ANTONIO PAULO DA SILVA JUNIOR
AS BASES PARA O SURGIMENTO DE UMA INDÚSTRIA
AERONÁUTICA BRASILEIRA DE ASAS ROTATIVAS
Trabalho de Conclusão de Curso - Monografia
apresentada ao Departamento de Estudos da
Escola Superior de Guerra como requisito à
obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de
Política e Estratégia.
Orientador: Cel QEM Douglas M MERQUIOR.
Rio de Janeiro
2013
C2013 ESG
Este trabalho, nos termos da legislação
que resguarda os direitos autorais, é
considerado propriedade da ESCOLA
SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É
permitido a transcrição parcial de textos
do trabalho, ou mencioná-los, para
comentários e citações, desde que sem
propósitos comerciais e que seja feita a
referência bibliográfica completa.
Os conceitos expressos neste trabalho
são de responsabilidade do autor e não
expressam
qualquer
orientação
institucional da ESG
_________________________________
Assinatura do autor
Biblioteca General Cordeiro de Farias
Silva Junior, Antonio Paulo.
As bases para o surgimento de uma indústria aeronáutica brasileira
de asas rotativas: replicando a EMBRAER / Cel Cav Antonio Paulo da
SILVA JUNIOR. - Rio de Janeiro: ESG, 2013.
48 f.: il.
Orientador: Cel QEM Douglas Marcelo MERQUIOR.
Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito
à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e
Estratégia (CAEPE), 2013.
1. Ciência e Tecnologia. 2. Indústria Aeronáutica Brasileira. 3. Asas
Rotativas. I.Título.
À minha família, o reconhecimento pela
dedicação e compreensão incondicional
que permitiram que atingíssemos mais
este objetivo na ESG.
AGRADECIMENTOS
Aos meus chefes e companheiros de todas as épocas por terem tido a
paciência para ouvir e responder às minhas infindáveis dúvidas.
Aos estagiários da melhor Turma do CAEPE de 2013 pelo convívio
harmonioso de todas as horas e pelas demonstrações de franca amizade.
Ao Corpo Permanente da ESG pelos ensinamentos e orientações que me
fizeram refletir, cada vez mais, sobre a importância de se estudar o Brasil para poder
melhorá-lo.
O que mais engrandece uma
nação é o conhecimento que ela
detém. Conhecimento que, no
caso do Brasil, deve ser buscado
por instituições como o ITA e as
Universidades.
Marechal do Ar Casemiro
Montenegro Filho
RESUMO
Esta monografia aborda a Indústria Aeronáutica, com foco naquela de asas
rotativas. O objetivo deste estudo é, partindo do diagnóstico dos fatores de sucesso
da EMBRAER, empresa líder no mercado de aeronaves regionais de até 120
passageiros, verificar as possibilidades de replicação daquele modelo aproveitando
o momento particular de atenção internacional ao mercado de defesa brasileiro, em
particular de alguns dos maiores players mundiais na indústria de aviação de asas
rotativas. A metodologia adotada comportou uma pesquisa bibliográfica e
documental, visando buscar referenciais teóricos, além da experiência do autor
como piloto de helicópteros, comandante de unidade aérea e responsável pela
revisão do planejamento estratégico da Aviação do Exército em atenção ao
processo de Transformação do Exército Brasileiro. Também focaliza a contribuição
da Teoria da Tripla Hélice na formulação de políticas de Estado que fomentem e
apoiem o surgimento de uma indústria intensiva em tecnologia e inovação. O campo
de estudo delimitou-se à indústria aeronáutica de asas rotativas, embora no decorrer
do trabalho aquela de asa fixa tenha sido mencionada. Utiliza como benchmark o
histórico de alguns casos de sucesso no mundo para o desenvolvimento da
produção de helicópteros a partir do domínio da produção de aviões e discorre sobre
os fatores que podem contribuir para uma transição do gênero no Brasil. Por último,
analisa criticamente a situação atual da indústria de asas rotativas no Brasil,
ressaltando pontos fortes e fracos e sugerindo algumas políticas e estratégias. Os
principais tópicos são: história da EMBRAER, história da Sikorsky e da
AgustaWestland, tripla hélice, mercado civil e militar para helicópteros no Brasil e
América do Sul, formação continuada de profissionais da indústria aeronáutica, além
da indústria de helicópteros brasileira. A conclusão apresenta propostas de projetos
com potencial para colocar o parque aeronáutico brasileiro na situação não mais de
simples montadora de helicópteros, mas de uma indústria capaz de produzir
conhecimento e projetos autóctones voltados para as necessidades dos mercados
civil e de defesa e segurança.
Palavras chave: Indústria Aeronáutica do Brasil. Indústria de Helicópteros. Tripla
Hélice. EMBRAER.
ABSTRACT
This monograph addresses the Aeronautical Industry, focusing on that of rotary
wings. The aim of this study is, based on the diagnosis of the success factors of
EMBRAER, market leader in regional aircraft up to 120 passengers, verify the
possibilities of replicating that model leveraging the particular moment of international
attention to the Brazilian defense market, particularly of some of the major players in
the rotary wings aviation industry. The methodology included a bibliographic and
documentary research, aiming to seek theoretical frameworks beside the author's
experience as a helicopter pilot, helicopter unit commander and responsible of the
Army Aviation’s strategic planning review in attention to the process of transformation
of the Brazilian Army. It also focuses on the contribution of the Theory of Triple Helix
in the formulation of state policies that encourage and support the emergence of a
technology-intensive industry. The study was restricted to the rotary-wing aircraft
industry, although in the course of the work that of fixed-wing has been mentioned.
Uses as a benchmark two success stories of developing the production of helicopters
starting from aircraft production and discusses the factors that can contribute to a
transition of this kind in Brazil. Finally, it analyzes the current situation of the rotorcraft
industry in Brazil, highlighting their strengths and weaknesses and suggesting some
policies and strategies. The main topics are: EMBRAER history, history of Sikorsky
and AgustaWestland, triple helix, the market for civil and military helicopters in Brazil
and South America, continuing education of professionals in the aviation industry,
and the helicopter industry in Brazil. The conclusion presents proposals with the
potential to change the situation of the Brazilian helicopters industry, turning it in an
industry capable of producing indigenous knowledge and projects geared to the
needs of civil, security and defense markets.
Keywords: Aeronautical industry of Brazil. Helicopter industry. Triple Helix.
EMBRAER.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1
Sikorsky S97 Raider.........................................................................17
FIGURA 2
AW 609 em voo de transição ...........................................................20
FIGURA 3
Família AW 139 / AW 169 / AW 189 ................................................21
FIGURA 4
Modelo Tripla Hélice I ......................................................................36
FIGURA 5
Modelo Tripla Hélice II .....................................................................36
FIGURA 6
Modelo Tripla Hélice III ....................................................................37
FIGURA 7
Iceberg científico-tecnológico de defesa ..........................................43
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AAS
Armed Aerial Scout (Escolta aérea armada)
CAD-CAM
Computer-aided design / Computer-aided manufactoring
CDI
Conselho de Desenvolvimento Industrial do Ministério da Fazenda
CEO
Chief Executive Officer (Diretor Executivo)
CNTH
Centro Nacional de Tecnologia de Helicópteros
CTA
Centro Técnico Aeroespacial
EADS
European Aeronautic Defence and Space Company
EMBRAER
Empresa Brasileira de Aeronáutica
EUA
Estados Unidos da América
FA
Forças Armadas
GKN
Guest, Keen & Nettlefolds Ltd
HELIBRAS
Helicópteros do Brasil S.A.
IFI
Instituto de Fomento Industrial do CTA
IPD
Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do CTA
ITA
Instituto Tecnológico de Aeronáutica
P&D
Pesquisa e Desenvolvimento
P,D&I
Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação
UEP
Unidades Estacionárias de Produção
UNIFEI
Universidade Federal de Itajubá
USAF
United States Air Force (Força Aérea dos Estados Unidos)
UTC
United Technologies Corporation
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO ............................................................................................. 10
2
INDÚSTRIA AERONÁUTICA DE ASAS ROTIVAS ..................................... 14
2.1
SIKORSKY AIRCRAFT CORPORATION ..................................................... 15
2.1.1
Origens ........................................................................................................ 16
2.1.2
Evolução ...................................................................................................... 16
2.2
AGUSTA-WESTLAND .................................................................................. 18
2.2.1
Westland ...................................................................................................... 18
2.2.2
Agusta ......................................................................................................... 19
2.2.3
Evolução ..................................................................................................... 20
3
INDÚSTRIA AERONÁUTICA NO BRASIL .................................................. 22
3.1
EMBRAER .................................................................................................... 22
3.2
HELIBRAS .................................................................................................... 25
3.3
O MERCADO DE AERONAVES DE ASAS ROTATIVAS NO BRASIL. ........ 30
3.3.1
Civil .............................................................................................................. 30
3.3.2
Militar ........................................................................................................... 32
4
MODELO DA TRIPLA HÉLICE .................................................................... 33
5
DISCUSSÃO. ............................................................................................... 38
6
CONCLUSÃO............................................................................................... 46
REFERÊNCIAS ............................................................................................ 49
10
1 INTRODUÇÃO
O potencial dos mercados civil e militar de aeronaves de asas rotativas no
Brasil tem despertado o interesse de, pelo menos, quatro dos cinco grandes
fabricantes globais.
Em janeiro de 2013, a EMBRAER anunciou a disposição de associar-se à
italiana AgustaWestland, do grupo Finmeccanica1, para a fabricação nacional dos
modelos italianos. Um mês antes, a Odebrecht comunicou a assinatura de um
memorando de intenções com a estatal Russian Technologies para produzir sob
licença os helicópteros Mi-171, bem como oferecer assistência técnica e serviços de
manutenção especializada para equipamentos militares, particularmente os Mi-35
adquiridos pela Força Aérea Brasileira (RUSSIAN AVIATION, 2013). Pouco tempo
depois, a Sikorsky anunciou a abertura da SIKORSKY Brasil, acompanhando a
crescente demanda por helicópteros da fabricante (SILVEIRA, 2013).
A HELIBRAS, subsidiária da Eurocopter (grupo EADS), está ampliando suas
atividades no Brasil em decorrência de um acordo com o governo brasileiro, fechado
no final de 2008, para produção local do helicóptero pesado EC-725. O Ministério da
Defesa realizou uma encomenda inicial de 50 unidades que começaram a ser
entregues a partir de 2010 (BOROS, 2010).
Além do aumento dos gastos de defesa, a demanda por transporte aéreo das
empresas que operam nos campos de petróleo em alto-mar aumentará
exponencialmente. Em uma década, o transporte anual de passageiros realizado
apenas pela Petrobras saltará de 850 mil para 1,6 milhão de pessoas, segundo as
previsões da própria empresa (TEIXEIRA, 2012). Seria preciso, no mínimo, dobrar a
frota atual das empresas que oferecem este serviço.
Some-se à intenção do governo federal de manter o plano de modernização
da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, as encomendas das polícias estaduais e
dos novos milionários brasileiros e tem-se um quadro de demanda aquecida para um
setor que já vinha em franca expansão. ´
Neste cenário, o interesse que grandes empresas da indústria de aeronáutica
de asas rotativas demonstram (coligadas ou não a indústrias nacionais) em assumir
1
Cerca de um mês depois a EMBRAER anunciou a decisão de não levar adiante as negociações com a AgustaWestland. Porém, em palestra proferida em sua sede no dia 19/Jun/13, o Gerente de Plj Estratégico da
companhia afiançou ao autor que a produção de helicópteros continua como uma meta de curto prazo no esforço
de diversificação do portfólio da empresa.
11
um papel relevante no mercado brasileiro certamente poderá ser utilizado pelo
governo para alavancar uma indústria de elevado potencial para o desenvolvimento
tecnológico e científico do país.
O Brasil possui um caso de absoluto sucesso na implantação e
desenvolvimento de uma indústria com alto grau de complexidade tecnológica e que
demanda um esforço contínuo e concentrado de pesquisa para manter-se em
constante evolução, sendo a inovação praticamente parte do core business.
