Universidade de Brasília - UnB Faculdade de Ciências da Saúde Departamento de Saúde Coletiva Graduação em Gestão em Saúde Coletiva Disciplina: Comunicação em Saúde Profa. Dra: Ana Valéria Mendonça Alunos: Alisson Vinci Pereira Elizeu – 10/0091121 Andrey Almeida Loyola – 10/0048315 Camila Reis Santana - 0831158 Marcos Antonio Amorim – 10/0114130 Entrevista com a Professora Doutora Maria de Fátima Sousa sobre a Atenção Básica no Distrito Federal. Boa noite ouvintes da Radio web! Vocês sabiam que o Sistema Único de Saúde do Brasil, conhecido como SUS, é uma política social que define o estado como provedor da assistência à saúde de todos os brasileiros, de forma universal, integral e respeitando as necessidades de cada indivíduo, inclusive dos não brasileiros que estejam em território nacional? Ehhhhh! Mas este SUS, que ao longo de 23 anos de instituição, sendo referência de modelo de atenção a nível Mundial, mostra-se fragilizado diante da precarização da saúde vista no Distrito federal, onde o Estado descumpre seu dever na garantia de ações e serviços públicos de saúde a população. O DF apresenta atualmente 30 regiões administrativas que totalizam uma população de 2.570.160 pessoas segundo o (IBGE 2010), com 130 equipes do Programa de Saúde da Família instaladas, o que representa 01 equipe do PSF para cada 19.770 usuários, ao passo que o Ministério da saúde define como média ideal 01 equipe para cada 3.000 habitantes. É visível a desorganização da atenção básica no Distrito Federal que se estende por anos atrelados aos interesses políticos no centro do poder brasileiro, onde as políticas públicas deveriam servir de referência aos demais estados da nação. Recentemente, o Governo do Distrito Federal publicou a chamada pública 01/2012, abrindo espaço ao setor privado para gestão das Unidades de Pronto Atendimento (UPAS) e Unidades Clínicas da Família. Ou seja, certa forma de privatizar as ações e serviços de saúde na atenção básica. Para comentar um pouco mais sobre o sistema de saúde no Distrito federal, convidamos para uma rápida conversa, a Professora Doutora, Maria de Fátima Sousa do Departamento de Saúde Coletiva, da Faculdade de Ciências da Saúde, da Universidade de Brasília. Enfermeira sanitarista e Coordenadora do Núcleo de Estudos em Saúde Pública (NESP/UnB). Marcos Amorim: Doutora, a seu ver, como se apresenta a saúde pública no Distrito Federal (DF)? Professora Maria de Fátima Souza: A saúde pública no DF ao longo de seus 20 anos vem sofrendo uma série de descompromissos por parte dos entes governamentais, quando você disse muito bem, ela deveria ser modelo e exemplo para uma série de unidades federais do nosso Brasil. No entanto não é! Não é porque entra governo e sai governo e o Distrito Federal ainda não definiu qual é o modelo de atenção a saúde que ele quer oferecer aos seus habitantes. O DF apresenta uma rede física instalada considerável sob o ponto de vista hospitalar, entretanto ele não apresenta uma rede básica que possa sustentar o sistema a partir das reais necessidades de sua população. Nós tínhamos a esperança de que agora, com o novo governo, considerado por todos como um governo mais de linha democrática e popular, que eles pudessem enfim definir uma saúde pública de qualidade e que cumprisse com os princípios constitucionais do SUS e mais do que isso, que conseguisse organizar o sistema de saúde a altura do nosso Distrito Federal. Marcos Amorim: E doutora a quem podemos atribuir a baixa cobertura da Estratégia Saúde da Família aqui no Distrito Federal? Professora Maria de Fátima Souza: Essa baixa cobertura é uma revelação de que o governo do Distrito Federal ainda não definiu qual é o caminho que ele quer dar na saúde pública aqui no Distrito Federal. Se fosse do interesse dele, ele poderia perfeitamente definir que a atenção à saúde poderia e deveria começar com uma rede física instalada onde os agentes comunitários de saúde fossem a base de organização dessa rede e mais que isso, os agentes por serem da comunidade deveriam acompanham em conjunto com outros profissionais, entre eles eu cito os médicos, enfermeiros, odontólogos, auxiliares de enfermagem, farmacêuticos, assistentes sociais que pudessem compor uma equipe multiprofissional e atender as necessidades das pessoas o mais perto de suas casas, o mais perto dos lugares onde elas vivem e trabalham, ai teríamos uma rede básica forte e teríamos inclusive condições de redefinir o papel dos outros pontos do sistema, estou falando, poderíamos redefinir o papel dos hospitais e por consequência ele teria um papel mais claro para a população de como que essa rede pode e deve ser configurada e as pessoas então seriam atendidas, não só com qualidade mais sobretudo de forma acolhedora e mais do que acolhedora, de forma humanizada. Marcos Amorim: E o que a senhora vê como negativo para que o território da capital do país apresente tamanha precariedade na atenção básica de saúde? Professora Maria de Fátima Souza: A atenção básica de saúde não dá lucro sob o ponto de vista da ambição do mercado da medicina biotecnológica ou das ciências da saúde no sentido mais pejorativo da palavra. Se a atenção básica não da lucro, são os hospitais, os grandes procedimentos, os grandes consumos de equipamentos e medicamentos é neste lugar que o governo organiza seu sistema, um sistema falido no mundo inteiro e falido no Distrito Federal, sem contar que é um desserviço que o governo faz ao investir cada vez mais nesses pontos extremos do sistema, que são os hospitais, por exemplo, se você pegar hoje o