Documentos
ISSN 0102-0110
Setembro, 2006
METABOLÔMICA: aplicações e perspectivas
189
ISSN 0102 0110
Setembro, 2006
Recursos Genéticos e
Biotecnologia
Documentos 189
METABOLÔMICA: aplicações e perspectivas
Thales Lima Rocha
Raphael Garcia de Sousa Evaristo
Luciano Paulino da Silva
Djair dos Santos de Lima e Souza
Brener Magnabosco Marra
Paulo Henrique Alves da Costa
José Cesamildo Cruz Magalhães
Maria Cristina da Silva Mattar
Maria Fátima Grossi-de-Sá
Brasília, DF
2006
Exemplares desta edição podem ser adquiridos na
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia
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Normalização Bibliográfica: Maria Iara Pereira Machado
Editoração eletrônica: Maria da Graça S. P. Negrão
Fabrício Lopes dos Reis Rodrigues
1ª edição
1ª impressão (2006):
M 587 Metabolômica: aplicações e perspectivas. / Thales Lima Rocha ... [et. al.]. –
Brasília: Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia, 2006.
38 p. (Documentos / Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia,
0102 – 0110; 189)
1. Metabolômica. 2. Ômicas - plataformas tecnológicas. I. Rocha, Thales
Lima. II. Série.
620.82 – CDD 21.
Autores
Thales Lima Rocha
Raphael Garcia de Sousa Evaristo
Luciano Paulino da Silva
Djair dos Santos de Lima e Souza
Brener Magnabosco Marra
Paulo Henrique Alves da Costa
José Cesamildo Cruz Magalhães
Maria Cristina da Silva Mattar
Maria Fátima Grossi-de-Sá
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Sumário
As Ômicas ................................................................................................................. 6
A Genômica............................................................................................................... 6
A Transcriptômica .................................................................................................... 9
A Proteômica .......................................................................................................... 10
A Metabolômica ...................................................................................................... 11
Os metabólitos........................................................................................................ 13
Metaboloma,
Metabolômica,
“Metabolic
profiling”
e
Engenharia
de
metabolismo......................................................................................................... 15
Seqüência de etapas da metabolômica ................................................................ 16
Aplicabilidade da Metabolômica ........................................................................... 21
Farmacologia .......................................................................................................... 22
Nutrição ................................................................................................................... 24
Ecologia e Evolução............................................................................................... 25
Perspectivas para a metabolômica....................................................................... 27
Considerações Finais ............................................................................................ 28
Referências Bibliográficas..................................................................................... 31
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METABOLÔMICA – Aplicações e Perspectivas
Thales Lima Rocha
Raphael Garcia de Sousa Evaristo
Luciano Paulino da Silva
Djair dos Santos de Lima e Souza
Brener Magnabosco Marra
Paulo Henrique Alves da Costa
Maria Fátima Grossi-de-Sá
As Ômicas
As plataformas tecnológicas conhecidas como “ômicas” são aquelas que têm
o objetivo de isolar e caracterizar o maior número possível de biomoléculas de um
mesmo grupo, como Ácidos Desoxirribonucléicos (DNA), Ácidos Ribonucléicos
(RNA), proteínas ou metabólitos. A primeira ômica a ser denominada como tal foi a
genômica. Esse termo vem da palavra Genoma, que por sua vez deriva da junção
das palavras Gene e Cromossoma. Graças a grande aceitação desses termos,
outros como transcriptoma, proteoma e metaboloma (assim como suas respectivas
ômicas) foram também surgindo. Entretanto as suas origens etimológicas são ainda
mais confusas (ROBERTSON, 2005).
Nos últimos anos têm surgido várias ômicas. Entretanto, aquelas mais
conhecidas são: a genômica, a transcriptômica, a proteômica e a metabolômica.
Elas têm como objetivo isolar e caracterizar, respectivamente, o DNA, o RNA, as
proteínas e os metabólitos (BINNECK, 2004). A integração das informações obtidas
por essas plataformas citadas acima são o objetivo principal da Biologia de
Sistemas, também conhecida como Genômica Funcional (ROCHFORT, 2005).
A Genômica
Nos últimos anos, é crescente o número de seqüências gênicas conhecidas,
assim como a quantidade de dados disponíveis para acesso público (BINNECK,
2004). Isso certamente está relacionado à alta estabilidade das moléculas de DNA,
quando comparadas às moléculas de RNA ou proteínas (PODGORNICK, 2004).
Outro fator que contribuiu bastante para esse aumento foi o grande investimento na
área da genômica, sobretudo na última década (BINNECK, 2004).
6
Além do crescimento do número de dados, ocorre também um maior acesso
aos mesmos. A grande facilidade em se explorar os dados de seqüências reside nas
ferramentas de bioinformática. Essas ferramentas agrupam uma grande quantidade
de informação e permitem a busca de seqüências similares no banco de dados, ou
mesmo a comparação de dados de diferentes genomas (BINNECK, 2004).
Entretanto, tem-se criado uma expectativa excessiva quanto à aplicação dos
dados obtidos de seqüências gênicas no que tange a inferências biológicas
(BINNECK, 2004). Conhecer essas seqüências não garante que a proteína
codificada seja facilmente determinada (HÜTTENHOFER e VOGEL, 2006).
As predições computacionais efetuadas a partir de dados de seqüências são
complexas e nem sempre garantem resultados aceitáveis, principalmente quando se
trata de genomas complexos, como o humano. A razão dessa incerteza reside no
fato de que as predições são derivadas de diferentes métodos (BINNECK, 2004).
Alguns programas determinam genes pela identificação de parâmetros que
definem o início e o fim de um gene (predição “ab inittio”). Já outros programas
buscam genes pela comparação de fragmentos de seqüências com homologia a
genes conhecidos (predição comparativa). Dessa forma, a predição ab inittio tende a
superestimar o número de genes por identificar qualquer fragmento de seqüência
que pareça um gene. Já a predição comparativa tende a subestimar o número de
genes porque só identifica os genes homólogos aos já conhecidos. Portanto, com as
informações obtidas até hoje, apenas os métodos computacionais não são
suficientes para gerar o número real de genes de um genoma eucariótico complexo
(BINNECK, 2004).
Se não bastasse essa incerteza no número total de genes em um genoma
específico, a identificação de sua função também não é fácil (HÜTTENHOFER e
VOGEL, 2006). O tamanho do genoma por si só não define a complexidade de um
organismo. A tabela 1 mostra que organismos fenotipicamente bem diferentes, como
o nematóide Caenorhabditis elegans e a planta Arabidopsis thaliana, possuem
genomas de tamanho próximo. Além disso, só pela seqüência de nucleotídeos
apresentada por gene não é possível inferir com certeza a proteína que ele codifica
(RIGOUTSOS et al., 2006). Isso é devido à ocorrência de várias modificações pós
transcricionais e pós traducionais (ZANCAN, 2002; BINNECK, 2004).
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Tabela 1: Tamanho do Genoma e número estimado de genes de vários organismos
Tamanho do Genoma
Número estimado de
Organismo
(pares de base)
Genes
Homo sapiens
3 bilhões
30.000
Mus musculus
2,6 bilhões
30.000
Arabidopsis thaliana
100 milhões
25.000
Caenorhabditis elegans
97 milhões
19.000
Drosophila melanogaster
137 milhões
13.000
12,1 milhões
6.000
Escherichia coli
4,6 milhões
3.200
Vírus da AIDS (HIV)
9700
9
Saccharomyces
cerevisiae
(Adaptado de BINNECK, 2004).
