamento e mesmo possuidores e não possuidores de propriedade podem
dentro deste grupo conviver harmoniosamente, desde que haja o sentimento de
pertença.
Já a classe diz respeito aos interesses econômicos das pessoas e o
pertencimento do indivíduo a determinada classe está dado pela sua situação de classe,
ou seja, pelas condições determinadas pelo mercado de bens e de trabalho. Essas
pessoas estão ligadas por meio de um componente causal comum específico de suas
oportunidades de vida; não necessariamente compartilhando o mesmo prestígio social.
Na perspectiva weberiana, é totalmente possível a colaboração de classes e não
existe o antagonismo entre exploradores e explorados, pois o campo de atuação e os
interesses intraclasses se estabelecem nos marcos do mercado.
A nova orientação dos sindicatos a partir principalmente do advento do
neoliberalismo no Brasil vai fragmentar as lutas e colocar cada vez mais as organizações
dos trabalhadores nos braços dos patrões e do governo. (REIS, 2009, p. 13) diz que o
“pragmatismo sindical, a negociação em detrimento da luta, a adaptação ao modelo
neoliberal, a institucionalidade, a divisão” são algumas das características desse
período.
O combate à própria precarização do modelo de sindicalismo já parece ser
desafio grande o bastante para ser enfrentado, porém a luta travada internamente nas
entidades da classe trabalhadora é apenas a ponta do iceberg dos grandes desafios que
estão em curso.
Impedir a escalada do desemprego, da informalidade, da miséria e da
degradação humana é tarefa da classe trabalhadora e só ela, por meio de suas
históricas organizações de luta: os sindicatos podem mudar o curso deste projeto
nefasto de acumulação sem limites.
Um importante passo na caminhada do sindicalismo classista foi dado em São
Paulo agora em junho de 2010 com a realização com a realização da Conferência
Nacional da Classe Trabalhadora – CONCLAT, que não ocorria desde 1981. Lá no
Pacaembu com mais de 30 mil pessoas, as cinco maiores centrais sindicais aprovaram
intensa agenda de mobilização pela valorização da classe trabalhadora. Um projeto
nacional de desenvolvimento foi debatido e a unidade foi a grande marca do encontro.
É com certeza uma tentativa de trazer de volta o sindicalismo ao curso histórico
de combatividade e de novo fazer nascer no coração dos trabalhadores a esperança em
um outro modelo diferente do tão desigual e desumano Estado neoliberal.
Referências Bibliográficas
ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio sobre as Metamorfoses e a
Centralidade do Mundo do Trabalho. 12ª edição. São Paulo: Cortez; Campinas, SP:
Editora da Universidade Estadual de Campinas, 2007.
__________________. O que é sindicalismo. São Paulo: Brasiliense, 1994.
MATOS, Marcelo Badaró. Trabalhadores e sindicatos no Brasil. 1ed. São Paulo:
Expressão Popular, 2009.
REIS, Gilson. Sindicalismo brasileiro, ontem e hoje. IN: REIS, Gilson (org.).
Sindicalismo: cenários de um novo tempo. 1ª ed. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2009.
ROSSI, Waldemar; GERAB, Willian Jorge. Para entender os sindicatos no Brasil:
uma visão classista. 1 ed. São Paulo: Editora Expressão Popular, 2009.
SANTIAGO, Cláudia; GIANNOTTI, Vito. Comunicação sindical: arte de falar para
milhões. Petrópolis: Vozes, 1997.
SOARES, Laura Tavares. Os Custos Sociais do Ajuste Neoliberal na América
Latina. 2ª edição. São Paulo: Cortez, 2002.
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