PETROLINA O CENTRO DA
‫סּ‬SA
R
Francisco José Pereira Cavalcante
Petrolina 2013
Diocese de Petrolina
D. MANOEL DOS REIS DE FARIAS (Bispo)
Prefeitura Municipal de Petrolina
JULIO EMÍLIO LÓSSIO DE MACEDO (Prefeito)
REVISÃO DE TEXTO
D. Paulo Cardoso da Silva
Pe. Francisco Ferreira L. Filho
CAPA, ILUSTRAÇÕES
Pe. Francisco José P. Cavalcante
FRANCISCO JOSÉ P. CAVALCANTE
PETROLINA
O CENTRO DA ROSA
Petrolina, 2013
3
Introdução
A Jornada Mundial da Juventude, no Rio de
Janeiro, provocou a realização de vários outros
eventos, no Brasil. Um deles é a pré-jornada, isto é,
um encontro com jovens provenientes de outros
países em algumas dioceses do Brasil. Entre elas
está Petrolina, que preparou uma série de eventos. A
diocese tem como atual bispo D. Manoel dos Reis de
Farias.
Consciente da importância do acontecimento
para construção de uma imagem internacionalmente
sempre mais positiva e objetivando dar continuidade
ao reforço de bases para o turismo local, associou-se
ao evento – na qualidade de parceira – a Prefeitura
Municipal da cidade.
Da programação petrolinense, consta uma
mostra que tem como tema de base, justamente, a
cidade de Petrolina. Esta se encontra ao centro de
uma secular “encruzilhada de grandes caminhos”
e era no século XIX a “passagem do Rio São
Francisco [a] mais freqüentada de todo o sertão da
Bahia”.1 Dela, realmente, partia a famosa “Travessia
Nova” que ligava a Bahia e o Pernambuco ao Piauí e
ao Maranhão. Um pouco mais tarde dela também
partia o caminho para o Ceará.
A posição estratégica da povoação tornou
Petrolina: a sede da grande Barca que facilitava a
passagem de pessoas, animais e mercadorias pelo
rio São Francisco; o porto do “Registro”, isto é, de
uma espécie de posto fiscal com caráter Alfandegário
e de controle realizado em terras pernambucanas; 2
um simples, mas destacado centro geográfico, que
se originou a partir e na dependência da criação da
Missão de N. Senhora das Grotas em Juazeiro da
Bahia. É a este centro geográfico que chamamos de
o CENTRO DA ROSA.
Assim sendo o tema da exposição –
PETROLINA, O CENTRO DA ROSA – é emblemático e
visa animar a reflexão sobre a centralidade da cidade
em relação aos caminhos que nela ainda se
encontram e dela partem. Tal centralidade confere à
1
SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Viagem pelo Brasil. Trad. Lúcia
Furquim Lahmeyer promovida pelo Instituto Histórico e Geográfico brasileiro. Rio
de Janeiro: ImprensaNacional, 1938. p. 11, v. 2. Original alemão. p.407s.
2
SCWARZMANN, Joseph. GeographischeKarte der Provinz von São José
do Piauhý: Carte Geographique de Piauhý. Provence de l’Empire du
Bresil. Redigido a partir de mapas manuscritos por José Pedro César de
Menezes e Matias José da Silva Pereira, pelo Sr. José Schwarzman
primeiro lugar tenente da Infantaria da Armada Bávara. Munique, 1928.
O mapa encontra-se em SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Atlas
deViagem pelo Brasil dos Drs. V. Spix e V. Martius. Rio de Janeiro, 1938.
v. 4. Original alemão; também na http://acervo.bndigital.bn.br . Acessado
em 2013.
5
cidade o significado de ponto de partida e de “portal”
para diferentes lugares e, ao mesmo tempo, de ponto
de orientação geográfica.
A
mostra
exibe
alguns
documentos
desconhecidos para uma grande maioria que
permitem vislumbrar a relativa vitalidade de Petrolina
nos tempos em que se chamava Passagem do
Juazeiro. Realmente, apesar de pequenina em
relação a Juazeiro da Bahia, a povoação era nos
séculos XVIII e início do XIX um espaço social onde
aconteciam ações de tipo econômico, político, judicial
e religioso.
Os documentos mostrados nos foram legados
por gente de diversas partes do Brasil e da Europa
que, de algum modo, ao passar por Petrolina,
registrou algum momento da vida da região. Assim
fazendo, eles colaboraram com a edificação da
memória histórica da cidade que, uma vez acessada,
permite ao homem hodierno vislumbrar – refletindo –
instantes da gênese de Petrolina como centro
geográfico, qual “CENTRO DA ROSA DOS VENTOS”.
Para apresentar os documentos utilizamos o
método de inseri-los em ilustrações de nossa autoria,
estruturadas com elementos anteriormente criados
por nós, mas tendo como base documentos
relacionados a visitantes, a maioria deles
contemplados pela mostra. Ao assim fazer pensamos
em tornar a apresentação mais atraente e situar os
documentos num contexto de elementos de autoria,
de história e de representações estéticas. Estas
funcionam como símbolos que, no conjunto, fazem
pensar Petrolina como “CENTRO DA ROSA DOS
VENTOS”.
Monumento moderno aludindo a Petrolina como centro,
encruzilhada de caminhos.