Sendo assim, a explicação para tantas diferenças entre os fenótipos das
espécies em questão é depositada nos mecanismos de modificações pós
transcricionais como o “splicing” alternativo, nas inúmeras transformações pós
traducionais que ocorrem com as diferentes proteínas, na produção e utilização dos
inúmeros metabólitos como cofatores enzimáticos e nos mecanismos que regulam
esses processos (ZANCAN, 2002; FIEHN, 2002; RIGOUTSOS et al., 2006).
O “splicing” alternativo consiste em produzir um RNA mensageiro (RNAm)
diferente do esperado a partir de um RNA nuclear heterogêneo (RNAnh) comum.
Para tanto, pode ocorrer de se eliminar um dos éxons ou mesmo manter um dos
íntrons. É dessa forma que a D. melanogaster produz suas três diferentes cadeias
pesadas de miosina, partindo de apenas um RNAnh (MACHUCA-TZILI et al., 2006).
As modificações pós traducionais são alterações na seqüência de aminoácidos
recém traduzida (clivagens proteolíticas) ou a inserção de grupamentos acetil,
fosforil, metil, entre outros, além da adição de grupos prostéticos, como por exemplo,
o grupo Heme na hemoglobina (MÄDER et al., 2002; ZANCAN, 2002).
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Com o intuito de se relacionar as informações obtidas pela genômica com o
fenótipo apresentado pelo indivíduo em questão, outras tecnologias estão se
desenvolvendo e ganhando destaque no cenário científico. Dentre essas
tecnologias, ganham destaque a transcriptômica, a proteômica e, ultimamente, a
metabolômica (MÄDER et al., 2002; FRANK e HARGREAVES, 2003; VIVANCO et
al., 2003).
A Transcriptômica
Transcriptoma é o termo dado ao produto inicial da expressão gênica de um
organismo. Em outras palavras, é o conjunto de RNAs mensageiros (RNAm) que
codificam as informações que a célula precisa em um determinado momento
(NAKANISHI e NUREKI, 2005).
Qualquer célula recebe seu transcriptoma da célula mãe que lhe deu origem
por divisão celular. Logo, a transcrição de seus genes não resulta na síntese de seu
transcriptoma, mas sim na manutenção do mesmo e na mudança de sua
composição à medida que genes específicos são transcritos ou não (BINNECK,
2004).
O estudo de RNAm tem se beneficiado muito com as tecnologias baseadas
na Reação de Cadeia de Polimerase (PCR). Dessa forma, vários genes podem ser
estudados paralelamente, ao invés de um só de cada vez. As técnicas “Differential
Display” (DD), “Serial Analylis of Gene Expression” (SAGE) e microarranjo de DNA
apresentam muitas vantagens quando comparadas ao “Northern Blotting”, tanto em
sensibilidade quanto em número de ensaios (BINNECK, 2004). Dentre essas
técnicas, a que vem sendo mais utilizada tanto no estudo da composição de
transcriptomas quanto na comparação entre transcriptomas diferentes é o
microarranjo de DNA (FRANK e HARGREAVES, 2003; NAKANISHI e NUREKI,
2005; RIGOUTSOS et al., 2006).
O microarranjo de DNA consiste em uma coleção de vários fragmentos
pequenos de genes que são dispostos em locais específicos de uma lâmina de vidro
especial de microscopia ou uma lâmina de sílica. A técnica se alicerça da habilidade
das moléculas de RNAm de se ligarem especificamente (hibridizar) ao DNA
complementar do qual foram transcritas. Utilizando uma placa com milhares de
fragmentos de DNA, é possível saber, em um único experimento, o nível de
9
expressão de milhares de genes em uma célula com base na quantidade de RNA
hibridizados em cada sítio (BINNECK, 2004). A quantificação dos RNA de cada sítio
é efetuada com o auxílio de programas computacionais (por exemplo, ArrayVision
software), gerando um perfil de expressão gênica da célula (MÄDER et al., 2002).
Apesar de informarem que genes estão sendo expressos em maior
quantidade, os dados obtidos pela quantificação do RNAm de uma célula nem
sempre se correlacionam com a expressão das proteínas da mesma (CALSA
JUNIOR et al., 2004). Isso porque os RNA menos abundantes, como aqueles que
codificam proteínas responsáveis pela maturação de leucócitos são mais difíceis de
serem quantificados do que aqueles RNAm mais abundantes (PATTON et al., 2006).
Informações mais precisas sobre o nível de expressão protéica de um organismo
são obtidas pela utilização da tecnologia proteômica (BINNECK, 2004).
A Proteômica
O proteoma de um organismo é o conjunto de proteínas expressas por um
organismo ou tecido em um determinado momento e sob uma condição específica
(JAMES, 1997; ROCHA et al., 2005). O número de proteínas produzidas por um
organismo excede e muito o número de genes que o mesmo possui. Isso novamente
se explica pelas inúmeras modificações pós transcricionais e pós traducionais
(BINNECK, 2004). O conjunto de tecnologias criadas para analisar a expressão de
proteínas é conhecido como proteômica (ROCHA et al., 2005; VIVANCO et al.,
2003).
A proteômica vem se desenvolvendo com o intuito de implementar novas
estratégias para a análise de proteínas em escala genômica. Entretanto, a análise
das proteínas de um organismo depende da extração, purificação, visualização,
identificação e quantificação dessas, e em cada uma das etapas há uma série de
limitações. Dessa forma, para se conhecer o proteoma completo de um organismo,
se faz necessária a utilização de diversas estratégias, como: a utilização de técnicas
como cromatografias associadas à eletroforese, o pré-fracionamento das amostras
por meio de extrações seqüenciais, a análise do proteoma organelar, entre outras.
(ROCHA et al., 2005).
Atualmente, as investigações proteômicas se iniciam principalmente com a
eletroforese bidimensional (2DE). Essa técnica permite separar as proteínas de uma
10
amostra pelos seus respectivos pontos isoelétricos e pesos moleculares
(O’FARREL, 1975; KLOSE, 1975). As proteínas separadas por essa técnica são,
geralmente, digeridas por proteases e analisadas em espectrômetros de massa. Os
perfis obtidos pelo espectrômetro de massa, contendo todos os fragmentos
resultantes da digestão enzimática que foram detectados pelo equipamento, são
denominados “fingerprinting” (MÄDER et al., 2002). Dependendo da qualidade da
amostra analisada, pode-se chegar ao seqüenciamento parcial ou mesmo total da
proteína em questão. A partir da comparação das seqüências obtidas em um banco
de dados, pode-se identificar a proteína isolada (BINNECK, 2004).
A eletroforese bidimensional apresenta as mesmas limitações observadas
nas técnicas transcriptômicas acima descritas. As proteínas expressas em baixa
quantidade, ou em um curto período, acabam por não serem, às vezes, sequer
visualizadas (MÄDER et al., 2002). Essas proteínas podem estar sendo expressas
para iniciar a resposta a algum estímulo importante, como aquelas relacionadas à
cascata de ativação da proteína Kinase C, que tem um importante papel na
prevenção da isquemia no miocárdio (VIVANCO et al., 2003; BINNECK, 2004).
A Metabolômica
Não há dúvidas de que conhecer as proteínas de um organismo é importante.
