RELATÓRIO FINAL
VIDA SOCIAL DAS COMUNIDADES DA
FLONA DE PAU ROSA E DO ENTORNO
MAUÉS - AM
Instituição Parceira:
Ministério da Ciência e Tecnologia
Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia
Núcleo de Pesquisas em Ciências Humanas e Sociais
Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental
Laboratório de Antropologia e Etnologia
RELATÓRIO FINAL
VIDA SOCIAL DAS COMUNIDADES DA
FLONA DE PAU ROSA E DO ENTORNO
MAUÉS - AM
Elaborado por:
Maria Inês Gasparetto Higuchi
Maria de Nazaré de Lima Ribeiro
Carlos Henrique Ferreira Santos
Igor José Theodorovitz
Manaus – AM
Julho, 2009
Equipe em campo
Maria de Nazaré de Lima Ribeiro
Igor José Theodorovitz
Maria Inês Gasparetto Higuchi
Carlos Henrique Ferreira Santos
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................................................. 1
FLORESTAS NACIONAIS – FLONAs ..................................................................................................................... 2
FLONA DE PAU ROSA – MAUÉS ......................................................................................................................... 3
A EXPEDIÇÃO CIENTÍFICA .................................................................................................................................. 5
METODOLOGIA DE PESQUISA ........................................................................................................................... 6
COMUNIDADES DA FLONA DE PAU ROSA E DO ENTORNO ............................................................................. 11
Santa Marta ................................................................................................................................................. 12
Vilanova ....................................................................................................................................................... 15
Santa Maria de Ituense................................................................................................................................ 16
São Pedro..................................................................................................................................................... 18
Sagrado Coração de Jesus ........................................................................................................................... 19
Ozório da Fonseca ....................................................................................................................................... 21
Santa Teresa ................................................................................................................................................ 23
São Tomé ..................................................................................................................................................... 24
Bragança ...................................................................................................................................................... 26
Fortaleza ...................................................................................................................................................... 28
Santa Maria do Caiaué................................................................................................................................. 29
São João do Cacoal ...................................................................................................................................... 32
Monte Carmelo............................................................................................................................................ 34
Bom Pastor .................................................................................................................................................. 35
DADOS DEMOGRÁFICOS.................................................................................................................................. 37
Numero de Pessoas por Domicilio............................................................................................................... 37
Mobilidade e Tempo de Moradia nas localidades ...................................................................................... 38
Situação Civil – Posse de documentos ........................................................................................................ 41
Escolaridade ................................................................................................................................................ 42
Religião ........................................................................................................................................................ 43
INFRA ESTRUTURA DAS COMUNIDADES ......................................................................................................... 44
Habitação..................................................................................................................................................... 44
Arranjo Interno das Casas............................................................................................................................ 47
Transportes.................................................................................................................................................. 51
Energia ......................................................................................................................................................... 52
Meios de Comunicação ............................................................................................................................... 54
Destino de resíduos e saneamento ............................................................................................................. 56
Abastecimento e uso da água ..................................................................................................................... 61
SOCIOECONOMIA ............................................................................................................................................ 65
Atividades econômicas – renda familiar ..................................................................................................... 66
EDUCAÇÃO................................................................................................................................................... 71
Níveis de Ensino disponíveis nas comunidades ....................................................................................... 71
Escolas e condição dos benefícios educacionais ..................................................................................... 73
Escola de Santa Marta ............................................................................................................................. 75
Escola de São Pedro ................................................................................................................................. 75
Escola de Sagrado Coração de Jesus ....................................................................................................... 76
Escola de Monte Carmelo........................................................................................................................ 76
Escola de Ozório da Fonseca ................................................................................................................... 77
Escola de São João do Cacoal .................................................................................................................. 77
Escola de Santa Teresa ............................................................................................................................ 78
Escola de Santa Maria de Caiaué ............................................................................................................. 78
Escola de Bom Pastor .............................................................................................................................. 79
NUTRIÇÃO ........................................................................................................................................................ 80
Bebidas ........................................................................................................................................................ 81
Frutas ........................................................................................................................................................... 81
Hortaliças e raízes ........................................................................................................................................ 82
Massas e doces ............................................................................................................................................ 83
Alimentos industrializados .......................................................................................................................... 84
Carnes .......................................................................................................................................................... 85
Preparo dos alimentos............................................................................................................................. 87
SAÚDE .............................................................................................................................................................. 88
Saúde familiar .............................................................................................................................................. 88
Doenças mais freqüentes ............................................................................................................................ 89
Causas de mortalidade da população nos últimos 5 anos .......................................................................... 91
Tratamento para as doenças ....................................................................................................................... 91
LAZER ............................................................................................................................................................... 94
Lazer do fim do dia ...................................................................................................................................... 95
Lazer nos fins de semana............................................................................................................................. 98
ORGANIZAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL ....................................................................................................... 100
Participação dos moradores em atividades sociais ................................................................................... 102
Clima Social .................................................................................................................................................... 105
Aspectos de satisfação com o lugar onde vivem ....................................................................................... 108
Lugar de convivência social ....................................................................................................................... 109
Lugar de produção material ...................................................................................................................... 110
Lugar de produção material e convivência social...................................................................................... 110
Aspectos de insatisfação com o lugar onde vivem .................................................................................... 111
Problemas nas relações sociais ................................................................................................................. 112
Problemas relacionados às intempéries do ambiente natural ................................................................. 113
Falta de serviços e benefícios sociais ........................................................................................................ 114
O suposto tráfico e plantio de maconha ................................................................................................... 114
Intenções de mudança para outros locais................................................................................................. 115
Dificuldades enfrentadas ........................................................................................................................... 118
Superando as dificuldades......................................................................................................................... 119
Expectativas ............................................................................................................................................... 121
Empreendedorismo ....................................................................................................................................... 123
Projeto de extrativismo ............................................................................................................................. 124
Projeto de agricultura ................................................................................................................................ 125
Projeto formação de cooperativa.............................................................................................................. 127
SIGNIFICADO DO LUGAR................................................................................................................................ 129
SIGNIFICADO DA FLONA PARA OS MORADORES........................................................................................... 132
PERCEPÇÕES SOBRE O CUIDADO AMBIENTAL .......................................................................................... 134
O que faz “bem à terra”......................................................................................................................... 134
O que faz “mal à terra” .......................................................................................................................... 135
PERCEPÇÕES SOBRE ÁREAS VERDES.......................................................................................................... 136
Identificação da área verde circundante da localidade - paisagem ...................................................... 137
Noções sobre Floresta ........................................................................................................................... 138
Noções sobre Mata................................................................................................................................ 139
Noções sobre Mato ............................................................................................................................... 140
Noções sobre Floresta Amazônica......................................................................................................... 141
CONCEITOS SOBRE MANEJO FLORESTAL....................................................................................................... 143
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................................................ 144
APENDICE I ..................................................................................................................................................... 146
APENDICE II .................................................................................................................................................... 148
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 – Limites de abrangência da Flona de Pau Rosa .................................................................................. 4
Figura 2- Barco da Expedição - Cometa Halley .................................................................................................. 5
Figura 3 – Deslocamento do barco às comunidades usando voadeiras ........................................................... 6
Figura 4– Dificuldades de acesso para chegada na comunidade ...................................................................... 6
Figura 5– Receptividade e oferta de frutas e hortaliças à equipe de pesquisadores ....................................... 7
Figura 6 – Reunião com os moradores para explicação do trabalho a ser desenvolvido ................................. 8
Figura 7 – Interação da equipe de pesquisadores e comunitários.................................................................... 8
Figura 8– Interação da equipe de pesquisadores e crianças da comunidade ................................................... 9
Figura 9– Realização das entrevistas nas casas e no centro comunitário ....................................................... 10
Figura 10– Elaboração do croqui da comunidade com auxílio dos moradores .............................................. 10
Figura 11– Localização das comunidades dentro e no entorno dos limites da Flona PR ................................ 12
Figura 12 - Vista Panorâmica da Sede comunitária de Santa Marta ............................................................... 13
Figura 13 -- Croqui da Comunidade Santa Marta ............................................................................................ 13
Figura 14– Vista Panorâmica da Sede comunitária de Frente São Jorge ........................................................ 14
Figura 15– Croqui da Comunidade Frente São Jorge ...................................................................................... 15
Figura 16– Croqui da Comunidade Vilanova ................................................................................................... 16
Figura 17– Vista panorâmica de Santa Maria de Ituense ................................................................................ 17
Figura 18- Croqui da Comunidade Santa Maria de Ituense ............................................................................ 18
Figura 19– Vista Panorâmica da Comunidade São Pedro ............................................................................... 19
Figura 20 - Croqui da Comunidade São Pedro ................................................................................................. 19
Figura 21– Vista Panorâmica da Comunidade Sagrado Coração de Jesus ...................................................... 20
Figura 22 – Croqui da Comunidade Sagrado Coração de Jesus ....................................................................... 21
Figura 23 – Vista Panorâmica da Comunidade de Ozório da Fonseca ............................................................ 22
Figura 24 – Croqui da Comunidade de Ozório da Fonseca.............................................................................. 22
Figura 25 – Vista Panorâmica da Comunidade de Santa Teresa ..................................................................... 23
Figura 26 - Croqui da Comunidade de Santa Teresa ....................................................................................... 24
Figura 27 - Vista Panorâmica da Comunidade de São Tomé ........................................................................... 25
Figura 28 - Croqui da Comunidade São Tomé ................................................................................................. 26
Figura 29 – Vista Panorâmica da Comunidade de Bragança ........................................................................... 27
Figura 30 – Croqui da Comunidade de Bragança ............................................................................................ 27
Figura 31 - Vista Panorâmica da Comunidade Fortaleza ................................................................................. 28
Figura 32 – Croqui da Comunidade Fortaleza ................................................................................................. 29
Figura 33 – Vista panorâmica de Santa Maria de Caiaué ................................................................................ 31
Figura 34 – Croqui da comunidade de Santa Maria de Caiaué ....................................................................... 31
Figura 35 – Vista Panorâmica de São João de Cacoal ...................................................................................... 33
Figura 36 – Croqui da Comunidade de São João de Cacoal............................................................................. 33
Figura 37 – Vista Panorâmica de Monte Carmelo ........................................................................................... 34
Figura 38 - Croqui da Comunidade de Monte Carmelo................................................................................... 35
Figura 39 - Vista Panorâmica da Comunidade de Bom Pastor ........................................................................ 36
Figura 40 – Croqui da Comunidade de Bom Pastor......................................................................................... 36
Figura 41 - Estilos de construção das igrejas nas comunidades ...................................................................... 44
Figura 42- Arranjo espacial das residências e tipo de construção .................................................................. 45
Figura 43– Disposição de móveis na sala ........................................................................................................ 48
Figura 44 - Uso do fogãozinho a carvão e fogão a gás na cozinha .................................................................. 48
Figura 45 – Disposição interna dos utensílios domésticos e redes ................................................................. 49
Figura 46 - Objetos industrializado e manufaturados de uso dos moradores ................................................ 49
Figura 47 – Tipo de embarcação para deslocamento de pessoas e produção................................................ 51
Figura 48 - Tipo de embarcação comunitária e de transporte escolar ........................................................... 52
Figura 49 - Casas de abrigo do gerador de energia ......................................................................................... 53
Figura 50 – Fabricação e comercialização de carvão vegetal .......................................................................... 54
Figura 51 - Proteção de cuidado aos aparelhos de telefone público em Vilanova ......................................... 55
Figura 52 - Uso de canoas pelas crianças entre as unidades domésticas ....................................................... 56
Figura 53 – Lixo acumulado e queima de resíduos ......................................................................................... 57
Figura 54 - Depósito de garrafas para evitar riscos ......................................................................................... 58
Figura 55 - Panelas de alumínio achatadas para venda e pilha descartada no quintal .................................. 58
Figura 56 - Acúmulo de lixo nos barrancos dos rios e lixeiras domésticas...................................................... 59
Figura 57 - Tipo de sanitário – “casinha”......................................................................................................... 61
Figura 58 - Sistema de abastecimento de água construído pela Funasa ........................................................ 62
Figura 59 – Abastecimento de água do rio e acondicionamento em caixas d’água ....................................... 62
Figura 60 - Hora do banho no rio – higiene e lazer ......................................................................................... 64
Figura 61 - Utensílios domésticos feitos de barro ........................................................................................... 68
Figura 62 - Barco que trafega pelos rios comercializando carne bovina ......................................................... 70
Figura 63 – Tipo de construção dos prédios escolares .................................................................................... 73
Figura 64 – Cupuaçu, Limão e tucumã in natura consumidos pelos moradores ............................................ 82
Figura 65 – Banana e Graviola em fase de amadurecimento.......................................................................... 82
Figura 66 – Plantio de temperos e ervas medicinais na horta comunitária .................................................... 83
Figura 67 – Alimentos feitos a partir da massa da mandioca ......................................................................... 84
Figura 68 – Sub produtos da mandioca utilizado como alimentos ................................................................. 84
Figura 69 – Carne de Tatu pronta para ser cozida........................................................................................... 85
Figura 70 - Consumo de peixes pelos entrevistados ....................................................................................... 87
Figura 71 – Preparo dos alimentos com poucos cuidados de higiene ............................................................ 88
Figura 72 – Poste de saúde e atendimento de emergência médica à luz de velas ......................................... 92
Figura 73 – Remédios disponíveis nos postos de saúde locais........................................................................ 93
Figura 74 – Livros e instrumentos médicos adquiridos pelos práticos pela ajuda de estrangeiros ................ 94
Figura 75 – O jogo de futebol ao final do dia reúne times de homens e mulheres ........................................ 96
Figura 76 - Jogos de mesa com amigos ao final do dia ................................................................................... 96
Figura 77 – Crianças ao fim do dia no rio e nas brincadeiras de bola no quintal ............................................ 97
Figura 78 – O lazer como forma de união e celebração religiosa nos fins de semana ................................... 99
LISTA DE GRÁFICO
Gráfico 1-Residência em lugares diferentes do atual ..................................................................................... 39
Gráfico 2 - Locais procurados para residir em algum tempo antes da chegada ou retorno ........................... 39
Gráfico 3– Tempo de moradia dos comunitários ............................................................................................ 40
Gráfico 4– Tipo de posse da casa onde a família reside .................................................................................. 44
Gráfico 5– Tipo de material usado nas casas .................................................................................................. 45
Gráfico 6– Origem dos recursos despendidos na construção da casa ............................................................ 46
Gráfico 7- Forma de aquisição da terra onde vivem ....................................................................................... 46
Gráfico 8– Tipo de energia elétrica utilizada pelos moradores....................................................................... 52
Gráfico 9– Preocupação dos moradores em relação resíduos produzidos na comunidade ........................... 60
Gráfico 10– Origem da água de beber ............................................................................................................ 63
Gráfico 11 - Consumo de alimentação líquida nas famílias dos entrevistados ............................................... 81
Gráfico 12– Consumo de massas e farináceos pelos entrevistados................................................................ 85
Gráfico 13 – Consumo de carnes pelos entrevistados .................................................................................... 86
Gráfico 13 – Principais formas de tratamento das doenças ou emergência................................................... 91
Gráfico 14 - Tipos de atividades de lazer praticado pelos moradores ao fim do dia ...................................... 98
Gráfico 15 - Tipos de atividades de lazer praticado pelos moradores nos fins de semana .......................... 100
Gráfico 16 - Participação dos moradores em Associações Comunitárias ..................................................... 102
Gráfico 17 - Tipo de atividades sociais comunitárias e freqüência ............................................................... 103
Gráfico 18 – Atividades que agregam os moradores nas diferentes comunidades ...................................... 107
Gráfico 19 – Aspectos que os moradores dizem gostar mais do lugar onde moram ................................... 109
Gráfico 20 – Aspectos de insatisfação nas comunidades .............................................................................. 112
Gráfico 21 – Intenções de mudança numa eventualidade que surgir .......................................................... 116
Gráfico 22 – Aspectos de dificuldades vivenciadas pelos moradores ........................................................... 118
Gráfico 23 – Expectativas de melhoria para as comunidades ....................................................................... 121
Gráfico 24 – Expectativas de empreendimento para as comunidades ......................................................... 123
Gráfico 25 – Tipos de atividades de extrativismo com interesse para o empreendedorismo ...................... 124
Gráfico 26 - Plantações passíveis de projetos de empreendedorismo ......................................................... 126
Gráfico 27 – Atividades de criação de animais passiveis de empreendedorismo......................................... 127
Gráfico 28 – Tipo de ajuda externa recebida pelas comunidades ................................................................ 128
Gráfico 29 - Significados atribuídos ao lugar ................................................................................................. 129
Gráfico 30 – Sentimentos de posse verdadeira da terra onde vivem ........................................................... 131
Gráfico 31 – Motivos por se sentirem verdadeiros donos da terra onde vivem........................................... 131
Gráfico 32 – Motivos por não se sentirem verdadeiros donos da terra onde vivem ................................... 132
Gráfico 33 - Conhecimento dos moradores sobre o que é Flona.................................................................. 133
Gráfico 34 - Aspectos que fazem “bem à terra”............................................................................................ 134
Gráfico 35 - Aspectos que fazem “mal à terra” ............................................................................................. 135
Gráfico 36– Nome designado à área verde circundante (paisagem) da localidade ...................................... 137
Gráfico - 37 Noções de Floresta .................................................................................................................... 138
Gráfico 38– Noções sobre Mata .................................................................................................................... 139
Gráfico 39 – Noções referentes à diferença e semelhança entre Floresta e Mata ...................................... 139
Gráfico 40 – Noções sobre Mato ................................................................................................................... 140
Gráfico 41– Noções sobre Floresta Amazônica ............................................................................................. 142
Gráfico 42 – Noções de inclusão no ambiente da Floresta Amazônica ........................................................ 143
Gráfico 43 – Noções sobre Manejo Florestal ................................................................................................ 144
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Número de entrevistados por localidade ...................................................................................... 37
Tabela 2 - Distribuição de pessoas por domicílio em cada comunidade ........................................................ 38
Tabela 3 - Distribuição por tempo de residência no local em anos ................................................................ 40
Tabela 4 - Moradores das localidades que não possuíam nenhum documento ............................................ 42
Tabela 5 – Distribuição dos entrevistados por nível de escolaridade nas comunidades ................................ 42
Tabela 6 - Composição de domicílios, instituições, organizações e estabelecimentos comerciais nas
comunidades ................................................................................................................................................... 50
Tabela 7 - Distribuição do tipo de energia nas diversas comunidades ........................................................... 53
Tabela 8 – Produção econômica e grau de renda familiar .............................................................................. 67
Tabela 9 – Renda sobre Benefícios recebidos pelos moradores em cada localidade ..................................... 69
Tabela 10 – Tipo de dívidas feitas pelos moradores entrevistados ................................................................ 70
Tabela 11 – Tipos de ensino oferecido nas escolas de cada comunidade ...................................................... 72
Tabela 12 – Situação Educacional das Comunidades no entorno e dentro da Flona de Pau Rosa ................. 74
Tabela 13 – Tipos de queixas e/ou doenças mais freqüentes entre os moradores ........................................ 90
Tabela 14 – Atividades de superação utilizada pelos moradores diante das dificuldades enfrentadas ....... 120
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 – Produtos citados pelos entrevistados como base da economia e subsistência familiar ............. 66
Quadro 2 – Discriminação de serviços desenvolvidos nas localidades ........................................................... 68
Quadro 3 – Nome dos coordenadores de cada comunidade........................................................................ 101
1
APRESENTAÇÃO
Com o objetivo da melhoria das condições sociais e uso racional dos recursos naturais o
Governo Federal estabeleceu a criação de Florestas Nacionais. De acordo com SNUC (Lei 9985 de
2000) as Florestas Nacionais integram o grupo das unidades de conservação de uso sustentável que
objetivam compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável de parcela dos seus
recursos naturais.
O Ministério do Meio Ambiente, por meio do Instituto Chico Mendes de Conservação da
Biodiversidade – ICMBio, por intermédio da Diretoria de Unidades de Conservação de Uso
Sustentável e Populações Tradicionais – DIUSP é responsável pela elaboração e implementação dos
instrumentos de gestão desta categoria de unidade deconservação (UC). O ICMBio, se ocupa no
entendimento socioambiental e na manutenção da vida nessas localidades, bem como atua na
vigilâncias dos termos de gestão dos recursos naturais. Para tanto é necessário que se implemente e
consolide um plano de manejo para a Flona dentro dos princípios da sustentabilidade socioambiental.
O Plano de Manejo, constitui-se num dos principais instrumentos de gestão de uma Flona. Em
termos concretos se trata de um documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos
gerais de uma unidade de conservação, se estabelece seu zoneamento e as normas que devem orientar
o uso da área e o manejo dos seus recursos naturais, inclusive a implantação das estruturas físicas
necessárias à sua gestão. Na sua elaboração é fundamental obter informações que irão colaborar para
o zoneamento da unidade e a definição de regras de utilização das zonas. Neste contexto, se faz
necessário o levantamento de informações socioeconômicas e a dinâmica social das populações que
vivem no seu território bem como as populações imediatamente em seu entorno, e que por motivos da
socialidade vivida, a Flona é um espaço de uso direto ou indireto dos moradores residentes no interior
e entorno.
Este relatório se refere, pois a área de estudo da Floresta Nacional de Pau Rosa, a ser referida
neste relatório por Flona PR, que foi criada pelo Decreto s/nº de 07 de agosto de 2001, no estado do
Amazonas. Possui uma área de 947.520,285 ha localizada nos municípios de Maués e Nova Olinda
do Norte.
Para responder a essa necessidade, o ICMBio, Setor de Gestão da Flona PR, por meio da sua
Chefe Ana Paula de Oliveira Mendes solicitou ao Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia INPA, mais especificamente ao Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental (LAPSEA) para
realizar um diagnóstico socioambiental, de modo a identificar, descrever e caracterizar os grupos
cujos interesses se relacionam de forma direta ou indireta com a Flona PR, incluindo as populações
residentes no seu interior e nas comunidades do entorno, abrangendo um número de moradores
2
representativo.
Este relatório descreve aspectos processuais da expedição e os respectivos aspectos da relação
gente e ambiente na Flona PR, que foram analisados para o fim proposto deste trabalho. A expedição
foi realizada em conjunto com o Laboratório de Manejo Florestal (LMF) do INPA que se ocupou de
dados do inventário florestal e envolveu uma sofisticada logística por meio fluvial numa época de
muitas chuvas e cheia dos rios.
FLORESTAS NACIONAIS – FLONAs
As Florestas Nacionais (Flonas) são áreas de domínio público que existem formalmente a partir
da Lei 4.771 de 15 de setembro de 1965. Ao serem designadas como Flonas a área passa a ser de
posse e domínio públicos, sendo que as áreas particulares incluídas em seus limites devem ser
desapropriadas de acordo com o que dispõe a lei. As áreas demarcadas como FLONA podem ter
cobertura vegetal nativa ou plantada, que no caso da Amazônia, o mais comum é a vegetação nativa.
Com a lei 9985 de 2000 as Flonas foram integradas a esse novo Sistema de Unidades de
Conservação (SNUC) e denominadas como Unidades de Uso Sustentável direto. As Flonas tem
objetivo principal de promover o manejo de recursos naturais, com ênfase na exploração sustentável
de florestas nativas (produção de madeiras) e demais produtos vegetais, sem que esse uso traga
prejuízo aos recursos hídricos, à paisagem cênica, aos sítios arqueológicos (se existentes) e ainda
fomentar a pesquisa científica, programas de educação ambiental, atividades de lazer e turismo. Em
se tratando do desenvolvimento da pesquisa e educação ambiental, qualquer estudo ou intervenção
deve ter uma prévia autorização do órgão responsável pela administração da unidade, às condições e
restrições por este estabelecidas e àquelas previstas em regulamento.
Apesar da ênfase nos recursos naturais e geológicos, nas Flonas podem ter em suas áreas
moradores que estão residindo na área há muitas décadas. Dessa forma a lei resguarda o direito da
permanência de populações tradicionais que a habitam, quando de sua criação, em conformidade com
o disposto em regulamento e no Plano de Manejo da unidade. Essa população será um elemento de
grande importância na co-responsabilidade da gestão da Flona. Por isso é prevista a formação de um
Conselho Consultivo, presidido pelo órgão responsável por sua administração e constituído por
representantes dos órgãos públicos, de organizações da sociedade civil e, quando for o caso, e
representantes das populações tradicionais residentes.
Essa conformação que prevê uma certa versatilidade estabelecimento do processo de gestão da
Flona é, na verdade bastante complexa. Além das distâncias de acesso, em particular na Amazônia, e
complicações orçamentárias e de recursos humanos do órgão gestor, no caso o ICMBio, o processo
3
em si demanda aprimoramento dos mecanismos de gestão e acesso aos recursos naturais renováveis,
exigindo, inclusive, a criação de incentivos duradouros aos diversos atores envolvidos, uma vez que
as atividades ali desenvolvidas são cíclicas e de longo prazo.
FLONA DE PAU ROSA – MAUÉS
A Flona de Pau-Rosa foi criada pelo Decreto S/N, de 07/08/2001. Está localizada no
Município de Maués, no Estado do Amazonas e possui uma área total aproximada de 827,877 ha,
descrita nas Cartas Planimétricas SA-21-Y-D, SB-21-V-B, SB-21-V-D e SB- 21-V-C, do Projeto
RADAMBRASIL, escala l:250.000, ano 1978. Os limites estão também descritos nesse decreto e
abrange a confluência de dois municípios estaduais, o de Maués e Nova Olinda do Norte (Figura 1).
A Flona PR tem como objetivos a promoção do manejo de uso múltiplo dos recursos naturais, a
manutenção e a proteção dos recursos hídricos e da biodiversidade, a recuperação de áreas
degradadas, a implementação e consolidação de atividades de educação ambiental, bem como o apoio
ao
desenvolvimento
sustentável
dos
recursos
naturais
das
áreas
limítrofes
(http://www.icmbio.gov.br/Flonas/index.php?id_menu=159 ) .
Mesmo que criada há 8 anos, o endereço constante no sítio de Internet acima apresentado
consta estar ainda na capital do estado, Manaus, na sede do antigo instituto IBAMA, onde há uma sala
provisória para as atividades do ICMBio, e por conseguinte, o escritório da Flona de PR. Neste sítio
encontram-se os números de telefone, da chefia atual e nenhuma outra informação, de modo que as
informações sobre essa Flona ainda se encontram de acesso restrito ao público em geral. Embora
algumas informações já estejam disponíveis para consulta junto ao órgão gestor e sua chefia, outras
informações necessárias para a implementação de ações como o Plano de Uso e Manejo necessitavam
ser desveladas.
4
Figura 1 – Limites de abrangência da Flona de Pau Rosa
Fonte: MMA/IBAMA
Este trabalho trata, portanto de construir um repertório de informações iniciais para cumprir as
determinações legais de gestão e uso da Flona. O presente relatório está organizado em seções a partir
de indicadores socioambientais para o monitoramento da FLONA além de outras informações
socioculturais e percepções que podem ampliar o conhecimento das práticas atuais e possibilidades
de intervenção para uma nova atuação para cumprimento dos objetivos estabelecidos para essa Flona.
5
A EXPEDIÇÃO CIENTÍFICA
A expedição para o trabalho de coleta de informações ocorreu durante 30 (trinta) dias, iniciada
no dia 08 de fevereiro até o dia 07 de março de 2009. No dia 06 e 07 o barco as equipes foram
equipando o barco locado para a expedição - Cometa Halley (Ver Figura 2). No dia 08 de fevereiro o
barco com as equipes do INPA e ICMBio, partia rumo à Flona PR. O barco e sua tripulação abrigou
por 30 (trinta) dias, mais de trinta pessoas, entre pesquisadores, auxiliares técnicos e representantes
do órgão gestor do ICMBio, e eventualmente pesquisadores e técnicos da equipe independente de
Fauna. O percurso percorrido foi Rio Amazonas Abaixo, Lago Grande, Rio Urariá e Rio Paraconi. A
viagem teve duração aproximada 30 horas até chegar nas primeiras localidades do entorno, Santa
Marta e Frente São Jorge.
Figura 2- Barco da Expedição - Cometa Halley
Em muitos casos o barco atracava nas margens do rio, próximo a uma comunidade ou no meio
do rio onde havia profundidade suficiente para navegação e as equipes se deslocavam com canoas –
voadeiras para domicílios mais distantes (Figura 3) ou para o centro da comunidade, onde moravam
alguns moradores.
6
Figura 3 – Deslocamento do barco às comunidades usando voadeiras
Além dos deslocamentos a equipe também enfrentava a fragilidade das escadas já desgastadas
nos barrancos ainda não totalmente submersos, uma vez que o rio ainda estava subindo (Figura 4) e as
chuvas torrenciais que ocorriam na época.
Figura 4– Dificuldades de acesso para chegada na comunidade
METODOLOGIA DE PESQUISA
Num cronograma sincronizado com a equipe do LMF, a equipe do LAPSEA se dirigia às
localidades iniciando na sede da comunidade. Poucas informações previas se tinha sobre a vida social
daquelas populações.
7
Ao atracarmos em Itacoatiara-AM nos surpreendemos com as notícias referentes aos problemas
e riscos da viagem para a área da Flona PR. Os riscos colocados pelos gestores do IBAMA nos
apontavam um cenário perigoso, onde poderíamos não ser bem recebidos, ou até hostilizados, tendo
em vista problemas ocorridos com operações de fiscalização e autuações do IBAMA e operações do
Departamento Antitrafico da Polícia Federal. Surpreendentemente, esse cenário se mostrou
equivocado, pois todas as lideranças como os demais moradores receberam com atenção e interesse
os pesquisadores de todas as áreas, mesmo sem conhecimento de nossa visita para desenvolver o
diagnóstico.
Nas primeiras localidades observou-se que os moradores ficaram surpresos com a notícia do
trabalho. Logo percebeu-se que havia nas localidades e entre as comunidades um forte esquema
associativo e participativo, liderado principalmente pela Igreja Católica de Maués. Mesmo assim
todos foram solícitos e ao serem informados do trabalho, suas condições e objetivos foram
colaborando em todas as informações solicitadas. As demais comunidades que foram tomando
conhecimento na medida em que avançávamos o Rio Paraconi, já aguardavam nossa chegada para
participarem do diagnóstico. Os moradores se mostravam hospitaleiros com nossa visita e não raro
traziam ao barco frutas e outros produtos como doces caseiros e sucos de frutas (Figura 5).
Figura 5– Receptividade e oferta de frutas e hortaliças à equipe de pesquisadores
Em cada localidade a equipe do INPA optou por realizar uma breve reunião com alguns
moradores e líderes da comunidade para apresentar os objetivos do trabalho. Em geral ao chegarmos
numa localidade já tínhamos o nome do coordenador da associação de moradores, com quem nos
apresentávamos e solicitávamos uma reunião com os demais comunitários. Como o primeiro contato
era normalmente feito no final da tarde, a reunião era marcada para o início do dia seguinte, dando
tempo para que o maior número possível de moradores pudesse estar presente na primeira conversa.
Essa reunião ocorria à sombra de uma árvore, nos centros comunitários ou ainda na escola (Figura 6).
A reunião não ocorria apenas com a equipe socioambiental, mas com a equipe do inventário florestal
onde eram esclarecidas todas as dúvidas sobre o trabalho. Como de modo geral os comunitários não
8
tinham conhecimento sobre a Flona, o responsável pelo ICMBio, Sr Huelinton da Silveira Ferreira
passou a fazer uma palestra explicando a existência desse instituto, seus objetivos e formas de gestão
que ora se iniciava com o trabalho de levantamento florestal, socioambiental e da fauna. que após da
informação esclarecida os líderes recebiam e assinavam o formulário de consentimento livre, como
suporte ético às atividades de levantamento de dados (Anexo I).
Figura 6 – Reunião com os moradores para explicação do trabalho a ser desenvolvido
Em todas as comunidades os líderes e demais moradores prontamente aceitaram a participar da
pesquisa e se dispuseram a auxiliar no que fosse necessário. Ressalta-se que a convivência entre
pesquisadores foi bastante amistosa e se tornava muito comum uma interatividade de lazer no final do
dia, quando os pesquisadores se juntavam para um jogo de futebol ou os moradores vinham ao barco
para conversar, oferecer algum produto ou solicitar ajuda (Figura 7).
Figura 7 – Interação da equipe de pesquisadores e comunitários
É surpreendente a interação que ocorreu principalmente com as crianças, que ficavam no início
tímidas no contato, mas em poucas horas estas já se juntavam nas brincadeiras com a equipe fazendo
visitas ao barco para comer, brincar ou ver no computador os mapas da região e fotos que eram tiradas
9
deles próprios (Figura 8).
Figura 8– Interação da equipe de pesquisadores e crianças da comunidade
O trabalho de coleta de informações seguia-se nessa convivência das conversas e interações
espontâneas. Muitas informações são possíveis serem apreendidas a partir dessa metodologia de
observação participante. A sistematização dessas informações foi realizada com anotações no diário
de campo de cada pesquisador e utilizada nesse relatório como detalhamento e aprofundamento das
informações fornecidas por meio da entrevista semi- estruturadas (Formulário no Anexo II).
As entrevistas foram feitas nos domicílios ou nos centros sociais, muitas vezes logo após a
reunião comunitária (Figura 9). Os que moravam perto da sede comunitária eram visitados em suas
casa, os mais distantes preferiam ser entrevistado por ocasião da reunião, uma vez que a distância de
suas casas era relativamente grande. A entrevista era conduzida pelo adulto responsável pela unidade
doméstica, mas não raro o casal respondia alguns questionamentos de forma conjunta. As crianças se
juntavam aos pais e os bebês trocavam de colo constantemente. Em muitos casos a entrevista era
interrompida para dar atenção aos pequeninos que queriam tomar a mamadeira, comer ou estavam
fazendo algo não aprovado pelos pais.