(Foto: Pe. Francisco José - 2013)
7
1. Petrolina e a “Rosa dos Ventos”
Um dos instrumentos que o homem inventou
para se situar em relação ao espaço onde se
encontra foi a bússola. Antes desta, havia a Rosa
dos Ventos. Ambas, no momento em que são
consultadas, colocam de algum modo a pessoa no
“centro do mundo”. Isto porque, para aquele que
procura orientação, no momento em que consulta um
dos mencionados instrumentos, o lugar onde está
passa a funcionar como o “umbigo do mundo”,
representado pelo centro da rosa, da estrela, da
bússola.
Por exemplo, o petrolinense – ou visitante –
torna-se “centro da bússola” quando a consulta ali na
cidade mesma. Mas também quando toma
consciência que está numa encruzilhada de
caminhos que, desde o passado, provoca a
passagem de pessoas por este lugar que começou
os seus dias com o nome de “Passagem do
Juazeiro”. Esta denominação foi aplicada ao lugar
porque ele era o porto onde estava instalada uma
barca que permitia a travessia de pessoas, animais
e bens, conforme já vimos.
No porto havia, a partir de certo momento, uma
espécie de alfândega que controlava o fluxo de
passageiros, mercadorias e, principalmente de gado.
Indo ou provindo da Bahia, do Maranhão, Piauí ou
Ceará, o passante por Petrolina devia – ou deve –
tomar consciência do rumo geográfico que quer
tomar e acessar uma das vias (terrestres, fluviais e
hoje aérea) para o destino escolhido. Isto torna
Petrolina um ponto central de escolha e de
orientação geográfica.
Se historicamente Juazeiro da Bahia funcionou
como o centro do Sertão, como uma espécie de
“oásis de civilização”, mas o centro exato da
encruzilhada de caminhos é a localidade
pernambucana. De fato, “Passagem” está ao centro
de um sistema de estradas que dá acesso à Bahia
(Sul) por meio de Juazeiro; ao Piauí e Maranhão pelo
Noroeste; ao Recife pelo Leste; ao Ceará pelo norte.
Foi a partir da consciência desta privilegiada
posição que, nos anos sessenta, criou-se um
monumento simbolizando a “confluência de
caminhos”. O monumento foi erguido na estrada que
conduz para Recife e Ceará, e de certa forma para o
Piauí e Maranhão. Mais ou menos no mesmo
período de tempo e a partir desta mesma
consciência,
cunhou-se
o
lema
“Petrolina,
encruzilhada para o progresso”.
9
2. Passantes ilustres
Ao falarmos das raízes históricas de Petrolina
como confluência de portas de acessos, sentimos a
necessidade de recuperar o nome de algumas dos
milhares de pessoas que de algum modo passam por
Petrolina. Entre tantas escolhemos os seguintes:
2.1 Pedro Marinho da Gama (séc. XVIII). Foi escrivão
de documento judiciário em 09.07.1743. Ele concluiu o
registro de uma sentença atuada em “Passagem do Juazeiro”
com o Termo de Publicação onde escreveu: “Juiz ordinário do
Cabrobó. Ano de 1743. Auto de Justificação. Justificante João
Ferreira Maciel. No ano do nascimento de Nosso Senhor
Jesus Cristo de mil setecentos e quarenta e três anos, aos
nove dias do mês de julho do dito ano, nesta Passagem do
Juazeiro, Distrito da povoação de Nossa Senhora da
Conceição dos Rodelas, Comarca de Pernambuco e sendo ali
por João Ferreira Maciel me foi dado essa sua Petição com o
despacho do Juiz ordinário, o Alferes João Pinto Leal para o
feito de Justificar o nela contido pedindo-me e requerendo-me
que a autuasse a qual dita Petição tomei autuei e tudo o que
adiante se segue de que fiz este autuamento. Eu Pedro
Marinho da Gama escrevi. (assinatura)”.3 O documento
permite compreender a situação judiciária, política, religiosa e
geográfica da Passagem do Juazeiro no Estado de
Pernambuco, cerca de trinta e sete anos após a fundação da
4
Missão de N. Senhora das Grotas em Juazeiro da Bahia.
3
4
Documento do acervo do INSTITUTO ARQUEOLÓGICO E GEOGRÁFICO
DE PERNAMBUCO. Livro de casamentos da Freguesia de Floresta.
José Gonçalves da Fonseca deve ser o mesmo cartógrafo que foi
secretario do Governo de Pernambuco em 1763 (MELLO, José Antônio
Gonaçalves de. Pesquisas Históricas de Portugal._______Diário de
Pernambuco. Recife, 28 de set 1952. http://fgf.org.br.) e do Estado do
Maranhão e do Grão Pará. Escreveu um famoso diário de viagem e
desenhou, com ajuda de exploradores e missionários, várias cartas
geográficas. Conferir sobre ele em ALMEIDA, André Ferrand de. A
viagem de José Gonçalves da Fonsecae a cartografia do rio Madeira
(1749-1752). Anais do Museu Paulista. São Paulo. N. Ser. V17.n2,
p.235-215. PDF. www.scielo.br. Acessado em maio de 2013.
11
2.2 José Gonçalves da Fonseca (séc. XVIII) –
cartógrafo famoso, desenhou uma “Carta Topográfica aonde
se compreendem as Capitanias de que se compõem ao
presente o Governo de Pernambuco” 5 em Recife, aos
5
Carta Topográfica aonde se compreendem as Capitanias de que se
mo
compoem ao presente o Governo de Pernambuco; oferecida ao Il. .
mo
r
co
a
e
e Ex.
S Fran
X. deM.ç
Furtado, do conselho de S. Mag.