Mas existe um universo de pequenas moléculas orgânicas que interagem
diretamente com as proteínas e outras macromoléculas (HALL, 2006). Essas
moléculas atuam como substratos, inibidores ou ativadores alostéricos de uma
enzima. Podem ser precursores de alguma molécula importante nas inúmeras rotas
metabólicas celulares, ou até mesmo um resíduo metabólico de alguma via de
síntese ou degradação de macromoléculas que por algum motivo é estocado e
utilizado como defesa química contra algum patógeno (ENGEL et al., 2002; DEMAIN
e VAISHNAV, 2006). Essas pequenas, porém, importantes moléculas são
conhecidas como metabólitos (DIXON, 2001).
Esses metabólitos são divididos em dois grandes grupos: os metabólitos
primários e os secundários. Os primários são aqueles que estão diretamente
envolvidos nas rotas de síntese e degradação das macromoléculas em qualquer ser
vivo (DIXON, 2001). Já os secundários são mais comuns em plantas e fungos
(CHALLIS e HOPWOOD, 2003; HALL, 2006). Eles atuam como componentes
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estruturais, defesas contra herbívoros e patógenos, atrativos para polinizadores e
agentes nas interações interespecíficas, como a alelopatia (ENGEL et al., 2002;
CHALLIS e HOPWOOD, 2003).
Segundo Challis e Hopwood (2003), o estudo desses metabólitos visando à
obtenção de produtos efetivos contra diversas doenças e passíveis de
comercialização já vem sendo feito desde o início do século XX. Entretanto, a idéia
de se analisar todo o conjunto de metabólitos em qualquer nível de complexidade
(organismo, órgão, tecido, célula ou mesmo compartimentos celulares) só começou
a ganhar destaque nos últimos anos, conforme pode ser observado na figura 1
(HORNING e HORNING, 1971; NICHOLSON et al., 1999; FIEHN, 2002; REO, 2002;
LINDON et al., 2003, 2004a, b; NICHOLSON e WILSON, 2003; WECKWERTH,
2003; BINO et al., 2004; FERNIE et al., 2004; GOODACRE et al., 2004; FUKUSAKI
e KOBAYASHI, 2005; MUNGUR et al., 2005; ROBERTSON, 2005; ROCHFORT,
2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005). O nome dado a todas as tecnologias
envolvidas na análise desses metabólitos foi metabolômica.
250
Nº de artigos publicados
200
150
100
50
0
1975 - 1994
1995 - 1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005*
Ano
Figura 1: Número de artigos relacionados à metabolômica publicados desde 1975 até
Setembro de 2005. Nota-se um grande aumento nas publicações sobre esse tema nos
últimos cinco anos. (Adaptado de ROCHFORT, 2005).
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Nos últimos anos, a metabolômica tem sido empregada em diversas áreas e
com inúmeros propósitos. Todavia, em qualquer âmbito existem várias dificuldades a
serem superadas tanto na extração e separação das amostras quanto na análise
dos resultados (ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005;
GIBNEY et al., 2005; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005;
CHALLIS e HOPWOOD, 2003). Contudo, é de senso comum que os resultados
obtidos pela metabolômica facilitarão o entendimento de como o genótipo de um
indivíduo está relacionado como o seu fenótipo (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005;
BINNECK, 2004).
O objetivo principal desse estudo é mostrar a metabolômica hoje em dia. Isso
inclui todos os avanços já realizados, assim como as dificuldades ainda enfrentadas.
As informações abordadas aqui poderão ser utilizadas em uma possível execução
de projetos de pesquisa envolvendo metabolômica e engenharia de metabolismo na
Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia.
Como objetivos específicos, podem ser citados:
- Esclarecer os conceitos básicos da metabolômica;
- Citar todas as etapas básicas para a análise de uma amostra, enfatizando as
dificuldades existentes;
- Apontar as inovações tecnológicas geradas ou aplicadas na metabolômica;
- Discutir a aplicabilidade dessa plataforma tecnológica em várias áreas de
conhecimento, como a farmacologia, a nutrição, a ecologia e a evolução;
- Comentar sobre as perspectivas dessa plataforma, ressaltando as principais
dificuldades e apontando os benefícios da interação com outras plataformas.
Os metabólitos:
Encontram-se dissolvidas no citosol de qualquer célula milhares de pequenas
moléculas conhecidas como metabólitos primários. Essas moléculas estão
envolvidas nas principais rotas metabólicas que ocorrem nas células (DIXON, 2001).
Dentre esses metabólitos estão: os aminoácidos, nucleotídeos, lipídeos,
carboidratos e seus derivados fosforilados, além de um grande número de ácidos
mono-, di- e tricarboxílicos. Esses metabólitos são altamente polares ou carregados
eletricamente, solúveis em água e presentes nas células em concentrações variadas
(entre milimolar e micromolar). Sua retenção dentro das células se deve ao fato de a
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membrana plasmática ser impermeável a eles, embora existam transportadores nas
membranas celulares que possibilitem a entrada e/ou saída desses compostos na
célula, ou em compartimentos subcelulares (células eucarióticas). A presença
bastante similar dos mesmos grupos de metabólitos em qualquer célula viva
demonstra a conservação evolucionária dessas rotas metabólicas principais que
surgiram nos organismos mais primitivos e permanecem até os dias de hoje
(SMEDSGAARD e NIELSEN, 2005).
Existe um outro grupo de pequenas biomoléculas que, ao contrário dos
metabólitos primários, são específicas de certos tipos de células ou organismos.
Essas moléculas são comumente chamadas de metabólitos secundários (DIXON,
2001). Os metabólitos secundários são moléculas que geralmente não estão
envolvidas em funções vitais, geralmente não fazem parte do metabolismo básico e
possuem características químicas muito variadas e, às vezes, bem complexas
(HALL, 2006). Durante muito tempo acreditou-se que os metabólitos secundários
fossem produzidos sem uma função específica, simplesmente como produtos finais
das reações, chegando a ser considerados até como anomalias (MARASCHIN e
VERPOORTE, 1999). Essa visão mudou radicalmente e a cada dia descobre-se um
pouco mais sobre a função destas substâncias, sua utilidade para o
desenvolvimento fisiológico das plantas e seu papel como mediadores das
interações entre as plantas e outros organismos (MARASCHIN e VERPOORTE,
1999; NEWMAN et al., 2003; ZHANG et al., 2003).
Os principais grupos de metabólitos secundários são os alcalóides, terpenos,
taninos, flavonóides e glicosídeos (HALL, 2006). Os alcalóides são bases
nitrogenadas com grande variação na estrutura molecular. Possuem sabor amargo e
pH alcalino quando em solução. Nas plantas têm função de regulação do
crescimento e de proteção. Os terpenos são moléculas de estrutura cíclica, também
conhecidos como óleos essenciais. Eles são voláteis e por isso são responsáveis
pelos odores dos vegetais. Podem ser classificados quanto ao número de átomos de
carbono em: mono, sesqui, di e triterpenos. Nas plantas possuem funções na
polinização, proteção, etc. Os taninos são compostos fenólicos (poli fenóis) de
estrutura variável. Apresentam atividade adstringente, ou seja, precipitam proteínas.
