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9ª Conferência Internacional Cidades e Portos COMUNICAÇÕES Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias
9a Conferência Internacional Cidades e Portos
9th Internacional Conference Cities and Ports
9e Conférence Internationale Villes et Ports
DISCURSOS E COMUNICAÇÕES
Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias
CENTRO CULTURAL DE BELÉM | LISBOA | 5 A 9 DE JULHO DE 2004
DISCURSOS E COMUNICAÇÕES
Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias
Comunicações apresentadas na 9ª Conferência Internacional Cidades e Portos subordinada ao
tema “Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias”, promovida e organizada pela Área
Metropolitana de Lisboa e pela Association Internationale “Villes et Ports” no Centro Cultural de
Belém, em Lisboa, entre os dias 5 e 9 de Julho de 2004.
Algumas das intervenções publicadas não reproduzem integralmente os documentos originais, mas mantêm inalterados o sentido dos textos
e as ideias-força expressas pelos seus autores. Tal facto, fica a dever-se às necessárias adaptações editoriais na conceptualização deste livro
e aos trabalhos de tradução para a língua portuguesa
Comissão de Honra
• Sua Excelência o Senhor Presidente da República Portuguesa
• Sua Excelência o Senhor Primeiro - Ministro da República Portuguesa
• Sua Excelência o Ministro das Cidades, Ordenamento do Território e Ambiente (Portugal)
• Sua Excelência o Ministro do Equipamento, dos Transportes e do Mar (França)
• Sra. Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa
• Sr. Presidente da Câmara Municipal de Lisboa
• Sr. Presidente da AIVP
• Sr. Presidente da Administração do Porto de Lisboa
• Sr. Embaixador da República Francesa
• Sr. Embaixador da República Italiana
Comissão Científica
• Arq. Alcino Soutinho
• Arq. Bruno Soares
• Arq.a Helena Roseta
• Prof. Joan Busquets
• Prof. João Ferrão
• Dr. José Manuel Marques
• Arq. Manuel Salgado
• Arq. Ribeiro Teles
• Prof. Rinio Bruttomesso
Comissão Executiva
• Dalila Araújo (AML)
• Patrícia Encarnação (AML)
• Filomena Conceição (AML)
• Fátima Ricardo (AML)
• Ana Cristina Cunha (APL)
• Bruno Delsalle (AIVP)
• Corinne Monnet (AIVP)
• Olivier Lemaire (AIVP)
Mensagem de Sua Excelência
o Presidente da República Portuguesa
Dr. Jorge Sampaio
As funções portuárias individualizam as cidades, tanto do ponto de vista económico como no plano cultural. Certamente que a existência de instalações portuárias numa cidade é um factor de estímulo ao desenvolvimento, constituindo igualmente um desafio ambiental, patrimonial e social.
Nem sempre esse desafio é bem entendido e nem sempre a convivência entre as cidades e os
seus portos decorre sob o signo de um saudável entendimento e recíproca valorização.
Tem cabido à Associação Internacional “Cidades e Portos” (AIVP) uma acção relevante para o
conhecimento das características próprias e específicas das cidades portuárias e para uma melhor
compreensão do seu papel numa economia globalizada e numa sociedade onde as exigências
para com o ambiente e o património felizmente se reforçaram. A Associação ocupa um lugarchave no apoio aos projectos lançados por cidades portuárias com objectivos no campo do urbanismo e do ordenamento do território.
Quero por isso saudar a realização em Lisboa da 9ª conferência Internacional da AIVP, na qual está
directamente envolvida a Área Metropolitana de Lisboa, bem como as Câmaras Municipais de
Porto e Gaia e as Administrações Portuárias portuguesas.
Desejo a todos os participantes uma boa estadia no nosso País e faço votos para que os trabalhos
da Conferência constituam, como nas Conferências anteriores, mais um importante contributo
para o aprofundamento das experiências, dos métodos e dos planos de requalificação e valorização das cidades portuárias.
A escolha dos temas que inspiram esta Conferência são da maior actualidade. Efectivamente, as
cidades portuárias estão apostadas na inovação tecnológica e na modernização competitiva, e, ao
mesmo tempo, na qualidade ambiental e social e na defesa do seu riquíssimo e original património
histórico. ❘❙❚
ABERTURA OFICIAL
10
SESSÃO I Competitividade Portuária, Modernidade Urbana
20
ATELIER 1 Tempo da Cidade, Tempo do Porto, como harmonizá-los?
30
ATELIER 2 Acessibilidades e transportes - gerir o quotidiano e preparar o futuro
40
ATELIER 3 Novos poderes institucionais para ultrapassar os antagonismos “cidade/porto”
54
SESSÃO II Cidade / Porto - Estratégias diferentes num projecto comum
64
SESSÃO III Desafios da valorização do património portuário
80
ATELIER 4 Terá o património portuário um valor económico?
90
ATELIER 5 As marinas como instrumento de valorização dos portos
100
ATELIER 6 Equipamentos públicos, privatização, PPP... questão de dinheiro ou de ambição?
110
SESSÃO IV Área Metropolitana de Lisboa - o regresso ao rio
120
SESSÃO V Viver e trabalhar na cidade portuária
142
ATELIER 7 A cidade portuária, um “eldorado” turístico?
152
ATELIER 8 A questão ambiental: um novo trunfo para os portos?
162
ATELIER 9 Viver nas zonas ribeirinhas... a que preço?
170
SESSÃO VI As vantagens de um porto interveniente na interface “cidade/porto”
180
CONCLUSÕES E SÍNTESE
188
ENCERRAMENTO OFICIAL
198
ABERTURA OFICIAL
Maria da Luz Rosinha
Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa,
Portugal
Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes e
Habitação, Professor Carmona Rodrigues; Sr. Secretário
de Estado dos Negócios Estrangeiros de França,
Monsieur Renaud Muselier; Sr. Presidente da AIVP,
Sr. Giulianno Gallanti; Sr.ª Vereadora Maria Eduarda
Napoleão, em representação do Presidente da
Câmara Municipal de Lisboa, Dr. Santana Lopes; Srs.
Representantes do Corpo Diplomático; Srs. Presidentes
de Câmara e demais Autarcas; Presidentes de Câmara
de cidades estrangeiras; Srs. Congressistas; Srs.
Convidados; Minhas Senhoras e Meus Senhores.
A Área Metropolitana de Lisboa orgulha-se de promover pela 1ª vez em Portugal a Conferência Internacional
da AIVP – Association International Villes et Ports – um dos mais relevantes “fóruns” internacionais de reflexão e debate sobre as cidades e os portos, fazendo jus à nossa história, de País virado para o mar, entreposto
de povos, civilizações e culturas.
O tema escolhido para a 9ª Conferência da AIVP - Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias - não
podia ser mais adequado ao actual debate, sobre a globalização e a competitividade internacional, se pensarmos nas vantagens comparativas desses centros urbanos, como elementos estruturantes de uma nova
tendência, baseada no pensar global e agir local, assente na partilha do saber e na cooperação entre os Povos
e Nações, tendo o mar por referência e inspiração.
Conceito de Modernidade, entendido como resposta integrada, participada e inovadora, por parte dos
agentes determinantes do desenvolvimento urbano das cidades portuárias - Municípios e Administrações
Portuárias - integrando-as nas suas opções políticas, económicas e sociais, com Identidade, enquanto valor
intrínseco de salvaguarda cultural, preservando e recuperando o património histórico com significado afectivo, comum a cada cidade e a cada porto.
Duplo compromisso este, estabelecido numa relação dinâmica e harmoniosa, entre passado e futuro, ao
qual devemos associar os restantes elementos presentes no desígnio civilizacional que perseguimos: o mar,
imutável na forma e inesperado, nos efeitos, e a componente humana, com a sua inteligência conceptual,
indispensável à dinamização racional de um lugar portuário, moderno, competitivo e à escala humana.
Na Grande Área Metropolitana de Lisboa encontramos exemplos dessa nova realidade urbano-portuária,
indissociavelmente ligada aos rios Tejo e Sado, desde os pequenos portos fluviais aos grandes portos atlânticos, constituindo pólos de atracção e de fixação das populações, origem dos primeiros núcleos urbanos, e
pontos privilegiados de encontro de culturas e civilizações, como diria Fernão Lopes, cronista português do
séc. XIV, “locais de muitas e desvairadas gentes” ou “terras de muitas e tresloucadas gentes”.
O Mar é um tema recorrente no nosso passado histórico, inegavelmente ligado ao imaginário nacional. Glorificando heróis e carpindo desgraças, assente numa lógica de conquista e de expansão comercial e económica, mas
deixando transparecer, no entanto, essa necessidade/desejo de procura de um mundo desconhecido, em contacto com outras civilizações, como contributo histórico civilizacional, “dando novos mundos ao Mundo”, como diria
Camões, nos Lusíadas, ressaltando o papel dos portugueses no desbravar de “mares nunca dantes navegados”.
Esta gesta marítima de País voltado para o mar e de povo que se fez ao mar, é um passado de que nos orgulhamos, enquanto portugueses, europeus e ”cidadãos do mundo” que muito contribuíram no aproximar
de Países, Povos e Civilizações.
A sua importância na actualidade mantêm-se, reforçada pelos novos usos dados ao oceano – a investigação
sobre os recursos marinhos, a protecção ambiental, os paradigmas do lazer, o combate ao contrabando e ao
narcotráfico e a segurança das rotas marítimas, com influência directa na funcionalidade e riqueza dos portos,
justificando que as nações costeiras assumam, em toda a plenitude, a defesa dos seus interesses vitais, no
quadro multilateral de interesses no mundo globalizado em que vivemos.
Aproveitando o consenso generalizado em torno da requalificação urbanística das frentes de mar, a envolvente marítima das cidades ribeirinhas transformou-se num espaço aberto à convivência entre os cidadãos, acompanhando
a valorização da imagem das cidades e identificando uma vasta oferta de actividades e de práticas apropriadas, não
deixando de equacionar novas oportunidades e parcerias ajustadas a um desenvolvimento urbanístico equilibrado.
Para que isso aconteça, é necessário, por vezes, assumir rupturas com o passado, sejam elas políticas, económicas ou arquitectónicas, de modo a consolidar consensos, em torno de opções estratégicas, que os centros
de decisão política precisam de assumir.
Mas raramente o debate sobre a modernização do sector portuário tem tido em conta, quer os apelos do
mar e a sua natural imprevisibilidade, quer o que se passa para lá da “fronteira” física dos portos, ficando-se,
por vezes, pelo discurso economicista e politicamente correcto.
Há pois que fazer um esforço de convergência institucional para que os poderes públicos e os estrategas das cidades
ribeirinhas valorizem aquilo que os deve unir: o património natural e paisagístico e a riqueza e diversidade cultural.
Apesar da controvérsia suscitada pela aplicação de modelos de gestão, os centros urbanos com frentes
marítimas têm tirado partido da sua singularidade, utilizando argumentos que ajudam a minorar os efeitos
das fragilidades estruturais existentes e da flutuação dos ciclos económicos, favorecendo o desenvolvimento
das economias locais e a valorização integral das cidades globais, através do aproveitamento da envolvente
portuária como factor de diferenciação e dinamização.
ABERTURA OFICIAL
13
A realidade dos últimos anos vem confirmar que se não olharmos para os factores que contribuem para os
desequilíbrios nas trocas comerciais, para o progressivo desaparecimento da marinha mercante, nas pequenas economias marítimas, e para a alienação de empresas nacionais a operadores estrangeiros, fica em causa
o domínio dos centros de decisão estratégica por entidades nacionais e o equilíbrio geoestratégico entre os
grandes blocos económicos da actualidade.
A afirmação dos países no contexto das nações, principalmente daqueles com forte tradição marítima e
tendo o mar como principal porta de entrada do comércio externo, exige a adopção de estratégias integradas assumidas pelo Estado, atendendo a factores de sustentabilidade económica, projecção das frotas no
contexto do interesse nacional e à autonomia de meios de transporte, necessários à visibilidade de bandeira
e à condição de suporte instrumental ao serviço da diplomacia.