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Figura 9– Realização das entrevistas nas casas e no centro comunitário
As respostas dadas pelos questionamentos feitos eram anotadas no formulário e depois
digitadas num banco de dados para posterior análise. A entrada dos dados exige um rigor absoluto da
informação fornecida, de modo que neste momento a fala do/a entrevistado/a é o dado bruto, sem
interpretações ou arranjos de linguagem, de modo a ser o mais fidedigno possível ao dialogo
estabelecido com o/a entrevistado/a.
Os dados foram submetidos a um tratamento quantitativo e qualitativo. Usou-se estatística
não-paramétrica (percentual) para compilação da informação e em muitos casos foi feita uma análise
para estabelecimento de categorias analíticas que surgem a partir do método de análise de conteúdo
(Bardin, 1977;1 Bauer, 20022). A análise de conteúdo foi o método principal para compreender
aspectos relacionados à percepção ambiental.
Além da entrevista foi elaborado um croqui sobre o arranjo espacial da habitação e demais
aparatos sociais existentes na localidade. Esses croquis eram feitos a partir da observação in loco por
um membro da equipe, que em muitas ocasiões era auxiliado pelos moradores (Figura 10).
1BARDIN,
2BAUER,
L. Análise de Conteúdo. São Paulo: Martins fontes, 1977.
M. 2002. Análise de conteúdo clássica: uma revisão. In Bauer, M.V. e Gaskell, G. Pesquisa qualitativa, com
texto, imagem e som. Petrópolis: Vozes, 516 pp
Figura 10– Elaboração do croqui da comunidade com auxílio dos moradores
As informações específicas sobre o histórico da comunidade foi feita a partir de entrevistas
consorciadas com moradores antigos ou com uma das pessoas mais antigas da comunidade e que era
indicada pelos demais como conhecedora desse processo.
Dados sobre a situação escolar eram fornecidos por professores que se encontravam na
comunidade por ocasião de nossa visita, mas essas informações foram comprometidas, pois os
professores estavam de férias fora da comunidade e os moradores não sabiam informar. Esses dados
podem vir a ser completados com um trabalho posterior na Secretaria Municipal de Educação de
11
Maués – AM, uma vez que todas as escolas estão vinculadas a esse órgão público.
A equipe fotografou acontecimentos, paisagens e objetos para uso no relatório como elemento
auxiliar na compreensão da sociabilidade e ambientabilidade existente na área pesquisada. As fotos
compõem um banco de imagens que foram devidamente autorizadas pelas pessoas fotografadas para
uso restrito nas atividades de pesquisa e banco para a equipe de gestão da Flona. A veiculação da
imagem para qualquer outro uso é vedada, a menos que as pessoas retratadas dêem o consentimento
para esta finalidade.
Em algumas situações foram realizadas reuniões com adolescentes e crianças com o objetivo de
desenvolver atividades lúdicas ou educacionais, que neste relatório não serão usadas para análise.
Este relatório consta, pois desses dados organizados e analisados para fins de uso pela Gestão
da Flona PR/ICMBio e estudos científicos pela equipe do INPA.
COMUNIDADES DA FLONA DE PAU ROSA E DO ENTORNO
Constam das informações providenciadas pela gestora da Flona PR que havia 10 comunidades
na área interna da Flona e pelo menos 5 na área limítrofe. Considerando as coordenadas geográficas
existem na Flona PR oito (8) comunidades dentro dos limites e 8 comunidades nas áreas limítrofes. A
Figura 11 mostra a localização geográfica das comunidades, sendo que uma das comunidades citadas
como entorno não foi visitada devido o acesso, uma vez que esta se localiza, segundo os moradores
num braço do rio Urariá de Cima, mais ao norte, não tendo, portanto acesso ao rio Paraconi e demais
moradores do entorno da Flona PR.
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Figura 11– Localização das comunidades dentro e no entorno dos limites da Flona PR
Fonte: MMA-ICMBio
Santa Marta
Na memória coletiva dos atuais moradores consultados não havia uma informação que
confirmasse uma história clara da habitação de pessoas que se identificam moradores de Santa Marta.
Antes da denominação “comunidade” os moradores dizem que moram nessa área, pois seus pais
nasceram e viviam ali. Poucos demonstraram curiosidade em saber sobre essa história e, portanto
dizem não saber quando e nem de onde seus antecedentes vieram. Uma informação que se tem é que
a família de um senhor chamado Antônio, que atuou muito como líder comunitário, se mudou da
região do rio Madeira há cerca de três gerações, no entanto, não se soube o motivo dessa mudança. O
Sr. Antônio também contou a história do Sr. Elias que teria sido o primeiro morador da área e que não
deixou descendentes. Por esse motivo, o lago seria conhecido por Lago do Elias.
Há aproximadamente 16 anos os moradores da área do Lago do Elias sentiram a necessidade de
uma casa de oração para o culto religioso (católico). Começaram então a se reunir na casa de Dona
Rosilda, a matriarca da família Guimarães. Destas reuniões começaram as idéias de se ter um espaço
mais adequado para as reuniões, culto e escola, então o Sr. Antônio doou parte de sua terra para essa
finalidade.
O nome Santa Marta parece ter sido escolhido pela Secretaria Municipal de Educação de
Maués, por ocasião da construção da escola, que na ausência de um nome para a comunidade, achou
que Santa Marta seria ideal, pois segundo um dos moradores, nessa Secretaria havia uma senhora que
tinha um quadro de Santa Marta, e por isso doou aos moradores pelo fato de aceitarem a sugestão. A
partir disso, os comunitários adotaram Santa Marta como padroeira. Os comunitários se orgulham do
nome escolhido, pois segundo os mesmos, não há por perto, outra comunidade com esse nome.
Os moradores se organizam em associação que é amparada e orientada pela igreja católica de
Maués. A associação comunitária é organizada com representantes que são votados e que
permanecem na função por 2 anos. O primeiro coordenador foi o Sr. Mauro Magalhães que
atualmente coordena a associação de Frente São Jorge. Sua mudança ocorreu porque se casou com a
filha do casal que primeiro habitou aquela área. Todas as reuniões da comunidade possuem ata, eles
aprenderam essa forma de organização em um curso para comunidades no município de Maués.
Um dos moradores da área se diz representante do sindicato dos agricultores, no entanto, este,
além de não ser atuante nas atividades comunitárias, uma vez que comunidade é entendida pelos
13
moradores como grupo ligado às atividades da igreja.
A localização da comunidade é de frente ao Grande Lago do Elias, entre os Igarapés Açu e
Mundurucu. A sede da comunidade (Figura 12) é habitada por membros da mesma família, que
também são os antigos e atuais líderes. Santa Marta é, no entanto, uma área maior do que a sede, que
pode ser visualizada no croqui (Figura 13)
Figura 12 - Vista Panorâmica da Sede comunitária de Santa Marta
Figura 13 -- Croqui da Comunidade Santa Marta
Os atuais moradores da localidade têm ligações familiares direta com o casal Maria das Graças
(Dona Pituca) e seu Paulo Pinheiro. O casal inicialmente recebeu a terra dos pais de Seu Paulo e
14
construíram uma casa nos arredores do lago São Jorge, onde plantaram seringa e castanha há 40 anos.
Para ficar mais próximo do rio transferiram a casa mais para frente, na parte baixa da várzea. Desta
forma o nome da localidade passou a ser “Frente São Jorge”.
O casal teve 10 filhos, dos quais 6 decidiram morar próximo. Uma das filhas casou- se com
Mauro, um jovem líder e atuante de Santa Marta, que ao construir a casa propôs criarem uma
comunidade. A comunidade se limita basicamente na sede com escola e uma igreja e os seus
moradores próximos. A forma atuante do atual coordenador é responsável pela organização da
associação comunitária e a construção da escola 2001. A escola passou a ter o nome de seu pai:
Bertholdo Lima, que já era falecido. Frente São Jorge se caracteriza, assim como um agrupamento
bastante familiar, mesmo tendo famílias sem parentes consangüíneos. Todos são participantes
atuantes e são organizados e possuem regra de convivência baseada nos preceitos católicos. Frente
São Jorge e Santa Marta se caracterizam como núcleos extensos de familiares.
É uma das poucas comunidades que tem poço artesiano em funcionamento e uma horta
comunitária bem organizada, cuidada pelos moradores e utilizada como atividade escolar. Frente à
sede comunitária há uma extensa passarela por onde todos circulam para chegar e sair, lavar roupa e
tomar banho (Figuras 14 e 15).
Figura 14– Vista Panorâmica da Sede comunitária de Frente São Jorge
15
Figura 15– Croqui da Comunidade Frente São Jorge
Vilanova
A comunidade Vilanova esta organizada como as demais comunidades. Localiza-se às margens
do Rio Urariá em cuja sede tem uma igreja de alvenaria, um centro social, um centro de saúde e uma
escola com várias salas e equipe auxiliar paga pela SEMED de Maués, telefone público e um centro
folclórico chamado Bentimódromo, onde reúnem grupos para apresentações de danças (Figura 16).
Os moradores como os das outras comunidades tem parentes nas proximidades e se organizam em
coordenação, atualmente sendo o Sr. Antonio da Silva (Tonhão) o coordenador.
16
Figura 16– Croqui da Comunidade Vilanova
Santa Maria de Ituense
O senhor Ermelino Carvalho de Oliveira se diz o morador mais antigo na comunidade, com 65
anos no local. Segundo ele o nome Ituense é uma tradição iniciada pela memória de seu avô, que se
chamava Tomaz de Oliveira Ituá. Seu Tomaz era conhecido à época como Seu Ituá, que era um
comerciante forte. Distinguia-se dos demais, pois morava numa casa de taipa, com telha de barro.
Segundo seu Ermelino foi lá onde nasceu meu pai. Essa localidade, segundo Seu Ermelino era um
grande cacual (semente que se vendia seca) grande na época do meu avô. Nessa época não corria
dinheiro era só ouro e prata, era uma região de muito ouro e muita prata e de acordo com a mãe de Seu
Ermelino, o avô tinha um tesouro. Seu Ituá adoeceu gravemente e foi se cuidar em Belém e lá morreu.
Deixou os filhos aqui e a história do ouro e da prata nunca foi encontrada. Dizem que ele enterrou por
aí...
Aquela casa de taipa de Seu Ituá foi se acabando e alguns filhos foram para Belém, porém dois
deles, um sendo o pai de Seu Ermelino decidiu ficar nessa localidade. O tio mais tarde foi para Belém
e seu pai se fixou em Manaus. Seu Ermelino permaneceu na localidade que passou a chamar de
Comunidade Ituense. Esse nome teve origem na caracterização da família Ituá, cujos vizinhos se
referiam a sede como lugar dos Ituenses.
A idéia de virar comunidade no papel foi estimulada por um parente vereador de Nova Olinda.
A idéia surgiu pelo fato de uma das filhas de seu Ermelino ser professora em Nova Olinda e ter que se
17
deslocar para outras comunidades remando de canoa. Se a localidade se tornasse uma comunidade ela
poderia lecionar no local. Seu Ermelino diz que então foi para Nova Olinda com o secretário da
prefeitura e ficou acertado que seria criado uma comunidade que teria uma escola com o nome de
Santa Maria do Ituence.
A comunidade tem oficialmente 14 anos, e o fundador foi Seu Ermelino e seus filhos. Por
conseguinte Seu Ermelino foi o primeiro presidente e depois passou para seu filho Roberval de
Oliveira, e assim sucessivamente a todos os filhos. Cada “mandato” tem duração de 2 anos. Um dos
filhos não foi bom presidente, vendeu tudo o que ganhou da prefeitura e o que foi conseguido pela
família. Como os filhos envelheceram os netos não parecem se interessar pela comunidade e foram
para outras comunidades ou cidades próximas. Há alguns anos atrás tinha um pequeno comércio e
uma escola. Hoje já não tem mais comércio nem escola. A comunidade praticamente é formada pelos
filhos e genros de Seu Ermelino, que vivem do roçado.
A Comunidade Ituense tem como criador seu Ermelino que é católico. Como um dos filhos se
converteu para a igreja evangélica, este acabou criando uma nova comunidade com uma igreja
evangélica e está propondo um novo nome: Monte Sinai, onde tem uma pequena igreja e está
tentando oficializar a troca de nome, porém ainda não está oficializado. Os cultos são apenas
evangélicos. A antiga igrejinha católica foi se acabando e os cultos católicos não aconteceram mais na
comunidade. A localidade abriga quatro famílias em quatro casas e apenas uma igreja pequena
(Figuras 17 e 18).
Figura 17– Vista panorâmica de Santa Maria de Ituense
18
Figura 18- Croqui da Comunidade Santa Maria de Ituense
São Pedro
Os primeiros moradores foram descendentes de Aureliano Leite – os Leitezada, como eram
conhecidos há 60 anos. Essa família construiu uma igreja e deu nome de São Pedro. Desde então a
localidade é conhecida como São Pedro. Com o tempo vieram outros moradores da família Freire – os
Freirezada. Os irmãos Freire inauguram em 2002 a escola “Cezar Gadelha” cujo nome foi uma
homenagem ao primeiro professor. Desde a aglomeração destes grupos familiares, os moradores da
área se identificam como comunitários e em 2002 criaram a associação que seus representantes
eleitos exercem a coordenação por 2 anos.
A comunidade se caracteriza pela presença de grupos familiares de duas gerações a três
gerações. Lembra um aglomerado com 15 famílias mais próximas, com outras que moram nas
margens ao longo do lago do rio Urariá. Uma vez por ano a comunidade de São Pedro se junta coma
as demais 13 comunidades do rio Urariá e Paraconi para decidir um cronograma de encontros
mensais para cultos, torneios e outras atividades interativas.
A comunidade São Pedro tem uma igreja, escola, salas de apoio comunitário como cozinha e
centro comunitário e campo de futebol (Figuras 19 e 20).
19
Figura 19– Vista Panorâmica da Comunidade São Pedro
Figura 20 - Croqui da Comunidade São Pedro
Sagrado Coração de Jesus
Segundo os moradores atuais a comunidade tem uma memória de pelo menos uma década. Há
20
mais de 100 anos uma mulher forte chamada Dona Francisca Pinheiro de Miranda – formou uma
família de seis filhos, que foram se casando e formando nova famílias. O número de crianças era tanto
que viram a necessidade de ter uma escola na própria localidade. Decidiram então criar uma escola
com o apoio da Semed de Maués. O nome “Sagrado Coração de Jesus” foi dado devido à devoção de
Dona Francisca.
A comunidade foi formada basicamente por três troncos familiares: os Freire, os Pinheiro e os
Barbosa. Mais recentemente chegaram os Viana, os Frós, os Peixotos, os Guimarães e os Breves.
A coordenação comunitária iniciou-se com incentivo da Diocese de Maués. A primeira
coordenação ocorreu em 1963. O primeiro coordenador foi o filho de Dona Francisca. A eleição para
este cargo ocorre de dois em dois anos e a equipe de coordenadores se reúne semanalmente. Até o
momento desta pesquisa faziam parte desse quadro Davi Freire Barbosa (coordenador) Reginilson
(Vice) Antonio Fernando (secretário) José Pinheiro (tesoureiro). Os atuais dirigentes tem planos para
formar grupos de trabalhos em conjunto.
A sede da comunidade abriga apenas algumas famílias, as demais estão dispersas ao longo das
margens do Rio Paraconi (Figuras 21 e 22).
Figura 21– Vista Panorâmica da Comunidade Sagrado Coração de Jesus
21
Figura 22 – Croqui da Comunidade Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
O primeiro nome da localidade era Povoação, depois passou a se chamar Santo Antonio em
homenagem ao padroeiro da localidade e pro fim teve nome de Ozório da Fonseca. A comunidade se
caracteriza pela presença de grupos familiares e desde 1960, os moradores se identificam como
comunidade.
Os primeiros moradores da localidade foram das famílias de José Bonifácio, natural de
Pernambuco casado com Dona Maria, moradora da região e de Mariano José Rodrigues Lauriano,
casado com Dona Lucinda também moradora da região. Segundo os moradores o Sr. Lauriano foi
professor da localidade durante 16 anos e ocupou cargos de guarda de medicador (uma espécie de
agente de saúde da época), atuava como policial chegando ser vice-prefeito nomeado por Maués.
Em 1962, o político Darcy Michiles deu o nome de Ozório da Fonseca à comunidade em
homenagem ao Marechal Ozório da Fonseca, que permanece até hoje. Atualmente fazem parte da
comunidade 35 famílias, sendo que 18 moram na sede, e as outras às margens direita e esquerda do
rio Paraconi nas proximidades a sede (Figuras 23e 24).
22
Figura 23 – Vista Panorâmica da Comunidade de Ozório da Fonseca
Figura 24 – Croqui da Comunidade de Ozório da Fonseca
A organização social comunitária é representada por coordenador, atualmente o senhor Roberto
Rodrigues Macedo, Diamor dos Santos (Vice), secretário e tesoureiro.
Na comunidade há um posto de saúde, construído em alvenaria pela prefeitura de Maués, na
gestão de Sidney Leite, que atende as treze comunidades da redondeza. Em Ozório há um sistema de
comunicação bem organizado, com antena para celular e até uso de Internet. Há um centro social
23
igreja e uma escola. A primeira igreja católica em homenagem ao padroeiro Santo Antonio foi
construída em madeira na década de 1960 com uma torre ao lado. O sino era batido todos os dias às
6:00h e às 18:00h. A pequena imagem de Santo Antonio usada na inauguração capelinha foi
substituída por uma maior, e a original está em Maués.
Santa Teresa
Localizada nas margens do rio Paraconi a comunidade Santa Tereza tem um histórico
semelhante às outras comunidades. A comunidade começou apenas com um morador Senhor
Aflaudisio Antonio Correa, seu “Didi” como era conhecido na redondeza. Este chegou na localidade
e fixou residência. Antes de tornar-se comunidade a área era conhecida como o sítio do seu Didi. Em
seguida outro morador vindo do Curuçá fixou também residência na área. Seu Didi doou a terra para
esse morador que mais tarde casou- se com uma moradora da região do Caiuaé.
A comunidade propriamente dita começou em 1983. Como a dificuldade de estudo para os
filhos eram muito grande, as famílias se reuniram para criar uma comunidade, que era condição
primordial para se ter uma escola. Os fundadores foram: Antonio Francisco da Silva, natural do ceará
e morando há 25 anos no local, Francisco Correa, Manoel da Luz (já falecido), cuja família continua
no local, e Miguel Correa. O terreno onde está localizada a escola foi doado pelo senhor “Didi”. Por
esse motivo a escola foi nomeada de “Escola Municipal Aflaudisio Antonio Correa”.
A estrutura organizacional da comunidade baseia-se em 18 domicílios e aproximadamente 20
famílias, entretanto, na sede da comunidade apenas três casas estão ocupadas. As outras famílias
moram nas margens do Rio Paraconi nas proximidades (Figuras 25 e 26).
Figura 25 – Vista Panorâmica da Comunidade de Santa Teresa
24
Figura 26 - Croqui da Comunidade de Santa Teresa
Na comunidade tem uma igreja católica que tem como padroeira Santa Tereza. Aos sábados há
formação de catequese com as catequistas Nicinha e Nadir. Há ainda um centro comunitário onde os
moradores costumam se reunir para suas atividades administrativas e sociais. A comunidade possui
um grupo de coordenadores que atualmente é representando por Miguel Correa (Coordenador), José
Nazir (Vice), Adenilson (Secretário) - filho de Nazir, Romário Correa (Tesoureiro) filhos de Miguel
Correa. Semelhantes as outras comunidades do Paraconi os representantes são eleitos de 2 em 2 anos,
com possibilidade de ficarem por até 4 anos.
São Tomé
A comunidade São Tomé existe há 14 anos e está localizada onde outrora foi o sítio da família
Lavareda. Antes de ser comunidade, a terra pertencia ao Senhor Osmar Lavareda, casado com dona
Estrogilda Freitas da Silva, filha da região do Paraconi. Dona Estrogilda morou no local por muitos
anos antes de ir embora para Manaus. Depois disso, o local ficou abandonado por mais ou menos seis
anos.
A idéia de formar uma comunidade partiu do Senhor Edimilson Francisco Freitas, morador da
região há muitos anos. A dificuldade no deslocamento dos filhos para irem à escola foi um dos
25
principais motivos que levaram seu Edimilson lutar para que o local tornasse uma comunidade,
assim, teriam direitos a uma escola mais perto de sua residência que atenderia os alunos das
proximidades.
A primeira casa construída no local onde hoje é a sede da comunidade foi um galpão coberto de
palha, uma cozinha e mesas feitas de tábuas para apoio dos alunos. Nessa casa funcionou a primeira
escola. Para acomodar a professora construíram um anexo que servia de quarto para a mesma. A
primeira professora da comunidade chamava-se Maria Graciele, ela passou 2 anos exercendo a
função de magistério na comunidade.
Uma das exigências da Secretaria de Educação foi que os moradores construíssem na
localidade uma igreja, assim a segunda providência dos moradores foi a construção da igreja que viria
a legitimar a localidade como comunidade. O nome da comunidade foi colocado por outro morador
da localidade Senhor José Perrone que era devoto de São Tomé. Na comunidade há um centro social
para reuniões e encontros comunitários além das casas (Figuras 27 e 28). Apesar de ter uma escola
não foi possível coletar dados educacionais por não haver nenhum morador que pudesse dar essa
informação.
Figura 27 - Vista Panorâmica da Comunidade de São Tomé
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Figura 28 - Croqui da Comunidade São Tomé
Bragança
Localizada na margem direita do Rio Paraconi, teve como primeiros moradores Salustiano da
Silva Monteiro e Maria Liberalina da Silva Monteiro. Pais de vinte e três filhos muitos dos quais
nascidos na região do Paraconi e os demais nascidos no Pará onde moravam anteriormente. A família
veio em busca de melhores condições de vida e fixaram residência no local onde atualmente é a sede
da comunidade.
Em homenagem a cidade de onde vieram Seu Salustiano colocou o nome do lugar de Bragança.
A comunidade existe há 13 anos, os motivos para tornar-se comunidade são semelhantes às outras
localidades. Os filhos precisavam estudar e as escolas eram em outras comunidades mais distantes.
Havia dificuldade para levar os filhos, remavam longas distancias até os locais onde havia escola.
Assim, os moradores reuniram-se e articularam com a Secretaria de Educação de Maués para instalar
uma escola no local e mandar professores.
A comunidade tem representantes formados atualmente por Antonio da Silva Monteiro
(Coordenador), Sebastião Rodrigues Garcia (Vice), Orlando dos Santos Barbosa (Secretário) e Silvio
da Silva Monteiro (Tesoureiro). Os representantes comunitários são eleitos de 2 em 2 anos, podendo
27
ser reconduzidos ao cargo por mais dois anos.
Na sede da comunidade moram 08 famílias em 05 domicílios. Tem uma igreja que tem como
padroeiro São José; um centro social onde os moradores fazem reuniões (Figuras 29 e 30). Muitos
moradores de Fortaleza, Cacoal e Monte Carmelo se dirigem a Bragança para serem atendidos pela
agente de saúde da sede.
Figura 29 – Vista Panorâmica da Comunidade de Bragança
Figura 30 – Croqui da Comunidade de Bragança
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Fortaleza
Localizada na margem direita do rio Paraconi, os primeiros moradores foram da família
Pandura. Segundo informações dos moradores o Senhor Adolfo Pandura veio do Peru com 15 anos,
ficou na região, trabalhou e casou-se com Dona Minervina dos Santos, natural da região do Paraconi.
Quando Sr Adolfo veio morar na localidade não havia ninguém na área. Ele registrou a terra no Incra
por meio da sua primeira esposa que era brasileira. Tiveram 4 filhas (Zelina, Zenaide, Zelinda, e
Maria do Socorro). Após o falecimento de Dona Minervina, o Sr Adolfo casou-se novamente e com
segunda esposa teve mais filhos. Os filhos foram casando-se e construindo casas na localidade que
era conhecido como sítio dos Panduras. Seu Adolfo faleceu com 88 anos de idade. Antes dividiu o
terreno com os filhos e cada um procurou tomar conta do seu pedaço de terra.
Para tornar-se comunidade os moradores reuniram-se na sombra de uma mangueira para
decidir a localização da sede comunitária. Um dos filhos de Seu Adolfo abriu mão do seu terreno em
favor da comunidade, que há 13 anos passou a ser chamada de Comunidade Fortaleza. O nome
“Fortaleza” foi decidido pelo pai do atual vice-coordenador e não se sabe o motivo da escolha.
Na comunidade além de algumas casas tem uma escola, um centro social e uma igreja que tem
como padroeiro São Benedito (Figuras 31 e 32). Segundo informações a primeira construção da
igreja era uma capelinha construída pelos próprios moradores. A atual construção da igreja feita em
novembro de 2001 foi feita em mutirão e embora seja em madeira é bem maior do que a anterior. Na
comunidade não há posto de saúde nem agente, essa atividade é feita pelo agente de saúde de
Bragança.
Figura 31 - Vista Panorâmica da Comunidade Fortaleza
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Figura 32 – Croqui da Comunidade Fortaleza
Santa Maria do Caiaué
Localizada na margem direita do rio Mundurucu a comunidade teve como primeiros moradores
Inácio Lopes casado com Dona Maria Muaca e João Gabriel, pai de dona Maria Muaca. As cinco
famílias de etnia mudurucanha/mundurucus deram origem a localidade. Ao longo do tempo perderam
o hábito de falar a língua dos antepassados indígenas e foram adotando costumes dos que chegavam
no local. A tradição da língua Mundurucu era falada pelos antigos moradores, mas foi se perdendo ao
longo do tempo, pois os jovens não entendiam. Segundo os mais antigos os jovens tinham vergonha
de se comunicar na língua oficial dos mundurucus. Segundo Seu Valtinho a tradição da fala
mundurucu é a coisa mais bonita que perderam. Os mais antigos não se comunicavam em outra
língua, falavam somente na língua mundurucu.
A comunidade foi fundada como dia 26/09/1972. Nesse ano fizeram a primeira festa, com a
presença do Padre Santos que fez quatro casamentos e dois batizados. O dono da área batizou-se aos
82 anos. No ano seguinte festejaram Santo Antonio que naquele tempo se fazia uma grande festa que
passou a ser tradicional, ao som do gambá (instrumento regional típico da época). Havia procissão de
Santo Antonio entre as
30
comunidades coletando doações para a festa. Quando voltavam para a comunidade continuavam com
a festa noite adentro, com a mesma dança do gambá acompanhado de tamborim, foliões que
cantavam. A lembrança dessa época ainda traz alegria aos moradores que comentam a beleza dos
festejos, as bandeiras e os instrumentos que tocavam. Atualmente dizem ter perdido esse costume e os
atuais moradores não sabem mais cantar as toadas da época da festa. Naquele tempo durante as noites
de festejos os moradores comiam beiju e biscoitos feitos de goma (amido retirado da mandioca) que
chamavam na época de café com cavaco. Toda essa tradição foi terminando com o passar dos anos.
A comunidade foi crescendo e novas famílias foram chegando e a tradição foi aos poucos
desaparecendo dos hábitos comunitários. As pessoas dizem que naquela época tudo era bonito, as
pessoas executavam todas as idéias em relação a festas e comemorações.
O primeiro coordenador comunitário foi o senhor Inácio Gabriel e a primeira coordenadora foi
dona Maria Muaca, esposa do senhor Gabriel Inácio. Dona Maria mobilizada os comunitários para os
serviços de limpeza do terreno, que segundo senhor Valter conhecido como “Valtinho” a frente do
terreno era um tirirical medonho e muitos marajás, as pessoas trabalhavam cortando os marajás no
meio da água de terçado e na época da seca os próprios moradores iam retirando os tocos que ficavam
e hoje está desse jeito (limpo), “mas aí era muito feio com tanto mato”. Nessa ilha tinha uns pés de
guaraná que o pessoal doou tudo pra comunidade.
A primeira capelinha foi construída em 1975, e no mesmo ano veio o bispo Dom Arcângelo, a
partir daí surgiu a paróquia, que nesse tempo a prelazia de Maués era auxiliada pela diocese de
Parintins. Em 1979 veio outro bispo Dom João Rizzate, nessa época a capela já era maior, embora
ainda feita em madeira. Nesta igreja o Bispo crismou muitos moradores da região.
A partir de 1975 a comunidade não parou mais de crescer e o número de famílias passou para 10
depois para 20 e hoje há aproximadamente 60 famílias. Em março de 1994 a nova capela foi
inaugurada em alvenaria com esforços dos próprios comunitários. Segundo os moradores nesse ano
havia muita roça. Seu Valtinho era o coordenador que sempre teve vontade de ajudar a comunidade
formou um novo grupo para trabalhar em favor dos comunitários. Depois do Senhor Inácio Gabriel
novos coordenadores surgiram. O segundo coordenador foi o senhor Rosendo Mendes e a esposa
Dona Rosa Mendes atuava como catequista. O terceiro coordenador foi o Raimundo Messias, depois
foi Raimundo Mendes, irmão da Noemia, depois José Edson, que era o pai do Evaldison conhecido
como “Chiquinho”, depois o Senhor Valter. O sexto coordenador Seu Valter exerceu o mandato de
coordenador três vezes, depois e uns anos ausente da coordenação, Senhor Valter retornou para
organizar novamente a comunidade e fazer as ruas.
Atualmente a comunidade lembra um aglomerado urbano dividido por duas ruas que
denominam uma parte delas de Inácio Gabriel e outra que fica atrás de Sidney Leite (Figuras 33 e 34).
Depois desse mandato, elegeram novo coordenador que foi Dona Noemia, a seguir Seu José Adelson
31
e Seu Manoel. O atual coordenador é o senhor Evaldison conhecido como “Chiquinho”. Cada
coordenação permanece por dois anos no cargo que pode ser renovado por mais dois. Fazem parte da
atual gestão: Evaldison Lavareda dos Santos (coordenador) Jose Ailton Freire (vice) Eliomar
Faustino da Silva (tesoureiro), Manoel Raimundo Faustino (secretario). Há também coordenação de
trabalho masculino que tem como responsável o senhor Osmar
Figura 33 – Vista panorâmica de Santa Maria de Caiaué
Figura 34 – Croqui da comunidade de Santa Maria de Caiaué
32
Com a organização os moradores já adquiriram um barco de nome Javé Nissi. Hoje já trocaram
o motor por um melhor. Tudo isso trabalhando com união na associação comunitária chamada
Atransmacurapá. Já compraram outro barco que tem o mesmo nome da associação. Segundo Seu
Valtinho a associação trabalha com transparência, todos os associados participam das decisões
tomadas. Há um cadastro e uma ficha com o nome e documentos de cada associado. A associação
existe há seis anos e está registrada em cartório e toda a documentação está legalizada. Porém, o
beneficio dessa união só veio depois de cinco anos de trabalho.
O nome antigo da vila era Santo Antonio, mas como já existia outra comunidade com esse
nome (a atual Ozório da Fonseca) decidiram mudar para não confundir com a outra comunidade.
Então o Padre Gabriel, da prelazia de Parintins, sugeriu que o nome da comunidade fosse Santa Maria
de Caiaué por ter muitas árvores de caiaué na área. Com a instalação do telefone público, os
moradores se orgulham de ter o nome registrado em Brasília. Na comunidade há além das casas um
centro comunitário e casa de alojamento para professores.
São João do Cacoal
Localizado na margem esquerda do rio Paraconi, a comunidade de Cacoal está sob a gestão da
prefeitura de Nova Olinda do Norte. Os primeiros moradores a chegarem na localidade foram da
família do Senhor Manoel dos Santos e Dona Maria Agostinha. Essa família reside no local há mais
ou menos 100 anos. Os cinco filhos foram casando e construindo suas famílias na localidade.
O nome Cacoal foi dado pelos primeiros moradores, e em 1954 o local passou a ser designada
comunidade de São João de Cacoal nome colocado então político da época Humberto Michiles
juntamente com os antigos moradores. O local lembra um aglomerado urbano com duas ruas
paralelas (uma de frente para o rio Paraconi e outra na área de trás). Na sede há um centro social
utilizado para múltiplas atividades (reuniões comunitárias, salão de festas, salas de aula).
A primeira igreja foi construída em 1954 pelos moradores, era de madeira com cobertura de
palha. A atual construção é em alvenaria, idéia de Padre Edílson que trabalhou muitos anos nas
comunidades do Paraconi. O Padre Edilson era muito atuante e visitava as comunidade de dois em
dois meses. Atualmente fazem parte da comunidade 42 famílias sendo que 12 moram na sede e as
outras distribuídas nas proximidades, tanto na margem direita quanto na esquerda do rio Paraconi
(Figuras 35 e 36). A comunidade é representada por Marquinasanor dos Santos Freire (Coordenador),
Sebastião Pinheiro (Vice), Aldemir dos Santos (Secretário), Elcimele Ferreira Pantoja (Tesoureira).
33
Figura 35 – Vista Panorâmica de São João de Cacoal
Figura 36 – Croqui da Comunidade de São João de Cacoal
Na comunidade há um agente de saúde responsável pelo atendimento dos comunitários
dando-lhes alguns medicamentos e tomando providencias de enviar os casos mais graves para a
cidade mais próxima.
34
Monte Carmelo
Localizado na margem esquerda do rio Paraconi, no igarapé do Miriti, Monte Carmelo faz parte
do município de Nova Olinda do Norte. Há mais de 65 anos o casal Manoel Nunes e Dona Maria
Amazonina Ferreira da Silva, natural da região, mais precisamente da atual comunidade de Caiaué
vieram morar nesta localidade. Nessa época não havia moradores no local e os dois construíram a
primeira casa, plantaram roça e formaram família. Pais de 17 filhos dos quais cinco ainda
permanecem na localidade com suas famílias. O senhor Manoel Nunes, atualmente viúvo, ainda
permanece morando no local, mais precisamente dentro de um pequeno barco regional que atraca nos
diferentes portos de seus filhos e vizinhos. Assim Seu Manoel vai levando a vida.
O nome da comunidade Monte Carmelo foi idéia de um pastor evangélico da localidade de
Santa Maria que viajava pela redondeza pregando o evangélico. Em 1988 o pastor reuniu os
moradores para propor que o local tornasse uma comunidade. Para isso elegeu o primeiro
coordenador comunitário o senhor Hermínio Ferreira da Silva. Após essa organização os moradores
passaram s denominar o lugar como comunidade.
