UNIVERSIDADE
CATÓLICA DE
BRASÍLIA
PRÓ-REITORIA DE GRADUAÇÃO
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
Direito
CRIME PASSIONAL: QUEM AMA MATA? CONTINGÊNCIAS
QUE ENVOLVEM O COMETIMENTO DESSE CRIME.
Autora: Daiene da Silva Oliveira Freitas Figueiredo
Orientador: Professor Heli Gonçalves Nunes
BRASÍLIA
2009
DAIENE DA SILVA OLIVEIRA FREITAS FIGUEIREDO
CRIME PASSIONAL: QUEM AMA MATA? CONTINGÊNCIAS QUE
ENVOLVEM O COMETIMENTO DESSE CRIME.
Trabalho apresentado ao curso
de Graduação em Direito da
Universidade
Católica
de
Brasília, como requisito Parcial
para a Obtenção do Titulo de
bacharel em Direito.
Orientador:
Esp.
Gonçalves Nunes
Brasília
Heli
2009
Folha de Aprovação
Monografia de autoria de Daiene da Silva Oliveira Freitas Figueiredo,
intitulada “CRIME PASSIONAL: QUEM AMA MATA? CONTINGÊNCIAS QUE
ENVOLVEM O COMETIMENTO DESSE CRIME”, apresentada como requisito
parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de
Brasília, em ________________________________________, defendida e
aprovada pela banca examinadora abaixo assinada:
________________________________________
Professor Heli Gonçalves Nunes
(orientador)
Direito – UCB
________________________________________
Professor
Membro da Banca
Direito – UCB
________________________________________
Professor
Membro da Banca
Direito – UCB
Brasília
2009
Dedico a presente monografia aos
meus filhos, Beatriz e Felipe, e ao meu
marido,
Pedro
Eduardo,
que
compreenderam as minhas omissões e
aceitaram minhas ausências. A vocês
dedico o mérito desta conquista, pois o
amor, estímulo e carinho que me
deram foram às armas desta vitória.
AGRADECIMENTO
Chegar até aqui não foi nada fácil e se hoje comemoro uma conquista, esta
se deve àqueles que estiveram ao meu lado em todos os momentos.
Agradeço à minha mãe, Luzia, pelo sacrifício em me manter em uma
universidade particular e principalmente pelas intermináveis orações por mim e
por minha família.
Às minhas irmãs, Darlene e Sthéfane, que de diversas formas me apoiaram
na concretização desse sonho.
Aos meus familiares que de alguma maneira contribuíram para esta etapa
da minha formação profissional.
Ao meu marido, Pedro Eduardo, pelo incentivo e apoio.
Aos meus filhos, Beatriz e Felipe, que tanto sofreram durantes as inúmeras
noites em que estive ausente, mas principalmente obrigada pela lição de amor
incondicional.
Aos meus pastores, Pastor Hugo e Pastora Ana, que por muitas vezes
foram como um escudo, em que despejei minhas frustrações, mas que se
mantiveram presentes para me reerguer através do apoio e conselhos inspirados
por Deus.
Aos incontáveis amigos que fizeram parte desta caminhada, alguns não
estão mais presentes, outros farão parte de minha vida para sempre, mas a todos
o meu muito obrigado.
Aos meus professores, pelo conhecimento partilhado, pelas horas de
dedicação e principalmente pela inspiração profissional que conduzirá os meus
passos em minha jornada jurídica.
Acima de tudo, agradeço a Deus, pelo dom da vida... Pela oportunidade de
fazer diferença, de impactar vidas e de ser testemunha viva de que para Deus
nada é impossível.
“O passionalismo que vai até o
assassínio muito pouco tem a ver com
o amor”. (Nelson Hungria)
RESUMO
O presente trabalho trata do crime passional, dos elementos que podem levar ao
cometimento desse crime, e do perfil do criminoso passional. Analisou-se a
evolução histórica do crime passional, as legislações brasileiras que trataram e
tratam do tema. Mostrando que a tão utilizada tese da legítima defesa da honra,
hoje não é mais aceita, e que o assassino passional vem sendo punido com um
rigor outrora nem imaginado. O propósito deste trabalho é provar que quem ama
não mata, pois os motivos que colaboram para a prática do crime passional são
baseados nos sentimentos de ódio, vingança, rejeição, e principalmente no
sentimento de posse em relação ao ser amado. Além disso, demonstrou-se
porque a mulher comete menos crime passional. Alguns dos crimes passionais
que mais impactaram a sociedade foram citados para provar que esta prática
delituosa está longe de ser erradica. E por fim buscou-se retratar o “amor” que
mata, provando que o que mata não é o amor, mas sim o sentimento de posse
que o assassínio passional exerce ou crê exercer sobre a mulher amada.
Palavras-chave: Crime passional. Motivo. Paixão. Amor. Posse.
ABSTRACT
This work deals with the delict of passion, the elements that can lead to the
commission of that delict, and the profile of the criminal passion. We analyzed the
historical evolution of delict of passion, the Brazilian legislation that dealt with and
deal with the subject. Showing that the much used argument of legitimate defense
of honor, today is no longer accepted, and that the killer of passion has been
punished with a precision not previously imagined. The purpose of this paper is to
prove that he loves does not kill, for the reasons that contribute to the delict of
passion is based on hatred, revenge, rejection, and especially in the sense of
ownership in relation to being loved. Moreover, it was shown because the woman
commits less delict of passion. Some of the delict of passion that most influenced
the society were cited to prove that this criminal practice is far from being
eradicated. Finally we sought to portray the "love” that kills, proving that what kills
it is not the love, but the sense of ownership that the murder of passion exercises,
or believes bear on the woman he loves.
Keywords: Delict of passion. Reason. Passion. Love. Possession.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO............................................................................................................ 10
1.
CRIME PASSIONAL ............................................................................................ 14
1.1 DEFINIÇÃO..................................................................................................... 14
1.2 O CRIME PASSIONAL AO LONGO DA HISTÓRIA......................................... 15
1.3 O CRIME PASSIONAL E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA ................................ 16
1.4 A MULHER COMETE MENOS CRIME PASSIONAL ...................................... 23
2.
CONTINGÊNCIAS QUE ENVOLVEM O COMETIMENTO DESSE CRIME ......... 26
2.1 HONRA ........................................................................................................... 26
2.2 INDIFERENÇA ................................................................................................ 27
2.3 PAIXÃO........................................................................................................... 28
2.4 CIÚME............................................................................................................. 30
2.5 INFIDELIDADE................................................................................................ 32
2.6 CARACTERÍSTICAS PREDOMINANTES DOS AUTORES DE CRIMES
PASSIONAIS................................................................................................... 33
3.
CASOS DA VIDA REAL....................................................................................... 35
3.1 PONTES VISGUEIRO E MARIA DA CONCEIÇÃO ......................................... 35
3.2 EUCLIDES RODRIGUES PIMENTA DA CUNHA, ANNA DA CUNHA E
DILERMANDO DE ASSIS ............................................................................... 36
3.3 AUGUSTO CARLOS EDUARDO DA ROCHA MONTEIRO GALLO E MARGOT
PROENÇA GALLO.......................................................................................... 38
3.4 DOCA STREET E ÂNGELA DINIZ .................................................................. 38
3.5 LINDOMAR CASTILHO E ELIANE DE GRAMMONT ...................................... 39
3.6 UM CASO HOMOSSEXUAL ........................................................................... 41
3.7 IGOR FERREIRA DA SILVA E PATRÍCIA ÁGGIO LONGO ............................ 42
3.8 ANTÔNIO MARCOS PIMENTA NEVES E SANDRA FLORENTINO GOMIDE 44
3.9 UBIRAJARA DUTRA E MARIA CONCEIÇÃO CASAGRANDE ....................... 46
3.10
CARLOS MOACIR DOS SANTOS CAVALHEIRO E SALETE
CAVALHEIRO ................................................................................................. 46
4.
3.11
EVANI GONÇALVES FONSECA E CENIR DE FREITAS ......................... 47
3.12
LINDEMBERG ALVES E ELOÁ CRISTINA PIMENTEL ............................ 48
3.13
CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DOS CASOS ELENCADOS ................ 49
QUEM AMA MATA? ............................................................................................ 51
4.1 DEFINIÇÃO DE AMOR .................................................................................... 51
4.2 QUANDO O AMOR SE TRANSFORMA EM OBSESSÃO ............................... 52
CONCLUSÃO ............................................................................................................. 54
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS............................................................................ 58
ANEXO 1 - ACÓRDÃO QUE CONDENOU PONTES VISGUEIRO............................. 62
10
INTRODUÇÃO
Os mais antigos registros da humanidade noticiam a ocorrência de crimes
passionais, que continuam presentes em nossa sociedade até os dias de hoje,
ceifando vidas em nome do amor. Mas será que aquele que ama é capaz de
matar o objeto de seu amor. O termo passional vem da palavra paixão e nos
remete ao sentimento arrebatador que pode levar ao cometimento do crime.
Crimes passionais estampam os noticiários de nosso país diariamente,
causam espanto, dor e envolvem aqueles que o acompanham como se fizessem
parte daquela situação, basta lembrar o caso Eloá Pimentel, que ao passar 100
horas em cativeiro, teve seu sofrimento acompanhado em tempo real por todo o
país através da mídia.
Nossa cultura está baseada no sistema patriarcal há mais de cinco mil
anos, e por quase todo esse tempo ao marido foi dado o direito de punir, bater e
até matar sua mulher, caso julgasse que esta vinha se comportando de maneira
inadequada. Com a evolução da condição da mulher perante a sociedade, o crime
passional passou a ser intolerado na maioria das culturas.
Durante muitos anos, o criminoso passional foi tratado com certa
benevolência, muitos foram absolvidos sob o argumento de legítima defesa da
honra ou alegavam ter agido sob violenta emoção. E quando condenados, o eram
em uma pena tão branda, que era como se tivessem sido absolvidos.
Essa cultura de impunidade só mudou quando, após várias manifestações
principalmente realizadas pelos movimentos feministas, a visão patriarcal foi
deixada de lado durante os julgamentos dos criminosos passionais. O marco
desta evolução ocorreu no segundo julgamento de Doca Street, que mesmo tendo
sido absolvido em seu primeiro julgamento e certo de que o mesmo se repetiria,
foi condenado por 15 anos de reclusão. Caía por terra a frase por ele declarada
“matei por amor”, e slogan proclamado por inúmeras pessoas durante o
julgamento passou a fazer parte do pensamento social, a saber, “quem ama não
mata”.
11
Entende-se
por
crime
passional
aquele
cometido
por
paixão,
desencadeada pelo ódio, ira, mágoa, rejeição, ciúme, pela frustração ao
sentimento de posse, ou diante da infidelidade ou da possibilidade desta. Nesse
mix de sentimentos não há espaço para o amor, enquanto sentimento belo, puro e
divino. Por isso, não há que se confundir a paixão que motiva o crime passional
com amor.
A paixão que conduz ao crime passional é crônica, obsessiva,
desmedida e sempre está baseada no sentimento de posse que o autor exerce
sobre a vítima.
Em dado momento até pode ter existido o amor, em sua mais bela
concepção, mas este perdeu espaço para outros sentimentos menos nobres,
acrescido de egoísmo, e principalmente do desejo de domínio e controle total
sobre o ser amado.
Nesse momento cabe ressaltar que não que se falar em inimputabilidade
para o criminoso passional de maneira geral, pois autor do delito tem consciência
e controle total sobre seus atos, sabem exatamente o que estão praticando um
delito. A deficiência deles está no campo emocional. Geralmente são pessoas
frias, calculistas, desprovidos de culpa ou remorso. Podem estar em qualquer
classe social, raça, credo, ou sexo, mas é mais comum que seja homens.
O homicida passional tem uma visão narcisista e supervaloriza seus
sentimentos, pois crê que é o centro do universo, não só do seu, mas também de
sua companheira. Por isso agem como se fossem superiores, como se as leis e
regras sociais não valessem para eles, assim acham-se no direito de tirar a vida
de suas companheiras.
O objetivo deste trabalho é, após a análise de todos os dados levantados,
refletir sobre o tema em questão, demonstrando se quem ama é capaz de matar,
e quais os elementos que podem contribuir para o cometimento desse crime.
Quer pela constante presença nos noticiários e no meio jurídico, quer pelo
choque que o crime passional causa em toda a sociedade ou ainda no intuito de
entender por que tantos homens, aparentemente normais reagem de forma brutal
12
e insana quando do término de seus relacionamentos ou quando são rejeitados, é
que este tema foi escolhido como objeto deste trabalho.
Para
tornar
possível
esse
trabalho,
o
método
utilizado
foi
predominantemente a pesquisa bibliográfica em livros doutrinários, jornais e
pesquisa jurisprudencial.
A fim de proporcionar um melhor entendimento do tema, no primeiro
capítulo foi definido o crime, a paixão e o crime passional.
Em seguida foi feito um relato acerca da evolução histórica do crime
passional e sobre a evolução da legislação brasileira que trata do tema em
questão.
Também foram analisados dados que provam que a mulher comete menos
crimes desta natureza do que os homens, e algumas explicações para esta
diferença foram dadas.
No segundo capítulo foram levantados os principais motivos que podem
levar ao cometimento do crime passional, tais como a defesa da honra, a
indiferença, a paixão, o ciúme e a infidelidade.