Nos vegetais, têm função de proteção. Os flavonóides são heterosídeos, ou seja,
14
contém uma porção açúcar (diferente da glicose) ligada a uma porção não-glicídica
(aglicônio), que neste caso é um pigmento. Esses compostos possuem cores de
acordo com o tipo de pigmento presente na molécula, por exemplo, as flavonas são
amarelas e os flavonóides antociânicos são azuis. Nas plantas atuam na coloração
dos órgãos vegetais e na diferenciação celular. Por fim, os glicosídeos são
compostos que contém um açúcar ligado a um aglicônio, sendo esse a porção ativa
da molécula. Possuem gosto muito amargo, e são classificados de acordo com o
tipo de aglicônio. Por exemplo: glicosídeos alcoólicos (o aglicônio é um álcool);
glicosídeos cianogênicos (liberam ácido cianídrico quando hidrolisados); glicosídeos
esteróides (o aglicônio é um esteróide); glicosídeos antraquinônicos (o aglicônio é
uma antraquinona). Nos vegetais, a função varia de acordo com a porção nãoglicídica (MARASCHIN e VERPOORTE, 1999; ZHANG et al., 2003).
Metaboloma, Metabolômica, “Metabolic profiling” e Engenharia de
metabolismo
O conjunto de todas essas pequenas moléculas (metabólitos primários e
secundários) de uma dada célula, fluido corporal ou organismo é conhecido como
metaboloma (GOODACRE, 2005). Uma vez conhecida a composição do
metaboloma, pode-se prever que genes e rotas metabólicas estão ativos naquele
momento na célula (GOODACRE, 2005; ROBERTSON, 2005).
O interesse em se conhecer melhor os metabólitos (primários ou
secundários), assim como suas vias de síntese e a regulação das mesmas tem
crescido muito nos últimos anos (ROCHFORT, 2005). Dessa forma, a Metabolômica,
ou Metabonômica, já figura entre as grandes plataformas tecnológicas para o estudo
de sistemas biológicos, como a Genômica, Transcriptômica e Proteômica
(BINNECK, 2004). Os dois termos (Metabolômica e Metabonômica) estão corretos.
O que os diferencia são apenas as suas origens etimológicas (ROBERTSON, 2005).
Para todos os fins, nesse trabalho será utilizado somente o termo Metabolômica.
A metabolômica tem como objetivo isolar e caracterizar todos os metabólitos
de uma dada amostra biológica em condições normais e sob algum tipo de estresse
(ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005). Mesmo utilizando as
mesmas técnicas, ela se difere da análise de perfil metabólico (Metabolic profiling),
15
que busca o isolamento de moléculas alvo e a caracterização das suas vias de
síntese (WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005). A linha que divide essas duas
plataformas geralmente é muito tênue. Técnicas como a Ressonância Magnética
Nuclear de biofluidos ou a Espectrometria de Massa de biofluidos são utilizadas para
os dois propósitos. No entanto, o que se sabe a cerca do biofluido e o conhecimento
prévio de parâmetros a serem analisados é que vai definir se a análise se enquadra
na metabolômica ou no “metabolic profiling” (ROBERTSON, 2005). A metabolômica,
devido ao seu objetivo, não utiliza parâmetros, mas sim os determina. Após serem
determinados, o “metabolic profiling” os utiliza (ROBERTSON, 2005; WECKWERTH
e MORGENTHAL, 2005).
Após a descoberta dos metabólitos de uma amostra qualquer e a
identificação de algum composto de interesse (farmacêutico, por exemplo), é
possível iniciar os estudos de engenharia de metabolismo. Tais estudos primam por
identificar os genes e as rotas metabólicas desses compostos, visando aumentar ou
diminuir a sua produção. Além disso, a engenharia de metabolismo pode ser
aplicada na modificação genética de um outro organismo, para que este possa
produzir o metabólito em questão (AHARONI et al., 2005).
Seqüência de etapas da metabolômica
A metabolômica, aplicada em qualquer área da ciência, possui uma série de
etapas. Em cada uma dessas etapas, podem ocorrer erros experimentais
(FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005).
A primeira etapa é a seleção do organismo, célula, tecido ou biofluido a ser
analisado. Nesse ponto, o mais difícil é manter a uniformidade da amostra. A
variação na idade ou tamanho destas amostras, assim como o tratamento dado ao
organismo de origem (dieta, adubação, exposição à luz, etc.) ou mesmo o horário da
coleta interfere substancialmente na composição da amostra (BOLLARD et al., 2001;
FIEHN, 2002; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005; ROCHFORT,
2005).
Após a seleção do organismo, é realizado o preparo da amostra. Essa etapa
é uma das mais importantes, uma vez que qualquer displicência pode interferir
drasticamente no resultado da análise (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005). Para se
16
evitar grandes variações experimentais, a mesma quantidade da amostra, avaliandose o peso seco do mesmo tipo de órgão deve ser coletada. E tudo isto deve ser feito
no mesmo horário (ROBERTSON, 2005). O processo de extração é o ponto mais
crítico. A maceração, quando necessária, deve ser realizada obedecendo a
rigorosos padrões (FIEHN, 2002; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005). Se a análise for
feita com biofluidos, essa etapa é mais simples. No entanto, esse é um tipo de
amostra muito sensível às variações citadas anteriormente, exigindo bastante
cuidado dos responsáveis por essa etapa (ROBERTSON, 2005; ROCHFORT,
2005).
Muitas das amostras, antes de serem analisadas, necessitam de um préfracionamento. Isso vai depender, principalmente, dos equipamentos a serem
utilizados no fracionamento (FIEHN, 2002; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005;
ROBERTSON, 2005; ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005;).
Esse pré-fracionamento serve para agrupar os compostos presentes na amostra de
acordo com suas características moleculares utilizando diferentes solventes (WANT
et al., 2006). Dessa forma, pode-se definir qual ferramenta será utilizada (FUKUSAKI
e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL,
2005). O ponto mais crítico desse pré-fracionamento é a escolha do solvente usado
para a separação (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005). Deve-se prestar muita atenção
nas possíveis interferências que esse solvente pode causar nos equipamentos de
análise, assim como nas possíveis reações indesejadas que podem ocorrer entre o
solvente e a amostra, produzindo novos compostos (ROBERTSON et al., 2000;
BECKWITH-HALL et al., 2002; ROBERTSON, 2005; WANT et al., 2006).
Outras considerações devem ser feitas acerca da utilização da metabolômica
no que tange estudos com animais (ROBERTSON et al., 2002). Uma vez que essa
tecnologia é extremamente sensível, variações fisiológicas ou ambientais que o
animal pode sofrer durante o teste serão detectadas e podem mascarar os
resultados. Por exemplo, uma diferença de apenas quatro semanas na idade pode
resultar em uma notória discrepância no perfil metabólico de ratos (ROBERTSON et
al., 2000).
O fracionamento da amostra é a etapa mais importante da metabolômica
(FIEHN, 2002; GERMAN et al., 2005). Embora qualquer ferramenta que permita
17
mensurar os metabólitos possa ser usada pela metabolômica, a Espectrometria de
Massa (EM) acoplada a Cromatografia líquida, Cromatografia Gasosa ou
Eletroforese Capilar, juntamente com a Ressonância Magnética Nuclear (RMN)
dominam a literatura (NICHOLSON et al., 1999; FIEHN, 2002; REO, 2002; LINDON
et al., 2003, 2004a; NICHOLSON e WILSON, 2003; WECKWERTH, 2003; BINO et
al., 2004; FERNIE et al., 2004; GOODACRE et al., 2004; ROBERTSON, 2005;
WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005).
