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NOVAS HIERARQUIAS
conhecimento, gênero e etnia
Dayse de Paula Marques da Silva*
RESUMO
Este texto vai destacar a constituição de identidades no espaço sociocultural
das construções simbólicas e a configuração de hierarquias pouco
consideradas no espaço do conhecimento. São elas as hierarquias
profissionais perpassadas pelas relações de gênero e etnia.
Já discorreram longamente sobre essas desigualdades no quadro latinoamericano, onde não se conseguiu alcançar um patamar “liberal” de acesso à
“educação para todos”, em muitas regiões. Os índices de analfabetismo no
Brasil ainda são alarmantes, considerando todas as políticas implantadas
com o fim de erradicá-lo. Entretanto, sem dúvida, esse problema atinge mais
a determinados contingentes da população do que a outros, como, por
exemplo, mulheres, negros, indígenas, imigrantes de países mais pobres.
Estes constituem grupos cuja cidadania deve passar por “visto permanente”.
ABSTRACTS
This text will emphasize the formation of identities in the social and cultural
space of the symbolic constructions and the configuration of the professional
hierarchies not very much considered in the knowledge field. These
professional hierarchies permeate the relationships of Gender and Ethnic
groups. The discussion about these inequalities in Latin-America is very old,
but we know that in some regions, people is not succeeding to reach even a
“liberal” level of access to “education for everybody” . The illiteracy rates in
Brazil, are still alarming, even considering the policies implanted in order to
eradicate it. However, this issue affects more certain groups of the population
like women, black people, native Brazilian, and immigrants. These groups
were not granted yet with a “permanent visa”.
1 INTRODUÇÃO
Este texto vai destacar a constituição de identidades no espaço sociocultural das
construções simbólicas e a configuração de hierarquias pouco consideradas no espaço do
conhecimento. São elas as hierarquias profissionais perpassadas pelas relações de gênero
e etnia.
A formação universitária há muito enfrenta dilemas tais como a dicotomia entre
as demandas do mercado e as de uma formação humanista, de conhecimento geral, que
prepare o indivíduo para se colocar diante do mundo a partir de uma visão consciente e
mais autônoma sobre a realidade. Esta é uma polêmica mais acirrada nos cursos da área de
ciências humanas onde, as disciplinas filosóficas e as teorias sociais do conhecimento
entram em choque com uma visão meramente operacional da formação técnico-científica,
como é mais freqüente nas áreas das ciências exatas e tecnológicas. Além disso, o
interesse “utilitário” na formação educacional, objetivando, apenas, a ascensão social, é alvo
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Assistente Social, Doutora em Sociologia
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de muitas críticas dos grupos de educadores e intelectuais, cujo discurso centra-se na
superação de uma lógica econômico-política injusta e desigual.
Já discorreram longamente sobre essas desigualdades no quadro latinoamericano, onde não se conseguiu alcançar um patamar “liberal” de acesso à “educação
para todos”, em muitas regiões. Os índices de analfabetismo no Brasil ainda são
alarmantes, considerando todas as políticas implantadas com o fim de erradicá-lo.
Entretanto, sem dúvida, esse problema atinge mais a determinados contingentes da
população do que a outros, como, por exemplo, mulheres, negros, indígenas, imigrantes de
países mais pobres. Estes constituem grupos cuja cidadania deve passar por “visto
permanente”. Não basta saber assinar o nome, ter a carteira de trabalho assinada, ter o
certificado de expertise. Caso venham a passar por alguma dessas “fronteiras”, serão
“checados” sempre, postos em julgamento sobre a sua legitimidade, competência e
legalidade. Parecem clandestinos permanentes, porque ousaram sair dos seus “lugares de
origem”. Lugar de índio é na tribo, lugar de mulher é na cozinha ou na cama, lugar de negro
é na senzala, lugar de imigrante é no seu país. Como diz a antiga frase popular: “Cada
macaco no seu galho”.