Após esse levantamento foram elencadas as principais características do
criminoso passional, porém cabe ressaltar que esse rol não é taxativo, muitas
outras características podem fazer parte do caráter do autor desse delito, aquelas
aqui elencadas foram escolhidas por serem mais fáceis de identificação.
No terceiro capítulo foram selecionados alguns casos de crimes passionais,
a escolha foi feita em decorrência do impacto social que causaram na época de
seu cometimento. Alguns desses crimes foram relatados com base nos dados do
livro A paixão do banco dos réus, outros foram selecionados em noticiários
nacionais, com o objetivo de demonstrar a evolução do tratamento dado a
aqueles que praticaram tal ato, e principalmente para mostrar que os estes crimes
ainda continuam presentes em nossa cultura.
Por fim, antes da conclusão, o amor foi definido, não de maneira absoluta,
pois enquanto sentimento, muitas podem ser as definições a ele agregadas, mas
13
apenas com o intuito de provar que o “amor” que mata não é aquele idealizado e
almejado pela humanidade. Além da definição de amor, dados foram levantados
para tratar do amor que se transforma em obssessão, e pode levar ao
cometimento do crime passional.
14
1. CRIME PASSIONAL
1.1 DEFINIÇÃO
Segundo Houaiss, crime é “todo ato ilegal, toda ação condenável.”1
Podendo ser definido também como a ofensa de um bem jurídico tutelado pela lei
penal. Para a doutrina crime é o todo fato típico e antijurídico.
Ensina Plácido e Silva, em seu livro Vocabulário Jurídico (1990, p. 586),
que o vocábulo crime advém do latim crimen, expressa acusação, queixa, injúria,
significando, portanto, toda ação dolosa, ou infração que atente contra os
costumes, à moral e à lei, passível de punição prevista em lei.
Passional é, ainda segundo Houaiss, aquilo próprio de ou regido por
paixão, que é definida como “grande sofrimento; martírio; afeto ou entusiasmo
muito intenso por algo ou por alguém”.2
Para Plácido e Silva (1990, p.326), passional é o termo empregado para
designar o que se faz por paixão, isto é, por impulso irrefletido ou exaltado, em
decorrência de um amor desmedido.
No campo doutrinário, Luiza Nagib Eluf (2002, p. 111) conceitua crime
passional como o “delito derivado da paixão, é o crime cometido por paixão”.
Para Eluf, paixão exprime algo intenso, perturbador, que resulta do
sofrimento, de uma mágoa profunda, da cólera. Assim, seria passional o crime,
fundado em uma paixão baseada no ódio, no sentimento de posse, no ciúme
desmedido, na vingança, no sentimento de frustração, na mistura de desejo
sexual com rancor. Para a autora, o delito passional tem natureza psicológica,
uma vez que a paixão avassaladora transtorna a mente humana.
Todavia, o crime passional é um homicídio com uma particularidade, que é
o elo afetivo e sexual entre as partes. Assim, apesar de ligado à “paixão”, não
1
HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2004. p 201.
2
HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2004. p 543.
15
pode se confundir com “amor”, pois o que leva ao cometimento do crime são
sentimentos de cunho negativo, como o desejo de vingança, o sentimento de
posse, o ciúme desmedido e descontrolado.
Enrico Ferri divide a paixão em duas espécies, a saber, a paixão social e a
paixão anti-social. Para ele, paixão social está ligada aos sentimentos de amor,
de honra, afeto materno, patriotismo; e paixão anti-social remete aos sentimentos
de vingança, de ódio, de cólera, de cobiça, de inveja, de posse.
Para Ferri, o crime passional pode ser em decorrência dos dois tipos de
paixão, porém caso o crime fosse cometido movido pela paixão social o autor
deveria ser isento de penalidade, pois era justificável, aceito. No entanto, caso
fosse fundado na paixão anti-social, deveria ser punido, uma vez que é
repugnado.
Segundo Ferri, crime passional é aquele cometido pela privação dos
sentidos e da inteligência, em decorrência da paixão. Assim, a paixão seria um
sentimento incontrolável que levaria os indivíduos domados por sua força
arrebatadora a cometerem o delito passional.
Diante de tudo isso, cabe ressaltar que a paixão por si só não é
responsável pelo delito. Por mais avassaladora que seja a paixão é necessário
um fato que instigue o indivíduo a praticar o delito. Assim, resta claro que o crime
se dá pelo contexto como um todo e não apenas pela paixão, ou amor.
1.2 O CRIME PASSIONAL AO LONGO DA HISTÓRIA
O crime passional esteve presente em todas as épocas da humanidade, e
sempre estará, pois não se trata de um mal social ligado a padrões culturais, mas
sim uma questão subjetiva envolvida em uma paixão, geralmente, perturbadora.
A afirmação de que este tipo penal sempre existirá funda-se na certeza de
que sempre haverá indivíduos, alguns com mais, outros com menos, dificuldades
em administrar perdas, traições, ódio, rancor, sentimentos esses que, por serem
inerentes aos seres humanos, são elencados como impulsionadores do crime
passional.
16
O tema em questão há muito faz parte de nosso cotidiano, seja pelos
noticiários, com histórias reais, seja pelos escritores, com suas estórias
envolventes e instigantes.
O mais antigo registro de crime passional remonta à Bíblia3 com o relato de
Caim que matou Abel por ciúmes e inveja. No entanto, nenhum autor se destacou
mais neste campo do que William Shakespeare que tem marcado gerações com
suas tragédias passionais como, por exemplo, Otelo, escrito no século XVI.
Otelo historia a vida de um homem que matou sua esposa após concluir
que ela o traía, mas somente após o cometimento do crime percebeu que havia
se enganado quanto à suposta infidelidade de sua mulher.
Não podemos nos esquecer do autor Machado de Assis, que de tantas
maneiras tratou do tema em questão, como por exemplo, no livro “A Cartomante”,
que relata o crime passional cometido por Vilella, um marido traído duplamente,
uma vez que sua esposa, Rita, se envolvera com seu melhor amigo, Camillo.
Em sociedades onde o homem se sentia dono da mulher, como se esta
fosse um mero objeto passível de posse, era mais comum o cometimento do
crime passional. Para Luiza Nagib Eluf esse sentimento de posse se dava não só
em decorrência do relacionamento sexual, mas também em virtude do fator
econômico, uma vez que as mulheres dependiam exclusivamente de seus
maridos.
1.3 O CRIME PASSIONAL E A LEGISLAÇÃO BRASILEIRA
Quando o Brasil passou a ser colônia portuguesa as suas leis passaram a
ser as mesmas, assim, o primeiro registro de lei sobre crime passional é desta
época e declara que ao homem era permitido matar a mulher e seu amante se
provado o adultério, no entanto a mesma prerrogativa não era dada às mulheres.
Em 1830, com o primeiro Código Penal do Brasil, denominado Código
Criminal do Império, a penalidade para a esposa adúltera era a prisão de um a
3
A Bíblia da Mulher. Almeida Revista e Atualizada. Editora Mundo Cristão. Gêneses Capítulo 4
versículo 8. p. 14.
17
três anos onde seria submetida a trabalhos forçados, para o marido que
mantivesse relação extraconjugal pública e estável a pena seria a mesma.
Com o advento do Código Penal Republicano, no final do século XIX, surge
o argumento de privação dos sentidos ou da inteligência durante a execução do
crime, tornando possível a absolvição ou diminuição das penas atribuídas aos
criminosos passionais.
Contudo, os dias de impunidade dos criminosos passionais cessaram com
a chegada do Código Penal de 1940, pois eliminava a possibilidade de perdão ao
crime passional, tratando-o como homicídio privilegiado, por ser movido por
motivo de relevante valor moral ou social, e o agente tomado de violenta emoção,
o que acarretaria na atenuação da pena imposta.
No entanto, essa mudança se deu apenas na teoria, pois o sentimento
patriarcal ainda imperava em nossa cultura, e os homicidas passionais eram
perdoados sob o argumento de legítima defesa da honra. Nesse período, a honra
masculina era depositada em sua esposa, assim se esta procedia de maneira
inadequada era maculada a imagem de seu marido que poderia lavá-la com o
sangue de sua companheira.
Sobre a tese de legítima defesa da honra, alguns julgados dos tribunais
nacionais merecem serem citados:
Candente, como é de seu vezo, o ilustre e saudoso penalista Nélson
Hungria, dizia: ‘o amor que mata, amor-Nemésis, o amor açougueiro, é
uma contrafação monstruosa do amor... O passionalismo que vai até o
assassínio, muito pouco tem a ver com o amor. Efetivamente, não é
amor, não é honra ferida, esse complexo de concupiscência e ódio, de
torvo ciúme e estúpida prepotência que os Otelos chamam sentimento
de honra, mas que, na realidade, é o mesmo apetite que açula a uncia
tigris para a caça e a carnagem. (TJSP, Rec, Rel. Camargo Sampaio,
4
RJTJSP 53/312).
A legítima defesa da honra não tem o mínimo cabimento quando
5
acoberta uma vingança ou extravasamento de ódio (RT 487/304).
O uxoricida passional, que pratica o crime em exaltação emocional, pode
apenas invocar a causa de redução de pena prevista no § 1º do art. 121
4
TJSP, Rec, Rel. Camargo Sampaio, RJTJSP 53/312 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco
dos réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 168.
5
RT 487/304 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p.
168.
18
do CP, não porém a legítima defesa da honra (TJSP, AC, Rel. Humberto
6
da Nova, RT 486/265)
Porém, na década de 70, os movimentos feministas se fortalecem e a
impunidade diminui. Isto fica evidente quando em um segundo julgamento Raul
Fernando do Amaral Street, Doca Street, acusado de matar sua esposa Ângela
Diniz, foi condenado a 15 anos de reclusão. Assim, o slogan “matei por amor” era
derrubado pelo “quem ama não mata”.
Em 1984 o Código Penal defasado passa por uma reforma em sua parte
geral, tendo como base a ratificação da Convenção sobre Eliminação de todas as
formas de discriminação contra a mulher, almejando a prevenção, punição e
erradicação da violência contra a mulher.
Desde então, o homicídio passional passou a ser denominado como
homicídio qualificado por motivo torpe, tipificado no artigo 121, § 2º, inciso I do
Código Penal, ou seja, por motivo vil, repugnante, contrário aos bons costumes.
Em 1994, a Lei 8.072/90 que versa sobre Crimes Hediondos foi modificada,
em decorrência do movimento realizado pela autora Glória Perez que teve sua
filha brutalmente assinada com golpes de tesoura por Guilherme de Pádua e sua
então esposa Paula Thomaz, e o crime de homicídio qualificado passou a ser
considerado crime hediondo.
Para o autor João José Leal, hediondo é:
Todo crime que causa profunda e consensual repugnância por
ofender, de forma acentuadamente grave, valores morais de
indiscutível legitimidade, como o sentimento comum de piedade,
de fraternidade, de solenidade e de respeito à dignidade da
7
pessoa humana.
Desde que passou a integrar o rol de crimes hediondos, o homicídio
qualificado passou a receber um tratamento mais severo, sem direito a indulto,
graça ou anistia, sem fiança e com progressão de regime diferenciada, a saber,
2/5 da pena se primário e 3/5 da pena se for reincidente, pena que deverá ser
cumprida em regime inicialmente fechado.
6
TJSP, AC, Rel. Humberto da Nova, RT 486/265 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 168.
7
LEAL, João José. Crimes hediondos: aspectos político-jurídicos da Lei 8.072/90. Rio de
Janeiro: Editora Atlas, 1996.p 7.
19
Hoje, não há mais que se falar em legítima defesa da honra, e as
jurisprudências atuais entendem que a emoção e a paixão não excluem a
imputabilidade do criminoso passional.
Apesar de todas as tentativas de coibir os crimes passionais, estes ainda
fazem parte de nossa realidade, o que mudou foi apenas o enfoque dado pelo
ordenamento jurídico brasileiro.
Em alguns casos, os julgados entendem que o marido ou amante que mata
a companheira por vingança, ciúme ou ódio age movido por um sentimento torpe
o que torna a conduta ainda mais reprovável.
Por ser narcisista, o homicida passional, estando enamorado de si mesmo,
vislumbrado apenas por suas qualidades e virtudes, não admite a possibilidade de
ser deixado pela mulher amada, ser traído, e sempre responsabilizará sua amada
por seus fracassos. Para o passional, se a amada não age de acordo com suas
expectativas receberá apenas seu ódio implacável. Segundo alguns julgados
podemos aferir que:
Caracteriza motivo torpe o fato de o marido, desprezado pela mulher que
com ele não mais quer conviver, resolver vingar-se, desejando matá-la.
O motivo é o antecedente psíquico da ação. No caso, a força que
colocou em movimento o querer do agente ativo, que o levou ao gesto
de matar a sua companheira, que somente não se consumou pelo fato
de a vítima ter fingido que já se encontrava morta (TJRJ, AC, Rel. Paulo
8
Sérgio Fabião, RT 733/659).
É certo que a vingança, por si só, não torna torpe o motivo do delito, já
que não é qualquer vingança que o qualifica. Entretanto, ocorre a
qualificadora em questão se o acusado, sentindo-se desprezado pela
amásia, resolve vingar-se, matando-a (TJSP, AC, Rel. Jarbas Mazzoni,
9
RT 598/310).