A recuperação de áreas portuárias abandonadas, um pouco por todo o lado, tem contribuído para a criação de importantes pólos de actividade económica, acolhendo, cada vez mais, novos hábitos sociais e as
necessidades quotidianas dos seus habitantes, representando uma alternativa consistente para a instalação de
marinas e terminais marítimos, contribuindo decididamente para a modernização das cidades portuárias.
Não faltam argumentos a este desígnio de modernidade: o design dos equipamentos, a qualidade arquitectónica dos projectos, os financiamentos e a vontade política, entendida de uma forma ampla e integrada, que
contribuem para o fascínio irrecusável que as cidades ribeirinhas exercem sobre quem as visita e para a sua
apropriação pelas populações que lhes dão vida, sem barreiras mentais ou arquitectónicas.
Esta evolução da procura obriga, naturalmente, a complexas intervenções na interface “cidade/porto” e no
respectivo património portuário, tendo em vista a sua reabilitação urbana, numa lógica de desenvolvimento
sustentável, reforçando a coesão, ao nível local, e favorecendo a sua projecção regional e internacional.
Ao promover a realização da 9ª Conferência da AIVP, em Lisboa, este vasto espaço geográfico metropolitano
afirma, inegavelmente, a sua dimensão ribeirinha, reforçando o redimensionamento estratégico das frentes
de água e dos seus magníficos estuários, como factores essenciais de desenvolvimento e competitividade.
Para terminar, quero agradecer a confiança que depositaram na nossa organização e desejar a todos um
enorme sucesso para os trabalhos que amanhã se iniciam, e que do debate resulte uma maior consciência
para a importância do mar no futuro da Humanidade e na sua estreita ligação com a vida das cidades, enquanto espaços de liberdade e de esperança num mundo melhor e mais solidário. ❘❙❚
Através do geógrafo grego Estrabão, há referências ao porto de Lisboa desde, pelo menos, o século II antes
de Cristo. Desde então, a importância estratégica do estuário do Tejo, quer na perspectiva política e militar
de ocupação do território, quer no âmbito do abastecimento das populações e na perspectiva económica
- que não cessou de aumentar e recebeu um novo impulso com a gesta dos Descobrimentos - quer ainda
como ponto de partida e chegada das armadas portuguesas e como entreposto comercial das mercadorias
oriundas dos novos mundos com destino a Lisboa, e daqui encaminhadas para outros portos europeus.
Paralelamente, não foi de menor importância o papel do porto de Lisboa do ponto de vista cultural, técnico e
científico, sabendo-se que os navios que aqui chegavam não transportavam só mercadorias e bens materiais,
traziam também, das novas terras, experiências inovadoras nas áreas do conhecimento, das ideias, das artes,
das ciências e das técnicas, veiculadas pelos livros ou através de gente de pensamento e de acção que aqui
aportava ao serviço da Igreja, da Coroa ou da Universidade.
Nos séculos posteriores, o porto de Lisboa teve um papel primordial na colonização, na ocupação e na administração dos territórios portugueses de África, América, Ásia e Oceânia – e assim foi até ao final do período
da descolonização, assegurando o transporte marítimo de pessoas e de carga, apesar da via área ter vindo a
ganhar, progressivamente, terreno nas comunicações entre Portugal e as colónias ao longo do século XX.
As alterações operadas nas últimas décadas nos sistemas de transportes levaram à existência, por toda a
parte, de zonas portuárias abandonadas, e conduzido, em consequência disso, à sua requalificação, conferindo-lhes novas funções, nas áreas do lazer, do turismo, da actividade cultural, entre outras.
Em Lisboa, tem vindo a verificar-se uma crescente aproximação dos lisboetas ao estuário do rio, mercê do
aproveitamento para novos fins de estruturas anteriormente relacionadas com a actividade portuária. Mas,
neste plano, há ainda muita coisa que pode e deve ser feita no sentido de atrair um maior número de lisboetas e de visitantes da Cidade para que possam desfrutar mais e melhor das margens do Tejo – enquanto o
Maria Eduarda Napoleão
Vereadora em representação do Presidente da Câmara
Municipal de Lisboa, Pedro Santana Lopes, Portugal
Sr. Ministro das Obras Públicas, Transportes
e Habitação; Mr. le Sécrétaire d’État des Affaires
Étrangères de France; Sr. Presidente da Associação
Internacional Cidades e Portos; Sr.ª Presidente da Junta
Metropolitana de Lisboa; Minhas Senhoras e meus
Senhores.
fluxo turístico de visitantes por via marítima tem vindo a crescer anualmente, tendo os navios de cruzeiro que
aportaram ao porto de Lisboa, em 2003, atingido o maior número de sempre.
O que vier a ser discutido nesta Conferência, será certamente de muita valia para o futuro urbanístico da
Lisboa ribeirinha, como também o será no que se refere à própria actividade portuária no quadro do comércio marítimo internacional e às suas repercussões na economia da Cidade e do País. A Câmara Municipal de
Lisboa não deixará de estar particularmente atenta ao que aqui for debatido, tratando-se de assuntos em que
lhe cabe intervir, juntamente com outras instâncias do Governo.
Por tudo isto, muito se espera dos debates e das conclusões desta 9ª Conferência Internacional Cidades e
Portos, a que auguro os maiores êxitos. E permitam-me que, em nome da Cidade de Lisboa, dê as boas
vindas a todos os participantes, figurando entre eles os mais prestigiosos especialistas nas diversas áreas em
estudo, e a todos deseje uma feliz estadia nesta Cidade à beira do Tejo erguida. ❘❙❚
Giuliano Gallanti
Presidente da Association Internationale
“Villes et Ports”, França
Sr.ª Presidente; Senhores Ministros de Portugal e de
França; Representante da Câmara Municipal de
Lisboa; Minhas Senhoras e Meus Senhores; Delegados
e Convidados
É com grande prazer que nos encontramos hoje em Lisboa para a abertura da 9ª Conferência da nossa
Associação. Agradecemos franca e sinceramente a calorosa recepção que nos foi dispensada.
Lisboa, como sabem, é uma cidade portuária particularmente activa na AIVP. Em conjugação com o Porto e
a Área Metropolitana de Lisboa, que também nos acolhem nesta ocasião, está, há já alguns anos, envolvida
nos nossos trabalhos. Para aqueles que já cá estiveram por ocasião da realização de uma assembleia-geral,
em 1998, trata-se de um feliz retorno, para muitos de nós que aqui estão pela primeira vez, é uma oportunidade para apreciar a vossa hospitalidade. A expressiva participação internacional nesta conferência constitui
já um grande êxito, que os números conhecidos não deixam de reflectir: cerca de 600 delegados inscritos
em sessões de trabalho; 135 delegações oriundas de cidades portuárias; 52 países representados.
A vossa presença é testemunho da vitalidade da nossa associação e do interesse dado aos debates. Reflecte
também a atracção internacional de Lisboa, muitas vezes citada como uma das mais bonitas e simpáticas cidades europeias, mas também uma das mais dinâmicas e abertas ao mundo. Nestes quatro dias de conferência
vamos falar precisamente sobre essa realidade.
A abertura ao mundo é, sem dúvida, aquilo que caracteriza melhor as nossas cidades e os nossos portos. Se quiserem, a mundialização começou sobretudo nas cidades portuárias. É dessa especificidade que tiramos a nossa
força; é do desenvolvimento do comércio internacional e do aproveitamento da economia globalizada que se
fomenta a criação de emprego e de riqueza para as cidades e regiões portuárias. Mas esta abertura é também,
por vezes, fonte de inquietações. As cidades portuárias devem estar atentas às decisões dos agentes económicos
à escala mundial, tomadas muitas vezes longe da origem das coisas e que escapam às cidades portuárias.
Ao longo dos anos, temos desenvolvido muitos e permanentes esforços para tornar os nosso portos cada vez
mais eficientes e as nossas cidades cada vez melhor adaptadas aos desafios internacionais, mas cada um de nós
está consciente de que estes esforços podem ser rapidamente postos em causa por razões de geopolítica e
pelas modificações dos ciclos económicos planetários, ou simplesmente por uma alteração das estratégias deste ou daquele operador portuário. É certo que as crises anunciadas de energia e das matérias-primas pesam
sobre as zonas industriais e portuárias, mas há ameaças novas que temos de enfrentar, como, por exemplo,
o terrorismo internacional, as mudanças climáticas e a subida do nível dos oceanos. Realidades estas com que
muitas cidades portuárias têm que lidar em poucas gerações. É necessário reagir a esta situação.
Como eu dizia há pouco, muitas vezes somos ultrapassados por acontecimentos que nos colocam na condição de
grandes operadores portuários. Temos que nos adaptar rapidamente a essa realidade, adequando as nossas infraestruturas e competências, para garantir padrões competitivos, num mercado aberto e ferozmente concorrencial.
Qual é a resposta que vamos dar a esta problemática? – é esta a grande questão em debate nesta conferência.
Uma das atitudes positivas que temos de ter é a diversificação das actividades de cada cidade portuária, a
busca de nichos específicos para as valorizar, segundo contextos geográficos, históricos e sociais de cada lugar.
Muitos dos membros da AIVP sabem disto há já muito tempo. É preciso para tal dispor de uma visão comum
entre a cidade e o porto e estratégias portuárias que sejam mais do que simples estratégias do porto ou da cidade, que são pré-requisitos indispensáveis a esta reactividade, que deve ser menos política e mais técnica.
A verdade é que, por paradoxo que seja, o porto tem mais necessidade da cidade do que a cidade do porto, porque os processos de mundialização dos portos e os seus agentes dinamizadores são, muitas vezes,
influenciados pelas grandes potências internacionais.
ABERTURA OFICIAL
15
Outro dos temas de que vamos falar é a Identidade. Trata-se do cerne dos debates desta Conferência. Cada cidade
portuária tem os seus próprios valores e isso é importante, tanto ao nível cultural como económico e social, sobre os
quais se constrói um património próprio, que lhes dá identidade. Estes valores identitários inscrevem-se na paisagem,
na arquitectura, mas também nas práticas de cada local para os quais servem de pontos de referência, arriscando-se,
muitas vezes, a desaparecer em benefício de uma certa estandardização das cidades portuárias internacionais.
O desejo de modernidade e identidade da cidade portuária deve ser a pedra angular dos novos projectos,
articulados com a sua estratégia de desenvolvimento competitivo. A identidade, que é diferente de cidade
para cidade, tem também um elemento comum, o que me leva a formular uma proposta para a qual quero
chamar a vossa atenção – a da solidariedade. Muitas vezes é uma ideia considerada moralista, mas creio que
actualmente o factor solidariedade ou seja, um relacionamento de proximidade entre cada uma das cidades
é, nesta altura, uma necessidade de desenvolvimento económico, de troca de experiências e de ideias, que
estes encontros proporcionam, reforçada pelos exemplos que os projectos em curso na maioria das cidades
do mundo favorecem. Isto é muito importante para enfrentar com eficácia os novos desafios do mundo.
Será que é suficiente? Não sei, mas penso ser o caminho certo. Temos que aprender a trabalhar cada vez
melhor e em conjunto, sobretudo nas cidades portuárias. Este elemento de ajuda é um factor fundamental
para o sucesso das nossas cidades portuárias, para podermos construir as novas auto-estradas do mar, para
desenvolver a cooperação entre cidades portuárias interiores e cidades portuárias marítimas, para gerir as
problemáticas da segurança, para dominar as questões ambientais que atingem o mar e as zonas costeiras.
As cidades portuárias têm de colaborar entre si, o que não quer dizer que deixem de ser competitivas. Creio
que os agentes das cidades portuárias têm uma responsabilidade colectiva no estabelecimento de novas
práticas, mais duradouras, no que diz respeito à circulação e à produção de bens.
Nas décadas vindouras estou convicto de que a colaboração e a solidariedade entre todas as cidades portuárias do mundo serão indispensáveis para o desenvolvimento de novas estratégias internacionais. Esta nova
solidariedade deverá ter cada vez mais em conta as necessidades de todos, dentro dos limites dos recursos
planetários, cuja fragilidade e desigualdade distributiva nós conhecemos, e também dentro do respeito pela
cultura e identidade de cada uma das nossas cidades.