31.03.1766. Neste mapa aparecem diversas localidades
ribeirinhas ao São Francisco, inclusive a “Passage’ do
Joazeiro”. Se José G. da Fonseca não esteve no Registro de
Juazeiro, mas desenhou um mapa com base em detalhes
fornecidos por viajantes ou missionários, portanto gente que
havia estado em Passagem, região do S. Francisco. A carta
geográfica ajuda a compreender a configuração geográfica do
sertão do São Francisco na segunda metade do século XVIII.
2.3 Johann Baptist von Spix (1781-1826) e Karl
Friedrich Philipp von Martius (1794-1868) – famosos
estudiosos alemães chegaram à Passagem do Juazeiro
(Petrolina) pelo seu lado Sul, isto é vindo da povoação do
Juazeiro da Bahia aonde chegaram por via terrestre. Em
21.04.1809 eles atravessaram o rio em balsa, movida a cabos,
e pisaram o solo petrolinense. A eles a cidade e a região
devem uma detalhada descrição da “passagem do Rio São
Francisco [a] mais freqüentada de todo o sertão da Bahia e
mais importante do que as outras que ficam junto das vilas de
Pilão Arcado, da Barra do Rio Grande e de Urubu”.6 Além de
descrever a passagem e de fornecer dados essenciais para se
entender o lugar, os dois estudiosos providenciaram um
desenho de Juazeiro da Bahia, intitulado “Joazeiro no Rio São
Francisco”.7 O desenho foi reproduzido no Atlas que
6
Fidelíssimo, Ministro, e secretário de Estado da Marinha, e Conquistas.
Por José Gonçalves da Fonseca. Recife, Pernambuco 31 março de.
1766. Aquarelado0,955 X 0,613. G.E.H.F.O.M 4586.
SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Viagem pelo Brasil. Trad. Lúcia
Furquim Lahmeyer promovida pelo Instituto Histórico e Geográfico brasileiro. Rio
de Janeiro: ImprensaNacional, 1938. p. 11, v. 2. Original alemão. p.407s.
7
SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Joazeiro no rio São Francisco. In
Atlas de Viagem pelo Brasil dos Drs. V. Spix e V. Martius. Rio de Janeiro,
1938. v. 4. Original alemão.
13
publicaram e recebeu comentário dos autores no segundo
tomo da obra, esclarecendo ter o desenho sido realizado na
“margem fronteira do rio, na província de Pernambuco
[portanto de Registro do Joazeiro, ou Passagem do Juazeiro,
Petrolina], donde se viam “ao fundo, as serras da Batateira e
do Salitre”.8 Além disso, prepararam a publicação de um mapa
“Da Província de São José do Piauhy”, representando o Piauí
e parte da área pernambucana servida pelo rio São Francisco,
onde estavam as “travessias” ou caminhos que cortavam as
caatingas levando os viajantes para o interior do Piauí. As
principais travessias para esse Estado e para o Maranhão
eram, na época da visita, a “Travessia Velha” e a “Travessia
Nova”. Esta última era a que partia de Petrolina. O termo
“travessia” faz pensar nos sertões como um espaço estranho
que pode ser atravessado e por raros “oásis” de civilização.
Petrolina está assinalada no mapa com o termo “Registro”,
termo que faz referencia ao caráter de controle de tipo
alfandegário realizado no porto pernambucano.9 Spix e
Martius deixaram Petrolina rumando para o Piauí, em lombo
de animais e utilizando um braço da Travessia Nova.
2.4 Frei João de São José Copertino (séc. XVIII).
10
Era missionário no aldeamento indígena de N. Senhora das
Grotas que havia e marcou a origem de Juazeiro da Bahia e
de Petrolina. O religioso como também os seus confrades –
8
SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Op. cit., p.11.
SCWARZMANN, Joseph. GeographischeKarte der Provinz von São
José do Piauhý: Carte Geographique de Piauhý. Provence de l’Empire
du Bresil. Redigido a partir de mapas manuscritos por José Pedro César
de Menezes e Matias José da Silva Pereira, pelo Sr. José Schwarzman
primeiro lugar tenente da Infantaria da Armada Bávara. Munique, 1928.
O mapa encontra-se em SPIX, J.B. von; MARTIUS, C.F.P von. Atlas
deViagem pelo Brasil dos Drs. V. Spix e V. Martius. Rio de Janeiro, 1938.
v. 4. Original alemão; também na http://acervo.bndigital.bn.br . Acessado
em 2013.
10
AQUINO, Raul. Ouricuri – tempo do Comendador Francisco Pedro.
Prefácio de Antônio C. de Medeiros. Recife: FIAM, CEHMF – Centro de
Estudos de História Municipal. 1998, p.50. (Coleção Tempo Municipal,
19).
9
15
antes e depois dele – podem ter celebrado missas, batizados,
assistido a casamentos e dado a extrema unção a muitos
moradores da Passagem do Juazeiro. Por exemplo, em “mil
oitocentos e dez, na Passagem
do Juazeiro [...] ele
atravessou o rio vindo da missão do Juazeiro, Bahia, para
assistir um casamento em Passagem do Juazeiro.11
2.5 Padre Manoel Antônio de Souza (séc. XVIII e
XIX) - Era Vigário Coadjutor na Freguesia de Nossa Senhora
da Conceição de Cabrobó, situada ao Nordeste de Petrolina,
de onde veio para a “fazenda do Massangano em desobriga”
– então território da Freguesia. – a fim de realizar desobriga,
isto é, celebrar missa, batizar e assistir casamentos. Um casal
de nubentes foi Paulo Batista (ex-escravo) e Ana Joaquina.
