Setembro - 2014
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A Contínua Desaceleração do Mercado de Trabalho
Apesar da taxa de desemprego brasileira seguir em patamares historicamente baixos,
alcançando em agosto a 5,0% da população economicamente ativa (PEA), segundo o Instituto
Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), uma análise mais detalhada mostra, porém, que o
mercado de trabalho sofre de uma contínua desaceleração, que reflete o esfriamento da atividade
econômica.
Em primeiro lugar, a desocupação é baixa muito mais devido à diminuição da PEA,
decorrente do envelhecimento acelerado da população brasileira, do que a um aumento na
ocupação, que, na verdade, vem diminuindo lentamente, principalmente na indústria e na
construção civil, e, em menor medida, no varejo. A redução da ocupação, aliada ao menor
crescimento dos salários médio está provocando, por sua vez, a quase estagnação da massa salarial
(rendimentos médios x ocupação), que, em termos macroeconômicos, representa a renda familiar
auferida no mercado de trabalho.
Do ponto de vista da geração de empregos no mercado formal, os resultados de setembro
do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), divulgados pelo Ministério do
Trabalho e Empego (MTE), mostram que a geração líquida de empregos (admissões menos
desligamentos) foi a pior dos últimos treze anos (123,7 mil trabalhadores), registrando, inclusive,
elevação de 3,3% na quantidade de demissões em relação ao mesmo mês de 2013. Além disso, o
salário médio dos trabalhadores admitidos registrou expressiva queda real (descontada a inflação)
de 9,0% em relação a setembro de 2013, o que sugere que, na média, as vagas geradas são de menor
qualificação, e, portanto, pior remuneradas.
As perspectivas para o que resta do ano e para 2015, independentemente do resultado das
eleições, são de continuidade na diminuição da ocupação e do crescimento dos salários, em linha
com as baixas expectativas de desempenho da atividade econômica. A retração da ocupação,
somada ao fim do recuo da PEA, sugerido pela análise do seu comportamento mais recente,
implicaria em aumentos paulatinos da taxa de desemprego, como parecem sinalizar os indicadores
da Fundação Getúlio Vargas, que captam a variação da confiança dos empresários e do consumidor
(Indicador Antecedente do Emprego – IAEMP e Indicador Coincidente do Desemprego – ICD).
Síntese Econômica
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Crédito à pessoa física continuou desacelerando em agosto.
Inflação anualizada de setembro mostrou aceleração, voltando a ultrapassar o
limite máximo da meta anual.
Produção industrial e varejo apresentaram recuos em agosto na comparação com
o mesmo mês de 2013.
Inadimplência bancária e do varejo apresentaram elevação, em agosto e setembro,
respectivamente.
Contas públicas ampliaram sua deterioração.
Contas externas voltaram a se deteriorar em setembro.
Real depreciou-se fortemente em relação ao dólar em setembro.
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Análise da Conjuntura
1. Moeda, Crédito e Inflação
Dados do Banco Central de agosto mostram que o crédito à pessoa física continua
apresentando desaceleração do crescimento, que em 12 meses alcançou a de 5,4%, contra
8,3% no final de 2013.
A inflação (IPCA) voltou a acelerar em setembro, alcançando a 0,57%, enquanto no
acumulado em doze meses atingiu 6,6%, novamente ultrapassando o limite máximo de
tolerância da meta anual (6,5%).
Em seu Relatório de Inflação, o Banco Central admitiu que a inflação deve
permanecer elevada, mesmo com a taxa de juros básica (SELIC) em 11,0%, não descartando
a possibilidade de efetiva ultrapassagem, em termos anuais, desse limite máximo de
tolerância, ao final de 2014.
2. Produção, Vendas e Inadimplência
Em agosto, de acordo com o IBGE, a indústria mostrou leve alta de 0,7% em relação
ao mês anterior, livre de influências sazonais, porém ficando 5,4% abaixo do nível registrado
para o mesmo mês de 2013. No acumulado do ano, o setor continuou mostrando retração,
que alcançou a 3,1%, principalmente pela redução na produção de automóveis (17,4%) e
de bens de capital (13,4%).