A EMBRAER nasceu de uma combinação de fatos fortuitos que foram
paulatina e pacientemente ordenados por um grupo seleto de pessoas que
comungavam de uma ideia quase obsessiva: desenvolver uma indústria aeronáutica
brasileira autóctone (SILVA, 2008). E como veremos mais adiante escolheram um
caminho que provou ser, ao redor do mundo, um dos mais bem sucedidos em
experiências do gênero.
Este caminho parte do princípio que a associação da produção científica
gerada nas universidades e institutos de pesquisa com o espírito empreendedor de
companhias estimuladas por políticas de governo que forneçam condições
favoráveis ao seu lançamento, propicia um ambiente fértil para o surgimento de
indústrias capazes de, utilizando a inovação como uma ferramenta obrigatória,
produzir itens de alto valor agregado. Mais tarde, experiências exitosas baseadas
neste princípio foram estudadas e o resultado da pesquisa foi codificado em uma
teoria chamada “da tripla hélice” (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000).
Este trabalho pretende estudar a possibilidade de estabelecer uma indústria
aeronáutica de asas rotativas tomando por base o desenvolvimento tecnológico e
científico alcançado pela indústria de asas fixas no Brasil.
Neste intento, proceder-se-á a uma pesquisa bibliográfica, histórica e
documental. Serão analisadas as iniciativas das universidades, os objetivos
empresariais e as políticas de governo na área da indústria aeronáutica de asas
rotativas que serão relacionados com o histórico da indústria aeronáutica de asas
fixas, verificando as bases sobre as quais se poderão construir aquela indústria.
Esta análise pode indicar caminhos para um melhor aproveitamento do
potencial polo tecnológico ligado à indústria aeronáutica de asas rotativas a ser
instalado no país, que, à semelhança daquele de asas fixas, pode impulsionar um
novo ciclo virtuoso de desenvolvimento científico-tecnológico.
12
A discussão tomará como base a teoria da tripla hélice lançada por Etzkowitz
& Leydesdorff (2000) para demonstração do potencial da indústria aeronáutica como
impulsionadora do desenvolvimento científico-tecnológico.
A pesquisa identificará quais fatores possibilitaram que a indústria
aeronáutica de asas fixas impulsionasse o desenvolvimento científico-tecnológico de
maneira significativa e se o seu processo de implantação pode servir de modelo para
aquela da de asas rotativas. Analisará ainda o impacto que a implantação de uma
indústria aeronáutica de asas rotativas pode ter no desenvolvimento científicotecnológico brasileiro.
O estudo será conduzido em nível de análise dos principais fatores de
sucesso identificados na implantação da indústria aeronáutica de asas fixas e a
viabilidade de usos destes como parâmetros para implantação daquela de asas
rotativas.
Quanto à temporalidade, a pesquisa se restringirá ao período compreendido
entre a criação do Centro Técnico Aeroespacial (CTA)2 e os dias atuais. Quanto à
abrangência, o estudo utilizará a base industrial existente na atualidade no Brasil,
focando basicamente na EMBRAER (2011) e na HELIBRAS (2009), duas maiores
empresas
com
atividades
fabris
relevantes,
respectivamente,
na
indústria
aeronáutica de asas fixas e de asas rotativas.
A fim de alcançar os objetivos propostos o trabalho está dividido em seis
seções, sendo a primeira esta introdução, onde são apresentados alguns elementos
para entendimento do escopo do trabalho, com destaque para o problema central,
os objetivos e a delimitação da pesquisa.
A segunda seção apresentará duas das maiores fabricantes mundiais de
aeronaves de asas rotativas, suas origens e processo de evolução até atingir a
relevância atual neste restrito mercado, utilizando-as como um benchmark das
singularidades dessa indústria aeronáutica.
Na seção três serão estudados alguns dos principais fatores que
possibilitaram o surgimento no Brasil da terceira maior empresa no mercado de
aviões e identificados aqueles que podem ser replicados para a evolução de nossa
indústria aeronáutica de asas rotativas. Além disto, traz informações sobre a única
unidade fabril de aeronaves de asas rotativas do Brasil, a HELIBRAS. Encerra esta
2
Atualmente denominado Departamento de Ciência e Tecnologia Aeroespacial (DCTA).
13
seção uma visão do mercado de aeronaves de asas rotativas - atual e potencial - no
Brasil, abrangendo as áreas civil e militar, onde se pretende explicar as
características e exigências de um mercado extremamente competitivo.
Na quarta seção será apresentada uma reflexão sobre a Teoria da Tripla
Hélice, destacando o papel das universidades, das empresas e do governo.
A seção cinco discute, à luz dos conteúdos dos capítulos anteriores, os
problemas enfrentados para a formação de uma indústria aeronáutica de asas
rotativas autossuficiente, usando como base a Teoria da Tripla Hélice.
Finalmente, a seção seis pretende contribuir com possíveis caminhos e
soluções para o desafio de desenvolver esta importante indústria e como podemos
replicar o sucesso alcançado com a EMBRAER. Tais opções serão baseadas nas
informações discutidas nas cinco seções anteriores, conformando a conclusão do
trabalho.
14
2 INDÚSTRIA AERONÁUTICA DE ASAS ROTIVAS
Nos últimos setenta anos, desde o primeiro voo bem sucedido, helicópteros
evoluíram de mecanismos instáveis que mal podiam alçar um piloto do solo,
vibrando quase insuportavelmente, para sofisticadas máquinas com extraordinária
capacidade de voo e manobrabilidade. Eles podem pairar, voar em todas as
direções e realizar manobras incríveis. Hoje em dia existem mais de 50.000
helicópteros voando pelo mundo, cumprindo missões de ambulância aérea
(evacuação aeromédica), salvamento no mar e na montanha, combate a incêndios,
vigilância policial, serviços corporativos e offshore, entre outros. As tarefas militares
incluem transporte de tropa, reconhecimento, assalto e ataque aeromóveis.
O preço para se obter uma aeronave que pudesse desempenhar de forma
segura e eficiente todas estas manobras de voo sob completo controle dos pilotos foi
uma enorme complexidade aerodinâmica e mecânica. Embora paralelos possam ser
traçados entre o desenvolvimento inicial dos aviões e dos helicópteros, a gestação
mais longa e tortuosa das aeronaves de decolagem vertical é consequência direta
do grande grau de conhecimento requerido para entender e resolver os diversos
problemas aerodinâmicos e mecânicos intrínsecos a este tipo de aeronave.
Além disto, existiam barreiras técnicas principalmente quanto aos motores –
que exigem uma elevada relação peso-potência, e aos materiais leves e resistentes
a serem utilizados nos rotores e células3.
Liberatore (1998) divide os trabalhos iniciais de desenvolvimento dos
helicópteros em duas categorias: inventivos e científicos. Os primeiros caracterizamse pelo uso extensivo da intuição em ligação com o conhecimento técnico, enquanto
na segunda categoria os trabalhos utilizavam uma aproximação sistemática e
planejada. A falta de motores com potência adequada a seu peso e as dificuldades
de controle levaram a centenas de tentativas frustradas de construir helicópteros que
algumas vezes simplesmente vibravam ao ponto de esfacelarem-se.
De qualquer forma, o desafio de pairar com um “mais pesado que o ar”
persistiu motivando inventores que, com o tempo, construíram um legado de
conhecimentos que, aplicados por engenheiros treinados formalmente, desembocou
no desenvolvimento do helicóptero moderno. A contribuição técnica de homens
3
Elemento estruturante do corpo do helicóptero, correspondente ao monobloco de um carro moderno.
15
como Juan de la Cierva, Louis Breguet, Heinrich Focke, Raoul Hafner, Igor Sikorsky
e Arthur Young foi fundamental para o projeto de helicópteros seguros e
economicamente viáveis (LEISHMAN, 2000).
Pesquisa
e
desenvolvimento
persistentes
em
diversas
disciplinas
aeronáuticas possibilitaram contínuos avanços na capacidade de carga, velocidade
de cruzeiro e desempenho geral dos helicópteros. Aperfeiçoamentos aerodinâmicos
nos rotores principais permitem hoje que o helicóptero erga cargas com peso
superior ao seu próprio peso vazio e alcance velocidades superiores a 250 Kts
(EUROCOPTER, 2013a), muito próximo daquelas de aeronaves de asas fixas. Há
avanços palpáveis no desenho dos novos helicópteros e na viabilidade de outras
aeronaves
de
decolagem
vertical,
como
aquelas
com
tilt-rotor4,
graças
principalmente à revolução proporcionada pelos processos CAD-CAM (computeraided design and manufactoring) e ao advento de materiais compostos mais leves e
resistentes. O helicóptero hoje é uma máquina segura, versátil e confiável que
desempenha um papel único na aviação moderna.
Nesta seção serão apresentadas as origens da moderna indústria de asas
rotativas, tomando como exemplos a Sikorsky e a AgustaWestland, pela
representatividade destas no mercado atual e pelas condições diversas em que
foram geradas. Estudar-se-á ainda o mercado de aeronaves de asas rotativas.
2.1 SIKORSKY
A Sikorsky Aircraft é parte de um conglomerado da indústria de defesa dos
Estados Unidos da América, a United Technologies Corporation (UTC). A companhia
foi fundada em 1923 por Igor Sikorsky e faz parte da UTC desde 1929.
Desde o início da década de 1940, a Sikorsky tem concentrado seus esforços
no projeto e fabricação de helicópteros. Em 1996, havia produzido mais de 7800
aeronaves de asa rotativa, além de outras 1800 construídas por licenciados
estrangeiros.
Hoje, os helicópteros Sikorsky ocupam uma posição de destaque nas
categorias média, média/pesada e pesada (entre 5.300 kg e 33.000 kg de peso
bruto). Eles são usados por operadores militares e civis em mais de 40 países.
4
Configuração de rotores que permite o giro do mastro (eixo onde estão instaladas as pás do rotor)
para qualquer posição entre 0º e 90º de inclinação.
16
2.1.1 Origens
Igor Ivanovich Sikorsky, russo de nascimento, desde muito cedo se interessou
pela aviação, particularmente a de asas rotativas. Após alguns insucessos
convenceu-se que teria de aguardar "melhores motores, materiais mais leves, e
mecânicos experientes" (SIKORSKY, 1967). Desanimado, Sikorsky dedicou suas
habilidades a projetos de asa fixa, atividade em que foi muito bem sucedido em sua
terra natal, tendo inclusive projetado o primeiro avião multimotor do mundo.
A Revolução Bolchevique o levou a, sacrificando uma fortuna pessoal
considerável, emigrar primeiramente para a França e, posteriormente, para os
Estados Unidos da América, em 1919.
O sucesso comercial e financeiro alcançado com seus aviões nos Estados
Unidos permitiu a Sikorsky voltar mais uma vez sua atenção para os helicópteros.
Através dos anos, ele havia anotado ideias para possíveis projetos, algumas das
quais por ele patenteadas.
Trabalhando em conjunto com Chance Vought, finalmente, em 14 de
setembro de 1939, Sikorsky levou o VS-300 a poucos metros do chão em voo
controlado, estabelecendo os parâmetros de desenho dos helicópteros modernos.
O sucesso do VS-300 levou Sikorsky a assinar contratos militares em 1943
que ensejaram a fabricação em grande escala do R-4, o primeiro helicóptero em
linha de produção do mundo (LAWRENCE, 2005).
2.1.2 Evolução
Assim como vários pioneiros, Sikorsky encontrou nos EUA um ambiente
comercial e científico entusiasmante para um jovem inventor e projetista. Por outro
lado as Forças Armadas (FA) americanas viram naquela nascente tecnologia
possibilidades operacionais enormes e apoiaram massivamente os melhores
projetos, levando o governo a participar ativamente do financiamento da pesquisa e
na criação de um mercado através de suas encomendas (LAWRENCE, 2005).