Há nessa comunidade 10 casas e 13 famílias, uma escola e uma igreja evangélica (Figuras 37 e
38). Estas famílias estão sob a atual coordenação de Manoel Ferreira da Silva tendo como vice
Geovani Ferreira da Silva. Não há secretário, tesoureiro, ou posto de saúde nem centro social. O
pastor ajudou na construção do templo evangélico em 1988 com auxilio dos pelos moradores.
Figura 37 – Vista Panorâmica de Monte Carmelo
35
Figura 38 - Croqui da Comunidade de Monte Carmelo
Bom Pastor
O primeiro morador da localidade que outrora se chamava São Tomé foi o senhor Manoel de
Abreu, natural do Amazonas que segundo os moradores era um grande mestre na carpintaria que fazia
casas, embarcações e outras coisas que envolvessem madeira. Morreu sem deixar herdeiros e durante
muitos anos a localidade ficou sem ninguém.
Em 1972 moradores da região formaram um Sindicato Rural tendo como membros Erasmo
(delegado), Osvaldo, Raimundo Marques, Raimundo Coelho (sócios) que vieram e demarcaram a
área. Esses moradores que faziam parte da localidade Centenário, onde não dispunham de terras para
trabalhar e se uniram para ocuparem uma nova área para morar e cultivar a terra. A primeira família a
ocupar a nova terra foi há família Palheta, sendo a localidade ainda chamada de São Tomé. A partir de
1982, quando havia mais famílias na localidade, o Padre Edílson da Paróquia de Maués trocou o
nome antigo de São Tomé pelo nome atual de Bom Pastor.
Atualmente fazem parte da comunidade 13 domicílios e 15 famílias (Figuras 39 e 40). A
comunidade tem Coordenador (Raimundo Palheta), Vice (Dinelson Borges), Secretário (Cláudio
Pereira da Silva) e Tesoureiro (Vivaldo Vieira Machado). Para ocupar esses cargos há eleição de dois
em dois anos, quando os moradores da comunidade votam nos candidatos às funções designadas.
A igreja foi construída em 1990 pelos moradores, sendo toda em madeira, coberta de telha de
amianto, piso em cimento e bancos em madeira. Antes dessa construção os cultos eram realizados em
uma pequena casa chamada de casa de oração. O padroeiro da comunidade é Cristo Bom Pastor,
36
festejado em janeiro no último sábado do mês.
A comunidade ainda não tem posto de saúde, mas há um agente de saúde que atende aos
moradores dando-lhes alguns medicamentos cedidos pela Secretaria de saúde. Há na comunidade
uma cozinha comunitária e escola.
Figura 39 - Vista Panorâmica da Comunidade de Bom Pastor
Figura 40 – Croqui da Comunidade de Bom Pastor
37
DADOS DEMOGRÁFICOS
As informações aqui apresentadas são fruto de entrevistas realizadas com os moradores de cada
localidade que eram escritas nos formulários e das observações realizadas em campo e descritas no
diário de cada pesquisador da equipe. A escolha dos entrevistados se deu pela disponibilidade e
presença desses moradores no momento da visita do pesquisador. Foram realizadas 116 (cento e
dezesseis) entrevistas com moradores de ambos os sexos com idade na faixa etária de 19 a 78 anos de
idades. Foram entrevistadas 31(trinta e uma) mulheres, o que equivale a 27% do total de
entrevistados, mais 85(oitenta e cinco) homens representando 73% do total. A Tabela 1 mostra o
número de entrevistados (freqüência e percentual) em cada localidade visitada.
Tabela 1 – Número de entrevistados por localidade
Localidade
Santa Marta
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Tereza
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria de Caiaué
S. J. Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
TOTAL
Homens
6
4
4
2
4
13
8
5
6
2
4
14
7
3
3
85
Mulheres
1
3
2
1
5
6
4
1
3
3
1
1
31
Total de
entrevistados
7
7
6
3
9
19
12
6
6
2
7
17
8
3
4
116
Fonte: ICMBio
Numero de Pessoas por Domicilio
De modo geral em todas as comunidades prevalece a característica de formação social centrada
no núcleo familiar. É comum encontrar com moradores que afirmam não ter um conhecimento
preciso de quando seus familiares se instalaram na localidade, uma vez que esse tempo já decorre de
várias décadas e se constitui como uma informação que já não precisa ser lembrada, uma vez que esse
38
tempo é “desde sempre”.
A maior parte (60%) dos domicílios é formada por mais de 6 pessoas, de forma que essa família
se expressa pela presença de até 3 gerações numa mesma casa. Observa-se que na Tabela 2, apenas
40% dos entrevistados residem em domicílios com menos de 5 pessoas.
Tabela 2 - Distribuição de pessoas por domicílio em cada comunidade
Comunidades
Santa Maria
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria Ituiense
São Pedro
Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Tereza
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do Caiaué
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
TOTAL
%
1a3
1
1
2
4
3
1
2
1
1
2
1
19
16
4a5
3
3
1
2
1
2
3
1
2
6
3
1
28
24
6a7
1
2
3
1
3
8
2
3
2
2
1
2
2
1
33
29
8a9
1
1
3
3
2
1
1
4
1
2
2
20
17
10
2
1
1
2
2
2
2
2
16
14
TOTAL
7
7
6
3
9
19
12
6
6
7
2
17
8
3
4
116
100
Fonte: ICMBio
Mobilidade e Tempo de Moradia nas localidades
Como as localidades em questão são centradas nas famílias, estas estão radicadas no local há
vários anos. A população residente nas comunidades é praticamente fixada nela, tendo uma baixa
mobilidade. Todos os entrevistados declararam ter nascido na região do Rio Paraconi. Apenas 43%
(50 moradores) em alguma ocasião morou em lugares diferentes da atual comunidade (Gráfico 1).
39
Gráfico 1-Residência em lugares diferentes do atual
47%
53%
Não
Sim
Os motivos da residência estão associados com sua chegada ou saída do atual lugar. A saída pra
residir em outros lugares se deu principalmente por quatro motivos: casamento, trabalho, estudos,
melhores condições econômicas e esejo de conhecer outros lugares. Os locais onde os atuais
moradores residiram por um tempo foram quase que totalmente no estado do Amazonas (96%) sendo
41% nas cidades próximas, 39% nas comunidades próximas, 16% em Manaus e apenas 4% procurou
o estado vizinho do Pará. Constata-se que a mobilidade para as cidades é mais intensa (57%) (Gráfico
2).
Gráfico 2 - Locais procurados para residir em algum tempo antes da chegada ou retorno
16%
4%
Outras comunidades próximas
39%
Outras cidades próximas
Manaus
Pará
41%
40
A chegada de pessoas originárias de outros lugares se deve principalmente por motivos de
casamento com alguém do local ou busca de um lugar para trabalhar (quando desempregado no lugar
anterior ou por ser professor, agente de saúde). O retorno ao local de origem se deve exclusivamente
por motivo familiar, como por exemplo, para ficar próximo dos pais e irmãos, Destaca-se que os
moradores das comunidades em sua grande maioria (67%) estão nesses lugares há mais de 20 anos
(Gráfico 3).
Gráfico 3– Tempo de moradia dos comunitários
18%
29%
1 a 10 anos
15%
11 a 20 anos
21 a 30 anos
31 a 40 anos
19%
19%
41 ou mais
De alguma forma o tempo de existência da comunidade está associada ao tempo de
moradia da população, predominando, no entanto a permanência no lugar (Tabela 3).
Tabela 3 - Distribuição por tempo de residência no local em anos
Comunidades
Santa Marta
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
Sagrado Cor. De Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Teresa
São Tomé
Bragança
Fortaleza
<=1 a 10
anos
11 a 20
anos
21 a 30 anos
31 a 40
anos
41 ou mais
2
2
3
1
3
3
3
1
1
1
1
1
1
1
4
2
1
-
1
1
1
2
3
2
2
2
1
2
1
1
4
3
1
2
1
2
4
5
4
1
2
2
3
41
Santa Maria do Caiaué
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
TOTAL
%
1
1
21
18
1
2
1
1
17
15
3
2
1
2
22
19
4
4
1
22
19
8
34
29
Os dados obtidos nos informam que em todas as comunidades prevalece o enraizamento, ou
seja, as famílias tendem a permanecer na localidade, ou próxima dela. Essa proximidade favorece os
laços de parentesco e consolida a responsabilidade e solidariedade que os membros dos grupos
familiares devem ter uns com os outros. Esta realidade tem sido recorrente no interior do Amazonas e
de modo especial os que vivem em comunidades cujas localidades foram incorporadas por uma
legislação de Unidade de Conservação – Resex (Higuchi et al, 2006; 2008a; 2008b)3. Esse dado é
crucial para identificarmos o grau de apropriação que estes moradores possuem com o lugar,
favorecendo aspectos de mobilização em prol de uma melhoria da comunidade e também numa ação
em que se almeje um melhor uso dos recursos no caso da implementação do plano de uso e manejo
dos recursos naturais.
Situação Civil – Posse de documentos
Das 116 famílias entrevistadas nas 16 comunidades, totalizando 724 (setecentos e vinte e
quatro) pessoas, apenas 9% não possuía nenhum documento civil. Observa-se que o maior índice sem
documentos são os bebês até um ano de idade. Dos 40 bebês 18 deles não tinham o registro de
nascimento. Nos grupos de idade, vemos 57% das pessoas que não tem documento são crianças de 0
a 5 anos; 21% estão na faixa etária de 6 a 15 anos; 12% estão na faixa de 16 a 25 anos e 10% são
adultos com mais de 25 anos. Outro dado importante é que de maneira geral as crianças e
adolescentes que não possuem documento algum são provenientes da mesma família. Na tabela 4
apresentamos a distribuição desses indivíduos sem documentação formal em cada localidade.
HIGUCHI, M.I.G. RIBEIRO, M.N.L., THEODOROVITZ, I.J. Vida Social das comunidades da Resex do Baixo
Juruá-AM. Relatório Técnico. Manaus:INPA/IBAMA-ICMBio, 2006.
HIGUCHI, M.I.G. TOLEDO, R.F., RIBEIRO, M.N.L.,SILVA, K. Vida Social das comunidades da Resex Auati-Paraná,
Fonte Boa-AM. Relatório Técnico. Manaus:INPA/IBAMA-ICMBio, 2008a.
HIGUCHI, M.I.G., BRUNO, A.C., SILVA, V.R.G., SANTOS, C.H.F., SOUZA, I.L.F., SAMPAIO, C.A.,
TOLEDO, R.F., RIBEIRO, M.N.L. Vida Social das comunidades próximas e pertencentes à Resex Lago do Capanã
Grande, Fonte Boa -AM. Relatório Técnico. Manaus:INPA/IBAMA-ICMBio, 2008b
42
Tabela 4 - Moradores das localidades que não possuíam nenhum documento
Localidade/Faixa Etária
0 a 5 anos 6 a 15 anos
Santa Maria
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
Sagrado Cor. De Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Teresa
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do Caiaué
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
TOTAL
%
3
2
3
11
7
2
4
3
2
1
38
57
1
1
4
3
2
3
14
21
16 a 25 anos
1
3
1
2
1
8
12
Mais de 25
anos
1
1
1
3
1
7
10
TOTAL
4
1
2
4
19
11
4
7
1
4
5
2
3
67
100%
Observamos ainda que entre os adultos (pessoas maiores que 18 anos) a maioria, ou seja, 80%
deles possuem todos os documentos principais (RN, RG, CPF, Titulo de Eleitor e Carteira de
Trabalho). Segundo os moradores isso foi possível pela ação da Prefeitura Municipal de Maués, que
trouxe um atendimento de barco para a emissão de todos esses documentos, na gestão passada.
Escolaridade
O grau de escolarização de uma população é um dado importante nas ações futuras do órgão
gestor, uma vez que é um indicativo importante na formação dos moradores da área e sua condição
cidadã. A escolaridade dos moradores entrevistados segue uma tendência encontrada em outras
comunidades de UCs (Higuchi et al., 2006; 2007; 2008), isto é, a maior concentração é de pessoas
(51%) com escolaridade de primeiro ciclo do ensino fundamental, seguido por 25% de pessoas com o
segundo ciclo do ensino fundamental. Os níveis educacionais dos entrevistados em cada comunidade
podem ser observados na tabela 5
Tabela 5 – Distribuição dos entrevistados por nível de escolaridade nas comunidades
43
Não
Estudaram
Santa Marta
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
2
Sagrado Cor. De Jesus
Ozório da Fonseca
2
Santa Teresa
São Tomé
1
Bragança
Fortaleza
2
Sta Maria do Caiaué
3
Cacoal
1
Monte Carmelo
Bom Pastor
1
TOTAL
12
%
10
Localidade/Ensino
1º ao 5º
ano
6
3
4
1
5
6
6
2
2
3
13
3
3
2
59
51
6º ao 9º ano
1
4
2
1
1
8
2
2
3
1
2
2
29
25
Médio
Médio
Incompleto Completo
1
1
2
2
2
4
1
2
1
12
4
10
3
Superior
1
1
1
Religião
Observa-se nas comunidades uma religiosidade muito saliente, e de fato todas as comunidades
são constituídas em torno da religião e igrejas construídas na localidade. A presença da religião
católica é mais marcante, de modo que 85% das famílias entrevistadas se declararam católicas e
apenas 15% são evangélicos, batistas e adventistas.
As festas e eventos católicos se consolidaram com encontros muito importantes de reunião das
comunidades, que estão divididas em 13 setores da prelazia de Maués. Uma vez por mês os
comunitários se reúnem numa das comunidades previamente agendadas e escolhidas por meio de
sorteio em presença dos coordenadores de cada localidade para momentos de oração, culto,
planejamento comunitário, esportes e lazer.
As construções das igrejas são muito variadas, algumas são em alvenaria e outras em madeira,
mas todas são cuidadas com esmero pelos comunitários (Figura 42). Mensalmente são feitos mutirões
para a limpeza do terreno e arrumação do prédio.
44
Figura 41 - Estilos de construção das igrejas nas comunidades
INFRA ESTRUTURA DAS COMUNIDADES
Habitação
De modo geral as casas nessas comunidades são muito parecidas com as demais comunidades
no interior do Amazonas. A maioria (89%) se considera dono da própria casa, e apenas 11% diz estar
vivendo numa casa que lhe foi cedida ou doada por familiares ou em alguns casos construída e cedida
pela comunidade para favorecer o morador que se encontrava com dificuldades econômicas ou com
problemas para construir a casa (Gráfico 4).
Gráfico 4– Tipo de posse da casa onde a família reside
11%
Casa própria
Casa cedida por parentes ou
comunidade
89%
A organização espacial das sedes comunitárias (local onde estão concentrados a igreja, escola e
centro social) segue um arranjo linear, muito similar à disposição urbana. As casas são normalmente
construídas de frente para o rio, salvo aquelas em que são construídas um pouco distantes do curso
principal. A grande maioria das casas nas comunidades tem sua construção básica feita de madeira,
45
mas já surgem algumas construções em alvenaria Os telhados das casas são feitos em palha e algumas
já apresentam cobertura de alumínio ou amianto (Figura 42).
Figura 42- Arranjo espacial das residências e tipo de construção
Observa-se que (93%) das casas residenciais são feitas em madeira, outras 3% estão sendo
ampliadas com tijolo e 2% das casas já estão sendo construídas em alvenaria. Entretanto, percebe-se
que 2% dos moradores ainda residem em casa bastante rústicas, sendo parcialmente abertas, com um
cômodo fechado com palha e chão batido (Gráfico 5).
Gráfico 5– Tipo de material usado nas casas
3%
2% 2%
Madeira
Tijolo e Madeira
Alvenaria
Palha
93%
Daqueles que consideram que moram em casa própria, em sua maioria (64%) admitem que
fizeram a casa com seus recursos econômicos e laborais, já 23% diz que obtiveram ajuda dos
46
familiares, e 13% contaram com ajuda econômica de órgãos públicos (Gráfico 6).
Gráfico 6– Origem dos recursos despendidos na construção da casa
24%
Próprio
13%
63%
Público
Familiar
Em se tratando da terra, isto é, da área geográfica em que moram, os entrevistados reconhecem
pelo menos quatro formas de aquisição ocorridas no histórico de sua moradia. A mais freqüente na
memória dos entrevistados é que a terra foi adquirida por meio da família (66%), outros 21% dizem
ter amigos lhes deram a terra num dado momento que vieram morar na localidade; 9% relataram que
compraram a terra por algum montante em dinheiro ou troca de propriedade, e 4% dizem ter chegado
e se instalado na área em que moram pois consideravam como “terra sem dono” (Gráfico 7).
Gráfico 7- Forma de aquisição da terra onde vivem
9%
4%
Familia
21%
Amigos
66%
Compra
Ocupação Espontânea
47
Entre os entrevistados constatou-se que 41% deles dizem ter algum documento de posse, sendo
o mais comum o formulário do Imposto Territorial Rural (ITR) emitido pelo Incra, que esses
moradores pagam anualmente, ou um recibo de compra emitido pelo morador anterior, que em alguns
casos é feito em cartório. Pelo menos um morador alega ter título de propriedade. Já 59% reconhecem
que não tem nenhum documento de legalização de propriedade sobre a área em que vivem.
Arranjo Interno das Casas
As residências possuem um arranjo interno bastante diversificado, mas de forma geral seguem
modelos culturais perceptíveis noutras comunidades do Amazonas. Observa- se que nas casas são
muito reduzidos os móveis manufaturados. A grande maioria das casa são divididas em duas partes,
uma parte fechada para o quarto, normalmente um apenas e um salão que é dividido pelos móveis,
sendo nos fundos a cozinha e na parte da frente a sala. Na sala geralmente existe uma mesa ou
máquina de costura para apoiar a TV,, ao lado desta uma estante de madeira para se colocar objetos
como jarro de flores artificiais, troféus, rádio, e livros escolares (Figura 43). Observa-se que os livros
são objetos de grande consideração para os moradores e estes além de representarem valores
simbólicos de escolarização, são elementos materiais de status social, onde os moradores se
distinguem entre si a partir da quantidade de livros que dispõem.
48
Figura 43– Disposição de móveis na sala
Na cozinha encontra-se o fogão a gás que é usado apenas eventualmente, uma vez que é comum
usar-se um “fogãozinho” de barro que é feito artesanalmente por algumas comunidades do Rio
Paraconi. Na cozinha os moradores costumam guardar tanto os utensílios domésticos como
mantimentos. As panelas são penduradas na parede e cuidadosamente areadas de modo que brilham
muito. O uso do pote de barro é utilizado para armazenamento de água para beber. Nos quartos estão
fixadas as redes dos adultos e crianças que durante o dia ficam enroladas para possibilitar melhor
locomoção e a noite as redes são estendidas no vão interno da casa. As roupas ficam dispostas em
prateleiras, ou ainda penduradas num varal interno ou nos pregos das paredes (Figuras 44 e 45).
Figura 44 - Uso do fogãozinho a carvão e fogão a gás na cozinha
49
Figura 45 – Disposição interna dos utensílios domésticos e redes
Observa-se que os arranjos internos das unidades domésticas começam gradualmente a se
parecerem com ambientes urbanizados e a quantidade de objetos manufaturados e industrializados é
também significante (Figura 46)
Figura 46 - Objetos industrializado e manufaturados de uso dos moradores
50
Tabela 6 - Composição de domicílios, instituições, organizações e estabelecimentos comerciais nas comunidades
Comunidades Reconhecidas pelos
entrevistados
Localização
Domicílios Escolas
Posto de
Campos de
Igrejas
Saúde
Futebol
Centros
sociais
Telefones e
outros
Limites da FLONA
FORA -Lago do Elias Margem Direita do Urariá
Santa Marta
Frente São Jorge
Vilanova
FORA -Margem Esquerda do Paraná Urariá
FORA -Margem Esquerda do Paraná Urariá
Sta. Maria de Ituiense
São Pedro
FORA - Margem Esquerda do Paraná Urariá
Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Tereza
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do Cauaué
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
FORA -Margem Direita do Paraná Urariá
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO - Margem Direta do Rio Paracuní
DENTRO – Margem Esquerda do Rio Paracuní
FORA – Margem esquerda do Rio Paraconi – Rio Miriti
FORA – Margem Direita do Rio Paraconi – Rio Peixinho
TOTAL
(*) Centro comunitário e escola.
(**) Tem aparelho telefônico, mas inoperante na época da visita.
Estabelecimentos
comerciais: (A) Bar
(B) Comércio
10
12
10
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
2
1
4
22
1
-
1
1
1
1
2
-
18
12
10
7
4
11
27
13
7
8
175
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
14
1
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
15
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
15
3
1
1
1
1
1
1
1*
16
1
1**
1
1
1**
5
1B
1A
1B
1A
1B
1B
6
51
Transportes
O transporte entre comunidades e entre moradores da mesma localidade é basicamente fluvial
usando-se canoas a remo (Figura 47) ou “rabeta” - adaptação de um motor de polpa na parte traseira.
Observa-se a precariedade do transporte familiar e comunitário e até mesmo o transporte
intermunicipal. O barco de linha para Maués chamado pelos moradores de “recreio” entra pela
“boca” (entrada) do rio Paraconi indo até a comunidade Ozório. Dependendo do número de
passageiros os barcos adentram mais ou menos nos rios. Esse transporte é normalmente feito uma vez
por semana.
Figura 47 – Tipo de embarcação para deslocamento de pessoas e produção
Algumas comunidades possuem transporte próprio, como é o caso de Caiaué que a Associação
Transmacurapá comprou um barco para o deslocamento de pessoas e escoamento da produção
agrícola e extrativa. A Associação Transmacurapá é formada por moradores associados de maioria
em Caiaué e organizada hierarquicamente, legalizada com CNPJ e se mantém graças às mensalidades
dos associados. A aquisição de dois barcos (Atransmacurapá e o Jave Nissi) foi possível com auxílio
de verba pública (Figura 48). O deslocamento dos comunitários é relativamente alto e observa-se que
famílias inteiras costumam se deslocar para a cidade de Maués ou Nova Olinda. Esse fluxo aumenta
consideravelmente no final do mês quando os benefícios e salários são pagos aos trabalhadores. É
comum os moradores pegarem carona com os barcos que costumam trafegar pelos rios pela falta de
uma regularidade dos barcos de linha.
O transporte escolar é aos alunos é feito por barcos que são contratados pela Secretaria de
Educação Municipal. De modo geral esses barcos não são criteriosos no sentido de proporcionar
todos os requisitos básicos de segurança aos alunos. Com as atuais exigências os prestadores de
serviço estão preocupados, pois dizem não ter condições financeiras para atender as exigências
(coletes salva vidas e outros itens de navegação).
52
Figura 48 - Tipo de embarcação comunitária e de transporte escolar
Energia
Nenhuma das comunidades havia energia elétrica provida pelo programa “Luz para Todos” do
Governo Federal. Constatou-se que 50% dos moradores entrevistados não possuem energia elétrica,
43% fazem uso do gerador comunitário e 7% fazem uso de gerador de energia particular (Gráfico 8).
Gráfico 8– Tipo de energia elétrica utilizada pelos moradores
13%
47%
Não tem
40%
Gerador Comunitário
Gerador Particular
Observa-se que em algumas comunidades há uma concentração de moradores e por estarem
situados na sede comunitária, estes se beneficiam com o gerador comunitário, mas aqueles que
moram distantes da sede fazem uso de um gerador particular. Os geradores são fixados normalmente
na sede comunitária e a uma certa distância das casas devido o barulho que eles produzem quando
ligados (Figura 49).
53
Figura 49 - Casas de abrigo do gerador de energia
Nas comunidades os horários e duração são decididos pelos próprios moradores que além de ter
iluminação noturna, o objetivo principal é para assistir TV. É comum nos dias de semana o gerador
ser ligado nas primeiras horas da noite, quando todos aproveitam para assistir TV e acompanhar o
Jornal Nacional e novelas da Rede Globo. Nos fins de semana o horário freqüente é na parte da tarde
para assistir o Domingão do Faustão e jogos de futebol. Porém esses horários ficam na dependência
da disponibilidade de diesel para o funcionamento do gerador.
De modo geral o diesel necessário para funcionamento do gerador é comprado por todos os
moradores num sistema de cotas. A cota varia, sendo a compra comunitária ou cada família
contribuindo mensalmente comprando o diesel. Na comunidade de Bragança, por exemplo, não há
gerador de energia nem particular nem comunitário (Tabela 7)
Tabela 7 - Distribuição do tipo de energia nas diversas comunidades
Localidade/Uso de Energ.
Elétrica
Santa Marta
Frente São Jorge
Vila Nova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Tereza
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do Caiaué
Cacoal
Monte Carmelo
Não tem
Gerador
Comunitário
Gerador
Particular
5
2
3
1
2
12
5
4
4
2
1
9
5
1
4
3
2
7
7
7
1
1
5
8
2
2
2
1
1
1
1
1
1
-
54
2
58
Bom Pastor
TOTAL
1
50
1
8
Muitos moradores que não tinham energia elétrica disponível em suas casas era pelo fato de
estarem distantes do gerador e não tinham dinheiro para comprar fios elétricos para chegar à sua casa
ou em alguns casos porque o gerador não tinha capacidade motriz (potência) para produzir mais
energia e distribuir para outras casas. Essas famílias fazem uso de lamparinas, candeeiros e lanternas
para se guiar na escuridão da noite ou desenvolver alguma atividade.
Constata-se que os moradores de modo geral estão cada vez mais dependentes do óleo diesel,
seja para produção de energia ou transporte. Com o incremento da renda o consumo de óleo diesel
aumenta proporcionalmente. O uso de gás para cozinha também passa a ser um produto de larga
necessidade, mesmo tendo alternativas de uso como o carvão, que também vem sendo
gradativamente incorporado para uso nos fornos para farinha e nos pequenos fogões de barro para
cozinhar alimentos. Alguns moradores já fazem do carvão uma atividade que gera renda para a
família. Há indícios de um provável aumento na produção de carvão vegetal, substituindo a madeira
usada como lenha para fogo (Figura 50)
Figura 50 – Fabricação e comercialização de carvão vegetal
Meios de Comunicação
De modo geral o meio de comunicação mais intenso é o uso do rádio, tanto para ouvir notícias,
recados, mensagens religiosas ou para ouvir música. O programa Voz do Brasil, Bicho do Mato e
Fala Governador são os programas mais citados. As estações de rádio mais ouvidas dependem da
antena e capacidade do aparelho, mas há uma preferência para a Radio Cultura, Radio Difusora de
Itacoatiara e Rádio Local de Maués. Os rádios são usados com pilhas, raramente são usados rádios
movidos a energia elétrica. Os que moram, vão ou estão na cidade enviam suas mensagens aos que
permanecem na comunidade via programas de rádio.
55
A Televisão exerce o maior fascínio para todos os moradores, os quais costumam se reunir ou
no centro comunitário ou numa das residências para compartilharem a apresentação de um programa.
Homens, mulheres e crianças dividem a atenção nos mais variados programas, porém o Jornal
Nacional, novelas e jogos de futebol são campeões de audiência. Programas de auditório (Domingão
do Faustão e BBB) são também favoritos por todos.
Apenas 17%, ou seja, em 20 residências, os moradores dizem não usar nem rádio nem
Televisão, justificando que não possuem esses aparelhos. Os que não possuem TV em casa, assistem
nas casas dos vizinhos ou na comunidade, de modo que a TV agrega encontros de todos para
assistirem os programas selecionados enquanto o gerador estiver ligado
Além desses aparelhos de comunicação os moradores fazem uso incondicional dos recados e
mensagens escritas ou faladas que são levadas pelos barcos que trafegam em frente à comunidade. É
comum também o uso do telefone que possuem na comunidade, ou nas comunidades próximas.
Percebe-se um grande cuidado com esse aparelho público, devido a grande utilidade que este tem
para todos os moradores. É comum haver uma cabine bem cuidada em torno desse aparelho e a
supervisão constante de um morador ou liderança comunitária para se certificar que todos estejam
zelando pelo telefone (Figura 51).
Figura 51 - Proteção de cuidado aos aparelhos de telefone público em Vilanova
Ao contrário dos cuidados dispensados pelos moradores aos aparelhos de telefones, as
mantenedoras deste serviço de comunicação raramente retornam às comunidades cujos aparelhos
apresentam problema. Dentre as cinco comunidades visitadas que possuíam o aparelho, antena e
sistema de energia solar da Embratel, apenas 2 apresentavam condições de uso. Vale acrescentar que
os telefones são a mais eficiente maneira de reduzir os riscos e problemas enfrentados pelos
moradores. O telefone é análogo a um atendimento de emergência que salva vidas e dá conforto aos
moradores.
Para se comunicar entre as moradias ou com comunidades próximas as crianças e jovens são os
56
mensageiros que se deslocam com grande destreza pelos rios e lagos, usando suas canoas a remo ou
ainda usando motor de rabeta (Figura 52).
Figura 52 - Uso de canoas pelas crianças entre as unidades domésticas
Destino de resíduos e saneamento
Observa-se um padrão de consumo bastante urbano sendo introduzido nas comunidades. O tipo
de descarte, que até pouco tempo era quase exclusivamente orgânico, já é considerável a presença de
resíduos inorgânicos. A quantidade de plásticos, PETs, pilhas, e latas é considerável. Os plásticos
advêm das embalagens dos produtos alimentícios, da mesma forma que latarias. Esta ultima tendo sua
origem principalmente da merenda escolar, que envia os fiambres e conservas às escolas. As pilhas
são amplamente usadas para as lanternas e rádios utilizados intensamente pela população. O alto
consumo de PETs tem sua origem nos refrigerantes consumidos com uma freqüência muito alta. Os
vidros são de garrafas, principalmente de aguardente vendidas pelos regatões ou pelo comercio
interno. Embora os moradores não utilizem tanto papéis como na cidade, percebe-se que restos de
cadernos, de livros escolares e algumas folhas de revistas perambulam com o vento entre as casas.
Embora muitos já expressem uma preocupação com determinados tipos de resíduos, a maioria
convive com os lugares aonde vão sendo depositados tais resíduos. Há, entretanto, uma diferenciação
de descarte em função do tipo de resíduo (Figura 53)
57
Figura 53 – Lixo acumulado e queima de resíduos
Os resíduos orgânicos como restos de comida, por exemplo, são sempre dados aos animais
para consumirem, quando estes sobram da alimentação diária. Já as cascas de frutas são comumente
jogadas num local onde se acumula o lixo, ou então ficam espalhadas no quintal até apodrecer
favorecendo a proliferação de insetos e não raro atraindo outros animais silvestres. Este é o
comportamento mais freqüente (61%) em relação às cascas de frutas. Já 34% dos entrevistados
admitem queimar quando estão secos. Os demais 5% declaram que dão aos animais ou fazem adubo
depois de deixarem num buraco como se fosse uma composteira. As folhas secas são quase
unanimemente (91%) varridas e depois queimadas. Estas são consideradas sujeiras que caem das
árvores próximas às casas, por isso mantêm limpas. Para evitar que essas folhas se espalhem
novamente, é feita a queima em todas as comunidades. Apenas 9% admite que junta as folhas num
monte e deixa apodrecer longe da casa. Os restos de madeira ou móveis quebrados são reutilizados
em outros objetos como canteiros suspensos de temperos, fazem remo, e quando não podem ser mais
usados queimam como lenha.
Após serem reutilizados à exaustão os resíduos inorgânicos como plásticos são queimados
pela maioria (76%) dos moradores, ou então são enterrados num buraco (usualmente a fossa das
casinhas) por 15% dos moradores; outros 9% dizem jogar na água ou na mata. As garrafas PETs
seguem o mesmo destino. São amplamente reutilizadas para acondicionamento de combustível
(diesel, gasolina). Usa-se ainda como depósito de água ou outro produto extraído da mata (óleo, mel).
Em alguns casos as mulheres usam para artesanato. Depois do uso intenso esse material é queimado
junto com outros objetos residuais no quintal das casas. Os vidros (potes e garrafas) ganham destino
diferenciado, quando não são vendidos ao barco de sucatas, estes são depositados em buracos da
fossa, uma vez que representam um perigo quando quebrados (Figura 54).
58
Figura 54 - Depósito de garrafas para evitar riscos
As latas e panelas de alumínio são achatadas e vendidas por preços irrisórios ao barco de
sucatas (Figura 55). Essa atividade é amplamente utilizada pelas crianças, cuja renda lhes permite
comprar salgadinhos e outras guloseimas. Dentre todos os resíduos nenhum é tão pernicioso e
preocupante como as pilhas usadas para lanternas e rádios. Percebe-se uma prática duvidosa de
descarte desse material, principalmente aquela, que segundo os moradores foi disseminada pela
campanha da fraternidade da igreja Católica, que era de enterrá-las ao pé das bananeiras, uma vez que
estas matariam as pestes comuns que atacam a banana. Outros expressam um maior entendimento do
perigo existente no descarte das pilhas, por isso dizem enterrar num buraco ou jogá-lo na fossa. Uma
boa parcela dos moradores admite que joga as pilhas no quintal, na mata ou no rio, porém coloca-as
dentro de um plástico, que equivocadamente acreditam que diminua o problema de contaminação.
Figura 55 - Panelas de alumínio achatadas para venda e pilha descartada no quintal
Entre todos os hábitos de descarte inapropriado dos resíduos, os moradores expressam uma
59
preocupação muito superficial e percebe-se que apesar de falarem dessa preocupação, as ações de
cuidado são mínimas. Alguns fazem um esforço para manterem lixeiras próximas da casa par depois
jogá-los num buraco distante ou então queimá-los, mas o que se vê é um crescente acúmulo de lixo
próximo das casas, nos barrancos dos rios e na floresta (Figura 56).
Figura 56 - Acúmulo de lixo nos barrancos dos rios e lixeiras domésticas
Pelo menos 31% dos moradores expressam uma preocupação com os resíduos plásticos;
seguidos por 23% que se preocupam principalmente com a poluição e sujeira na comunidade e nos
rios; 19% centram sa preocupação no crescimento do capim ou mato no perímetro da comunidade,
que deixa uma aparência de desleixo dos que lá residem, desvalorizando a localidade e a todos que
vivem lá. As pilhas que são descartadas com descuido mostram que a preocupação dos moradores é
insignificante, ou seja, apenas 7% deles demonstra alguma preocupação com elas; As fezes de
animais, vidros e latas somam 5%. Os demais 15% dos entrevistados dizem não estarem preocupados
com o lixo produzido pelos moradores (Gráfico 9).