Estou convicto que esta Conferência o irá testemunhar. Quanto mais nos conhecermos, melhor poderemos
ajudar ao desenvolvimento das cidades portuárias e participar activamente no bem-estar de todos. Não
tenho dúvida que os trabalhos que começam amanhã vão contribuir para isso. ❘❙❚
É com particular satisfação que participo na cerimónia de abertura da 9ª Conferência Internacional das Cidades e Portos, subordinada ao tema Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias, que decorrerá ao
longo da semana nesta magnífica cidade europeia de Lisboa, pelo que felicito desde já a AIVP e todos os
municípios da Área Metropolitana de Lisboa.
Queria, em particular, felicitar a Junta Metropolitana de Lisboa, e a sua Presidente, Dr.ª Maria da Luz Rosinha, pela
promoção deste grande evento que prestigia não só a Grande Área Metropolitana de Lisboa como o País.
O mar foi durante séculos o principal motor de desenvolvimento das grandes cidades, fazendo-as verdadeiras
cidades portuárias. As zonas marítimas e costeiras foram desde sempre palcos por excelência na fixação de
importantes centros populacionais, Portugal tem hoje mais de 80% da sua população a viver junto ao litoral.
Estas zonas foram evoluindo mediante operações de transformação dos seus espaços urbanos e das frentes
ribeirinhas perfiladas numa estratégia, nem sempre respeitadora de um desenvolvimento sustentável.
Nesse propósito, tornou-se fundamental fazer a deslocalização de algumas instalações portuárias, procurando novos espaços e melhores acessibilidades, desenvolvendo áreas especializadas de actividade comercial fora da zona
urbana, de que são exemplo os terminais portuários. Deste modo existe uma libertação de espaço, para que a
cidade possa responder a novas solicitações de índole económica, social e ambiental respeitando as suas características geográficas e culturais. Vários são os exemplos, alguns dos quais já foram aqui referidos, nomeadamente o
da cidade de Marselha, onde se tem vindo a trabalhar arduamente na reconversão urbanística destes espaços.
Relembro que, por exemplo, na cidade de Lisboa, até há relativamente poucos anos atrás, havia uma vasta
extensão ribeirinha que era ocupada por uma actividade portuária para a qual hoje já não existe vocação, que
criava uma barreira à comunicação entre a cidade e o rio. Como sabem, o estuário do Tejo que temos aqui
à nossa frente, é talvez o maior estuário da Europa.
Carmona Rodrigues
Sua Excelência o Ministro das Obras Públicas
Transportes e Habitação, Portugal
Exmo. Sr. Secret. de Estado dos Negócios Estrangeiros
de França, Renaud Muselier; Exmo. representante
do Sr. Pres. da Câmara Municipal de Lisboa, Dr.
Pedro Santana Lopes; Exma. Sra. Pres. da Junta
Metropolitana de Lisboa, Dr.ª Maria da Luz Rosinha;
Exmo. Sr. Pres. da AIVP – Association Internationale
Villes et Ports, Giuliano Gallanti; Exmas. Senhoras e
Senhores Convidados.
Fora da área portuária, mas criando um segundo nível de barreira na cidade, desenvolveu-se, naturalmente, ao longo dos anos um conjunto de indústrias, de armazéns e de edifícios, cuja actividade estava intrinsecamente associada
à função portuária. E foi assim, tal como noutras cidades europeias onde se verificou nos últimos 30 anos uma alteração substancial dessa actividade, criando-se zonas mortas - as zonas castanhas como alguém diz no planeamento
urbano - que introduziram um problema nas cidades. Hoje, cidades como Marselha, Nápoles, e outras urbes europeias e mundiais vivem a necessidade de reconversão, de reabilitação, tendo em atenção, obviamente, o desígnio
da actividade portuária que é parte da identidade das cidades, mas reabilitando o seu papel no sentido de reconfigurar a própria cultura, os valores patrimoniais, sócio-económicos e ambientais em direcção à frente ribeirinha.
A estratégia que tem vindo a ser seguida assenta no investimento e na requalificação das áreas portuárias
dentro das zonas urbanas, para que estas se reencontrem com a cidade. É disto exemplo a zona das “Docas”
e o parque “Expo” conhecido por todos na cidade de Lisboa; O mesmo princípio foi seguido em cidades
como Setúbal, Porto e tantas outras a nível nacional, europeu e internacional.
O porto é um elemento estruturante e integrante da identidade da cidade, motor da sua modernidade e competitividade. É necessário repensar a recomposição do território urbano e portuário por forma a que resulte uma comunidade territorial adaptada às novas exigências sócio-económicas com respeito pelos valores culturais e ambientais.
Neste sentido, os portos não se podem resumir à simples movimentação de cargas - a sua actividade nuclear
- devendo alargar o seu âmbito de acção a outras actividades, como a actividade logística, baseado nos seus
próprios recursos, ou mediante parcerias estratégicas com os operadores privados nacionais e internacionais, bem como a actividades do foro social e ambiental. Falo-vos por exemplo das actividades de turismo,
lazer e de gestão dos espaços verdes. O porto de Lisboa tem sido um exemplo de sucesso na captação de
turismo através de um movimento muito significativo de navios de cruzeiro, tendo sido no ano passado a
segunda cidade europeia com mais movimento deste tipo de navios.
Hoje, é claro que Portugal tem de apostar num modelo de desenvolvimento sustentável das suas cidades,
baseado no aumento da produtividade e da competitividade. Para isso é fundamental definir um sistema de
desenvolvimento dos transportes marítimos e dos portos integrado na política nacional de transportes e logística; criar uma Lei-Quadro para o sector que aprofunde o papel regulador do Estado e defina um sistema de
planeamento estratégico de desenvolvimento sustentado para os portos. É importante a integração dos portos
portugueses nas Redes Transeuropeias de Transportes, tendo em consideração as directrizes orientadoras e
os critérios que vierem a ser definidos ao nível europeu para a sua inclusão naquelas redes.
É também importante a criação de plataformas logísticas como centro fulcral do sistema marítimo-portuário,
designadamente no tocante ao transporte de cargas contentorizadas, contribuindo para o reforço da competitividade económica dos portos e de toda a cadeia logística em que estes se integram. Revela-se essencial
a criação de condições para garantir o auto-financiamento das autoridades portuárias, através da definição
de um sistema de financiamento que potencie condições equitativas de crescimento e desenvolvimento dos
portos. Neste sentido, o Ministério das Obras Públicas, Transportes e Habitação realizou um estudo estratégico que visa apresentar um novo modelo de gestão para os Portos Nacionais.
A organização actual não permite uma visão integrada dos portos nacionais, o que se traduz no actual excesso e
mesmo desadequação, de uma parte significativa da oferta de infra-estruturas portuárias relativamente à procura.
Este facto tem ainda conduzido a uma política de investimentos desadequada, com excessiva participação
pública, assumindo o Estado, quase sempre, o risco do negócio. Os nossos portos comerciais continentais
movimentam, aproximadamente, 57 milhões de toneladas de mercadorias por ano, sendo que os principais
portos dispõem das infra-estruturas necessárias para movimentar todos os tipos de carga.
A proposta em análise assenta na Criação da Entidade Gestora dos Portos Nacionais que terá como objectivo constituir uma sociedade que detenha o capital das Autoridades Portuárias e o património dos portos secundários.
Esta Entidade, será dotada dos meios físicos e legais para cumprir as suas atribuições de planeamento estratégico, administração e controlo de gestão dos portos; promoção internacional do Sistema Portuário Português; coordenação do desenvolvimento/ investimento nos portos, e terá também como função a prestação
de serviços comuns passíveis de serem partilhados por todos.
Assim, e para os próximos três anos estão previstas quatro grandes linhas de actuação estratégica: a Eficiência, numa óptica económico-financeira, a Excelência Operativa, numa óptica de qualidade/ redução de
tempo na passagem das mercadorias pelos portos, a Responsabilidade Social, numa óptica de integração com
as cidades e de respeito pela segurança, minimizando o impacte ambiental e urbano da operação portuária e
a Governabilidade, numa óptica de estabilização do sector e de gestão estratégica integrada dos portos.
ABERTURA OFICIAL
17
Esta visão assenta em quatro princípios fundamentais de actuação: o da Garantia Pública, o da Gestão Integrada, o da
Auto-suficiência de exploração e o da Excelência no desenvolvimento das actividades pelos Portos portugueses.
Portugal tem desenvolvido esforços no seio da União Europeia para o estabelecimento das AEMAR – Autoestradas Marítimas do Atlântico que consiste na criação de linhas regulares de transportes marítimos de
mercadorias entre portos da Comunidade. Dando assim cumprimento a um grande objectivo no sector dos
transportes, a promoção da transferência modal de um número cada vez maior de toneladas de mercadorias
da rodovia para modos de transporte mais respeitadores do ambiente.
No que refere à Segurança, a escolha da cidade de Lisboa como Sede da Agência Europeia de Segurança
Marítima é o corolário do empenho, interesse e determinação com que o Governo Português se envolveu
e conduziu todo o processo. Ainda no âmbito da segurança, acabou de entrar em vigor, no passado dia 1
de Julho de 2004, de acordo com as directivas da OMI (Organização Marítima Internacional) a adopção do
código ISPS (International Ship and Port Facility Security Code), de extrema importância para a melhoria da
segurança da cadeia logística do abastecimento do transporte marítimo, do fornecedor ao consumidor.
Foi também por nós criado o Conselho Nacional dos Portos e dos Transportes Marítimos e aprovada a
moldura legal relativa à segurança marítima.
Todas estas medidas visam reestruturar o sistema portuário por um lado, e desencadear acções que permitam uma recomposição do território urbano e portuário por outro, para que o resultado seja a criação de
uma comunidade territorial.
Neste sentido é fundamental ter como princípio que a modernidade das nossas cidades é construída no
respeito pela sua identidade histórica - o retrato mais fiel da cultura de um povo - traduzida na valorização
dos conhecimentos adquiridos e na prospecção da sua visão futura.
Em suma, é necessário encontrar valores que identifiquem e promovam cada cidade e cada porto e os diferenciem dos demais. Esta é a via ideal para reforçar um lugar portuário, moderno e competitivo. É do estreitar de
laços, do trabalho conjunto e em parceria cidade / porto, que se reforça a sua identidade e especificidade.
Este é o caminho, determinados em conciliar inovação com modernização do serviço público, pela redefinição e requalificação de espaços ribeirinhos integrados dentro das nossas cidades. É fundamental promover a
interacção entre a política portuária e o ordenamento do território.
Tornar Portugal um País Inovador é um desígnio nacional! Os países inovadores estão constantemente em
busca de novas oportunidades e de novas formas de melhorar a qualidade de vida dos seus cidadãos. Criam
riqueza, premeiam a iniciativa, incentivam o risco. Há pois que saber aproveitar, de forma inteligente, os
desafios, transformando-os em oportunidades.
No alcance deste desiderato é fundamental o esforço conjunto de todos os agentes envolvidos desde a administração
central, autarquias, autoridades portuárias, operadores dos portos e os próprios cidadãos. É desta visão articulada e de
conjunto que se fará o caminho da modernidade, atento o respeito pela identidade de cada cidade portuária. ❘❙❚
É com muito prazer que estou aqui convosco na 9ª Conferência Internacional sobre as Cidades e os
Porto, aproveitando a oportunidade para saudar o Sr. Gallanti pelo seu dinamismo dentro da AIVP e todos
os congressistas presentes.
No âmbito das minhas responsabilidades ministeriais, como eleito pela cidade de Marselha, e na qualidade de
vice-presidente da AIVP, pude avaliar, à escala local e internacional, até que ponto as cidades portuárias estão
no coração dos desafios do mundo actual.
O tema da conferência deste ano “Modernidade e Identidade das Cidades Portuárias” é particularmente
pertinente. Permite apreender uma das questões mais importantes com que as cidades portuárias são confrontadas num mundo cada vez mais mundializado e globalizado: como podemos conciliar as exigências de
modernidade com a necessária salvaguarda da identidade própria das cidades portuárias?
Quando da leitura do programa, não pude deixar de reparar no valor do leque de convidados, de todas as áreas
e de muitas nacionalidades, o que faz prever a qualidade dos debates que vamos ter nos próximos dias.