Desta forma, seguiu-se uma grande quantidade de modelos criados conforme
requisitos técnico-operacionais das FA, entre os quais podemos citar: o S-55
Chickasaw (1949), primeiro helicóptero a cruzar o Atlântico com escalas; o S-61 Sea
King (1959), ainda hoje uma lenda na guerra antissubmarino; o S-65 Sea Stallion
17
(1964), famoso por ter participado da Operação Eagle Claw5; e o S-70 Blackhawk
(1974), a aeronave de assalto por excelência, referência em performance e
capacidade de sobrevivência no campo de batalha (SIKORSKY, 2013b).
O primeiro projeto comercial da Sikorsky foi o S-51 Dragonfly, que na verdade
era uma adaptação do R-5, helicóptero construído conforme requisitos da Força
Aérea dos Estados Unidos (USAF), em 1946. Porém, a sua primeira aeronave
desenhada especificamente para o mercado civil foi o S-76, que voou pela primeira
vez no ano de 1970 (SIKORSKY, 2013b).
A Sikorsky emprega hoje mais de 13.000 pessoas, das quais uma grande
parte são engenheiros e operários altamente qualificados (SIKORSKY, 2013b). A
companhia se mantém na vanguarda do desenvolvimento das aeronaves de asas
rotativas, sendo seu último exemplo o sucesso estrondoso da comprovação do
conceito do X-2 (SIKORSKY, 2013c) e sua proposta para o programa Armed Aerial
Scout (AAS) do Exército dos Estados Unidos. O S-97 Raider (Figura 1) reúne todas
as tecnologias comprovadas no programa X-2 e oferece desempenho muito superior
a qualquer outra aeronave de asas rotativas hoje em operação.
Figura 1: Principais tecnologias integradas ao S-97 Raider
Fonte: SIKORSKY, 2013a.
5
Mal sucedido resgate de reféns americanos em sua embaixada no Irã em 1980.
18
2.2 AGUSTAWESTLAND
A AgustaWestland é fruto da fusão de dois tradicionais fabricantes de
aeronaves. O grupo italiano Finmeccanica, proprietário da Agusta, e o grupo inglês
GKN, proprietário da Westland, anunciaram em 1999 a intenção de fundir suas
respectivas subsidiárias, permanecendo cada grupo com 50% da nova companhia.
Em maio de 2004, GKN confirmou a venda de sua participação na
AgustaWestland à Finmeccanica. A venda foi aprovada pelo governo britânico em
outubro de 2004 e passou a ser uma subsidiária integral do grupo Finmeccanica.
A empresa tem o conhecimento de engenharia para realizar todas as etapas
de design, desenvolvimento e fabricação de novas aeronaves, incluindo integração
de
sistemas
aviônicos
avançados,
bem
como
capacidade
própria
de
desenvolvimento de software para seus sistemas (AGUSTAWESTLAND, 2012c).
Esta capacidade global permitiu à AgustaWestland desenvolver uma moderna
família de helicópteros que, através de seu alto nível de integração de sistemas,
atende aos requisitos operacionais atuais e futuros mais exigentes.
2.2.1 Westland
Os irmãos Petters começaram uma pequena empresa de engenharia no início
do século XX. Na 1 ª Guerra Mundial, o Almirantado Britânico aceitou sua oferta de
fabricar aviões e uma longa tradição naval nasceu. No final da Guerra, por volta de
1100 aeronaves de 10 tipos diversos tinham sido construídas (MONDEY, 1982).
No período entre guerras a Westland produziu diversas aeronaves de asa fixa
e, a partir de 1936, construiu as primeiras de asas rotativas baseadas em projeto de
Cierva6 (MONDEY, 1982).
Em 1947, a Westland firmou um acordo com a Sikorsky para fabricar e
customizar o WS-51 Dragonfly para emprego pela Royal Navy e pela Royal Air
Force. Neste mesmo ano a companhia executou o último projeto de asa fixa. A
Westland produziu cerca de 6000 aviões antes de concentrar-se em helicópteros
(AGUSTAWESTLAND, 2012c).
6
Juan de la Cierva, um dos pioneiros na construção de autogiros, alcançou grande sucesso comercial com seus
modelos, licenciados para várias companhias, inclusive a Westland.
19
Incentivada pelo governo, ocorreu uma maior racionalização da indústria
aeronáutica inglesa durante a década de 1960. A Westland adquiriu a Bristol
Helicopters, a Fairey Aviation e a Saunders-Roe, transformando-se em Westland
Helicopters (AGUSTAWSTLAND, 2012c).
A colaboração com a Sikorsky (a esta altura um dos seus principais
acionistas) continuou com a fabricação do Sea King e um novo e extenso acordo foi
firmado com a Aerospatiale para o projeto e a produção do Puma, do Gazelle e do
Lynx, este um projeto da Westland (AGUSTAWESTLAND, 2012c).
Nos anos 1980, buscando novos caminhos, a Westland adotou um enfoque
mais europeu e começou a colaboração com a Agusta no EH101. Em 1994, a United
Technologies (empresa controladora da Sikorsky) vendeu suas ações da Westland e
a GKN tornou-se controladora da empresa (AGUSTAWESTLAND, 2012c).
2.2.2 Agusta
Giovanni Agusta projetou e construiu sua primeira aeronave em 1907 e, após
a Guerra Ítalo-Turca de 1911, foi contratado pela Caproni, uma das maiores
indústrias aeronáuticas da Itália naquela época.
Após a Primeira Grande Guerra, deixou a Caproni e fundou, em 1923, a
Costruzioni Aeronautiche Giovanni Agusta que viria a ser instalada mais tarde em
Cascina Costa, até hoje sede do grupo, onde realizava atividades de manutenção e
revisão dos aviões trimotores produzidos pela Caproni (CERIANI, 2004).
A partir de 1952 a empresa se envolveu na fabricação de helicópteros, o
primeiro sendo o Bell 47G, sob licença da Bell Helicopters. Em dois anos, a Agusta
havia produzido e vendido mais de cem helicópteros em toda a Europa.
Tendo adquirido grande experiência na personalização dos Bell 47G vendidos
para diversos clientes, a Agusta licenciou outros modelos Bell e desenvolveu um
corpo técnico que lhe permitiu alçar voos mais altos. Assim, desde 1958, a empresa
projeta e constrói seus próprios helicópteros, a maior parte conforme requisitos das
forças armadas italianas (CERIANI, 2004).
Desenvolvido na década de 1970, o Agusta A109 foi até o momento, sem
dúvida, o maior sucesso da empresa. O A109 é um helicóptero comercial e militar
biturbina, cujas últimas variantes ainda estão em produção, tendo sido vendidas
centenas de unidades (CERIANI, 2004).
20
Em 1983, demonstrando a sua capacidade tecnológica a Agusta apresentou o
A129 Mangusta, primeiro helicóptero de ataque a ser desenhado e produzido na
Europa Ocidental. Uma variante modernizada foi recentemente adotada pelo
exército turco (AGUSTAWESTLAND, 2012b).
A partir de 1980 a Agusta iniciou vários projetos de colaboração. Em 1981,
com a Westland começou o projeto do helicóptero EH101, a fim de satisfazer as
exigências da Marinha Real Britânica e da Marinha Italiana. Em 1985, a empresa
iniciou um programa com as indústrias aeronáuticas da França, Alemanha e
Holanda, a fim de desenvolver e produzir o NH90, aeronave multi-função na classe
de 9 ton com dois motores, a fim de satisfazer as necessidades das forças armadas
de seus respectivos países (AGUSTAWESTLAND, 2012c).
Em 1998 a Agusta formou uma joint venture com a Bell Helicopter Textron
chamada Bell/Agusta Aerospace Company. Seu objetivo era desenvolver o
helicóptero AB139 e o avião tiltrotor AW609 (Figura 2). A Bell mais tarde retirou-se
do projeto AB139, que agora é conhecido como o AgustaWestland AW139.
Figura 2: AW 609 em voo com rotores em transição.
Fonte: AGUSTAWESTLAND, 2012a.
2.2.3 Evolução
Após a união, a AgustaWestland passou a contar com uma das mais
completas linhas de helicópteros da indústria mundial. Desde a versão monomotor
do
AW119
até
o
médio/pesado
AW101,
passando
pelo
AW159,
último
desenvolvimento da mais famosa aeronave naval de ataque, e pelo T129, aeronave
de ataque dedicada, a AgustaWestland demonstra uma constante capacidade de
inovação e para tal possui um extenso programa de Pesquisa e Desenvolvimento.
21
Um conceito que a AgustaWestland trouxe da indústria de asas fixas foi o de
família de aeronaves. Os helicópteros AW119, 109, 139, 169 e 189 (Figura 3)
desfrutam do mesmo desenho básico e possuem vários componentes em comum,
facilitando muito a operação e reduzindo substancialmente os custos dos
operadores. Além disto, os pilotos e mecânicos podem facilmente migrar de um
modelo para outro com uma curva de aprendizagem muito mais ágil em virtude do
comportamento dinâmico das aeronaves ser muito semelhante, ressalvadas as
diferenças em massa e tamanho (o AW119 tem peso máximo de decolagem de
2850 Kg, enquanto o AW189 deverá deslocar em torno de 8000 Kg).
Atualmente a companhia possui em torno de 13000 empregados (a grande
maioria
engenheiros
e
técnicos
altamente
especializados)
e
investe
aproximadamente 12% de seu faturamento de mais de quatro bilhões de euros em
P&D (AGUSTAWESTLAND, 2012c).
Figura 3: Da esquerda para a direita, AW169, AW139 e AW189 em voo de formação.
Fonte: AGUSTAWESTLAND, 2012c.
22
3 A INDÚSTRIA AERONÁUTICA NO BRASIL
Nesta seção serão apresentadas informações sobre a EMBRAER, a
HELIBRAS e o mercado nacional de aeronaves de asa rotativa.
3.1 EMBRAER
Em meados da década de 60 tornava-se nítida uma tendência de redução do
número de cidades atendidas pelo transporte aéreo no Brasil. Desde o final da
Segunda Guerra Mundial centenas de cidades vinham sendo atendidas por
equipamentos de procedência norte-americana, especialmente o conhecido
aparelho Douglas DC-3. Eram aeronaves que operavam em pistas de terra, de curta
extensão, transportando até 30 passageiros e operando com pouca ou nenhuma
infraestrutura de apoio à navegação (DRUMOND, 2004).
O desenvolvimento tecnológico do setor aeronáutico, fortemente impulsionado
pela Segunda Guerra Mundial, havia possibilitado o advento de uma nova geração
de aviões de passageiros, de propulsão a jato ou aparelhos turboélice, que exigiam
uma infraestrutura consideravelmente mais complexa. Por outro lado, essa nova
geração de aviões transportava um número substancialmente maior de passageiros
o que tornava antieconômica a sua operação na maioria das cidades do país. Dessa
forma, o Brasil, que nos anos cinquenta chegara a contar com 360 cidades
atendidas por aviões, em 1960 tinha apenas cerca de 120 cidades sendo servidas
por transporte aéreo (FORJAZ, 2003).
Foi precisamente nesse momento que um grupo do Instituto de Pesquisa e
Desenvolvimento do CTA (IPD) propôs a elaboração do projeto de um avião bimotor,
turboélice, capaz de transportar até quinze passageiros e operar nas condições
vigentes na grande maioria das cidades brasileiras. Esse grupo era constituído
essencialmente por técnicos formados pelo Instituto Tecnológico de Aeronáutica
(ITA), sob a liderança de Ozires Silva. Assim, foi iniciado o projeto do aparelho
Bandeirante, em meados de 1965 (SILVA, 2008).
Desde 1962 esse grupo de pesquisadores do CTA buscava convencer o
Governo a realizar o projeto de um avião para o atendimento das demandas do
tráfego aéreo nacional. No entanto, pesava contra tal ideia um ceticismo
generalizado quanto à viabilidade técnica de se projetar um avião no país contando
23
com uma equipe de engenheiros brasileiros. A superação dessa dificuldade foi
possível graças à vinda para o país de um conhecido projetista francês, Max Holste.