60
Gráfico 9– Preocupação dos moradores em relação resíduos produzidos na comunidade
2%
7%
31%
23%
Plásticos
Mato/Capim na comunidade
Vidros e latas
Não tem preocupação
15%
3%
19%
Sujeira na comunidade
Pilhas
Fezes de animais
Os motivos da preocupação com cada um desses tipos de resíduos segue uma lógica
funcionalista de cuidado. Por exemplo, o resíduo que desperta maior atenção, o plástico, é motivo de
preocupação pelo fato de ser um perigo aos animais, que por descuido podem engolir e vir a morrer;
porque deixa “sujo”, “feio” ou “bagunçado” o ambiente; pode prejudicar os peixes na água; porque
é proibido pelos órgãos gestores; o plástico junta doença; pode acumular água e virar criadouro do
mosquito da dengue; demora muito para acabar.
A preocupação em torno da sujeira da comunidade agrega motivos que possam favorecer a
disseminação de doenças, atrair animais peçonhentos, insetos e urubus; poluir as águas dos rios
próximos. Mas o principal motivo é a apresentação da comunidade como aspecto de higiene e
organização social, pois a sujeira “deixa a comunidade feia”. Deixar o capim ou mato crescer na
sede da comunidade é uma preocupação muito parecida com a sujeira acumulada. O capim pode
servir de esconderijo de cobras e outros animais que são perigosos às pessoas, principalmente para as
crianças. Essa vegetação rasteira favorece ainda a criação de formigas, mosquitos, micuins,
carrapatos e outros que tornam a vida dessas pessoas, em determinadas estações, insuportável. Outro
aspecto diz respeito à apresentação da comunidade, que segundo a opinião dos moradores, deve estar
“limpa”, ou seja, cuidadosamente capinada e varrida. Deixar o capim crescido “deixa a comunidade
feia e poluída”.
Entre os moradores que se preocupam com o descarte das pilhas há um motivo único, ou seja,
todos se preocupam com o “veneno” da pilha, ou com o “produto químico que pode contaminar a
água, a terra e as pessoas”. Com os vidros e latas o principal risco na opinião daqueles que se
61
preocupam com isso é das crianças ou as pessoas se machucarem ou se cortarem com os cacos ou
latas enferrujadas.
Para os moradores que declararam não ter preocupação com o lixo ou descarte de resíduos
está baseado na justificativa de que a comunidade por enquanto não tem quantidade de lixo como na
cidade.
O saneamento em boa parte das comunidades é bastante precário ou inexistente. É bastante
comum, ou seja, 96% dos moradores fazerem suas necessidades fisiológicas em casinhas construídas
próximo à casa. Essas casinhas são feitas de madeira e com a fossa. Em muitos casos a casinha é
compartilhada por membros da mesma família de várias casas, ou ainda, a comunidade constrói o
sanitário para uso comum de boa parte dos moradores (Figura 57). Apenas 4% dos entrevistados
admitem usar a mata para fazer suas necessidades.
A água servida na cozinha para lavagem de utensílios domésticos é despejada displicentemente
pela janela, formando uma lama que exala um mau cheiro e se espalha no quintal. Os animais criados
no quintal como galinhas, patos, porcos e cães acabam por beber dessa água e também são os
responsáveis pela sujeira que se espalha por debaixo das casas e se alonga no terreno todo.
Figura 57 - Tipo de sanitário – “casinha”
Abastecimento e uso da água
Apenas quatro (4) comunidades tem poço para abastecimento de água (Frente São Jorge,
Ozório da Fonseca, Santa Maria de Caiaué e Fortaleza) que foram feitos com recursos públicos seja
da Prefeitura de Maués ou pela Funasa (Figura 58).
62
Figura 58 - Sistema de abastecimento de água construído pela Funasa
Apesar de que várias comunidades já terem todo o equipamento e a escavação feita pela
anterior administração municipal de Maués. Pelo tempo deixado sem concluir, a fonte de água já
encontrada acabou secando. O abastecimento da água, na ausência do poço, é feito exclusivamente do
rio ou igarapé próximo, e nesse caso as crianças são os principais agentes de abastecimento doméstico
(Figura 59).
Figura 59 – Abastecimento de água do rio e acondicionamento em caixas d’água
Na época de chuvas alguns moradores acondicionam a água em camburões para uso geral.
Mesmo com poço tubular na sede da comunidade, apenas as famílias que moram próximo são
beneficiadas, uma vez que vários domicílios se localizam em locais distantes da sede. Outro motivo
está no abastecimento dos tanques (caixas d’água) para distribuição às unidades domésticas. O
problema não está no defeito da bomba, mas na ausência de combustível para o gerador, que muitas
vezes os moradores não tem dinheiro para comprar o diesel.
63
Dos entrevistados, 17% (20 moradores) se beneficiam de poço tubular feito na comunidade. Os
demais 83% dependem totalmente da água do rio ou igarapé para beber e usar em suas atividades de
limpeza doméstica, lavagem de roupa e higiene corporal (Gráfico 10).
Gráfico 10– Origem da água de beber
17%
Poço comunitário
Igarapé
83%
A água captada pelo poço traz uma satisfação sem igual aos moradores da comunidade, pois
além de constatarem uma melhora substancial nas diarréias e outros males nas crianças e adultos, o
poço diminui o árduo trabalho de subir e descer os barrancos para trazer as latas de água para casa.
Todos que utilizam a água de poço relataram que a água é “muito boa”, tem “outro gosto”, “é
branquinha e clara”; “é limpinha” e “é gosto de água mesmo”.
Já os que tomam água do rio ou do igarapé parecem estar acostumados com a rotina de beber
aquela água e 62% dizem que a água é boa, mas 38% reclama que a água não é boa, pois “tem muita
lama”, “ é suja”, “na seca dá muita doença nas crianças”, “tem muita coisa suja, até sujeira das
necessidades das pessoas...”; “é a única que temos pra matar a sede”; “as vezes tem
microbiozinhos...”; “dá dor de barriga” ou “estamos acostumados. Para melhorar a qualidade da
água os moradores costumam coar, ferver e aplicar o bactericida (hipoclorito de sódio) que é
mensalmente disponibilizado pelos agentes de saúde. Em muitos casos os frascos acabam antes da
próxima visita e assim os moradores apenas coam a água. Para evitar ficar sem o bactericida alguns
moradores dizem “economizar”, ou seja, aplicam menos gotinhas para uma mesma quantidade de
água. Apesar de ser um hábito saudável, constata-se que esse uso não é seguro o bastante devido as
proporções de hipoclorito para a quantidade de água, pela falta de precisão na aplicação, uma vez que
estes dizem “coloco algumas gotinhas de cloro” sem se dar conta que a quantidade de gotinhas
64
depende da quantidade de água.
A água usada para cozinhar é invariavelmente a do rio ou igarapé. Nesse caso, como irá ferver,
os moradores costumam usá-la diretamente, apenas coando na época da seca, quando tem mais lama
ou resíduos.
Todos os moradores, de forma unânime usam as águas dos rios e igarapés para higiene pessoal.
O banho é feito em cima de um trapiche, construído rusticamente pela família ou grupo de familiares
para uso comum (Figura 60). As mulheres e homens se alternam nos horários de banho. As crianças
pequenas se banham com a presença da mãe ou irmãos mais velhos. Esse momento é mais um
momento de brincadeira do que de higiene.
Figura 60 - Hora do banho no rio – higiene e lazer
Apesar de haver um horário mais comum, como o de da manhã e no cair da tarde, o banho pode
ser tomado a qualquer momento, principalmente pra se refrescar do calor, ou antes de sair para uma
atividade social com outros moradores. As crianças se banham antes de ir à escola, logo cedo, quando
o dia começa. Na hora do banho, aproveita-se para escovar os dentes, pelo menos uma vez por dia.
Nota-se, entretanto que a escovação ainda é precária e esporádica seja entre os adultos, jovens ou
crianças. Isso fica visível na quantidade de adultos sem dentes, ou com cáries à mostra. As crianças
pequenas também exibem uma dentadura já comprometida pelas cáries.
A água é sem dúvida o elemento mais importante para esses moradores. Dela são retiradas
muito além das condições necessárias e suficientes para sua sobrevivência física. A água é um
elemento simbólico da cultura e identidade desse povo cujo rio é a própria vida do ribeirinho. A água,
no entanto não possui apenas aspectos agradáveis, mas exprime também sofrimentos de uma vida de
dificuldades para essas pessoas. A percepção da água, como elemento de uso nos indica formas de ver
o mundo com limitações. O valor da água na vida dos moradores dessas localidades é largamente
reconhecido como fator de interesse sanitário, tanto para a prevenção como para disseminação de
doenças.
65
SOCIOECONOMIA
A base da economia dessas famílias é a terra, a água e a floresta, tal como as demais populações
tradicionais. Essa fonte é respeitada por todos e há um reconhecimento da dádiva oferecida pela
natureza, entretanto alguns moradores começam a introduzir necessidades próprias das culturas
urbanas de redução do trabalho físico e maior conforto nas tarefas de produção rural. De modo geral,
essas pessoas tem conhecimento de algumas tecnologias simples que podem ser introduzidas nas suas
atividades e percebem as dificuldades que tem em adquiri-las, seja pelo custo ou pela capacitação
operacional das mesmas. Em muitos casos este é o motivo pelo qual queiram se mudar do interior
para a cidade, pois na cidade não teriam que “suar tanto”.
Os moradores dessas localidades ribeirinhas atuam em diversas frentes de trabalho que mudam
de acordo com a época do ano, obedecendo a sazonalidade (chuva e seca) e ciclo das águas (cheia e
vazante). Ao caracterizar a ocupação dos moradores dessas localidades, percebe-se que todos se
denominam a partir da atividade exercida, ou seja, fazem roça, pescam, caçam, praticam o
extrativismo vegetal, cultivam produtos agrícolas e criam uns poucos animais. Desse modo dizem
que são agricultores.Outros já assumem atividades assalariadas como professores, agentes de saúde,
ou auxiliares da escola. Mesmo assim não deixam de assumir sua condição de vida ribeirinha. As
mulheres e homens se dividem no tipo de trabalho executado, de modo que os homens se encarregam
de atividades que exige maior força física. É comum a participação da família toda em qualquer
atividade, porém cada membro fica com uma parte do trabalho. Essa divisão é feita em função do
gênero e idade. As crianças estão sempre envolvidas com alguma atividade, e a partir de 5 anos já se
observa essas atribuições dadas pelos pais aos filhos. As meninas se ocupam com tarefas mais
domésticas, enquanto que os meninos tendem a seguir o pai na pesca, caça ou na feitura da roça. Essa
participação não é contestada pelas crianças, ao contrário, é um momento de recreação e grande
satisfação para elas. Na colheita todos participam sem distinção.
A jornada de trabalho não segue um padrão rígido de horário, mas é organizada de acordo com
a atividade a ser desenvolvida. Tal tarefa é modificada diante de qualquer mudança do tempo, ou seja,
caso chova raramente essas pessoas saem de casa. Uma rotina de trabalho para os homens que vão
para a mata em busca de produtos da floresta é feita normalmente com outros moradores. Em muitos
casos os homens acampam na mata por alguns dias até terminarem a tarefa, visto que voltar para casa
seria muito cansativo pela distancia em que se embrenham na mata.
Na época de horário escolar as mulheres costumam acordar antes das 7 horas da manhã, quando
inicia a aula. Nas férias, esses horários se estendem um pouco mais, esperando o sol aquecer o
ambiente. Nos dias de chuva as janelas da casa demoram um pouco mais de tempo para serem
abertas. O motivo cultural de se manter na rede é reproduzido por questões funcionais também, tendo
66
em vista que não se tem onde ir e o que fazer fora de casa. Com a chuva tudo se protela, o tempo pára
e o corpo assume essa postura de recolhimento.
Atividades econômicas – renda familiar
Os moradores das localidades dentro da Flona de PR e das localidades no entorno vivem
basicamente da renda advinda da produção rural para a subsistência e renda familiar. O quadro 1
mostra o tipos de produtos citados pelos entrevistados.
Quadro 1 – Produtos citados pelos entrevistados como base da economia e subsistência familiar
Tipo
Extrativismo
Frutas Perenes
Caracterização
Castanha, Guaraná, Seringa, Mudas de Pau Rosa, Madeira,
Açaí e Copaíba
Banana
Açaí, Limão, Abacaba, Cupuaçu, Ingá, Caju, Maracujá,
Acerola, Taperebá, Graviola, Jenipapo, Laranja, Biribá,
Frutas da Época
Cacau, Goiaba, Tucumã, Puxuri, Mamão, Pupunha,
Tangerina, Jaca, Manga, Abacate, Abacaxi(ananá),
Uixi(liso e coroa), Carambola, Murici, Jambo e Mari-Mari.
Tomate, Maxixi, Cebolinha, Couve, Pimentão, Feijão,
Hortaliças/Legumes
Gerimum, Cubiu, Alface, Repolho, Coentro, Pequiá,
Cheiro Verde
Tatu, Paca, Veado, Catitú, Anta, Mutum, Jacamim, Jaboti,
Caça
Cotia, Capivara, Guariba, Cabeçudo, Nambu, Jacu,
Cujubim, Onça, Tucano, Papagaio
Jaraqui, Tucunaré, Pacu, Sardinha, Mapará, Acará,
Peixes
Curimatã, Branquinha, Charuto, Matrinxã, Cará, Traíra,
Piranha, Aracu, Surubim, Aruanã, Tambaqui, Pirarucu,
Pescada, Peixe boi, Jacunda.
Produtos do Roçado
Batata, Cará, Verdura e Melancia.
Criação de Animais
Aves, Bovino, Suino, Ovino e Equino
67
Esses produtos representam níveis diferenciados de renda em épocas distintas no ano, as quais
dependem do ciclo das águas e chuvas. A Tabela 8 apresenta o grau de renda familiar tendo como
base os produtos extraídos da natureza e vendidos para compradores que levam a produção para
cidades e em casos excepcionais para comunidades vizinhas ou compradores eventuais que trafegam
os rios.
Tabela 8 – Produção econômica e grau de renda familiar
Local /
Produto
Santa Marta
Frente São Jorge
Vilanova
Sta Maria de
Guaraná
Castanha
Farinha
Madeira
Frutas
Peixes
Criação de
animais
***
***
***
**
**
**
**
**
**
**
*
**
*
**
**
**
*
**
*
-
**
**
*
***
**
**
-
*
*
**
***
**
**
**
*
*
*
**
**
**
**
**
*
*
*
**
*
**
*
*
*
*
*
*
**
*
**
**
**
*
-
**
**
*
**
*
-
***
*
*
-
*
-
-
*
**
*
*
***
*
-
*
-
-
Ituiense
São Pedro
Sagrado
Coração
de Jesus
Ozório da
Fonseca
Santa Teresa
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do
Caiaué
São João do
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor
Legenda: (***) grau alto de renda; (**) grau médio de renda; (* ) grau baixo de renda
Além da produção extrativista e agropecuária, muitos moradores desenvolvem serviços
assalariados e executam atividades que lhes rendem uma renda extra, porém não constante. Algumas
comunidades se valem do artesanato que é vendido na época da pesca esportiva, quando trafegam
pelos rios muitos turistas. Da mesma forma é a produção artesanal de utensílios domésticos que
fazem com o barro como pequenos objetos de decoração, potes, panelas e “fogãozinhos” (Figura 61).
68
Figura 61 - Utensílios domésticos feitos de barro
De todos esses utensílios, o “fogãozinho” (uma espécie de churrasqueira em miniatura) é
amplamente procurado e muito utilizada pelos moradores das comunidades, pois substitui o fogão a
gás. Neste fogãozinho bastam alguns pedaços de carvão e o fogo é feito para aquecer a água ou
cozinhar alimentos. Os serviços públicos relativos à escola, saúde e gestão ambiental tem sido uma
fonte constante para alguns moradores, mas essa renda não impede que estes continuem a atividade
costumeira de extrativismo e agricultura. Percebe-se que essas atividades dão uma grande segurança
ao morador que terá, todo final do mês, a garantia de um dinheiro para os gastos que necessita. No
quadro 2 estão descritos esses serviços mais comuns relatados pelos moradores.
Quadro 2 – Discriminação de serviços desenvolvidos nas localidades
Tipo
Caracterização
Serviços assalariados
Agente de saúde, Transporte escolar, Serviços Gerais da Escola, Vigia de
Escola, Observador Hídrico (CPRM) e Professor.
Serviços eventuas
Serralheria, Empreitada em roçado, Prático dentista e curandeiro, Costura,
Batelão (calafetar barco); Artesanato (cestos de cipó), marcenaria (remos,
pequenos objetos), Confecção de Fogãozinho de barro, panelas de barro,
potes de barro, produção de Vassouras, Produção de Carvão
Além dos serviços que geram renda mensal, muitas famílias contam com os auxílios referentes
à aposentadoria e Bolsa família, programas do Governo Federal. A Tabela 9 apresenta esses
rendimentos em cada comunidade. Muitas famílias expressam frustração por ainda não terem
recebido o benefício da Bolsa Família, que dizem já ter se cadastrado.
69
Tabela 9 – Renda sobre Benefícios recebidos pelos moradores em cada localidade
Localidade/Benefícios
Pensão e/ou
Aposentadoria
Bolsa
Familia
Santa Marta
1
3
Frente São Jorge
1
5
Vilanova
1
2
Sta Maria de Ituiense
1
-
São Pedro
3
3
Sagrado Coração de
Jesus
4
6
Ozório da Fonseca
2
2
Santa Teresa
2
-
São Tomé
2
-
Bragança
-
-
Fortaleza
2
3
Santa Maria do Caiaué
6
6
São João do Cacoal
2
-
Monte Carmelo
-
-
Bom Pastor
-
-
26
30
Total
Outro
2 Auxilio
Saúde
A renda obtida é costumeiramente utilizada para aquisição de bens manufaturados desde
alimentos, vestuário até mobiliário. As compras são efetuadas mensalmente (ou bimensal) nas
cidades próximas, como Maués, Itacoatiara e Nova Olinda. Compras emergenciais são feitas nos
pequenos comércios existentes em algumas comunidades, como produtos de higiene, de limpeza e
salgadinhos ou refrigerantes. Apesar de mais raro, o regatão ainda se faz presente. Da mesma forma,
os moradores costumam trocar produtos da agricultura ou extrativistas com produtos manufaturados.
Observa-se que os moradores são fregueses costumeiros de uma mesma rede comercial, como é o
caso da “Casa Mendes” em Maués, que dizem que os produtos são mais baratos e que se sentem bem
comprando lá, pois o dono já os conhece.
Alguns barcos de comercio trabalham a base do escambo (troca de mercadorias por produtos
naturais ou artesanais) outros por dinheiro como é o caso do comercio de carne bovina, tendo o
proprietário a regularidade de abater uma rés semanalmente para abastecer algumas comunidade
(Figura 62).
70
Figura 62 - Barco que trafega pelos rios comercializando carne bovina
Constatou-se que é muito comum a existência de dívidas pelos moradores dessas comunidades
tanto por atividades de compra como empréstimos bancários. Os valores não são muito elevados, mas
com as dificuldades de pagamento, muitos deles acabam por acumularem altos valores e dizem não
saber como e quando poderão saldar a dívida. A Tabela 10 mostra o tipo de dívida e fonte de
empréstimo.
Tabela 10 – Tipo de dívidas feitas pelos moradores entrevistados
Localidade/Empréstimo
Bancos
Familiar
Comércio
Santa Marta
3
-
-
Frente São Jorge
-
-
4
Vila Nova
1
1
3
Sta Maria de Ituiense
1
-
1
São Pedro
1
-
1
Sagrado Coração de Jesus
12
1
1
Ozório da Fonseca
5
-
5
Santa Teresa
2
-
1
São Tomé
3
-
-
Bragança
1
-
-
Fortaleza
3
-
-
Santa Maria do Caiaué
10
-
1
São João do Cacoal
4
-
1
Monte Carmelo
-
-
-
Bom Pastor
2
-
-
48
2
18
Total
O número de famílias (41%) com dívidas nos bancos (BASA, do Brasil e Bradesco) é
preocupante. Em algumas comunidades – Sagrado Coração de Jesus, 75% dos entrevistados tem
71
dívidas com bancos, fruto de empréstimos. De forma geral, todos estão tentando renegociar a dívida
para fazer novos empréstimos, e muito desse dinheiro é aplicado na compra de gado ou em subsídios
para a produção agrícola – PRONAF (plantação de banana, guaraná, açaí, mandioca e outros
produtos do roçado). Os empréstimos nos Bancos variam de R$ 1.000,00 (Hum mil Reais a R$
6.000,00 (Seis mil Reais). Já os empréstimos junto ao Pronaf, variam de R$ 750,00 (Setecentos e
Cinquenta Reais) a R$ 1.500,00 (Hum mil e Quinhentos Reais).
EDUCAÇÃO
É por meio da educação que muitas comunidades superaram suas dificuldades de inserção na
sociedade maior. Como Paulo Freire ensinava, a escola não pode ser criticada como apenas um
espaço de reprodução da ideologia predominante e dominante, mas acima de tudo um espaço de
libertação dessa dominação e um espaço para transformação, como diz Edgar Morin (1989, p. 23)4 “
inventar um novo futuro”. Nesse sentido a educação é um espaço de esperança e deve ser vivida como
lócus de construção de um novo ethos social, isto é, um espaço de que possibilita a promoção da
pessoa tendo os direitos e deveres como norteadores de uma trajetória social em busca da plena
cidadania. Em particular nas questões ambientais, a educação permite a busca sistemática da reflexão
e atitudes individuais e coletivas que permitam uma relação de respeito entre as pessoas e o ambiente
(Reigota, 19945; Boff, 20036).
Embora o ensino desenvolvido nessas comunidades não possa ser qualificado como um ensino
de excelência – ao contrário, em alguns casos bastante deficiente, há entre os agentes de educação um
desejo gradativo de aprimoramento. Um exemplo disso é a formação contínua dos professores, os
quais participam ativamente dos cursos promovidos pela Secretaria Municipal de Educação em
Maués e outros também estão matriculados em cursos superior na Universidade Estadual do
Amazonas (UEA) no Proformar (Programa de Formação de Magistério) que realizam no pólo de
Maués ou até um Manaus.
MORIN, E. Idéias Contemporâneas. Entrevistas da Lê Monde. São Paulo: Ática, 1989.
REIGOTA, M. O que é Educação Ambiental. São Paulo: Brasiliense, 1994.
BOFF, L. Ethos Mundial. Rio de Janeiro; Sextante, 2003
Níveis de Ensino disponíveis nas comunidades
Observa-se a valorização dada a instituição escolar e as atividades educacionais em
72
absolutamente todas as comunidades. Muitos adultos voltaram a estudar depois de terem parado por
muitos anos. Os turnos escolares variam durante o dia (7:00 às 11:00h) e parte da noite (19:00 às
22:30h). Os turnos matutinos são reservados ao ensino infantil e primeiro ciclo do ensino
fundamental; o turno vespertino é prioridade para o ensino do segundo ciclo fundamental e a noite é
para o ensino médio ou outros cursos de curta duração como o acelerado do ensino fundamental para
adultos. Na Tabela 11 mostra-se os tipos de ensino disponibilizados nas escolas em cada comunidade.
Tabela 11 – Tipos de ensino oferecido nas escolas de cada comunidade
Infantil
Fundamental
Médio
Acelerado
Santa Marta
12
17
-
18
Frente São Jorge
*
*
*
*
Vilanova
*
*
*
*
Sta Maria de Ituiense
*
*
*
*
São Pedro
13
32
-
-
Sagrado Coração de Jesus
19
59
-
-
Ozório da Fonseca
30
60
60
-
Santa Teresa
*
*
*
*
São Tomé
*
*
*
*
Bragança
12
20
-
20
Fortaleza
*
*
*
*
Santa Maria do Caiaué
*
*
*
*
São João do Cacoal
26
-
34
-
Monte Carmelo
21
15
-
-
Bom Pastor
-
-
-
24
Tipo de Ensino
Localidade
133
203
94
62
Total
*sem informação devido a ausência dos responsáveis pelas escolas e do desconhecimento dos entrevistados
73
Escolas e condição dos benefícios educacionais
Na maior parte das comunidades há um prédio em boas condições que abriga a escola. O prédio
representa uma conquista que faz parte da história dessas pessoas. A escola simboliza a integração e o
crescimento do morador a um mundo onde a escolaridade é um importante meio de obtenção da
cidadania. De modo geral a escola é muito bem cuidada, pois todas as famílias participam da
manutenção da escola. Em algumas localidades há um mutirão para a limpeza da escola e os
consertos tanto do mobiliário quanto do prédio (Figura 63).
Figura 63 – Tipo de construção dos prédios escolares
Na tabela 12 estão descritos a situação física do prédio escolar e os auxílios recebidos em cada
escola, além do número de profissionais alocados em cada escola. Em algumas comunidades, por ser
período de férias escolares não foi possível obter informações precisas sobre a situação escolar, nem
tampouco o número de docentes e discentes.
Observa-se que em algumas localidades o prédio escolar existente não abriga toda a demanda
de classes em andamento, por isso alguns prédios comunitários como o salão de atividades, salão da
igreja, ou residências são usadas para uso de algumas turmas.
74
Tabela 12 – Situação Educacional das Comunidades no entorno e dentro da Flona de Pau Rosa
Localidade
Estrutura
Física
Cozinha
Merenda
Escolar
Fardamento
Material
Didático
Nº de
Professores
Nº de
Auxiliares
Santa Marta
Alvenaria*
Não
Mães
Sim
Sim
2
***
Frente São Jorge
Alvenaria*
Sim
Pais
Sim
Sim
4
***
Vilanova
Alvenaria**
Sim
Auxiliares
Sim
Sim
5
***
Sta. Maria de Ituiense
Não Tem
Não
Mães
Sim
Sim
São Pedro
Alvenaria*
Não
Mães
Sim
Sim
4
***
Sagrado Coração de Jesus
Madeira
Sim
Mães
Sim
Sim
5
***
Ozório da Fonseca
Alvenaria**
Sim
Auxiliares
Sim
Sim
14
***
Santa Tereza
Madeira*
Não
Mães
Sim
Sim
5
***
São Tomé
Madeira*
Não
Mães
Sim
Sim
***
***
Bragança
Madeira
Não
Mães
Sim
Sim
2
***
Fortaleza
Alvenaria*
Não
Mães
Sim
Sim
***
***
Santa Maria do Caiaué
Alvenaria
Não
Mães
Sim
Sim
***
***
São João do Cacoal
Alvenaria*
Sim
Auxiliares
Sim
Sim
4
3
Monte Carmelo
Madeira
Não
Mães
Sim
Sim
2
3
Bom Pastor
Madeira
Mães
Sim
Sim
2
***
***
75
Para um melhor detalhamento descreve-se a seguir algumas informações obtidas por
professores, auxiliares ou comunitários. Essas informações, porém devem ser vistas com cautela,
uma vez que os informantes não estavam seguros sobre a exatidão dos dados.
Escola de Santa Marta
A Escola Municipal Edmundo Mendonça é um prédio em alvenaria, que ainda está em boa
condição de uso, em seu interior possui cadeiras de madeira com braço para apoiar o material dos
alunos. Ao lado do prédio da escola existe um barracão em madeira que serve como sua cozinha, onde
as mães dos alunos preparam a merenda.
Em 2008 matricularam-se 18 alunos no período noturno, e ao final do ano letivo ocorreu uma
desistência de 8 alunos terminando o ano com 10. No período matutino tiveram 12 crianças no ensino
infantil e 17 crianças de 1ª a 5ª série. Os professores recebem a merenda mensalmente de Maués
(arroz, feijão, rapadura, óleo) e os pais e alunos cozinham em casa e levam para a escola. Estão
satisfeitos com os alimentos, também recebem material escolar novo.
Escola de São Pedro
A Escola Cezar Gadelha foi inaugurada em 2002 e é de alvenaria e possui uma sala de aula com
carteiras de madeira, mais um cômodo para a copa que é usado como depósito. Os banheiros apenas
têm o compartimento, mas não foram instalados. Hoje é usado para armazenar material escolar. Por
falta de sala, os alunos de educação infantil usam a construção rústica da cozinha comunitária para
suas atividades. Os alunos recebem somente a camisa da farda e o material didático. A escola recebe
mensalmente a merenda padrão (arroz, feijão, macarrão, conserva, etc,). Por falta de merendeiras
contratadas as mães dos alunos se revezam para preparar o alimento, que cozinham em suas casas e
levam à escola.
Os quatro professores são da Semed de Maués e trabalham com as quatro turmas, sendo no
período da manhã o ensino Infantil com 13 alunos e de 1a a 4a com 14 alunos. No período da tarde as
turmas são de 4a e 5a séries 12 alunos e noturno 6o ao 9o com 18 alunos.
76
Escola de Sagrado Coração de Jesus
A escola começou a funcionar na capela há 40 anos. A doação do terreno onde funciona
atualmente a escola em alvenaria foi feita por Dona Francisca Pinheiro de Miranda. A escola tem 20
cadeiras de madeira com braços, lousa com giz e depósito.
O material didático para o professor são livros (da série que lecionam), cadernos, pincel e lápis.
Para os alunos a Semed de Maués envia: farda (somente a camisa) quantidades de acordo com a
matrícula.
No kit de merenda a escola recebe: feijão, arroz, macarrão, salsicha, açúcar, sal, óleo, suco de
caju, rapadura, xarope de guaraná. Esses alimentos os professores pegam na SEMED de Maués uma
vez por mês quando vão receber o salário, às vezes têm atividades de formação para eles
permanecendo na cidade de 3 a 4 dias. Fazem parte do corpo docente 5 professores, todos da
comunidade SCJ. A escola funciona pela manhã com ensino infantil (19 alunos), no salão
comunitário, de 1a a 4a - 1o ano (10 alunos), funciona na escola; 2o ano (10 alunos) funciona na casa
em construção; 3o ,4o e 5o ano (18 alunos) funciona na casa do povo (alojamento). No período da
noite de 6:30h às 21:30h estudam os alunos do 6o ao 9o ano. Na casa do povo 6o com (6 alunos); no
salão comunitário 7o (7 alunos) e 8o ano (8 alunos); na escola 9º ano (16 alunos).
O transporte escolar, contratado pela Semed é pontual e assíduo, tem substituto. A coordenação
e supervisão desse trabalho fica sob a responsabilidade do Coordenador e vice coordenador
comunitários.
O preparo dos alimentos para os alunos é de responsabilidade das mães que se revezam em uma
escala. Fazem a comida na casa comunitária onde tem o refeitório. Na ausência o professor
improvisa. Se não tiver merenda os alunos saem mais cedo.
Escola de Monte Carmelo
Na comunidade tem uma escola com uma sala de aula com cadeiras de madeira e braços para
escrever. No horário da manhã funciona o ensino infantil das 7:30h às 11:30h (21 alunos) e a noite
fundamental (6o ao 9o ano) das 19:00h às 21:30h (15 alunos). Faz parte do corpo docente apenas um
professor. Seu Manoel não soube informar se o professor recebe algum material escolar para
auxiliá-lo. Mas os alunos recebem farda (camisa), caderno, lápis, borracha, livros didáticos. Ainda
não há transporte para os alunos, os pais são responsáveis por essa tarefa. A escola recebe a merenda
77
padrão mensal que é trazida da SEMED de Nova Olinda do Norte. As mães são responsáveis para
fazer o alimento para os alunos. Elas cozinham em suas próprias casas e levam à escola diariamente.
Escola de Ozório da Fonseca
A atual escola construída com ajuda da senhora Marina, uma dinamarquesa, que morou na
região alguns anos financiou a maior parte da construção em parceria com a prefeitura de Maués. A
escola tem 06 salas de aula, cozinha, banheiros, poço artesiano e um gerador de luz exclusivo. Fazem
parte do quadro docente 14 professores, sendo 04 deles efetivos. Funciona em 3 turnos sendo: pela
manhã ensino infantil com 30 alunos e ensino fundamental com 60 alunos, a noite o ensino médio
com 1o, , 2o e 3o ano.
Segundo informação da gestora os professores não recebem kit escolar, o material fornecido
pela secretaria de educação são camisetas, lápis cadernos e livros didáticos para os alunos. A escola
recebe a merenda básica: feijão, arroz, salsicha, conserva, rapadura, charque, leite, achocolatado,
suco, bolacha, milho, etc. O montante de alimentos, porém não é suficiente para todos e normalmente
dura somente quinze dias. As auxiliares de serviços gerais preparam os alimentos para os alunos.
Escola de São João do Cacoal
A Escola Municipal de São José foi construída em 1954 e está sob gestão da Semed de Nova
Olinda do Norte. Nessa escola há salas multisseriadas. Fazem parte do quadro docente três
professores e um gestor, todos são de Nova Olinda com exceção do gestor que é natural da
comunidade, formado em Ensino Superior pela UEA de Nova Olinda do Norte. Três pessoas são
contratadas pela Semed para fazer o transporte escolar e recebem diária de R$ 50,00 (Cinqüenta
Reais).
A escola funciona em 2 turnos: pela manhã das 7:00h às 11:00h com ensino infantil (26 alunos)
noturno das 17:00 às 21:00h, ensino fundamental 6o ao 9o ano (34 alunos) e Educação de Jovens e
Adultos - EJA. Para atender a esses alunos o professor recebe um kit contendo caneta, lápis, caderno,
livro do mestre, régua, cadernos e pincel. Para os alunos a SEMED envia: farda (camisa) caderno,
lápis, caneta, livros didáticos. A merenda a escola é semelhante às demais comunidades com
conteúdo padrão de alimentos. Fica sob a responsabilidade do professor ir uma vez por buscar a
merenda na Semed de Nova Olinda do Norte. Três auxiliares de serviços gerais contratadas
temporariamente são responsáveis pelo preparo do alimento.