Os especialistas e os investigadores que falarão depois de mim, terão a oportunidade de dissertar sobre
a noção de cidade portuária, dispensando-me dessa tarefa. Desejo simplesmente que possam partilhar
da minha opinião relativamente à necessidade de um diálogo renovado entre cidade e porto como elo
decisivo de novos tempos.
Renaud Muselier
Sua Excelência o Secretário de Estado dos Negócios
Estrangeiros de França
Senhor Ministro; Senhora Presidente da Junta
Metropolitana de Lisboa; Senhor Presidente da AIVP;
Senhora representante da Câmara Municipal de
Lisboa; Minhas Senhoras e Meus Senhores
Destino final de uma rota de transportes, o porto, até ao fim do século XVIII, estava enraizado na cidade:
era um centro da vida mercantil e um centro de instituições públicas. Nas representações de Veneza,
Barcelona e Bruges, o porto aparece em primeiro plano com determinado poder sobre a cidade que lhe
era próxima.
O porto e a cidade formaram assim, durante muito tempo, um sistema baseado na complementaridade
entre as suas diferentes funções, por forma a criar capacidade de troca entre as necessidades de um e as
vantagens de outro.
Para além destes aspectos económicos, os portos constituem também a alma das cidades. Durante muito
tempo, a aventura partiu dos portos. Entre chegadas e partidas, toda a cidade vivia ao ritmo do mar. Este
movimento perpétuo fez desenvolver o comércio, engendrou novos contactos e novas relações. Com o
tempo, as cidades portuárias foram enriquecendo e tendo uma identidade cada vez mais própria.
Entretanto, sobre os efeitos do exterior, as cidades e os portos evoluíram rapidamente e a natureza das suas
relações mudou. Uma grande parte das actividades portuárias foi deslocalizada para fora do território urbano
e as antigas instalações portuárias do coração das cidades foram progressivamente postas de parte até se
tornarem obsoletas.
O abandono dos grandes hangares em brique, a arquitectura portuária por excelência, testemunha esta
transformação - a passagem de uma situação de armazenamento para um outro sistema.
Estas mutações vieram modificar profunda e rapidamente a natureza dos portos. Aquilo que antes era
o pólo de desenvolvimento de uma cidade depressa ficou esquecido. Os portos no coração das cidades ficam no imaginário colectivo, sobretudo como símbolo de decadência, ou como uma lembrança
nostálgica do passado.
No entanto, progressivamente, no prolongamento das primeiras reconversões ocorridas nos EUA entre
1930 e 1960 – a intervenção nas frentes ribeirinhas – as cidades portuárias começaram a reduzir a fractura
que surgiu entra a cidade e o porto, retomando a sua relação bilateral. Hoje em dia, são cenário para recomposições urbanas espectaculares. São numerosas as cidades nos EUA que podem exemplificar toda esta
dinâmica urbana.
Rejeitando o seu carácter portuário, as cidades aperceberam-se que mantendo o seu carácter portuário tradicional se privavam de um adorno fundamental, fonte de identidade, de atractividade e de desenvolvimento.
Assim, cada vez mais, as operações actuais procuram favorecer as novas funções portuárias adaptadas ao
contexto urbano e em benefício das cidade e dos portos.
Este movimento, que eu qualifico como reconciliação entre a cidade e o seu porto, é, hoje em dia, uma
fonte de desenvolvimento para as cidades portuárias e de melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes.
As interdependências que esta aposta proporciona projecta a atracção de fluxos de riqueza para um modelo
de cidade portuária agradável, moderna, bela, inteligente e atractiva.
Neste contexto, o ordenamento surge como um meio de promoção ao serviço do desenvolvimento, respondendo às exigências sociais e económicas actuais.
Devido à sua localização junto à água, as cidades portuárias podem responder a estas questões de qualidade
de vida. Mas elas não detêm o monopólio da integração da água para a implantação de funções urbanas num
cenário agradável e atractivo. Outras cidades partilham este tipo de projectos.
As cidades portuárias têm, acima de tudo, interesse em se evidenciarem e tirar partido da especificidade
do seu território, não só em relação à sua localização, mas também atendendo à sua vocação industrial e
portuária, a que a história destas cidades está intimamente ligada.
Para as cidades portuárias trata-se de representar a história e a vocação portuária, sem pôr em causa o seu
desenvolvimento, através de uma política patrimonial que consiste em preservar e reconverter edifícios de
utilidade industrial, afectando a sua utilização para outras actividades. Opção que corresponde, muitas vezes,
a uma exigência emergente do desenvolvimento turístico. Foi o que aconteceu em Marselha e também
noutras cidades.
Esta especificidade própria da cidade portuária traduz-se também em termos de paisagem, inventando-se uma envolvente paisagística diferente que responde à escala marítima com novos equipamentos
ligados ao mar.
Esta paisagem tem força própria, visível tanto do mar como de terra. As sonoridades e os odores são também distintos, atraindo muita gente para as cidades portuárias, nomeadamente para as suas praias e espaços
de divertimento.
ABERTURA OFICIAL
A preservação dos edifícios de utilidade industrial e a sua utilização para outras actividades, corresponde,
muitas vezes, a uma exigência emergente do desenvolvimento turístico.
A meu ver, o turismo cultural que vive dos museus marítimos e do turismo de massas no binómio mar
/ praia, dão às cidades portuárias uma nova dimensão espacial que as torna cada vez mais acessíveis e
interessantes.
Existe também a tendência para um processo de «musealização» da cidade portuária, que pode ser a verdadeira oportunidade de mutação da cidade portuária no actual sistema mundial de produção de riqueza e
mais um pólo de atracção para as cidades portuárias.
O contexto económico actual, orientado para os serviços e o comércio, faz das cidades espaços produtivos privilegiados, que concentram fluxos, actividades e riquezas – numa verdadeira «metropolização» dos
espaços urbanos.
Paralelamente, cada cidade insere-se nas redes globais onde é posta em concorrência directa com os seus
semelhantes – num processo conhecido como a mundialização das relações e dos negócios.
Para assegurar o seu desenvolvimento, as cidades procuram garantir e dinamizar o máximo de fluxos competitivos de modo a posicionarem-se solidamente numa escala regional, nacional ou internacional.
As cidades portuárias constituem historicamente locais de troca para o mundo e têm por isso necessidade de
se adaptarem a este novo contexto económico.
Os portos têm, muitas vezes, a tendência para serem considerados como utilidades técnicas ao serviço duma
estratégia nacional, o que consequentemente priva as cidades do seu contacto internacional.
O desafio para os responsáveis políticos consiste em voltar a dar às cidades portuárias o papel de interfaces
internacionais e restabelecer um quadro de sinergias entre funções portuárias e urbanas.
Esta dinâmica visa acompanhar e estimular o processo de metropolização através das funções de intermediação e de trocas, sobretudo no que diz respeito aos centros de decisão política. Tem ainda por objectivo
permitir uma melhor integração da cidade portuária no comércio internacional.
Através do reforço das competências e dos serviços locais, temos de encarar esta nova relação entre a cidade
e o porto, como um processo sinergético portador de desenvolvimento ao serviço da cidade portuária.
Esta estratégia foi usada há uns anos atrás em Marselha, um dos maiores portos do Mediterrâneo. A aposta
do projecto «Cité de la Méditerranée à Marseille» era fazer coexistir uma cidade habitada e um porto activo.
A «Cité de la Méditerranée» situada na interface do centro da cidade e do porto, encarna a ambição de descobrir um modus vivendi entre estas duas entidades que estavam separadas há já algum tempo.
Em Marselha, tivemos possibilidade de desenvolver novas estratégias face aos desafios que se nos colocavam
e a oportunidade para aproximar mais o porto da cidade.
Esta relação entre o porto e a cidade é muito importante para uma cidade portuária, sobretudo para manter
a sua modernidade e a sua identidade, tema da conferência.
A implicação de todos os agentes locais é fundamental para criar um dinamismo próprio durável e sustentável para os locais portuários. As parcerias também são fundamentais e os desafios que têm que enfrentar
dependem dessa relação de proximidade.
Este seminário, que conta com a presença de mais de 50 países, irá debater interesses estratégicos comuns,
enriquecendo o nosso saber com propostas inovadoras, permitindo-nos, ao mesmo tempo, aprofundar o
intercâmbio entre os vários agentes portuários e evitar que se cometam no futuro erros importantes. ❘❙❚
19
Competitividade Portuária
e Modernidade Urbana
As mutações muito rápidas que ocorrem nos portos torna-os bons locais de acolhimento
para actividades diversas, necessitando para esse efeito que sejam revistas as condições da
sua operacionalidade, de modo a disporem de melhor capacidade de resposta às necessidades do mercado, cada vez mais exigente. Isto é um problema, quer para os portos, quer para
as próprias cidades.
O desenvolvimento do tecido urbano, sobretudo ao nível social e económico, tem de ser
visto à luz do papel do porto na cidade. De qualquer forma é uma problemática que não
é fácil de resolver. O tempo de transformação pedido pelos processos de modernização
das grandes companhias de navegação e dos terminais marítimos não corresponde, muitas
vezes, ao tempo de transformação das cidades. Este processo confronta-se muitas vezes e
de forma violenta com a dinâmica portuária que exige adaptações rápidas e investimentos
consideráveis.
Parece-me, por isso, particularmente importante estabelecer bases de diálogo entre as cidades e os portos para se obter uma atitude reactiva no seu conjunto, quer dos portos, quer da
cidade e de todos os grandes operadores económicos. É um pouco esta a chave do sucesso
de uma cidade portuária. Condição ideal para oferecer novos serviços aguardados pelos
operadores portuários, incluindo também as zonas logísticas indispensáveis para o tráfego
marítimo. Não é apenas uma porta para a passagem de mercadorias mas, mais do que isso,
é um valor acrescentado, um elemento de criação de riqueza.
A competitividade do porto – um dos temas deste encontro - passa pela modernização da
cidade. Estas intervenções deverão dar, em primeira mão, contributos para as questões que
nos preocupam ou que nos preocuparão nos anos vindouros.
Antes de mais, como vamos abordar a questão da planificação cidade/porto a curto, médio
e longo prazo? Como é que os espaços urbanos se irão acomodar à rápida adaptação dos
portos às estratégias dos operadores marítimos internacionais? Como é que o tríptico porto/
cidade/ indústria se vai desenvolver? Qual o papel do porto nesta envolvente? Como é que
vamos lidar com a gestão do tráfego de mercadorias? Existem novas estruturas e novas ferramentas de planificação que permitem ultrapassar o antagonismo que ainda existe entre as
cidades e os portos. É este desafio de planificação que está a ser discutido em vários países
europeus. Será que a aproximação entre a cidade e o porto é a resposta correcta e realista
esperada por ambas as entidades? ❘❙❚
SESSÃO I
Giuliano Gallanti
Presidente da Association Internationale Villes
et Ports, França
Presidente da Mesa
Intervenção de
Antônio Carlos Soares Lima
Pres. da Companhia Docas do Rio de Janeiro, Brasil
O Sistema Portuário
do Estado do Rio de Janeiro:
infra-estruturas
e perspectivas de negócios
Porto de Angra dos Reis
O Brasil tem uma população de 176 milhões de habitantes, 8.514.877 km2 de área, divide-se em cinco
regiões, 27 Estados, 561 Municípios, e exportou, nos últimos 12 meses, 79,935 biliões de dólares, tendo
importado 51,935 biliões de dólares.
A população do Estado do Rio de Janeiro, situado numa região do país com clima tropical, cifra-se em 13,406
milhões de habitantes, distribuídos por 92 Municípios, localizados num raio de 500 km, representando 70%
do Produto Interno Bruto (PIB) nacional.
Na actualidade, a Bacia de Campos, situada no mesmo Estado, é um dos maiores produtores de petróleo no
Brasil, servindo o porto, pela sua proximidade, como base de apoio às plataformas aí existentes.
A Companhia Docas do Rio de Janeiro é uma empresa de capital misto, englobando quatro portos que
movimentaram no ano passado o equivalente a 27 milhões de toneladas, destacando-se entre eles o Porto
de Sepetiba, o maior de todos, que representa 73% da carga total movimentada pelos portos administrados,
enquanto o tráfego do Porto do Rio de Janeiro se situa nos 26%.