A vingança e o ódio reprimido, que levam o agente à prática do crime,
configuram o motivo torpe a que alude o art. 121, § 2a, I, do CP (TJSP,
10
AC, Rel. Weiss de Andrade, RT 560/323).
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. HOMICÍDIO QUALIFICADO.
MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. PRONÚNCIA. CRIME
PRATICADO POR MOTIVO DE CIÚME, POR MOTIVO TORPE.
MOTIVO FÚTIL EXCLUÍDO, POR ESTAR DIVORCIADO DO
CONJUNTO PROBATÓRIO. LIBERDADE PROVISÓRIA MANTIDA. 1.
8
TJRJ, AC, Rel. Paulo Sérgio Fabião, RT 733/659 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 142.
9
TJSP, AC, Rel. Jarbas Mazzoni, RT 598/310 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 142.
10
TJSP, AC, Rel. Weiss de Andrade, RT 560/323 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 142.
20
Comprovadas a materialidade e autoria de homicídio qualificado,
praticado mediante recurso que impossibilitou a defesa do ofendido, eis
que foi assassinado com quatro disparos de arma de fogo no interior de
seu veículo quando conversava com a namorada do réu, sendo
surpreendido pelo acusado, a sentença de pronúncia é medida que se
impõe para submeter o réu a julgamento perante o Júri Popular. 2.
Tendo o crime sido praticado por motivo de ciúme, ou seja, por motivo
torpe, segundo ficou esclarecido no conjunto probatório, correta a
decisão que excluiu a qualificadora do motivo fútil, eis que divorciada da
verdade dos fatos. 3. Embora o §1º do art. 408 do Código de Processo
Penal preveja o recolhimento do acusado a estabelecimento prisional
quando da pronúncia, permite-se liberdade provisória ao mesmo se
assim esteve durante a instrução processual, não havendo motivo que
justifique a sua custódia cautelar. Na hipótese, o acusado manteve-se
em liberdade provisória durante toda a instrução processual e não há
notícia de ter, em qualquer momento, atentado contra a ordem pública
ou contra a tramitação do feito. 4. Recurso conhecido e não provido,
mantendo-se incólume a r. sentença que pronunciou o acusado por
homicídio qualificado praticado mediante recurso que impossibilitou a
defesa da vítima, assegurando-lhe liberdade provisória até o julgamento
perante o Júri Popular, não sobrevindo motivo para sua custódia
cautelar. (20040310003253RSE, Relator ROBERVAL CASEMIRO
BELINATI, 1ª Turma Criminal, julgado em 07/12/2006, DJ 11/04/2007 p.
11
101)
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRIBUNAL DO JÚRI. HOMICÍDIO
NA SUA FORMA TENTADA. QUALIFICADORA DO MOTIVO TORPE.
AFASTAMENTO. INVIABILIDADE. Motivo torpe. Indícios de ciúme
excessivo e injustificado, motivado pelo sentimento de posse que o
acusado mantinha em relação à vítima, e que já motivara diversas
discussões entre o casal. A circunstância qualificadora descrita na
denúncia se apresenta viável, em face dos elementos de prova
produzidos na instrução processual, devendo ser acolhida, para levar à
apreciação dos jurados. Recurso em sentido estrito a que se dá
provimento. (Recurso em Sentido Estrito Nº 70021856216, Segunda
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jaime Piterman,
12
Julgado em 14/02/2008).
TRIBUNAL DO JURI. PROVA DOS AUTOS. QUALIFICADORAS:
MOTIVO TORPE E CRUELDADE. ART. 593, III, "D", DO CPP.
INOCORRENCIA. SE O CONSELHO DE SENTENÇA ENTENDEU
CONFIGURADAS AS e QUALIFICADORAS DO MOTIVO TORPE E DO
MEIO CRUEL EM SIMETRIA COM OS FATOS REGULARMENTE
COMPROVADOS, NÃO HA COGITAR DE REFORMA DO
VEREDICTUM POPULAR PARA LEVAR O CONDENADO A NOVO
JURI. NO CASO, OCORREU O MOTIVO TORPE (MORTE POR CIUME
E VINGANÇA) COM A QUALIFICAÇÃO DA CRUELDADE (REPETIDOS
13
GOLPES DE FACA). - RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.
11
DISTRITO FEDERAL. Tribunal de justiça. 20040310003253RSE, Relator ROBERVAL CASEMIRO
BELINATI, 1ª Turma Criminal, julgado em 07/12/2006, DJ 11/04/2007 p. 101. (grifo nosso)
12
DISTRITO FEDERAL. TRIBUNAL DE Justiça. Recurso em Sentido Estrito Nº 70021856216,
Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jaime Piterman, Julgado em
14/02/2008. (grifo nosso)
13
BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 97.012/DF, Rel. Ministro José Arnaldo da Fonseca, 5ª
Turma, julgado em Brasília, 18 de fevereiro de 1997, DJ 07.04.1997 (grifo nosso)
21
No entanto, para outros Tribunais, aquele comete crime passional fundado
em ciúme age motivado por sentimento fútil, vão, frívolo, insignificante. Como
demonstrado abaixo:
Quando o agente atua impulsionado, premido, pressionado pelo
sentimento do ciúme, fundado ou não, não se pode dizer que se cuida de
motivo irrelevante, insignificante, fútil (TJSP, Rec, Rel. Diwaldo Sampaio,
14
RT 595/349).
O homem que, embora esteja separado da mulher, a encontra em sua
casa juntamente com as filhas, na companhia de outro, não age por
motivo fútil, podendo o motivo ser até injusto, mas sua injustiça, embora
desconforme com a ética ou com o direito, não é desconforme com o
15
antecedente psicológico (TJMG, AC, Rel. Costa Loures, RT 676/322).
É cristalina a inadequação da qualificadora do motivo fútil. Quem discute
por interesse no reatar uma relação conjugal interrompida e, vendo-se
rejeitado, pratica um crime, não age por móvel insignificante. (TJSP,
16
Rec, Renato Nalini, RJTJSP 141/362).
Não se deve confundir motivo fútil com motivo injusto. Aliás, a injustiça
da motivação do agente é elemento integrante do crime. Para que se
reconheça a futilidade da motivação é necessário que, além de injusto, o
motivo seja insignificante. Isso, contudo, não se pode dizer quando
entram em jogo a separação de um casal e o crime. Se tais motivos
justificassem a motivação do réu, corresponderiam a causas excludentes
de criminalidade, que, evidentemente, não são. (TJSP, Rec, Rel. Geraldo
17
Arruda, RJTJSP 62/356).
O fato de ser a vítima prostituta e desejá-la o acusado só para si, por
estar com ela envolvido afetivamente, afasta o motivo fútil do homicídio
por ele perpetrado ao vê-la em companhia de outro homem. (TJSP, Rec,
18
Rel. Prestes Barra, RT 554/347).
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. SENTENÇA DE PRONÚNCIA.
TENTATIVA DE HOMICÍDIO. GOLPES DE FACA NA COMPANHEIRA
POR MOTIVO DE CIÚME. MOTIVO FÚTIL. MATERIALIDADE E
INDÍCIOS DE AUTORIA. INEXISTÊNCIA DE PROVA INCONTESTE DE
CAUSA EXCLUDENTE DE ILICITUDE. IMPOSSIBILIDADE DE
ABSOLVIÇÃO SUMÁRIA. ANIMUS NECANDI EVIDENCIADO.
DESCLASSIFICAÇÃO PARA LESÕES CORPORAIS OU PERIGO PARA
14
TJSP, Rec, Rel. Diwaldo Sampaio, RT 595/349 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 145.
15
TJMG, AC, Rel. Costa Loures, RT 676/322 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos réus.
São Paulo: Saraiva, 2002 p. 145.
16
TJSP, Rec, Renato Nalini, RJTJSP 141/362 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 145.
17
TJSP, Rec, Rel. Geraldo Arruda, RJTJSP 62/356 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco
dos réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 146.
18
TJSP, Rec, Rel. Prestes Barra, RT 554/347 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 146.
22
A VIDA. IMPOSSIBILIDADE POR FALTA DE PROVAS. COMPETÊNCIA
DO TRIBUNAL DO JÚRI. 1. Estando a materialidade demonstrada e
havendo indícios suficientes de autoria, impõe-se a pronúncia do réu
para que seja submetido a julgamento perante o Tribunal do Júri.
2. A hipótese de legítima defesa só pode ser reconhecida para autorizar
a absolvição sumária, quando houver prova inconteste da sua existência.
3. De igual modo, havendo evidências do animus necandi, não cabe, na
fase do iudicium accusatione, a desclassificação para lesões corporais
ou perigo para a vida, devendo a dúvida ser dirimida no Tribunal Popular.
No caso, os autos informam que a vítima ficou quatro dias internada em
hospital e oito meses sem poder trabalhar, em razão dos golpes de faca
que recebeu do réu. 4. Somente as circunstâncias qualificadoras
manifestamente improcedentes, e sem qualquer apoio na prova dos
autos, podem ser subtraídas do Conselho de Sentença. Sendo assim,
caberá ao Júri decidir se o crime foi praticado por motivo fútil, pois,
segundo a acusação, o réu teria golpeado a vítima por motivo de ciúme.
5. Recurso conhecido, mas improvido, mantendo incólume a sentença de
pronúncia para que o réu seja submetido a julgamento perante o Tribunal
do Júri. (20010310088657RSE, Relator ROBERVAL CASEMIRO
BELINATI, 2ª Turma Criminal, julgado em 05/06/2008, DJ 02/07/2008 p.
19
136)
APELAÇÃO CRIMINAL - JÚRI - HOMICÍDIO QUALIFICADO - ARTIGO
121, § 2º, II E IV, DO CP - ARTIGO 61, II, "E", DO CP - OCULTAÇÃO
DE CADÁVER - ARTIGO 211, DO CP - MATERIALIDADE DELITIVA E
AUTORIA COMPROVADOS - QUALIFICADORAS - MOTIVO FÚTIL RECURSO QUE DIFICULTOU A DEFESA DA VÍTIMA - AGRAVANTE CRIME PRATICADO CONTRA CÔNJUGE - ATENUANTE CONFISSÃO ESPONTÂNEA - MÍNIMO LEGAL - NOVO JÚRI IMPOSSIBILIDADE - DECISÃO EM CONSONÂNCIA COM AS PROVAS
DOS AUTOS - MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Comprovadas
materialidade e autoria deve o agente que esfaqueou sua esposa e,
depois, escondeu o cadáver enterrando-o no quintal de sua casa,
responder pelas penas dos artigos 121, § 2º, II e IV, e 211, ambos do
CPB, consideradas a agravante do artigo 61, II, "e", do CPB e a
atenuante da confissão espontânea (artigo 65, III, "d", do CPB). O ciúme
injustificado, considerado pelo Júri Popular como motivo fútil,
insignificante e desproporcional frente à vida humana, com base nas
provas dos autos e em versão que considerada mais correta configura a
qualificadora do artigo 121, § 2º, II, do CP. Resta caracterizada
qualificadora de recurso que dificultou a defesa da vítima se o agente, de
madrugada, encurralou sua esposa no interior do banheiro da casa,
esfaqueando-a. O crime de ocultação de cadáver (artigo 211, do CPB)
não exige, para sua configuração, dolo específico, bastando que cadáver
tenha sido escondido pelo agente, em seu quintal, pois o resultado
independe de o acusado ter confessado o delito e a localização do corpo
da vítima. A determinação de novo Júri somente é cabível se
comprovado que a decisão do Conselho de Sentença foi manifestamente
contrária às provas dos autos, em consonância com a orientação da
20
Súmula n. 28, aprovada pelo Grupo de Câmaras Criminais do TJMG.
19
DISTRITO FEDERAL. Tribunal de Justiça. 20010310088657RSE, Relator ROBERVAL CASEMIRO
BELINATI, 2ª Turma Criminal, julgado em 05/06/2008, DJ 02/07/2008 p. 136 (grifo nosso)
20
MINAS GERAIS. Tribunal de Justiça. 1.0079.00.018128-3/001(1). Relator: Armando Freire. Julgado
em: Belo Horizonte, 10de maio de 2005. (grifo nosso)
23
Nos casos em que o ciúme é mencionado como circunstância
qualificadora, sempre é enquadrado como motivo fútil e não como motivo
21
torpe” (TJSP, Rec, Rel. Luiz Betanho).
A ausência de motivo equipara-se, para os devidos fins legais, ao motivo
fútil, porquanto seria um contra-senso conceber que o legislador punisse
com pena maior aquele que mata por futilidade, permitindo que o que
age sem qualquer motivo receba sanção mais branda (TJMG, Rec, Rel.
22
Costa e Silva, RTJE 45/276)
Cabe ressaltar que a jurisprudência dominante não admite a cumulação
das qualificadoras, motivo torpe e motivo fútil. Assim o crime só pode ser
praticado por motivo torpe ou por motivo fútil.
Inadmissível no homicídio o reconhecimento de dúplice qualificadora
fundada em motivo simultaneamente fútil e torpe, uma vez que ambos
23
são de caráter subjetivo” (TJSP, AC, Rel. Renato Nalini, RT 657/282).
Diante dos julgados ora relatados, resta evidenciado que a matéria está
longe de ser pacificada.
