A DEDUÇÃO NO CAMPO DO DIREITO
Leocádia Maria Melo de Oliveira Carvalho1 (CEUNSP)
RESUMO
O presente artigo2,
é uma síntese de uma
das Lições de Direito do memorável
André Franco Montoro, demonstrando como a
Lógica Jurídica em seus princípios e
regras auxiliam o jurista nas suas operações intelectuais de elaboração, interpretação e
aplicação do Direito.
Palavras-Chave: Lógica – Dedução no direito.
Introdução
"Eu sustento que a descoberta da
forma dos
silogismos é uma das mais belas conquistas
da mente humana. É
uma espécie
de
matemática universal, cuja importância não é
suficientemente conhecida" (LEIBNIZ)
Em sentido amplo, usamos indiferentemente as expressões "raciocínio",
"argumentação", "argumento", "inferência", para indicar um elemento lógico como o
seguinte: Todo eleitor é obrigado a votar. Fulano é eleitor. Logo, Fulano é obrigado a
votar.
Mas, em sentido estrito e, mais rigoroso, essas expressões têm significações
1
A autora é discente do 8º semestre do Curso de Direito da Faculdade de Direito de Salto do
Centro Universitário Nossa Senhora do Patrocínio, em 2007.
2 Dados preliminares de Lógica Jurídica -- Lições do Prof. André Franco Montoro PUC/SP –
Faculdade Paulista de Direito - Pós Graduação em Direito - 1998
distintas. A palavra "raciocínio" pode designar uma atividade da inteligência ou o produto
e resultado dessa atividade, ressalta Montoro.
Podemos dizer que o raciocínio é:
- uma operação mental
- pela qual, por via de conseqüência, passamos
- de algumas proposições, chamadas premissas
- para uma nova proposição, chamada conclusão.
A argumentação pode ser definida como:
- um conjunto de proposições
- em que uma chamada conclusão
- é inferida como conseqüência
- de outras chamadas premissas.
Características da dedução e da indução.
Para Franco Montoro, dedução é a argumentação que conclui por intermédio
de um elemento "total".
Em princípio, é a argumentação que vai do "total" para o "particular". Exemplo:
-Todo menor de 16 anos é incapaz.
-Fulano é menor de 16 anos.
-Logo, Fulano é incapaz.
A indução, pelo contrário, é o argumento que conclui por intermédio do
"particular". Exemplo: os seres vivos a,b,d, etc., são constituídos de células. Esses casos
são suficientemente representativos de todos os seres vivos. Logo, todo ser vivo é
constituído de células.
Montoro, citando SALMON compara: "os argumentos indutivos aumentam o
conteúdo das premissas, com sacrifício da necessidade, ao passo que os argumentos
dedutivos atingem a necessidade, sacrificando a ampliação do conteúdo "
Na dedução, tomamos certas proposições como premissas e delas tiramos
conclusões rigorosamente necessárias. Provada a verdade das premissas, segue-se
necessariamente a verdade da conclusão.
Importância da dedução no direito.
Nas lições do doutrinador André franco Montoro, a atividade normal do jurista,
seja ele advogado, promotor, juiz, consultor, administrador, o raciocínio dedutivo
desempenha
função
importante.
Muitos
autores
pretendem
mesmo
reduzir
essencialmente toda a atividade jurídica a raciocínios dedutivos: passar da norma geral
para casos particulares.
Silogismo no processo judiciário.
Ressalta o doutrinador que, por força da própria lei processual, em cada petição
inicial, denúncia, sentença ou recurso, está presente, como estrutura lógica fundamental,
um raciocínio dedutivo, chamado silogismo judiciário ou silogismo jurídico.
Exemplo:
Todo homicida deve ser punido com reclusão.
Ora, Fulano é homicida.
Logo, Fulano deve ser punido com reclusão.
No silogismo judiciário, a premissa maior é a lei ou a norma jurídica. A menor é o
fato, a que a norma deve se aplicar. A conclusão é a aplicação da sanção prevista na
norma.
Por isso, o trabalho do advogado consiste substancialmente em:
1. invocar a "norma aplicável", esclarecendo ou interpretando sua
significação e alcance (premissa maior);
2. demonstrar o "fato", através dos meios de provas idôneas, como
documentos, testemunhas, perícias, etc. (premissa menor);
3. formular o pedido ou conclusão em termos precisos.