As áreas de negócio que se desenvolvem no porto - os portos públicos são explorados pela iniciativa privada,
em regime misto - distribuem-se por três formas de contrato negocial: 1. Contrato dito operacional, de curta
duração, em que o cliente / investidor não tem necessidade de investimento, encontra já a infra-estrutura pronta
a explorar; 2.Contratos de arrendamento, entre 25 e 50 anos, correndo os investimentos por responsabilidade
do cliente, mas podendo ser deduzidos dos contratos; 3. Parceria entre o sector público e a iniciativa privada,
produzindo respostas no curto prazo de modo a suprir algumas deficiências das infra-estruturas portuárias.
O poder político encaminhou recentemente para o Congresso Nacional um projecto legislativo de parceria público/privado - um sistema em que o país acredita muito – dada a reduzida capacidade de investimento público.
Em qualquer dos casos, para negociar com a Companhia Docas Rio de Janeiro (CDRJ) os interessados devem apresentar um estudo de viabilidade, estarem habilitados a participar em concursos e apresentar as garantias tradicionais.
No conjunto dos portos administrados pela nossa Companhia, o Porto de Angra dos Reis está fase de expansão e especializou-se em produtos siderúrgicos e granel, havendo a pretensão de instalar ainda um terminal
de off-shore. A sua localização central e a existência de uma retro-área com vários terrenos próximos da
cidade, permite admitir um crescimento exponencial dos negócios e a exploração do potencial da pesca.
Neste contexto está a ser desenvolvido entre a Companhia Docas, a Prefeitura do Município de Angra dos
Reis e a iniciativa privada, um projecto destinado a implantar uma marina na enseada de S. Bento.
Na Baía de Guanabara, estão localizados dois portos - Rio de Janeiro e Niterói – um em frente do outro.
O Porto de Niterói foi criado em 1925, a leste da Baía de Guanabara, sendo a sua vocação actual os graneis
agrícolas e carga geral. Foi aprovado no mês de Abril o respectivo plano de negócios, estando já em curso o
arrendamento, por períodos de 25 a 50 anos, de duas áreas do porto para off-shore. Servido pela BR 101,
tem um canal de acesso de 18,5 km e um comprimento de 150 metros. Por outro lado, dispõe de 430
metros de cais contínuo, três berços e dois armazéns, cada um deles com 3.300 m2.
Competitividade Portuária e Modernidade Urbana
SESSÃO I
Porto de Niterói
O Porto do Rio de Janeiro, localizado no centro da cidade, tem vocação para carga geral, produtos siderúrgicos,
papel, graneis agrícolas e contentores, armazenada em 23 armazéns, com 3000 m2 cada. O acesso rodoviário
faz-se pela BR 040, BR 101 e BR 116, dispondo ainda de ligação ferroviária. O canal de acesso ao Porto do Rio de
Janeiro tem 18,5 km, 150 metros de largura e 17 metros de profundidade e um cais contínuo de 6.700 metros.
Os principais produtos movimentados no Porto do Rio de Janeiro são: veículos, produtos siderúrgicos, trigo e açúcar.
O terminal de passageiros está em expansão, tendo movimentado, no ano passado, 82.000 passageiros e
recebido cerca de 80 acostagens, o que faz admitir um mercado com um potencial de crescimento bastante
significativo. O Porto do Rio de Janeiro movimentou, em 2002, aproximadamente 100.000 passageiros
transportados em 79 navios e, em 2003, 81.818 passageiros.
A Administração do Porto do Rio de Janeiro em conjunto com a Prefeitura está a desenvolver um processo
de revitalização do centro da cidade, do espaço que se estende para além da zona portuária, numa lógica de
integração entre o porto e a cidade. Durante vários anos a cidade foi crescendo, isolando o porto, marginalizando-o. Agora o Porto do Rio de Janeiro ressurge com perspectivas novas.
Porto do Rio de Janeiro
23
2015 - Porto do Rio de Janeiro
Porto do Rio de Janeiro
Porto de Sepetiba
Porto de Sepetiba
O último projecto apresentado para a área do pier foi a instalação do Museu Gugenheim, o que gerou uma
grande polémica na cidade do Rio de Janeiro. O Prefeito, a princípio, desistiu do projecto, abrindo-se agora
novamente a sua discussão para escolher o tipo de empreendimento que deve ser feito no pier.
Seguindo a tendência mundial de integração porto/cidade, a opção do porto foi no sentido de promover
a relação de proximidade com o cidadão, contrária ao isolamento tradicional das estruturas portuárias, o
Porto do Rio de Janeiro vai destinar os seis primeiros armazéns para shopping centers, salas de conferências,
cinemas, etc.
O Porto de Sepetiba é a maior infra-estrutura portuária administrada pela Companhia Docas. Tem uma extensão total de 10 milhões de m2 e está localizado na costa norte da Baía de Sepetiba. A sua vocação é para graneis
sólidos ( coque e carvão ), agrícolas, contentores e roll-on/ roll-off. Também é servido pela BR 101 e dispõe de
ligação ferroviária com o centro-sul. Tem um canal com 200 metros de largura e 19,5 metros de profundidade.
O seu cais multiusos tem 810 metros de comprimento, 32 metros de faixa de largura e 400 mil m2 de retroáreas. Tem três berços de atracação com 270 metros de comprimento e 14,5 metros de profundidade.
Os próximos negócios no Porto de Sepetiba são a instalação de mais dois terminais para graneis agrícolas,
incluindo a soja, graneis líquidos, gasosos e sólidos (minério) áreas operacionais e zona de apoio logístico,
onde pretendemos instalar toda a base de apoio ao porto e uma área para arrendamento.
O Brasil entra agora numa fase de estabilização da economia, prevendo-se num novo ciclo com perspectivas
de crescimento de 3,5% do PIB, estamos, por isso, de braços abertos à espera dos investidores europeus.
O aumento significativo das exportações de minério para a China é um exemplo desta capacidade de atracção sobre as economias emergentes. Este país era um grande importador da Austrália, procurando agora
abastecer-se no mercado brasileiro.
O mercado de turismo no Brasil tem um potencial muito forte para ser explorado, atendendo aos 7.500 km
de costa que praticamente não exploramos. A favor desta ideia, temos a BR 101 que vai do sul até ao norte,
uma estrada praticamente paralela ao mar sujeita a um tráfego intenso de camiões. Recentemente assinámos
um convénio de intercâmbio com a Câmara Italo-Brasileira e o Porto de Nápoles, no sentido de estreitar
relações e analisar a possibilidade de começarmos a explorar o turismo nacional. O Porto de Nápoles participaria com dois navios de passageiros de pequeno porte, com capacidade para 600 ou 1000 passageiros. ❘❙❚
Competitividade Portuária e Modernidade Urbana
Em primeiro lugar vou tecer algumas considerações gerais sobre aquilo que entendo como fundamental para
a competitividade portuária e a sua relação com a cidade, bem como, quanto ao seu enquadramento e os
tipos de mecanismos que permitem materializar esta relação.
Passando, de seguida, a desenvolver em pormenor as principais razões que caracterizam o desenvolvimento
portuário e as ferramentas para o materializar, que são as ferramentas de planificação.
Proponho pois à vossa atenção o quadro reflexivo que balizará a minha intervenção.
Se falamos de um porto moderno temos de ter em conta que este se move numa envolvente competitiva,
tanto ao nível da concorrência entre autoridades portuárias, como também entre os operadores que actuam
no porto. Este ambiente de concorrência em que trabalha o porto deve ser visto com diferentes objectivos.
Por um lado, o porto moderno deve tratar de captar tráfego, tanto e tão diversificado quanto possível, para
concorrer com outros portos que procuram igualmente atingir o mesmo objectivo.
O porto moderno, nesta estratégia de concorrência deve desenvolver actividades, prestar serviços e oferecer espaços para atrair e fixar indústrias e centros de distribuição na sua zona de serviço. Novas oportunidades vão permitir fidelizar outros clientes, criar riqueza, emprego e valor acrescentado.
Finalmente, o porto moderno que está, como sabem, integrado em cadeias logísticas de transporte, deve ser
um porto eficiente e competitivo, ao custo mínimo. Os factores de competitividade que o caracterizam, em
ligação à cidade e ao território são os seguintes: A acessibilidade terrestre – é evidente que os acessos terrestres são um elemento de concorrência fundamental, tanto no que se refere aos acessos viários, como aos
acessos ferroviários. Se o porto moderno tiver limitações vai prejudicar este tráfego. É por isso importante
acabar com estes condicionamentos ao acesso que podem converter-se num verdadeiro ponto de engarrafamento em cadeia, tornando-a cada vez menos competitiva; O porto moderno deve dispor de infra-estruturas e instalações adequadas às exigências actuais e a capacidade de disponibilizar estes equipamentos como
resposta às necessidades e às exigências dos utentes, por forma a permitir-lhe adaptar-se com facilidade às
exigências, em constante mutação, destes mesmos clientes; Os efeitos activos da envolvente – este aspecto
é fundamental para que o porto vá mais além das meras relações institucionais entre a edilidade e a autoridade portuária. Trata-se de conseguir o reconhecimento da própria sociedade para a actividade portuária.
O porto necessita da cidade, do seu apoio e da sua cumplicidade, mais que a cidade do porto. E necessita
da cidade não só para a eliminação dos conflitos que existem com frequência entre portos e cidades - algo
que é muito importante – mas também para o apoio activo na oferta de espaços, por forma a conseguir
melhores acessos, mais áreas para a ampliação do porto, a requalificação urbanística que permita localizar
áreas logísticas ou centros de transportes, bem como facilidades fiscais para determinadas instalações. Precisa
também de apoio para fazer as adaptações necessárias à sua funcionalidade, ou para prolongar um dique,
etc. O porto precisa que a sociedade se aperceba das suas necessidades e que faça, ela própria, de grupo
de pressão para conseguir outros objectivos para além dos aspectos relacionados com o desenvolvimento
físico dos portos.
Nestes factores de competitividade do porto ligados à cidade que, como referi, se estabelecem dispondo
de bons acessos, infra-estruturas adequadas e efeitos activos da envolvente, todos eles se traduzem no grau
de desenvolvimento físico portuário. Esta evolução do porto é levado a cabo através de ferramentas de
planificação indispensáveis que, para além de resolverem os problemas do desenvolvimento físico do porto,
constituem um mecanismo fundamental na procura de outras oportunidades, sobretudo a de favorecer as
relações entre porto e cidade, ou seja, fazer com que a cidade possa ajudar para melhorar a competitividade
do porto. Por um lado, o mecanismo de planificação permite antecipar problemas funcionais e operativos
que muitas vezes se estabelece nestas relações porto/cidade, que têm a ver com o desenvolvimento, ou
seja, é preciso que haja um plano director, um plano dos espaços portuários, etc. Por outro lado, as ferramentas de planificação permitem integrar as soluções a adoptar relativamente aos espaços porto/cidade, isto
é, provavelmente, o melhor mecanismo que conheço para de uma forma civilizada organizar em conjunto
aquilo que se vai fazer e de que forma se podem transferir determinados espaços na fronteira entre porto e
cidade da melhor maneira.
Estes mecanismos podem converter-se num instrumento de diálogo, cada vez mais generalizado, para toda
a problemática das relações cidade / porto. De qualquer forma, para que a cidade possa de facto coadjuvar
a competitividade do porto através do desenvolvimento destes factores de concorrência, para que a cidade
possa integrar-se com o porto no processo de planificação, é preciso que haja um conhecimento profundo
e mútuo, que muitas vezes a cidade não tem.