No fracionamento de amostras para os estudos de metabolômica, o ideal é
que se tenha uma alta resolução dos diferentes compostos presentes. Essa
resolução depende, sobretudo, da ferramenta utilizada para o fracionamento
(FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; WILSON et al., 2005). A EM é muito mais
sensível do que a RMN, muito embora isso nem sempre represente uma vantagem
(ROBERTSON, 2005). Essa maior sensibilidade implica em uma menor
reprodutibilidade da análise no mesmo equipamento ou em equipamentos
equivalentes (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROCHFORT, 2005; WECKWERTH
e MORGENTHAL, 2005; WILSON et al., 2005). A tabela 2 (ROBERTSON, 2005)
mostra um comparativo entre essas duas ferramentas com relação à aplicabilidade
das mesmas na metabolômica. Equipamentos como o “Fourier Transform Ion
Ciclotron Ressonance Mass Spectrometry” (FT-ICR-MS) combinam a RMN e a EM,
possibilitando a detecção de um maior número de compostos diferentes. Entretanto,
esse tipo de equipamento ainda carece do desenvolvimento de algoritmos mais
efetivos para analisar os resultados obtidos com ele (MUNGUR et al., 2005). Uma
variação da RMN, conhecida como “Magic Angle Spinning” (MAS), permite a análise
direta de tecidos, não necessitando das etapas de extração e pré-fracionamento.
Entretanto essa técnica necessita de equipamentos especiais e recursos humanos
altamente qualificados, acabando por limitar seu uso (STRAUS, 2004). Devido a
essas peculiaridades, a maioria dos grupos de pesquisa voltados aos estudos de
metabolômica estão usando tanto os equipamentos associados a EM quanto os
associados a RMN (ROBERTSON, 2005).
18
Tabela 2: Comparação entre RMN e EM para a aplicação na metabolômica.
RMN
EM
Logística
Custo total
sem vantagem
Custos para
sem vantagem
utilização rotineira
Manutenção
vantagem
Custo por amostra
sem vantagem
Habilidade técnica
vantagem
requeridaa
Durabilidade
sem vantagem
Considerações
Analíticas
Sensibilidade
muita vantagem
Reprodutibilidade
(em outros
muita vantagem
laboratórios)
Velocidade de
sem vantagem
análise
Capacidade
sem vantagem
(amostras/dia)
Preparo da amostra
vantagem
Automatização da
vantagem
análise
Versatilidadeb
vantagem
Seletividadec
vantagem
Metabolômica
Resolução de
muita vantagem
estrutura molecular
Identificação de
moléculas
vantagem
desconhecidas
Polarizaçãod da
muita vantagem
amostra
Automatização da
análise dos
vantagem
resultados
a. O número de analitos qualificados por RMN é muito menor do que por EM.
b. Geralmente, qualquer equipamento de RMN pode ser configurado para a maioria das
aplicações, enquanto diferentes equipamentos de EM podem ser necessários para aplicações
específicas.
c. A EM prima pela identificação seletiva da identidade molecular, enquanto a RMN prima pela
identificação de todos os átomos que contêm prótons na amostra. Entretanto, a seletividade
pode ser uma vantagem ou uma desvantagem, dependendo da aplicação.
d. Potencial para gerar séries de dados incompletos ou com baixa reprodutibilidade devido à
polarização inerente a tecnologia (ex: supressão de íons na EM).
(Adaptado de ROBERTSON, 2005).
19
Existem três requisitos básicos para a utilização de qualquer uma das
ferramentas listadas. São eles: o capital de investimento para a compra dos
equipamentos e reagentes necessários, uma vez que não existam equipamentos
aptos ao uso; o espaço físico, já que esses equipamentos não são pequenos e
necessitam de temperaturas controladas; e, principalmente, pessoas qualificadas
para manipularem-nos (LINDON et al., 2004b; ROBERTSON, 2005). Como em
grandes instituições de pesquisas é comum que existam os três pré-requisitos,
geralmente, a disponibilidade dos equipamentos e de profissionais capacitados para
operá-los é que irá determinar a ferramenta que será usada (ROBERTSON, 2005).
Após todos os passos de fracionamento, se faz necessária a conversão dos
valores obtidos por diferentes equipamentos para uma unidade padrão. Contudo,
isso nem sempre é fácil, ainda mais se forem utilizados muitos passos para o
fracionamento (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005; ROCHFORT,
2005). A conversão de dados obtidos por cromatografias, eletroforeses ou mesmo
RMN necessitam de ser convertidos em uma linguagem digital que possa ser
utilizada em análises multivariadas utilizando ferramentas de estatística (FIEHN,
2002; DURAN et al., 2003; STEUER et al., 2003; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005;
MUNGUR et al., 2005; ROBERTSON, 2005; ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e
MORGENTHAL, 2005).
As ferramentas de estatística são muito importantes para a metabolômica
(DURAN et al., 2003; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005;
WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005). Um estudo de metabolômica qualquer
pode gerar milhares de espectros de RMN para serem analisados, o que seria uma
tarefa no mínimo exaustiva, mesmo para um espectroscopista experiente
(ROBERTSON, 2005). Dessa forma, muitas ferramentas têm sido desenvolvidas ou
adaptadas de outros estudos para analisar um grande número de dados
rapidamente (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; ROBERTSON, 2005; WECKWERTH
e MORGENTHAL, 2005). Entretanto, assim como nos outros passos dos estudos de
metabolômica, as ferramentas de análise dos dados obtidos ainda são limitadas
(FIEHN, 2002; STEUER et al., 2003; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; MUNGUR et
al., 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005).
20
A escolha do tipo de análise estatística a ser utilizada nos dados obtidos
pelas técnicas de fracionamento varia de acordo com a estrutura dos dados e da
intenção da análise. Entretanto, a Análise de Componente Principal (ACP) é a mais
utilizada na metabolômica (NICHOLLS et al., 2001; NICHOLSON et al., 2002).
A ACP é uma análise muito útil para se reduzir grupos de dados muito
grandes e identificar sinais importantes nesses grupos, sobretudo se o
fracionamento não foi bem sucedido. A partir de uma série de cálculos conhecidos
por análise dos vetores de Eigen, a ACP permite identificar os compostos mais
abundantes e, a partir disto, visualizar as diferenças dentro da amostra e agrupar os
compostos hierarquicamente (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005).
Associando-se todo esse conhecimento gerado pela metabolômica àqueles
obtidos pelas outras ômicas, é possível determinar quais são as rotas metabólicas e
os genes que possivelmente estejam envolvidos na produção dos compostos de
maior destaque (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005). Essa integração entre as
diferentes plataformas tecnológicas é chamada de Biologia de Sistemas
(ROCHFORT, 2005). A figura 2 mostra um esquema típico dos passos a serem
seguidos em análises metabolômicas utilizando plantas, da seleção da amostra até
a determinação dos genes envolvidos na produção dos compostos mais relevantes
(FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005).
Aplicabilidade da Metabolômica
As informações obtidas pela metabolômica, assim como aquelas obtidas pelo
“metabolic profiling”, têm sido freqüentemente usadas em pesquisas de diversas
áreas. Exemplos específicos para indicar o alcance dessa tecnologia incluem a
correlação entre perfis metabólicos dos biofluidos e doenças em animais, na
influência da dieta no padrão metabólico do indivíduo, na investigação dos efeitos
causados pela inserção de um gene em um organismo transgênico, entre outras
(BRINDLE et al., 2003; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; GIBNEY et al., 2005;
ROBERTSON, 2005; ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005).