É interessante pensar na imagem que nos sugere. A árvore está lá, sendo
composta pelo tronco, galhos, folhas e raízes para ser completa e, sendo boa, dará frutos...
Mas os macacos estão posicionados conforme uma hierarquia. Pular para o galho vizinho
poderá provocar hostilidades.
Buscar as origens desse fenômeno – o surgimento das
hostilidades e seus desdobramentos -- vem sendo objeto da História e demais disciplinas
das ciências humanas. Devemos considerá-lo ao colocarmos em perspectiva o discurso da
interdisciplinaridade, não para “reacender” hostilidades, mas para termos clareza de que o
vizinho é sempre o vizinho, que deve pedir licença educadamente ao entrar no terreno,
respeitando as plantações, os jardins, as construções, os objetos de estima, mas,
principalmente, as pessoas que moram lá. Há quanto tempo estão lá, o que têm a nos dizer,
o que têm a nos mostrar? Não pode ser, apenas, “o que têm para me dar em troca”?
Certamente, os grupos estabelecem relações de interesse que precisam ser discutidas com
mais profundidade e ter maior visibilidade quanto às suas diferenças, para que a integração
não se faça de forma fictícia - “para inglês ver...”, citando outra frase popular. Este processo
estabelece hierarquias, algumas veladas, não admitidas, que excluem sujeitos de
determinados espaços, sendo absorvidas como “escolhas” baseadas em características
próprias, naturalizadas, como as de gênero, faixa etária etc. Aquelas referentes à raça e
etnia vêm sendo, nos últimos tempos, “politicamente” mais fiscalizadas.
Entretanto, as
estatísticas mostram as desigualdades na reduzida participação de negros e ameríndios, por
exemplo, nos espaços educacionais. Esta situação, em geral, está associada à inserção
destes grupos nos estratos sociais mais baixos, mas os “critérios” de exclusão também se
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expressam nos valores culturais impregnados e absorvidos, muitas vezes, pelos próprios
sujeitos, que não “buscam” ocupar outro lugar. A partir destas considerações, propõe-se um
recorte específico na abordagem das políticas educacionais – a das hierarquias de gênero
e etnia no campo da formação educacional de nível superior e a difícil percepção do
problema no debate das “escolhas” por carreiras universitárias.
A pesquisa vem sendo desenvolvida no Serviço Social – uma profissão
tradicionalmente feminina -- e na Medicina – uma profissão marcadamente masculina, mas
que vem sofrendo alterações fundamentais na sua composição, observando-se uma
crescente inserção de mulheres nos últimos anos. Estão colocadas de forma polarizada na
hierarquia das carreiras, observando-se uma outra diferença entre elas – a composição
étnica. Vem aumentando significativamente o número de estudantes negras no Serviço
Social, permanecendo uma maioria quase absoluta de brancos na Medicina. Portanto, os
pressupostos para fazer o estudo comparativo são: a tradição da composição feminina de
uma e o processo de feminilização da outra; a posição diferenciada na hierarquia das
carreiras; as disparidades no poder aquisitivo dos seus candidatos e a composição étnicoracial diversa.
2 QUALIFICAÇÃO E NÍVEL DE ESCOLARIDADE
A qualificação da força de trabalho é um ponto fundamental desse debate. Ela
vem constituindo-se o principal critério para alocação dos sujeitos sociais no mercado e
explica, primeiramente, a distribuição da mão-de-obra nos diversos setores da estrutura do
emprego.
As primeiras considerações sobre a segmentação da força de trabalho tiveram
como parâmetro o nível de qualificação exigido para o desempenho da função. Conforme
foram introduzidas mudanças no processo de produção, principalmente a partir do avanço
da tecnologia, verificaram-se alterações profundas na organização dessa estrutura. A
inovação tecnológica provocou a extinção de postos de trabalho e o surgimento de outros. A
mão-de-obra deslocou-se nesse espaço a partir de sua qualificação, e novas exigências se
apresentaram quanto ao seu preparo e habilidade. Essas exigências se colocam de forma
diferenciada para homens e mulheres.