Escola de Bragança
78
A escola está registrada na Semed de Maués com o nome de “Escola Municipal Carlos
Esteves”, entretanto, o nome conhecido pelos moradores é Salustiano da Silva Monteiro pelo fato do
terreno onde funciona a escola ter sido doado pelo senhor Salustiano há 14 anos. A escola tem uma
sala de aula com cadeiras de madeira com braços. A escola funciona pela manhã com ensino infantil
(12 alunos) e a noite ensino fundamental do 6o ao 9o ano (10 alunos). Para atender aos alunos a
Semed envia dois professores. O transporte dos alunos é feito por um morador contratado pela
Semed.
Para os alunos a secretaria envia um kit contendo: farda (só camisa), caderno, lápis, livros
didáticos, canetas. Os professores recebem o kit escolar com caderno, livros do professor, régua,
canetas, lápis e pincel. A merenda escolar é semelhante às demais escolas com alimentos padrão. Fica
sob a responsabilidade do professor ir uma vez por buscar a merenda na Semed.
Escola de Santa Teresa
A escola está sob a gestão da Semed - Maués contém 3 salas de aula, um anexo para alojamento
dos professores com capacidade para 5 professores. A escola funciona em dois turnos sendo pela
manhã ensino infantil com aproximadamente 12 alunos; ensino fundamental com aproximadamente
20 alunos e no período da noite turma de adultos (EJA) com aproximadamente 20 alunos. O
transporte dos alunos é feito por um morador contratado pela Semed.
Para os alunos a secretaria envia um kit contendo: farda (só camisa), caderno, lápis, livros
didáticos e canetas. Os professores recebem um kit escolar contendo caderno, livros do professor,
régua, canetas, lápis e pincel. A merenda escolar é composta pelos itens padrão: feijão, arroz,
salsicha, rapadura, sardinha, suco industrializado, açúcar, sal, conserva, ervilha, milho branco. Fica
sob a responsabilidade do coordenador (Miguel) ir uma vez por mês buscar a merenda na Semed em
Maués. O preparo fica por conta das mães que se revezam e cada dia uma delas prepara o alimento e
leva à escola para os alunos.
Escola de Santa Maria de Caiaué
Em 1973 iniciou a primeira turma tendo como professora a Senhora Raimunda Freire Brasil que
ministrou aulas na comunidade até o ano seguinte (1974). A partir desse no iniciou de fato a escola
79
com a professora Noemia Mendes dos Santos que foi a segunda professora e trabalhou no local até
2000, após Dona Noemia vários professores já atuaram como docentes na comunidade.
Na Escola Municipal João Gabriel é toda em alvenaria, ela possui duas salas de aula com
cadeiras em madeira próprias para escola que permite que os alunos desenvolvam suas atividades. Na
escola são ministradas aulas do ensino fundamental nas duas salas da escola e no centro comunitário,
onde são ofertadas aulas para os jovens e para os adultos.
Estão em via de implementação do Ensino Médio na localidade em parceria com a Secretaria de
Educação do Estado do Amazonas para o ano de 2010. As aulas ocorreram assim como na
comunidade Ozório da Fonseca que ocorre por meio de tele aula, onde um professor atua apenas
como facilitador, intermediando a aula ministrada pelo vídeo e os alunos na comunidade.
Quanto ao número de alunos, professores e auxiliares não se obteve maiores informações
devido a falta de pessoas com conhecimento suficiente para assegurar a certeza dos dados referentes
ao numero de alunos e demais dados escolares.
Escola de Bom Pastor
O terreno onde funciona a escola Rural Boa União foi doado pelo senhor Raimundo Barros há
aproximadamente 12 anos. Ele foi o primeiro professor da localidade. A escola funciona em um
barracão construído em madeira, sem paredes, cobertura de telhas de amianto e tendo cadeiras de
madeira com braço. A gestão escolar é de responsabilidade da Secretaria de Educação de Nova
Olinda do Norte. O professor está cursando o último período de Pedagogia pelo Município de Nova
Olinda do Norte e também é de lá, mas já está na localidade há dois anos.
A escola tem uma sala de aula com turmas multisseriadas de 1º. ao 4º. ano que funciona no
horário matutino de 7:00h às 10:45h quando tem merenda, e no período noturno de 18:00h às 21:00h
uma turma de EJA com 24 alunos. O transporte dos alunos senhor Osvaldo Marques de Souza
contratado pela Semed para este serviço porque possui barco próprio estilo regional.
O professor recebe um kit escolar contendo: lápis, caderno, borracha, canetas e alguns livros
didáticos do professor. Para os alunos a Semed de Nova Olinda do Norte envia caderno, borracha,
lápis, régua, lápis de cor e farda somente a camisa. A merenda é mensal e é composta dos alimentos
padrão. O preparo fica por conta das mães dos alunos que se revezam para realizar essa tarefa.
Entretanto, segundo o professor algumas vezes elas não podem fazer tal serviço ficando a cargo do
mesmo o cumprimento da tarefa. Então a partir deste ano a prefeitura contratará uma das mães que
ficará com a responsabilidade de fazer as refeições durante o ano todo. Todos os meses o professor
80
ausenta-se da comunidade durante uma semana para receber a merenda escolar, diesel e resolver
partes burocráticas da escola e ainda receber o salário.
Neste ano alguns alunos irão cursar o 6o ano do ensino fundamental, entretanto, a localidade
ainda não tem essas séries e esses discentes terão que se deslocar para outra comunidade mais
próxima onde já há essas séries. Esta é uma preocupação do professor, pois segundo ele não há
transporte matutino para esses alunos. Os alunos irão depender do transporte da comunidade de
Ozório da Fonseca para chegar até a escola que só faz isso no período da noite. Segundo o professor
urge fazer alguma coisa para manter esses alunos motivados para continuar na escola.
NUTRIÇÃO
Sabe-se que o conceito de nutrição é muito amplo, e que, a alimentação não se delineia
enquanto uma “receita” preconcebida e universal para todos, pois deve respeitar alguns atributos
coletivos e individuais impossíveis de serem quantificados de maneira prescritiva. Contudo,
identifica-se alguns princípios básicos que devem reger esta relação entre as práticas alimentares e a
promoção da saúde e a prevenção de doenças. Uma alimentação saudável deve ser baseada em
práticas alimentares assumindo a significação social e cultural dos alimentos como fundamento
básico conceitual. A alimentação se dá em função do consumo de alimentos (e não de nutrientes). Os
alimentos têm gosto, cor, forma, aroma e textura e todos estes componentes precisam ser
considerados na abordagem nutricional. Os nutrientes são importantes, contudo, os alimentos não
podem ser resumidos a veículos destes.
Alguns estudos antropológicos que abordam o tema dos hábitos alimentares demonstram que o
quê se come e como se come são elementos fortemente incorporados na construção da identidade
cultural dos povos, constituindo uma das barreiras mais fortes de resistência às mudanças. A
diversificação dos modelos de alimentação na Amazônia está diretamente relacionada com as
diferenças no acesso aos alimentos e nos hábitos alimentares. Por isso os alimentos trazem
significações culturais, comportamentais e afetivas singulares que jamais podem ser desprezadas. O
alimento como fonte de prazer também é uma abordagem necessária para promoção da saúde.
As práticas alimentares dos moradores da Flona Pau-Rosa envolvem refeições rápidas, como
um desjejum matinal, um almoço e jantar, porém entre essas três refeições é comum o consumo de
frutas apanhadas no pé ou algum alimento que se tem disponível em casa. O cardápio envolve uma
significativa variação de alimentos e bebidas de produção local, embora os alimentos industrializados
sejam cada vez mais consumidos. Listamos abaixo os tipos de alimentos que os moradores
mencionaram a partir de uma lista recordatória. Os hábitos alimentares dos moradores da Flona do PR
81
são baseados em proteínas e carboidratos, centrados basicamente na farinha, no peixe, na caça e
eventualmente alimentos de origem vegetal. Os relatos apresentaram um pleno uso do extrativismo
animal para o consumo (caça - animais silvestres).
Bebidas
Há uma variedade de bebidas consumidas pelos moradores das comunidades da Flona, as mais
citadas podem observadas no Gráfico 11. Importante salientar que os sucos consumidos em sua
maioria são de frutas naturais.
Gráfico 11 - Consumo de alimentação líquida nas famílias dos entrevistados
140
120
100
80
60
SIM
NÃO
40
20
0
Frutas
Os frutos da Amazônia, ricos em nutrientes são alimentos consumidos pelos moradores. Essas
frutas, algumas são coletadas na própria floresta outras plantadas nos quintais, as mais citadas foram:
cupuaçu; banana, limão ingá, maracujá acerola, taperebá pupunha, graviola jenipapo, manga, laranja
mamão, abacate, jambo, mari-mari, murici, goiaba, castanha, açaí, piquiá, uixi, melancia, tucumã. É
importante salientar que essas frutas são sazonais (Figuras 64 a 65).
82
Figura 64 – Cupuaçu, Limão e tucumã in natura consumidos pelos moradores
Figura 65 – Banana e Graviola em fase de amadurecimento
Hortaliças e raízes
Canteiros de tempero como pimenta de cheiro e cebolinha são comuns próximos da cozinha das
casas plantadas em canoas velhas suspensas ou jiraus. As citações de consumo de hortaliças foram as
seguintes: tomate, maxixe, couve, pimentão, feijão, jerimum, coentro, cebolinha, alface. Há ainda
consumo de batata e cará. Embora a maioria tenha o hábito de cultivar canteiros isolados, na
comunidade Frente São Jorge, cuidada pelos alunos, professore e comunitários há uma horta escolar
83
com plantio de hortaliças e plantas medicinais (Figura 66). Ações como manter a horta bem cuidada
demonstra que os moradores têm interesses em melhorar a nutrição de todos, principalmente dos
filhos, inserindo no cardápio alimentos que ajudarão na prevenção de doenças. Condimentos
industrializados são também são consumidos pelos moradores.
Figura 66 – Plantio de temperos e ervas medicinais na horta comunitária
Massas e doces
Produtos vindo da roça, como mandioca (Manihot esculenta), são manufaturados também pelas
famílias. Nessa atividade participavam homens e mulheres de forma conjunta. A prática de colher e
transformar a mandioca em farinha é semelhante em todas as comunidades. Depois da colheita os
moradores retiram a casca da raiz da mandioca deixando apenas a polpa. Depois a polpa é depositada
numa canoa próxima a um pequeno flutuante para que fique encharcada e seja mais fácil de ralar.
Quando já ralada e seca, a massa é peneirada e colocada no forno de torrar farinha, aquecido com
lenha. Para que a farinha seja torrada sem queimar, uma pessoa fica mexendo de um lado para outro
até o ponto de retirada do produto.
Toda a atividade de descasque da mandioca até o produto final são momentos de reunião
familiar, que pode ser feito na própria cada de farinha ou embaixo de árvores. Da mandioca tudo é
aproveitado. A polpa serve para fazer a farinha, as crueiras – resto que sobra da mandioca após a
peneiragem, é utilizada para comida dos animais. As cascas também podem ser aproveitadas para
comida dos animais. Com parte do liquido que é retirado da polpa faz-se o tucupi. Também se tira a
goma (amido) para fazer tapioca e beiju, alimentos muito apreciados na mesa dos amazonenses.
Alguns tipos de massas consumidos pelos moradores (Figuras 67 a 68).
84
Figura 67 – Alimentos feitos a partir da massa da mandioca
Figura 68 – Sub produtos da mandioca utilizado como alimentos
Alimentos industrializados
Como nos centros urbanos, o consumo de produtos alimentícios são intensamente apreciados
nas comunidades da Flona de PR e se vê a incorporação gradativa de compras no supermercado,
sendo que uma vez por mês as famílias costumam abastecer suas despensas com o “rancho”. Os
moradores deslocam-se para as cidades mais próximas para receber pensão, aposentadoria, salário
família e vender os produtos da roça. Nessas idas e vindas aproveitam para comprar mantimentos
para a casa, ou seja, fazem o rancho. Incluídos nesse rancho compram doces para os filhos (goiabada
e bombons) são os mais comuns. Entre os alimentos industrializados os mais citados foram pão
(torrado), biscoitos, arroz, o feijão, o óleo, o macarrão, a margarina, trigo, salgadinho, goiabada,
85
bombons, açúcar (Gráfico 12).
Gráfico 12– Consumo de massas e farináceos pelos entrevistados
120%
100%
80%
Sim
60%
Não
40%
20%
0%
Pães
Biscoitos
Macarrão
Arroz
Feijão
Carnes
As famílias que residem nas comunidades da Flona e no seu entorno utilizam freqüentemente a
caça em sua alimentação, segundo eles existe em abundância (Tatu, Paca, Veado, Catitú, Anta,
Mutum, Jacamim, Jabuti, Cotia, Capivara, Guariba, Cabeçudo (quelônio), Nambu, Jacu, Cujubim,
Onça, Tucano, Papagaio, entre outros). A caça é trazida do roçado ou da espera (tipo de caçada que é
realizada durante a noite) (Figura 69).
Figura 69 – Carne de Tatu pronta para ser cozida
86
A dinâmica sazonal da caça se diferencia da pesca no sentido de que, ao contrário da pesca, é
mais fácil caçar na época da cheia do que na seca. Com o avanço das águas e conseqüentemente
diminuição das áreas secas, os animais se encontram aglomerados em ilhas que vão se formando
durante a cheia, tornando mais fácil sua captura. Com o baixar das águas, os animais passam a ter uma
maior área para se movimentar dificultando sua captura. Os moradores usam a espingarda como
instrumento principal de caça. Além da caça outras carnes são também muito apreciadas e
consumidas. A criação de animais domésticos se dá de forma mais incipiente. De forma geral esses
animais são reservados para consumo principalmente na falta de peixe e caça. Verificou-se que na
maior parte das localidades os moradores criam galinhas e gado, sendo este último, utilizado também
como uma fonte de renda. Em períodos que o peixe e a carne tornam-se escassas, os moradores
também se alimentam de carnes enlatadas, tipo conservas. O Gráfico 13 mostra os tipos de carnes
consumidas pelos moradores da Flona.
Gráfico 13 – Consumo de carnes pelos entrevistados
120%
100%
80%
Sim
60%
Não
40%
20%
0%
Caça
Bovina
Aves
Peixes
Conservas
A atividade de pesca, segundo relato dos moradores se baseia exclusivamente para subsistência,
não existindo nenhum tipo de comércio interno ou externo. Como alimentação é tida como fonte de
suprimento de proteína animal diferenciados durante o ano, devido a sazonalidade das águas.
Durante a cheia a dificuldade da pesca é acentuada, não que deixe de existir peixes, mas sim
devido a maior quantidade de água, os peixes se espalham, exigindo um melhor preparo dos
87
instrumentos de captura e maior desgaste e tempo do morador, resultando assim, numa pequena
quantidade de peixes pescados. Já na vazante, os peixes se concentram numa área menor de água.
Durante a vazante os peixes mais abundantes são o tucunaré e o jaraqui, mas há uma variedade de
peixes consumidos pelos moradores tais como: jaraqui, tucunaré, pacu, sardinha, mapará, acará,
curimatã, branquinha, charuto, matrinxã, cará, traíra, piranha, aracu, surubim, aruanã, tambaqui,
pirarucu, pescada, peixe- boi, jacundá (Figura 70)
Figura 70 - Consumo de peixes pelos entrevistados
Preparo dos alimentos
O preparo das refeições é feito basicamente pelas mulheres, mas quando estas estão trabalhando
no roçado ou ajudando seus maridos, a refeição é preparada pelas filhas, que desde muito cedo
aprendem e se responsabilizam pelos trabalhos domésticos, cuidar dos irmãos menores além de
ajudar os pais no roçado. Além de preparar os alimentos, as mulheres trazem a macaxeira, a banana, o
cará e outras frutas do roçado, pescam, retiram o peixe das malhadeiras, criam patos e galinhas,
cultivam alguns temperos e verduras próximo a casa e recolhem frutas junto com as crianças, já aos
homens além de suas atividades econômicas cabe a responsabilidade da pesca, caça e também,
carregar a mandioca (Manihot esculenta) do roçado para casa.
Quase sempre os alimentos são retirados da natureza na hora do consumo com exceção do peixe
salgado e da farinha, ambos requerem processos mais elaborados são feitos por todos da família,
mulheres, homens e crianças, variando apenas as etapas em que cada um participa.
Para salgar o peixe, primeiramente as mulheres ou os homens o limpam, retirando as víceras e
as escamas após essa etapa o alimento está pronto para receber o sal, depois disso acrescentam sal
deixam secar durante o dia ao sol e à tardinha retira para um local coberto, este processo é repetido até
que o peixe fique seco, o processo de conservação pelo sal e muito eficiente se bem feito. Através
desta técnica eles podem consumir peixe mesmo em períodos de escassez de peixe. Este processo é
88
feito tanto para o peixe quanto para a carne, e normalmente com poucos cuidados de higiene (Figura
71).
Figura 71 – Preparo dos alimentos com poucos cuidados de higiene
SAÚDE
Ao considerar o estado de saúde de uma população, em particular de comunidades ribeirinhas, é
inevitável o aparecimento das doenças. Entretanto é importante ter em que saúde não é simplesmente
ausência de doença nos seus aspectos de dor, sofrimento, desconforto e incapacidade corporal, “um
estado de completo bem-estar físico, mental e social” conforme definição da Organização mundial de
saúde. Para se atingir esse estado vários fatores devem ser considerados desde alimentação, moradia,
saneamento básico, meio ambiente, trabalho, renda, educação, transporte, lazer e acesso aos bens e
serviços essenciais. São essas condições que estão sempre presentes em qualquer grupo social,
mesmo que estes não sejam imediatamente visíveis.
Para algumas populações esses aspectos estão longe de serem supridos e os níveis de doença se
sobressaem em detrimento da saúde. Observa-se que esses moradores estão, como as demais
localidades de UCs (Higuchi et al., 2006, 2008a; 2008b) vivem situações de dificuldades e sofrimento
contínuo seja pela falta de assistência ou pelos males crônicos provocados pela deficiência
nutricional, trabalho físico extenuante, falta de cuidados médicos e exposição aos riscos próprios da
vida na floresta e nos rios.
Saúde familiar
Mesmo diante das adversidades vividas esses moradores têm uma percepção sobre saúde que os
89
orienta para o desempenho de suas atividades diárias. Ao serem questionados a respeito da saúde
familiar 69% dos moradores consideram que seus familiares são saudáveis. Os indicadores são
baseados na aparência e na intuição e por isso muitas vezes o morador não sabe explicar sua avaliação
de estar com saúde, mas tem uma sensação da saúde a partir de vários aspectos, tais como: vejo que
estão bem; ou a gente pergunta se estão bem [os filhos] e eles dizem que sim, aí eu me conformo. A
postura corporal e as atitudes são expressões genuínas da saúde: eu vejo os filhos alegres, animados,
não se queixam. Viver sem queixas demonstra para alguns motivos de vida saudável na família, isto
é, viver bem sem reclamações é porque tá com saúde. Não sentir necessidade de ir ao médico também
é indicador de saúde: porque não vive procurando médico. Ir ao médico significa para eles ausência
de saúde para alguns.
Outros relacionam a saúde dos familiares ao fato de considerar que são bem alimentados;
comem bem. Se por um lado a alimentação, embora em alguns momentos mais escassa, esses
moradores têm à sua disposição alimentos naturais e sem agrotóxicos, por outro lado os hábitos de
higiene e manuseamento da comida, em algumas famílias, são bastante precários. Dentro das
limitações próprias de higiene e conhecimento observa-se que alguns moradores já salientam a
importância do cuidado com esses aspectos para prevenção de doenças, principalmente com as
crianças: cuido delas, dou remédio, dou banho; faço remédio pra evitar doença.
Apenas 31% se caracterizam como famílias não saudáveis, tendo em vista que sempre tem
alguém com doença como, por exemplo:
meu filho tem dor de cabeça todos os dias, ele não consegue ler; porque sempre aparece uma doença
como resfriado; muita dor de cabeça nas crianças; os sintomas dos filhos deficientes mostraram que
não têm saúde; minha mulher teve derrame; milha filha tem asma; tenho desvio de coluna; minha mãe
vive doente, tem dormência nos braços e pernas e dor de cabeça.
Podemos observar que várias são as causas que levam esses moradores a considerar a ausência
de saúde na família, mas a doença (estado físico do corpo) permanece como balizador desse estado de
saúde, de modo que se um membro da família está doente, todos são atingidos nesse agravo, com
maior ou menor grau.
Doenças mais freqüentes
Constatou-se que de um modo geral os moradores falam das doenças a partir dos sintomas e a
partir das queixas apresentadas é comum levantarem suspeitas do tipo de doença e do tratamento a
90
seguir. A automedicação é cada vez mais presente não por falta da busca de atendimento, mas
principalmente pela ausência da oferta de serviço de saúde. Essas queixas não são necessariamente
comprovadas por diagnósticos médicos, mas determinados sintomas são compartilhados com algum
dos moradores que já teve o queixa semelhante e foi diagnóstico e medicado. O queixoso acaba
apropriando-se dessa experiência do outro e usando dos medicamentos e procedimentos já receitados
pelo agente de saúde, ou mesmo o médico. Na tabela 13 estão discriminadas as diferentes queixas
apresentadas como doenças que algum membro da família foi acometida recentemente e que
consideravam mais freqüentes na localidade em que vivem.
Tabela 13 – Tipos de queixas e/ou doenças mais freqüentes entre os moradores
QUEIXAS/DOENÇAS
Ocorrências em
crianças
Ocorrências
em mulheres
Ocorrências
em homens
Respiratória (Gripe, dor de
garganta, virose, tosse,
77
43
43
Gastrintestinal (Diarréia,
cólica, dor de barriga, dor de
estômago, gastrite, vermes)
67
21
21
Febre
34
21
21
4
35
23
2
10
29
Hipertensão Arterial
0
11
2
Dermatológica (Ferida na
pele, ferida, coceira, alergia)
3
1
3
Ginecológica (Varizes,
menstruação, tempo de
mulher, doença do útero)
0
7
0
Infecto-contagiosa
(coqueluche, hepatite)
1
0
3
Renal (dor nos rins e pedra
na vesícula)
0
1
3
Malária e Leishmaniose
0
0
3
Visão (problemas de perda
de visão)
0
1
2
Acidentes (Picada de cobra,
acidente de moto serra)
0
1
2
Neurológica (Epilepsia,
convulsão)
0
2
0
Dores Localizadas (de
ouvido, de dente, de cabeça)
Muscular Esquelético:
(Contusão de queda,
clavícula quebrada,
reumatismo, dor nas costas,
dor nas cadeiras, hérnia,
rasgadura, anemia)
91
Urológica (Próstata, Infecção
urinária)
0
0
2
As queixas mais freqüentes foram aos males relativos ao trato respiratório e gastrintestinal,
principalmente no das cheias dos rios que trazem resíduos de toda ordem. Assim as péssimas
condições ou ausência de saneamento, baixa resistência às patologias e situação socioeconômica
desfavorável se apresentam como possíveis causas das queixas apresentadas.
Causas de mortalidade da população nos últimos 5 anos
Não se pode aqui apresentar um quantitativo de mortalidade, uma vez que muitas das mortes a
que diferentes entrevistados se referiam se tratava de um mesmo caso. Dessa forma apresentamos
aqui dois grupos de causas de mortes que foram citadas pelos moradores: a) Doenças ou morte
natural: derrame, câncer, parto, enfarto, velhice, do intestino, cirrose, diabetes; e b) acidente ou
conflitos: picada de cobra, afogamento, envolvimento em briga. Essas causas não podem ser tomadas
como causas definitivas, uma vez que este inventário foi recordatório e envolve um grau de incerteza.
Entre os 116 moradores entrevistados, 71 (61%) indicaram que o óbito ocorrido se tratava de
um membro próximo da família, e 45 (39%) responderam que nenhum parente havia falecido nos
últimos 5 anos.
Tratamento para as doenças
Ao serem acometidos por algum mal, os moradores buscam solucionar o problema de diversas
formas. O gráfico 13 mostra a percentagem de busca dos diferentes modos.
Gráfico 13 – Principais formas de tratamento das doenças ou emergência
9%
36%
21%
Posto de Saúde Local
Agente de Saúde
34%
Cidades Próximas
Remédio Caseiro
92
Observa-se que o uso de serviços de saúde já é uma prática bastante utilizada pela maioria dos
moradores da Flona (57%). É necessário enfatizar que o deslocamento mais distante (Manaus ou
Maués) ou mais próximo (Posto de saúde local) tem a ver com o grau de gravidade da enfermidade ou
ferimento percebido pela família.
Para 36% dos moradores o posto de saúde da comunidade é a melhor opção para o tratamento
da doença. É evidente que recorrem a essa opção apenas nos casos em que julgam não trazer perigo de
morte para o doente. É bom lembrar que nem todas as comunidades possuem postos de saúde e
profissionais qualificados para oferecer condições de cura e tratamento para a população. Outro
aspecto relevante são as estruturas precárias para a manutenção desse profissional nessas localidades:
como uma residência própria, sendo o próprio posto local de moradia para a técnica de enfermagem.
A falta de energia (diesel para os geradores) dificulta os atendimentos noturnos de emergência que
aparecem no posto de saúde e não raro os agentes de saúde se obrigam a atender em condições muito
precárias (Figura 72) Apenas dois postos de saúde são disponíveis nas proximidades da Flona (um no
rio Urariá em Vila Nova e outro no Rio Paraconi, em Ozório da Fonseca) Estes apesar de serem
construídos em alvenaria, possuem poucas macas e leitos para atender as emergências locais.
Figura 72 – Poste de saúde e atendimento de emergência médica à luz de velas
A procura pelo agente é feita por 34% dos moradores, que tem nesse profissional uma certeza
de atendimento das pequenas emergências e sentem confiantes para um necessário encaminhamento
ou remoção aos centros maiores. Os agentes de saúde dão uma segurança aos que buscam nele uma
solução emergencial, mas na maioria das vezes servem apenas como facilitador entre os postos de
saúde das cidades e a comunidade. Esses agentes são pagos pela prefeitura de Maués e têm ao seu
dispor um kit de primeiros socorros e medicamentos que são: paracetamol (líquido e drágeas),
dipirona, soro para re- hidratação via oral e hipoclorito de sódio (Figura 73). As quantidades variam
de acordo com a quantidade de famílias que atendem. Esses agentes muitas vezes são responsáveis
por mais de uma localidade, por isso recebem em média de 20 (vinte) litros de combustível para se
93
deslocarem nos atendimentos. A falta de remédio é um problema registrado por todos os agentes de
saúde tendo muitas vezes que administrar as doses sem entregar a quantidade de remédios necessária
para o tratamento.
Além da busca de auxílio com profissionais, é comum entre os moradores a automedicação ou o
uso de remédios caseiros. Entre os entrevistados 9% deles prefere fazer tratamentos com remédios
caseiros, utilizando para isso ervas, cascas de pau, folhas e outras plantas medicinais.
Figura 73 – Remédios disponíveis nos postos de saúde locais
Algumas pessoas detêm um conhecimento reconhecido entre os moradores e buscam auxílio
dos “práticos”. Muitos dos práticos na Região do Rio Paraconi diz ter sido
agraciado com
treinamentos curtos (3 a 5 dias) patrocinados por uma senhora dinamarquesa chamada por eles de
“Marina” ou “gringa” que segundo os moradores ajudava e ainda manda dinheiro para cuidar da
saúde e educação de algumas pessoas. Segundo o Senhor Gaú (Antonio) ela trouxe profissionais
estrangeiros para ministrar esse curso sendo que o único que concluiu foi o Gaú. No final do curso
ganhou um Kit com os instrumentos para extração de dentes e dois livros “Onde não há dentista” de
Murray Dickson e “Onde não há médico” de Devid Werner. Através da leitura deste segundo livro o
Seu Gaú passou a utilizar medicamentos medicinais e atualmente é um dos “práticos” mais
procurados do Paraconi, principalmente para extração de dentes (Figura 74). Esse “tratamento” é
cobrado de acordo com a possibilidade de pagamento do paciente.
94
Figura 74 – Livros e instrumentos médicos adquiridos pelos práticos pela ajuda de estrangeiros
LAZER
O lazer urbano segue critérios e opções que fazem uma dicotomia clara entre “tempo livre” e
trabalho. O tempo livre está, pois diretamente relacionado com o ficar cansado, exaurido com a
atividade laboral. Segundo Moraes (2005)7, descanso é uma função a qual o lazer é um reparador dos
desgastes físicos e mentais provocadas pelas tensões do trabalho, das obrigações cotidianas. Nesse
contexto, na sociedade atual o lazer, para muitos se tornou uma forma de descanso, o que na maioria
das vezes se confunde com o ócio (Meinster, 2005)8. Nessa perspectiva os menos desfavorecidos
acabam sendo excluídos dessa necessidade, uma vez que raramente tem um emprego ou um trabalho
regular para lhes proporcionar o merecido descanso. Alguns autores como Castelli (2002)9, se
ocupam em questionar esse pensamento e tentam mostrar que todo e qualquer indivíduo deve ter
acesso ao lazer e que além de lhes proporcionar uma infra-estrutura adequada, as políticas públicas
deveriam estar atenta a uma condição de vida melhor: empregos, salários condizentes, educação,
saúde, habitação.
Além do lazer ser um direito humano (Meister, ibid), este inclui um conjunto de atividades onde
o indivíduo se entrega de livre vontade, com prazer e desinteressadamente (Camargo,198910;
Dumazedier, 197611; Leite, 199512; Santini, 199313), como se fosse uma conquista por desenvolver
atividades de conteúdo compulsório. Essa atividade proporciona elementos importantes de promoção
social e auxilia no rompimento da alienação própria do trabalho desempenhado e estimula a criação
de uma ampla rede de interação social, uma vez que o lazer é um aspecto do comportamento humano
que proporciona condições de bem estar físico e mental (Oleias, s/d14) onde a recreação é inevitável
e unificadora de um espírito comunitário (Voser et al., 200515).
7 Moraes, J.F. Lazer e qualidade de vida. In:DORNELES, B; COSTA, G.J.C. (Orgs). Lazer, uma realização do ser humano: uma
abordagem para além dos 60 anos. Porto Alegre: Editora Dora Luzzato, 2005.
8 Meinster, J.A.F. Lazer e prazer é só fazer. In: DORNELES. Beatriz; COSTA, Gilberto José Correa da(Orgs). Lazer, uma realização
do ser humano:uma abordagem para além dos 60 anos. Porto Alegre: Editora Dora Luzzato, 2005.
9Castelli, G. Turismo - Atividade Marcante do Século XX. Caxias do Sul - RS, EDUCS, 2002.
10Camargo, L.O.L. O que é Lazer. São Paulo, Brasiliense, 1989.Dumazedier, J. Lazer e cultura popular. São Paulo, Perspectiva, 1976.
333p.
11 Leite, C.B. O século do Lazer. São Paulo -SP: LTr, 1995.
12 Santini, R.C. Dimensões do Lazer e Recreação - Questões espaciais, sociais e psicológicas. São Paulo -SP: Angelotti,
1993.14Oleias, V.J. Conceito de lazer. Disponível em www.cds.ufsc.br/valmir/cl.html - 2-k. Acesso em14/04/2009.
15 Voser, R.C.et. al. Atividade de recreação. In: DORNELES, B.; COSTA, G.J.C. (Orgs). Lazer, umarealização do ser humano: uma
abordagem para além dos 60 anos. Porto Alegre: Editora Dora Luzzato, 2005.
95
Sabe-se que o lazer foi por muito tempo considerado algo que desencadeia mudanças no ser
humano em todos os sentidos, seja moral, cultural ou social (Marcellino, 1995) e que foram se
transformando gradativamente de modo a se padronizar como uma atividade instituída formalmente
(Bruhns, 199716; Dumazedier, 1974; Sant'Anna, 199217).
O repertório de lazer entre os moradores das localidades da Flona parecem estar confirmando
esses princípios de liberdade, criação, e alegria. As atividades de lazer podem ser enumeradas num
amplo repertório que ocorre em temporalidades similares aos moradores urbanos, porém
padroniza-se com afinco o lazer do fim de semana e os do fim do dia.
Lazer do fim do dia
Todo dia os homens, mulheres e crianças têm suas atividades estabelecidas por uma rotina de
produção de sua existência. Os homens se dedicam ao deslocamento na floresta e nos rios para obter
o produto necessário para a renda e sobrevivência da família. A mulher recebe esses produtos e os
transforma em efetivo alimento e segurança no espaço de sua casa. As crianças se ocupam de sua
formação escolar e compartilham com os pais as atividades que lhes farão adultos competentes
naquele ambiente em que vivem. Essa atividade há que ser seguida, uma vez que foi e é estruturada
historicamente na cultura dos que os antecederam e reproduzem tais práticas, mesmo que inovando
alguns aspectos. Um determinado momento, ao final do dia, é reservado para se fazer algo que os
exime dessas funcionalidades. É um tempo para relaxar, juntar o ócio com o entretenimento de modo
que se junta nessa atividade uma necessidade objetiva e subjetiva (Andrade, 200118). A necessidade
objetiva envolve as possibilidades de realização de uma atividade qualquer e as habilidades do
indivíduo em tomar parte dela, enquanto que a necessidade subjetiva diz respeito às preferências de
cada pessoa e os significados atribuídos à essa participação individual e coletiva. Brincar e se divertir
faz parte do universo de todas as pessoas, as opções individuais por tipos, formas e modos de lazer
procedem de motivações e convivências coletivas.
16Bruhns, H.T. Introdução aos Estudos do Lazer, Campinas - SP: Editora da Unicamp,1997.
17Sant’Anna, D.B. O prazer Justificado - História e Lazer. São Paulo - SP: Marco Zero, 1992.
18ANDRADE, José Vicente de. Lazer: princípios, tipos e formas na vida e no trabalho.Belo Horizonte:Autêntica, 2001.