A credibilidade do nome do projetista francês no meio aeronáutico tornou possível a
construção da aeronave (SILVA, 2008).
Em virtude da falta de interesse da iniciativa privada – primeira opção – em
produzi-lo, o Governo decidiu criar uma sociedade de economia mista de controle
estatal, tendo sido constituída a Empresa Brasileira de Aeronáutica – EMBRAER.
Originalmente concebida para produzir um total de 150 aparelhos Bandeirante
a uma cadência de dois aviões por mês, a EMBRAER rapidamente superou esses
propósitos. O Ministério da Aeronáutica contratou inicialmente a aquisição de 80
unidades,
e
o
aparelho
foi
projetado
para
transportar
12
passageiros.
Posteriormente, o Ministério da Aeronáutica encomendou outras 200 unidades do
Bandeirante,
numa
versão
capaz
de
transportar
19
soldados
equipados
(DRUMOND, 2004).
A homologação do Bandeirante nos Estados Unidos foi extremamente difícil e
consumiu seis anos. Mas a partir daí a aeronave estava pronta para ser exportada.
Ao mesmo tempo, a EMBRAER recebia outra encomenda da Força Aérea,
para a fabricação sob licença de 112 jatos de treinamento avançado, apoio tático e
ataque ao solo, de projeto italiano. A produção da aeronave denominada AT26
Xavante teve inicio em 1971, marcando o início da produção de aeronaves a jato no
país. Foi encomendado um total de 175 aparelhos, tendo sido sua produção
encerrada em 1981 (DRUMOND, 2004).
O Governo incluiu a EMBRAER na sistemática de incentivos fiscais já no seu
primeiro momento de vida. Em janeiro de 1970 uma portaria do Ministério da
Fazenda permitia a dedução de 1% do Imposto de Renda das pessoas jurídicas
para compra de ações da empresa. Ao longo dos anos, a EMBRAER contou assim
com um poderoso mecanismo de capitalização que contribuiu para conferir à
empresa a capacidade de investimento necessária a seu crescimento.
Em 1970, a EMBRAER tinha 1035 acionistas, sendo que a participação
privada totalizava apenas 18% do capital social. Em 1981, esse número tinha se
elevado para 226506 acionistas e a participação privada atingia a 93% do capital
social (DRUMOND, 2004).
Ao final da década de 1970, o desenvolvimento de novos produtos – como o
EMB 312 Tucano e o EMB 120 Brasília, seguidos pelo programa AMX, em
24
cooperação com as empresas Aeritalia (hoje Alenia) e Aermacchi – permitiu que a
empresa alçasse a um novo patamar tecnológico e industrial (SILVA, 2008).
O CBA 123 foi resultado de um acordo entre os governos brasileiro e
argentino para o desenvolvimento e fabricação de um avião de transporte regional. A
aeronave foi apresentada em cerimônia na presença do presidente do Brasil,
Fernando Collor de Melo e do presidente da Argentina, Carlos Menen, além de
muitas autoridades, clientes, parceiros, colaboradores e jornalistas da imprensa
nacional e internacional. A aeronave, embora tecnologicamente muito avançada,
tinha custo elevado e as vendas não se confirmaram, impedindo a continuidade do
programa (SILVA, 2008).
Em 11 de agosto de 1995 ocorreu o primeiro voo de teste do EMB 145
(atualmente nomeado de ERJ 145) – jato pressurizado para transporte regional, com
alto desempenho e o baixo custo de operação. O ERJ 145, com capacidade para 50
passageiros, foi um enorme sucesso de vendas e deu origem ao conceito de
“família”, com o ERJ 135 (37 assentos) e o ERJ 140 (44 assentos) (EMBRAER,
2011).
A entrada em operação da nova família de jatos comerciais EMBRAER
170/190 a partir de 2004, fruto de um projeto desenvolvido em tempo recorde para
suprir um vazio no mercado regional para aviões de maior capacidade (70 a 100
lugares) provou que a empresa mais uma vez havia feito uma excelente leitura das
tendências para aquele mercado.
A valorização do mercado de Aviação Executiva com o lançamento de novos
produtos nas linhas Phenom e Lineage gerou um volume impressionante de vendas,
tendo a família Phenom iniciado sua carreira com filas de espera de até quatro anos.
Ao mesmo tempo, a EMBRAER expandia suas operações no mercado de
serviços aeronáuticos, estabelecendo bases sólidas para o desenvolvimento futuro
da empresa (EMBRAER, 2011).
Com mais de 40 anos de existência, a empresa atua em todas as etapas de
um processo complexo: projeto, desenvolvimento, fabricação, venda e suporte pósvenda de aeronaves para os segmentos de aviação comercial, aviação executiva,
além de oferecer soluções integradas para defesa e segurança.
Já foram produzidos pela EMBRAER mais de cinco mil aviões, que operam
em 80 países, nos cinco continentes, tornando-a líder no mercado de jatos
comerciais com até 120 assentos, além da fabricação de alguns dos melhores jatos
25
executivos em operação e da entrada em um novo patamar no setor de defesa
(EMBRAER, 2011).
Mas como tudo isto foi possível em um país sem tradição no desenvolvimento
de tecnologias avançadas?
Como disse Silva (2008), “com base em um planejamento governamental de
cinquenta anos atrás, um empreendimento diferenciado foi criado e mantido. Anos
de investimentos em processos educativos inovadores e eficazes incluíram o Brasil
no seleto grupo de países capazes de projetar, desenvolver e fabricar aviões”.
A EMBRAER foi viabilizada pelos investimentos e pelas expressivas compras
do governo para dar sustentabilidade financeira inicial ao negócio. No setor militar e
aeroespacial, o papel do Estado é sempre o de gerar as condições para que os
benefícios desta atividade possam ser absorvidos pelos diversos setores da
economia. A aviação é para o País uma atividade de importância singular,
principalmente como elemento de integração regional; porém é um setor em que não
há espaço para microempresas, a não ser como fornecedoras de componentes e
serviços. Então, existe uma tendência ao fortalecimento desigual de empresas e à
consolidação de grandes grupos em número limitado.
Diversos autores, entre eles Silva (2008), Cabral (1998) e Forjaz (2003),
destacam o papel fundamental do CTA, e mais especificamente de seus institutos,
na produção do conhecimento que embasaria a experiência industrial da EMBRAER.
Entretanto, a falta de maturidade da interface entre os institutos e as atividades da
EMBRAER é destacada por Cabral (1998). Esse autor constata a evasão do pessoal
técnico e administrativo desses institutos de pesquisa para a EMBRAER. É claro que
essas transferências de tecnologia, ligadas a uma transferência definitiva de pessoal
qualificado, permitiram à EMBRAER empreender novos projetos (AMX, EMB123),
sem nenhuma participação do IPD, do ITA e do Instituto de Fomento Industrial (IFI) excetuando-se os estudos de homologação e experimentação de protótipos. Mas
essa prática, segundo o autor, iria desembocar inevitavelmente, cedo ou tarde, em
uma degradação da qualidade das atividades de pesquisa e de ensino.
3.2 HELIBRAS
Em 1973 o Instituto de Fomento Industrial (IFI) do CTA iniciou uma série de
gestões visando à implantação de uma indústria de helicópteros no País. O projeto
26
previa a constituição de uma joint venture entre uma empresa estatal brasileira e
uma empresa estrangeira, cabendo à última fornecer a tecnologia. A empresa
estrangeira permaneceria em condições minoritárias de capital e a empresa a ser
criada não poderia apresentar déficit na balança de divisas (FUNDAÇÃO ..., 2002).
Naquele
momento,
o
mercado
brasileiro
apresentava
dimensões
relativamente reduzidas e o mercado militar se afigurava como sendo fundamental
para viabilizar uma indústria de helicópteros no país. Dados de 1982 revelavam que
cerca de 55% dos 38000 helicópteros em operação no mundo eram militares. Por
outro lado, a frota brasileira não ultrapassava a casa de 130 aparelhos. No mesmo
ano, voavam na França cerca de 1500 aeronaves de asa rotativa (CANDAU, 1982).
Diversas empresas estrangeiras foram instadas a apresentar projetos de
fabricação de helicópteros no país. As negociações prolongaram-se pelos anos de
1974 e 1975. Em 1976, finalmente, a empresa estatal francesa Aeroespatiale
apresentou um projeto detalhado de fabricação, sendo o mesmo analisado no
âmbito do Conselho de Desenvolvimento Industrial7 (CDI) para a concessão de
incentivos fiscais. Concomitantemente, a empresa francesa procurava um parceiro
estatal, conforme exigência do Ministério da Aeronáutica, e o encontrou no Governo
de Minas Gerais. O então governador Aureliano Chaves desenvolvia uma política de
incentivos à criação de pólos industriais no Estado. A participação do Governo de
Minas no capital de uma fábrica de helicópteros inseria-se nessa política
(FUNDAÇÃO ..., 2002).
Em abril de 1978 era constituída a HELIBRAS – Helicópteros do Brasil S.A.,
com a Societé Nationale Industrielle Aeroespatiale detendo 45%do capital; a Cia. de
Distritos Industriais de Minas Gerais e a Minas Gerais Participações com 22,5%
cada; e a Serviços Aerofotogramétricos Cruzeiro Do Sul com 10%. O projeto previa a
fabricação de 200 helicópteros em dez anos, chegando a 57% de índice de
nacionalização, em valor, no final do período, tendo o CDI concedido à HELIBRAS
80% de isenção de impostos de importação (FUNDAÇÃO ..., 2002).
O Departamento de Pesquisa, do Ministério da Aeronáutica, posicionou-se
contrariamente à isenção, alegando não estar previsto o desenvolvimento de
tecnologia no país em momento algum do projeto, que se limitava à montagem no
7
Atualmente SDP - Secretaria de Desenvolvimento da Produção do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e
Comércio Exterior (MDIC)
27
Brasil do helicóptero francês Ecureil. Além, disso o Departamento de Pesquisa
pronunciava-se contra cláusulas do acordo de acionistas que julgava inaceitáveis.
Um dos pontos de discussão era o fato de o contrato admitir o voto de
qualidade, ou seja, as decisões deveriam ser tomadas por unanimidade, o que
equivalia a conferir ao sócio estrangeiro o poder do veto, tornando sem efeito o
controle acionário nacional (FUNDAÇÃO ..., 2002).
De fato, o projeto da HELIBRAS previa a montagem no país do Ecureil
francês, com gradativa nacionalização de partes e peças, exceto as turbinas e os
componentes de rádio-navegação. Não estava previsto, ainda que a longo prazo, a
industrialização de aeronaves de projeto nacional ou mesmo de projeto conjunto
com a empresa francesa (FUNDAÇÃO ..., 2002).
O Instituto de Pesquisa e Desenvolvimento do CTA também se manifestava
contrário ao projeto e aspirava trilhar o caminho bem-sucedido do Bandeirante8.
Em agosto de 1979, o presidente da Republica assinou decreto concedendo
100% de isenção de pagamento de impostos sobre a importação de máquinas,
equipamentos, partes, peças e turbinas para a produção de 200 helicópteros em dez
anos. A exposição de motivos vinha assinada pelos ministros João Camilo Penna,
da Indústria e do Comercio, Mário Henrique Simonsen, do Planejamento, e Karlos
Rischbieter, da Fazenda. Nela, os ministros afirmavam que a empresa tinha controle
nacional (55% do capital); investimento fixo de 125 milhões de cruzeiros (a preços
de 1976), dos quais 49% com recursos próprios da empresa; que o projeto visava à
produção de 250 aparelhos Ecureil e mais 30 aeronaves Lama; que no quinto ano
de operação se atingiria 57% de índice de nacionalização em valor do produto; e
que esse índice poderia chegar a 65,5% com a nacionalização de parte da turbina,
cujo projeto se procuraria viabilizar. Por fim, argumentava que o projeto por seu
“valor tecnológico deveria ter apoio total do Governo” (FUNDAÇÃO ..., 2002).