Um outro foi Valério Coelho Ferreira e Vitória Maria, filha
legítima de Miguel de Carvalho e Ana de (?). Os matrimônios
foram assistidos às onze horas da manhã do dia 07.06.1815.
12
De acordo com o mapa do Atlas de Halfeld, a fazenda se
situava a oeste da povoação em frente às pedras ditas “Do
Maurício”, que ficavam no interior do rio e antes da Ilha do
13
Rodeador.
11
“Aos 6 do mês de setembro de mi oitocentos e dez, na Passagem do
Juazeiro de minha licença, assistiu o casamento o Rver.do Fr. João de
S. José Copertino, depois de conferidos [...] sacramental e presentes as
Testemunhas, Manoel Luis Pires e Maria, digo, Francisca [...] José [...],
ambos desta Freguesia [de Cabrobó]. Elle filho de Manoel José Duarte e
to.
Tereza Maria de Jesus, já falecidos, e ela foi legítima de An. Barboza
to.
da Cunha com Maria An. da Conceição e logo dei as bensoens
nupciaes conforme o Ritual Romano. Lavrei para constar este assento e
me assinei.” RECIFE. INSTITUTO ARQUEOLÓGICO E GEOGRÁFICO
DE PERNAMBUCO. Livro de casamentos da Freguesia de Cabrobó.
12
RECIFE. INSTITUTO ARQUEOLÓGICO E GEOGRÁFICO DE
PERNAMBUCO. Livro de casamentos da Freguesia de Cabrobo.
13
HALFELD, Henrique Guilherme Fernando. Mapa N° 20. _______ In: Atlas e
relatório concernente a exploração do rio de S. Francisco”: desde a cachoeira da
Pirapora até o Oceano Atlântico. 2.ed. São Paulo: Empresa das Artes, 1994.
(reprodução fac-símile acrescida de textos).
17
2.6 Henrique Guilherme Fernando Halfeld (17971873) Engenheiro alemão radicado no Brasil em 1853.14 Ele
visitou a Passagem do Juazeiro provindo da Vila do Juazeiro,
aonde havia chegado passando por Pirapora e em barca
especial. Na região da Ilha do Fogo, ele viu as povoações do
Massangano, Fazenda Novo e a “Passagem do Joazeiro”
(Petrolina). Nesta havia uma capela e 48 casas edificadas
sobre rochedos graníticos-gneiss, e mais adiante uns
quartéis.15 “[...] Entre o porto desta villa [Juazeiro] e o porto da
Passagem do Joazeiro, fronteiro a este, na província de
Pernambuco, está estabelecida uma barca grande de véla,
que dá cada vez passagem de 50 a 60 animaes, cujo
rendimento pertence à câmara municipal da Villa de Boa
Vistada Província de Pernambuco: cada pessoa paga 80 rs.
de passagem, por cada animal cavallar ou muar 360 rs.,
sendo manso, e 220 rs, sendo bravo, poldros 100 e 140 rs,
cada cabeça de gado vacuum, carga de animal 40 rs.; porém
os tropeiros ou proprietários da carga nada pagão de
passagem. Pelas informações obtidas, passarão em um anno
7.500 a 8.000 pessoas, 10.500 cabeças de gado vacuum, e
1.300 animais cavalares e muares, sendo onduzido o maior
numero dos primeiros para a Bahia. “ [...] “a Vila de Juazerio
tem a vantagem de estar situada na linha de uma das
estradas as mais comerciais entre a Bahia e as Províncias do
Norte, e particularmente a cidade de Oeiras, que dista daqui
14
A data nós a colhemos da: Planta da Cachoeira do Sobradinho. Prancha N°31.
In HALFELD, Henrique Guilherme Fernando. Atlas e relatório concernente a
exploração do rio de S. Francisco”: desde a cachoeira da Pirapora até o Oceano
Atlântico. 2.ed. São Paulo: Empresa das Artes, 1994. (reprodução fac-símile
acrescida de textos).
15
HALFELD, Henrique Guilherme Fernando. Relatório Concernente a Exploração
do Rio de S. Francisco: desde a cachoeira da Pirapora até o Oceano Atlântico.
In: Atlas e Relatório Concernente a Exploração do rio de S. Francisco”: desde a
cachoeira da Pirapora até o Oceano Atlântico. 2.ed. São Paulo: Empresa das
Artes, 1994. p. 34. (reprodução fac-símile acrescida de textos).
19
80 léguase, e com a qual a vila de Juazeiro entretem um vivo
comércio. Os habitantes desta vila e do seu município
fabricam sal das terras salíferas, particularmente na beira do
16
riacho do Salitre”. Também deixou em seu Atlas um micro16
Ibid.
esboço de mapa de Petrolina e de Juazeiro, que pelo
tamanho, poderia ser apenas uma representação sem relação
com a realidade, mas que, se comparados com outros mapas,
mostram que houve o esforço de realmente representar a
configuração das ruas e de certas construções. Foi o que
concluímos comparando os mapas de Petrolina e Juazeiro
produzidos por Halfeld e um mapa das duas cidades e
17
posterior ao de Hlafeld, mas também do século XIX.
2.7 Padre Manoel Joaquim da Silva (Vigário entre
07.06.1862 - †1886) – Segundo a tradição, era Português
de Portugal. Era Vigário de Santa Maria da Boa Vista em 1844
e o primeiro vigário da Freguesia de Santa Maria Rainha dos
Anjos de Petrolina sancionada em 07.06.1962. A paróquia foi
criada em acordo com a população dos habitantes da
povoação e mediante pedido escrito do mesmo Pe. Manoel
18
Joaquim. Este foi Vigário Colado da Paróquia até falecer em
dezembro de 1883.19 Está sepultado na Igreja matriz da
cidade. Encontramos um registro de casamentos realizado por
17
Ibid.