Não há entre os moradores um horário prévio e pontual, mas num dado momento os homens e
mulheres se juntam num lazer esportivo no campo de futebol antes do entardecer e lá permanecem
sem tantos acordos jogando e liberando as energias da preocupação das grandes caminhadas na
floresta ou nos rios buscando o alimento e renda para suas famílias. É surpreendente como a atividade
do futebol agrega as pessoas e proporciona momentos de intenso entretenimento (Figura 75). Uma
96
comunidade sem campo de futebol certamente estaria incompleta. Nas laterais do campo as crianças
correm e se envolvem em outras atividades lúdicas.
Figura 75 – O jogo de futebol ao final do dia reúne times de homens e mulheres
Outros preferem repor as energias num jogo de dominó ou sinuca com amigos ou com um
banho frio no rio e no balanço das redes gostosamente cochilar com o saudável barulho das crianças
que brincam entre as casas e se banham no rio (Figura 76).
Figura 76 - Jogos de mesa com amigos ao final do dia
Ficar simplesmente em casa pode ser um momento de relaxamento, de descanso e em muitos
casos apenas assistir TV, ouvir as notícias do dia no radio a pilha, ou ler a bíblia. Cunha (199419) em
suas reflexões defende que a leitura é uma forma altamente ativa de lazer. Em vez de propiciar,
sobretudo, repouso e alienação, como ocorre com formas passivas de lazer, a leitura exige não
somente um alto grau de consciência e atenção como também uma participação efetiva do
recebedor-leitor. Já televisão e o rádio além de um instrumento de comunicação que leva informação
a longa distância, também se tornou uma aliada para atividade de descanso e lazer para muitas
pessoas. O avanço da tecnologia cada vez mais vem possibilitando as pessoas das áreas mais distantes
dos centros comerciais uma apropriação dos acontecimentos do mundo para dentro de seus lares.
Atualmente é muito comum ouvir de moradores que vivem longe dos grandes centros urbanos que
usam o tempo livre para assistir TV e ouvir rádio. Ao contrário do que muitos possam dizer, a
97
televisão não é um instrumento de alienação per si, uma vez que esta possibilita uma janela de
inclusão num mundo distante, do qual esses moradores desejam ter notícias. Porém esta também
mostra modos de vida que passam a ser desejados pelos moradores mais jovens, mesmo que não
sejam adequados para aquela realidade, produzindo efeitos surpreendentes.
19CUNHA, M.A.A. Literatura infantil, teoria e prática. São Paulo: Ed. Ática, 1994
Ficar em casa simplesmente também é uma forma de lazer. Alguns preferem ficar no
aconchego do lar, num território seguro, vivendo um momento de privacidade. Pensar em uma
atividade de lazer é pensar em algo que nos possibilite prazer. Não se pode ver o lazer como
obrigatoriedade, mas como prazer e complemento da vida que cabe as pessoas realizar como
complemento de seu mundo. Ficar em casa é, pois uma forma de lazer e complemento de seu mundo,
tal como o simples fato de pescar, fazer uma oração, observar a diversão das crianças na água, no
quintal ou contemplar o rio (Figura 77).
Figura 77 – Crianças ao fim do dia no rio e nas brincadeiras de bola no quintal
Percebe pelos relatos que as diferenças entre as atividades e a diversificação de circunstâncias
fazem com que, para uns, o lazer consista em qualquer tipo de quietude ou sossego e para outros, em
quaisquer das formas que traduzam movimento. Porém, as atividades expressam uma complexa rede
que a liberdade humana pode construir.
De um modo geral, a idéia da unidade da vida presente em muitos moradores, estes não
separam o descanso do trabalho, dessa forma não há como separar essas coisas, por isso não se
identificam atividades de lazer separadamente. No Gráfico 14 observa-se os diferentes tipos de lazer
praticado pelos moradores nas localidades.
98
Gráfico 14 - Tipos de atividades de lazer praticado pelos moradores ao fim do dia
10%
13%
9%
Jogo de Futebol e Vôlei
Descanso
Outras Respostas
Não respondeu
68%
Lazer nos fins de semana
O fim de uma semana de trabalho é celebrado de acordo com fundamentos cristãos fortemente
incorporados pelos moradores. Se durante os dias o trabalho é a pré condição para o lazer, nos fins de
semana o culto religioso é a atividade compulsória antes da recreação, do lazer esportivo ou do
descanso. Alguns moradores consideram o próprio culto como lazer tendo em vista que este permite o
encontro com outras pessoas e promove a união das famílias. Embora haja igrejas em todas essas
localidades, a ausência de padres é comum. Mesmo com essas dificuldades os moradores celebram
aos domingos cultos religiosos. As práticas religiosas nas comunidades da Flona são bastante intensas
e os moradores vivenciam a religiosidade nos seus atos solenes, participando aos domingos dos
cultos; com grupos de jovens; grupos de catequese Esses momentos de encontro comunitário e
fortalecimento espiritual compactuam para união dos comunitários. A maioria das comunidades é
católica, entretanto, isso não impede que seguidores da igreja evangélica participem e se juntem aos
católicos para celebrar o “Rebanhão”. O Rebanhão é denominado ao encontro comunitário realizado
mensalmente nas comunidades. Esses encontros seguem um calendário anual, e a cada mês os
moradores se reúnem na comunidade escolhida anteriormente para celebrar, jogar bola, festejar e
principalmente partilhar a palavra de Deus. O Rebanhão permite uma participação social maior e
99
mais livre, a prática de cultura desinteressada do corpo, da sensibilidade e da razão. Além da
formação técnica e prática, oferece novas possibilidades de interação voluntária à vida de
agrupamentos, culturais e sociais, cria novas formas de aprendizagem voluntária a serem praticadas
durante toda a vida e contribui para o surgimento de condutas inovadoras e criadoras (Figura 78).
Figura 78 – O lazer como forma de união e celebração religiosa nos fins de semana
A escolha da comunidade é feita por sorteio no final do ano anterior para que cada uma se
prepare para organização. Nesses encontros vários temas são discutidos. Há uma “comissão
organizadora do setor”, onde cada membro tem um papel definido como coordenador de jovens; de
esporte; de catequese e de casais. Essas pessoas são assistidas pela diocese de Maués e recebem
treinamento para dar prosseguimento ao trabalho da igreja católica nas comunidades.
Associado às atividades religiosas o futebol é certamente recordista de preferência dos
moradores. Os torneios são intra e inter comunidades. O esporte articula e reúne os moradores,
pode-se dizer que não é uma atividade praticada apenas por homens, as mulheres também têm seus
times e disputam torneios internos na comunidade. Não satisfeitos apenas em organizar torneios os
moradores da Flona agregam essa atividade com a religiosidade. Pode-se dizer que nesses torneios há
regras especificas como, por exemplo, não poder chamar palavrão durante o jogo. A penalidade para
quem infringir a regra é ficar fora do jogo por três minutos, então quem chamar três palavrões ficará
praticamente fora do jogo, pois cada jogo tem a duração de apenas dez minutos. Esse tempo
estipulado é devido a grande participação dos moradores nas competições.
O fim de semana para alguns moradores é um momento de calma, de ficar em casa com a
família, receber visitas e conversar.
100
Gráfico 15 - Tipos de atividades de lazer praticado pelos moradores nos fins de semana
15%
39%
Visitas e Passeio
Cultos
28%
Jogos de Futebol e Vôlei
Descanço
18%
ORGANIZAÇÃO E MOBILIZAÇÃO SOCIAL
Organização Social é o conjunto de relações entre membros de um grupo, entre grupos ou entre
pessoas e grupos. Essas organizações, tanto formais como informais, possuem papel fundamental no
desenvolvimento de lideranças e organização das pessoas envolvidas. No Flona, a organização social
dá-se de forma tradicional, que se concretiza por meio de instituições como a igreja e a escola e se
expressa por meios de sociabilidade que podem ser exemplificadas pelas festas religiosas e ainda pela
formação de associações comunitárias. Observa-se que as comunidades buscam a organização social
através das instituições para promoverem o desenvolvimento local.
De modo geral as localidades estão organizadas em “comunidades”, a partir do conceito
apregoado pela igreja católica, isto é, existe uma sede com as instituições mais importantes: escola,
igreja, centro comunitário (salão e campo de futebol). Essa espacialidade define um modelo de
organização que se repete na maioria das localidades Na organização estimulada e, de certa forma,
apoiada pela igreja é formadas por equipes de coordenação (coordenador, vice, tesoureiro e
membros). A equipe de coordenação é normalmente mantida por um período de 2 (dois) anos, e
depois há novamente eleição para o novo mandato. Os coordenadores comunitários articulam-se da
melhor forma possível em prol das comunidades das quais são responsáveis, e, dentro desta
101
organização eles buscam formar associações para conquistarem melhorias para todos. O quadro 3
mostra o nome dos coordenadores à época dessa visita. Em muitas comunidades os moradores mais
antigos e que exercem uma liderança visível, já ocuparam funções de coordenação e por falta de
novos membros, os que se sentem capazes estão reiniciando um novo ciclo e assumindo novamente
essas lideranças. De modo geral as lideranças são respeitadas e articuladas o bastante para estarem
sempre decidindo de forma conjunta qualquer situação. As reuniões são regulares e em determinadas
circunstâncias há convocação dos moradores para assembléia extraordinária. Pelo treinamento feito
pela igreja, todos as coordenações mantêm registros em ata das decisões tomadas.
Quadro 3Comunidades
– Nome dos coordenadores
de cada em
comunidade
Coordenador
Fev/2009
Santa Marta
Frente São Jorge
Vilanova
Sta Maria de Ituiense
São Pedro
Sagrado Coração de Jesus
Ozório da Fonseca
Santa Teresa
São Tomé
Bragança
Fortaleza
Santa Maria do Caiaué
Cacoal
Monte Carmelo
Bom Pastor


Ercílio
Mauro
Tonhão
Waldemar
Danilo
José Roberto
Miguel
Sebastião
Bergue
Manoel
Valdison
Marquisanor
Manoel
Raimundo Palheta
As associações existentes nas comunidades da FLONA são:
Associação Comunitária do Rio Paraconi (Ascarpani),

Associação Atransmacurapá (sede em Caiaué),

Associação da Comunidade de Cacoal (Adesa).
Há ainda outras que estão em fases de legalização como é o caso da comunidade de Fortaleza.
Apesar de haver alguns descontentes com a dinâmica de algumas associações um bom número de
moradores se mantém em silencia ao comentar sobre elas. Observa-se que pelo menos 41% dos
entrevistados dizem fazer parte de associação (Gráfico 16).
102
Gráfico 16 - Participação dos moradores em Associações Comunitárias
9%
41%
50%
Sim
Não
Eventualmente
A Atransmacurapá está em pleno funcionamento com toda a documentação legalizada e já
dando retorno aos comunitários. Os associados pagam uma taxa de aproximadamente R$ 10,00 (dez
Reais) por mês. Os benefícios propostos são bastante diversos, como por exemplo, quando um
associado precisa ir até a cidade de Maués, este não pagará a passagem no barco da associação. Os
moradores asseguraram que os membros responsáveis pela associação não recebem pagamentos para
a administrarem a mesma. Os membros são eleitos pelos associados seguindo o regimento interno.
Constatou-se que havia um descontentamento generalizado com um dos ex-presidentes da
Associação, que segundo os moradores, permanece mais na cidade de Manaus do que na Flona.
A Ascarpani, embora tenha a documentação completa estava em fase de mudanças de alguns
membros. Era uma associação muito atuante na agricultura, mediando a procura de financiamentos e
escoamento da produção, mas acabou falindo. Sua sede principal era a comunidade de Sagrado
Coração de Jesus.
A Adesa até o presente momento está em fase de legalização da documentação junto aos órgãos
competentes da cidade de Nova Olinda do Norte.
Participação dos moradores em atividades sociais
103
As participações em eventos e outros tipos de reuniões tem sido uma característica marcante das
localidades do interior, e isso é verdadeira com os moradores entrevistados. Eles mencionaram
participar de algum tipo de associação. As respostas mais freqüentes podem ser visualizadas no
Gráfico 17.
Gráfico 17 - Tipo de atividades sociais comunitárias e freqüência
100
90
80
70
60
Sim
50
Não
40
Eventualmente
30
20
10
0
Igreja
Escola
Esporte
Associação
festejos
Os moradores que disseram participar de alguma associação, mas apenas eventualmente, ou
seja, não pagam mensalidade e participam apenas das reuniões. Nas falas dos moradores podemos
observar qual o tipo de participação deles na comunidade “cuido do trabalho da comunidade;
participo das reuniões; ajudo na limpeza da comunidade”.Esse grupo está vinculado a associação ou
assembléia nas próprias comunidade, aonde sempre há reuniões para tomadas de decisões de trabalho
ou outros assuntos inerentes aos próprios moradores.
Outra parcela de 31% dos moradores disse que sempre participam da associação. Nos relatos
podemos visualizar a forma de participação desses moradores “participo do sindicato; participo da
associação pecuarista em Maués; participo da associação do IDAM; participo da associação
Ascarpani aqui da comunidade; participo da associação comunitária; participo da associação
Atrasmacurapá aqui da comunidade”. Esses moradores são membros e pagam uma taxa para a
associação. Observamos que em algumas comunidades da Flona há associações com toda a
documentação em dia, como é o caso da Atrasmacurapá na comunidade de Santa Maria do Caiaué.
Porém, outra associação que também possui toda documentação é a Ascarpani, no entanto, por
104
motivos administrativos encontrava-se sem atividade até a data desta pesquisa. Para outra parcela de
49% mencionou que não participa de nenhum tipo de associação formal. Em conversas informais
verificamos que muitos desses moradores ficaram desiludidos com a administração de alguns
responsáveis pelas associações e desligaram-se dela, preferindo optar por criar uma associação para a
própria comunidade. Outros 9% disseram que às vezes participam. Com relação a participação em
movimentos escolares 24% mencionaram que sim. Alguns relatos revelam o tipo de participação dos
moradores em atividades na escola “ajudo na horta escolar; Ajudo na limpeza; quando tem bingo vou
lá; sou professor; participo os professores são meus irmãos; festa dos aniversariantes; participo da
gincana”. Podemos observar que os moradores procuram estar presente tanto nas festividades quanto
nos trabalhos em favor da escola. Há uma preocupação deles com o bem estar dos alunos.
Outra parcela de 34% mencionou sempre participar das atividades que ocorrem na escola seja
formal ou informal estão sempre presentes. Os relatos evidenciam essa participação “vou a reunião de
pais e mestres; os professores são meus irmãos; festa de aniversário; ajuda os professores na
formatura dos alunos; vou as reuniões; vou as palestras”. Podemos observar que o nível de
participação dos moradores em movimentos sociais nas escolas serem significantes, chama a atenção
o percentual de 40% que por algum motivo disseram que não participar de nenhuma atividade na
escola. Outra parcela de 3% mencionou que às vezes participam de alguma coisa. De qualquer modo,
podemos considerar o índice de participantes como positivo, pois, esse percentual demonstra que os
moradores são unidos e organizados, isso é um grande passo para a implementação de programas de
desenvolvimento sustentável.
No que diz respeito a participação dos moradores nos movimentos sociais relacionados a igreja
podemos verificar que os índices são bastantes acentuados. As análises a essa questão mostram que
33% disseram sim. Nos relatos podemos observar como de que maneira esses moradores participam
das atividades na igreja “vou ao culto toda semana; reúnem para orar; ajuda na organização da festa;
participo todo sábado à noite; participo com meus irmãos; sou catequista das crianças”.
Outra parcela de 46% mencionou sempre participar dos movimentos sociais da igreja. Os
relatos demonstram o tipo de participação deles nesses eventos “participo do grupo de oração; ajudo
na pregação do culto; sou dirigente do culto e participo da organização da festa do padroeiro; canto no
coral; sou membro da igreja; faço animação e louvor; partilho o evangelho”. Como podemos observar
os moradores são bem atuantes em todos os seguimentos da igreja. Além disso, a diocese de Maués
presta assistência na preparação dos moradores que atuam como coordenadores de grupos de casais,
catequistas e dirigentes de culto. Essas pessoas são preparadas para dar assistência aos moradores no
que se refere às ações da igreja. É oportuno lembrar aqui que os evangélicos embora em menor
quantidade forma grupos unidos e com bastante participação nos movimentos da igreja.
No que diz respeito a participação dos moradores nos movimentos esportivos locais 23%
105
mencionaram que sim. Embora não atuem ativamente jogando, sempre acompanham os filhos ou vão
somente assistir ao torneio ou um joguinho no fim da tarde. Outra parcela de 21%, mais ativa,
mencionou que sempre participam de esporte. Nos relatos podemos observar de que forma esses
moradores participam participo do jogo; participo do time da comunidade; jogo vôlei e futebol;
participo dos torneios.
Outra parcela de 35% disse que não participa de nenhum tipo de movimento esportivo.
Possivelmente isso poderá ocorrer devido a dificuldade de locomoção ou as canoas são pequenas e há
ainda o custo de combustível.
Entretanto, uma parcela de 21% deles mencionou que ás vezes participa dos eventos sociais
esportivos, indo somente assistir e raramente jogando bola. Justificaram suas respostas dizendo que
não tem mais idade para isso ou preferem ficar em casa descansando ou fazendo outros deveres
inerentes a rotina do dia.
Ainda nesta linha de indagação, investigamos se os moradores da Flona participam de alguma
atividade relacionada ao folclore. Uma parcela de 12% disse que sim. Aqui os relatos dizem o
seguinte: participo do festival da escola; participo do festival folclórico; participo do festival do boi
garantido; festa de São João em Cacoal; Festival folclórico em Ozório. Outra parcela de 24%
participa mais ativamente nos movimentos folclóricos, eles estão sempre presentes em todas as
atividades relacionadas com esses eventos. Isso pode ser constatado nos relatos: participo do festival
e da quadrilha, dança do bentivi, capoeira e a dança do tipiti; participo levando as crianças para a
quadrilha; participo ajudando na organização do festival e dançando. Embora muitos moradores
participem dos festivais folclóricos das comunidades, chama a atenção o percentual de 60% dos que
mencionaram não participar de nada nessa categoria. Outra parcela de 4% disse participar somente às
vezes.
Clima Social
Nas comunidades dentro da Flona e no seu entorno podem ser caracterizadas como grupos
alicerçados em boa convivência. Um dos motivos são os laços de parentesco que existem entre os
moradores das comunidades. É visível o grau de mobilização entre os moradores. Os relatos
demonstram que o clima de harmonia ajuda mútua, companheirismo e solidariedade predominam
entre eles. É comum os moradores se juntarem para mutirões seja para fazer serviços de limpeza na
Igreja, roçar o mato ou ajudar outros moradores em atividades de produção de farinha ou extrativismo
de algum produto. Ao serem solicitados a falar sobre a convivência entre os comunitários
mencionaram ter uma boa convivência e que:
106
Todos se ajudam, não tem brigas.
Somos uma família.
Sempre precisamos uns dos outros, somos uma família.
Aqui todos se dão bem, são famílias daqui mesmo.
Unidos, quando um tem trabalho o outro ajuda.
Somos unidos, aqui não tem inimizade com ninguém.
Além desses aspectos positivos nos relacionamentos internos, há também uma boa convivência
entre as comunidades. Durante a permanência das equipes de Manejo Florestal e Laboratório de
Psicologia e Educação Ambiental do INPA na área da Flona pudemos observar um bom
entrosamento entre os moradores. As Instituições religiosas, em particular a igreja católica parecem
contribuir para a união nessas comunidades. Antecedendo um grande evento religioso há reunião
mensal onde os representantes comunitários visitam as comunidades fazendo reunião. Esse vínculo
mantém o grupo unido diluindo possibilidades de discórdia graves entre eles. Esses fatos podem ser
observados nos relatos:
Todos se dão bem
Fazendo parte do rebanhão.
São bons, eles vem jogar bola pra cá.
Onde chega é bem recebido.
Nunca vi briga entre eles.
É como se vivêssemos em casa todos juntos.
A gente sente até falta quando não se vê.
Embora a maioria dos moradores tenha apontado para uma convivência pacifica, alguns deles
revelam certa disputa entre algumas comunidades e que chega até a emergir conflitos por conta disso.
Tais conflitos, entretanto, não podem ser caracterizados como problemas que interferem num
relacionamento mais profundo. São disputas superficiais que ocorrem pelo próprio repertório das
diferenças sociais que ocorrem em qualquer grupo. Nesse contexto de união também há atividades
que agregam valores e são responsáveis pela união geral de todos. Assim ao serem questionados quais
tipos de atividades que unem os moradores quatro aspectos ficaram evidentes e podem ser observadas
no Gráfico 18.
107
Gráfico 18 – Atividades que agregam os moradores nas diferentes comunidades
13%
43%
21%
Mutirão
Encontros Religiosos
Festas e Torneios
Reunião Comunitária
23%
Para 43% dos moradores os mutirões de trabalho são atividades muito presentes nas
comunidades da Flona moradores sempre se reúnem em prol de alguém que os solicite ajuda ou
trabalhando na limpeza da sede comunitária. Para realizar esse tipo de trabalho os moradores
escolhem um dia na semana, geralmente às sextas-feiras, pois nesse dia eles já realizaram os trabalhos
em suas roças e dedicam-se a zelar pela comunidade. Todos colaboram, inclusive as crianças. Quando
algum comunitário precisa de ajuda, a comunidade também se reúne para auxiliá-lo. Com
organização e união eles vão superando as dificuldades. Os mutirões ou puxiruns são as atividades
que mais agregam os comunitários, pois “vai um no roçado do outro no tempo da mandioca”, ou “ a
gente se junta para roçar toda semana, pra fazer limpeza na comunidade...”.
Para outra parcela de 21% dos moradores, as festas e os torneios são atividades que agregam as
pessoas. No divertimento em grupo, segundo Amaral (1999)20, do mesmo modo que na religião, o
indivíduo “desaparece” no grupo e passa a ser dominado pelo coletivo. Nesses momentos, apesar ou
por causa das transgressões, são reafirmadas as crenças grupais e as regras que tornam possível a vida
em sociedade. Ou seja, o grupo reanima periodicamente o sentimento que tem de si mesmo e de sua
unidade. Ao mesmo tempo, os indivíduos são reafirmados na sua natureza de seres sociais. A autora
diz isso
20Amaral, Rita. Festa à Brasileira: sentidos do festejar no país que “não é sério”. Disponível em publicação eletrônica na Internet,
www. URL: http://www. aguaforte.com/antropologia/festaabrasileira/festa.html Acesso em 07/05/2009
porque, em sua opinião, com o tempo, a consciência coletiva tende a perder suas forças. Logo, são
108
imprescindíveis tanto as cerimônias festivas quanto os rituais religiosos para reavivar os “laços
sociais” que correm, sempre, o risco de se desfazerem. As festas seriam uma força no sentido
contrário ao da dissolução social. Neste sentido, os relatos dos moradores afirmam a união e o
fortalecimento social por meio das festas e torneios; aniversário de moradores; dia das mães e dos
pais; jogo de bola, sinuca, bingo, torneio; festival da escola, festa do padroeiro21.
Os encontros religiosos são para 23% dos moradores formas muito importante para unir as
pessoas. Esses encontros são os cultos, a catequese, os encontros de casais, encontro de jovens e o
grande evento que os moradores denominam de rebanhão; encontro de comunidades ou encontro de
setores. As respostas mais freqüentes foram: Culto nos domintos na igreja; Rebanhão para escutar a
palavra de Deus; Encontro das Comunidades na Igreja.
Para outra parcela de moradores as reuniões para tratar assuntos de interesses comuns foram
mencionadas por 15% dos moradores. Dentro das comunidades da Flona os moradores têm a
preocupação em manter um clima de harmonia e trabalho, assim, quando precisam discutir algo em
beneficio de alguém ou da comunidade como um todo, o coordenador convoca os moradores para
reunião: Reunião da comunidade; Reunião do setor pra ver o que está acontecendo nas comunidades;
Reunião de moradores, de pais e mestres; Reunião pra resolver problemas comunitários.
Aspectos de satisfação com o lugar onde vivem
Em contato direto com os recursos naturais esses moradores incorporam na terra a satisfação
que brota na relação com os recursos valorizados pela experiência vivida nos mais variados aspectos:
a paisagem bucólica da floresta, a fartura (mesmo que limitada a certos períodos do ano), o ar puro, a
autonomia de trabalho, as pescarias. Assim ao falarem sobre os aspectos afetivos relativos ao que
mais gostavam no lugar, os moradores
21
A festa também é capaz de colocar em cena, o conflito entre as exigências da vida séria e a própria natureza humana.
As religiões e as festas refazem e fortificam o “espírito fatigado por aquilo que há de muito constrangedor no trabalho
cotidiano”. Nas festas, por alguns momentos, os indivíduos têm acesso a uma vida menos tensa, mais livre, a um mundo
onde “sua imaginação está mais à vontade” (Durkheim, 1968, p.543, 547) citado em Amaral (1999).A festa - como o
ritual - reabasteceria a sociedade de “energia”, de disposição para continuar. Ou pela resignação, ao perceber que o
caos se instauraria sem as regras sociais, ou pela esperança de que um dia, finalmente, o mundo será livre - como a festa
pretende ser durante seu tempo de duração - das amarras que as regras sociais impõem aos indivíduos. Ainda de acordo
com Amaral (1999), na festa a energia do coletivo atingiria o seu apogeu no momento de maior “efervescência” dos
participantes. Ela observa que esta efervescência muda as condições da atividade psíquica. As energias vitais são super
excitadas, as paixões mais vivas, as sensações mais fortes
entrevistados demonstram três formas de satisfação em relação ao lugar: lugar de convivência social
(56%); lugar de produção material (16%); e lugar de produção e convivência social (28 %) (Gráfico
109
19).
Gráfico 19 – Aspectos que os moradores dizem gostar mais do lugar onde moram
28%
Lugar de Convivência
56%
16%
Lugar de Produção
Material
Lugar de Produção e
Convivência
Lugar de convivência social
As relações de convivência social foram citadas por 56% dos moradores das localidades como
algo que traz satisfação a eles. “Nasci aqui, construí minha família”;. Neste caso a satisfação pelo
lugar ocorre em virtude das relações estabelecidas nele por se ter nascido no lugar e a
responsabilidade de formar família dando segmento a sua própria geração. Relatos como “ver a
comunidade alegre” mostra que os moradores, apesar das dificuldades inerentes à vida do interior
mantém uma alegria constante, seja no trabalho comunitário quanto nas próprias conversas informais.
Relatos como “morar na comunidade, dos vizinhos”; estar perto da família”, revela a forte presença
de familiares vivendo na mesma comunidade e nas outras, contribui para a o fortalecimento e
consolidação de laços comunitários entre os moradores da Flona.
Há uma rede de apoio familiar na rotina dessas pessoas, bem como uma simplicidade das
relações e da produção que fazem do lugar onde moram uma rede de afetividade. Na interação entre
as pessoas, e destas com o ambiente há uma mobilização comunitária, no trabalho, nos festejos pros
santos, nos cultos, “divertimento estar perto da família”; “diversão, rezar, jogar bola”. Essas relações
são marcadas também, pelas características da vida no interior no qual prevalece a calma e
tranqüilidade, uma vez que não há tantas atividades de lazer como na cidade, mas o silêncio
110
reconfortante e a alegria das pessoas.
Nos aspectos de convivência social há ainda que se destacar alguns relatos que mencionaram
gostar do lugar pela segurança e tranqüilidade “a dormida é tranqüila”; “não tem marginal”; “durmo
de porta aberta, não tem ladrão”; “Aqui a gente dorme despreocupado” ou ainda “não tem tumulto”.
Isso demonstra que a convivência entre os moradores é tranqüila e harmoniosa, livres das intempéries
das cidades.
Lugar de produção material
A área da Flona foi considerada por 16% dos entrevistados como um lugar onde a terra oferece
recursos para o trabalho que ele já conhece e está acostumado a desempenhar. A terra, a água e a
floresta oferecem produtos em abundancia para o trabalho, a certeza de muito trabalho com a garantia
de colheita para o sustento e geração de renda, assim nos relatos: “tudo que planto eu colho” “muita
terra pra plantar”; “plantar guaraná, milho”. Nesse sentido, a terra é o elemento fundamental para
gerar renda e sobrevivência. Os relatos sedimentam que a terra é fértil e que eles tem disposição para
o cultivo da mesma, pois, o esforço do trabalho é recompensado pela colheita.
A terra onde vivem e trabalham, a moradia propriamente representa em muitos casos o único
bem adquirido, proporcionando o sentimento de proteção e garantia. E essa relação com a terra onde
os moradores nasceram e possuem uma história pregressa significa pertencimento e continuidade.
Estas garantias em relação a terra traz a certeza de continuidade da produção, pois é naquele lugar que
os moradores aprenderam a lidar com os recursos e destes tirar a sua produção que tanto é para
negociação com os barcos; vendas nas cidades mais próximas como Maués e Nova Olinda do Norte e
para o consumo.
Lugar de produção material e convivência social
Para 28% dos moradores das localidades, o lugar onde vivem é fonte de satisfação pela junção
de vários fatores, tanto pelo lugar ser de produção material assim como, por ser o lugar de
convivência social, chegando até a dizer que tudo o que existe neste lugar “é bom”. A localidade onde
vivem é compreendida pelos moradores como sendo um lugar onde as relações sociais estão em
mútua interação com o trabalho na terra. O convívio social existe e se fortalece por um motivo em
comum: o bem estar e sobrevivência das pessoas através do trabalho e a relação com o ambiente.
111
Relatos como “Gosto de andar pela comunidade, pescar e conversar com os camaradas” revela que a
convivência entre os moradores é saudável. A base das relações principalmente as familiares estão
ligadas principalmente pelo cultivo da terra: “Gosto de viver em família, dos colegas e do trabalho”.
Alguns relatos revelam que a vida em família, a união a convivência fortalece os laços afetivos
estendendo-se até aos colegas.
Na Flona a presença religiosa é fator muito presente, por isso alguns relatos revelam que
Gostam de trabalhar e do culto”. Outros associam as atividades diárias e o lazer, assim os relatos
revelam“Gosto de trabalhar e jogar bola”. Em outros o prazer do alimento retirado do rio e consumido
sem passar por processo de congelamento revelam a satisfação por estar nesse lugar, dessa maneira os
relatos revelam“Gosto do alimento fresco”; Há ainda a satisfação pelos ambientes físicos como dizer
que“ gostam do terreno”; da casa”. Para os moradores da Flona a família significa a força de trabalho,
a boa convivência e o alicerce seguro, assim pode-se perceber que todos ajudam em todas as
atividades inclusive os filhos menores ajudam na roça e nos serviços de casa. E isto é visto como algo
positivo pelos pais, pois vivendo dessa forma as crianças crescem longe da violência, aprendem o
valor do trabalho e da responsabilidade e do respeito pelos outros.
Não só o trabalho como os produtos que resultam do trabalho é dividido entre a rede social
(parentes, vizinhos), havendo solidariedade entre os membros do grupo. Segundo Fisher (s/d), em
sociedades rurais a organização do trabalho se baseia numa solidariedade coletiva. O essencial não é
a ferramenta, mas a maneira comunitária de trabalhar: o trabalho é antes de mais o fato de um grupo
que se encontra num determinado lugar para, em conjunto realizar uma atividade. A Flona se
configura para esses moradores como um lugar onde as relações sociais estão intrinsecamente ligadas
ao uso da terra. O convívio social existe por um motivo em comum: o bem estar das pessoas através
do trabalho e da relação com o ambiente. Para esses moradores os recursos materiais, a natureza e a
sua própria vida estão imbricados de tal forma que estes não se percebem vivendo ou existindo noutro
lugar que não seja na Flona. Dentro dessa UC observou-se que há tranqüilidade em relação a
conivência social. Desse modo, a perspectiva de um descompasso dessa harmonia pode gerar
insegurança. Portanto, esses moradores são agentes fundamentais de estrutura de um
desenvolvimento sustentável na Flona.
Aspectos de insatisfação com o lugar onde vivem
Da mesma forma que os moradores se sentem satisfeitos por ali viverem, há moradores que
relataram alguma insatisfação com o lugar onde vivem. Para esses moradores, os aspectos de
112
insatisfação decorrem, basicamente por quatro motivos: problemas nas relações sociais (44%)
problemas relativos às intempéries do ambiente natural problemas nas relações sociais (14%), e
problemas com a falta de serviços e benefícios sociais (13%); gosta de tudo (21%) (Gráfico 20).
Gráfico 20 – Aspectos de insatisfação nas comunidades
Problemas nas Relações
Sociais
21%
52%
14%
Ausência de serviços e
benefícios
Intempéries
13%
Gosta de Tudo
Problemas nas relações sociais
Viver em comunidade onde a convivência é, sobretudo coletiva traz inevitavelmente conflitos
interpessoais, que em ordem menor não se diferencia de problemas que ocorrem em qualquer grupo
ou lugar. Em toda a história da humanidade nunca se ouviu falar em uma sociedade onde todos
convivessem na mais perfeita ordem, onde não houvesse conflitos ou intrigas. Assim pode-se
observar que essas discórdias acompanham as gerações, embora não tenham a conotação dos tempos
antigos aparecem como indicadores de insatisfação dos moradores da Flona, deste modo, para 44%
dos moradores as insatisfações com o lugar ocorrem devido: “algumas intrigas na comunidade”;
fofoca, fuxico e intriga”; “bêbados fazendo arruaça”.. O consumo de bebidas alcoólicas é um motivo
de transtorno nas comunidades, entretanto, o tráfico de drogas é um problemas que deixam os
moradores em alerta. Em períodos anteriores os comunitários sofreram com o tráfico turbulência na
região, eles se sentiam reféns dos traficantes. O tráfico de drogas no rio Paraconi, era como disseram
os moradores um caso grave. Embora haja uma calma aparente eles ainda temem que tudo volte a
acontecer. Tal assunto chegou a ser veiculado na mídia nacional como uma área de grandes conflitos.