1.4 A MULHER COMETE MENOS CRIME PASSIONAL
Para Eluf, a paixão homicida é uma conduta tipicamente masculina,
segundo ela as mulheres, geralmente, não matam. Existem alguns casos, mas
em geral elas são menos dadas à violência. Na história quase não há registrados
casos de mulheres ou amantes que mataram seus companheiros por se sentirem
traídas ou desprezadas.
21
TJSP, Rec, Rel. Luiz Betanho apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos réus. São Paulo:
Saraiva, 2002 p. 146.
22
TJMG, Rec, Rel. Costa e Silva, RTJE 45/276 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos
réus. São Paulo: Saraiva, 2002 p. 146.
23
TJSP, AC, Rel. Renato Nalini, RT 657/282 apud ELUF, Nagib Luiza. A paixão no banco dos réus.
São Paulo: Saraiva, 2002 p. 145.
24
Por questões intrínsecas as mulheres não têm a mesma agressividade que
os homens, a maneira que a mulher expressa essa agressividade, quando
existente, se dá de forma menos física, passando a exigir mais dinheiro, mais
bens do que o homem pode lhe oferecer ou agindo com certo desprezo sexual. Já
o homem se vale sempre de sua superioridade física.
Cabe ressaltar ainda, que a mulher comete menos crimes passionais
porque ela tem uma capacidade maior de suportar as intempéries da vida, muito
mais do que o homem. Isso porque o ego da mulher não está em seu
companheiro, mas sim em si mesma, a mulher tem mais consciência de seu valor.
Além disso, não podemos deixar de levar em consideração a influência que
a cultura exerce sobre as mulheres, que desde muito cedo são ensinadas a
aceitar ou pelo menos compreender e fingir não ver a traição masculina,
enxergando esta traição como uma necessidade natural do homem.
Isso fica evidente, conforme bem lembra Eluf (2002, p.116), quando vemos
ainda hoje religiões e grupos sociais que permitem e incentivam a poligamia, ou
seja, a união de um homem com diversas mulheres, exigindo da mulher a
passividade frente a essa situação.
Historicamente o homem tem sido educado para ser possessivo e
dominador, essas características também presentes nos crimes passionais, fazem
com que o homem, mais facilmente que a mulher, cometa um crime passional.
A mulher delinqüe menos que o homem por que tem um caráter mais
afável, mais meigo, por ter domínio de si mesma e por ter consciência de seu
valor (Eluf, 2002, p.191).
A história traz poucos relatos de mulheres que mataram seus
companheiros movidas pela paixão. Dificilmente nos defrontamos com casos de
mulheres possessivas e vingativas que por não suportarem a rejeição ou a dor da
traição se acharam no direito de matar.
O livro “A paixão no banco dos réus” traz o relato de quatorze crimes
passionais que marcaram uma época, destes apenas dois foram praticados por
mulheres.
Em 1950, Zulmira Galvão Bueno por estar convencida da infidelidade de
seu companheiro Stélio Galvão Bueno, matou-o com dois tiros. O outro caso
ocorreu em 1980, e trata do crime cometido pela atriz Dorinha Durval, que após
25
ser traída, humilhada e rejeitada pelo seu marido Paulo Sérgio Garcia Alcântara,
matou-o com três tiros.
26
2. CONTINGÊNCIAS QUE ENVOLVEM O COMETIMENTO DESSE CRIME
Diante de situações inesperadas qualquer um pode ser acometido por
sentimentos que transtornam a mente, porém nos indivíduos equilibrados
socialmente há um bloqueio para que as atitudes destrutivas não passem do
campo mental. Abaixo seguem alguns dos elementos que podem levar a prática
do delito passional, porém devemos ter em mente que os fatores que contribuem
para a consumação do crime passional estão sempre ligados a situações
multifatoriais, e não podem ser analisados de maneira isolada.
2.1 HONRA
O Minidicionário Houaiss define “honra” como sendo “sentimento de
dignidade e honestidade moral; marca de distinção; privilégio; motivo de
admiração, de glória”.24
Desde os tempos antigos, o caráter subjetivo da honra permeia a mente
dos homens, constituindo até um direito assegurado por lei. O código Penal
protege a honra quando define tipos penais e penas para os crimes contra a
honra, como por exemplo, calúnia, difamação e injúria.
A ofensa à honra inicia no ser ofendido uma avalanche de sentimentos e
emoções, principalmente se relacionado à honra conjugal, pois o ofendido
depositou confiança e anseios naquele que maculou sua honra.
Para o criminoso passional, a honra masculina pode ser manchada e até
mesmo destruída pelo comportamento inadequado da mulher, e só poderá ser
lavada com o sangue de sua companheira.
Para tanto, a honra masculina é considerada externa ao homem e repousa
na mulher que forma o seu círculo familiar. Neste caso, os atos femininos devem
24
HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2004. p 392.
27
ser vigiados cuidadosamente, uma vez que qualquer deslize comprometerá a
honra masculina e sua aceitação social, o que demonstra uma relação de
hierarquia entre homem-mulher.25
A razão que leva o indivíduo a praticar o crime passional motivado pela
honra é o receio de ser julgado, ser motivo de chacotas e difamação em
decorrência do mal comportamento de sua companheira. Neste cenário, a sanção
penal é vista como menos grave do que a social.
Neste tipo de delito, fica evidenciada a característica egoísta do autor do
crime passional, pois comete o delito por convicção de que de algum modo sua
honra antes manchada se tornará alva novamente.
Para o criminalista Valdir Troncoso Peres (Eluf, 2002, p178), a honra é
inerente ao homem, e quando esta é arrancada dele é como se o matassem,
então ele mata por entender que está se defendendo legitimamente.
A honra é bem personalíssimo e não pode ser afetada pela conduta de
outrem. Não há desonra para o marido na conduta da esposa ou de seu amante.
A honra está em cada um de nós e não em outra pessoa.26
2.2 INDIFERENÇA
Para Houaiss, “indiferença” é “a falta de interesse ou de sensibilidade;
despreocupação, desprendimento.” 27
A indiferença contribui para a concretização do crime passional quando o
desinteresse pelo sentimento do outro ou o desdém da pessoa amada acarreta
em desequilíbrio no sujeito contrariado.
Neste cenário, o autor deste delito é uma pessoa excessivamente
apaixonada, que em decorrência da rejeição, sente-se infeliz, humilhada, com seu
25
BORELLI, Andrea. Matei por amor: representações do masculino e do feminino nos crimes
passionais. São Paulo: Celso Bastos Editor, 1999.
26
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 60.
27
HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2004. p 412.
28
orgulho ferido, e de maneira geral passa a idealizar a possibilidade de conquista
ou reaproximação da pessoa amada.
Caso a rejeição persista, o sentimento ora denominado de amor
transforma-se em ódio, em desejo de vingança, e a única solução encontrada
pelo sujeito rejeitado é a eliminação da pessoa que o feriu.
De maneira geral, o autor do crime passional motivado pela indiferença do
companheiro ou companheira age de maneira premeditada e com requintes de
crueldade.
Vale ressaltar, que em muitos casos a vítima não tem nenhuma ligação
com o autor do crime, por desconhecer seu sentimento ou por crê que o mesmo
já foi superado.
É inadmissível pautar-se na rejeição para tirar a vida de outrem, cabe
àquele que está sofrendo por conta da indiferença do ser amado, respeitar a
escolha do outro e dar tempo ao tempo, pois como bem lembra o filósofo
argentino Mário Augusto Bunge (Eluf, 2002, p.54) “não há paixão que não se cure
com o tempo e com o espaço”.
2.3 PAIXÃO
Houaiss define a paixão como “grande sofrimento; martírio; afeto ou
entusiasmo muito intenso por algo ou por alguém.” 28
Para Plácido e Silva, qualquer fato que produza na pessoa emoção intensa
e prolongada, diz-se paixão, com caráter crônico.
Enquanto sentimento eufórico, arrebatador, a paixão faz com que o sujeito
perca sua individualidade em decorrência do fascínio exercido pelo outro, o que
gera sentimento de obsessão e egoísmo.
A paixão não se confunde com violenta emoção. O termo “passional” vem
da paixão, não do amor ou da emoção.
28
HOUAISS, Antônio. Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 2ª edição revista e ampliada. Rio de
Janeiro: Objetiva, 2004. p 543.
29
Uma grande paixão cria no homem uma segunda natureza, fazendo com
que todas as regras sociais e emocionais que permeiam sua mente percam o
sentido e valor.
A paixão desmedida tem características peculiares, como angústia,
desespero, desinteresse pelas demais coisas que não estejam ligadas à pessoa
amada, obsessão e idéia fixa pelo sentimento cultivado. Quando chega a este
nível a paixão se torna um transtorno psíquico que pode levar ao cometimento do
crime.
A paixão homicida resultado do somatório de emoções e sensações que
acarretam na infelicidade, gera no apaixonado reações inesperadas e
inexplicadas, é como se uma nova criatura tomasse conta de sua vida o tornado
um ser agressivo, que deixa de avaliar os seus atos de acordo com os valores
sociais imperantes.
Para Luiza Nagib Eluf (2002, p. 111) “paixão não é sinônimo de amor.”
Diante dessa afirmação, resta evidenciado que amor e paixão não se confundem.
O que pode ocorre é a paixão saudável transformar-se em amor passado a
euforia inicial da relação.
Benedito Ferri (Eluf, 2002, p. 113) diferencia duas espécies de paixão: as
sociais e as anti-sociais, à medida que sejam úteis ou danosas, favoráveis ou
contrárias à ordem e aos valores sociais. Para ele, são sentimentos que
representam as paixões sociais o amor, a honra, o afeto materno, o patriotismo. E
as paixões anti-sociais são aquelas que envolvem o ódio, a vingança, a cobiça, a
inveja.
Isso revela a característica arriscada que a paixão possui, uma vez que o
apaixonado só se satisfaz quando tem o objeto de sua paixão sob o seu poder ou
controle absoluto, no entanto só a paixão não leva ao cometimento do crime.
30
2.4 CIÚME
O ciúme é um sentimento que pode interferir no relacionamento conjugal,
em maior ou menor grau, produzindo angústia, raiva, desconfiança, prejudicando
o relacionamento amoroso.
O ciúme em decorrência do estado de perturbação emocional que o
envolve foi considerado por Willian Shakespeare29 como um demônio, um
monstro de olhos verdes, que intoxica a vida afetiva da humanidade.
Antônio Mourão CAVALCANTE descreve com excelência o ciúme e suas
conseqüências:
(...) uma perturbação total, um transtorno afetivo grave. O ciumento sofre
em seu amor: em sua confiança, em sua tranqüilidade, em seu amor
próprio, em seu espírito de dominação e em seu espírito de posse. O
ciúme corrói-lhe o sentimento em sua base e destrói, com uma raiva
furiosa, suas próprias raízes. Propicia a invasão da dúvida que perturba
a alma, fazendo com que ame e odeie ao mesmo tempo, a pessoa
objeto de sua afeição. O maior sofrimento do ciumento é a incerteza em
que vive, pela impossibilidade de saber, com segurança, se o (a)
30
parceiro (a) o engana ou não.
Para Léo Rabinowcz (2000, p.67) “ciúme é o medo de perder o objeto para
o qual se dirigem os nossos desejos. O ciúme destrói, instantaneamente, a
tranqüilidade da alma.” Surge da insegurança, do medo, e do sentimento de
inferioridade.
Esse medonho sentimento que rodeia as mentes torna as pessoas
paranóicas, fazendo com que simples olhares, gestos de amizade, alguns elogios,
passem a incomodar e inquietar as mentes, o que acarreta no medo da perda do
ser amado.
Em decorrência do seu instinto de sobrevivência, o ser humano tem
enraizado em si a idéia de exclusividade e posse, tais sentimentos se estendem
as relações amorosas o que acarreta no ciúme.
29
SHAKEASPEARE, Willian. Otelo, o Mouro de Veneza. São Paulo: Editora Martin Claret, 2003.
CAVALCANTE, Antônio Mourão. O ciúme patológico. Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1997 p.
24.
30
31
Cabe ressaltar que alguns autores defendem que há duas espécies de
ciúmes: o ciúme fisiológico, aquele natural ao ser humano, e o ciúme patológico,
ou seja, o doentio que perturba a lucidez mental.
A autora Luiza Nagib Eluf (2002, p. 114) declara que o ciúme nasce de um
complexo de inferioridade profundo, e denota imaturidade afetiva.
O que leva ao crime passional é ciúme decorrente da idéia de posse, uma
vez que o agente vê a pessoa amada como um objeto pessoal e intransferível.
Eluf, em referência a Roque de Brito Alves (2002, p.114), menciona que o
ciumento sente-se incapaz de manter o amor, de vencer, ou de afastar um rival,
mas, sobretudo, sente-se humilhado e ferido de morte em seu amor próprio.
Para alguns, o ciúme é prova da existência do amor e que este não existe
sem aquele. Para o autor Léon Rabinowcz (2000, p. 71) o ciúme pode até
proceder do amor, mas quando desmedido destrói o sentimento que o originou.
Rabinowcz cita em seu livro, O Crime Passional, uma declaração do autor
Roland Barthes, que descreve com brilhantismo o ciúme:
Como ciumento, sofro quatro vezes: porque sou ciumento, porque me
reprovo em sê-lo, porque temo que meu ciúme magoe o outro, porque
me deixo dominar por uma banalidade. Sofro por ser excluído, por ser
31
agressivo, por ser louco e por ser comum.
