XXIX DOMINGO DO TEMPO COMUM – Ano B
Evangelho Mc 10,35-45.
“Entre vós não deve ser assim”
Ir. Sandra M Pascoalato, sjbp.
Situada no seu contexto, aquele da viagem para Jerusalém, e, imediatamente após o terceiro e
mais detalhado anúncio da paixão (Mc 10,32-34), tanto que se assemelha a uma espécie de script
da Paixão que logo mais Jesus viverá, a cena com o pedido dos filhos de Zebedeu que abre o texto
do evangelho deste Domingo e a reação dos outros dez discípulos que encontramos mais adiante,
impacta o leitor pelo forte contraste que apresenta. Jesus havia acabado de elencar a sucessão de
sofrimentos que culminaria na sua morte, e os dois irmãos, Tiago e João, com uma desenvoltura
que surpreende e que irrita ao mesmo tempo (cf. Mc 10,41), pedem-lhe de poder ocupar os
lugares mais importantes no seu reino, quando ele se manifestará como o Messias glorioso. Ou
melhor, mais que pedir, pretendem: “Mestre, queremos que faças por nós o que vamos pedir”
(10,35). É como se tudo o que Jesus havia dito e ensinado até agora caísse no vazio: enquanto o
Mestre pensa em dar a vida, os seus discípulos pensam em obter favores. Demonstram que pouco
compreenderam do caminho proposto por Jesus e revelam o sentido profundamente destorcido
que possuem do viver em comunidade. Existe uma passagem radical a ser feita: ‘da comunidade
para mim’ ao ‘eu para a comunidade’.
Jesus responde aos dois irmãos, primeiro, com grande paciência, mas depois com firmeza e
decisão: “Vós não sabeis o que pedis” (10,38). É como se escapasse a eles mesmos a moção mais
profunda e secreta do pedido que fazem.
É possível que também nós nos reconheçamos nestes discípulos. E é possível que os
pedidos que também nós dirigimos a Deus sejam atravessados por uma sutil parcela de exigência
e prepotência, aquela prepotência que distorce na sua raiz e genuinidade a oração cristã: passa-se
do ‘seja feita a vossa vontade’ (cf. Mt 6,10) ao ‘seja feito conforme queremos’ (cf. Mc 10,35).
Aquela mesma prepotência que gera cegueira e ergue barreiras: “Quando os outros dez discípulos
ouviram isso, indignaram-se com Tiago e João” (10,41). Os outros dez, unânimes no ciúme, na
rivalidade, na concorrência: um espetáculo indecoroso que os evangelhos registram com uma
franqueza desarmante!
Eis que Jesus, então, desloca o horizonte do pedido, como a dizer: não é esta a estrada,
esta é uma estrada sem saída. É outra a estrada: “Podeis beber o cálice que eu vou beber ou ser
batizados com o batismo com que vou ser batizado?” (10,38). Esta é a garantia, segundo Jesus.
Esta é a condição que consente a um poder de não degradar-se em dominação. Este é o caminho
proposto por Jesus: beber do seu cálice, beber do cálice da sua amargura, do seu sofrimento, da
sua cruz. Servir, fazer-se escravo de todos. É o que torna verdadeiras e credíveis as nossas
palavras, as nossas homilias, as nossas opções. Purifica-nos, nos despoja, nos esvazia... e faz
brilhar em nós o rosto de Cristo.
Textos consultados:
BARBAGLIO, G. – FABRIS, R. – MAGGIONI, B. I Vangeli. Cittadella Editrice, Assisi, 1998.
MANICARDI, L. Eucaristia e Parola. Vita e Pensiero, Milano, 2010.
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