18
“Aos 6 do mês de setembro de mi oitocentos e dez, na Passagem do
Juazeiro de minha licença, assistiu o casamento o Rev. do Fr. João de S.
José Copertino, depois de conferidos [...] sacramental e presentes as
Testemunhas, Manoel Luis Pires e Maria, digo, Francisca [...] José [...],
ambos desta Freguesia [de Cabrobó]. Elle filho de Manoel José Duarte e
to.
Tereza Maria de Jesus, já falecidos, e ela foi legítima de An. Barboza
to.
da Cunha com Maria An. da Conceição e logo dei as bensoens
nupciaes conforme o Ritual Romano. Lavrei para constar este assento e
me assinei.” RECIFE. INSTITUTO ARQUEOLÓGICO E GEOGRÁFICO
DE PERNAMBUCO. Livro de casamentos da Freguesia de Cabrobó.
19
O paroquiato do Pe. Manoel Joaquim da Silva terminou em dezembro
de 1883 quando faleceu. (PETROLINA. Arquivo da Diocese de Petrolina.
Tombo da Paroquia Santa Maria Rainha dos Anjos de Petrolina – 19001911.p.1)
21
ele: “De minha licença o Revdo. Manoel Joaquim da Silva
Vigr.º. da Freguesia do S.B.Jesus da
Cachoeira abençoou o Matrimonio de meo Parochiano André
Nunes de Barros , com D. Mª. Carlota Nunes de Souza no dia
11 de Maio de 1869 [...].”20
20
O outro casamento foi o de Manoel Francisco de Souza com D. Coleta
Nunes de Souza. (Cf. PETROLINA. Arquivo diocesano. Livro de
casamentos de Santa Maria da Boa Vista: 1886-1899. p. 51)
2.8 Frei Henrique de Castel São Pedro (séc. XIX) –
Mencionado pela tradição como “frei Henrique”, este religioso
realizou missões em Boa Vista e Petrolina a pedido do Vigário
Joaquim Manoel da Silva. Durante a visita missionária à
Passagem do Juazeiro, ele fundou uma capela no lugar, sob a
invocação da Senhora Rainha dos Anjos.21 Vários indícios nos
fazem pensar que a imagem foi transferida de Santa Maria da
Boa Vista, durante a missão que julgamos ter acontecido no
mês de maio de 1849. Não possuímos documentos sobre a
visita do frade a Petrolina, mas em 1849 ele esteve em
Floresta e realizou um casamento. 22 De Petrolina ele se
dirigiu para Minas Gerais.23
2.9 Richard Francis Burton (1821-1890) – Esteve em
Juazeiro da Bahia por volta de 24 de outubro 1876. Na
ocasião descreveu a povoação – futura Petrolina – como
sendo “o porto de Passagem do Juazeiro, ultimamente
chamada de Petrolina. Consistia numa capelinha, de Nossa
Senhora de Tal, e meia dúzia de casas, com teto de telha, de
frente para o rio, e tendo por trás umas poucas cabanas,
21
COSTA, Francisco Augusto Pereira da. Anais Pernambucanos 17011739. Edição fac-similar. Prefácio, aditamentos e correções de José
Antônio Gonçalves de Mello. 2° edição. Recife: FUNDARPE; Diretoria
dos Assuntos Culturais; 1983. v. 5, p. 416. (Coleção Pernambucana, 2°
fase).
22
INSTITUTO ARQUEOLÓGICO E GEOGRÁFICO DE PERNAMBUCO.
Livro de casamentos da Freguesia de Floresta.
23
REGNI, Pietro Vittorino, Os Capuchinhos das Marcas. Vol3. Salvador:
1991, p. 168. (Os capuchinhos na Bahia, 3)
23
numa ondulação de terreno mais alto e saudável do que a
margem direita.”24 Além disso, descreveu o movimento da
24
o
BURTON, Richard. Viagens aos planaltos do Brasil: o rio São Francisco. 2 .ed.
São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1983. v.3. p. 189. (Brasiliana, 376)
barca que realizava a passagem de pessoas, animais e bens
materiais: “As duas povoações são ligadas por um barco de
transporte que aproveita o ‘vent traversier’ e conduz de vinte
e cinco a trinta cabeças de gado. Cada passageiro paga, por
viagem, $0,80, cavalo ou burro $400 (a carga e o tropeiro não
pagam) e gado vacuum $300. a situação mudou pouco após
25
1863 quando Halfeld calculou o movimento em 7.500 a 8.000
almas, 10.000 reses e 1.300 burros e cavalos, bravos e
mansos, velhos e novos, destinados ao mercado baiano”.25
3. Breve Histórico da “Passagem
do Juazeiro”
A “Passagem do Juazeiro”, Registro do
Juazeiro ou Petrolina nasceu sob o signo do encontro
de caminhos surgido a partir da instalação da missão
portuguesa, com indígenas, da Senhora das Grotas
ao lado, no lado direito e baiano, do rio. A presença
da missão a partir de 1706 favoreceu a passagens de
pessoas pelo Juazeiro, provavelmente gerando a
“Travessia Nova”, uma importante rota comercial
cortando a caatinga.