Para Willy Passini,32 o ciúme pode ser dividido em quatro graus:
1º grau: ciúme normal, aquele que gera o desejo de ter apenas para si a
pessoa amada;
2º grau: é a forma mais séria de ciúme, implica em verificações contínuas
acerca da vida do parceiro, almejando toda atenção do companheiro;
3º grau: é a forma obsessiva do ciúme, geralmente baseada na suspeita,
por vezes infundada, de infidelidade do cônjuge, nesse estágio é comum ocorrer
espionagem e invasão à privacidade em emails e outros documentos;
4º grau: é o ciúme patológico, nasce do delírio da imaginação, é inútil
discutir, pois o ciumento nesta fase crê somente em seus delírios.
Diante deste relato, fica evidente que o homem tomado por esse
sentimento, pode cometer um delito motivado pelo ciúme.
31
32
RABINOWCZ, Léon. O crime passional. São Paulo: Albuquerque Editores Associados, 2000.
PASSINI, Williy. Ciúme: a outra face do amor. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.
32
É preciso ressaltar, que nem todo ciumento é capaz de cometer um delito,
caso o fosse, o mundo seria uma grande penitenciária.
A manifestação do ciúme se dá de maneira diferente nos homens e nas
mulheres, apesar de serem igualmente ciumentos.
As mulheres, em sua maioria, desejam compromisso sério, amor, homens
maduros e com certo status financeiro. Os homens anseiam por variedade sexual,
priorizando a beleza física. Assim, para as mulheres é mais perturbadora a
possibilidade da infidelidade emocional, enquanto os homens ficam aflitos diante
da possibilidade da infidelidade sexual de suas companheiras.
As manifestações de ciúme podem variar desde ameaças de violência,
ocorrências de espancamentos até a consumação de assassinatos.
O ciumento não perdoa e não confia. Se lhe faltam motivos no presente,
busca-os no passado e até no imprevisível futuro, ainda que ilusórios, frutos de
sua imaginação atormentada.33
2.5 INFIDELIDADE
Conforme define Houaiss (2002, p. 415) infidelidade é a qualidade ou
característica ou caráter de infiel, de traidor, de desleal.
Para Luiza Nagib Eluf (2002, p. 116) a infidelidade, enquanto elemento
impulsionador do crime passional está ligada ao desejo sexual pela mesma
pessoa por um longo período, que não se mantém e não é fiel, ou pelo menos se
duvida desta fidelidade.
Para a pessoa traída, ou supostamente traída, a infidelidade acarreta na
perda da auto-estima, do status e respeito social. Então, na tentativa de
preencher o vazio gerado pela traição ou suposta traição, o homicida passional
pratica o crime, crendo que assim não será alvo das más-línguas da sociedade,
mas não exclusivamente por medo de perder a pessoa amada ou pelo receio de
ver esta com outra pessoa.
33
ROSA, Ubiratan. Mais amor, menos ciúme: 450 reflexões para amar mais e melhor. São Paulo:
Idéia e Ação, 2005, p. 19.
33
Os homens de maneira geral figuram mais no pólo ativo de crime passional
que as mulheres, principalmente quando o fator ocasionador do crime é a
infidelidade. Isso por que para o homem a fidelidade de sua companheira é um
dado que o faz respeitado perante o meio social em que vive, e a traição
mancharia sua honra, que como já foi dito só poderá ser alva novamente se
lavada com o sangue da pessoa que a manchou, nesse caso sua companheira,
para que toda a sociedade saiba que ele se vingou.
2.6 CARACTERÍSTICAS PREDOMINANTES DOS AUTORES DE CRIMES
PASSIONAIS
O criminoso passional não tem como característica predominante a raça,
credo, classe social, porém quase sempre está presente a diferença de idade, e
na maioria dos casos são sempre do sexo masculino.34
De maneira geral os criminosos passionais são pessoas ciumentas,
inseguras, depressivas, motivadas pelas mais diversas causas: defesa da honra,
sentimento de posse, ciúme, infidelidade, paixão desmedida, infidelidade e outros
mais.
Luiza Nagib Eluf define o perfil do homicida passional da seguinte forma:
É homem, geralmente de meia idade, é egocêntrico, ciumento e
considera a mulher um ser inferior que lhe deve obediência ao mesmo
tempo em que a elegeu o “problema” mais importante de sua vida. Tratase de pessoa de grande preocupação com sua imagem social e sua
respeitabilidade de macho. Emocionalmente é imaturo e descontrolado,
presa fácil da “idéia fixa”. Assimilou os conceitos da sociedade patriarcal
35
de forma completa e sem crítica.
Os indivíduos que cometem crime passional são em geral pessoas que não
sabem perder, que não sabem como viver sem o que possuíam ou sem o que
queriam. É acima de tudo um narcisista, ou seja, tem uma vaidade exarcebada e
autoconfiança exagerada.
34
Conforme Regina Navarro Lins, psicóloga, em entrevista ao jornal O DIA, em 25 de junho de 2009.
ELUF. Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 198.
35
34
O autor do crime passional, em geral, é uma pessoa em estado de extrema
emoção, sem senso crítico, que sem referência age como um animal. Na maioria
das vezes, o homicida passional nunca matou ninguém, e seu furor violento é em
relação a uma mulher específica.36 Para o criminoso passional a vida conjugal é
composta apenas por ele e seu sentimento de superioridade em relação ao ser
amado, denotando o seu desejo de subjugar o outro.
A autora Eluf, continua (2002, p. 117):
Os homicidas passionais trazem em si uma vontade insana de
auto-afirmação. O assassino não é amoroso, é cruel. Ele quer, acima de
tudo, mostrar-se no comando do relacionamento e causar sofrimento a
outrem. O assassino não vê limites e apenas se satisfaz com a morte do
suposto traidor. Os homicidas passionais padecem de amor obsessivo,
de desejo doentio, de insensatez. São narcisistas, querem ver na outra
pessoa o engrandecimento de seus próprios egos, transformando o ser
amado em idéia fixa, em única razão de existir.
O criminoso passional raramente se arrepende, (Eluf, 2002, p. 197), e em
alguns casos, perante o juiz, se diz arrependido objetivando apenas alcançar a
compaixão dos julgadores e a diminuição da pena.
O homicida passional, na maioria dos casos, confessa o crime, pois para
ele de nada valeria matar a mulher que o traiu se a sociedade não soubesse que
sua “honra” fora lavada com sangue.
Dominado pelo ódio, sede de vingança, rancor, intolerância, egoísmo e
preocupação exacerbada com sua imagem perante o grupo social, o autor do
crime passional mata para exercer o poder que crê ter sobre a pessoa amada.
Para Ferri,37 o delinqüente passional é, antes de tudo, movido por uma
paixão social, normalmente trata-se de um jovem, que pratica o ato criminoso ao
ar livre, sem cúmplices ou testemunhas, com espontânea apresentação à
autoridade policial impelido pelo remorso – sincero ou não. É um criminoso
momentâneo, não volta a delinqüir.
36
ELUF. Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002.
37
FERRI, Enrico. O delito passional na civilização contemporânea. Campinas: LZN Editora, 2003.
35
3. CASOS DA VIDA REAL
Ao longo dos anos, o tratamento dado ao criminoso passional evoluiu,
porém nunca deixou de causar grande interesse e comoção social, basta
observar como os meios de comunicação dão espaço para as manchetes de
crimes passionais.
Em seu livro “A Paixão no Banco dos Réus”, a procuradora de justiça do
Ministério Público do Estado de São Paulo, Luiza Nagib Eluf, elenca os casos de
crimes passionais mais célebres de nossa sociedade, que nos permitem elucidar
como estes crimes continuam presentes em nossa história.
A citação de alguns crimes relatados no livro supracitado e de outros
noticiados pela mídia em geral, permite perceber o perfil comum dos criminosos
passionais, além de revelar detalhes que nos levam a concluir que tais crimes não
foram cometidos por amor, mas sim por outros sentimentos menos nobres.
3.1 PONTES VISGUEIRO E MARIA DA CONCEIÇÃO
Sem levar em consideração as regras sociais de sua época, José Cândido
de Pontes Visgueiro, desembargador - do que hoje seria o Tribunal de Segundo
Grau, assumiu publicamente sua relação amorosa, com uma mulher 45 anos mais
nova que ele, Maria da Conceição, conhecida por “Mariquinhas Devassa”, que era
prostituta.
Seu relacionamento com Mariquinhas foi conturbado, permeado de
manifestações públicas de paixão e surtos de ciúmes.38
Em 14 de agosto de 1873, Visgueiro atraiu Mariquinhas para sua casa com
o intuito de matá-la, movido por ciúme e principalmente pela frustração gerada
diante da impossibilidade em obter a fidelidade da moça.
38
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 4.
36
Assim, atormentado pela infidelidade de Mariquinhas, Visgueiro comprou
previamente dois caixões, um de zinco e um de madeira, e com um punhal matou
Mariquinhas, colocando seu corpo primeiro no caixão de zinco e após soldá-lo
com ajuda de um amigo, guardou-o no caixão de madeira e em seguida decidiu
enterrar sua amada no quintal de sua casa.
As investigações policiais começaram logo, pois como era prostituta,
Mariquinha era muito conhecida, e não tardou para que a polícia desvendasse os
fatos ocorridos naquela noite.
Quando interrogado Visgueiro assumiu ter matado Mariquinhas porque a
amava muito. A sua defesa sustentou a tese de desarranjo mental, provocado
pelo “mais violento ciúme inspirado por uma mulher perdidíssima”.39 A acusação
repeliu essa alegação baseando-se no fato de que após Visgueiro ter cometido o
crime mostrava-se calmo, e pediu a pena de morte para o acusado.
No julgamento a tese de desarranjo mental foi afastada, a pena de morte
não foi acolhida e decidiu-se pela pena de galés perpétua – onde o condenado
deveria pedir esmolas em praça pública para o seu sustento, essa pena foi
substituída pela pena de prisão perpétua com trabalho, por ser o réu maior de
sessenta anos, devendo ser cumprida na Casa de Correção da Corte no Rio de
Janeiro.
Diante
desta
condenação
Visgueiro
perdeu
seu
cargo
de
40
desembargador.
3.2 EUCLIDES RODRIGUES PIMENTA DA CUNHA, ANNA DA CUNHA E
DILERMANDO DE ASSIS
No dia 15 de agosto de 1909, no Rio de Janeiro, Euclides Rodrigues
Pimenta da Cunha, professor de lógica e autor do livro Os Sertões, tentou matar
Dilermando de Assis, tenente do Exército, crendo ser este amante de sua mulher,
Anna da Cunha, mas acabou sendo morto.
39
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 7.
40
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
37
No ano de 1905, Dilermando, aos 17 anos, envolveu-se com Anna, uma
mulher casada, cujo marido estava sempre ausente, que tinha três filhos e 30
anos de idade. Alguns meses depois de iniciado seu romance com Anna,
Dilermando decidiu afastar-se de sua amada, a fim de evitar cenas de ciúmes
desta com seu marido, recolhendo-se numa escola militar. A esta época Euclides
já desconfiava do relacionamento extraconjugal de sua esposa.
Não mais suportando viver longe de seu novo amor, Anna pediu a
separação ao escritor. Euclides recusava-se a conceder a separação, e Anna
decidiu deixá-lo indo morar na casa de Dilermando.
Diante da recusa da mulher em voltar para casa, Euclides da Cunha
resolveu ir à casa de Dilermando para vingar-se do homem que roubara o amor
de amada. Portando uma arma de fogo, Euclides invadiu o quarto de Dilermando
e desferiu um tiro em sua virilha direita, percebendo que Euclides estava
transtornado, Dilermando entrou em luta corporal com seu algoz com o objetivo
de desarmá-lo. Foi nesse momento que Euclides desferiu o segundo tiro, agora
no peito do tenente, no entanto mesmo ferido e após presenciar Euclides atirar
em seu irmão, Dilermando reuniu todas as suas forças e pegou sua arma que se
encontrava em cima de uma prateleira, e uma troca de tiros teve início.
Dilermando, com o objetivo de mostrar-se em condições de resistir, atirou em
direção oposta a que se encontrava Euclides, para revidar o escritor atirou
novamente contra o tenente atingindo-lhe as costelas, nesse momento
Dilermando atira contra seu algoz ferindo-lhe no pulso e diante da possibilidade
de um novo disparo por ele, Dilermando acerta-lhe o ombro.
Euclides morreu e Dilermando sobreviveu.
Dilermando foi preso e julgado, e diante da tesa de legítima defesa contra
agressão injusta e traiçoeira, fora absolvido.
Depois da morte de Euclides, Anna e Dilermando casaram-se e tiveram
mais cinco filhos.41
41
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
38
3.3 AUGUSTO CARLOS EDUARDO DA ROCHA MONTEIRO GALLO E
MARGOT PROENÇA GALLO
No dia 7 de novembro de 1970, Augusto Carlos Eduardo da Rocha
Monteiro Gallo, procurador de justiça, suspeitando que sua mulher, Margot
Proença Gallo, era infiel, matou-a com onze facadas.
Gallo era membro do Ministério Público havia 17 anos, e quando o crime
ocorreu morava em Campinas com a mulher e três filhos.