Por sua vez, as vendas do varejo restrito (que exclui veículos e material de
construção) e do ampliado (que inclui todos os segmentos), afetadas pela alta dos juros,
desaceleração do crédito e cautela do consumidor, mostraram em agosto recuos de 1,1% e
6,8% em relação ao ano passado, respectivamente, com destaque para a redução das
vendas de veículos (12,8%), segundo o IBGE. Nos primeiros oito meses o primeiro segmento
cresceu apenas 2,9%, enquanto o segundo recuou 1,5%.
Dados da ACSP/BVS, com base nas consultas efetuadas em setembro, apresentaram
alta de 6,2% nas vendas a crédito em base anual, embora com dois dias úteis a mais. Por
sua vez, as vendas à vista do mês ficaram apenas 1,7% maiores, mostrando a menor
disposição a gastar por parte do consumidor, enquanto no ano cresceram 1,5% e 1,8%,
respectivamente.
A confiança do consumidor, medida pelo Índice Nacional de Confiança (INC),
calculado pelo IPSOS para a ACSP, registrou em setembro levíssima elevação de 0,7% em
relação a agosto, sugerindo falta de confiança no momento da compra, principalmente no
caso dos bens de maior valor.
Com relação ao desemprego, o IBGE voltou a publicar a Pesquisa Mensal do
Emprego (PME), que assinalou uma taxa de desocupação levemente crescente, que em
agosto correspondeu a 5,0% da força de trabalho. A massa salarial (salários médios x
ocupados) aumentou 2,4% na base anual, com queda de 0,1% na ocupação e alta de 2,5%
nos rendimentos recebidos.
A taxa de inadimplência, medida pelo Banco Central, que sinaliza o nível de atraso
no crédito bancário (incluindo o crédito consignado), aumentou levemente para 4,3% em
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agosto, enquanto no caso das vendas do varejo, os atrasos no pagamento registrados em
setembro também apresentaram crescimento mensal, alcançando a 4,8% do total. Vale
destacar que a inadimplência vinha recuando a mais de dois anos, e, mesmo com essa alta,
ainda encontra-se em nível tolerável. Essa alta ainda não preocupa, porque a concessão de
crédito está mais seletiva, o emprego ainda se mantém estável e o décimo-terceiro salário
deve facilitar a renegociação de dívidas.
Finalmente, a prévia do PIB do Banco Central (IBC-BR) de agosto mostrou nova alta
de 0,3% sobre julho, livre de influências sazonais, enquanto no acumulado do ano
apresentou leve queda de 0,1%.
Em síntese, os dados do segundo semestre apresentam alguma “normalização” pós
Copa, mas o crescimento do PIB de 2014 deve ficar próximo de zero. Já a inflação segue
“resistente”, embora a forte queda das cotações do petróleo no mercado internacional,
dependendo da evolução do cambio, possa aliviar o reajuste dos combustíveis, reduzindo
um importante foco de pressão sobre os preços.
3. Finanças Públicas
Os resultados das finanças públicas brasileiras continuaram acumulando recordes
negativos durante o mês de agosto, apesar do recebimento de receitas extraordinárias
equivalentes a R$ 12,5 bilhões relativas à reabertura do programa de parcelamento de
dívidas tributárias (Refis) e ao recebimento de dividendos pagos pelas empresas estatais.
De acordo com o Banco Central, o Governo consolidado (União, Estados, Municípios
e Estatais) apresentou excesso de despesas não financeiras em relação às receitas (déficit
primário), que alcançou a R$ 14,4 bilhões, o maior valor mensal até hoje registrado desde
2000, além de ser o quarto mês consecutivo em que esse excesso é registrado.