SESSÃO I
Intervenção de
José Luís Estrada Llaquet
Director de Planeamento e Controle de Gestão
Puertos del Estado, Madrid, Espanha
A Competitividade Portuária
e a Relação Cidade/ Porto
25
Porto de Algeciras
Os elementos que são a causa mais importante do crescimento e desenvolvimento físico de um porto, são
os seguintes: 1. o crescimento do tráfego – quanto mais tráfego mais toneladas, mais buques, mais serviços
portuários, mais necessidade de terminais, etc; 2. a evolução e as mudanças tecnológicas dos utentes – desde
1980 até 2004, o tamanho do buque médio de porta-contentores passou de 975 TEU’s de capacidade
para 2.000 TEU’s, e o tamanho máximo passou de 3.000 para 8.000 TEU’s; 3. a especialização dos portos
e dos terminais portuários – hoje em dia não se pode falar de portos multiusos. Temos de falar sobretudo de
terminais portuários especializados, na medida em que estes terminais se integram nas cadeias logísticas e de
transporte intermodal porta-a-porta, com o objectivo de eficiência de toda a cadeia; a sua necessidade exige,
muitas vezes, o nascimento de novos terminais com novas exigências;
Algeciras - Baía Rinconcillo
Porto de Santander
Porto de Málaga
4. as exigências ambientais e de segurança – todos sabemos que a actividade portuária tem, muitas vezes,
impacto no meio ambiente e nas envolventes urbanas próximas, seja no transporte de mercadorias perigosas
ruído, poeiras, etc., e isto justifica com frequência a deslocalização das suas instalações, de modo a melhorar a
organização do espaço e o meio ambiente, sobretudo quando falamos da proximidade aos núcleos urbanos;
5. a pressão das cidades – As zonas habitacionais próximas das instalações portuárias exercem uma grande pressão sobre estas dificultando a realização de novos desenvolvimentos portuários e condicionando a sua actividade diária, limitando consequentemente as condições de exploração da mesma. São já conhecidos os problemas
que a actividade portuária junto a núcleos urbanos costumam provocar: dificuldades de acessibilidade terrestre,
problemas com o transporte de mercadorias perigosas, ruído, impacto visual, etc. A consequência imediata da
pressão da cidade sobre o porto para que se reduzam ou eliminem este tipo de impactos negativos obrigam,
com frequência, o porto a novos desenvolvimentos noutras zonas e à transferência da actividade.
Assim, não é somente o crescimento do tráfego que justifica a necessidade de novos padrões de desenvolvimento portuário, mas também a cada vez maior evolução tecnológica dos utentes, a especialização dos
terminais, as exigências ambientais e de segurança e a pressão das cidades. Para se levar a cabo este processo
de racionalização do porto é preciso planificar.
Vou falar-vos sobretudo do caso espanhol porque, indubitavelmente, as ferramentas de planificação estão
vinculadas à estrutura jurídica e às características de cada país. 1. o Plano Estratégico – tem por objectivo
cobrir um vazio entre o que o porto é hoje e aquilo que deveria ser, tendo em conta as condições da envolvente; 2. o Plano Director – é um documento que descreve o modelo de desenvolvimento e crescimento
a longo prazo de um porto, com base no tráfego previsível que resulta da avaliação racional entre várias
alternativas em coerência com o Plano Estratégico e as condições ambientais; 3. o Plano de Utilização dos
Espaços Portuários – define e ordena a zona de serviços, ou seja, estabelece usos portuários e usos não portuários, sobretudo os relacionados com actividades culturais, recreativas, feiras, certames, exposições, etc.;
neste plano é, segundo a legislação espanhola, onde se pode estabelecer as áreas que, de acordo com as
Competitividade Portuária e Modernidade Urbana
necessidades do porto, são susceptíveis de serem transformadas para o uso dos cidadãos; 4. o Plano Especial
– desenvolve as previsões que o Plano Geral de Ordenamento Urbano propõe incorporar obrigatoriamente
no sistema geral portuário; o Plano Especial é uma ferramenta urbanística que vincula a legislação da cidade
ao âmbito portuário.
Do lado do território temos: 1. o Plano Geral de Ordenamento Urbano – que qualifica a zona de serviço como
sistema geral portuário, ou seja, não pode legislar sobre o interior da zona portuária, não pode interferir com
a exploração portuária; o desenvolvimento concreto da área portuária é levada a cabo, do ponto de vista
urbanístico, no Plano Especial; 2. o Plano Estratégico da Cidade; 3. os Planos de Desenvolvimento Territoriais.
Os Planos Territoriais que, à semelhança dos planos gerais, têm de ter em conta o porto, os seus modelos de
desenvolvimento e exploração; o mesmo diria dos Planos Estratégicos da Cidade.
O que quero aqui realçar sobretudo em relação aos planos territoriais é que muitas vezes, o porto foi esquecido na elaboração dos Planos Estratégicos da Cidade. No caso que conheci, depois de algumas reclamações
por parte da autoridade portuária, foram finalmente incorporados um ou dois capítulos no Plano Estratégico
da Cidade. Este Plano, ainda que não possa legislar sobre o porto, deve recolher as sensibilidades dos seus
responsáveis sobre as acessibilidades, de superfície, relacionadas com a actividade portuária.
O conteúdo destes planos é extremamente importante, mas mais importante ainda é a forma como eles são
elaborados e o respectivo processo de tramitação. Este processo deve ser participativo e no cumprimento
literal da própria lei, ou seja, a lei muitas vezes exige procedimentos de informação e de audiência pública,
exige a presença dos cidadãos e a participação das instituições para que opinem sobre o desenvolvimento de
um determinado plano. Na minha opinião deve-se ir mais longe. Têm de existir mecanismos que permitam
a integração dos profissionais de ambos os lados, para que num processo de desenvolvimento e tramitação
sejam conhecidos os conteúdos e os desenvolvimentos pretendidos.
Para terminar, e resumindo estas ideias, quero realçar que considero factores fundamentais de competitividade de um porto que este disponha de bons acessos, infra-estruturas adequadas e interacção com a sua
envolvente; em todos estes factores, a cidade pode e deve contribuir para o seu desenvolvimento de forma
decisiva e mais racional, ou seja, utilizando ferramentas de planificação do desenvolvimento portuário que
permitem, além da sua própria função, tentar resolver por antecipação eventuais conflitos entre o porto e a
cidade, integrar as estratégias de reconversão das frentes marítimas, incorporar o apoio necessário que a envolvente do porto necessita e estabelecer um diálogo mais geral nas relações entre o porto e a cidade. Mas
tanto ou mais importante que o conteúdo dos planos é o processo de implementação que deve ser sempre
participado por todas as partes envolvidas. Para tal é necessário respeito mútuo, que deve ser baseado no
conhecimento e no diálogo, ambos imprescindíveis.
As boas relações entre porto e cidade constitui a base essencial para a competitividade do porto. ❘❙❚
Como todos sabem os portos são realidades distintas com problemas complexos. Aquilo que vou tentar transmitirvos é como podemos tornar estas fraquezas e ameaças em oportunidades. É esse o título da minha apresentação.
Relativamente aos portos da Noruega, que são entidades municipais, o seu enquadramento jurídico assenta
no nosso código de portos e nos regulamentos nacionais aplicáveis.
A Noruega é basicamente uma ilha e é por isso que 95% do comércio externo é feito por transporte marítimo, o que significa que somos muito vulneráveis às operações portuárias.
Oslo é a capital, como todos sabem, mas é também do ponto de vista histórico o maior terminal intermodal,
associando a ferrovia e o transporte marítimo. Tem, por outro lado, uma grande capacidade instalada para
importação de carga geral e bens de consumo.
A cidade de Oslo tem uma grande superfície, mas apenas uma pequena parte diz respeito a áreas urbanas.
É, para nós, uma prioridade política manter a grande área de floresta e de diversão. Por outro lado, temos
falta de urbanizações e elevados níveis de exigência para novos projectos.
Quanto ao porto, pode-se dizer que é um porto antigo - começou há cerca de 1000 anos quando os
dinamarqueses iniciaram as trocas comerciais com os povos locais. Do conhecimento actual sabe-se que
resultou de aterros reclamados ao mar e do crescimento da cidade. É o porto que fornece os principais bens
de consumo aos seus habitantes e a sua principal função é a de servir de escoamento de mercadorias para o
mercados e para o hinterland de uma forma geral, por via marítima ou rodoviária.
SESSÃO I
Porto da Corunha
Porto Vell - Barcelona
Intervenção de
Per Gisle Rekdal
Gestor de Planeamento Estratégico e Investigador
Oslo Port Authority, Noruega
Oslo, uma Cidade Portuária
Cumpre Novos Desafios
27
Porto de Oslo em 2020
Porto de Oslo 2005
Como disse, a gestão do porto pertence à edilidade, de acordo com leis específicas, economicamente dependente da cidade, com 200 postos de trabalho, e dotado de um departamento técnico responsável por
todas as infra-estruturas que existem no porto.
As condições físicas do porto em 2003 consistiam numa área terrestre de 1.200.000 m2; 2 Terminais ferroviários; 2 Terminais de contentores; 1 Terminal rodoviário; 14 Rampas rodoviárias e 4 linhas férreas.
Relativamente ao tráfego do porto, o volume de carga é de cerca de 6,2 milhões de toneladas. Em 1998, a
Câmara Municipal pediu-nos que fizéssemos ver aos políticos como é que poderíamos desenvolver o porto
nos próximos 20 anos. Não vou entrar em pormenores, mas quero dizer-vos que apresentámos um plano
de desenvolvimento com o fim último de estabelecer metas e definir estratégias para alcançar esses objectivos. Uma das principais questões era saber como utilizar o espaço duma forma mais eficiente.
A utilização de equipamento específico como guindastes, etc., necessitava de mais espaço, por isso era
preciso encontrar novas soluções técnicas de modo a justificar a ocupação dos terrenos, um bem escasso
numa cidade como Oslo.
No que diz respeito aos resultados, posso dizer que a implementação deste plano vai criar um porto mais
eficiente para tratar de toda a carga nos próximos 20/30 anos. Vamos duplicar a capacidade dos terminais,
sem utilizar mais espaço, e libertar 35 ha de terreno perto do centro urbano, com alto valor urbanístico,
dando oportunidade à cidade para desenvolver áreas atractivas para moradias e empresas.
Fizemos também uma análise de custo/ benefício e quando apresentámos o plano, a Câmara votou a favor
doutro projecto, chamado “Fjord City”, o que obrigou o porto a refazer os planos no sentido de retirar a sua
principal actividade – os contentores - para fora dessa área.
As autoridades nacionais estavam contra essa visão, porque Oslo é o principal porto nacional, e foi por isso
que o Governo integrou as nossas soluções no plano nacional de transportes, adoptado pelo Parlamento,
resultando daí um conflito entre a cidade, os interesses locais e o interesse nacional.
Competitividade Portuária e Modernidade Urbana
O projecto “Fjord City” foi para a frente, tendo sido na altura difícil de perceber como é que iríamos fazer
as duas coisas ao mesmo tempo: mudar actividades, nomeadamente o tráfego de contentores, vital para a
economia do país, mas continuar como porto nacional. Por outro lado, era imperioso manter o tráfego dos
ferry-boats e tomar conta das actividades de navios de cruzeiro.
O que aconteceu foi que houve uma mudança de mentalidades. No passado era lógico para o público que
todas as cidades deveriam ter um porto; agora essa ideia mudou – será que todas as cidades necessitam de
ter um porto? A partir de agora, um porto tem de justificar a sua existência num ambiente urbano, e foi em
torno dessa ideia que surgiu a nossa oportunidade. Começámos por afirmar que a autoridade portuária ia
possibilitar o abandono da parte ocidental do porto actual e facilitar o acesso do público à frente marítima,
permitindo que houvesse desenvolvimento urbano nestas zonas.
Houve necessidade, também, de reduzir as áreas de granel sólido e líquido para disponibilizar espaço para
outros tipos de tráfego.
Simultaneamente, tínhamos que estabelecer um acordo. Se íamos libertar a parte ocidental do porto, a
contrapartida teria de ser um porto sustentável, eficaz, com alta produtividade no sul e no leste, que é uma
área bastante mais reduzida do que a ocupada actualmente, tratando simultaneamente das actividades mais
importantes.
Por isso, foi feita uma revisão do plano estratégico baseada no projecto “Fjord City”, aprovado pela Câmara.
As autoridades locais participaram neste trabalho com as administrações portuárias. Trata-se de um período
de implementação original de 20 anos, que foi reduzido, sendo preciso agora criar uma nova estratégia de
aproveitamento dos terrenos e elaborar o planeamento do projecto.