21
Escolha do organismo
Fracionamento
Conversão de
Preparo da
amostra
Préfracionamento
Análise estatística
Identificação dos genes e rotas metabólicas envolvidos na produção de
metabólitos específicos
Figura 2: Esquema típico de análises metabolômicas utilizando plantas. 1- escolha do
organismo a ser estudado; 2- preparo da amostra; 3- pré-fracionamento; 4- fracionamento;
5- conversão dos resultados para uma unidade comum; 6- análise estatística dos dados; 7elucidação funcional de genes. (Adaptado de FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005).
Farmacologia
A metabolômica tem uma gama de aplicações na área farmacêutica (figura 3),
tendo grande destaque as pesquisas para seleção de fármacos efetivos e seguros, a
identificação de marcadores biológicos de toxicidade e doenças e o entendimento
dos mecanismos de toxicidade (ROBERTSON, 2005).
Na seleção de fármacos efetivos e seguros, tem-se utilizado bastante os
ensaios “in vitro”. Isso porque este tipo de ensaio é mais rápido e mais fácil de ser
executado. Entretanto, por mais que se use no ensaio células do mesmo tecido onde
o fármaco irá atuar, essas linhagens celulares cultivadas não respondem da mesma
maneira do que as células que estão no organismo. Com isso, muitos dos fármacos
bem sucedidos nos ensaios in vitro acabam por fracassar nos ensaios in vivo por
provocarem efeitos colaterais indesejados, não observados anteriormente
(ROBERTSON, 2005).
22
Seleção
Ensaios de toxicidade in
vitro e in vivo
Síntese
Industrialização
Busca de marcadores
de toxicidade
Mecanismos de
toxicidade
Figura 3: Esquema padrão de desenvolvimento de fármacos indicando as principais etapas
seguidas. Em cada etapa estão indicados os locais onde a metabolômica pode ser aplicada.
(Adaptado de ROBERTSON, 2005).
Os ensaios “in vivo” certamente trazem resultados mais concisos quanto à
eficiência e à segurança dos fármacos. Entretanto, a sua utilização como método
primário para a identificação de fármacos promissores ainda é uma esperança para
um futuro próximo (ROBERTSON, 2005). Seguindo essa idéia, espera-se utilizar a
metabolômica como uma técnica padrão para diferenciar os efeitos colaterais
causados pelo fármaco daqueles causados por outros fatores. Outra vantagem
reside no fato de que a metabolômica permite a detecção de problemas causados
por fármacos de uma forma não invasiva – através da utilização de biofluidos como
a urina e sangue – facilitando a sua aceitação (ROBERTSON et al., 2002).
A identificação de marcadores biológicos de toxicidade utilizando-se a
metabolômica tem mostrado bons resultados (ROBERTSON, 2005; ROCHFORT,
2005). Essa aplicação teve seu início com a busca de marcadores biológicos para
doenças renais e hepáticas (ROBERTSON et al., 2000; NICHOLLS et al., 2001). À
medida que esses estudos foram avançando, foi constatado que uma série de
compostos sempre variavam, não importando a natureza do composto tóxico, seu
mecanismo de ação, ou mesmo seu alvo (ROBERTSON, 2005). Entretanto, a busca
por marcadores biológicos utilizando a metabolômica vai além desses compostos
comuns. A partir de análises comparativas foram detectados uma série de
compostos que estão relacionados à toxicidade renal e nervosa (ROBERTSON,
2005; ROCHFORT, 2005). Certamente, a maior parte do esforço em prol da
utilização da metabolômica para esse fim é realizada pelo COMET (Consórcio de
Metabolômica aplicada a Toxicologia). Esse consórcio visa montar um banco de
23
dados com milhares de espectros de RMN utilizando biofluidos de animais tratados
com toxinas modelo (ROBERTSON, 2005). Esse grupo é formado pela Imperial
College de Londres e mais seis companhias farmacêuticas que investem milhões de
dólares na seleção e produção de fármacos (ROCHFORT, 2005).
A outra grande aplicação da metabolômica dentro da farmacologia, senão a
maior, é no entendimento dos mecanismos de toxicidade, uma vez que
compreendendo esse mecanismo, os marcadores biológicos serão identificados
(ROBERTSON, 2005). Todavia, para a identificação de um marcador biológico, não
é necessário conhecer o mecanismo de toxicidade do fármaco. A maioria dos
trabalhos de metabolômica relacionados aos mecanismos de toxicidade tem
comparado os perfis obtidos pelas análises de biofluidos de animais submetidos à
utilização da toxina estudada aos perfis obtidos de animais não submetidos,
observando os efeitos provocados por essa toxicidade (HOLMES et al., 1998;
ROBERTSON et al., 2000; NICHOLSON et al., 2002; LENZ et al., 2003).
Nutrição
Assim como na farmácia, a metabolômica tem varias aplicações na área
nutricional. Como a dieta influencia diretamente no desenvolvimento do indivíduo, a
metabolômica possibilita conhecer os arranjos e desarranjos metabólicos causados
pela alimentação (GERMAN et al., 2005). Dessa forma, o papel que os componentes
alimentares desempenham na saúde e na doença, assim como os efeitos causados
pela falta ou excesso de determinados nutrientes podem muito bem ser conhecidos
pela metabolômica (WATKINS et al., 2001; GERMAN et al., 2003).
Nos alimentos, o número de compostos que não são nutrientes é muito maior
do que o número daqueles que são. Muitos desses compostos não nutrientes são
aqueles já descritos acima, os chamados metabólitos secundários (GIBNEY et al.,
2005). Além dos compostos advindos dos alimentos, deve-se considerar ainda
àqueles produzidos pela microbiota intestinal e àqueles produzidos ou adicionados
aos alimentos durante o cultivo ou o preparo (GERMAN et al., 2005; GIBNEY et al.,
2005). Essas moléculas possuem diversas atividades biológicas e, sem dúvida,
interagem de diversas formas dentro do organismo, alterando o metaboloma desse
indivíduo (ROCHFORT, 2005). Exemplos simples disso são: a detecção de vários
metabólitos oriundos do café em alta concentração na urina seis horas após a
24
ingestão; o aparecimento de vinte e três tipos de quercitinas (flavonóides) no sangue
após a ingestão de cebolas fritas, sendo que dezoito delas já são detectadas em
menos de quatro horas após a ingestão; entre outros (AHARONI et al., 2005;
GIBNEY et al., 2005). Muitas dessas moléculas possuem efeitos positivos ou
negativos sobre algumas doenças importantes, como o câncer (GIBNEY et al.,
2005). Como exemplos disso, podem ser citados: o álcool de perila, um
monoterpeno extraído do morango (Fragaria sp.), que tem atividade anticarcinogênica e alguns análogos do estrógeno encontrados em leguminosas que
podem interferir no tratamento do cancer de mama (CASSIDY, 2003; AHARONI et
al., 2005). A figura 4 mostra a distribuição dos compostos oriundos dos alimentos em
nutrientes e não-nutrientes e suas respectivas subdivisões.
De posse dessas informações acerca de como o organismo reage, na esfera
metabólica, aos diferentes compostos adquiridos pelo consumo dos alimentos, em
um futuro próximo será possível determinar a quantidade correta a ser ingerida de
cada alimento, sem incorrer em problemas causados pela falta ou excesso dos
diversos componentes que esses alimentos possuem (ASZTALOS et al., 2000;
PARKS e HELLERSTEIN, 2000; GERMAN et al., 2005).