Nos setores onde o contingente feminino é majoritário, torna-se muito freqüente
a associação entre as habilidades naturais da mulher e as características da atividade
desempenhada no mercado de trabalho. A qualificação formal, que se constitui em
aprendizado legitimado pelo treinamento sistemático no sistema escolar e reconhecido
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socialmente como mais “competente”, específico, sofisticado, tende a ser minimizada em
favor dessas aptidões consideradas femininas. É como se não precisasse de muito
empenho fora do lar para fazer bem aquela tarefa. Daí, o serviço não ser tão valorizado, e
as hierarquias de gênero começarem a se configurar no processo de trabalho.
Entretanto, é necessário levar em conta as reflexões desenvolvidas sobre a
alienação do sujeito social na organização moderna do trabalho. Há uma avaliação
“negativa”, em geral, quanto à própria natureza das atividades produtivas: pouco criativas,
repetitivas, controladoras, tirando toda a autonomia do indivíduo quanto ao seu
desempenho. Inclusive, foram essas características que fundamentaram projeções muito
pouco animadoras a respeito do futuro da força de trabalho, que tenderia, inexoravelmente,
à degradação e à subutilização de seu potencial pelos interesses em jogo no mercado
(BRAVERMAN, 1981). Enfim, a desvalorização da força de trabalho não apresentaria, a
princípio, uma determinação de gênero. A própria dinâmica do mercado provocaria esse
quadro tão desfavorável aos sujeitos envolvidos na produção como assalariados.
Apesar disso, observamos algumas “surpresas” nesse percurso. O surgimento
de novas tecnologias implica pessoal qualificado para viabilizá-las, manipular máquinas
diferentes das anteriores. A informática vem-se constituindo um fator de grande mudança no
processo produtivo, demandando formação específica em sua linguagem e na utilização do
seu equipamento. Nesse sentido, a qualificação toma uma importância fundamental no que
se refere ao destino mais promissor ou não da mão-de-obra. Os empregadores mostram
interesse em investir nessa qualificação. O mercado contemporâneo apresenta uma
flutuação provocada por mudanças tecnológicas que, em alguns setores, refletem taxas
maiores de desemprego, mas também é resultado de colapsos de demanda, estoques
excessivos, problemas que começam a ser enfrentados com propostas extremamente
inovadoras de organização do processo produtivo, tais como a especialização flexível,
rotatividade da mão-de-obra dentro da própria empresa e investimento na sua qualificação.
Tais mudanças apresentam ainda propostas de uma participação mais efetiva dos
empregados em grupos de decisão.
O que os estudos sobre o gênero vão mostrar é que essas alterações atingem
de forma diferenciada homens e mulheres. A qualificação é um ponto de distinção muito
freqüente entre eles. As mulheres se localizam em setores menos qualificados ou
desempenham tarefas que são menos valorizadas1. O questionamento da natureza da
atividade produtiva como essencialmente masculina ou feminina, como mostra o estudo de
Rodrigues (1992), argumentando uma certa homogeneidade de funções e uma não
1
“Embora existam tais tarefas não taylorizáveis para homens, no caso deles, isso resulta numa valorização
muito grande da tarefa e de seu executante, em termos de salário, prestígio, situação privilegiada de
‘insubstituibilidade’ etc. Ao colocar uma mulher nesse tipo de tarefa, não se corre o risco de nenhuma dessas
conseqüências.” (RODRIGUES, 1992, p. 277)
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correspondência imediata com a dinâmica doméstica, demonstra que essas diferenças se
pautam muito mais na necessidade de dar um sentido à organização da produção,
implicando em manter hierarquias e, conseqüentemente, relações de poder com base no
simbólico, do que uma fundamentação concreta em diferenças perceptíveis entre homens e
mulheres com base no biológico.
