Executivos acumulam cargos na crise
Página 1 de 3
Imprimir ()
09/09/2015 - 05:00
Executivos acumulam cargos na crise
Por Letícia Arcoverde
Josiel Florenzano, CEO da farmacêutica dinamarquesa
Lundbeck, reorganizou algumas diretorias da empresa para não precisar realizar grandes cortes
Em tempo de crise, sobreviver à demissão não é único desafio dos profissionais. Nas empresas onde o
contexto é de corte de pessoal, vagas congeladas e processo de seleção mais lento, aqueles que ficam
muitas vezes precisam acumular mais de uma função. Essa necessidade de fazer malabarismo exige
habilidades a mais, além de muito esforço e competência, mas especialistas apontam que também pode
ser uma oportunidade para se destacar na carreira e deixar o currículo mais atrativo no futuro.
Bruno Lino, sócio-diretor da empresa de recrutamento executivo Fesa, percebe um movimento de
unificação de cargos e acúmulo de funções nas empresas atualmente. "Em um contexto de retração de
mercado, a palavra de ordem é produtividade. É preciso fazer render mais com menos gente", diz. Ao
invés de contratar um novo diretor para uma área, é comum deixar um profissional mais júnior - como
um gerente - liderando o departamento e torná-lo parte de outra diretoria. O cenário incerto também faz
as empresas demorarem mais em processos de contratação, o que leva funcionários interinos a serem
aproveitados por mais tempo.
Desde o início do ano, Dione Freitas se divide entre a diretoria administrativo-financeira, cargo que
ocupava interinamente desde janeiro e assumiu oficialmente em junho, e a sua função anterior, a gestão
executiva das áreas de manutenção e operação das usinas no grupo EDP. Ele deve continuar nas duas
posições, gerindo equipes que somam 80 pessoas, até a empresa contratar um novo gestor para a área de
manutenção.
A mudança exigiu que ele reorganizasse a rotina, que ganhou entre uma e duas horas de trabalho a mais
todos os dias. Freitas procura sempre separar seu dia entre as horas que irá dedicar a uma área e à outra,
mas o importante é manter o foco para não deixar que as demandas não planejadas tomem conta do dia.
"E caprichar em delegar", enfatiza. Para saber distribuir o trabalho entre os subordinados, entretanto, é
preciso conhecer bem e confiar no time. "É muito importante medir o nível de maturidade da equipe,
saber quem tem condições de receber mais carga e quem não", diz.
http://www.valor.com.br/imprimir/noticia_impresso/4214300
09/09/2015
Executivos acumulam cargos na crise
Página 2 de 3
Com formação em engenharia elétrica e uma carreira até agora com perfil mais técnico, parte do desafio
de Freitas foi desenvolver o olhar administrativo que a nova função exige. Para isso, a empresa ofereceu
coaching e cursos, e Freitas buscou conversar com colegas de outras áreas e de outras empresas, além de
buscar benchmarks. "Quando se assume uma mudança de escopo, é essencial se atualizar", diz.
Segundo Villela da Matta, presidente da Sociedade Brasileira de Coaching, a procura por coaching tem
incluído mais a preocupação com o acúmulo de função e a sobrecarga dos executivos. "A cobrança
aumenta e o estresse também", diz da Matta. Na opinião do profissional, o primeiro passo do executivo
nessa situação deve ser definir claramente os indicadores de desempenho da sua nova área e os
resultados desejados. Assim que ficar claro como atingir os objetivos, o profissional deve correr para
adquirir os conhecimentos necessários da nova função, que ele talvez não domine. Por fim, a solução
para trabalhar em dobro não tem muito segredo: "O executivo vai ter que se tornar mais competente",
diz.
Isso significa que atividades como a condução de reuniões, feedback, planejamento e gestão das equipes
precisarão ser melhoradas. Justamente por isso, os consultores concordam que a situação é uma boa
oportunidade de desenvolvimento profissional. "É na crise que você reconhece o bom líder", diz Mara
Turolla, diretora de coaching e mentoring da consultoria Career Center.