No dia do crime, o casal Proença iniciou uma discussão acerca da
separação pedida por Margot. Segundo o depoimento do procurador, ele exigia
que os filhos ficassem com ele, alegando que a mulher não tinha condições
morais para cuidar deles e impondo ainda que Margot deveria deixar a cidade,
pois havia manchado o seu nome e sua honra. Margot recusou-se a aceitar a
separação naqueles termos, e uma discussão teve início. Foi nesse momento que
Gallo apanhou uma faca que estava sobre o armário e desferiu o primeiro golpe
em Margot Proença. Nesse ínterim, Margot e Gallo entraram em luta corporal e
Gallo a feriu outras dez vezes, o que ocasionou sua morte. Gallo deixou o local do
crime levando consigo a faca usada para tirar a vida de sua mulher.
Eduardo Gallo foi julgado por duas vezes, mas predominaram os padrões
machistas da época, e Gallo foi absolvido nos dois julgamentos.42
3.4 DOCA STREET E ÂNGELA DINIZ
Raul Fernandes do Amaral Street teve um relacionamento emocional com
Ângela Diniz por aproximadamente quatro meses e após uma discussão
desencadeada por uma crise de ciúmes, Doca matou Ângela com três tiros no
rosto e um na nuca, o que a deixou transfigurada.
42
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
39
Doca Street abandonou sua mulher, perdendo a mordomia que esta lhe
proporcionava uma vez que vinha de família rica, para viver com Ângela Diniz.
Doca e Ângela se conheceram em agosto de 1976 em um jantar, um mês
depois Doca deixou sua mulher e foi viver com Ângela na casa dela em Búzios.
Em depoimento Doca alegou que Ângela sempre o comparava com outros
homens o que certamente gerou nele certa insegurança emocional.
Quando do seu primeiro julgamento Doca Street fora condenado a dois
anos de reclusão com sursis – suspensão condicional da pena, havia sido
praticamente absolvido, e horas depois dizia à imprensa da época “matei por
amor”. Como Doca, inúmeros homens foram absolvidos valendo-se do argumento
de legítima defesa da honra, sendo perdoados por executarem suas mulheres.
No entanto, a promotoria recorreu da decisão, os movimentos feministas
que se fortaleciam fizeram grandes protestos, e no segundo julgamento Doca foi
condenado a 15 anos de reclusão, sob o argumento de que ele não agiu em
legítima defesa de nenhum direto, muito menos de sua honra ferida. Logo um
novo slogan surgiu “quem ama não mata” e diante dessa nova realidade social os
crimes passionais passaram a ser julgados com um olhar menos machista.43
3.5 LINDOMAR CASTILHO E ELIANE DE GRAMMONT
Eliane Aparecida de Grammont era cantora e tinha 26 anos de idade
quando foi assassinada. No dia 30 de março de 1981, ela cantava no bar “Belle
Epoque”, em São Paulo, quando seu ex-marido Lindomar Castilho, portando arma
de fogo, surgiu de repente, em estado visivelmente alterado, aproximou-se e
disparou cinco tiros contra ela.44
Lindomar, que praticou o ato na presença do público e depois tentou fugir,
foi agarrado e dominado pelo dono do bar e pelos freqüentadores do local. A
43
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
44
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 75.
40
Polícia chegou algum tempo depois e encontrou o assassino com os pés e mãos
amarrados, caído na calçada. Ele foi autuado em flagrante e recolhido à Casa de
Detenção.45
Eliane havia conhecido Lindomar na gravadora RCA, na qual ambos
gravaram discos. O cantor estava bem de vida, já tendo constituído um patrimônio
pessoal. Casaram-se em 10 de março de 1979, depois de morar um tempo juntos,
e tiveram uma filha. Fixaram o regime nupcial de separação de bens por
exigência de Eliane, que não queria dar a impressão de estar interessada no
patrimônio do consorte. Ela afirmava que realmente gostava dele.
O casamento nunca andou bem. O cantor era agressivo, ciumento, tinha
conduta violenta e costumava fazer uso de bebidas alcoólicas sem nenhuma
moderação. Espancava a esposa e, em episódio anterior, tentara estrangulá-la.46
Eliane teve de abandonar sua profissão de cantora, que somente retomou
depois da separação do casal. Quando morreu, fazia seis meses que tinha
voltado a cantar e apenas vinte dias que o desquite havia sido formalizado.
Lindomar se dizia apaixonado e traído pela mulher por conta do fato desta
ter retomado sua carreira como cantora. Foi um crime premeditado. Quando
Lindomar entrou naquele bar, ele entrou para fuzilar Eliane.
Em 24 de abril de 1979, a Lindomar foi cendido o direito de aguardar o
julgamento em liberdade. Por 4 votos a 3, o Júri decidiu ter ocorrido homicídio
qualificado pelo meio que impossibilitou a defesa da vítima, e a pena fixada foi de
doze anos e dois meses de reclusão. Era 25 de agosto de 1984 e Lindomar tinha
46 anos.
O condenado apresentou-se para ser preso e foi levado para Goiânia. Em
1986, conseguiu progredir para o regime semi-aberto e em 1988 recebeu o
benefício do livramento condicional.
Em São Paulo, por iniciativa da Prefeita Luiza Erundina, em 9 de março de
1990, criou-se a “Casa Eliane de Grammont”, que dá amparo às mulheres vítimas
de violência e promove debates sobre o tema.47
45
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 76.
46
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 77.
47
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
41
3.6 UM CASO HOMOSSEXUAL
Na noite do dia 11 de outubro de 1986, em São Paulo, J. G. E. D. (que
recebeu o nome fictício de José) foi à casa de seu companheiro, A. J. M. (a quem
foi dado o nome fictício de Armando), advogado de 43 anos, a pretexto de buscálo para irem ao teatro. Na realidade, porém, tinha outra intenção.
Estava com ódio do companheiro, que queria deixá-lo para se casar com
uma mulher e constituir família. Não suportava a idéia da separação e pretendia
vingar-se.
José havia preparado tudo para acertar as contas do modo mais radical
possível. Não foram ao teatro. Em vez disso, ele agrediu Armando com várias
facadas. Não satisfeito, decapitou-o. A cabeça foi deixada ao lado do corpo. José
também machucou-se, apresentando ferimentos no nariz e nas mãos, como
resultado da luta corporal que antecedeu a morte da vítima.
A cena do crime era chocante: poças de sangue sobre os lençóis da cama,
um corpo sem cabeça no chão do quarto, uma cabeça a pouca distância do
corpo, arrumada no chão, voltada para a porta.
Diante dos enormes ferimentos causados na vítima, a quantidade de
sangue no local era proporcionalmente pequena. Supuseram os peritos que o
agressor estancou parte das hemorragias usando seus conhecimentos técnicos.
José tinha 42 anos e era cirurgião-dentista. Não admitia ter assassinado o seu
companheiro, e apesar de tê-lo negado até o fim, foi desmentido pelas muitas
provas que o mostravam como único culpado.
José foi denunciado como autor do crime. Inicialmente, o Ministério Público
atribuiu-lhe a prática de homicídio simples. Em virtude da troca dos promotores do
caso, foi pedida a condenação do réu não mais por homicídio simples, cuja pena
mínima é de seis anos de reclusão, mas por homicídio qualificado pelo motivo fútil
e pelo meio cruel, para o qual a pena mínima é de doze anos. Em sua
manifestação, o promotor asseverou que o motivo do crime era torpe, repugnante,
alegando “A vítima foi morta por tentar desligar-se de relacionamento anormal e
42
imoral.”48 O meio utilizado para matar foi cruel: “A vítima recebeu diversos
pontaços, tendo sido decapitada. Revelou o agente, desta forma, brutalidade fora
do comum, contrastando com o mais elementar dos sentimentos humanitários.”49
Uma das testemunhas ouvidas nos autos informou que, na religião
muçulmana, as pessoas castigadas são mortas por decapitação. José era de
origem árabe-muçulmana e talvez por essa razão tenha cortado a cabeça da
vítima. Mas nem por isso sua conduta foi considerada menos grave.
Aos 49 anos de idade, passados quase sete anos do cometimento do
crime, José foi levado a julgamento pelo Júri e acabou condenado a treze anos de
reclusão, maspor conta de um recurso a pena foi aumentada para quinze anos de
reclusão.
O acusado aguardou a decisão final do processo em liberdade, no dia em
que soube de sua condenação definitiva, em virtude de o Tribunal de Justiça não
ter anulado a decisão condenatória do Júri e, ainda, ter aumentado sua pena para
quinze anos, José estava sozinho. Suicidou-se. Era dia 7 de julho de 1995. Sua
certidão de óbito deu como causa mortis “intoxicação por monóxido de carbono”.
José morreu sem nunca ter admitido a prática do crime pelo qual foi julgado e
condenado.50
3.7 IGOR FERREIRA DA SILVA E PATRÍCIA ÁGGIO LONGO
No dia 4 de junho de 1998, em Atibaia/SP, Patrícia Ággio Longo, então
grávida de sete meses, foi assassinada por seu marido, o Promotor de Justiça
Igor Ferreira da Silva.
48
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 82.
49
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 83.
50
A história de José e Armando é verdadeira e está baseada no processo-crime referente ao caso
Processo 1.658/86, da 1ª Vara do Júri da Capital. Segundo Luiza Nagib Eluf, a pesquisa não foi feita
em matérias de imprensa e sim diretamente nos autos, os nomes das partes, réu e vítima, aqui
mencionados são todos fictícios.
43
A versão do Promotor era de que o casal fora vítima de um assalto e sua
esposa havia sido morta pelos assaltantes por motivos ignorados. Porém, em
suas afirmações, Igor se contradisse várias vezes e o depoimento das
testemunhas demonstrou que, em nenhum momento, o veículo do Promotor foi
seguido. Por isso e pelas demais evidências - não houve qualquer subtração de
bem, o caminho escolhido para retorno à residência do casal foi justamente o
mais longo e difícil; houve demora na entrega da roupa que o Promotor usava no
dia do crime para os devidos exames – chegou-se à conclusão que a versão
oferecida pelo Promotor de Justiça não era a verdadeira.
O fato é que, diante dessas constatações, em 2001, Igor Ferreira da Silva
foi condenado, por unanimidade, a dezesseis anos e quatro meses de reclusão
pela morte de Patrícia Ággio Longo e do filho que ela carregava em seu ventre.51
O motivo do crime até hoje permanece envolto em mistério. Foram
levantadas várias hipóteses, como, por exemplo, queima de arquivo, homicídio
passional, etc., sendo a última hipótese a mais provável, uma vez que, no
decorrer do processo, foi descoberto, por meio de exame de DNA, que o filho que
Patrícia esperava não era de Igor.
Sobre o motivo do crime, o Acórdão52 trouxe a seguinte ponderação: “O
motivo não é circunstância elementar do tipo penal. Em tese, o motivo pode ser
causa de diminuição da pena ou de qualificação do delito. Pode ser sopesado
como circunstância agravante ou atenuante... (mas) o motivo não é figura
elementar do delito nem tampouco exclui o dolo. (...) Na verdade, a prova dos
autos não permite detectar qual o motivo do crime. Por certo que ele existe, como
sempre existe em qualquer crime. Mas permaneceu oculto, nos recônditos
insondáveis da alma humana. A própria defesa, aliás, foi além e chegou a admitir,
em certa passagem, que ‘hoje em dia mata-se por qualquer ou nenhum motivo’. O
fundamental é que a prova dos autos — ainda que não detectado o motivo — não
deixa dúvida sobre a autoria do crime.”53
51
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 94.
52
Segundo dados colhidos no site do Superior Tribunal de Justiça, em consulta ao Processo REsp
509324.
53
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 98.
44
O promotor Igor foi condenado a 16 anos e 5 meses de reclusão. Após
cinco anos da decisão judicial que o condenou, Igor perdeu o cargo de Promotor
de Justiça.
Foragido desde 2001, na tarde do dia 19 de outubro de 2009, Igor Ferreira
da Silva foi preso no Estado de São Paulo.54
3.8 ANTÔNIO MARCOS PIMENTA NEVES E SANDRA FLORENTINO
GOMIDE
No dia 20 de agosto de 2000, em um haras em São Paulo, o jornalista
Antônio Marcos Pimenta Neves, 63 anos, tomado de ciúme e rancor pela
ex-namorada Sandra Gomide, 32 anos, disparou dois tiros à queima-roupa contra
ela, levando-a a morte. Havia uma diferença de idade entre eles de trinta e dois
anos.
Pimenta Neves conheceu Sandra em 1995, quando se tornou diretor-chefe
do jornal Gazeta Mercantil. Sandra era repórter deste jornal havia sete anos, e por
conta do trabalho, houve uma aproximação entre eles, o namorou começou um
ano depois, durando quatro anos.55
O relacionamento foi marcado por muitas brigas e reconciliações. Diante de
cada rompimento, Pimenta Neves pedia a Sandra que lhe entregasse todos os
presentes que ele havia lhe dado, para ele não havia sentido algum em a moça
ficar com os objetos depois do rompimento. Para Pimenta Neves tudo o que
Sandra possuía e havia conquistado (o emprego nos jornais, o salário que
recebia, o amigos que tinha, a vida que levava) era fruto do relacionamento deles,
nada havia sido conquistado por mérito de Sandra.56
Quando o crime ocorreu, Pimenta Neves trabalhava no jornal Estado de
São Paulo e havia levado Sandra para trabalhar com ele. Diante da posição de
54
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
55
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 104.