A qualificação pelo sistema de ensino formal é um fator concreto de
diferenciação entre eles, mas não escapa à reprodução simbólica de valorizações de
aptidões conforme o gênero. O aumento do nível de escolaridade na população brasileira
vai definir novos contornos na mão-de-obra, porém o olhar sobre esse fenômeno deve estar
atento para as trajetórias diferenciadas entre homens e mulheres no sistema escolar.
O acesso aos recursos educacionais amplia as chances de inserção no mercado
de trabalho em condições mais vantajosas, desde que a qualificação e a aquisição de
conhecimentos institucionalizados e específicos definam o desempenho de determinadas
funções na estrutura do emprego em seus respectivos setores: primário, secundário e
terciário. Nesse sentido, compreender as mudanças na distribuição da força de trabalho
implica diretamente considerar a ampliação do sistema educacional no interior da arena dos
interesses econômicos e político-sociais, onde a mobilidade social é colocada como um
ponto de interseção entre as forças em conflito. Certamente, a mobilidade social se
apresenta com potencial diverso para os estratos sociais que compõem a organização da
sociedade. Portanto, conforme sua posição na estrutura econômica, os sujeitos sociais terão
mais ou menos chances de se qualificarem melhor ou não para os postos de trabalho
demandados pelo mercado e hierarquicamente delimitados. O capital cultural exigido por
esse mercado dependerá do capital econômico a que os grupos sociais envolvidos em
determinados espaços sociais têm acesso.
Tradicionalmente, o projeto da mobilidade social era prioridade do sujeito do
sexo masculino na família. A universalização do ensino ampliou o acesso à educação
básica, não apenas para os estratos mais baixos da população, mas também para as
meninas, oferecendo-lhes uma alternativa de participar desse projeto, independentemente
do casamento. Entretanto, os estudos sobre a trajetória escolar entre meninos e meninas
mostram diferenças significativas nem sempre observadas pelos pesquisadores que se
interessam pelo estudo da expansão da educação e sua relação com os níveis de
desenvolvimento social, propondo políticas públicas quanto a esse tema. Quando tais
pesquisadores não desagregam o sexo nos seus levantamentos, deixam de observar
comportamentos de gênero importantes, como vão ser destacados por Anyon (1990) e
Rosemberg (1992) ao estudarem as diferenças entre meninos e meninas no sistema
escolar.
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Rosemberg (1992) observou que a maioria dos que evadem da escola aos 12-14
anos é do sexo masculino. As meninas tendem a permanecer na escola, tendo em vista a
prioridade de os meninos se inserirem no mercado de trabalho. Nesse sentido, as meninas
usufruem de maior vantagem no que diz respeito à formação escolar. De qualquer modo, é
importante levar em conta que essa trajetória para as meninas de famílias de baixa renda
não vai muito além do 1º grau por limitações do próprio sistema escolar. Portanto, as
expectativas quanto à mobilidade social ficam muito reduzidas, considerando que o maior
sucesso desse projeto está condicionado a uma qualificação mais extensa e sofisticada.
Entretanto, as mulheres desse grupo terão mais chances de se inserir em melhores
condições no mercado do que os homens que tiveram o seu percurso educacional
interrompido por necessidades de sobrevivência, colocadas pela família de origem. O
acesso ao ensino superior não se amplia na mesma proporção que o ensino básico,
revelando, ainda, uma fronteira social bem demarcada na realidade brasileira. A expansão
das matrículas na universidade na década de 1970, a partir da reforma universitária no
Brasil, apesar de alterar o perfil socioeconômico dos alunos de alguns cursos, mantém-se
como um ideal de mobilidade difícil de alcançar para grande parte da população.