Na verdade, o projeto inicial sofreu muitas modificações e adiamentos em
função dos obstáculos que se interpuseram. Originalmente a Aeroespatiale
pretendia fabricar no Brasil o aparelho Lama, um helicóptero antigo cujo projeto
datava dos anos 50. Durante as negociações, contudo, concordou em fabricar o
Ecureil, seu modelo mais recente de helicóptero leve, que voara pela primeira vez na
8
O IPD/CTA havia desenvolvido, sob a égide do Prof Heinrich Focke, um helicóptero genuinamente nacional
que contava com soluções aerodinâmicas revolucionárias.
28
França em 1976, entrando em produção seriada cerca de um ano mais tarde
(FUNDAÇÃO ..., 2002).
Definido o Ecureil, batizado Esquilo, como produto básico da HELIBRAS, foi
definida Itajubá como o local da fábrica por sua proximidade a São José dos
Campos, o centro da indústria aeronáutica brasileira.
Em 1981, a HELIBRAS procurou novamente o CDI, argumentando não ser
possível cumprir o cronograma de nacionalização previsto no projeto original. O CDI
acedeu e estabeleceu um novo cronograma de nacionalização. Em 1982, a previsão
era de que somente em 1991 seriam nacionalizadas as partes nobres do
helicóptero, incluindo-se as pás, as caixas de redução e a cabeça do rotor, três
componentes tecnologicamente complexos de um helicóptero. Continuariam sendo
importadas as turbinas e os instrumentos (FUNDAÇÃO ..., 2002).
Em 1984, um contrato entre a Força Aérea Brasileira e a Aerospatiale
garantiu o fornecimento de 10 helicópteros Super Puma, 30 Esquilos monoturbina
produzidos na HELIBRAS e 11 Esquilos biturbina.
Em maio de 1987, a HELIBRAS havia produzido 91 aparelhos, além de um
aparelho “Lama” em 1980 e três em 1981, representando uma produção total de 95
aparelhos. Naquele ano o índice de nacionalização atingia apenas 29% do valor dos
aparelhos (FUNDAÇÃO ..., 2002).
Em 1988, o consórcio HELIBRAS/Aerospatiale/Engesa venceu a concorrência
internacional para fornecer ao Exército Brasileiro 36 helicópteros Pantera e 16
Esquilos, seguidos de uma aquisição de outros 20 Esquilos (HELIBRAS, 2009).
Em 1992, cria-se na França a Eurocopter, resultado da fusão das divisões de
helicópteros das empresas Aerospatiale e Daimler Chrysler Aerospace. A empresa
torna-se, então, a nova matriz da HELIBRAS.
Em junho de 2002, a empresa entregou ao Exército brasileiro os primeiros
dos oito Cougar adquiridos em uma compra de oportunidade (HELIBRAS, 2009).
Em 2003, a empresa se aparelhou para a intervenção mecânica nos
Pantera/Dauphin e ampliou a capacidade das oficinas destinadas à manutenção dos
EC120 e EC135. A partir daí, a empresa se qualificou para realizar inspeções de
manutenção rotineiramente nas aeronaves da Aviação do Exército.
No ano de 2004 foi iniciada a operação no Brasil da família AS365 Dauphin
em missões offshore. Em 2005 e 2006 chegaram ao país os primeiros helicópteros
EC135 para operações offshore e atendimento médico de urgência.
29
Em 2008, a HELIBRAS/Eurocopter comemorou o lançamento do pólo
aeronáutico brasileiro de helicópteros de grande porte, com a assinatura de contrato
com o Governo Federal para fornecimento de 50 helicópteros EC725 às Forças
Armadas brasileiras (HELIBRAS, 2009).
O projeto, com investimentos iniciais de US$ 450 milhões para a expansão da
fábrica e transferência de tecnologia entre o Brasil e a França, prevê duplicação da
sua capacidade instalada com a geração de 300 empregos diretos e 3 mil indiretos.
Uma nova linha de montagem está sendo construída especialmente para atender à
produção e a pedra fundamental para a nova fábrica foi lançada em março de 2010.
Em 2009, um contrato entre a HELIBRAS e o Exército Brasileiro colocou a
empresa no restrito grupo capaz de planejar e conduzir um projeto de retrofit de
aeronaves militares. Os 34 helicópteros Pantera modernizados receberão uma nova
cablagem, novo capô do motor, tela VEMD9 integrada a um novo glass cockpit10,
piloto automático de quatro eixos, motor Arriel 2C2CG (40% mais potente que o
atualmente instalado), entrada de ar e radiador maiores e uma caixa de transmissão
principal
totalmente
modernizada.
Também
contarão
com
novos
radares
meteorológicos e altímetros, modernos rádios de navegação e de comunicação,
além de um novo rotor de cauda, aumentando significativamente o desempenho e a
segurança da aeronave (HELIBRAS, 2009).
Este projeto está possibilitando à HELIBRAS um importante salto tecnológico,
o qual, juntamente com a fabricação do modelo EC725, a modernização do Esquilo
e demais programas em andamento, poderão possibilitar o desenvolvimento e
concepção de um helicóptero brasileiro, previsto para 2020.
A empresa, que em 2009 tinha 260 funcionários, vai terminar 2013 com 850,
chegando aos mil funcionários em 2014. De sua fábrica saem por ano 40 novos
helicópteros leves e 13 médios. O planejamento estratégico da empresa prevê a
partir de 2015 a produção de 16 helicópteros de grande porte por ano (HELIBRAS,
2009).
Desde sua fundação, a HELIBRAS já entregou mais de 500 helicópteros no
Brasil, sendo 70% do modelo Esquilo, aeronave também vendida a outros países
sul-americanos, como Argentina, Bolívia, Chile, Paraguai e Venezuela (HELIBRAS,
2009).
9
Tela digital para monitoramento das informações oriundas de todos os sensores da aeronave.
Telas para apresentação digital de todas as informações de voo e de desempenho da aeronave.
10
30
A HELIBRAS resumiu-se ao longo de sua história a um projeto de montagem
de helicópteros no país. Apesar de não prever projetos de desenvolvimento de
helicópteros no Brasil, a empresa contou com o apoio das FA, através de suas
políticas de compras e de outros mecanismos de fomento. O resultado apresentado
até o momento é decepcionante. O Esquilo, aeronave montada no país há quase
trinta anos, tem índice de nacionalização de componentes variando entre 40 e 50%,
dependendo da metodologia adotada, sendo a maior parte do valor referente à mão
de obra utilizada em sua montagem.
A empresa contava até bem pouco tempo com um número muito reduzido de
engenheiros e técnicos especializados, sendo a maior parte de seus empregados
ligados às áreas financeira e administrativa (HELIBRAS, 2009).
O projeto EC725 teve o mérito de quintuplicar o corpo de engenheiros da
empresa (LOMBARDI, 2012), o que junto com os desafios tecnológicos dos
programas de modernização das aeronaves do Exército Brasileiro - inteiramente
conduzidos no Brasil, inclusive campanhas de certificação de modelo - elevará
substancialmente a capacitação técnica da HELIBRAS, qualificando-a para provar
voos mais altos como desenhar e desenvolver projetos autóctones com o respaldo
da experiência e know-how da Eurocopter.
3.3 O MERCADO DE AERONAVES DE ASAS ROTATIVAS NO BRASIL
As informações sobre o mercado de aeronaves serão divididas para fins
didáticos em mercado civil e militar. Entretanto, as limitações de nosso orçamento
militar impedem que exista um genuíno mercado militar, com aeronaves
especificamente projetadas para emprego civil, sendo as nossas aeronaves militares
simples adaptações de modelos civis.
3.3.1 Civil
O mega plano de investimentos da Petrobras 2013-17 reforçou as
expectativas do setor de apoio offshore, que tem reiterado o gargalo existente nessa
atividade chave da indústria de petróleo e gás. Assim como a segurança operacional
e a questão ambiental, a logística é crucial para garantir as operações das quase
150 unidades de produção instaladas ao longo da costa brasileira (TEIXEIRA, 2012).
31
A grande concentração delas acontece no litoral da Região Sudeste, onde
estão as bacias mais produtivas, como a de Campos e a do Espírito Santo, e a de
maior potencial, a Bacia de Santos, com a sua rica camada do pré-sal.
Segundo números da Petrobras, o transporte aéreo na Bacia de Campos
movimentou mensalmente mais de 70 mil passageiros em 2012, transportados por
uma frota que somava 94 helicópteros contratados, partindo dos aeroportos da
região – Macaé, Campos dos Goytacazes e Cabo Frio (TEIXEIRA, 2012).
Devido às novas unidades de produção que serão instaladas nos próximos
anos, a expectativa da Petrobras, que responde por 90% da demanda de transporte,
é de que o número desses passageiros dobre até 2017 e continue a crescer até
2020. E o volume de carga, hoje em torno de 500 mil toneladas, deve superar um
milhão de toneladas até o final da década (TEIXEIRA, 2012).
De acordo com dados da petroleira, entre 2003 e 2010 entraram em operação
na costa brasileira 35 unidades estacionárias de produção (UEP). De 2011 a 2015, a
previsão é de mais 21 UEP, duas das quais já entraram em operação em 2011: a
plataforma de Mexilhão, na Bacia de Santos, e a P-56, que começou a produzir em
agosto no campo de Marlim Sul (Campos). De 2016 até 2020, a Petrobras prevê
instalar mais 30 UEP (TEIXEIRA, 2012).
O mercado de transporte offshore no Brasil tem crescido mais de 10% a.a.
nos últimos cinco anos, impulsionada pela expansão da Petrobrás. O principal
operador desse serviço, a Líder Aviação, obteve uma receita de mais de 500 milhões
de reais em 2009 e a receita deve disparar com o desenvolvimento das plataformas
de petróleo no Pré-Sal. Como os reservatórios do pré-sal estão a mais de 300
quilômetros da costa brasileira, o transporte de pessoas e cargas precisará ser feito
com helicópteros maiores e mais eficientes. Embora sejam mais caros, rendem mais
receita e lucro às empresas de táxi aéreo.
A Petrobras está promovendo em 2013 duas licitações para contratar novos
helicópteros médios e grandes, que devem começar a ser usados nos trabalhos do
pré-sal. Os médios, geralmente, comportam entre dez e 12 pessoas e custam entre
US$ 10 milhões e US$ 15 milhões. Os pesados podem levar 18 passageiros e
custam cerca de US$ 25 milhões. As empresas de táxi aéreo estimam um número
entre 20 e 30 aeronaves contempladas nesses dois processos licitatórios
(TEIXEIRA, 2012).
32
A Bristow, maior empresa de transporte aéreo offshore do mundo em número
de helicópteros (480 unidades), projeta que o Brasil demandará de 30 a 40 novos
helicópteros nos próximos cinco anos e mais 30 ou 40 nos cinco anos seguintes. A
tendência é que a frota irá crescer significativamente na próxima década, o que torna
o Brasil um dos maiores mercados de táxi aéreo no mundo (TEIXEIRA, 2012).
Estimativas menos conservadoras do setor apontam que, nos próximos sete
anos, o mercado offshore vai necessitar de mais 100 helicópteros de médio e grande
porte para atender a uma demanda que foi de 800 mil passageiros em 2011 e que
deverá chegar a 1,6 milhão em 2015. Existem hoje no mercado offshore brasileiro
cerca de 200 helicópteros, de todas as marcas.
3.3.2 Militar
As três FA brasileiras possuem aviação de asas rotativas e comungam a
intenção de incrementar quantitativamente e qualitativamente estas frotas.
Existem diversos programas militares de aquisição de aeronaves, dentre os
quais podemos citar a compra dos UH60 BlackHawk pelo Exército, pela FAB e pela
Marinha (na versão SeaHawk); o programa LUH (Ligh Utility Helicopter) e a
substituição das aeronaves do Esquadrão de Instrução da Marinha; e o mais
ambicioso de todos, o EC725 (BOROS, 2010).