Na actualidade dispomos de uma área portuária que é metade daquilo que tínhamos antes, mas com funções
iguais e a mesma capacidade. Ao mesmo tempo, vamos libertar um dos nossos melhores terminais de contentores, disponibilizando 500.000 m2 para desenvolvimento urbano, não esquecendo que o porto continua
a operar dentro dos limites da cidade e que todas as áreas do porto estão a ser utilizadas, hoje em dia.
Para obter financiamento para o desenvolvimento das nossas actividades foi vendida uma área com 33.000
m2, utilizada como pontão. Metade dessas receitas vão ser canalizadas para a construção de museus e centros culturais na zona e a outra metade destina-se ao desenvolvimento do próprio porto; é um presente
que estamos a dar à cidade como contrapartida pela aceitação do plano pela Câmara Municipal, no Outono
passado, e pelo Parlamento em Junho deste ano. O projecto começa a desenvolver-se nos próximos 6
meses, sendo o seu período de implementação de 8 anos. Um período muito curto para a complexidade
das tarefas, mas que constitui uma oportunidade única de trabalho. ❘❙❚
SESSÃO I
29
1
Tempo da Cidade,
Tempo do Porto, Como Harmonizá-los ?
Não há dúvida de que o espírito dos tempos passa pelas cidades e a planificação das políticas
urbanas significa não apenas trabalhar sobre os problemas, mas também antecipá-los.
Os quatro oradores presentes, representando diferentes continentes, escolas de pensamento
e modelos culturais diversos, dão-nos a oportunidade de conhecermos as suas experiências
no contexto da relação entre o porto e a cidade.
Trata-se de entender na globalidade o processo de transformação das cidades, dos portos e
também do próprio conhecimento. ❘❙❚
ATELIER 1
Roberto Converti
Arquitecto, Buenos Aires, Argentina
Presidente da Mesa
Intervenção de
Sung-Woo Lee
Centro de Planeamento Urbano e Gestão Ambiental
Universidade de Hong Kong, China
Desenvolvimento urbano
e crescimento portuário:
os exemplos de Busan,
Singapura e Hong Kong
Vou falar-vos sobre o meu estudo relativo ao planeamento urbano e de transportes e às políticas portuárias
nestas três cidades asiáticas.
Esta investigação dá-se num contexto em que a globalização é uma tendência em muitos países; muitas
multinacionais têm avançado para a Ásia, o que afectou os portos da região levando à concentração e concorrência entre porto localizados, inevitavelmente, em cidades portuárias.
Hong Kong e Singapura têm posições eminentes como cidades globais e portos de plataforma, mas não
deixam de enfrentar os desafios colocados pelos portos vizinhos.
Neste sentido, temos de nos questionar como é que mantêm a competitividade em relação a estes portos?
A resposta é: vantagens inerentes e vantagens artificiais. As vantagens inerentes têm a ver com questões
internas e as vantagens artificiais estão relacionadas com o ambiente.
Já a cidade de Busan tem vantagens inerentes, mas não pode ser designada por cidade portuária global.
A população de Busan e Singapura é semelhante, enquanto a de Hong Kong é superior, o mesmo se aplica
à dimensão das cidades e à sua densidade populacional. Quanto ao PIB per capita, relativo ao turismo,
investimento directo estrangeiro e tráfego de contentores, Hong Kong e Singapura têm um desempenho
relativamente superior a Busan. Já a estrutura espacial, a densidade demográfica e a distância é semelhante
nestas três cidades.
O objectivo consiste em identificar o tipo de respostas locais mais apropriadas para as cidades portuárias,
através de uma análise comparativa, sugerindo novas directivas para o planeamento urbano em áreas portuárias periféricas.
Carga contentorizada
O movimento de contentores em Hong Kong, tem tido um aumento significativo, tendo chegado, em 2003,
às 20.000 TEU’S, o que lhe dá o melhor desempenho das três.
Hong Kong e Singapura têm mantido uma dinâmica viva, um planeamento urbano eficaz, políticas de transporte e portuárias bem sucedidas. Busan, por seu lado, não tem atraído muitas sedes de multinacionais, nem
tem criado o ambiente cosmopolita das duas primeiras cidades, apesar da existência de algumas semelhanças
em vários aspectos.
Vejamos o exemplo de Hong Kong: a Grã-Bretanha escolheu este território em 1842 como a sua porta de
entrada na China, aproveitando as excelentes condições naturais para acostagem, a sua localização geográfica
e, mais recentemente, a abertura política da China para influenciar o seu crescimento. Por tudo isto, o porto
de Hong Kong está em primeiro lugar no ranking mundial desde 1992.
Veja-se agora o caso de Singapura: foi estabelecida em 1819 como um entreposto comercial para navios de
carga, mas abriu outra frente de interesses para dinamizar a economia. O porto tem-se mantido em segundo
lugar no ranking mundial desde 1992.
O exemplo de Busan: localizada no sul da Coreia, dispõe de boas condições naturais para acostagem e uma
excelente localização geográfica. O porto organizou-se como plataforma portuária de alta qualidade e tem
desempenhado um papel importante como porta de saída para a indústria de manufactura coreana, tendo
ficado em 2002 em terceiro lugar no ranking mundial.
Tempo da Cidade, Tempo do Porto, Como Harmonizá-los ?
Relativamente à política de planeamento urbano, no caso de Hong Kong há um sistema de planeamento
discricionário que tem o seu mérito na flexibilidade e as fraquezas nas leituras pouco racionais. Singapura
e Busan têm um sistema de planeamento tradicional, cujo mérito está nas garantias de estabilidade e a
fraqueza na sua rigidez. Os departamentos de planeamento portuário e urbano de Hong Kong e Singapura fazem parte dos respectivos governos, estando por isso em condições de assegurar uma relação
simbiótica com os centros de decisão. Ao contrário, a cidade de Busan só pode controlar as suas decisões
ao nível local, dado que o planeamento portuário e os planeamentos regional e nacional são controlados
pelo governo central.
Enquanto as áreas portuárias de Hong Kong são geridas em nome do planeamento e ordenamento do território no conjunto das políticas urbanas, as áreas portuárias de Singapura privilegiam os parques de negócios.
Já no planeamento urbano das áreas portuárias de Busan só está contemplada a zona de instalação portuária.
Uma orientação estabelecida há três décadas, numa altura em que as funções portuárias eram diferentes
- centravam-se na carga e descarga - das funções portuárias actuais, mais complexas e diversificadas.
No que diz respeito à política de transportes, há uma boa contribuição do porto para a economia das cidades
portuárias. As autoridades estão apostadas em encontrar soluções com o objectivo de separar os diferentes
tipos de cargas e de trânsito rodoviário nas áreas periféricas dos portos, de modo a reduzir os volumes de
tráfego. Hong Kong e Singapura têm políticas de transporte mais exigentes e minuciosas em comparação
com Busan.
No que diz respeito à política portuária, o funcionamento do porto de Hong Kong baseia-se na concorrência
entre empresas privadas, numa política de laissez-faire. A de Singapura está baseada no princípio da economia de mercado, mas é maioritariamente controlada por entidades subsidiárias do governo. Já em Busan, o
porto é gerido ao abrigo de políticas portuárias estabelecidas pelo governo central.
Hong Kong baseia-se numa grande eficácia das suas instalações portuárias; tem parques logísticos com tecnologia avançada, etc. Singapura depende de instalações portuárias também altamente eficazes; dispõe de
parques de negócios de grande dimensão, com um desempenho altamente eficiente. Em contraste, Busan
tem uma eficiência muito inferior, devido à falta de áreas de apoio e a acessibilidades mais difíceis.
Hong Kong e Singapura, ao contrário do que se pensa, oferecem uma localização privilegiada e uma boa
relação entre o porto e a cidade, sobretudo devido ao sistema intermodal. Já Busan não tem esta vantagem,
daí que a sua qualidade seja inferior.
Este estudo confirma que existem diferenças em termos de planeamento urbano e de políticas de transporte
e portuárias. Além disso, estes instrumentos de ordenamento do território desempenham um papel muito
importante nos portos de plataforma.
Estas conclusões são um contributo básico, que não dispensa outras investigações, por forma a dispormos
de uma perspectiva interactiva entre a cidade e o porto. ❘❙❚
O Porto Grande faz parte de um sistema portuário de 9 portos, distribuídos por um arquipélago com 10
ilhas, uma delas não habitada.
O Porto Grande é o maior e o mais antigo porto de Cabo Verde, com uma vocação internacional muito
forte e um passado também muito marcante, constituindo, tradicionalmente, um factor de crescimento e de
desenvolvimento da região em que está inserido - a cidade do Mindelo - e também da República de Cabo
Verde.
A nossa apresentação tem por título O Porto Grande e a Cidade do Mindelo – Passado, Presente e Futuro.
O Passado, com responsabilidade principalmente na época do transporte de carvão, o Presente, como
motor da economia nacional e o Futuro com desenvolvimentos na área do transporte de contentores e do
turismo de cruzeiro e lazer, acompanhado da criação de infra-estruturas, incluindo marinas, numa das baías
mais belas do mundo.
Faremos a seguir, alguns comentários sobre os aspectos técnicos do projecto que concebemos para o Porto
Grande da cidade do Mindelo.
A comunicação baseia-se num estudo de reordenamento e requalificação do Porto Grande e de melhoria
dos espaços dos interface urbano-portuários da cidade do Mindelo, que a Administração Portuária de Cabo
Verde tendo em vista o desafio da competitividade.
ATELIER 1
Relação entre automóveis, população e rodovia
Intervenções de
Jorge Pimenta Maurício
Administrador Empresa do Porto Grande
– ENAPOR, S.A., Cabo Verde
Miguel Ferrão
Chefe de Projecto/ Consultor Sénior
– DHVFBO Consultores, Cabo Verde
A relação entre Porto Grande
e a Cidade do Mindelo:
passado, presente e futuro
33
Porto Grande
Crescimento do transporte marítimo
Infra-estrutura portuária primitiva
No contexto da afirmação da cidade do Mindelo como cidade portuária atlântica moderna, estabeleceram-se como objectivos principais: a melhoria da eficiência das operações portuárias; a rentabilização da
área de jurisdição da ENAPOR; a certificação do Porto Grande no âmbito do ISPS Code; a melhoria da
articulação porto-cidade e a valorização dos espaços do interface urbano-portuário de modo a permitir a
futura expansão do porto.
Fazendo uma breve viagem ao passado para percebermos a importância histórica que o Porto Grande teve
no desenvolvimento da cidade do Mindelo e de Cabo Verde, posso dizer que o crescimento da cidade
esteve sempre relacionado com a actividade do seu porto – a cidade do Mindelo nasceu e cresceu à volta
do Porto Grande. Dadas as suas características e a posição geo-estratégica, situado a cerca de 400 milhas do
Senegal e a 650 milhas das Ilhas Canárias, o porto funcionou como um importante ponto de escala obrigatória dos navios a vapor que atravessavam o Atlântico, e foi esse tráfego que afirmou o Porto Grande como
o maior porto carvoeiro do médio Atlântico, tendo o seu apogeu nas primeiras décadas do séc. XX, quando
a cidade desenvolvia grande actividade relacionada com a vertente marítima. Isto reflectiu-se no dinamismo
comercial e na diversidade de povos e culturas que se fixaram no Mindelo, na construção da identidade
mindelense (cultura da tolerância, de encontro e de busca da universalidade) e na herança arquitectónica
deixada pelo património portuário.
Como principais etapas de evolução do porto surge uma fase inicial de grande dinamismo associado à expansão da navegação comercial na segunda década do século XIX, a que se seguiu um período de maior
estagnação derivado da evolução da tecnologia do transporte marítimo e da substituição do carvão pelo
fuel. Seguiu-se, na década de 50 do séc. XX, o início da construção do actual porto e a sua última ampliação, já na década de 90, que consistiu na construção de um parque de contentores e de um terminal de
cabotagem.
O aspecto que interessa sublinhar são os factores de valorização do Porto Grande e que derivam das suas
condições naturais – um porto de águas profundas localizado numa baía protegida com características ímpares para a actividade portuária.