É o próprio Código de Processo Civil que exige, sejam indicados expressamente
na petição inicial:
1. o fundamento jurídico do pedido;
2. o fato e os meios de prova com que o autor pretende demonstrar a
verdade do alegado;
3. o pedido.
O silogismo na sentença
Salienta Montoro que, o raciocínio semelhante preside à atividade específica do
juiz que é a sentença. A decisão judicial é estruturalmente, na sua formulação final, uma
argumentação dedutiva. O Código de Processo Civil, no tocante a sentença (art. 458)
determina que ela contenha:
l. os fundamentos de direito;
2. os fundamentos de fato;
3. a decisão.
Destaca também que, a dedução ocupa, tradicionalmente, lugar de destaque
entre os métodos do raciocínio jurídico e é considerada por muitos como o método por
excelência da argumentação jurídica. Os adeptos de uma concepção mais dogmática e
sistemática do direito sustentam que a função precípua do jurista é aplicar dedutivamente
a norma geral ao caso particular. Subsunção do fato à norma.
Críticas ao emprego da dedução no direito.
" A lógica dedutiva é imprópria para a solução
dos problemas jurídicos e humanos".
(RECASENS SICHES)
Importante ressaltar que, para Montoro , não há dúvida de que a argumentação
normalmente encontrada em petições, pareceres, sentenças, acórdãos, é, em última
análise, redutível a um silogismo em que a premissa maior é a norma, a menor é o fato e
a conclusão é a solução de direito para o caso.
Mas, será que essa dedução explica suficientemente todo o complexo raciocínio
desenvolvido pelos juristas, em suas petições, contestações, recursos, pareceres,
sentenças? O trabalho intelectual de demonstração ou fundamentação do juiz, do
advogado, do promotor, do estudioso do direito limita-se à aplicação dedutiva da norma
geral ao caso particular?
Alguns autores se revoltam contra o que poderia parecer uma aplicação mecânica
do direito reduzida a uma dedução meramente formal.
Assim, na "lógica do razoável", entende-se que a lógica dedutiva é imprópria para
a solução dos problemas jurídicos e humanos. A "lógica do razoável", que é a verdadeira
lógica do direito, realiza operações de valoração e adaptação à "realidade concreta".3 (
Em sentido semelhante,
a lógica da persuasão, reage contra a concepção
cartesiana e excessivamente formalista da lógica do direito. Há outras formas de
raciocínio que não constituem deduções silogísticas ou cálculos lógico-matemáticos. A
lógica do direito é a lógica do provável, da argumentação, em que são pesadas as
circunstâncias de fato e as razões das normas aplicáveis a casos concretos.4
Na mesma linha, podem ser indicados os estudos sobre a "inferência não formal",
de que é exemplo a "evidência circunstancial", fundada em uma série de fatos, ligados
uns aos outros, que nos conduzem a uma conclusão, sem lugar a qualquer dúvida
razoável. Esse seria o raciocínio característico do direito.
Existem ainda, os que se opõem ao raciocínio meramente dedutivo as
considerações sobre a situação concreta ou de lugar ("tópos" = lugar).
Os "topoi", que
correspondem ao "lugar comum", constituem no campo do direito os "Tópicos jurídicos".
Como argumento e lugar comum no trabalho jurídico, tem-se catalogado 64 "tópicos
jurídicos" ou "lugares comuns"5.
Eis alguns, a título de exemplo: 1. A lei posterior derroga a lei anterior. 2. Uma lei
especial derroga a lei geral 3. A coisa julgada deve ser reconhecida como verdadeira. 4.
É preciso ouvir a parte contraria. 5. Ninguém pode transferir mais direitos do que possui.
6. Cada um é presumido bom (ou inocente). 7. As exceções são de interpretação restrita.
8. ninguém pode ser juiz e parte. 9. Na dúvida, a divisão deve ser feita em partes iguais.
10. Quem cometeu uma falta, deve suportar as conseqüências. 11. ninguém é obrigado a
fazer o impossível. 12.
O arbitrário não é admitido (esta regra limita o poder
discricionário, que não pode ser exercido de forma desarrazoável).
Proposta de Solução
Montoro afirma que, diante de dois estilos de pensar ou duas metodologias: 1.