A HELIBRAS vai fornecer um total de 50 helicópteros EC725 às três forças
armadas do Brasil num contrato de aquisição de 1,8 bilhão de euros assinado com o
Ministério da Defesa em 2008. Como parte do acordo, esses helicópteros vão incluir
progressivamente até 50 por cento de conteúdo nacional (HELIBRAS, 2009).
A frota militar brasileira hoje é de 211 helicópteros, sem contar os EC725 e os
SH60 SeaHawk da Marinha. Deste total, mais de 70% são aeronaves no limite de
seu tempo útil de vida, o que gera excelentes oportunidades de negócios. Além da
reposição, os projetos de aquisição de novas capacidades pelas FA fatalmente
redundarão na aquisição de expressiva quantidade de aeronaves para compor as
unidades a serem criadas (BRASIL, 2012).
O mercado parapúblico tem crescido consistentemente nos últimos anos, com
demanda por modelos mais sofisticados. O Ministério da Justiça deve adquirir até
130 novas aeronaves para equiparem as diversas polícias estaduais entre 2010 e
2016.
33
4 MODELO DA TRIPLA HÉLICE
A transição do paradigma da sociedade industrial para o da sociedade do
conhecimento inseriu a gestão do conhecimento no centro de uma discussão ampla,
que envolve o Estado, a iniciativa privada e a universidade. A necessidade crescente
de conhecimentos científicos para o desenvolvimento de novas tecnologias e o
encurtamento do ciclo das inovações exige práticas de cooperação tecnológica entre
os atores citados acima, a chamada tripla hélice.
O entendimento das limitações do Estado levou à discussão do seu papel e o
da iniciativa privada no fomento de mudanças e benefícios à sociedade,
potencializando
a
contribuição
das
universidades
para
o
desenvolvimento
econômico e social do país. Uma vez definidos os projetos tecnológicos estratégicos
- as Políticas de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) - do Estado, cabe a este criar
e/ou estimular as interações entre universidade e segmento empresarial, baseado no
argumento de que essas favorecem o acesso aos conhecimentos e habilidades
tecnológicas dos parceiros, além de minimizarem os riscos financeiros inerentes às
atividades de pesquisa e desenvolvimento, ao mesmo tempo em que possibilitam
novo aporte de recursos àquelas atividades (FUJINO; STAL; PLONSKI, 1999).
Segundo Webster e Etzkowitz (1991), entre as razões que estimulariam as
empresas a ampliar estas interações, podem-se citar:
- custo crescente da pesquisa associada ao desenvolvimento de produtos
e serviços necessários para assegurar posições vantajosas num mercado cada vez
mais competitivo;
- a necessidade de compartilhar o custo e o risco das pesquisas com
outras instituições que dispõem de suporte financeiro governamental;
- elevado ritmo de introdução de inovações no setor produtivo e a redução
do intervalo de tempo que decorre entre a obtenção dos primeiros resultados de
pesquisa e sua aplicação; e
- decréscimo dos recursos governamentais para pesquisa em setores
antes muito fomentados, como os relacionados ao complexo industrial-militar.
Do lado da universidade, as motivações principais seriam:
- a dificuldade crescente para obtenção de recursos públicos para a
pesquisa e a expectativa de que estes possam ser fornecidos pelo setor privado em
função do maior potencial de aplicação de seus resultados na produção; e
34
- interesse da comunidade acadêmica em legitimar seu trabalho junto à
sociedade que é, em grande medida, a responsável pela manutenção das
instituições universitárias.
Essa ampliação estaria demonstrando uma maior eficiência da relação
universidade-empresa-governo, levando a universidade a incorporar funções de
desenvolvimento econômico às suas já clássicas atividades de ensino e pesquisa,
obrigando-a a redefinir suas estruturas e funções (ETZKOWITZ, 1994). Estaria
ocorrendo, assim, a generalização de um padrão de relação caracterizado pelo
maior impacto econômico das pesquisas realizadas na universidade.
Em sua obra de 1994, Gibbons et. al. (apud Sobral, 2004), por exemplo,
referem-se ao surgimento de um novo modo de produção do conhecimento. As
pesquisas são desenvolvidas a partir da necessidade de resolução de problemas
práticos, e assim, visão dos autores, nesse novo modo de produção a pesquisa
assume um caráter mais interdisciplinar. Isto baseado na premissa que, se o
conhecimento é produzido para superar um desafio prático e não apenas para
acumulação, muitas vezes o caminho passa por várias disciplinas que se
complementam, trabalhando juntas.
Assim, o novo modo de produção do conhecimento provoca mudanças
significativas na forma tradicional de se fazer pesquisa, uma vez que o que antes era
orientado pelo próprio processo de acumulação do conhecimento passa a ser regido
também por sua utilidade social ou econômica. Entretanto, a consolidação do novo
modo de produção do conhecimento não implica necessariamente na substituição
do antigo (SOBRAL, 2004).
Na mesma linha, Etzkowitz e Leydesdorff (2000), em seu modelo da tripla
hélice de relações entre as esferas universidade-empresa-governo, afirmam que as
universidades estão passando por uma segunda revolução. Segundo os autores
essa revolução se refere ao fato de que, as pesquisas passam a ser orientadas para
as necessidades de se contribuir mais efetivamente para o desenvolvimento
econômico, especialmente das regiões.
Em outras palavras, além das duas
missões básicas: ensino e pesquisa, na segunda revolução as universidades
incorporam a missão institucionalizada de contribuir para a resolução de problemas
práticos da sociedade e também do mercado. No mesmo sentido, Martin e Etzkowitz
(2000), afirmam que o resultado dessa nova visão é a emergência da universidade
35
empreendedora, a qual combina ensino, pesquisa e contribuição para a economia,
particularmente da região na qual está inserida.
Como visto no início desta seção, o entendimento do papel de cada ator vem
sofrendo revisões ao longo do tempo. O texto Science: the Endless Frontier (BUSH,
1945) tornou-se um marco da política científica e tecnológica que, ao final da década
de 1950, foi adotada pela maioria dos países industrializados. Ao mesmo tempo,
difundiu a concepção do modelo linear de inovação que dominou o pensamento de
ciência e tecnologia até recentemente. Segundo essa concepção, o progresso
técnico constitui-se em uma sequência linear causal de estágios, partindo da
pesquisa básica até atingir a inovação tecnológica no final da cadeia. Assim, novos
conhecimentos advindos da pesquisa chegariam a certo tempo ao estágio de
invenção de produtos e processos tecnicamente viáveis e comercializáveis
(MARTIN; ETZKOWITZ, 2000).
A ideia era que se o governo investisse recursos suficientes na pesquisa
básica, em algum momento, surgiriam inovações tecnológicas, gerando maior
desenvolvimento econômico e social. (GUSTON; KENISTON, 1994).
Após o declínio do modelo linear de inovação, como observado por Martin e
Etzkowitz (2000), espera-se que os cientistas e universidades usem os recursos
públicos, atentando para as necessidades da economia e da sociedade em geral.
Nesta linha de rompimento com conceitos e práticas do passado, Etzkowitz e
Leydesdorf (2000) propõem a interação entre as esferas universidade-governoempresa, como forma de se complementar necessidades e recursos na direção da
formação do ambiente institucional propício à geração de inovações. Estas ideias
confirmam a visão de autores já citados, como Fujino; Stal; Plonski (1999) e Webster
e Etzkowitz (1991).
Esta tese apresenta um alto grau de concordância e está relacionada à
observação de que a universidade pode e deve desempenhar um papel maior na
sociedade, contribuindo na destinação dada ao conhecimento ali produzido. Este
será o modelo adotado para discussão nesta seção.
Os arranjos no modelo da tripla hélice não são estáveis. Uma vez que as
vertentes das hélices se relacionam entre si, juntas produzem o surgimento de novas
camadas
de
inter-relação
organizacionais híbridas.
institucional,
resultando
em
redes
e
formas
36
No entanto, existem formas distintas de relações entre universidade, empresa
e governo. No modelo Tripla Hélice I (Figura 4), o Estado absorve em sua estrutura a
academia e a indústria e dirige as relações entre eles. O mais forte exemplo deste
modelo poderia ser encontrado na antiga União Soviética. Versões mais fracas deste
modelo poderiam ser encontradas nas políticas de muitos países latino-americanos
e em alguns países da Europa (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000).
Figura 4: Tripla-Hélice I
Fonte: Adaptação de Etzkowitz e Leydesdorff (2000)
O fato deste arranjo, em certo grau, desencorajar iniciativas para a inovação,
ao invés de encorajá-las, é o maior problema encontrado aqui e motivo de
frequentemente este modelo ser visto como um modelo de desenvolvimento falho
(ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000).
Um segundo modelo consiste na separação institucional das esferas, com
claros limites que as dividem. Apresentam relações altamente circunscritas dentro
das esferas. Como exemplo desta configuração podemos citar a Suécia e os
Estados Unidos (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000).
Figura 5: Tripla-Hélice II
Fonte: Adaptação de Etzkowitz e Leydesdorff (2000)
37
A Figura 5 apresenta a configuração do modelo da Tripla Hélice II. Este
modelo de relações entre universidade, indústria e governo é também chamado
pelos autores de modelo laissez-faire.
Finalmente, no modelo da Tripla Hélice III, existe uma configuração evoluída,
promovendo uma infraestrutura de conhecimento que chega a justapor esferas
institucionais, ao contrário do modelo anterior no qual a ação de cada esfera se
circunscrevia dentro de seus limites específicos.
Figura 6: Tripla-Hélice III
Fonte: Adaptação de Etzkowitz e Leydesdorff (2000)
Como pode ser visto na Figura 6, cada uma das esferas, nas zonas de
interseção, assume o papel que antes estava na responsabilidade da outra. Com
isso surgem organizações híbridas em suas interfaces.
De uma forma ou outra, a maioria dos países está tentando implementar este
terceiro modelo. O objetivo comum é permitir um ambiente favorável à inovação por
meio de iniciativas trilaterais com o objetivo de se alcançar o desenvolvimento da
economia. A busca de alianças estratégicas entre empresas (grandes e pequenas,
atuando em diferentes áreas, e com diferentes níveis de tecnologia), laboratórios do
governo e grupos de pesquisas acadêmicos seriam encorajados, mas não
controlados pelo governo (ETZKOWITZ; LEYDESDORFF, 2000).
O fundamental neste último modelo de relações institucionais é o fato de que
cada sistema seria definido conforme as necessidades e disponibilidades de
recursos fossem se desenhando, com a participação conjunta tanto do governo, da
iniciativa privada e das universidades.
38
5 DISCUSSÃO
Em 1953, com o ITA já em funcionamento, o Prof Dr. Heinrich Focke foi
convidado pelo Brig Casimiro Montenegro Filho para trabalhar no CTA,
desenvolvendo projetos de aeronaves de asas rotativas, área de excelência da
equipe do Prof Focke11. Seu primeiro projeto no Brasil foi de uma aeronave cujo
conceito ainda não foi comprovado e que muitos julgam utópico, o Convertiplano12.
Este projeto teve o mérito de motivar a criação do IPD (SILVA, 2008).
Em seguida, Focke propôs o desenvolvimento de um helicóptero que inovava
tremendamente na forma de controlar os movimentos longitudinais e laterais, com
seu rotor de cauda duplo, responsável por aqueles controles, e um rotor principal
rígido, algo ainda hoje pesquisado como uma boa solução para o problema do
antitorque em aeronaves de configuração clássica.
O Beija-Flor, nome do projeto, fez seu voo inaugural em fevereiro de 1960
(DRUMOND, 2004), porém sua planejada produção seriada não pode ser iniciada
devido à falta de uma estrutura industrial que permitisse o sucesso do projeto. Ficou,
porém, comprovada a possibilidade de projetar e desenvolver um helicóptero
genuinamente nacional.