Para ela, uma das habilidades mais importantes é saber o que é prioridade. É preciso, portanto, separar
o que o próprio executivo precisa fazer, o que ele pode delegar para a equipe e o que pode ser
simplificado. "Em momento de crise, não adianta fazer atividades com efeitos sutis, como relatórios que
não agregam valor. O profissional deve estar alinhado com a empresa e focar no que vai impactar o
negócio no curto prazo". A consultora sugere reuniões com a equipe para acompanhar o trabalho e gerar
proximidade, especialmente no caso dos funcionários da nova área, que poderão estar inseguros com o
próprio futuro na empresa.
Josiel Florenzano assumiu o comando da farmacêutica dinamarquesa Lundbeck no Brasil há cerca de
quatro meses, com a missão de tirar a empresa de um período de queda de vendas. "Os investidores não
querem perder lucratividade", diz o CEO, que participou da abertura da companhia no Brasil há 14 anos
e havia deixado a organização em 2013.
Sua estratégia foi reorganizar as diretorias para não precisar realizar grandes cortes. Duas posições
deixaram de existir, e as funções foram assumidas por ele: a financeira e a comercial. O diretor
financeiro foi aproveitado na diretoria de marketing e, na área comercial, Florenzano deixou um gerente
de vendas reportando diretamente para ele. "Com isso, evitei cortar entre cinco e dez pessoas no nível
médio."
Como a operação brasileira é essencialmente comercial, ele optou por se aproximar mais dessa área. A
cada duas semanas faz uma reunião com seus subordinados diretos e toda semana faz encontros
individuais de pelo menos uma hora com cada um para acompanhar o trabalho das áreas. Seu
expediente hoje é de pelo menos 10 horas por dia, mas ele ressalta que não perde tempo no trânsito, pois
a sede da empresa fica a cinco minutos a pé da sua casa. Mesmo assim, ele afirma que ainda não
encontrou tempo de fazer exercícios físicos e almoçar em casa. "O ritmo está muito puxado", diz. Sua
expectativa é que a situação se torne mais calma daqui a alguns meses, após o lançamento de um novo
produto.
http://www.valor.com.br/imprimir/noticia_impresso/4214300
09/09/2015
Executivos acumulam cargos na crise
Página 3 de 3
Cuidar da saúde e gerenciar o estresse é um dos pontos que os consultores reforçam como
imprescindível. Para Villela da Matta, da Sociedade Brasileira de Coaching, é uma questão de adaptar a
vida pessoal à nova realidade, incluindo atividade física para manter a disposição no dia a dia e dando
atenção redobrada aos relacionamentos interpessoais na família. "Se uma área da vida de uma pessoa
não está funcionando bem, ela não vai aguentar a pressão", diz.
De acordo com Bruno Lino, da Fesa, algumas competências importantes nessa fase são a capacidade de
traduzir objetivos claros e comunicar bem as prioridades para a equipe. "Além disso, também é essencial
ter uma visão de inovação para trazer melhorias para o negócio, demonstrar resiliência e ter capacidade
de assumir uma multiplicidade de tarefas", diz. Por mais desafiadora que seja, a experiência vai agregar
tanto habilidades "soft" de gestão de pessoas quanto conhecimentos técnicos de uma nova área.
Na opinião de Dárcio Crespi, sócio-diretor da empresa de recrutamento executivo Heidrick & Struggles,
o aumento de responsabilidades é uma "chance de ouro para se preparar para a função de presidente".
Além de proporcionar uma visão mais abrangente do negócio, vai deixar o currículo do profissional mais
atraente. "O aumento de responsabilidade é uma oportunidade de aprendizado amplo", diz.
O lado bom desse cenário vai aparecer também para o mercado como um todo, ressalta Villela da Matta.
"Ele força as empresas a aumentar a produtividade e as competências dos profissionais. Quando o Brasil
voltar a crescer, elas estarão mais preparadas."
http://www.valor.com.br/imprimir/noticia_impresso/4214300
09/09/2015
Download

EXECUTIVOS ACUMULAM CARGOS NA CRISE