56
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 103.
45
hierarquia que havia entre eles, em decorrência do trabalho, Pimenta Neves
manipulava a vida profissional de Sandra de acordo com andamento de seu
namoro com ela. Quando brigavam, Pimenta Neves transferia Sandra para uma
função de menor importância, mas quando tudo ia bem, ele sempre concedia a
Sandra uma promoção.
Após
várias
idas
e
vindas,
Sandra
rompeu
definitivamente
o
relacionamento com Pimenta Neves, e não sucumbiu a nenhuma de suas
chantagens ou ameaças, o que fez com que Pimenta Neves acreditasse que ela
estava apaixonada por outro homem.
No dia do crime, Sandra foi ao haras para tentar se distrair e esquecer os
problemas com o ex-namorado. Pimenta Neves já esperava por ela, pois queria
esclarecer algumas atitudes de Sandra durante o relacionamento com ele. No
decorrer da discussão Pimenta Neves tentou obrigar Sandra a entrar em seu
carro, e diante da recusa da moça, desferiu dois tiros contra ela, que morrera no
mesmo instante.
Depois de cometer o crime, Pimenta Neves fugiu do local, e se escondeu
em um apartamento em São Paulo, e passados alguns dias ingeriu grande
quantidade de comprimidos antidepressivos, tendo que ser internado às presas
para tratamento de saúde. Quando de sua saída do hospital foi conduzido ao 13º
Distrito Policial onde confessou detalhadamente o crime, permanecendo detido
até 23 de março de 2001, quando foi beneficiado com um habeas corpus, e
aguardou seu julgamento em liberdade.
O julgamento só ocorreu em 3 de maio de 2006 e durou três dias, Pimenta
Neves fora condenado a dezenove anos, dois meses e dozes dias de reclusão, no
entanto essa pena foi reduzida para quinze anos de prisão, com o direito de
recorrer da decisão em liberdade.
Hoje57, com 72 anos, Pimenta Neves continua em liberdade, e no conforto
de sua residência desfruta de uma vida mansa e discreta, como se nada tivesse
acontecido. 58
57
Fonte: Revista Veja. Edição 2131 – 23 de setembro de 2009. Reportagem: Quase uma década de
impunidade.
58
Análise de acordo com o livro A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres de Luiza
Nagib Eluf.
46
3.9 UBIRAJARA DUTRA E MARIA CONCEIÇÃO CASAGRANDE
Em 26 de novembro de 2000, na cidade de Sorocaba, interior de São
Paulo, a funcionária pública municipal, Maria Conceição Casagrande, 27 anos, foi
assassinada por seu ex-marido, o aposentado Ubirajara Dutra, então com 56
anos.
O casal estava separado há três meses, e, por não conformar-se com a
separação, Ubirajara matou sua esposa, com cinco tiros e depois se suicidou com
um tiro no ouvido.59
3.10
CARLOS MOACIR DOS SANTOS CAVALHEIRO E SALETE
CAVALHEIRO
Em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Salete Cavalheiro foi morta, a facadas
por seu ex-marido, Carlos Moacir dos Santos Cavalheiro. O crime ocorreu em 10
de junho de 2001, quando a vítima comemorava o aniversário da filha mais nova
do casal.
Segundo Paula Cavalheiro, filha mais velha do casal, seus pais brigavam
muito, principalmente devido ao constante estado de embriaguez do seu pai, que
se mostrava sempre bastante agressivo.
Por não agüentar mais as agressões do companheiro, a vítima se viu
impelida a sair de casa, porém seu marido não aceitava a separação e começou a
persegui-la, insistindo em uma possível reconciliação.
O crime foi friamente planejado por Carlos Moacir, valendo-se do fato de
ser aniversário de sua filha, convenceu sua ex-mulher a ir a uma festinha que ele
havia preparado para a criança. Na festa o homicida desferiu golpes de faca na
vítima e fugiu, permanecendo seis meses desaparecido. Por fim, Carlos Moacir foi
59
Conforme reportagem Sorocaba tem três crimes passionais em uma semana. Disponível no site
http://www1.folha.uol.com.br/folha/cotidiano/ult95u18494.shtml. Acesso em 23 de outubro de 2009, as
11h.
47
tido como louco, e terminou internado no Hospital Psiquiátrico Forense de Porto
Alegre.60
3.11
EVANI GONÇALVES FONSECA E CENIR DE FREITAS
Em 8 de abril de 2002, em Minas Gerais, Cenir de Freitas foi encontrada
morta em sua própria cama com um tiro no rosto desferido por Evani Gonçalves
Fonseca, seu ex-marido.
Segundo relatos o casal vivera em união durante nove anos. Dois anos
antes da morte da vítima, Evani perdeu seu emprego e por conta da dificuldade
em voltar ao mercado de trabalho passou a fazer uso de bebidas alcoólicas
diariamente. Diante desse quadro, o sustento da família ficou a cargo de Cenir,
que possuía uma loja, de onde tirava o sustento para a família e para o vício do
marido.
Por conta do alcoolismo do marido, não agüentando mais conviver com
Evani, Cenir pediu a separação.
Após um mês da homologação do divórcio, não conformado, Evair matou a
vítima com um tiro no rosto. Depois do crime, Evani fugiu não mais sendo
localizado.61
60
Conforme reportagem da Revista Marie Claire, sob o tema Essas mulheres foram assassinadas por
seus companheiros. Disponível no site
http://revistamarieclaire.globo.com/Marieclaire/0,6993,EML831416-1740-1,00.html. Acesso em 23 de
outubro de 2009, às 11h
61
Conforme reportagem da Revista Marie Claire, sob o tema Essas mulheres foram assassinadas por
seus companheiros. Disponível no site
http://revistamarieclaire.globo.com/Marieclaire/0,6993,EML831416-1740-1,00.html. Acesso em 23 de
outubro de 2009, às 11h
48
3.12
LINDEMBERG ALVES E ELOÁ CRISTINA PIMENTEL
Após cem horas de cativeiro, no dia 17 de outubro de 2007, em Santo
André, Lindemberg Alves de 22 anos matou sua ex-namorada Eloá Cristina
Pimentel, 15 anos, com dois tiros, um em sua virilha e outro na cabeça, o motivo:
ciúme e vingança.
Lindemberg e Eloá namoraram por dois anos e sete meses. Foi um
relacionamento permeado de ciúmes, brigas, e agressões por parte de
Lindemberg, que se revelara ciumento e possessivo, proibindo Eloá de sair de
casa, de ir a festas e até mesmo de manter contato com os amigos.
Diante do comportamento de Lindemberg, após muitos rompimentos
seguidos de promessas de mudanças, que nunca aconteceram, Eloá decidiu
romper definitivamente o namoro com Lindemberg.
Inconformado, Lindemberg decidiu que deveria matar Eloá e em seguida se
matar. Para ele, se ela não ficasse com ele não deveria ficar com mais ninguém.
No dia 13 de outubro de 2007, Eloá havia retornado da escola e fazia um
trabalho escolar com alguns amigos, Nayara, Vitor e Iago, quando Lindemberg
invadiu sua casa. Ele não esperava que Eloá estivesse acompanhada, mas isso
não o fez retroceder em seu plano de vingança, decidiu transformar todos em
reféns.
O cárcere privado durou cinco dias, durante esse período Lindemberg
libertou alguns reféns, e nas últimas horas de cativeiro manteve apenas Eloá e
sua amiga Nayara presas.
Já nas primeiras horas de cárcere tiveram início as negociações com o
Grupo de Ações Táticas Especiais – GATE, na tentativa de convencer
Lindemberg a desistir de matar Eloá e de tirar sua própria vida.
Durante os dias de cativeiro Lindemberg apareceu duas vezes na janela
sozinho, era a chance que a polícia precisava para neutralizá-lo e acabar com
aquele tormento, mas a polícia escolheu não atirar. Em outros momentos ele se
exibiu na janela ameaçando Eloá com a arma, tudo era exibido em tempo real
pela mídia, o país parou para acompanhar o sofrimento de Eloá Pimentel.
49
Lindemberg estava obcecado por matar Eloá, ele não queria dinheiro, não
temia por sua integridade física, não tinha interesse em fugir, por isso as
negociações não evoluíam.
Cansada e esgotada emocionalmente, Eloá em um surto destrói alguns
objetos de sua casa, e implora para que Lindemberg a liberte ou a mate logo, mas
que acabe com todo aquele sofrimento, somente se controlando quando seu exnamorado ameaça matar Nayara em sua frente.
Após cinco dias de fracassadas negociações a polícia decidiu invadir o
local em que Lindemberg mantinha Eloá e Nayara como reféns. Na iminência da
invasão Lindemberg atirou em Nayara ferindo-a no rosto e ainda disparou duas
vezes contra Eloá, uma na virilha e outra na cabeça. Nayara sobreviveu e Eloá
morreu um dia depois no hospital.
Lindemberg não se matou como disse que faria quando da invasão ao
apartamento. Foi preso em flagrante e aguardará seu julgamento preso.62
Lindemberg irá a julgamento no Tribunal do Júri que tem previsão para
ocorrer no primeiro semestre de 2010.63
3.13
CONSIDERAÇÕES A RESPEITO DOS CASOS ELENCADOS
Todos os casos elencados neste trabalho serviram para elucidar o crime
passional e principalmente os sentimentos que movem seu autor.
Tendo em vista que os crimes relatados remontam a diferentes épocas de
nossa história, resta evidenciado que o crime passional está ainda enraizado em
nossa sociedade, com muita força e freqüência, estando presente em qualquer
tipo
de
relacionamento,
seja
namoro,
casamento
ou
mesmo
em
um
relacionamento já rompido.
62
O relato do caso Eloá Pimentel foi feito segundo dados apresentados pela mídia durante o fato.
Conforme reportagem da Revista Veja. Disponível no site http://veja.abril.com.br/noticia/brasil/jurilindemberg-deve-ocorrer-primeiro-semestre-2010-505296.shtml. Acesso em 23 de outubro de 2009,
às 11h
63
50
O mais estarrecedor é que o autor do crime passional é sempre uma
pessoa muito próxima da vítima, que se vale da confiança e da proximidade
emocional para subtrair a vida da pessoa amada.
Cabe mencionar ainda que todos esses crimes poderiam ter sido evitados,
se os autores destes delitos tivessem agido de forma mais sensata e menos
violenta. Devemos ter em mente que sempre há outra saída, que não a morte.64
64
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 200.
51
4. QUEM AMA MATA?
Grandes amores com finais trágicos atraem o interesse de pessoas de
diferentes classes sociais, raças, sexo, crenças e religiões. É inevitável questionar
como um sentimento belo se transmuda em algo inaceitável.
Será que o amor, nobre sentimento, que permeia nossos sonhos e
fantasias desde a mais tenra idade, que exprime perdão, generosidade, é o
mesmo “amor” que destrói e mata? Será que o mesmo amor que traz a vida,
também leva à morte?
Todas estas indagações passeiam no campo dos mais variadas ciências
como o direito penal, a psicologia e a literatura. Na tentativa de elucidar o
sentimento que envolve o cometimento do crime passional, é que definiremos o
amor, discutindo a mutação sofrida pelo amor, enquanto sentimento nobre que
constrói, em um “amor” que é capaz de destruir, e matar a pessoa amada.
4.1 DEFINIÇÃO DE AMOR
O termo amor advém do latim amore, e pode ter inúmeros significados. O
minidicionário Houaiss (2002,0 p. 39) explica que amor é “atração afetiva ou
física; adoração, veneração, afeto, carinho, ternura; dedicação; demonstração de
zelo, de fidelidade; apego a algo ou a alguém.”
O amor definido como sentimento que impulsiona o indivíduo para o belo,
digno ou grandioso; como afeição de uma pessoa por outra e até mesmo como
desejo sexual, vem sendo descrito e estudado há muitos séculos.
Enquanto sentimento sublime, o amor não deve causar destruição ou
sofrimento; deve ser fonte de afeto e respeito, não uma justificativa para a morte.
Para Luiza Nagib Eluf (2002, p. 114) o verdadeiro amor é denominado de
amor-afeição, e não origina idéia de morte uma vez que perdoa sempre. Assim, o
52
verdadeiro amor pode ser resumido em resignação e auto-sacrifício, ternura,
perdão e cumplicidade.
O autor Léon Rabinowcz (2000, p. 53) classifica o amor em: platônico,
afetivo e sexual. Para ele o amor platônico é o amor que satisfaz só em pensar na
pessoa amada, ocorre em sujeitos doces e românticos, incapazes de cometer um
crime passional. O amor afetivo, também chamado de “amor normal” é a forma
mais sã do amor, a forma mais feliz, é a mistura de atração e amizade, é a forma
menos egoísta do amor, excepcionalmente pode ser fundo para um crime
passional. Já o amor sexual, é a forma mais primitiva e natural de amor; é
profundo e egoísta, pode alimentar o ódio e o desejo de vingança; fornece a
imensa maioria dos crimes passionais, se não a totalidade deles, conforme o
autor.