Na apresentação da indústria aeronáutica de asas rotativas (Seção 2)
verificou-se o papel fundamental desempenhado pelo “pioneiro”, o indivíduo
diferenciado, dotado de inteligência, iniciativa e persistência para perseguir um
sonho e concretizar um projeto.
Igor Sikorsky e Giovanni Agusta valeram-se de sua paixão pela aviação para
construir as bases do que viria a tornar-se mais tarde um gigantesco complexo
industrial dedicado à inovação.
Ozires Silva, impulsionado pela mesma motivação, mas vivendo situação
institucional muito diversa, lançou-se no desafio de construir aeronaves com um
grupo de abnegados, dedicados e bem qualificados engenheiros, sem permitir que
se convertessem em “vítimas ingênuas de um novo Convertiplano” (SILVA, 2008).
11
Heinrich Focke era um dos pioneiros da aviação de asas rotativas e teve o privilégio de fazer voar o primeiro
helicóptero de forma controlada, o FW61, em 1936. Em sua carreira projetou e construiu uma série de
helicópteros de cada vez maior grau de refinamento técnico, sempre com a configuração em tandem lateral.
12
Aeronave de decolagem vertical com quatro rotores acionados por um único motor, cujos eixos de propulsão
articulados permitiriam converter-se em uma aeronave similar a um avião, capaz de alcançar velocidade de até
500 km/h.
39
Entretanto, embora as fontes existentes não se estendam sobre o assunto,
fica claro ao leitor atento de Sikorsky (1967), Leishman (2000), Silva (2008) e Ceriani
(2004) a importância da universidade e dos institutos de pesquisa na sustentação de
um negócio baseado em conhecimento, pesquisa e inovação. O constante
desenvolvimento
de
novas
tecnologias,
buscando
sempre
os
limites
do
conhecimento com intensa pesquisa é parte indissociável do negócio da indústria
aeronáutica e, como dizia sabiamente o Brigadeiro Casimiro Montenegro, “somente
produziremos aviões se antes ‘fabricarmos’ engenheiros e técnicos” (SILVA, 2008).
É importante ressaltar ainda que, muito antes da moderna discussão sobre
modelos de desenvolvimento e sobre a teoria da tripla hélice, o que se pode
observar no surgimento das empresas aeronáuticas utilizadas como benchmark
neste trabalho é a profunda inter-relação entre estado-universidade-empresa criando
um ambiente propício para o início de suas atividades e alimentando novos ciclos de
interação, como previsto por Etzkowitz e Leydesdorff (2000).
O papel do Estado, identificando áreas estratégicas do conhecimento e
incentivando por intermédio de políticas e aquisições o surgimento de um mercado
que estimule a ação de empreendedores e cientistas foi constatado em todos os
casos apresentados.
O R4, sucessor do VS300 primeiro helicóptero funcional com a configuração
de um moderno aparelho, só foi viabilizado devido a uma encomenda das FA dos
EUA, que cedo identificaram o potencial da máquina para cumprir missões que não
poderiam ser desempenhadas por nenhuma outra aeronave (UNITED ..., 2012).
O governo italiano, por intermédio de suas FA, foi sempre cliente lançador de
diversos projetos da Agusta (CERIANI, 2004); assim como o governo britânico com a
Westland, desde o tempo dos irmãos Petters (MONDEY, 1982). A EMBRAER foi
viabilizada como empreendimento financeiramente sustentável com a encomenda
inicial feita pelo governo brasileiro (SILVA, 2008).
Estes exemplos de sucesso puderam contar também com um forte suporte
acadêmico para a composição de seus extensos quadros de engenheiros e técnicos.
A construção aeronáutica exige um alto grau de capacitação técnica em diversas
áreas do conhecimento para projetar e desenvolver produtos tão complexos. Esta
mão de obra não é facilmente encontrável e é de difícil formação, portanto institutos
de formação de excelência são o local mais propício para recrutá-la na quantidade e
qualidade necessárias.
40
Todos estes elementos – à exceção do “pioneiro” – estavam presentes no
nascimento da HELIBRAS. O que deu errado então com a indústria aeronáutica
nacional de asas rotativas?
A HELIBRAS, diferentemente da EMBRAER, não foi um esforço de
industrialização de projetos oriundos da área acadêmica capitaneados por um
indivíduo ou grupo de indivíduos empreendedores. Ela nasceu como um projeto de
subsidiária, muito semelhante à situação da nossa indústria automobilística.
A indústria automobilística brasileira é um dos pilares da política industrial do
país desde a década de 1950 (LEAHY, 2013), e mesmo assim até hoje foi incapaz
de projetar localmente produtos tecnologicamente avançados13, não obstante
empregar mão de obra nacional de alta qualidade. Os engenheiros, projetistas e
designers brasileiros empregados nos centros de pesquisa das grandes montadoras
“nacionais” limitam-se a realizar “tropicalizações” dos produtos projetados nas
matrizes americanas e europeias, desenhados para os mercados do mundo
desenvolvido (YOKOTA, 2010).
É importante traçar a distinção entre HELIBRAS e EMBRAER – bem como as
semelhanças entre HELIBRAS e as montadoras de automóveis nacionais - porque
vários especialistas afirmam que os problemas que impediram a HELIBRAS de
desenvolver-se em uma ‘Embraer das asas rotativas’ eram ligados à falta de mão de
obra qualificada, às dificuldades intransponíveis para superar os desafios
tecnológicos presentes na construção de helicópteros, ou ainda à falta de um
mercado que viabilizasse o negócio.
O autor acredita que o verdadeiro motivo do atraso e autolimitação da
HELIBRAS é sua completa dependência da matriz para definição de suas ações
estratégicas, desde seu nascimento. Desta forma, todas as decisões são tomadas
tendo por base a lógica de negócios da EUROCOPTER, dona de mais de 85% das
ações da HELIBRAS, maior produtora de helicópteros do mundo e empresa atuante
em todo o globo, tendo subsidiárias em vários países, entre eles EUA e Rússia
(EUROCOPTER, 2013b).
Não por acaso, o plano de negócios apresentado em 1974 pela, então,
Aerospatiale previa a fabricação do envelhecido Lama, opção que só foi modificada
pela pressão do governo brasileiro, oriunda, sobretudo, da Força Aérea. Com pouco
13
A observação refere-se às chamadas “quatro grandes”: Chevrolet, Fiat, Ford e Volkswagen.
41
esforço se pode fazer um imediato paralelo com a nossa indústria automobilística, ao
mesmo tempo em que será difícil encontrar traços comuns com as outras empresas
da indústria aeronáutica mencionadas no trabalho.
Pode-se imaginar que os franceses, maiores acionistas da holding
Eurocopter, não viram – e ainda não veem – possibilidade de reunir todos os atores
necessários para viabilizar uma atuação mais independente, sobretudo tecnológica,
de sua subsidiária. Esta não seria uma situação inédita na história de nossa indústria
aeronáutica. Segundo Silva (2008), “[...] parecia que os italianos não acreditavam
muito que a EMBRAER poderia ser diferente de iniciativas semelhantes promovidas
por outros países. Imaginavam que a empresa brasileira seria simplesmente uma
montadora das peças e dos equipamentos enviados da Itália”.
As condições proporcionadas pelas interações contínuas e retroalimentadas
das relações universidade-empresa-estado, conforme explicado nos modelos da
tripla hélice, criam um ambiente adequado para apresentar resultados diversos
daqueles imaginados pelos europeus.
Neste sentido, iniciativas recentes como as do Governo de Minas Gerais, ao
fomentar o Projeto Tecnópolis da Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI),
comprovam o poder de mobilização dessa interação. Em pouco tempo, a prefeitura
da cidade, o governo do estado, o governo federal e empresas da indústria local –
capitaneadas pela HELIBRAS – juntaram-se à UNIFEI para dar corpo ao projeto que
hoje constitui uma das melhores possibilidades de efetiva transferência de
conhecimento e tecnologia nas diversas áreas da engenharia aeronáutica e
engenharia mecânica aeronáutica em virtude das cláusulas de offset do contrato de
aquisição das aeronaves EC725.
O primeiro passo concreto já foi dado com a destinação de recursos federais
e estaduais para elaboração do projeto executivo do Centro Nacional de Tecnologia
de Helicópteros (CNTH), em Itajubá. Segundo o Secretário de Ciência, Tecnologia e
Ensino Superior de Minas Gerais “[...] teremos a nacionalização da produção do
nosso primeiro helicóptero. O Centro vai ser responsável por absorver esta
tecnologia e ampliar as pesquisas sobre a indústrias de asas rotativas em Minas”
(RODRIGUES, 2013).
Entre os objetivos específicos apresentados pela UNIFEI para criação do
42
CNTH14 constam:
- ampliar a área de pesquisa, desenvolvimento e inovação (P, D&I) em
tecnologias
aeronáuticas
competitividade
e
o
de
asas
rotativas
desenvolvimento
da
capazes
indústria
de
proporcionar
aeronáutica
a
brasileira,
especialmente a indústria de asas rotativas, com foco em 2023;
- propor uma plataforma de desenvolvimento de tecnologias aeronáuticas
de asas rotativas com o uso intensivo de ciência básica que seja capaz de gerar
tecnologias inovadoras para o complexo aeronáutico; e
- adensar a cadeia produtiva de asas rotativas.
Estes fatos novos nas políticas de governo e nas iniciativas acadêmicas,
aliados à assinatura do contrato para fornecimento dos 50 EC725, colocam a
HELIBRAS em uma situação curiosa. Com valor aproximado de 1,8 bilhões de
euros, o contrato do EC725 provê saúde financeira à empresa e exige contrapartidas
de transferência de tecnologia que demandarão maciços investimentos em
capacitação da mão de obra. Ou seja, todas as condições que, como visto,
possibilitam o surgimento de círculos virtuosos de inovação estão presentes neste
momento na empresa. É uma oportunidade única que exigirá dos executivos da
companhia uma visão além daquela imediatista. Caso a HELIBRAS falhe em
desenvolver um modelo de negócios que colabore para a criação de um verdadeiro
polo de indústria aeronáutica de asas rotativas, não poderá contar com nenhuma
daquelas habituais justificativas para o insucesso.
Como se pode observar, o Estado e a universidade já se colocaram em
movimento e cabe à empresa completar o modelo de tripla hélice que se desenha
para a eclosão de uma genuína indústria nacional de asas rotativas. Segundo
Rodrigues (2013):
Estamos dando os primeiros passos para a consolidação do Complexo
Aeroespacial de Minas. O Governo está fazendo uma grande concertação
envolvendo, além dele, a indústria e a academia para o desenvolvimento de
uma nova realidade no Estado. Queremos desenvolver novos produtos, mas
também valorizar o que já existe, caso específico da experiência já existente
em Itajubá com a HELIBRAS e a Universidade Federal de Itajubá.
Ainda como efeito do offset do contrato do EC725, a HELIBRAS anunciou
recentemente sua intenção de projetar e produzir comercialmente o primeiro
14
Proposta apresentada pelo Prof. Dr. Ariosto Bretanha Jorge (UNIFEI) a institutos de fomento à pesquisa. A
cópia em posse do autor foi apresentada à FINEP (Financiadora de Estudos e Projetos).
43
helicóptero genuinamente brasileiro15. Segundo o presidente da empresa “o modelo
deverá ser apto tanto ao uso civil como militar e deve ser capaz de atrair
compradores no Brasil e no exterior” (QUAINO, 2013).
O presidente da HELIBRAS declarou que a escolha do Brasil para a criação
de uma nova aeronave se deu principalmente pela disponibilidade de engenharia e
pelas escolas fortes. A Universidade Federal de Itajubá criou um curso de
engenharia de aeronáutica voltado para helicópteros e tem ainda um centro de
tecnologia de helicópteros (QUAINO, 2013).
A justificativa para esta reviravolta no planejamento estratégico da matriz, no
entanto, deve ser buscada também no mercado de asas rotativas (ver seção 3.3).