Essa sequência de déficits fez recuar ainda mais a diferença entre a arrecadação e
os gastos sem incluir os juros da dívida (superávit primário) acumulado desde janeiro para
R$ 10,2 bilhões, o que representa uma queda de 81,1% em relação ao mesmo período de
2013, e apenas 10% da meta comprometida para o ano (R$ 99 bilhões – 1,9% do PIB),
inviabilizando, na prática, seu cumprimento efetivo.
O principal foco de deterioração fiscal continua localizando-se no Governo Central
(Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência), cujo crescimento dos gastos nos primeiros
oito meses do ano (12,6%) continuou superando o aumento da arrecadação (7,4%),
segundo dados do Tesouro Nacional. Chama particularmente a atenção o fato de que
durante agosto as despesas dessa esfera governamental tenham aumentado 26,9%, uma
taxa expressiva mesmo em anos eleitorais, mas que poderia estar vinculada com o término
dos atrasos dos repasses do Tesouro aos bancos públicos (“pedaladas”) para os pagamentos
de itens como abono salarial, seguro-desemprego e Fundo de Amparo ao Trabalhador
(FAT).
Também é interessante notar que, no tocante à composição das despesas, os dados
do Tesouro apontam para uma elevação de 27,4% dos desembolsos com investimentos,
destacando-se aqueles vinculados ao Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Esse
resultado, aparentemente alentador, deve, contudo, ser relativizado, pois, por um lado, o
Governo costuma contabilizar indevidamente o subsídio habitacional concedido a partir do
programa Minha Casa Minha Vida como investimento público, e, por outro, trata-se de um
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comportamento pontual, influenciado pela proximidade do período de eleições
presidenciais. Além disso, segundo a organização não governamental Contas Abertas, os
investimentos de empresas públicas, notadamente a Petrobrás, recuaram 8,8% durante o
ano em relação a igual período de 2013, o que sugere que as despesas do governo
continuam concentradas em itens correntes, não ligados à expansão da infraestrutura.
Frente a esse cenário, as autoridades econômicas continuam negando a realidade e
os princípios básicos da aritmética, reafirmando o cumprimento da meta anual de superávit
fiscal primário, o que só deteriora ainda mais a combalida credibilidade da política
econômica atual. Para piorar, o governo continua lançando mão da “contabilidade criativa”,
com novos itens de um “arsenal” quase inesgotável: saque de R$ 3,5 bilhões do Fundo
Soberano, aceleração das despesas do PAC para posterior abatimento no resultado,
reabertura do Refis e renegociação das dívidas do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) com o Tesouro, reduzindo a necessidade de injeção de recursos
por parte do governo.
A perspectiva é de continuidade na elevação das despesas públicas muito acima da
capacidade de arrecadação, afetada negativamente pelo fraco desempenho da economia e
pelas crescentes desonerações e renúncias fiscais, implicando na incapacidade do Governo
em pagar a totalidade dos encargos financeiros da dívida pública, levando o chamado déficit
nominal, que já alcança a 4,0% do PIB – o maior em muito anos, e, em consequência,
aumentando o endividamento público, que já ultrapassou o limite preocupante dos 60% do
PIB, o que eleva a possibilidade de redução da avaliação da economia brasileira por parte
das agências de classificação de risco.
4. Setor Externo
A balança comercial brasileira (exportações menos importações) registrou um
déficit de US$ 939 milhões, um dos piores saldos negativos para o mês de setembro nos
últimos anos. Enquanto as exportações foram de US$ 19,6 bilhões, valor 10,2% menor do
que as vendas realizadas em setembro do ano passado, as importações que somaram US$
20,5 bilhões, tiveram um acréscimo de 4,0%, na mesma base de comparação. O baixo
desempenho das vendas externas deve-se, sobretudo, à diminuição das vendas de soja e
seus derivados, cujos embarques se retraíram devido ao término da safra brasileira, às
vendas de minério de ferro, cujo preço está cada vez mais baixo no mercado internacional
e aos embarques de manufaturados, sobretudo automóveis e autopeças para a Argentina,
cujo mercado recuou cerca de 40% para os produtos brasileiros, diante da crise cambial que
esse país atravessa.