4.2 QUANDO O AMOR SE TRANSFORMA EM OBSESSÃO
A atitude de fixar atenção e cuidados em relação ao companheiro é
esperada em qualquer relacionamento amoroso saudável. Todavia, quando
ocorre falta de controle e de liberdade de escolha sobre essa conduta, de modo
que ela passa a ser prioritária para o indivíduo em detrimento de outros interesses
antes valorizados65, está caracterizado um problema denominado “amor
patológico”.
O amor patológico, nada mais é do que a manifestação da obsessão em
torno da pessoa amada. Esse sentimento pode estar associado a sintomas
depressivos e a ansiedade desmedida, é mais freqüente em pessoas com baixa
auto-estima e tomadas por sentimentos de rejeição, abandono, raiva, ciúme, e
sede de vingança, sentimentos esses direcionados sempre à pessoa amada.
Normalmente está presente em relacionamentos tensos e conturbados. Em
estágio primário o amor patológico proporciona o alívio para a angústia que
65
Conforme dados constantes no site http://recantodasletras.uol.com.br/mensagens/256094. Acesso
em 10 de outubro de 2009, às 11h
53
acomete alguns enamorados, pois crêem que o parceiro traz significado para sua
vida.
A essência desse relacionamento não é o amor, mas sim sentimento de
posse e o medo, que pode ser de estar ou ficar só, de não ser valorizado, de não
merecer ou ter o amor do outro, de ser abandonado.
De maneira geral, os acometidos por amor patológico mantêm atitudes
nocivas no relacionamento, mesmo quando resta evidenciado que tais atitudes
prejudicam o seu vínculo afetivo com o ser amado, e por vezes o relacionamento,
a sua vida ou a de outras pessoas.66
Normalmente apresentam, diante do distanciamento (físico ou emocional)
do parceiro ou perante ameaça de abandono, episódios de insônia, taquicardia,
tensão muscular; costumam se queixar do distanciamento e do déficit de atenção
do parceiro; desperdiçam muito tempo controlando as atividades de seus
parceiros com o objetivo único de mantê-los sob total controle, o que os tornam
obcecados pelo parceiro.
É nesse tipo de amor que ocorrem as oscilações entre o real e o ilusório,
levando o acometido por esse sentimento a sensação de insegurança, passando
a ter certeza da traição ou indiferença ou da iminência do abandono pelo ser
amado, mesmo quando não há motivos para alimentar esses sentimentos.
Tomado por atitudes egoístas e violentas, marcados pela instabilidade
emocional, quer a todo custo eliminar o ser que lhe causa tantos dissabores, ou
seja, a pessoa a quem ama.
Esse amor constitui-se por um sentimento de posse, e não mais como algo
terno e bonito idealizado outrora. É a forma brutal, primitiva e animal do amor, é o
amor que mata.67
66
Revista Brasileira de Psiquiatria. Reportagem Amor patológico: um novo transtorno psiquiátrico?
Disponível no site http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S151644462007000100016&lng=pt&nrm=iso Acesso em 10 de outubro de 2009, às 10h.
67
LEAL, João José. Cruzada doutrinária contra o homicídio passional: análise do pensamento de
Leon Rabinowicz e de Nelson Hungria. Disponível em
http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/view/12072/11637. Acesso em 10
de agosto de 2009, as 15h.
54
CONCLUSÃO
A impulsividade é uma das características mais marcantes do ser humano.
Em decorrência desta impulsividade muitas vezes o indivíduo é levado a agir sem
pensar, e por isso pode ter atitudes boas ou ruins. Por isso, o crime passional
mantém-se presente na história da humanidade.
O crime passional se distingue dos demais delitos por conta das
particularidades que o envolve e por ter como pano de fundo uma das áreas mais
importantes na vida dos seres humanos: o relacionamento conjugal.
O amor é o sentimento que move todas as áreas de nossas vidas, por ser
inerente ao ser humano, traz com ele uma gama de sentimentos: alegrias,
tristezas, angústias, desespero, esperança, equilíbrio, medo, ciúme, dor... além de
muitos outros.
Quando amor chega, vem acompanhado do desejo de ter apenas para si o
ser merecedor de todo seu afeto. É nesse momento que surge o sentimento de
posse, em decorrência do medo de perder a pessoa amada. A esse temor
reagimos de maneira diferente, uns de forma mais romântica, a fim de manter viva
a chama do amor e interesse do ser amado, outros porém agem de forma mais
intensa, com rigor e obsessão... Pronto, está montado o cenário perfeito para que
o crime passional possa acontecer.
Para que o crime passional se torne uma realidade, basta que uma fagulha
seja lançada, que poder ser o ciúme, paixão, a infidelidade – concretizada ou não,
o ódio, o desejo de vingança, a indiferença, e até mesmo o desejo de defender a
honra outrora maculada.
No ato criminoso do passional há uma pressão social para que ele não
aceite a autodeterminação da mulher. Uma vez desprezado, o passional passa a
se preocupar em mostrar para o meio social em que vive que continua no
comando de sua relação e que se preciso for punirá todos aqueles que ousarem
contestá-lo.
Os assassinos passionais normalmente são pessoas calmas, que nunca
cometeram outro delito antes, mas que praticam esse ato por não saberem lidar
com o fim da relação, não por amor, mas por sentirem-se donos da pessoa
55
amada e não admitindo a possibilidade que esta possa esquecê-lo ou trocá-lo por
outro.
A desculpa “matei por amor” não convence mais... A legítima defesa da
honra também não... Quando decide matar a pessoa amada, o único pensamento
que habita a mente do assassino passional é que “se não for meu, não será de
mais ninguém”.
O crime passional tem fundamentos sócio-culturais. No decorrer da história
da humanidade temos visto a supervalorização dos pensamentos patriarcais,
onde a mulher é subjugada em relação ao homem, assim desde pequenas as
mulheres aprendem a perdoar e fazer vistas grossas para as traições de seus
maridos, já aos maridos era ensinado que no caso de traição, a mulher deveria
sofrer pena de morte, homem teria sua honra lavada e ainda tal fato serviria de
exemplo para que outras mulheres não cometessem o mesmo erro.
Por muitos anos, o crime passional era justificado como um meio de defesa
da honra maculada pela mulher infiel, mesmo quando haviam apenas indícios
desta infidelidade, pois a honra do homem estava depositada no comportamento
de sua mulher.
Hoje, não se admite mais este tipo de argumento, a sociedade evoluiu e
enfim entendeu que a honra do marido não está em sua esposa ou em seu
comportamento. A honra é bem personalíssimo, somente as nossas próprias
atitudes é que têm poder para denegrir o engrandecer nossa honra.
Alguns casos passionais, aqueles que mais impactaram a sociedade, foram
elencados com o objetivo de demonstrar como este delito está impregnado em
nossa realidade, mas principalmente por revelarem suas motivações e ainda por
permitir
analisar
algumas
características
predominantes
nos
criminosos
passionais.
Os autores dos delitos passionais são, em geral, homens, a classe
econômica não é fator determinante, são egocêntricos, ciumentos, tem vaidade
exarcebada e autoconfiança exagerada. No momento em que cometem o crime
são invadidos por um mix de sentimentos, e por não saberem lidar com eles agem
de maneira irrefletida. Todo o seu potencial assassino é voltado para uma única
pessoa, a mulher amada. Normalmente, o criminoso passional não se arrepende,
e quando o declara o faz apenas almejando a diminuição de sua pena.
56
Movido pelo rancor, desejo de vingança, ciúme, o homem mata para limpar
sua imagem perante a sociedade, pois não admite ser trocado ou abandonado
pela amada, pois crê que sobre esta tem direito exclusivo de posse, e pode fazer
dela o que bem entender.
Geralmente, os assassinos passionais agem de maneira premeditada,
decidida, fria e calculada, com o objetivo de por fim ao ser que não soube dar
valor ao amor que lhe fora devotado.
Cabe ressaltar, que diante dos dados colhidos, restou evidenciado que a
mulher comete menos crime passional porque é mais madura, mais preparada
para lidar com as perdas e dificuldades da vida. Por ter sido educada para a
passividade perante o comportamento agressivo e hostil do homem, a mulher
apresenta um caráter mais afável, tem consciência de seu valor, é menos
agressiva, por isso raramente nos deparamos com um crime passional cometido
por uma mulher.
Analisar os diversos dados recolhidos para tornar possível a execução
deste trabalho permitiu concluir que não é o amor, enquanto sentimento belo, que
impulsiona a prática do crime passional.
O amor ora declarado pelo assassino passional é o amor a si mesmo,
sentimento egoísta, que não aceita que o outro o contrarie. Não é amor, é posse.
Quando crê que a mulher amada lhe pertence, não admite que esta tome as
rédeas de sua própria vida, para ele, a amada é um objeto exclusivo, que lhe
deve obediência, fidelidade e respeito eternos.
Deveríamos repensar a nomenclatura do delito criminal passional, permitir
que este seja denominado “crime de amor” não conduz com a com a nobreza que
esse sentimento revela. O amor não mata, não destrói, não traz dor... O Amor, o
autêntico, gera alegria, esperança... É paciente, benigno, não arde em ciúmes,
não se envaidece, não procura seus interesses (...) tudo crê, espera e suporta68.
Aquele que mata está enamorado de si mesmo, e apenas nutri pelo outro
um sentimento de posse. Sentimento esse que quando frustrado, gera ódio,
rejeição, raiva, humilhação e desespero. Para o criminoso passional somente
quando eliminar a fonte de seus tormentos, a mulher amada, é que poderá se
libertar desses sentimentos.
68
A Bíblia da Mulher. Almeida Revista e Atualizada. Editora Mundo Cristão. I Coríntios Capítulo 13
versículos 4 a 7 p. 1453.
57
A todos é dada a opção de delinqüir ou não. Todos estamos sujeitos a
traições, crises de ciúmes infundadas ou não, a temer diante a possibilidade de
ser abandonado pelo ser amado, a sofrer ante a indiferença do ser que amamos.
Mas tudo isso não nos torna criminosos passionais, caso contrário precisaríamos
de uma grande penitenciária, pois nesse instante há inúmeras pessoas tomadas
pelos mais diferentes sentimentos, bons e ruins, que abandonadas pelo ser
amado continuam sua vida... É preciso saber perder, perdoar...
O presente trabalho não teve a pretensão de esgotar o tema abordado,
serve apenas como um sinal de alerta para um tema tão atraente, instigante e
mais presente do que nunca em nossa sociedade. Visa apenas saciar o desejo de
melhor compreender o crime passional, o comportamento do autor deste delito e
os sentimentos que podem levar a prática deste ato.
Porém, espera-se principalmente contribuir para a construção de uma
sociedade melhor. Por isso reafirmo: Não!!! Quem ama não mata.
58
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59
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às 11h
62
ANEXO 1 - ACÓRDÃO QUE CONDENOU PONTES VISGUEIRO
“Vistos, etc.
Attendendo a que por taes provas, e até pela confissão livre e expontânea
do réo, está plenamente provado ter elle matado no dia 14 de agosto último a
Maria da Conceição, pela fórma articulada no libello a fls...;
Attendendo a que, entre o desígnio, formado pelo réo, de cometter o crime
e o acto de comettel-o mediaram mais de 24 horas, o que é evidente em face dos
depoimentos e declarações de fls. e fls.;
Attendendo a que o réo para vencer a repugnancia e receio que Maria da
Conceição mostrava de ir á sua casa, procedeu com fraude, empregando affagos
e excitando-lhe o interesse por promessas falsas, como se vê de fls.;
Attendendo a que o réo havia superioridade de sexo, forças e armas, de
maneira que a offendida não podia repelir a ofensa;
Attendendo a que o réo foi impellido por um motivo reprovado, considerada
a natureza torpe de suas relações com Maria da Conceição;
Attendendo a que o delicto foi cometido com surpresa, lançando-se o réo e
seu cumplice sobre Maria da Conceição, e ferindo-a o réo quando ella descuidosa
entrava no quarto, onde lhe dissera o mesmo réo estarem os presentes que elle
lhe promettêra;
Attendendo,
finalmente,
a
que
pelos
mesmos
depoimentos
e
interrogatorios, está plenamente provado que entre o réo e a assassinada tinha
deixado de existir a confiança mutua que naturalmente se presume entre dois
entes, que se amam ou prezam, manifestando ella, aliás, mêdo e receio de que
elle a quisesse ofender, em vingança de não lhe guardar fidelidade em suas
relações ilicitas e consequentemente que não podia o réo abusar de uma
confiança que já não existia;
Attendendo igualmente a que o convite feito a Guilhermino para dar uma
surra em Maria da Conceição, sem nunca lhe revelar o designio de matal-a, não
pode ser considerado ajuste para cometter este delicto, nos termos do art. 16, §
17:
63
Julgam o réo incurso no art. 193 do Codigo Criminal e o condenam na pena
de galés perpetuas, gráo maximo, por concorrerem as circunstâncias aggravantes
mencionadas no art. 16, §§ 42, 62, 82, 9a e 15, pena que será substituída pela
prisão perpetua com trabalho, nos termos do art. 45, § 2°, do mesmo Codigo, por
ser o réo maior de sessenta annos, e nas custas.
Rio de Janeiro, 13 de maio de 1874.”69
69
ELUF, Luiza Nagib. A paixão no banco dos réus: casos passionais célebres. São Paulo:
Saraiva, 2002, p. 12 e 13.
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Daiene da Silva Oliveira Freitas Figueiredo