Alimento
Nutrientes
Macro-nutrientes
Não-nutrientes
Micro-nutrientes
Contaminantes
Insumos agrícolas
Fitoquímicos
Defensivos
Figura 4: Esquema da divisão dos compostos oriundos dos alimentos em nutrientes e nãonutrientes, assim como suas respectivas subdivisões. (Adaptado de GIBNEY et al., 2005).
Ecologia e Evolução
Outro campo de notória aplicabilidade da metabolômica é a ecologia
(ROBERTSON, 2005; ROCHFORT, 2005). A utilização dessa plataforma nos
estudos com vegetais tem sido constante nos últimos anos (FIEHN et al., 2000;
25
ROBERTS, 2000; FIEHN, 2002; VIANT et al., 2003; WECHWERTH, 2003;
FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; RISCHER e OKSMAN-CALDENTEY, 2006). A
realização desses estudos visa entender, sobretudo, o mecanismo de ação de
compostos bioativos e a diferenciação de variedades selvagens daquelas
modificadas geneticamente (OTT et al., 2003; FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005;
MUNGUR et al., 2005; RISCHER e OKSMAN-CALDENTEY, 2006).
A metabolômica permite identificar os efeitos de compostos bioativos, como
os herbicidas, em plantas de interesse agronômico (ARANIBAR et al., 2001; OTT et
al., 2003). A partir de espectros de RMN realizados com extratos obtidos de
exemplares de milho (Zea mays) tratados com diversos compostos bioativos, como
o Glyphosate, entre outros, demonstraram a interferência desses compostos em
processos biológicos importantes, como a mitose, a fosforilação oxidativa e o
transporte de auxina (OTT et al., 2003).
A análise de organismos geneticamente modificados (OGM) pela
metabolômica tem sido extensamente utilizada (MUNGUR et al., 2005; KRISHNAN
et al., 2005; RISCHER e OKSMAN-CALDENTEY, 2006). Esse tipo de estudo prima
por detectar as diferenças imprevistas existentes entre a cultivar selvagem e a
transgênica. Essas diferenças imprevistas são explicadas pelas interações
randômicas ou desconhecidas que ocorrem entre os genes, assim como a
participação dos metabólitos em diversas rotas metabólicas (RISCHER e OKSMANCALDENTEY, 2006). A inserção de genes pode provocar um número elevado de
modificações no perfil metabólico de uma planta. De acordo com Mungur et al.
(2005), a inserção do gene oriundo da bactéria Escherichia coli que codifica a
enzima Glutamato desidrogenase em plantas de tabaco (Nicotiana tabacum) alterou
o perfil metabólico de duzentos e oitenta e três metabólitos nas raízes e noventa e
oito nas folhas da planta. Nesse estudo foi utilizada a ferramenta de fracionamento
FT-ICR-MS. Mesmo com a confirmação dos metabólitos correspondentes a apenas
42% dos íons detectados, foi comprovado o aumento da concentração de: alguns
aminoácidos, como a arginina, fenilalanina, triptofano, asparagina, glutamina e
histidina; alguns açúcares e derivados, sobretudo alguns intermediários na
regeneração da ribulose-5-fosfato no ciclo de Calvin; alguns metabólitos secundários
e compostos nitrogenados, como fenóis, alcalóides e aminas; entre outros. Além
26
disso, foi detectada a presença de cerca de trinta e dois compostos de importância
farmacêutica, entre eles nove compostos carcinogênicos e quatorze fármacos em
potencial (MUNGUR et al., 2005).
Outra aplicação da metabolômica na botânica reside no entendimento da
relação planta-patógeno. Ao serem parasitadas por insetos ou nematóides, por
exemplo, as plantas produzem e liberam uma série de compostos como fenóis,
terpenos ou alcalóides. Esse aumento de produção é induzido pelo contato com
sinalizadores químicos oriundos dos patógenos. Contudo, apesar de todas as
plantas reagirem ao parasitismo, nem todas produzem os metabólitos necessários
para o controle do patógeno. Dessa forma, a metabolômica pode ser aplicada na
identificação dos metabólitos diferenciais entre variedades resistentes e susceptíveis
a uma determinada praga. Esse tipo de trabalho já é largamente efetuado a nível
transcriptômico e proteômico. Entretanto, em se tratando de metabolômica, isso já é
bem mais incomum (FORST, 2006).
Adicionalmente, a utilização da metabolômica para a diferenciação de
organismos também vem sendo usada fora da botânica. Challis e Hopwood (2003)
compararam algumas espécies do gênero Streptomyces, organizando-as
evolutivamente a partir da presença de metabólitos secundários com efeito
antibiótico. Em outro exemplo, Viant et al. (2003) conseguiram diferenciar os
mariscos (Haliotis rufescens) normais dos portadores da síndrome de “withering”
utilizando espectros de RMN de diversos biofluidos.
Perspectivas para a metabolômica
Recebe o nome de repetitivo aquele resultado que é obtido mais de uma vez,
sob as mesmas condições, com os mesmos equipamentos e no mesmo laboratório.
É chamado de reproduzível aquele resultado que é obtido em condições parecidas,
com equipamentos similares e em um outro laboratório (FUKUSAKI e KOBAYASHI,
2005). A metabolômica atualmente tropeça em um problema que, de certa forma, é
comum a outras plataformas tecnológicas, como a proteômica ou a transcriptômica.
Esse problema é a falta de um protocolo padrão (ROCHFORT, 2005). Como cada
laboratório utiliza uma determinada seqüência de procedimentos com seus próprios
equipamentos, fica difícil de manter a reprodutibilidade, ou até mesmo a
repetitividade (ROBERTSON, 2005).
27
A falta de um protocolo padrão existe hoje porque as próprias ferramentas de
fracionamento da amostra e análise dos resultados necessitam ser melhoradas
(FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005; WECKWERTH e MORGENTAL, 2005). No
fracionamento, as ferramentas de maior sensibilidade esbarram na baixa resolução
dos resultados, enquanto aquelas que primam pela resolução, exigem uma grande
quantidade de amostra, limitando a sua utilização (ROBERTSON, 2005). Contudo, o
principal desafio a ser enfrentado pela metabolômica é desenvolver ferramentas
para comparar, entender e aplicar todo o conhecimento gerado por ela. Uma boa
parte dos dados obtidos é simplesmente rejeitada pela falta de uma tecnologia que o
entenda (MUNGUR et al., 2005; KRISHNAN et al., 2005; ROBERTSON, 2005).
Conhecer o perfil metabólico de um organismo por si só é importante, mas
não é suficiente. Faz-se necessária a integração das informações obtidas pela
metabolômica, proteômica, transcriptômica e genômica (ROBERTSON, 2005;
ROCHFORT, 2005, KLENO et al., 2004). Dessa forma seria possível prever como
uma supressão ou uma super expressão gênica influenciaria no perfil protéico e
metabólico, assim como também prever a influência de metabólitos inseridos no
organismo (alimentos e remédios, principalmente) na expressão gênica (FUKUSAKI
e KOBAYASHI, 2005; GIBNEY et al., 2005; ROBERTSON, 2005). Essa união de
esforços é o objetivo da Biologia de sistemas (ROCHFORT, 2005).
Considerações Finais
O desenvolvimento destas plataformas tecnológicas conhecidas como
“ômicas” tem trazido uma série de conhecimentos para a ciência. Sem dúvida, a
genômica é a mais desenvolvida. Isso porque ela já tem protocolos determinados e
ferramentas de fracionamento e análise dos resultados bem desenvolvidos.
Entretanto, ainda há muito que se descobrir e melhorar na genômica (BINNECK,
2004).