A qualificação oferecida pela universidade coloca uma distinção de imediato para
a força de trabalho, conferindo um grau de prestígio bem mais elevado que a qualificação
em nível básico ou médio, engendrando hierarquias na estrutura do emprego que passam
por critérios de excelência da mão-de-obra.
Aparentemente, conseguindo-se superar essa barreira social e conquistando-se
a qualificação profissional, o único e difícil obstáculo a ser superado seria o da
competividade do próprio mercado de trabalho. Enfrentadas as barreiras de ordem
socioeconômica, a mão-de-obra se colocaria em condições igualitárias de competividade no
mercado. Entretanto, como é possível observar, trajetórias diferenciadas quanto ao gênero,
no sistema de ensino elementar, também serão verificadas nos cursos superiores, e essas
diferenças vão repercutir na distribuição da força de trabalho no mercado.
Partindo do pressuposto de que qualificação e gênero constituem-se critérios de
organização do sistema produtivo nos seus vários níveis, esse processo delinea a evolução
da participação da mulher no mercado de trabalho e, particularmente, sua inserção nas
atividades de maior prestígio - as profissionais.
3 AS HIERARQUIAS DE GÊNERO E ETNIA NAS CARREIRAS UNIVERSITÁRIAS
Apesar do aumento de matrículas femininas registrado nos cursos universitários
nas últimas décadas, não há uma distribuição homogênea por áreas de conhecimento.
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Evidencia-se uma concentração de mulheres nas de baixo prestígio e uma associação entre
a sua inserção e a “desvalorização” da área escolhida, constituindo-se as chamadas
profissões femininas. A mesma tendência surge nos estudos que buscam dimensionar o
acesso dos negros ao ensino superior, no Brasil. Entretanto, outro problema vem sendo
apontado neste caso – o da evasão, a dificuldade de permanência no curso ou uma
trajetória acadêmica cheia de obstáculos, fato que tem levado à sustentação da proposta da
“participação afirmativa”.
O Serviço Social constitui-se, historicamente, como uma “profissão para
mulheres” e não mostra nenhuma tendência de mudança significativa quanto ao seu perfil
de gênero. A medicina, hoje, já mostra outro quadro. Começa o debate sobre a feminilização
da profissão, pois o número de matrículas de homens e mulheres vem-se equiparando nos
cursos. Entretanto, observa-se uma concentração de mulheres nas especialidades médicas
de baixo prestígio. Embora este grupo de mulheres seja mais preparado do ponto de vista
educacional, tenha sido selecionado para um curso universitário extremamente competitivo,
tenha melhor desempenho que seus colegas masculinos na formação, ainda assim, se
estabelecem de forma inferiorizada na estrutura do emprego (MARQUES, 1998).
4 A ETNIA E A CLASSE NA CONFIGURAÇÃO PROFISSIONAL
As diferenças étnicas2 e de classe social nos dois cursos universitários são
visíveis. Nos últimos anos, vem-se observando uma inserção bem mais acentuada de
negros no Serviço Social do que na Medicina.
Damos destaque aqui à inserção dos negros brasileiros, tendo em vista o seu
aumento nos cursos universitários, grupo historicamente segregado, fato que vem sendo
acentuado em algumas análises que colocam em debate os mecanismos de exclusão
social. Entretanto, o estudo pretende dimensionar a inserção de outras origens nos cursos
em foco, como, por exemplo, a de estrangeiros ou seus descendentes.
Considerando a trajetória dos negros no Brasil e os mecanismos de exclusão
existentes, as chances de ingresso em cursos competitivos como a Medicina diminuem
bastante 3. As exigências da formação - uma seleção rigorosa, implicando um preparo
2
Utilizamos o termo etnia nesse trabalho enquanto conceito que revela diferenças socioculturais de agrupamentos, com base
não apenas na cor, mas também nas origens regionais e nacionais desses agrupamentos dentro de um determinado espaço
geográfico. Estamos incluindo um olhar para as manifestações religiosas, principalmente porque o curso de Serviço Social
apresenta em sua trajetória uma forte influência de formação nesse campo.