Os maciços investimentos a serem feitos pelos operadores do transporte
offshore em aeronaves e suprimentos os colocarão em uma posição muito mais
vantajosa para negociar com os fabricantes, tendo em vista o volume de negócios
Ciência
Tecnologia
que estas empresas estarão gerando.
Figura 7: Iceberg científico-tecnológico de defesa
Fonte: Livro Branco de Defesa (Brasil, 2012)
15
O Beija-Flor não foi produzido comercialmente.
44
A figura 7 ilustra o desafio de desenvolver um projeto complexo como uma
aeronave de asas rotativas. O desenvolvimento de um helicóptero genuinamente
brasileiro será o fruto do trabalho de uma enorme estrutura que funciona “sob a linha
d’água” dando o suporte científico-tecnológico necessário.
Agrava este quadro o fato da indústria aeronáutica de asas rotativas operar
com margens de tolerância de imprecisão baixíssimas na usinagem de peças
produzidas com materiais e processos metalúrgicos no estado da arte.
Ou seja, há necessidade de uma base do “iceberg” com competências que
vão da aerodinâmica avançada à metalurgia de precisão, passando pela produção
de materiais compostos. Isto, sem mencionar a produção de turbinas aeronáuticas.
Onde estão sendo – ou podem ser – construídas estas competências?
O Brasil carece de mão de obra especializada e, para formar profissionais
qualificados, desde 2008, a HELIBRAS tem um convênio com três universidades do
País que formam engenheiros aeronáuticos: o ITA, a USP e, mais recentemente, a
Universidade Federal de Itajubá. Os melhores alunos candidatos a ingressar na
empresa ganham estágios na matriz Eurocopter.
No âmbito do contrato de aquisição dos 50 EC725, a Eurocopter se
comprometeu a qualificar a HELIBRAS e seus fornecedores para nacionalizar 50%
do valor do helicóptero. Neste sentido, alguns contratos com fornecedores locais já
foram firmados e incluem transferência de tecnologia.
A InbraAerospace, por exemplo, foi escolhida para fornecer a blindagem, os
capôs e carenagens do cone de cauda, bem como a estrutura intermediária em
material composto, tecnologia ainda não disponível no Brasil. Outros contratos com
fornecedores da Helibras para o EC725 no Brasil incluem a Toyo Matic Aerospace,
que já produziu as primeiras peças da cabeça do rotor16 “made in Brazil”; a
Aernnova do Brasil para peças do rotor de cauda; a Turbomeca do Brasil para o
fornecimento de motores17; a Sagem para sistemas de piloto automático; a AEL
Aeroeletrônica, que vai fornecer instrumentos do painel; a Microturbo para unidades
de potência auxiliares (APUs); a SDV Brasil para logística; a Akaer para serviços de
engenharia e fabricação de ferramental para os fornecedores RCS, GNS, UNISTI,
MASTER, ITAKAR e IFAM (VALDUGA, 2012).
16
17
Um dos componentes dinâmicos do helicóptero de maior complexidade, junto com as pás e as turbinas.
Somente montados e inspecionados no Brasil.
45
Os recentes movimentos de grandes fabricantes no sentido de montarem
unidades fabris em território nacional põe em risco a situação de relativa
tranquilidade em que viveu até aqui a HELIBRAS.
Pela primeira vez, o mercado interno terá força suficiente para motivar, e até
mesmo forçar, os fabricantes a oferecerem algo mais do que a importação de
aeronaves, sobressalentes e serviços, prática que costuma gerar custos muito altos
para os operadores pela imobilização dos helicópteros enquanto aguardam, por
exemplo, o reparo de um grande conjunto dinâmico em outro continente.
Os contratos de modernização de aeronaves do Exército Brasileiro estão
proporcionando a oportunidade à HELIBRAS de trabalhar com projeto de sistemas
complexos tendo em vista a integração de motores, aviônicos e rádios militares no
estado da arte nos helicópteros. Todo este pesado trabalho de engenharia está
sendo feito por profissionais franceses e brasileiros trabalhando em times
multinacionais, assegurando a transferência de conhecimentos em profundidade
inédita na história da empresa (HELIBRAS, 2009).
A exigência de usar fornecedores nacionais sempre que possível (VALDUGA,
2012) também está obrigando a empresa a obter excelência na área de formação e
administração de uma cadeia de desenvolvedores de soluções customizadas e
futuros fornecedores.
Estas são competências fundamentais para um possível projeto autóctone no
futuro que poderá alcançar viabilidade financeira com encomendas governamentais
e investimentos públicos em pesquisa, como já vem ocorrendo em pequena escala,
e ainda contar com a demanda esperada no mercado de óleo e gás.
Paira, contudo, a sombra das motivações da Eurocopter (acionista majoritária
da HELIBRAS), ou se haverá interesse do grupo europeu em estimular o surgimento
de um novo pólo industrial de asas rotativas no Brasil.
46
6 CONCLUSÃO
O Brasil foi capaz de, superando os enormes obstáculos impostos pela
industrialização tardia, desenvolver uma indústria aeronáutica reconhecida no
mundo todo pela capacidade tecnológica e comercial.
As bases para este feito notável foram interações quase intuitivas de políticas
de estado, estratégia comercial e pesquisa aplicada. Esta fórmula produziu efeitos
autossustentáveis e retroalimentados tendo a capacidade de aprofundar as
interações supramencionadas e criar um ambiente propício ao surgimento de uma
base industrial com grande densidade tecnológica.
Etkowitz e Leydesdorff (2000) mais tarde codificaram e estudaram
intensamente as interações governo-empresa-universidade e propuseram modelos
que representavam em grande parte as experiências relatadas neste trabalho sobre
o surgimento da EMBRAER, Sikorsky e AgustaWestland. O Estado definindo as
áreas do conhecimento que receberiam prioridade de investimento, seja em
pesquisa seja em aquisições; as empresas identificando e explorando as
oportunidades de negócios surgidas com o direcionamento dado pelo Estado; e as
universidades oferecendo a pesquisa básica e aplicada que daria sustentação
tecnológica e vantagem competitiva aos novos negócios.
Como foi visto, a tentativa de aplicar o modelo de sucesso utilizado no
surgimento da EMBRAER – fortemente apoiado na teoria da tripla hélice – não foi
bem sucedida com a HELIBRAS. Estavam presentes o governo, a universidade
(SILVA, 2008) e a empresa, porém faltava a interação entre estes atores.
A ausência de objetivos claros na política para a formação da indústria
aeronáutica de asas rotativas impediu a cobrança dos parâmetros de nacionalização
da produção estabelecidos como contrapartida à participação do governo como
acionista e cliente lançador da HELIBRAS.
Por outro lado, a equipe que criou o Beija-flor, apesar de haver reunido um
considerável conhecimento e know-how foi desmontada com a saída do Prof Focke
(DRUMOND, 2004) e o CTA praticamente abandonou esta linha de pesquisa, apesar
do grande avanço que haviam feito em tão pouco tempo.
Porém, o fator decisivo para o relativo fracasso (sob o aspecto do
desenvolvimento e defesa) até aqui da indústria brasileira de helicópteros foi a
orientação comercial da empresa, a HELIBRAS. Todas as decisões relativas ao
47
plano de negócios dela foram tomadas pela matriz europeia, com uma lógica
obviamente conflitante com o modelo desejado pelo Brasil, de desenvolvimento
tecnológico autóctone.
Ações recentes do governo, da universidade e da HELIBRAS (RODRIGUES,
2013; QUAINO, 2013) parecem portar elementos capazes de mudar esta situação. O
CNTH, junto a outras iniciativas do governo de Minas Gerais e da UNIFEI, pode
servir como elemento catalisador das interações necessárias com a HELIBRAS.
Papel importante também está sendo cumprido pelo Governo Federal com as
compras governamentais e os programas de modernização dos helicópteros do
Exército Brasileiro.
Os novos investimentos federais requerem contrapartidas em forma de offset
que estão forçando a HELIBRAS pela primeira vez em sua história a investir
seriamente na composição de um quadro de engenheiros de grande envergadura a
fim de capacitar-se para o desafio tecnológico que estes contratos trouxeram.
Existe, portanto, a expectativa de que em curto prazo as interações entre
todas estas ações permita um círculo virtuoso de crescimento da indústria
aeronáutica de asas rotativas, com todos os reflexos positivos para a defesa e
desenvolvimento do país. Entretanto, o acionista controlador da HELIBRAS tem um
claro conflito de interesse com este movimento.
O surgimento de uma genuína indústria aeronáutica de asas rotativas no
Brasil não será possível por intermédio de investimentos públicos em projetos da
HELIBRAS. O alto grau de controle exercido pela Eurocopter sobre as decisões
estratégicas da subsidiária nacional inviabilizam que o modelo da tripla hélice seja
aplicado com sucesso, não obstante os esforços do Estado, das universidades e, até
mesmo, da própria HELIBRAS. Entretanto, sob o ponto de vista da Defesa, é
interessante que ela se capacite tecnologicamente cada vez mais. Desta forma,
projetos como o de modernização de aeronaves do Exército Brasileiro contribuem
para o desenvolvimento de competências na área de projetos de helicópteros que
não seriam voluntariamente suportadas pela matriz.
A EMBRAER, como visto na 1ª Seção deste trabalho, incluiu em seu
planejamento estratégico a entrada no mercado de asas rotativas. Uma das grandes
qualidades da empresa sempre foi “ouvir” o mercado e oferecer produtos que os
clientes necessitam para continuar competitivos em seus negócios.
48
O enorme quadro de engenheiros, a excelência no desenvolvimento de
produtos de alta complexidade, a extensa rede de fornecedores de produtos
aeronáuticos, o tamanho e respeito conquistados pela empresa no mercado nacional
e internacional, tudo isto contribui para que a empresa tenha muitas chances de
sucesso em uma empreitada deste porte.
Por este motivo, a melhor chance do país para definitivamente estabelecer
uma indústria capaz nesta área é a iniciativa da EMBRAER de acrescentar a asa
rotativa ao seu portfólio de produtos.
Pesa contra a EMBRAER a falta de conhecimento específico sobre o projeto
e produção de helicópteros. Problema, aliás, vivido também pela HELIBRAS, para
quem a solução é entretanto relativamente simples, pois sua matriz conta com um
quadro de engenheiros altamente qualificados e um histórico de excelentes produtos
oferecidos ao mercado.
A EMBRAER tomou a decisão de buscar um grande fabricante de
helicópteros que se interessasse em estabelecer um plano de negócios que previsse
a transferência total de tecnologia e finalmente o desenvolvimento conjunto de
aeronaves adequadas aos mercados onde a EMBRAER pudesse usar sua marca
para auxiliar na penetração dos produtos daquele fabricante.
Esta seria uma situação de ganha-ganha para os parceiros comerciais e para
o país por permitir acesso rápido e irrestrito a tecnologias e conhecimentos de
grande valor comercial e que de outra forma não seriam obtidos.
A EMBRAER, caso consiga concretizar seu plano de negócios, seria a melhor
aposta no estabelecimento de um modelo de tripla hélice de sucesso. O seu
histórico como empreendimento baseado na inovação (SILVA, 2008); a enorme
disponibilidade de engenheiros e centros de pesquisa de alto nível; as interações já
existentes com o Estado em virtude de projetos de grande alcance no
desenvolvimento e na Defesa (como visto na seção 3.1); tudo contribuindo para que
o modelo Tripla Hélice III funcione conforme predito por Etzkowitz e Leydesdorff
(2000).
A EMBRAER é o maior sucesso da aplicação daqueles conceitos em nosso
país e tem portanto conhecimento, experiência e conexões com o Estado e com a
universidade para repetir o mesmo sucesso em outro negócio intimamente ligado ao
seu core business, sendo a opção com maiores chances de sucesso no
estabelecimento de uma indústria aeronáutica de asas rotativas nacional autóctone.
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as bases para o surgimento de uma indústria aeronáutica brasileira