113
Atualmente embora pareça resolvido, ainda há relatos que alguns traficantes viajam pela área assim
pode-se nos relatos as insatisfações de morar no lugar “quando os barcos passam com traficantes pelo
rio” ou porque alguns consumem bebida alcoólica e causam insegurança entre os demais. A
insegurança, a incerteza da impunidade ocasionada pelo passado difícil com o trafico de drogas
acabam gerando mal-estar nas comunidades da Flona.
Problemas relacionados às intempéries do ambiente natural
Vivenciar as intempéries do ambiente natural causa insatisfação por dificultar os trabalhos mais
básicos como os serviços e afazeres de casa e trazem desconforto. Para 14% dos moradores as
intempéries do ambiente natural são fatos deixam o lugar menos prazeroso para viver.
O comportamento desses grupos sociais está em dependência direta com a natureza e seus
ciclos sazonais e assim adaptar sua forma de vida as condições climáticas desse modo os relatos
reafirmam tais insatisfações “quando enche o terreno fica feio”; ou quando seca “acho a água longe”
ou mesmo a chuva é fator de desagrado, pois dificulta a saída para o trabalho, para a pescaria e outros
afazeres. Há relatos que mencionam a dificuldade de conseguir alimento na época da cheia “Fica ruim
pra conseguir comida”. A seca dos rios causa muitos transtornos aos moradores, principalmente no
abastecimento de água, pela formação de barrancos e a distância das casas em relação ao rio tornando
esse trabalho doméstico mais difícil, assim os relatos reafirmam esse descontentamento “No tempo
de seca fica muito longe pra fazer as coisas”. Trabalhar nas condições de contato com a natureza, para
esses moradores é expor o corpo a todas as dificuldades físicas. Agüentar o calor escaldante dos raios
solares no período da seca também é motivo de desconforto, assim como a lama que se forma nas
margens dos rios e nos caminhos que levam ao próprio rio ou a qualquer outro lugar. Para os
moradores vivenciar as condições climáticas causa insatisfação por dificultar o trabalho na roça, no
inverno (quando chove muito) “as crianças não podem sair para brincar”, não dá para trabalhar e no
verão o calor reduz a resistência física por ser muito quente. Enquanto para alguns moradores as
intempéries do ambiente natural são fatores de desagrado outros inconvenientes relatados pelos
moradores referem-se às ações causadas pelo próprio homem como as grandes queimadas, assim o
relato menciona a insatisfação dos moradores “As grandes queimadas desnecessárias”. Isso realça
que as ações antrópicas também são indicadores de desequilíbrio climático na região forçando muitas
vezes mudanças na rotina desses moradores.
Alguns relatam ainda, a falta de atenção que certos moradores têm com a criação de animais
como as galinhas que ficam soltas e comem a horta.
114
Falta de serviços e benefícios sociais
As agruras da vida no interior e a comparação com o conforto e possibilidades de vida em
centros urbanos onde supostamente há uma oferta maior de benefícios, faz com que os moradores
notifiquem mais ainda o distanciamento que estão dessas possibilidades. Os serviços e benefícios
vindos da assistência de programas dos governos que propiciam maior conforto e qualidade de vida
seja na cidade ou no interior. Para os moradores a falta de serviços básicos como energia elétrica nas
casas é um fator de descontentamento em relação ao lugar onde vivem, pois os condiciona a
desenvolver determinadas tarefas em horas que não tem disposição do serviço: “à noite não tem luz,
estar no escuro”; “da falta de luz em certos momentos do dia”. Neste sentido, o descontentamento se
refere ao acesso a algum conforto ou benefícios que requerem programas de assistência pública nos
diversos âmbitos da vida moderna, melhorias na infra-estrutura do lugar, recursos que trazem melhor
qualidade de vida para os moradores. “Estamos esquecidos principalmente na saúde, pouco recurso”;
“a falta de médico, cuidado com a saúde; falta escola”. A ausência de escola reclamada não é
necessariamente do espaço físico destinado a essa atividade, e sim pela ausência de profissionais, mas
precisamente de professores que se disponham a suprir essa necessidade nesses lugares. Muitos
professores segundo relatos dos moradores não agüentam viver longe da cidade ou da família e
passam pouco tempo no local. Isso tem sido um problema constante. Tentando minimizar esses
problemas a Prefeitura de Maués abriu concurso para esses locais, assim o profissional que passar terá
que se adaptar as condições locais.
Outros relatos mencionaram a falta de transporte para levar as pessoas doentes até a cidade mais
próxima. Embora tenha um barco fazendo o serviço de resgate dos doentes, esse serviço ainda não
atende satisfatoriamente aos moradores.
O suposto tráfico e plantio de maconha
Observa-se que durante as conversas informais alguns moradores das comunidades se mostram
bastante insatisfeitos a respeito dos rumores de trafico de drogas e plantio de maconha. Embora esse
assunto seja recorrente por algumas pessoas nas cidades vizinhas, nada foi verificado comprovando
ou não esse fato. Porém, ao serem perguntados sobre isso, de modo espontâneo, os moradores pouco
falam e alguns se sentem constrangidos por estarem sendo citados dessa forma.
Logo no inicio das entrevistas nas primeiras comunidades da Flona pouco se ouviu falar sobre o
tráfico de drogas no Rio Paraconi, mas ao adentrar para as comunidades mais distantes esses fatos
foram ficando mais evidentes e comentados pelos moradores com certo desconforto. Segundo alguns
115
moradores, algumas comunidades seriam coniventes com os traficantes, os quais já haviam se
instalado na área amedrontando quem não quisesse participar do “esquema”. Em um breve relato uma
moradora chega a mencionar as possíveis razões de alguém estar envolvido ou vir a se envolver, ou
seja, de que as pessoas não têm emprego e por isso supostamente trabalhassem para os traficantes. Em
uma das comunidades há ainda um clima de revolta porque esta é frequentemente apontada como
uma das que plantavam maconha, esse fato até hoje traz ressentimento como se pode perceber no
relato do morador:
“Somos pessoas direita, trabalhamos para manter a nossa comunidade unida e as pessoas vêm falar essas coisas”. Vou
lhe dizer a verdade teve época aqui que a gente tinha medo até de ir no igarapé pescar para comer, porque os traficantes
poderiam estar por lá e atirar em nós. Foi uma época muito difícil, a gente não poder andar na nossa própria área,
porque eles ficavam passando de lá pra cá naquelas voadeiras e armados. Outro fato que aconteceu, foi um dia que eu fui
pra Maués e lá um conhecido me parou na rua e perguntou como estava a plantação de maconha na minha comunidade,
eu fiquei muito chateado e disse pra ele que lá mesmo não tinha isso e quem estiver falando que vá lá e prove que tem
isso. Depois de algum tempo nós fomos outra vez a Maués e eu fiz questão de falar com esse cidadão e lhe disse: Agora vá
lá no barco e veja o que eu trouxe pra vender aqui em Maués é isso que nós estamos plantando lá (milho, feijão, melancia
e farinha) [...]
Pode-se observar pelo relato do morador que embora o clima de tráfico tenha se acalmado isso
ainda repercute na moral dos moradores e tais acontecimentos isso são aspectos de insatisfação ainda
muito presente. Embora a maioria dos moradores tenha expressado os motivos de insatisfação com o
lugar há uma parcela de 21% que disseram não ter nenhum descontentamento com o lugar, isso
significa que para esses moradores as dificuldades inerentes à vida do interior são adversidades
enfrentadas dentro de suas possibilidades.
Intenções de mudança para outros locais
As peculiaridades de um determinado lugar podem despertar nos moradores o desejo de
mudança para outro lugar de acordo com as expectativas e necessidades de cada pessoa ou família,
assim como o desejo de permanência no mesmo local. Dos moradores entrevistados, a maioria (56%)
mudaria para a cidade, porém a mudança seria para outras localidades dentro da área de abrangência
da Flona; entretanto, 44% permaneceriam no local ou nas imediações (Gráfico 21).
116
Gráfico 21 – Intenções de mudança numa eventualidade que surgir
44%
56%
Interior
Cidade
Quanto às intenções de mudança da Flona 56% mencionaram que mudariam para a cidade, uns
pela educação dos filhos “mudaria para a cidade por causa dos estudos dos meus filhos” ou “por causa
do colégio dos meus filhos” A esperança de dar aos filhos um futuro melhor por meio da educação
formal são alguns indicadores de mudanças. Para esses moradores questões simples e garantida pela
Constituição Brasileira só são possíveis se houver deslocamento do lugar onde residem há anos para
uma cidade, só assim a educação dos filhos seria garantida, seria mais fácil de conseguir. A buscar de
melhores condições de vida fazem alguns moradores abdicarem da vida tranqüila, porém de trabalhos
duros e pesados da roça em busca de mais recursos e trabalhos que não demandasse tanto sacrifício,
nesse sentido os relatos evidenciam a vontade de mudança “melhoria a vida, procuraria um trabalho e
tudo é mais perto”; Na cidade tem empresa, firma para trabalhar”. Compartilhando a vontade de vida
melhor outros falam que na cidade tem tudo mais próximo e ainda serviços básicos de infra- estrutura
como água encanada, luz comércio e outras facilidades que por ora as comunidades não oferecem,
dessa forma os moradores mencionam o desejo de mudanças referindo-se que “Na cidade tem tudo,
luz, água”. Verifica-se que os moradores buscam por melhores condições de vida na cidade. Alguns
relatos informam que essas intenções são devido a idade avançada, sentem sem condições da lida
dura na roça “somos idosos, não temos mais força pra trabalhar”. Verifica-se que esses moradores
sentem vontade de ir para a cidade por não se sentirem mais produtivos no interior. O trabalho outrora
executado com agilidade torna-se um fardo pesado com o passar dos anos, por isso, a vontade de
mudança. Viver na cidade significa estar “próximo” de maiores oportunidades. No olhar desses
moradores para “crescer” um pouco mais mudar seria a solução mais sensata, pois o interior não
117
oferece as mesmas oportunidades de emprego, comércio, saúde, comunicação e outros benefícios que
melhorariam a qualidade de vida dessas pessoas.
Vale ressaltar que as intenções de mudança não representam planos concretos de mudança, mas
indica uma preferência diante de uma possibilidade de mudança. Outros demonstraram uma possível
intenção de mudança baseando-se na localidade onde possuem parentes, expressando a vontade de
estarem perto dos familiares, “mãe do meu marido mora lá”; “Tenho filhos morando em Itacoatiara”.
Outros relatam que gostariam de ir muito além como por exemplo, no relato o morador expressa que
gostaria de ir para São Paulo, entretanto, a maioria mudaria para cidades mais próximas como Maués,
Itacoatiara ou Nova Olinda do Norte, essas pequenas cidades ainda mantêm características
semelhantes as comunidades da Flona, ambientes tranqüilos, livres de violência, porém possuem
comércio, educação, saúde e comunicação.
Morar na cidade não é um atrativo para muitos moradores da Flona, assim 44% deles afirmaram
que gostariam de permanecer no interior ou mudar da localidade atual de moradia, para outro lugar no
interior mesmo, de preferência na mesma área da Flona. Para esses entrevistados eles nunca pensaram
em mudar para a cidade porque já estão acostumados com a tranqüilidade, o silencio e a liberdade que
a vida no interior proporciona “estou acostumado com a vida aqui”, ou “nasci no interior e não me
acostumo com a vida na cidade”; “porque me criei no interior e não me acostumo com a vida na
cidade”; “gosto do interior, fui criado aqui, to acostumado”; porque tem menos preocupação e as
pessoas são mais livres. A preocupação com a integridade da família é um fator de preferência por
morar no interior, assim relata o morador “ é mais fácil de manter a família”; “sabe que daria conta de
cuidar da família no interior ”. Morar na cidade demanda custos que nem sempre poderiam pagar ou
controlar, assim alegam que pra se viver nesses lugares precisariam ter dinheiro para comprar os
alimentos básicos “viver aqui não precisa comprar alimento” ou “na cidade tudo é comprado”; “aqui
tudo é de graça, na cidade precisa de dinheiro”; “lá tudo é comprado, a minha família é grande tenho
muita despesa”.
Além desses indicadores que mostram a preferência dos moradores por permaneceram no
interior, ainda prevalece à certeza da vida tranqüilidade, tanto em relação ao barulho que existe na
cidade quanto a ausência de violência “aqui a gente não ta perseguido de maldade”; “muita facilidade
e pouca violência; “o clima é diferente, aqui é mais tranqüilo, o cara anda pra onde quer”; aqui vivo
tranqüila, na cidade tem muita bebedeira, pessoas fumando”. Percebe-se que esses moradores não
iriam se adaptar com a vida agitada da cidade já que são acostumados com a vida tranqüila do interior.
Outro fato mencionado pelos moradores de permanência no interior é certeza de espaço de
trabalho, de alimento “aqui a gente planta o que quer”; “é mais fácil de conseguir o alimento”. Mudar
para a cidade seria uma dolorosa adaptação, eles se sentiriam inseguros, sem liberdade, pois no
interior eles conhecem cada canto da floresta ou do rio, sabem onde encontrar alimento para
118
sobreviver, eles conhecem os perigos e as facilidades.
Assim ao se pensar em um Plano de Uso para a Flona há que se pensar principalmente nesses
moradores que mesmo sem nenhuma expectativa de melhoria para o local, ainda preferem
permanecer no lugar.
Dificuldades enfrentadas
Sabe-se que muitas pessoas encontram obstáculos na vida de toda ordem. Para os moradores da
Flona as dificuldades encontradas no dia a dia são várias, mas os aspectos relacionados à
infra-estrutura própria do local e o distanciamento dos benefícios são mencionados por 56% dos
entrevistados (Gráfico 22).
Gráfico 22 – Aspectos de dificuldades vivenciadas pelos moradores
Moradia e Acesso Precário
Falta de Alimentação
3%
9%
Intempéries do Ambiente
22%
56%
6%
4%
Ausência de emprego e
Renda
Relacionamento Conflituoso
Não tem Dificuldades
Para 56% dos moradores as dificuldades de transportes, educação, saúde, moradia,energia e
água foram os mais evidentes nessa categoria. Eles falaram da dificuldade de transportar pessoas
doentes que necessitam de atendimentos urgentes na cidade, “Procurar uma saúde. Se adoecer grave,
até chegar na cidade está morto”; “pouca saúde, não tem recursos quando a gente adoece”; doença,
porque não tem transporte”. Segundo eles há um barco que faz esse serviço, entretanto, nem sempre o
doente pode esperar. Nesses casos os moradores gostariam de resolver essa situação tendo nas
comunidades um barco que pudesse ser utilizado para esses fins. Mencionaram ainda sobre a falta de
infra-estrutura comercial nas comunidades. Quando precisam comprar mantimentos precisam
119
deslocar-se para as cidades mais próximas. Assim disseram que “comprar o rancho”; “dificuldade de
comprar produtos”; “ não ter onde comprar as coisas”, é difícil, não apenas por falta de dinheiro, mas,
pela ausência de comerciantes na área. Há ainda as dificuldades com relação a educação, os
moradores gostariam que houvesse nas escolas ensino médio, embora em duas comunidades já tenha
ensino médio, ainda não são suficientes para os moradores. Nesse caso eles necessitam se deslocar até
a escola aonde há essas séries e precisam mais uma vez do transporte, um barco escolar. Para 22% as
dificuldades estão relacionadas com a ausência de emprego e renda. Os moradores mencionaram que
sobreviver nesse s lugares torna a vida mais difícil. Isto pode ser constatado nos relatos “é difícil
conseguir dinheiro”; “falta de renda”; “acesso a emprego”. De fato, os moradores dessas
comunidades não podem contar com salários vindo de empregos. Todo dinheiro adquirido é fruto de
muito trabalho na roça e nas plantações de guaraná.
Outra parcela de 9% dos moradores acredita que as dificuldades são devido as relações sociais.
Nos relatos os moradores mencionaram que “união dos moradores”; “falta de participação dos
comunitários”; “briga por causa da terra”; “juntar os jovens e os casais que não querem saber de
nada”. Entretanto, é oportuno lembrar que nestas comunidades há uma movimentação acentuada dos
coordenadores dos setores para manter o bom relacionamento entre os moradores.
No entanto, para 6% dos moradores as dificuldades estão relacionadas a falta de alimentação.
Segundo eles, a época da enchente dos rios fica difícil adquirir peixe, a caça já está escassa devido o
desmatamento. Muitos moradores estão deixando de cultivar roça de mandioca e plantio de outras
culturas comestíveis para investir em outro tipo de plantação como o guaraná e pau-rosa, isso tem
levado a carência e a falta de alimentos. Alguns relatos mencionaram que há pessoas passando
necessidade, neste caso passando fome. Nestes casos há que se pensar em uma orientação para que
esses moradores não desistam de cultivar ou fazer criações de pequeno porte para que não falte
alimento para eles.
Para 4% dos moradores as causas naturais são as maiores dificuldades, pois quando o nível das
águas do rio baixa, tudo fica mais árduo. Os serviços básicos do dia-a-dia, como buscar água,
cozinhar, lavar a roupa, deslocar-se para a roça, demanda mais tempo. Por outro lado, na época da
cheia esses serviços ficam mais amenos, entretanto, surgem às doenças típicas desses períodos.
Embora, a maioria dos moradores tenha mencionado algum tipo de dificuldade, há uma parcela
de 3% que disseram não ter dificuldades de nenhuma ordem.
Superando as dificuldades
120
A presente pesquisa também se ocupou em investigar como essas dificuldades são ou poderiam
ser superadas pelos moradores. As respostas mais freqüentes foram agrupadas nas seguintes
categorias como mostra a Tabela 14:
Tabela 14 – Atividades de superação utilizada pelos moradores diante das dificuldades enfrentadas
Categorias
FI
%
30
26
32
16
28
14
Compra de
Barcos ou
Canoas
14
12
Colocando
Comércio
7
6
Organização
dos Moradores
5
4
Não Sabe ou
Não tem
Solução
10
9
Financiamento
TOTAL
2
116
2
100
Ajuda de
Moradores
Poder Público
Com Trabalho
Os moradores demonstraram há muitas dificuldades, entretanto, para tudo há uma solução.
Quando solicitados a responderem a respeito de como fazem ou fariam para que essas dificuldades
fossem sanadas 26% mencionaram que os próprios moradores são as pessoas a quem recorrem.
Para outra parcela de 28% muitas dificuldades só podem ser resolvidas ou superadas com a
ajuda do Poder Público, pois, a maioria deles está relacionada com infra-estrutura de transporte,
saúde, energia, poço artesiano e educação. No caso da saúde, por exemplo, os moradores
mencionaram que há necessidade de ter nas comunidades uma canoa de alumínio com motor 40 para
fazer transporte dos doentes, pois o serviço prestado pelo barco ambulância não atende
satisfatoriamente as comunidades, outra maneira de superar, ou seja, amenizar mais essas
dificuldades seria colocar postos de saúde com pessoal qualificado para atendimento. Assim muitos
casos “considerados” como urgência poderiam ser resolvidos no local mesmo.
Com relação à superação de locomoção fluvial, 12% mencionaram que compraram canoas e
motor rabeta para fazer esse serviço. Há ainda um barco regular do tipo “recreio” que faz transporte
de mercadorias e pessoas, mas, ainda não supre a necessidade dos moradores. Então alguns com
poder aquisitivo melhor compraram canoas com capacidade maior e superaram esse problema.
121
Mesmo assim acreditam que seria melhor ter mais um barco desses fazendo esse serviço.
Para superar a dificuldade com relação a compra de alimentos não perecíveis 6% dos moradores
colocariam comércio nas comunidades, assim não precisariam deslocar-se até as cidades mais
próximas para aquisição desses alimentos.
Entretanto, outra parcela de 9% dos moradores disse que não sabem como superar as
dificuldades ou mesmo que as mesmas não têm solução. Podemos perceber que essa parcela de
moradores não acredita que haja solução para superar tais dificuldades. Ao se pensar na
implementação do Plano de Manejo para a área da Flona, deve-se levar em consideração essa parcela
de moradores e envolvê-los de modo que voltem a ter esperanças e posteriormente saibam que as
soluções em sua maioria vão depender da tomada de decisão deles. Para outra parcela de 2% a
superação das dificuldades está relacionada a financiamento ou investimentos em projetos que leve
aquela área meios de cultivar melhor a terra.
Expectativas
Como em qualquer outro lugar, nas comunidades da Flona, os moradores também têm suas
expectativas de melhorias e mutua ajuda. Podemos observar que as expectativas estão relacionadas
com as dificuldades enfrentadas no dia-a-dia (Gráfico 23).
Gráfico 23 – Expectativas de melhoria para as comunidades
1%
27%
Infra-Estrutura Local
56%
16%
Benefícios sociais
Produção e Trabalho
Está Tudo Bem
Uma das maiores expectativa está relacionada a infra-estrutura das comunidades, para 56% dos
122
moradores se eles tivesse condições de investir no local, melhorariam o transporte, a educação, a
saúde, a comunicação, água encanada, poço artesiano, construiriam casas melhores para os
comunitários, investiriam no comércio, construiriam ainda casas para que os professore tivessem
mais conforto durante o período letivo e não sentissem vontade de voltar para a cidade. Os relatos
revelam tais expectativas:
Recurso para melhorar o telefone.
Colocaria um motor na comunidade.
Se tivesse posto de saúde, comércio perto.
Posto de saúde, voadeira para levar os doentes.
Mandava fazer posto de saúde, mandava as pessoas fazer cursos na saúde pro atendimento dos comunitários.
Entretanto, para outra parcela de 18% dos moradores as expectativas estão relacionadas ao
trabalho. Os relatos demonstram tais expectativas.
Ajudaria os moradores com dinheiro e com trabalho.
Convocaria os moradores de porto em porto para trabalharem e não dependerem mais dos aposentados.
Melhoria o trabalho, alguma coisa que rendesse dinheiro.
Emprego para os jovens para as pessoas que não tem ganho.
Trabalhar em conjunto.
Dar emprego para as pessoas do interior.
Percebe-se que os moradores gostariam de melhorar a vida deles e dos outros tanto com ajuda
financeira quanto com emprego. Há ainda os que gostariam de não depender mais dos aposentados,
para isso convocaria as pessoas e formaria grupos de trabalho para que dele tirasse o seu sustento e
dos demais.
Outra parcela de 16% tem a expectativa de ajuda social para os comunitários. Assim pode-se
observar nos relatos essa vontade de colaborar de uma maneira diferente, mas sempre em prol dos
comunitários. Esses moradores mencionaram o seguinte quando responderam suas expectativas:
Ajudar alguém com fome.
Daria um rancho mensal.
Montava programas para mulheres, artesanato, por exemplo.
Melhoraria as condições de vida das pessoas dando um rancho.
Comprava material de esporte para os times.
Ajudaria as pessoas com salário ou mesmo com um rancho.
Organizar a comunidade para ajudar os mais necessitados.
123
Para outra parcela de 9% dos moradores, melhorar a produção é uma das expectativas, para
tanto eles necessitam de ajuda profissional para que atenham êxito. Assim ao serem questionados
sobre suas expectativas disseram que:
Auxílio técnico para os agricultores da região.
Melhorariam a produção da terra.
Aumentar a produção para ter mais recurso.
Aumentaria a produção agrícola.
Embora a maioria tenha algum tipo de expectativa em relação a melhorias nas comunidades da
Flona, há uma parcela de 1% que disse estar tudo bem. Observa-se que a maioria dos moradores
gostaria de melhorar sua comunidade para que possam trabalhar e permanecer no interior.
Empreendedorismo
As expectativas relacionadas aos possíveis empreendimentos a serem estimulados nas
comunidades são bastante diversas (Gráfico 24).
Gráfico 24 – Expectativas de empreendimento para as comunidades
4%
32%
24%
Extrativismo
Cooperativas
Agricultura
8%
7%
Atividades Sociais
Criação de Animais
25%
Não sabe ou NR
124
Projeto de extrativismo
O extrativismo é a atividade humana mais antiga que a agricultura, a pecuária e a industria.
Significa a coleta de elementos da natureza de origem animal, vegetal ou mineral. No Brasil a
extração de produtos nativos da biodiversidade é uma atividade constante na história, atravessando
ciclos econômicos, encontra-se épocas em que se constituía como principal atividade regional.
Dentre esses períodos destacaram-se a extração das denominadas “drogas do sertão”, borracha,
madeira, castanha, metais preciosos, cacau, entre outros produtos. No século XX prevaleceu na
Amazônia a prática do extrativismo da borracha, da castanha e da madeira perpetuando-se até os dias
atuais.
Entretanto, embora seja comum em outras áreas da Amazônia o extrativismo dos produtos
acima, na Flona o extrativismo não está baseado somente na retirada dos recursos naturais. Nesta área
para 32% dos moradores um dos projetos que certamente daria certo seria o plantio consorciado de
guaraná e pau-rosa, banana, cupuaçu, melancia. Os moradores não estão preocupados apenas em
retirar os recursos naturais, mas, no lugar da floresta derrubada fazer plantação de guaraná e pau-rosa
que daria um retorno financeiro melhor que da agricultura em si, e ainda evitaria maiores
desflorestamentos. Os plantios de guaraná e pau-rosa seriam para todas as gerações e associado a essa
cultura outras plantações consorciadas serviriam tanto para alimentação como para venda do
excedente.
Buscando um melhor entendimento separamos as atividades de extrativismo, verifica-se que as
mais respostas mais freqüentes foram: Projeto de Plantação de Guaraná 38%; Projeto de Guaraná e
Pau-Rosa (14%); Projeto consorciado de Guaraná e outras culturas (melancia, cupuaçu, etc) (32%);
Projeto extração e beneficiamento da madeira (5%); Projeto de manufatura de móveis e Programas de
artesanato (11%) com palha e barro (Gráfico 25).
Gráfico 25 – Tipos de atividades de extrativismo com interesse para o empreendedorismo
5%
38%
32%
Guaraná
guaraná e Pau-Rosa
Artesanato
Guaraná e outras culturas
11%
14%
Madeira
125
Projeto de agricultura
Há cerca de 10 mil anos, o ser humano começou a praticar a agricultura, mudando radicalmente
a sua vida e a face do Planeta.
Com a revolução agrícola, acredita-se que as mulheres eram, em geral, responsáveis pela coleta
de raízes e frutos, e assim puderam observar que as sementes das plantas, uma vez enterradas no solo,
davam origem a novas plantas. A agricultura teria sido então, uma invenção da mulher. Assim, além
de caçar, pescar e coletar, os seres humanos começaram a plantar e a colher.
O desenvolvimento da agricultura obrigou os grupos humanos a viver junto das terras de
cultivo, onde fundaram as aldeias, reunindo famílias vizinhas. Algumas famílias eram mais
numerosas do que as outras ou tinham um rebanho maior. Apesar dessas diferenças, todos os assuntos
de interesse da comunidade eram tomados em conselhos formados pelos chefes das famílias.
A agricultura é uma prática milenar de transformação da terra que prevalece até os dias de hoje.
Depois que o homem descobriu a agricultura deixou de ser apenas coletor, fixou residência passou a
cultivar a terra para extrair o sustento. A partir desse período começaram a surgir as primeiras e
povoados. Com o aumento da demanda a agricultura foi se expandindo. Embora atualmente haja
mecanismo e tecnologias para essas práticas o que se observa em muitos lugares da Amazônia é a
utilização da mesma metodologia dos nossos antepassados. Nas comunidades da Flona, por exemplo,
os moradores utilizam-se dos mesmos processos e fazem da agricultura um meio de sobrevivência,
além de vender o excedente.
Assim ao serem solicitados a responder quais projetos dariam certo, 25% responderam que
trabalhar com roça, ou seja, com agricultura seria a melhor solução para eles. Assim dentro dessa
categoria vários sub-projetos foram sendo evidenciados tais como: Plantações diversas tais como milho, arroz, feijão, melancia, macaxeira - (69%); Plantação de mandioca (14%); Plantação de
banana (10%); Plantação de cupuaçu e graviola (7%) (Gráfico 26).
126
Gráfico 26 - Plantações passíveis de projetos de empreendedorismo
7%
Plantações Diversas
14%
plantação de Banana
10%
Plantação de Mandioca
69%
Plantação de Cupuaçu e
Graviola
Desde que o homem deixou de ser nômade mantém a cultura tanto da agricultura quanto da
domesticação de animais. Assim para 24% dos moradores da Flona os projetos que dariam certo na
percepção deles seriam a criação de animais tanto de pequeno quanto de grande porte. A demanda por
alimentos é cada vez mais acentuada. Acredita-se que isso é devido a alguns fatores como, por
exemplo, a grande demanda populacional.
A criação de animais domésticos se dá de forma mais incipiente. De forma geral esses animais
são reservados para consumo principalmente na falta de peixe e caça.
Verificou-se que na maior parte das localidades os moradores, principalmente as mulheres
criam, porcos e galinhas. Em uma das comunidades observou-se um galpão que anteriormente servia
de galinheiro. Segundo informações era de um projeto que não deu certo por falta de
acompanhamento de um técnico nessa área. Percebeu-se ainda que os moradores não têm o hábito de
criar animais presos, os que foram observados andavam soltos pelos terreiros e na sua maioria eram
galinhas.
Para os moradores dessa Unidade de Conservação reforçar projetos que dariam certo além da
garantia de não faltar alimento na mesa deles, são os seguintes projetos: Criação de peixes (43%);
Criação de galinha (29%); Criação de gado (21%); Criação de porco e carneiro (7%) (Gráfico 27). É
oportuno lembrar que tais projetos devem estar de acordo com a legislação que rege a conservação da
Flona, além de haver a necessidade de acompanhamento técnico em todos esses seguimentos para que
não incorra em prejuízos para os moradores pela falta de conhecimento para a manutenção e melhor
aproveitamento dos projetos.
127
Gráfico 27 – Atividades de criação de animais passiveis de empreendedorismo
7%
43%
29%
Criação de Peixe
Criação de Gado
Criação de Galinha
Criação e Porco e Carneiro
21%
Ainda com relação a projetos 8% dos moradores mencionaram que, o que daria certo na Flona
são projetos sociais. Esses moradores vêem a necessidade de construir casas para os comunitários,
ajudá-los com cestas básicas, ir de casa em casa promovendo o bem estar das crianças, fazer clubes de
mães para que, além do trabalho na roça e em casa as mães tenham a oportunidade de aprender algo a
mais.
Projeto formação de cooperativa
Sabe-se que uma cooperativa é uma entidade de direito privado, dotada de personalidade
jurídica e caracterizada pelo agrupamento de pessoas para a realização e consecução de objetivos e
ideais comuns, sem finalidade lucrativa. Em sentido mais amplo, associação é qualquer iniciativa
formal ou informal que reúna pessoas físicas ou outras sociedades jurídicas com objetivos comuns,
visando superar dificuldades e gerar benefícios para os seus associados. Formalmente, qualquer que
seja o tipo de associação ou seu objetivo pode-se dizer que a associação é uma forma jurídica de
legalizar a união de pessoas em torno de seus interesses e que sua constituição permite a construção
de condições maiores e melhores do que as que os indivíduos teriam isoladamente para a realização
dos seus objetivos. A associação então, é a forma mais básica para se organizar juridicamente um
grupo de pessoas para a realização de objetivos comuns.
Assim ao serem solicitados a responder sobre os projetos que dariam certos na Flona 7% os
128
moradores mencionaram que organizar as comunidades e formar associações. Percebe-se que esses
moradores ao mencionarem isso como uma forma de projeto tem noção de que todos precisam estar
unidos para alcançarem seus objetivos conseguir mais recursos em beneficio das comunidades.
Sabe-se que para elaboração de um plano de manejo ou plano de uso de uma determinada área há que
se pensar também como esses moradores se organizam. A organização deles ou o pensamento em
organizar-se já representa pontos positivos em relação ao Plano de Manejo da Flona.
Embora a maioria tenha respondido a respeito dos projetos há ainda uma parcela de 4% não
sabem o que daria certo na Flona ou não responderam. Acredita-se que isso seja devido a
simplicidade da vida que levam ou realmente a falta de informação sobre o potencial de recursos que
poderiam ser desenvolvidos naquela área.
Ajuda externa
Sabe-se que os meios de sobrevivência são muito difícil no interior, não há infra-estrutura
básica de saúde, educação, transporte e outros direitos conferidos aos cidadãos pela Constituição
Federal Brasileira. Morar em áreas distantes das cidades é conviver com todos tipos de adversidades.
As ajudas nem sempre chegam e quando chegam são poucos que as recebem (Gráfico 28).
Gráfico 28 – Tipo de ajuda externa recebida pelas comunidades
2%
4%
16%
Nenhuma
Instituição Pública
Familiar
78%
Outras
129
A maioria 78% nunca recebeu ajuda de ninguém. Uma parcela de 14% recebeu ajuda da
prefeitura de Maués dando-lhes subsídios para melhoria das casas. Outros 2% recebem ajuda dos
filhos que moram nas cidades próximas como Itacoatiara, Maués, Nova Olinda e Manaus. E outra
parcela de 2% foi beneficiada com ajuda do Incra
SIGNIFICADO DO LUGAR
Morar em algum lugar é mais do que habitar uma casa localizada num determinando ponto
geográfico. É, sobretudo se sentir parte daquele ambiente físico, o qual se constitui num universo de
significados seja de pertença, de habitabilidade ou de territorialidade (Fischer, s/d22). Tais
significados se referem a um processo no qual as pessoas transformam os lugares em algo pessoal,
exercendo sobre este um domínio físico e psicossocial através de atividades que indicam seu
repertório pessoal e coletivo. Este modo de agir sobre o lugar se dá a partir das experiências de vida e
das aquisições culturais, cujo repertório define para o indivíduo um senso de pertencimento ao lugar e
compromisso social (Candido e Higuchi, 200523; Pereira, 200524 e Padilla e Higuchi, 200625). Esse
compromisso é a pedra angular para transformações, principalmente de preservação dos recursos
naturais e de convivência social.
Os significados atribuídos ao lugar onde os moradores vivem foram agrupados a partir das
justificativas apresentadas: a) história de vida familiar (69 %); b) posse física da moradia e lugar de
produção do trabalho (18 %); c) vida tranqüila e segura (6 %); d) fartura de alimentos e
disponibilidade de recursos naturais (6%); (Gráfico 29 ).
