Caso em Análise
Banco Marka e
Banco Fonte-Cindam
Rodrigo F. Fragoso
Rio de Janeiro, setembro de 2008
ESCOLA DE DIREITO DO RIO DE JANEIRO DA FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS
AULA 3
Leitura e debate do texto da BM&F sobre a
desvalorização cambial (disponibilizado na
Wiki)
Exame dos argumentos de defesa.
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Personagens do processo:
(1) “Banqueiros”: Acionistas, administradores e
funcionários dos bancos Marka e Fonte-Cindam.
(2) “Servidores do BC”: Presidente e demais membros
da diretoria do Banco Central que participaram da
operação.
(3) “Intermediários”: Pessoas suspeitas de corromper
“servidores do BC” para repassar informações
privilegiadas aos “banqueiros”.
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A defesa dos “Banqueiros”
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• Ponto 1: As operações obedeceram aos
regulamentos da BM&F. Os contratantes
apresentaram todas as garantias exigidas
pela BM&F.
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Ponto 2: Imprevisibilidade de uma desvalorização de
70%:
• em dezembro/98, Governo publicou um “Memorando
Técnico de Entendimentos”, prometendo rigidez das
políticas monetária e fiscal, bem como a manutenção do
regime de câmbio no ano de 1999.
• Prestigiadas empresas de consultoria econômica faziam
prognósticos de que não haveria desvalorização. (ex.,
Tendências, Prof. Maílson da Nóbrega)
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• Ponto 3: Único ato não configura crime de “gestão”
fraudulenta ou temerária.
Juliano Breda: “embora alguns autores sustentem a
tipicidade de um ato fraudulento isolado, a interpretação
mais correta é a que exige a reiteração dos atos
criminosos, até pela gravidade da sanção aplicada.”
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Ponto 4: Sobre a operação Stock-Maxima/Innovation Fund:
• Operação foi previamente informada ao BC e à BM&F.
Objetivo: BC decidiu evitar problemas de liquidez de
uma instituição brasileira no exterior.
• USD 181 mil é o saldo restante, e não o valor total dos
compromissos do Marka Bank na Bolsa de Chicago.
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Ponto 5: Sobre os saques nos fundos Marka Nikko
em 13 e 14.01.99:
• Os acusados e seus parentes não fizeram saques.
• Os saques ocorridos obedeceram aos regulamentos dos
fundos, igualitário para todos os cotistas.
• No dia 18.01.99, foram suspensos os saques porque o
BC deixou o dólar flutuar.
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Ponto 6: Sobre alterações no balanço de 1998 do
Banco Marka:
• O balanço só é considerado acabado quando
assinado e aprovado em assembléia, com
parecer da Auditoria. As declarações de rendas
também permitem, enquanto não são
entregues, uma série de retificações. Os
“exercícios” não configuram “manipulação”
porque foram feitos internamente no sistema.
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Ainda sobre as alterações no balanço:
•
O plano contábil das instituições financeiras (“COSIF”)
permite tais ajustes. Obs.: O COSIF contém as
normas e os procedimentos que padronizam as
demonstrações financeiras das instituições do Sistema
Financeiro Nacional. (Carta-Circular n.º 1273 BACEN)
•
A KPMG deu parecer no sentido de que não era
possível publicar o balanço com o PL de dezembro de
1998 porque o Banco Marka já estava em processo de
liquidação.
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A defesa dos “Servidores do BC”
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Ponto 1: o risco sistêmico.
BC Europeu: “evento no qual a divulgação
de uma má notícia sobre uma instituição
financeira, ou mesmo sua falência, ou a
quebra de um mercado financeiro leva, de
forma sequencial, a consideráveis efeitos
adversos em uma ou mais instituições ou
mercados”.
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b) Desvalorizações cambiais anteriores resultaram
em quebras de bancos e empresas em várias
economias emergentes (México, Tailândia,
Coréia, Indonésia, Rússia e Argentina).
c) A decisão foi tomada em situação de extrema
anormalidade. Min. Pedro Malan concordou com
a necessidade e adequada finalidade de
preservação do SFN.
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Ponto 2: BC salvou, na verdade, a
credibilidade da própria BM&F:
• a) Preocupada em proteger sua imagem
pública, BM&F procurou desviar atenção
do seu risco de quebra. Bancos
pequenos, mas posições grandes.
Fragilidade dos mecanismos de defesa
para absorver os R$ 1,5 BI.
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Opções do Clearing BM&F:
• (1) executar as garantias (Marka-R$ 78,4MM e Fonte-R$
25,6MM);
• (2) executar títulos patrimoniais dos membros de
compensação (Banco Theca-PL de R$ 15MM);
• (3) executar fundos de liquidez, de liquidação e de
garantia (R$ 28MM, R$ 42,3MM e R$ 53MM,
respectivamente); e
• (4) executar o PL da própria BM&F (R$ 423,5MM).
• Total: R$ 723MM
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Conclusão
Sem recursos suficientes (R$ 723MM)
para cobrir o prejuízo (R$ 1,5BI),
restariam duas opções à BM&F: quebrar
ou liquidar compulsoriamente as
posições compradas.