O título Nossa Senhora das Grotas relaciona-se
a Mãe de Jesus qual protetora dos animais e dos que
deles cuidam. Este aspecto do título da padroeira de
Juazeiro somente aparece se reconhecemos que a
imagem que representa a Senhora das Grotas em
Juazeiro da Bahia é do mesmo tipo que, em Portugal,
e em outras partes do Brasil é identificada como
“Nossa Senhora das Brotas”. A missão que estava
25
Ibid.p.191.
em ponto estratégico no rio dos currais, diante da
qual desfilaram milhares de vaqueiros tocando o
gado para os grandes centros, não poderia não ter
uma padroeira que lembrasse a “Mãe do Bom
Pastor” como pastora de ovelhas espirituais que
cuidavam de gado.
Podemos pensar que antes da civilização
chegar, havia, num lado e no outro do rio, um
verdadeiro muro de plantas aquáticas do tipo que
ainda muito se encontra em áreas do rio. Após a
criação da missão, aproveitando caminhos indígenas
ou não, as pessoas descobrem a facilidade de
trânsito entre o Piauí e a Bahia através da missão.
Perto desta, o viajante possui um oásis de civilização
que permite: recarga segura de suprimentos;
encontrar remédio para si e para os animais;
indígenas hábeis na tarefa de atravessar animais a
nado; barcos suficientes para atravessar bens e
pessoas; atendimento religioso sob a proteção da
padroeira dos animais, vaqueiros e viajantes – Nossa
Senhora das Grotas.
Estas e outras facilidades geraram aos poucos,
do lado pernambucano do rio, a “Travessia Nova” e
outros caminhos. A Travessia começava de fato no
lado esquerdo do rio, pois quem vinha da Bahia
chegava a Juazeiro e dali empreendia ainda uma
pequena viagem fluvial, o que era feito atravessando
o rio de um lado para o outro. Ao pisar em Passagem
(Petrolina) o visitante se postava no ponto de partida
27
da Travessia Nova que conduzia, via terrestre, para
Piauí, Maranhão, Ceará ou outras localidades
pernambucanas. Para outras localidades, aquelas
situadas a jusante ou a montante, o caminho era
fluvial.
Aos poucos, o número de passantes que
desciam ou partiam do Registro exigia ajuda de
vaqueiros, de pessoas para transportar a bagagem
dos barcos e colocar sobre os animais, para passar
os próprios animais, para servirem de guias...
Podemos imaginar que aos poucos as pessoas,
necessitadas de trabalho, foram se aglomerando no
lugar em cabanas até que, aproximadamente vinte
anos depois, alguém construiu uma barca grande e
começou a explorar comercialmente a travessia. Em
1730, portanto, há cerca de vinte e quatro anos após
a instalação da Missão, o governo imperial se deu
conta do grande movimento pela “Passagem” e
decidiu taxar a barca, controlar a entrada de
mercadorias e, com o tempo, colocar um posto
alfandegário – um “Registro”.
Em junho de 1740, “Passagem” era atendida
oficialmente e de forma esporádica pelo Vigário da
Freguesia de Nossa Senhora da Conceição de
Cabrobó. Em julho de 1743, a “Passagem do
Juazeiro” pertencia ao Distrito de Nossa Senhora da
Conceição dos Rodelas e Comarca de Pernambuco,
cuja sede era Cabrobó.
As datas nos ajudam a compreender que a
origem histórica da cidade deita raízes entre o final
da primeira e início da segunda década de século
XVIII. Na primeira (1706) foi criado o aldeamento
missionário da Senhora das Grotas, e na segunda
(1730), já havia a barca. 26
Outras datas importantes na gênese da cidade
são: a criação da Freguesia de Santa Maria Rainha
dos Anjos (07.06.1862) separando-se da Freguesia
de Santa Maria da Boa Vista, naquele ano ainda
sede da paróquia; a elevação da povoação ao status
de Vila (18.05.1870); a promoção da vila ao nível de
cidade (28.07.1895).27
4. A Estrela da Terra e a do Céu
Acima falamos sobre a criação de um
monumento alusivo à cidade como sendo uma
encruzilhada de caminhos. Mas a idéia de dotar
Petrolina com um monumento indicativo da sua
vocação, isto é, de ser um ponto axial de caminhos,
não é nova. Na verdade, já havia sido praticada no
passado, desde o momento em que se escolheu
26
WILLEKE, Venâncio. Missões franciscanas no Brasil Missões da
província de Santo Antônio. 2ed., Petrópolis, Vozes 1978.p. 85 e 86.
27
Cf. PADILHA, Antônio de Santana. Petrolina no tempo, no espaço, na
vez. Recife: Centro de Estudos Municipais FIAM. 1982, p. 21-23.
(Biblioteca Pernambucana de História Municipal, 10)
29
como padroeira da cidade a “Santa Maria Rainha dos
Anjos”.
A escolha da padroeira aconteceu na segunda
metade dos anos sessenta do século XIX. Naquele
momento histórico, os moradores de “Passagem”
desejavam preparar a povoação para ser vila e, mais
tarde, cidade. Seguindo os trâmites praticados pelo
regime monárquico católico, decidiram criar a
freguesia de “Santa Maria Rainha dos Anjos”.
O documento de criação da nova freguesia foi
ao mesmo tempo “certidão de nascimento” do nome
do lugar, enquanto também mudava o nome de
“Passagem do Juazeiro” para “Petrolina”. O título da
padroeira foi escolhido com base num “ícone” que é
um monumento alusivo – ao mesmo tempo – à
encruzilhada geográfica de caminhos que é Petrolina
e ao ardor missionário dos primeiros religiosos
europeus que anunciaram a fé na região São
Franciscana.