O resultado da balança comercial no acumulado do ano, após cinco meses de saldos
positivos, voltou a registrar um déficit de US$ 690 milhões. Entre janeiro e setembro, as
exportações foram de US$ 173,6 bilhões e as importações de US$ 174,3 bilhões, ambas com
queda de 1,7% e 2,2%, respectivamente, em relação ao mesmo período de 2013. Esse
déficit somente não é maior, devido à exportação “fictícia” de duas plataformas de
exploração de petróleo, no valor de US$ 2,0 bilhões, que, na realidade, não saíram do país.
Enquanto houve uma retração de 7,1% das vendas externas de produtos manufaturados,
os produtos básicos aumentaram 2,3% no período, apesar dos preços em queda de algumas
importantes commodities exportadas pelo país. Entre elas, destacaram-se soja em grão,
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farelo de soja, carne bovina e minério de cobre, além de celulose, couros e peles,
medicamentos e obras de granito, cujos embarques registraram recorde de vendas. Do lado
das importações, o fator negativo foi a redução de 5,7% no valor das aquisições de bens de
capital, reflexo do baixo nível de investimentos internos, em decorrência do pífio
crescimento econômico do país.
Esses resultados não deverão alterar significativamente o saldo de transações
correntes do balanço de pagamentos (diferença entre exportações e importações de bens
e serviços), que nos últimos doze meses terminados em agosto apresentou um déficit de
US$ 78,4 bilhões, representando 3,5% do PIB, percentagem que, com pequenas variações,
mantém-se estável desde julho do ano passado. Esse saldo negativo das contas externas
vem sendo coberto, na sua maior parte, pela entrada de investimentos estrangeiros diretos,
cujo montante foi de US$ 67,0 bilhões, no mesmo período.
No entanto, maior turbulência está ocorrendo no mercado de câmbio. Durante todo
o mês de setembro, a cotação do dólar sofreu forte oscilação, influenciada pelas mudanças
nos resultados das pesquisas de intenção de voto à presidência da República, com
tendência de alta. O Banco Central, mesmo ampliando sua atuação no câmbio, elevando a
“rolagem” dos contratos de swap (equivalente à venda futura de dólares), não impediu que
a taxa cambial fechasse o mês valendo R$ 2,45 por dólar, equivalente a uma desvalorização
de 9,4% do real em relação à moeda americana em setembro, e de 9,9% frente a setembro
de 2013.
Se o câmbio se mantiver em torno desse novo patamar, exercerá pressão sobre a
inflação, ao aumentar os preços em reais dos produtos importados, mas, por outro lado,
contribuirá para melhorar a competitividade dos produtos nacionais, nos mercados externo
e interno. Contudo, como essa maior competitividade não acontecerá em curto prazo e, ao
mesmo tempo, como não se espera recuperação nos preços das commodities e da
economia argentina, é muito provável que a previsão, recentemente revisada, do Banco
Central sobre a balança comercial registrar um saldo positivo de US$ 3,0 bilhões, não venha
a ser alcançada, aumentando a deterioração das contas externas brasileiras e sua
dependência em relação aos capitais financeiros internacionais.
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Indicadores de Conjuntura Selecionados:
Variação Acumulada
2014/2013 (%)
5,4%(1)
6,7%(1)
-5,4%(2)
-1,1%(2)
7,4%(3)
12,6%(3)
-1,7%(4)
-2,2%(4)
9,9%(5)
Crédito à Pessoa Física
Inflação – IPCA
Produção Industrial
Vendas do Varejo
Receitas Governo Central
Despesas Governo Central
Exportações
Importações
Taxa de Câmbio
Fonte: IBGE, Banco Central, STN, MDIC/SECEX, IEGV/ACSP.
(1) Variação acumulada em 12 meses.
(2) Variação agosto 2014 – agosto 2013.
(3) Variação janeiro-agosto 2014 – janeiro-agosto 2013.
(4) Variação janeiro-setembro 2014 – janeiro-setembro 2013.
(5) Variação setembro 2014 – setembro 2013
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