Gráfico 29 - Significados atribuídos ao lugar
História de vida familiar e social
6%
1%
18%
Tranquilidade e Segurança
Indiferente
6%
69%
Posse física e produção de
trabalho
Fartura de elimentos e recursos
naturais
130
22
FISCHER, G. Psicologia Social do Ambiente. Lisboa: Instituto Piaget, S.D
23CANDIDO,
A.M. e HIGUCHI, M.I.G. Estratégias de mobilização comunitária direcionadas à apropriação
socioambiental: Um estudo com moradores vizinhos da Reserva Ducke. Relatório Técnico de PIBIC/INPA/CNPq.
Manaus, AM. 2005.
24PEREIRA,
L.C.T. Modos de ser, morar e viver. Monografia de conclusão do Curso de Psicologia.ULBRA/Manaus.
2005.
25PADILLA,
V. e HIGUCHI, M.I.G. Significados do Lugar: Pertencimento Como Aspecto do Cuidado
Ambiental. Relatório Final de PIBIC/INPA/FAPEAM. Manaus. 2006
Verifica-se os fortes laços que a família exerce para esses moradores, de forma que
justificativas manifestadas por 69% dos moradores que atribuíram o significado a partir da história de
vida familiar e social vivida no lugar se deve aos laços de enraizamento onde os pais e filhos
compartilham historicamente o mesmo lugar com outros moradores na comunidade:
“Meu pai foi o primeiro fundador. Pra gente abandonar, não dá. Meus filhos também estudam aqui...”
“Ambiente muito bom, onde eu nasci, vem desde os meus avós e vivemos numa comunidade unida”.
Ao atribuírem o significado do lugar como posse física e produção de trabalho, os 18% dos
moradores justificaram a partir das idéias de que o lugar lhes garante a moradia e um lugar para
trabalhar tendo uma renda que lhes permite sobreviver:
“É meu lugar de trabalho, a terra é nossa...”
“ Aqui a gente tem escola, igreja, é nosso...”
Para 6 % dos moradores os significados atribuídos ao lugar se devem à tranqüilidade e
segurança, longe dos perigos da cidade e outras atribulações vividas em lugares diferentes: “Vivo na
minha casa sossegada, ninguém vem me aperrear, vivo tranqüila.”
Os moradores (6%) cujo significado do lugar se baseia na fartura de alimentos e disponibilidade
de recursos naturais justificaram da seguinte forma: “Estamos no meio de tudo, tem água, é bom de
plantar e criar gado.”
Apenas 1% (um morador) atribuiu um significado de indiferença, pois para ele “vivo num
isolamento aqui, longe de tudo, Pra comprar alguma coisa aqui é difícil”.
SENTIMENTO DE POSSE DA TERRA
Sentir-se dono ou dona do lugar, pertencer ao lugar onde se vive são aspectos intrinsecamente
131
ligados à noção de propriedade, mesmo que isso não esteja associado a um documento que comprove
tal situação. Vemos que os moradores se dividem sobre o sentimento de posse da terra. A maioria dos
moradores (61%) considera a terra verdadeiramente sua enquanto que para 39 % dos moradores, a
terra não é verdadeiramente sua (Gráfico 30)
Gráfico 30 – Sentimentos de posse verdadeira da terra onde vivem
39%
61%
Sim
Não
Entre os 71 moradores que se sentem verdadeiramente donos do lugar onde vivem, as
explicações são decorrentes de pelo menos três fatores: a) porque trabalham e moram na terra (58%);
b) porque possuem algum tipo de documento numa transação de negócio (21%); ou c) porque a
família reside na terra por longo tempo (21%) (Gráfico 31).
Gráfico 31 – Motivos por se sentirem verdadeiros donos da terra onde vivem
21%
21%
Trabalham e moram na terra
58%
A familia reside nela por
muito tempo
Tem algum documento
132
Já para os 45 moradores que não se consideram verdadeiramente donos este sentimento é
atribuído a pelo menos quatro fatores: a) Não possuem documentos; b) a terra é um bem divino
passageiro; c) a terra é de toda a comunidade, e d) a terra pertence ao governo (Gráfico 32 )
Gráfico 32 – Motivos por não se sentirem verdadeiros donos da terra onde vivem
A terra pertence a Deus
13%
33%
A terra é da comunidade
Não tem documentos
36%
18%
A terra pertence ao
Governo
Para que uma comunidade se consolide como tal e seus integrantes sejam mobilizados em prol
de atividades comunais o sentimento de posse indica as possibilidades de desenvolvimento social e
econômico. Apesar da maioria ter um sentimento de posse bastnte firme, é importante que esse
sentimento de posse seja ampliado aos demais moradores, não no sentido formal do termo, mas que se
criem possibilidades de verdadeiras apropriações e que estabeleça a segurança e pertença a partir das
necessidades apontadas na comunidade. É esse sentimento de posse que favorece o apego e
finalmente a identidade social de todos que finaliza num cuidado e zelo eficaz dos recursos e da
Flona.
SIGNIFICADO DA FLONA PARA OS MORADORES
A nomenclatura dada a um determinado lugar não é apenas função léxica, mas incorpora
significados que são transmitidos culturalmente e permitem uma unidade e identidade daqueles que o
habitam. Segundo Lovell (1998)26 a identidade de lugar, ou seja, o pertencimento a uma localidade,
133
transcende a experiência individual, para acrescentar laços de envolvimento coletivo, das relações
das pessoas entre si e destas com os elementos constituintes desse ambiente.
26LOVELL,
NADIA. Locality and Belonging. London, Toutledge, 1998.
O significado dado à localidade como Flona é particularmente revelador das práticas cotidianas
dos moradores e daqueles que ali desenvolvem alguma atividade social. Como o status “Flona” em
muitos casos é, sobretudo uma determinação externa e não parte necessariamente de uma solicitação
das populações, é comum que haja incertezas, mais sobre o nome e seu status do que o lugar em si
representa às pessoas que lá vivem. A territorialidade ou senso de pertencimento da “Flona do Pau
Rosa” introduz um modelo normativo de entendimento dessa ordem espacial, que diferencia o secular
significado de que a localidade, entendida como comunidade produz para esses moradores. Nesse
momento histórico, morar na Flona ainda é, para a grande maioria desconhecido, e para alguns
confuso.
Observa-se que 88% (83 dos 116) dos entrevistados não sabem o que seja Flona e destes, 85%
expressavam estranheza com o nome, pois lhes era totalmente desconhecido. Apenas 9% dos
moradores admitiram saber que Flona seria uma área de preservação natural, mas mesmo nesses
casos não sabiam dizer se essa demarcação traria algum benefício aos moradores. Alguns até
apontaram que demarcar áreas da floresta pode ser bom para os recursos da natureza (Gráfico 33 ).
Gráfico 33 - Conhecimento dos moradores sobre o que é Flona
3%
3%
Nunca Ouviu fala
9%
Área de preservação da
natureza
Ouviu fala mas não sabe o
que é
85%
Outras
É necessário apontar o distanciamento existente (ou a não existência de contato) entre essas
comunidades e o órgão Gestor, o ICMBio. Em reuniões feitas com as lideranças, na ocasião desse
134
estudo, o nome do Instituto Chico Mendes para a Conservação da Biodiversidade lhes foi apresentado
pela primeira vez pelo técnico Huellinton Ferreira que acompanhava as equipes de Pesquisa. De
forma geral, todos se interessavam muito pelas informações e pelo fato de que o Ibama não estaria
envolvido nesse processo, chegando a solicitar os números de telefone dos responsáveis no ICMBio e
outras informações para futuros contatos. A imagem do Ibama, para a maioria dos moradores é
assustadora e ameaçadora pelas formas equivocadas de vigilância imposta por alguns gestores.
Essa nova informação da gestão por parte do ICMBio pode trazer alguma insegurança para os
moradores, que costumavam pensar em suas terras isentas desse tipo de intervenção. Por um lado
havia a esperança de poder contar com a presença do poder público, por outro por não saber
exatamente o que lhes pode acontecer.
Sugere-se que haja um estreitamento desse relacionamento para a implementação de vários
projetos e ações necessárias de uso e gestão da área.
PERCEPÇÕES SOBRE O CUIDADO AMBIENTAL
Saber cuidar, ou melhor, ter práticas de zelo e preocupação com o uso do solo que abriga e
possibilita a vida das pessoas e dos demais recursos, envolve o modo de pensar das pessoas. São as
idéias que formamos ao longo dos anos, a partir de nossas vivências e capacidades pessoais, que
estabelece os diferentes tipos de ação em relação ao ambiente.
O que faz “bem à terra”
Entre os moradores entrevistados constatou-se que 64% deles atribuem às ações antrópicas a
condição do bom estado da terra, porém essas ações incluem, por exemplo, algumas práticas que são
deletérias, como as queimadas para o roçado e o uso de agrotóxico para melhorar o cultivo. Para 5%
dos moradores o que faz bem à terra tem a ver com as causas próprias da natureza, isto é, faz parte do
sistema ambiental, que acontece independente da ação dos humanos como a chuva, o sol ou a
produção própria da floresta como os frutos. Entretanto 31% dos entrevistados declararam não saber
responder (Gráfico 34).
Gráfico 34 - Aspectos que fazem “bem à terra”
135
Evitar queimadas e
desmatamento
19%
48%
Evitar poluição
20%
Cultivar plantas, reflorestar e
cuidar da terra
13%
Varias Coisas
O que faz “mal à terra”
Para a grande maioria 71% dos entrevistados as causas que fazem mal à terra tem a ver com as
ações humanas, seja o desmatamento e queimadas da floresta (49%), o lixo e poluição (14%), ou o
uso indevido de adubos químicos nos plantios. Para outros 16% o mal está na própria natureza que
produz chuvas e secas intensas ou pelo fato de terem animais e plantas, consideradas pragas
(formigas, insetos, capim) que danificam a terra. Já 13% dos moradores não sabem o que faz mal à
terra (Gráfico 35).
Gráfico 35 - Aspectos que fazem “mal à terra”
Desmatamento e queimadas
8%
Lixo e poluição
16%
49%
Não sabe
13%
Causas da Natureza
14%
Uso de adubo quimico nos
plantios
136
Diante dos resultados apresentados observa-se que os moradores possuem idéias bastante
generalizadas sobre os impactos nocivos ao ambiente, mas não há um conhecimento mais acurado das
práticas desenvolvidas no cotidiano da comunidade. É necessário um programa que os faça refletir
sobre as práticas domésticas e de cultivo onde todos possam traçar um plano de mudanças de hábitos
em favor da sustentabilidade. Dessa forma, o programa de educação ambiental deve contemplar esse
“deslocamento” das causas mais difundidas pela mídia, e que os exime de uma responsabilidade mais
individual, e assumir a sua parte nesse processo, inclusive de rever suas práticas diárias no uso da
terra, no descarte do lixo, na captação da água, etc.
PERCEPÇÕES SOBRE ÁREAS VERDES
As percepções que as pessoas possuem sobre áreas verdes - vegetação de fragmentos florestais
ou áreas mais abrangentes, podem nos dar indícios do comportamento ecológico direcionado a esses
ecossistemas. A ciência tratou de explicitar a constituição e dinâmica desses espaços, porém o saber
comum constitui um repertório bastante forte na determinação das práticas cotidianas de qualquer
grupo social. As denominações e classificações científicas são, via de regra, elementos norteadores
para políticas públicas de gestão ambiental, mesmo que essas políticas preconizem o respeito ao
pensamento tradicional das populações. Neste relatório não temos a pretensão de comparar saberes,
mas mostrar como eles se diversificam e que cada um se torna base para práticas específicas em
relação às áreas verdes.
Vários são os critérios que o pesquisador ou técnico das áreas naturais utiliza para caracterizar
um determinado ambiente físico. Entre elas está o tipo de vegetação predominante do lugar, a
situação florística, o tipo de solo, o tipo de cobertura física ou a formação paisagística, entre outros.
Estes atributos de classificação são utilizados para identificar e diferenciar áreas umas das outras para
um estudo detalhado desses ambientes. Mesmo no meio científico não há um consenso conceitual
desses ambientes ou ecossistemas identificados no Brasil, mais especificamente os da Região
Amazônica (Odum, 198827; Hatthaway, 199328; Ferraz, 199429; Vesentini, 199830; Ribeiro et
al.,199931).
As variações das ciências naturais ao estabelecer critérios de classificação dos cossistemas nos
mostram que se não há homogeneidade nos conceitos usados pela comunidade científica é de se
esperar que haja um contraste também com as concepções e imagens formadas pela população leiga,
no que se refere a esses ambientes naturais. O conhecimento científico é apenas uma dimensão de
137
organização conceptual da realidade. Entretanto, não é o único, uma vez que o saber popular coexiste
na mesma intensidade que os demais saberes. Ignorar esse aspecto é negligenciar a constituição de
nossa condição social centrada na intersubjetividade. A compreensão do mundo se dá
necessariamente das percepções da realidade externa.
Assim, ao tratarmos das questões ambientais, mais particularmente dos recursos naturais, é
crucial nos aprofundarmos nas formas de construção dos conhecimentos sobre esses aspectos, os
quais estão subjacentes às práticas ecológicas. Segundo Higuchi (2002) a percepção é
invariavelmente um julgamento a partir de nossos próprios sistemas de referência. Por exemplo,
preserva-se área verde a partir do que se considera próprio de ser preservado, ou então, acha-se uma
área suficientemente grande para um tipo de atividade cujo tamanho comporte a relação desejada. As
áreas verdes, de acordo com o saber científico podem ser denominadas floresta, mata, mato, bosque,
entre outros. Mas como essas áreas são denominadas e compreendidas pelo saber comum do morador
da Flona?
Abaixo apresentamos as percepções e conceitos que surgiram na entrevista.
Identificação da área verde circundante da localidade - paisagem
Os nomes designados às coisas do mundo ou os acontecimentos que ocorrem são formas
convencionadas de entendimento entre as pessoas. Um nome manifesta além das características
objetivas do que nos referimos, valores e significados
27
28
ODUM, E.P. Ecologia. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, S.S, 1988
HATTHAWAY, D. MENEZES, F., PESSANHA, L. CARNEIRO, P.R. Bioviversidade e Biotecnologia:Um
glossário. Rio de Janeiro: AS-pata; FLACSO, 1993.
29
FERRAZ. I.D.K. Amazônia:Uma proposta interdisciplinar de Educação Ambiental. Brasília: IBAMA,1994
30
VESENTINI, J.W. Geografia do Brasil: Brasil, sociedade e espaço. Rio de Janeiro: Ática. 28ª. Ed, 1998.
31
RIBEIRO, et al., Flora da Reserva Ducke. Manaus: INPA, 1999
que estão na base do comportamento em relação a essas coisas e acontecimentos. Desse modo,
constatamos que as áreas verdes que circundam as localidades são conhecidas de pelo menos três
denominações básicas: Floresta, Mata, Mato. O nome Floresta foi apontado por 49% (57 dos 116
entrevistados) dos moradores, enquanto que 40% se refere a paisagem como Mata; 4% como Mato,
3% como natureza e 4% se refere com nomes tipo: paraíso, flora ou terra Firme (Gráfico 36)
Gráfico 36– Nome designado à área verde circundante (paisagem) da localidade
138
3%
4%
4%
Floresta
49%
Mata
Mato
40%
Natureza
Outras
Noções sobre Floresta
Ao definirem Floresta os moradores se baseiam principalmente no acesso à área em questão. A
grande maioria (89%) define como uma área repleta de árvores de diferentes espécies, onde há muitos
animais e se localiza muito distante e poucos se atrevem a ir lá, pois é normalmente perigoso, pois é
desconhecido. Já para 9% deles, floresta é um lugar destinado a fornecer os recursos para o sustento
das pessoas, desta forma floresta seria uma área explorada, tanto para cultivo, quanto extrativismo ou
caça. Apenas 2% disseram não saber explicar (Gráfico 37).
Gráfico - 37 Noções de Floresta
2%
9%
Área inexplorada
Área explorada
Não sabe
89%
139
Noções sobre Mata
O termo “mata” é bastante nas conversas informais. O moradores da Flona entendem o termo
com características similares aos dados à área designada como floresta, isto é: 90% consideram Mata
como uma área com grande diversidade de árvores e animais, distante de suas moradias e que
inevitavelmente é uma área inexplorada, outros 9% consideram mata como uma área de uso e
sustento tanto para plantar, colher frutos e outros produtos como caçar. Apenas 1% diz não saber
dizer o que seja mata (Gráfico 38 ).
Gráfico 38– Noções sobre Mata
1%
9%
Área inexplorada
Área explorada
Não sabe
90%
Observou-se que muitos moradores utilizavam os termos floresta e mata para definirem termos
opostos. Por isso fez-se uma análise para verificar se esses termos estariam sendo usados como
sinônimo ou caracterizações para diferentes lugares. O gráfico 39 mostra os resultados obtidos a
partir desse cruzamento das respostas.
Gráfico 39 – Noções referentes à diferença e semelhança entre Floresta e Mata
140
8%
Iguais
Diferentes
92%
Constatou-se pelos resultados apresentados que o conceito de floresta e mata podem representar
o mesmo espaço físico para 92% dos entrevistados, enquanto que para 8% dos entrevistados, floresta
e mata são espacialidades diferentes entre si, com características peculiares. Esses resultados são
bastante diferentes dos encontrados com moradores de Resex (Higuchi, et al., 2006, 2007, 2008),
onde essas áreas verdes são diferenciadas.
Observa-se que muitos moradores passaram a falar em “floresta” como um termo introduzido
pela mídia e escola, visto que antigamente se falava em “mata virgem” dizem muitos dos
entrevistados.
Noções sobre Mato
Para 59% dos entrevistados, mato é uma categoria de vegetação rasteira, tipo capoeira que
cresce em dois lugares distintos, um debaixo das grandes árvores na mata, que de tão espessa e
cerrada impede o acesso aos lugares desejados, é também conhecido como Cerrado; e também como
as plantas que crescem após desmatar alguma área da floresta, o roçado ou o terreno próximo da casa.
Já para 8% dos entrevistados, mato é uma categoria igual à de floresta e mato, composta por árvores
de todos os tipos. Para 38 dos 116 entrevistados (33%), disseram não saber explicar (Gráfico 40).
Gráfico 40 – Noções sobre Mato
141
Plantas pequenas que
crescem na mata ou em
áreas pequenas
28%
Árvores diversas
68%
4%
Não sabe
Implícito nessas noções está o comportamento em relação à área verde, como, por exemplo,
desmatar aquilo que se entende como mato, por considerá-la sem importância ecológica, e da mesma
forma considerar áreas de floresta ou mata, as áreas que estejam distantes de si e, portanto, toda a
informação de preservação á floresta acaba sendo inócuo, pois estes moradores não estariam
atribuindo tal área como parte de sua responsabilidade.
Noções sobre Floresta Amazônica
A identificação dos elementos que compõem um ambiente não é uma mera formalidade léxica,
mas, sobretudo um conhecimento que, inevitavelmente está subjacente aos valores atribuídos a tudo
que fará referência a este ambiente. Qualquer denominação seja ela relacionada a uma pessoa ou a um
lugar há sempre um significado atrelado a ela, seja de representação ou construção de vivências
associadas a esses elementos. Floresta Amazônica tem sido um nome cada vez mais veiculado pela
mídia trazendo informações científicas e socioculturais. Cada grupo social investe de forma diferente
nessas subjetividades referentes ao lugar, que dependem das vivências e informações obtidas em
momentos diferenciados. São essas idéias sobre determinados lugares que fazem com que um
indivíduo ou grupos se apropriem deste território, formando assim um padrão de conduta que regula a
interação pessoa-ambiente, tais como a defesa do lugar, a vigilância e personalização do espaço
físico” Gifford 198732; Valera e Vidal, 200233). Uma das principais alterações de territorialidade
vividas pelos moradores da Amazônia tem a ver
32
Gifford, R. Environmental Psychology: Principles and Practice. Boston:Allyn and Bacon,
142
1987.
33
Valera, S. e VIDAL, T. Privacidad e territorialidad. In Aragonés, J.I., Amérigo, M. (Coords)
Psicologia Ambiental. Madri: Ediciones Pirâmide, 2002
com essa denominação “Floresta Amazônica” e deve ser especial para os moradores das Unidades de
Conservação denominadas Floresta Nacional.
Constatou-se que 39% dos moradores considera a Floresta Amazônica como uma área
geográfica, um lugar delimitado com floresta, mata e que fica no Amazonas. Nessa idéia está presente
a noção de posse, ou seja, que pertence àqueles que moram nesse lugar: é o nosso verde; área do
amazonas; Floresta que fica na Amazônia; é o lugar onde vivemos; área grande que vemos quando
andamos de barco.
Para 28% dos moradores a Floresta Amazônica é visto como uma área rica em recursos
naturais que a mesma disponibiliza para as pessoas, ou seja, um lugar que oferece elementos de
consumo e subsistência, rios com peixes, madeira e uma terra para morar: é nossa floresta, rica em
tudo porque tem madeira, petróleo e água; No Amazonas tem ainda muita floresta; uma extensão do
nosso planeta onde se encontra muito recurso natural que pode ser explorado como o pau-rosa,
castanha, copaíba, madeira...; área muito grande onde tem muitos animais, uma grande mata e
muito oxigênio.; é tudo o que tem de bom, a riqueza, principalmente as plantas medicinais.
Outros 11% dos moradores consideram Floresta Amazônica sob o ponto de vista ecológico,
como um ambiente a ser preservado pois existe uma preocupação ecológica, isto é, um lugar que
chama a atenção pela ameaça de devastação ou de uso intenso de seus recursos naturais e animais:
lugar para não desmatar; é o pulmão do mundo; é o verde do Brasil, a ecologia; tem gente acabando
por aí; é uma área preservada. Interessante observar que 22% dos moradores dizem que não sabem o
que seja Floresta Amazônica (Gráfico 41).
Gráfico 41– Noções sobre Floresta Amazônica
Área Geográfica
22%
39%
11%
ebeÁrea rica em Recursos
Naturais
Área a ser preservada
28%
Perc
Não Sabe
se
pelo
s
relat
os
143
que apenas moradores consideram-se incluídos na Floresta Amazônica: é esse nosso entorno; é aqui
mesmo; é tudo isso onde nós moramos, 26% expressam um distanciamento de não apropriação social
da Floresta Amazônica, uma vez que é considerada como lugar distante: é longe, tá acabando, aí [no
rio] tá passando passa muitas barcas cheias de madeira. Essa noção é apontada como elemento
crucial de falta de comprometimento nas práticas ecológicas, e involuntariamente estar contribuindo
para a ameaça de destruição. Já para os demais 26% não há evidências claras para essa questão de
pertencimento (Gráfico 42).
Gráfico 42 – Noções de inclusão no ambiente da Floresta Amazônica
26%
Se inclui como morador da FA
48%
Não respondeu
26%
A FA se localiza num lugar
distante
Estar incluído num lugar significa ser parte dele e aumentar seu envolvimento de
responsabilidade com o destino e uso dos recursos. Vê-se, portanto, a necessidade de ações
educativas onde os moradores se percebam como elementos constituintes desse ambiente que se
denomina Floresta Amazônica.
CONCEITOS SOBRE MANEJO FLORESTAL
Manejo Florestal é ainda um termo bastante desconhecido pelos moradores da Flona. Para a
maioria dos entrevistados (58%) não sabem o que seja manejo florestal, e muitos nunca ouviram
falar. Para 26% manejo florestal é uma permissão legal, um documento a ser obtido para extração da
144
madeira da floresta e assim ficarem isentos de algum problema com IBAMA: a gente precisa do
documento pro IBAMA não prender a madeira nem o barco; legalização para tirar, transportar e
comercializar a madeira; Ter o direito de ter e vender a madeira.
Já 16% deles manejo é uma técnica de sustentabilidade dos recursos florestais onde se prevê
um acompanhamento técnico para preservação dos recursos da floresta (Gráfico 43).
Gráfico 43 – Noções sobre Manejo Florestal
16%
26%
Permissão legal para tirar
madeira
Não sabe
58%
Técnicas de sustentabilidade
ambiental
Para os moradores cujo entendimento de manejo é o conjunto de procedimentos para uso
sustentável dos produtos da floresta, percebe-se a preocupação com a manutençã dos recursos: Uma
forma de se trabalhar com a floresta de forma sustentável, extrair da floresta de modo cauteloso os
recursos que ela tem; usar uma área e fazer manejamento pra outra enquanto aquela se recupera;
não deixar levar, derrubar. Nós temos que zelar pelas nossas madeiras.
Como as idéias sobre manejo florestal ainda são bastante confusas, o importante é proceder
com oficinas de formação técnica e de educação ambiental, para que as normas instituídas não sejam
produtoras de conflitos ou estranhamento para os moradores, prejudicando sobremaneira a gestão e
uso dos recursos de forma sustentável.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Observa-se que as localidades do entorno e dentro da Flona fazem um mosaico de pessoas que
145
estão unidas pelas relações familiares, na busca de uma melhor qualidade de vida. As comunidades,
como se definem a partir de uma perspectiva da igreja católica, estão unidas pelo eixo da religião e os
preceitos bíblicos da solidariedade e cooperação. Apesar da possível tendência que a igreja tenha
nesses movimentos, há que se constatar o grande empenho que os padres tem feito naquela região,
que até pouco tempo esteve muito esquecida do poder público. Há não mais que meia dezena de anos,
esses moradores foram de alguma forma lembrados pelo poder público municipal, onde na
administração de Sidney Leite, este deu grande impulso para a construção de poços tubulares, escolas
e postos de saúde. Com sua saída tudo voltou ao ponto inicial de relativo abandono, contando apenas
com algumas associações que ainda não se pode dizer que estejam consolidadas, ou que representam
um incremento na busca de melhorias evidentes para essas populações. Há na verdade uma
mobilização mais familiar em torno de certas iniciativas, como o plantio de pau-rosa numa das
comunidades, que realmente é surpreendente o número de mudas que estes moradores fazem para
venda nas cidades vizinhas.
Apesar das notícias que estigmatizam aquelas comunidades a respeito do tráfico de drogas,
mais particularmente o suposto plantio de maconha em algumas áreas com a participação ou
conveniência dos moradores, pouco ou nada pudemos comprovar. Alguns comentários surgiram e
destes um forte sentimento de injustiça em determinadas comunidades, em especial com a de Santa
Maria do Caiaué, onde os comentários são mais vívidos. Na verdade, as comunidades estão se
organizando para vencer os desafios impostos pelo isolamento e para um estilo de vida cada vez mais
evidente, o de ter ao seu dispor bens e benefícios que lhes permita maior conforto e segurança e
expectativas de melhoria socioeconômica.
Mesmo com dados bastante reduzidos nos aspectos de escolaridade e educação, observa-se a
grande disposição de jovens e adultos em voltarem aos bancos escolares para complementar sua
escolaridade até os níveis de ensino médio. Há um envolvimento sério e forte no sentido da educação
que transcende a escola atingindo a saúde e ambiente. Nesse sentido vemos com especial satisfação o
veio que possibilitará um grande envolvimento para a formação e preservação dos recursos naturais
para benefício dessa gente. É vital que os responsáveis pela gestão da Flona (ICMBio) esteja mais
presente nas localidades e possam manter um diálogo mais firme com os moradores e lideranças.
Constatamos o desejo de um maior contato e expectativa bastante alta de ter o apoio para vários
projetos que estão sendo gerados entre os moradores, alguns que não são necessariamente positivos
sob o ponto de vista ecológico, como a introdução da criação de gado, mas na ausência de um suporte
ou de outras possibilidades o prognóstico pode ser bastante preocupante no sentido ambiental e
também naqueles aspectos apontados pelos comentários de indução ao plantio de maconha (mesmo
que não comprovado in loco) ou extração da madeira sem controle.
Em cada aspecto da vida social dos moradores da Flona e de suas proximidades há elementos
146
que podem servir de foco para programas de intervenção educativa. Nessa proposta de transformação
que preze tanto o cuidado com os recursos ambientais quanto uma melhor qualidade de vida das
populações envolvidas requer, sem dúvida, prioridades que estabelecidas em comum acordo poderão
surtir resultados mais eficazes. O empenho comum das instituições e órgãos de políticas públicas bem
como dos moradores, trará ao longo do tempo possibilidades reais para a esperada sustentabilidade
socioambiental.
APENDICE I
MINISTÉRIO DA CIÊNCIA E TECNOLOGIA
INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS DA AMAZÔNIA
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
A equipe de pesquisas do Núcleo de Pesquisas em Ciências Humanas e Sociais do INPA –
por meio de seus pesquisadores Maria Inês Gasparetto Higuchi, Carlos Henrique Ferreira Santos,
Igor Theodorovitz e Maria de Nazaré Lima Ribeiro, pedem autorização ao Sr(a) como representante
desta comunidade, para realizar as atividades de pesquisa “Vida social das Comunidades Flona Pau
Rosa- Maués – AM”. Essa pesquisa tem como objetivo fazer um levantamento das características
ambientais, sociais, econômicas, educacionais, de saúde e lazer das pessoas que vivem em cada
comunidade. Serão ainda verificadas o que as pessoas pensam sobre alguns aspectos
socioambientais. Dentre as atividades a serem realizadas estão previstas entrevistas domiciliares e
encontros grupais com os comunitários. Estas informações irão contribuir para a elaboração do Plano
de Manejo desta FLONA bem como o Plano de Uso e Gestão da mesma pelo ICMBio.
Mesmo após sua autorização, terá o direito e a liberdade de retirar seu consentimento em
qualquer fase da pesquisa, independente do motivo e sem qualquer prejuízo a si e à comunidade.
Você não terá nenhuma despesa e também não receberá nenhuma remuneração por esta autorização.
Os benefícios de sua participação e dos comunitários é o envolvimento direto na elaboração do Plano
de manejo, uso e gestão da FLONA.
Os resultados da pesquisa serão analisados e divulgados, porém a identidade dos que
responderam será mantida em sigilo. Se você ou qualquer morador quiser saber mais detalhes da
pesquisa ou dos resultados, podem contatar a líder do grupo a pesquisadora Maria Inês Gasparetto
Higuchi pelo telefone (92) 3643 3145 no Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental
(LAPSEA/INPA) em Manaus-AM, ou pelo e-mail [email protected] .
147
Consentimento Pós-informação
Eu,
_____________________________________________________,
comunidade
________________________________________________
representante
por
me
da
considerar
devidamente esclarecido sobre o conteúdo deste documento e da pesquisa a ser desenvolvida,
livremente dou meu consentimento para a realização das atividades da pesquisa e atesto que me foi
entregue uma cópia desse documento.
Assinatura do Representante da Comunidade
Assinatura do(a) Pesquisador(a) Responsável
Em _________/ _________/ _______.
148
APENDICE II
Anexo – Roteiro de questões usadas na entrevista
Laboratório de Psicologia e Educação Ambiental – LAPSEA-INPA
COMUNIDADES DA FLONA DE PAU ROSA – MAUÉS - AM
Entrevistador(a):
Data:
Horário:
Localidade:
CARACTERÍSTICAS DO INFORMANTE:
01. Sexo
02. Idade
03. Estado civil
04. Escolaridade
05. Religião
06. Ocupação
07. Nascimento
08. Tempo de residência no local
09. Residência em outros lugares
10. Ocupantes no domicilio - características demográficas – escolaridade – ocupação e civilidade
149
RELAÇÕES DE PARENTESCO
10.1. Proximidade de residências do núcleo familiar – localidades – graus de parentesco e forma de contato
INFRA-ESTRUTURA:
MORADIA:
11.1 Tipo da residência atual
11.2. Apoio na construção
POSSE DO TERRENO
12. 1. Histórico e Fonte
12 2. Posse de documentos
ENERGIA E MEIOS DE COMUNICAÇÃO
13. Equipamentos e formas de energia doméstica e comunitária
14. Comunicação interna
15. Contato com familiares externos
ÁGUA
16. Fonte água para beber
17. Percepção sobre qualidade da água
17.1. Tratamentos da água para beber?
18. Hábitos de higiene
SANEAMENTO
19. Resíduos orgânicos.
20. Resíduos inorgânicos.
21. Preocupação sobre resíduos
22. Onde as pessoas daqui da comunidade costumam fazer suas necessidades?
150
SOCIO ECONOMIA
23. Tipo de atividade econômica/renda da família - Grau de rentabilidade - Época - Responsabilidade
24. Local de Abastecimento - Alimentação – Vestuário – Móveis – Utensílios
25. Empréstimos e Dívidas contraídas - Motivos
NUTRIÇÃO
26. Número de Refeições
26.1. Inventário Recordatório de alimentos – Bebidas – Frutas – Hortaliças – Carnes – Cereais - Doces
SAÚDE/DOENÇA
27. Percepções sobre saúde
28. Doenças mais freqüentes na família
29. Última Doença na família
30. Dinâmica de auxilio em caso de doença
31. Mortalidade nos últimos 5 anos
CLIMA SOCIAL
32. Aspectos de Satisfação na comunidade
33. Aspectos de insatisfação na comunidade
34. Intenções de mudança
35. Descrição da vizinhança
36.Tipo de atividades agregarias
37. Atividades de lazer e turismo
ORGANIZAÇÃO SOCIAL
38. Apoio instituições Externas
39. Participação e Mobilização Comunitária
40. Informações sobre associações de gestão
SIGNIFICADO E IDENTIDADE DE LUGAR
41. Identidade de lugar
42. Apropriação pessoal/sentimento de posse:
43. Status comparativo do morador
44. Avaliação do lugar/expectativas
45. Avaliação do lugar/ Dificuldade Atual
46. Dinâmicas de solução das dificuldades
47. Sentimentos de responsabilidade com o lugar
48. Idéias e empreendedorismo
151
NOÇÕES DE CUIDADO AMBIENTAL
49.Idéias sobre Impactos Negativos
50. Idéias sobre Impactos Positivos
CONTEXTUALIZAÇÃO DO LOCAL – PAISAGEM
51. Conhecimento da FLONA
52. Idéias sobre a paisagem
53. Idéias sobre áreas verdes: Floresta - Mata - Mato - Floresta Amazônica
54. Idéias sobre Manejo Florestal.
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RELATÓRIO FINAL