3
“Os trabalhos aqui realizados apontaram para o fato de que ser negro no Brasil hoje significa ocupar os estratos mais baixos
da hierarquia social, o que representa possuir níveis inferiores de instrução, de ocupação e de renda (Valle Silva e Hasenbalg,
1991). Em outros termos, os negros estariam destinados pela sociedade a viver nas piores condições de vida. O que, parece,
perpetuaria esse estado de coisas seria o fato de que também o negro ver-se-ia excluído das possíveis aberturas que a
estrutura social ofereceria à mobilidade social ascendente, via sistema formal de ensino e mercado de trabalho.” (TEIXEIRA,
Moema de Poli , 1998).
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educacional anterior, dedicação em tempo integral, material de estudo de custo alto e
mensalidades muito caras (caso houvesse tentativa nas instituições de ensino privadas) influenciam na escolha de carreiras em áreas mais acessíveis, como a de Ciências
Humanas. A estrutura dos cursos universitários neste último campo favorece a entrada de
grupos sociais de poder aquisitivo mais baixo, pois os critérios seletivos correspondem mais
à sua demanda. O Serviço Social teve uma mudança significativa no perfil socioeconômico
dos seus profissionais. As primeiras assistentes sociais pertenciam a estratos sociais
elevados. Conforme foram ampliando-se as chances de ingresso no curso - surgimento de
escolas sob a responsabilidade do Estado e gratuitas -, percebe-se uma alteração
fundamental nesse perfil profissional. Há um rebaixamento paulatino do poder aquisitivo dos
candidatos, encontrando-se, hoje, uma participação significativa de estratos sociais que
correspondem aos níveis mais baixos de renda.
5 CONCLUSÃO
Considerando os itens em discussão - etnia e classe -, o Serviço Social tende a
permanecer numa posição inferior à Medicina na hierarquia profissional. Entretanto, as
mudanças que se operam nessa última, tanto no movimento mais amplo que atinge as
profissões liberais - assalariamento, perda de autonomia, aumento excessivo de instituições
de ensino, fatores que levam a uma queda da qualidade da formação e inserção no
mercado de trabalho - como aquelas relativas ao gênero, têm provocado oscilações no
patamar do status profissional.
No Brasil, as implicações das relações de gênero vêm
sendo subestimadas em ambos os campos profissionais. Associar essas dimensões em
cursos universitários com prestígio tão extremo, mas com interfaces importantes na sua
função social implica, a nosso ver, uma análise mais profunda sobre os mecanismos
geradores de hierarquias no mercado de trabalho. O processo de feminilização da Medicina
aproxima-a do Serviço Social, quando se verifica uma reprodução de relações assimétricas
entre homens e mulheres na escolha da especialidade médica. É esse ponto de interseção
que a pesquisa vem enfatizando, o que não pode ser analisado sem relacioná-lo aos itens
aqui discutidos, pois são dimensões que interagem, formando níveis diferenciados de
hierarquias.
Investe-se, também, numa perspectiva de enfrentamento das desigualdades,
dando-se destaque, inclusive, às relações de poder interprofissionais, e coloca-se em
debate a legitimidade e importância de algumas funções que se concentram no setor dos
serviços e cuja expansão, no Brasil, se deve ao crescimento e gestão do Estado na área da
saúde.
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Reconhecendo
que
essas
hierarquias
estão
presentes
nas
estruturas
educacionais e, mais especificamente, no ensino superior, talvez, torne-se mais fácil
enfrentar
as
demais,
entre
regiões
no
continente
sul-americano,
composto
por
nacionalidades, mulheres e homens, jovens e velhos, negros, índios, portugueses,
espanhóis, holandeses, alemães, judeus, árabes, libaneses, japoneses, chineses, incas,
astecas.
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