hospital da Ceilândia você não consegue ver qual é a natureza da oferta deste hospital, aquele hospital maltrata a população, desgasta a força de trabalho que tem lá, não tem uma ordenação do sistema tem um custo altíssimo e por fim não atende a população, não a protege como deveria e tem um custo não somente alto mas também apresenta um custo politicamente insustentável e coloca o governo em uma fragilidade de ele não conseguir ofertar as ações de serviços de saúde como deveria ofertar. Marcos Amorim: Então doutora, a quem realmente interessa a privatização da Atenção Básica da Saúde do Distrito Federal? Professora Maria de Fátima Souza: A privatização da Atenção Básica do Distrito Federal não interessa nem ao setor privado, porque o governo distrital fez uma convocatória pública, ofertou a organização da Atenção Básica para que o setor privado pudesse organizar esse enquanto sistema ofertou inclusive não só as UPAS, mas ofertou também as clínicas de família. Neste lugar não tem lucro, esse é o lugar que o setor privado não tem interesse. O interesse é de fato nos hospitais, e nos hospitais de grande ponta, e nos hospitais é que são os lugares de alto consumo. Por exemplo, interessaria ao setor privado receber a concessão do Hospital de Santa Maria, como interessou. Interessaria por exemplo se ofertasse o HRAN para eles administrar, interessaria se ofertasse o Hospital de Base. O hospital, ainda que não seja estritamente administrado pelo DF, mas seria um grande interesse do setor privado se o Sarah Kubitschek fosse colocado para eles administrarem e assim sucessivamente. Então, a Atenção Básica não dá lucro, e sim, ela evita que o setor privado tenha lucro se bem organizada, então tá posto aí o grande desafio, a contradição, ao tempo que o governo deveria organizar a Rede Básica para evitar os grandes puxos na Nação, ele não organiza a Atenção Básica porque aí ele constrói um conjunto de situações problemas e que acarreta doenças e outros males que deságuam nos hospitais, no lócus onde sempre é, historicamente, o lugar do grande lucro da indústria farmacêutica, dos equipamentos, e mesmo do aliciamento dos profissionais que não são comprometidos com a saúde pública não só do DF, como do Brasil. Marcos Amorim: O que a senhora poderia apontar pra gente como aspectos que dificultam o fortalecimento das políticas públicas de saúde do SUS? Professora Maria de Fátima Souza: Muitos são os aspectos que dificultam. Acabei de dar uma aula sobre a Atenção Básica de Saúde para os alunos de graduação em Saúde Coletiva e dizer para eles que são um conjunto de situações que enquanto não tiver uma reforma política, enquanto não tiver um conjunto de reformas uma reforma de forma integrada, nós não conseguimos enfrentar de fato a consolidação do Sistema de Saúde, por exemplo, nós temos que ter uma reforma política substancial. Com a concepção de política e do jeito que os políticos assumem as ações públicas de saúde, elas nos colocam numa situação de bastante fragilidade por um lado, e por outro, enquanto agente ficar o tempo inteiro na velha discussão do financiamento da saúde, onde agente não tem sustentabilidade, mais do que isso, um orçamento estável e que esse orçamento seja dirigido à Atenção Básica, nós continuaremos com um sistema de saúde frágil. Enquanto a população não compreender que patrimônio é esse que nós temos, não só na Atenção Básica, mas também no Sistema de Saúde, que importância, que valor que cada um tem, o próprio agente comunitário que mora ali na sua comunidade, essas pessoas são compadres, amigos, irmãos, enquanto ele não valoriza esse trabalhador, enquanto não valoriza o médico de família, o enfermeiro de família, os outros profissionais da saúde, isso é uma fragilidade. Enquanto a população também não compreender que é preciso ter mudanças não só da cultura, mas mudança de ser corresponsável com o processo de organização do sistema de saúde como um todo, também nos tornaremos frágil. Enquanto nós não tivermos, mais do que isso, o ponto de vista da participação da população onde ela entenda que ela é o sujeito, e mais do que sujeito, ela é um meio participativo, ativo, da construção d sua própria saúde. Então é preciso que nós tenhamos várias reformas e que essas reformas se juntem e eu dizia há pouco, é importante que essas reformas se juntem e sejam entendidas de forma imbricadas, quase indissociável uma das outras. Marcos Amorim: Então, sendo assim, teríamos então um modelo ideal de Atenção à Saúde que o DF necessita? Professora Maria de Fátima Souza: O DF está longe de ter um modelo ideal. O DF segue organizando seus serviços, tendo como referência os hospitais, tendo como referência um espaço de grande consumo de medicamentos, de equipamentos, de alta tecnologia, e mais do que isso, de profissionais de ponta e se quer o nosso governador fez uma visita simbólica aos agentes comunitários e as equipes de saúde da família. Um dos primeiros atos de seu governo foi visitar os hospitais, ali ele sinalizou que segue dando prioridade a um sistema de saúde onde a referência é o médico, os hospitais e o alto consumo. Marcos Amorim: Agradecemos a brilhante conversa com a doutora Maria de Fátima de Sousa por ter nos proporcionado esse momento de reflexão e inquietando cada um de nós a questionar o porquê da precarização do sistema de saúde justamente no Distrito Federal, local que deveria ser referência para os demais Estados por concentrar o centro dos poderes e tomada de decisões. Obrigada doutora. Professora Maria de Fátima Souza: Eu que agradeço.