Contudo, muitas das reações e interações que definem um processo
biológico, a diferenciação de um organismo ou mesmo a interação entre vários seres
está fora da esfera genômica (GOODACRE, 2005; HÜTTENHOFER e VOGEL,
2006). Por isto que existe a necessidade de se desenvolver as outras plataformas
(HÜTTENHOFER e VOGEL, 2006; BINNECK, 2004).
28
Nem todos os fragmentos de DNA de uma célula representam um gene,
assim como nem todo gene vai dar origem a apenas um RNAm. A transcriptômica
tem a função de descobrir que genes estão sendo transcritos sob uma determinada
condição (NAKANISHI e NUREKI, 2005). Entretanto, as técnicas utilizadas para
esse fim não conseguem detectar todos os RNAm, deixando de fora aqueles
encontrados em concentrações muito baixas. Muitos desses podem estar
relacionados a processos regulatórios importantes, sendo responsáveis por codificar
as proteínas que iniciarão alguma importante modificação fisiológica da célula
(RIGOUTSOS et al., 2006; NAKANISHI e NUREKI, 2005; FRANK e HARGREAVES,
2003). Por isso os dados obtidos pela transcriptômica, apesar de muito importantes
e úteis, nem sempre refletem a expressão protéica da célula (BINNECK, 2004;
FEDER e WALSER, 2005).
O número de proteínas diferentes produzidas por um organismo excede e
muito o número de genes do mesmo. Isso se deve às várias modificações pós
transcricionais e traducionais que ocorrem com o RNAm e a seqüência de
aminoácidos produzida, respectivamente. Devido a esse aumento das variações
possíveis, torna-se mais trabalhoso conhecer o proteoma completo de um
organismo (VIVANCO et al., 2003). As técnicas utilizadas na proteômica, pelo
mesmo motivo, acabam por Ter problemas similares àquelas da transcriptômica. As
baixas concentrações de proteínas regulatórias e iniciadoras de processos
biológicos impedem, às vezes, a detecção destas (ROCHA et al., 2005; VIVANCO et
al., 2003). Mesmo com o desenvolvimento de novas estratégias, como por exemplo,
o pré-fracionamento da amostra ou a utilização de corantes altamente específicos,
ainda é muito difícil detectar tais proteínas (ROCHA et al., 2005; MÄDER, 2002).
A metabolômica foi criada para analisar um outro grupo de moléculas ainda
mais diversificado que o das proteínas. Estas moléculas são chamadas de
metabólitos (ROBERTSON, 2005; FIEHN, 2002). De acordo com a sua presença em
diferentes organismos, assim como a sua participação em rotas metabólicas
importantes, esses metabólitos são classificados em primários e secundários
(CHALLIS e HOPWOOD, 2003; HALL, 2006). Os primários são aqueles comuns a
qualquer célula e que participam de processos celulares importantes e que se
conservaram ao longo da evolução (SMEDSGAARD e NIELSEN, 2005). Os
29
secundários são aqueles encontrados somente em algumas famílias ou gêneros de
plantas e fungos e que estão relacionados às processos específicos, como a defesa
contra patógenos, ou mesmo à estrutura da célula (DIXON, 2001; CHALLIS e
HOPWOOD, 2003). As dificuldades para se conhecer todo o metaboloma de um
organismo, célula ou biofluido é ainda maior do que àquelas encontradas nas
análises de RNAm ou proteínas. Os metabólitos são estruturalmente muito diversos,
por isso necessitam da utilização de vários equipamentos de fracionamento (FIEHN,
2002). Além disto, eles são encontrados em concentrações muito variadas entre si,
tornando a detecção e a resolução de suas estruturas um processo muito difícil,
mesmo com equipamentos muito sensíveis (MUNGUR et al., 2005). Por fim, a
concentração deles é muito sensível a qualquer modificação fisiológica ou ambiental.
Isso faz com que os protocolos de preparo e fracionamento das amostras possuam
baixa reprodutibilidade, ou mesmo, repetibilidade (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005).
Assim como as outras plataformas referidas anteriormente, a metabolômica
possui uma série de etapas. Em todas elas, uma série de fatores pode causar erros
experimentais que afetariam diretamente o resultado da pesquisa. Além disto, os
trabalhos de metabolômica exigem uma série de equipamentos muito caros e,
principalmente, profissionais altamente capacitados para manipulá-los (FUKUSAKI e
KOBAYASHI, 2005; ROCHFORT, 2005; WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005).
Estes fatores limitam os trabalhos de metabolômica aos grandes centros de
pesquisa, onde já existem esses pré-requisitos (ROBERTSON, 2005).
A metabolômica tem sido empregada em várias áreas da ciência e para
diversos fins. Na farmacêutica, sobretudo na parte de toxicologia e desenvolvimento
de fármacos, a metabolômica está sendo empregada para se identificar marcadores
biológicos de toxicidade ou doenças, no entendimento do mecanismo de ação de
várias toxinas e na seleção de fármacos efetivos e seguros (ROBERTSON, 2005;
WECKWERTH e MORGENTHAL, 2005). Na área nutricional, a metabolômica pode
ser aplicada para se conhecer os efeitos que os compostos não nutrientes que estão
presentes no alimento causam no indivíduo, assim como entender os efeitos
causados pela falta ou excesso de determinado nutriente na manutenção da saúde
ou no desenvolvimento de doenças (GERMAN et al., 2003; GIBNEY et al., 2005;
WATKINS et al., 2001). Na área ecológica, a metabolômica tem sido aplicada,
30
sobretudo, na detecção de alterações imprevistas em OGM, demonstrando que a
inserção de apenas um gene pode alterar a concentração de centenas de
metabólitos, assim como levar à produção de dezenas de compostos de importância
farmacêutica (MUNGUR et al., 2005). Além disso, essa plataforma tecnológica pode
ser aplicada na identificação dos metabólitos que diferenciam variedades de uma
planta de interesse agronômico que são resistentes a uma determinada praga
daquelas que são susceptíveis. Entretanto, a aplicação da metabolômica na ecologia
ainda abrange outros campos, como por exemplo, a diferenciação de espécimes
normais daqueles portadores de doenças, de uma forma não invasiva (CHALLIS e
HOPWOOD, 2003) ou o efeito de compostos bioativos em plantas de interesse
agronômico (OTT et al., 2003; ARANIBAR et al., 2001). Na evolução, a
metabolômica pode ser aplicada na organização evolutiva de diferentes espécies de
um mesmo gênero a partir do perfil metabólico (VIANT et al., 2003).
Na metabolômica ainda há muito que se desenvolver. A primeira coisa a ser
feita é estabelecer um protocolo padrão (FUKUSAKI e KOBAYASHI, 2005). Uma vez
que cada laboratório desenvolve seus projetos a sua maneira, fica complicado
reproduzi-los. Porém, o mais importante a ser melhorado, tanto para a metabolômica
quanto para as outras plataformas tecnológicas, são as ferramentas de
fracionamento e análise das amostras, principalmente as do segundo grupo
(ROBERTSON, 2005).
As informações obtidas pela metabolômica são de grande valia em qualquer
das áreas já citadas. Entretanto, a integração dessas informações com aquelas
obtidas pelas outras plataformas tecnológicas (proteômica, transcriptômica e
genômica, principalmente) trará muito mais avanços no que tange relacionar o
genótipo e o fenótipo dos organismos (ROCHFORT, 2005; BINNECK, 2004).
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