De fato, o “ícone”, isto é, a imagem que representa a
Mãe de Jesus em Petrolina, tem um título muito caro
a São Francisco, o fundador do franciscanismo. A
esta corrente espiritual, pertenciam os franciscanos
(fundadores da Missão da Senhora das Grotas) e os
capuchinhos. Estes últimos foram os primeiros
catequistas da faixa de terras pernambucanas que
estão às margens do rio e se estendem desde
Cabrobó até Orocó. Na segunda metade do século
XVII, as ilhas de Aracapá, São Felix e Santa Maria
Representação de Santa Maria Rainha dos Anjos tendo ao fundo
antigo mapa da Europa. A composição permite perceber a relação
entre o recorte da imagem com o do continente europeu. A posição
da imagem em relação ao mapa permite pensar Maria como Rosa
dos Ventos, pois indica direções geográficas, os ventos que sopram
sobre a Europa, mas, sobretudo coloca Jesus como centro do Velho
Continente. A centralidade de Jesus é representada pela Cruz de
Jerusalém, isto é, uma cruz acompanhada de outras quatro. Todas
estão sugeridas no corpo da imagem a partir de quatro elementos
alegóricos e extremos, presentes no corpo da imagem. Cada um
deles alude a tipos de cruzes e de povos: Tau franciscano, Cruz de
Sto. Antão ou Ansada (copta) [sobre peito, broche); latina e grega
(ponta inferior, aos pés); florada (de S. Tiago, em Flor de Lis, à
direita) e Joanita ou de Malta [esquerda, oriente]. (Ilustração: Pe.
Francisco José)
31
eram palco da ação dos capuchinhos franceses e
depois dos italianos(séc. XVIII).
Além
das
referencias
simbólicas
à
espiritualidade franciscana o ícone de Santa Maria
Rainha dos Anjos é uma alegoria à geografia
europeia, o que o torna uma especial Rosa dos
Ventos. Isto porque a imagem situa concretamente o
homem, nos quatro pontos cardeais terrenos e nas
quatro virtudes cardeais, aquelas que – seguidas –
servem de caminho para a perfeição.
Considerando que os habitantes da Passagem
do Juazeiro tinham a consciência de habitarem no
ponto axial da encruzilhada de caminhos, podemos
entender a razão pela qual escolheram uma
padroeira cuja representação fosse justamente uma
alusão à Rosa dos Ventos, à Bússola.
Para entender a escolha, é preciso levar em
conta o significado e o alcance do padroeiro(a) numa
comunidade católica. O padroeiro não é a imagem,
mas o santo representado pela imagem. Ele não é o
dono de uma comunidade, mas faz as vezes de
“morador”, para o proprietário que é Jesus. O santo
padroeiro tem, portanto a função de zelar pela
pessoa, comunidade, ou instituição a ele dedicada. O
padroeiro faz isto, seja iluminando a comunidade
com seu exemplo de fé, seja com a oração
intercessora junto ao único Intercessor, junto ao Pai,
Jesus
A escolha de um padroeiro (a) está, em geral,
relacionada a uma devoção particular, portanto à
experiência da intercessão secundária e participada:
de uma pessoa santa pedindo a cura por outra (1Tm
2,1-5; Tg 5,16), de pessoas pedindo aos santos pela
própria cura (At 19,11), pedindo o fortalecimento no
Espírito (Ef 3,16ss), pelas autoridades, junto ao que
é o único mediador (1Tm 2,5) – Cristo Jesus (1Tm
2,1); de um justo falecido em favor dos vivos (2Mc
15,12-16; Ap 6,9). Esta compreensão da Igreja
funda-se na crença na ressurreição dos mortos, na
Comunhão dos Santos (Catecismo da Igreja Católica
946-962) e no fato de que a “Cabeça da Igreja”
(=Cristo Jesus [Ef 1,23; 1Cor 2,12]), está atenta aos
sentimentos dos seus membros, portanto das partes
que compõem o seu Corpo (Mt 10,42). De fato, a
relação entre corpo e cabeça é de unidade, o que
permite à cabeça sentir aquilo que comunica um
membro acerca de si mesmo ou sobre os outros
(1Tm 2, 1-6).
Em alguns casos, a escolha do padroeiro ligase um objetivo maior, não particular, mas social e de
forma mais racionalizada, intencional. Neste caso
entram os padroeiros das comunidades, ou
instituição, que desejam um padroeiro com um título
capaz de simbolizar os seus ideais, sua consciência,
sua vocação É o caso, por exemplo, do padroeiro da
internet, Santo Isidório de Sevilla, que no século VII
realizou um trabalho que se relaciona analogamente
33
a organização de dados, uma característica
fundamental da internet.
Pelos estudos que temos feito, a indicação da
padroeira de Petrolina seguiu os tramites da segunda
forma de eleger padroeiros. Isto quer dizer, foi
escolhida a dedo, com o escopo de representar uma
comunidade que se reconhece como epícentro de
uma encruzilhada de caminhos; que se entende
como espaço onde acontece a necessidade de
orientação geográfica, isto é, como Rosa dos Ventos;
que se sente, em última analise, fruto do trabalho de
missões religiosas européias.