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Por que era preciso salvar a BM&F?
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• Os compradores (vencedores)
simplesmente não receberiam seus
ganhos por causa da liquidação
compulsória dos contratos. Severo golpe
na confiabilidade do “hedge”. Haveria
desestabilização porque os compradores
acabariam migrando para outras
operações (p.ex., aquisição descontrolada
de dólares à vista).
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•
BM&F era uma das “ferramentas” da política
cambial. Desde 1994, o Governo era o maior
vendedor de dólares futuros na BMF. Isto
gerava uma garantia “implícita”. Inadimplência
na BM&F geraria sensação de que o próprio
Governo inadimpliu.
•
BC como “garantidor” do Sistema Financeiro
Nacional. Prevaricação por omissão, caso não
garantisse a liquidez da BM&F.
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Ponto 3: BC vendeu dólares acima da
cotação para os bancos.
• Obs.: Mercado futuro negocia expectativa.
As cotações dos mercados à vista e
futuros só se igualam no dia do
vencimento.
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• No pregão do dia 14, BC vendeu para
outros comitentes 3,2 mil contratos de
dólar futuro a R$ 1,25. Ainda no dia 14,
após o pregão, BC vendeu para Marka e
Fonte a 1,27 e 1,32, respectivamente. No
dia 19, pregão fechou a 1,50. BC vendeu
para Marka Nikko a R$ 1,56/dólar.
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Ponto 4: Sobre o Peculato:
• BC é “guardião” do SFN, sua finalidade
precípua não é lucrativa. (Lei. 4595/64)
• Mesmo assim, o BC lucrou ao preservar as
reservas em dólar, deixando o câmbio flutuar.
Logo, não houve desvio de dinheiro público
porque, no cômputo geral, o BC não teve
prejuízo.
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Ponto 5: Sobre a Prevaricação:
• O dever de ofício do Banco Central é manter a
higidez do Sistema Financeiro Nacional.
Liquidação extrajudicial é um dos instrumentos
para tal mister, e não o único.
• A liquidação extrajudicial desestabilizaria o SFN
porque implicaria na suspensão da exigibilidade
das obrigações, de acordo com arts. 6 e 18 da
Lei 6024/74).
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(ainda sobre prevaricação)
•
No dia 14 (dia da operação), os bancos não
estavam com PL´s negativos porque a cotação
do dólar futuro era R$ 1,25/dólar. A situação
de PL negativo só aconteceria com a cotação
R$ 1,27/dólar e quando as instituições
inadimplissem com os ajustes e garantias
“chamadas de margem” da BM&F.
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(ainda sobre prevaricação)
•
Após a operação, a liquidação
extrajudicial também não seria cabível
porque ausentes os pressupostos legais.
Não houve favorecimento porque os
PL´s dos bancos foram zerados. Os
bancos, aliás, se submeteram à autoliquidação.
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A defesa dos “Intermediários”
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Ponto 1: Sobre a viagem a Brasília:
• aceitaram o convite porque eram consultores do Banco
Marka. RN voltou no mesmo dia em vôo comercial.
Cacciola pediu que LAB intercedesse junto ao
Presidente Francisco Lopes para que fosse recebido
pela Diretoria do BANCO CENTRAL.
• LAB só encontrou Francisco Lopes no dia 14. A decisão
de socorro teria sido tomada na véspera (dia 13),
portanto antes do encontro. Francisco teria recusado
encontro com Cacciola.
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Ponto 2: Sobre as Informações privilegiadas:
• Perícia concluiu que não houve ligações entre os
números telefônicos indicados pela revista. Banqueiro
estrangeiro, fonte da “Veja”, não foi ouvido e nem
identificado no processo. Se existissem privilégios, os
Bancos Marka e Fonte não teriam quebrado.
• No dia 12, outras instituições mudaram de posição (de
vendida para comprada), na ordem de USD 1 Bi. Logo,
houve “tempo hábil” para repasse de informações
ilícitas.
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Ponto 3: Sobre o Enriquecimento ilícito:
• RN provou ter trabalhado na área de “corporate”
do Banco Pactual. Se fosse insider, receberia
remuneração informal. IRPF demonstra
resultado negativo no campo “ganhos com
renda variável”. Entre dez/98 e abr/99 também
não houve acréscimo patrimonial. Fato
inexplicável para quem detivesse informações
privilegiadas desde 1997.
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•
LAB alegou que enviou as mensagens
via fax somente porque queria
“impressionar” a ex-namorada, que era
uma mulher rica. O automóvel
VW/Passat foi comprado em espécie
porque foi oferecido desconto no
pagamento à vista.
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PRÓXIMA AULA:
- Exame da sentença através de grupos de
estudo em sala de aula. Avaliação dos
argumentos acolhidos (e rejeitados) pela Justiça
Federal.
- Análise crítica das teses jurídicas à luz da
Jurisprudência Criminal.
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MARKA-AULA_3 - Acadêmico de Direito da FGV