De um lado, o pensamento sistemático dedutivo, de caráter mais abstrato, formalista e
dogmático. 2. De outro, o pensamento problemático, voltado para o problema concreto,
investigando as razões e circunstâncias que poderão conduzir a uma solução razoável e
justa. O recurso a metodologias voltadas para os "problemas concretos", como a tópica
3
RECÀSENS SICHES “ Experiência jurídica, naturaleza de cosa y lógica razonable").
CHAIM, PERELMAN et OBRECHTS-TYTECA "Nouvelle Rhetorique", Paris, l958, 2 volumes.
5 GERHARD S. TRUCK, em seu estudo, "Tópicos de direito (Topische jurisprudenz).
4
ou lógica do razoável, não é oposta à idéia de um "sistema" de direito, mas, sim, oposta à
aplicação rígida e automática das regras do direito.
O jurista, o juiz, o advogado, o promotor utilizam, como vimos, o raciocínio
dedutivo ou silogismo em sua atuação. Mas essa geralmente é apenas a parte final de
um processo de estudo e investigação mais complexo. A própria escolha das premissas
do raciocínio dedutivo implica em valoração e outras considerações relativas às
circunstâncias concretas de cada caso.
O raciocínio jurídico, pode servir-se também das chamadas regras paralógicas,
que são: regras paralelas às regras lógicas, como as regras tópicas e as de retórica, o
recurso ao argumento de autoridade, etc. Pode se servir ainda de regras extralógicas,
trazidas de outros campos, como por exemplo, da moral e da religião, da política ou do
direito (regras de interpretação, presunções legais, etc.)
Concluindo, André Franco Montoro salienta que no mesmo sentido é a
observação de MIGUEL REALE: " A ciência do Direito, especialmente no Brasil, ainda
está muito imbuída da "racionalidade abstrata", no sentido de que a experiência jurídica
possa toda ela ser reduzida a uma sucessão de silogismos ou de atos atribuíveis a uma
entidade abstrata, ao "homo juridicus". A técnica jurídica, operando com menos dados
lógico-formais, vai, aos poucos firmando a convicção de que o juiz deve ser a encarnação
desse mundo abstrato de normas, prolatando sentenças como puros atos de razão.
Na realidade, sabemos que o juiz, antes de ser juiz, é homem partícipe de todas
as reservas afetivas, das inclinações e das tendências do meio, e que nós não podemos
prescindir do exame dessa circunstância, numa visão concreta da experiência jurídica,
por maior que deva ser necessariamente a nossa aspiração de certeza e objetividade.
Sentenciar não é apenas um ato racional, porque envolve, antes de mais nada,
uma atitude de estimativa do juiz diante da prova. O bom advogado sabe perfeitamente
da importância dos elementos emocionais na condução e na apreciação dos elementos
probatórios. Tais fatores de convicção adquirem importância muito grande em certos
setores do Direito, como, por exemplo, no júri popular. A convicção do jurado não é
resultante de frias conjeturas racionais, pois vem carregada sempre de cargas emotivas.
Estamos vendo, portanto, que a tendência muito nossa de simplificar e
empobrecer a vida jurídica, para torná-la uma fria sucessão de silogismos, esbarra diante
de fatos e atos que são de uma evidência irrecusável. Todos utilizamos tais ferramentas
da lógica no trato diário com os problemas de direito. Juizes ou homens mesmo
inconscientemente faz deduções, induções, raciocinamos, elaboramos proposições as
mais diversas.
O jurista – seja ele juiz, promotor, advogado, consultor, legislador ou estudioso do
direito – usa habitualmente a Lógica, a dedução em suas sentenças, petições, recursos,
pareceres, justificações ou estudos, se bem que nem sempre o faça de forma
plenamente consciente.
A Lógica jurídica não se contentaria em apenas ser um transplante da regras de
lógica formal para o Direito. Não. Assume contornos que superam a lógica da
demonstração formal, alcançando a lógica da argumentação que utiliza os instrumentos
da dialética para convencer o juiz da pertinência de nossas teses. A lógica jurídica cuida
de estudar os raciocínios próprios ao mundo do direito.
Referencias Bibliográficas:
http://www.lafayette.pro.br/ apostilas acesso em 25/8/2007.
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