A imagem ou – melhor – o “ícone” que
representa Santa Maria Rainha dos Anjos,
complementa o simbolismo iniciado pelo título,
enquanto foi esculpida de forma a fazer pensar em
Maria como a Stella Maris, a Rosa dos Ventos, como
indicadora de caminhos (Odigitria), Porta do Céu,
Guia para a Luz. Este pensar expresso por meio de
títulos está num famoso hino que os moradores de
Passagem do Juazeiro certamente cantavam. O título
do canto é Justamente Stella Maris (Estrela, Rosa,
Guia nos Mares). O primeiro registro do canto data
do século IX, na Europa, e saúda a Mãe de Jesus
com stas palavras:
“Ave, do mar Estrela,
bendita mãe de Deus,
fecunda e sempre Virgem,
portal feliz dos céus.
[..............................]
Oh! Daí-nos vida pura,
guiai-nos para a luz,
e um dia ao vosso lado,
possamos ver Jesus”.
O “ícone” da padroeira de Petrolina é como que
uma materialização das idéias ilustradas por esse e
por outros cantos marianos. É, assim, um tipo
especial de Odigitria, isto é, de representação de
Maria, Mãe de Deus, indicadora de caminhos – os
da terra e o do céu. Os da terra, porque o “ícone” faz
referências plásticas à geografia da Europa, aos
pontos cardeais e aos ventos que sopram no
ocidente do mediterrâneo; os do céu, porque a
mulher representada está a indicar Jesus sugerido
em forma de “Tau” (cruz) e de “Anjo” sobre o peito e
sobre o corpo.
Posto sobre o altar da Matriz, o “ícone” de
Santa Maria Rainha dos Anjos está realmente a
situar o fiel em relação aos pontos cardeais. Uma
análise de sua configuração plástica revela a
necessidade de que o “ícone” seja colocado sobre
um altar, tendo o norte às costas e o sul à frente; o
lado esquerdo voltado para o nascente (oriente onde
nasceu o Salvador, o “Caminho”) e o direito para o
poente. Esta configuração conferida à imagem
explica porque a igreja Matriz de Petrolina foi
construída com o altar-mor voltado para o norte.
35
Se a imagem aponta, aproximadamente, os
pontos cardeais da geografia petrolinense, mas o
objetivo era fazer – por um lado –com que eles se
tornassem motivo para pensar nas virtudes cardeais.
Estas são os quatro hábitos fundamentais, que
colaboram
para
a
uma
vida
santa
e,
conseqüentemente, para um agir reto e agradável a
Deus. Isto porque as virtudes cardeais – prudência,
justiça, temperança e fortaleza – colaboram com o
aperfeiçoamento da pessoa e conferem equilíbrio às
ações humanas no mundo.
Por outra parte, a imagem lembra a Mãe de
Jesus como “Estrela no Mar”, para aquele que se
perdem ou enfrentam tempestades nos mares da
vida. Para esses, Maria é “seguro porto”; é “porta [...]
para o Céu aberta”; defende da “serpente que nos
faz contínua guerra”.28
O sentido de Maria como estrela foi atualizado
por Paulo VI quando concluiu a encíclica Evangelii
Nuntiandi aplicando a Maria o título de “Estrela da
Evangelização”.
Concluindo
Ao conferir o título “Petrolina, o Centro da
Rosa” à exposição de ilustrações que criamos com
28
NOVENA PARA A FESTA DA ASSUNÇÃO DE NOSSA SENHORA.
Escudo Admirável, p. 342.
base em documentos produzidos por pessoas que de
um modo ou de outro frequentaram a Passagem do
Juazeiro, quisemos lembrar a vocação originaria de
Petrolina, a saber, de existir e funcionar como
epícentro de passagens, de caminhos, de progresso
e de fé. Para explanar a idéia apresentamos alguns
documentos antigos imersos em ilustrações que
visaram de alguma maneira contextualizá-los e
ampliar a capacidade de vislumbre do visitante em
relação ao passado de Petrolina e os significados a
ele inerentes.
Os documentos mostram que apesar de
pequenina a povoação de Passagem do Juazeiro, já
no século XVII constituía espaço onde se
estabeleciam relações comerciais, políticas, judiciais
e de fé cristã.
Chamamos Petrolina de “Centro da Rosa”
fazendo referencia à Rosa dos Ventos e lembrando a
privilegiada posição geográfica da cidade, sobretudo
em relação aos grandes caminhos que por ela
passam. A simbolizar esta condição central da cidade
sertaneja existe a imagem que representa a
padroeira da cidade, juntamente com sua Igreja
Matriz e mais modernamente o monumento com
cinco pontas. Este está edificado na BR 128, uma
das vias que tem como ponto de partida a cidade
pernambucana que reconhecemos estar ao centro de
uma antiga encruzilhada sertaneja. Petrolina é o
Centro da Rosa.
37
BIBLIOGRAFIA
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WILLEKE, Venâncio. Missões franciscanas no Brasil Missões da província
de Santo Antônio. 2ed., Petrópolis, Vozes 1978. 197p.
39
Sumário
Introdução ......................................................................... 4
1. Petrolina e a “Rosa dos dos Ventos”...........................8
2. Passantes Ilustres.........................................................10
2.1 Pedro Marinho da Gama
2.2 José G. da Fonseca
2.3 Johann B. von Spix e Karl F. Philipp von Martius
2.4 Frei João de São José Copertino
2.5 Padre Manoel Antônio de Souza
2.6 Henrique Guilherme Fernando Halfeld
2.7 Padre Manoel Joaquim da Silva
2.8 Frei Henrique de Castel São Pedro
2.9 Richard Francis Burton
3 .Breve Histórico da “Passagem do Juazeiro”.......... ....26
4. A Estrela da Terra e a do Céu ......................................29
Concluindo
Bibliografia
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Petrolina, o Centro da Rosa