Tem-se verificado um crescimento da actividade comercial do Porto Grande derivado fundamentalmente
da sua função de porto de recepção de mercadorias para distribuição no arquipélago, e essa tendência de
crescimento foi por nós confirmada nas previsões de tráfego que projectámos no horizonte de 2015, e que
serviram de base às nossas propostas de reordenamento dos espaços portuários.
O tráfego de passageiros é também muito importante no Porto Grande, quer ao nível das relações inter-ilhas,
quer no movimento de navios de cruzeiro, com um crescimento bastante acentuado nos últimos três anos.
Baía do Mindelo
Mindelo
Tendo presentes as duas dinâmicas actuais do porto, estabeleceram-se alguns objectivos tendo em vista
aquilo que se pretende que seja o seu desenvolvimento no futuro.
No curto e médio prazo, no que diz respeito ao tráfego internacional, desenvolveram-se três ideias-chave:
a Competitividade - reorganizar espaços e aumentar a eficiência das operações portuárias; a Modernidade
– melhorar as condições de recepção de passageiros dos navios de cruzeiro; e a Segurança – preparar o
porto para a certificação no âmbito do ISPS Code e separar as actividades de carácter comercial das actividades de recreio e lazer.
Ao nível do tráfego de cabotagem as ideias fortes são: a Expansão – incrementar o tráfego inter-ilhas através
da oferta de infra-estruturas adequadas e da melhoria das condições oferecidas aos operadores; a Eficiência
– permitir o desenvolvimento de novas soluções de transporte integrado (tráfego roll on – roll off); e o Conforto – oferecer melhores condições de conforto e rapidez nas deslocações, atraindo novos utentes para o
transporte marítimo inter-ilhas.
Tempo da Cidade, Tempo do Porto, Como Harmonizá-los ?
Outra das grandes linhas de orientação este estudo foi a de fomentar uma melhor articulação entre o espaço
portuário e a cidade do Mindelo, prosseguindo os seguintes objectivos: garantir uma articulação correcta entre o porto e a frente marítima da cidade, em diálogo construtivo com a autarquia; criar áreas para actividades
de restauração, comerciais, de recreio e lazer, de suporte ao turismo, nomeadamente ao turismo náutico;
requalificar e modernizar o porto, possibilitando a sua fruição por residentes e visitantes.
Na frente marítima da cidade do Mindelo a aposta vai no sentido das actividades marítimas poderem contribuir para a qualificação urbana da cidade, nomeadamente através da náutica de recreio e da construção
de uma marina; por outro lado, e procurando não perder as características que tornam o Mindelo um caso
particular no contexto de outras cidades atlânticas, procurámos valorizar alguns elementos da identidade
da própria cidade, tendo sido apresentada uma proposta de recuperação de um cais histórico - o Cais da
Alfândega - enquanto elemento simbólico da cidade e para apoio a actividades marítimas.
Em termos de objectivos a longo prazo, a aposta vai no sentido de afirmar o Porto Grande e S. Vicente
como plataforma atlântica de mercadorias, com a tomada das seguintes medidas: a) aproveitar a localização
geo-estratégica e as condições naturais (vantagens comparativas), para afirmar o porto no contexto das infraestruturas portuárias da Região (West Africa); b) potenciar as infra-estruturas (portuária e aero-portuária) e
a Zona Franca Industrial, criando sinergias entre elas de forma a atrair o investimento privado e consolidar o
Mindelo como centro de serviços de excelência na Região; c) apostar em parcerias público-privado, preferencialmente no modelo BOT, para desenvolvimento de terminal de transhipment de contentores.
Outra das ideias veiculadas vai no sentido de consolidar definitivamente a afirmação do Mindelo e do Porto
Grande como porto de cruzeiros à escala internacional, beneficiando da adesão à associação Cruises in The
Atlantic Islands. Havendo a perspectiva de grande crescimento do tráfego de cruzeiros a médio longo prazo,
foi equacionada, também, a possibilidade de se construir um terminal dedicado à recepção de navios de
cruzeiro.
Como propostas de intervenção vou muito rapidamente referir três áreas: a) a área do terminal internacional,
onde as intervenções têm a ver sobretudo com a melhoria das condições de movimentação e de operação
do tráfego de contentores; b) ao nível de infra-estruturas para os cruzeiros e para a cabotagem está previsto,
a médio prazo, uma frente de cais em zona de águas profundas de modo a permitir a recepção de navios de
cruzeiro e a ampliação dos terminais de cabotagem para a dinamização do tráfego roll-on/ roll-off.; c) a devolução de espaço portuário à cidade, sem comprometer a operação portuária, aproveitando as áreas que vão
ser disponibilizadas nesta zona de interface, para a localização de actividades de comércio, restauração, lazer,
estacionamento, etc.
A zona contígua ao terminal de cabotagem é uma área desocupada que apresenta uma barreira física que
impede o acesso das pessoas à frente marítima. Sendo assim, o que se propõe é a recuperação duma praça
onde se localiza um edifício de serviços e comércio que pode servir, eventualmente, para a localização da
própria autoridade portuária e a construção de um imóvel para actividades culturais e de lazer.
ATELIER 1
Porto Grande
Gare Marítima
Futuro Terminal de Cabotagem
35
Futura Zona de Interface
Futura Marina
Para a base da encosta onde actualmente se localizam os silos de combustíveis da Shell, há uma proposta de relocalização dessa infra-estrutura e de aproveitamento do espaço também para actividades
de restauração, comércio e lazer.
A norte, a intervenção teve sobretudo a ver com a reorganização de áreas de oficinas, prevê-se uma
nova solução que permite libertar áreas para escritórios, serviços e também estacionamento, que é
uma das carências sentidas. Por outro lado, para uma zona que actualmente está sobredimensionada
de armazéns é proposta a sua redução e a criação de actividades de apoio a cruzeiros e ao turismo.
Como referi, outra das propostas apresentadas, que tem a ver com a dinamização e requalificação
da frente marítima da cidade, resulta de um projecto para o desenvolvimento de infra-estruturas de
apoio à náutica de recreio, a que chamámos Marina do Mindelo. Prevê-se a sua localização numa
zona no centro da cidade onde actualmente se encontram as instalações de uma empresa petrolífera, com a intenção de atingir dois objectivos: por um lado, relocalizar essa infra-estrutura para uma
área industrial e, por outro lado, promover a requalificação da cidade através da construção de uma
marina associada a áreas de comércio, restauração e lazer, como já é comum fazer em muitas cidades
marítimas.
As ideias-chave que se pretenderam transmitir foram vertidas na apresentação das propostas tendo
em vista a afirmação do Porto Grande como símbolo da identidade da cidade do Mindelo e actor
principal na afirmação da modernidade e da competitividade futura da cidade, da ilha e do país. ❘❙❚
Tempo da Cidade, Tempo do Porto, Como Harmonizá-los ?
ATELIER 1
As relações entre as cidades e os portos são extremamente difíceis de consolidar e encontram-se no limite
entre o conflito e a integração.
Em Itália, graças ao desenvolvimento do tráfego marítimo de contentores, houve o problema da dispersão
territorial dos nossos portos. Inicialmente esta exigência foi ultrapassada tentando-se adaptar a configuração
dos portos às áreas portuárias que tinham sido construídas no passado, mas isto, obviamente, não respondia
às necessidades, levando a construir novas zonas portuárias que se adaptassem a esta nova realidade.
A expansão dos portos desenvolveu-se, à semelhança de outros países, de forma muito rápida, o que
também é verdade para o desenvolvimento dos centros urbanos. Como se sabe, houve êxodo rural, crescimento demográfico ao longo dos séculos, deslocação de habitantes para as faixas do litoral, aumento do
turismo e das actividade náuticas.
Isto caracteriza a realidade italiana. As populações deslocaram-se para junto dos estuários o que, naturalmente, criou um conjunto de oportunidades que fizeram aumentar a competitividade e a concorrência ao
nível do uso dos espaços vagos junto a essas zonas. Nos últimos anos, o que aconteceu foi que os portos
alteraram a sua tipologia e as suas características devido, por exemplo, ao tipo de mercadorias transportadas
a nível mundial através do mar e, por outro lado, ao desenvolvimento dos navios porta-contentores, petroleiros e outros mais especializados, que apareceram há alguns anos.
Há que salientar, também, que se alteraram as modalidades de transporte; surgiram outras formas de armazenar mercadorias – contentores – o que, naturalmente, teve incidências ao nível da organização e funcionamento das infra-estruturas e um importante impacto ambiental no sector portuário.
Outro elemento que deve ser salientado, não só em Itália, mas também a outros países, tem a ver com
uma maior sensibilização das autoridades nacionais junto das opiniões públicas mundiais no que diz respeito
à interface entre a cidade e o porto. Assistimos a várias iniciativas locais ao nível das cidades e dos portos no
sentido de esbater os conflitos entre o desenvolvimento das cidades e o desenvolvimento dos portos.
Pese embora estes desenvolvimentos, e de acordo com a experiência italiana, devo dizer que houve acontecimentos importantes que levaram à transformação dos portos e das zonas ribeirinhas. Vou dar-vos o
exemplo da requalificação da zona ribeirinha da cidade de Génova e do seu porto histórico.
Isso permitiu, naturalmente, junto das zonas desocupadas a criação de várias infra-estruturas diferenciadas - a
construção de edifícios para escritórios e para uso universitário, o aquário de Génova, agências de viagens,
etc., para não falar, por exemplo, do uso para actividades portuárias tradicionais, visto que o porto de Génova é um pólo de atracção para desportos náuticos a nível mundial.
Era isto que queria adiantar relativamente às modalidades de integração entre um porto que pretende desenvolver-se e a sua compatibilidade com a realidade urbana, através da interface entre o porto e a cidade.
Por outro lado, há que referir que a concorrência a nível internacional existe não só entre os portos e as áreas
portuárias, mas também em todo o território. Não podemos perder de vista, para além das áreas portuárias,
o território que se encontra à volta do porto. O porto tal como está configurado não se pode fechar sobre si
próprio, não pode esgotar-se nos seus próprios recursos e não pode viver única e exclusivamente de acordo
com as suas funções tradicionais ou de prestação de serviços junto dos passageiros e dos utentes que vivem
do outro lado das cidades.
O porto é um espaço de trânsito de redes e modalidades de transporte diferentes, mas é, também, uma
zona de intercâmbio de gentes e culturas, criando este facto, naturalmente, situações críticas e por vezes
polémicas entre as autoridades portuárias e os municípios, visto que ambas as entidades têm competências
na gestão do território à volta do porto. No caso da Itália, é a autoridade portuária que tem competência no
que diz respeito ao desenvolvimento de infra-estrutura e outros equipamentos.
Evidentemente que, para fazermos face a estas problemáticas, temos de responsabilizar as várias entidades
que fazem parte do sistema: por um lado as autoridades portuárias, por outro, os municípios; há que identificar prioridades e flexibilizar posições, quer pelo lado da autoridade portuária, quer por parte do município.
Nos últimos anos, em Itália, temo-nos deparado com uma série de dificuldades de entendimento entre estas
duas entidades. A jurisdição italiana neste momento atribui a responsabilidade da planificação do território
portuário a cada autoridade portuária, que é uma entidade pública sem fins lucrativos, que regulamenta todas
as actividades relacionadas com o porto em regime de concorrência mediante autorização ou concessão que
é dada pela própria autoridade portuária. O normativo de planificação é o chamado PRP, ou seja, o Plano
Regulador Portuário, um instrumento que delimita e define as actividades portuárias em que estão incluídas
a indústria, os estaleiros navais e outras infra-estruturas rodoviárias e ferroviárias.
Intervenção de
Tommaso Affinita
Presidente da ASSOPORTI
– Associação dos Portos Italianos, Itália
Porto e Cidade em Itália:
Conflito ou Integração
37
É evidente que um PRP não pode cingir-se exclusivamente ao porto no sentido estrito da palavra, ou seja, o
porto deve ser, também, um centro operacional e é óbvio que a autoridade portuária está interessada em gerir
todas as relações que o porto tem com as outras infra-estruturas, nomeadamente as rodoviárias e ferroviárias.
Dito isto, deparamo-nos com uma série de dificuldades muito complexas relativamente aos procedimentos de aprovação dos PRP’s. A jurisdição italiana prevê que estes Planos, que são apresentados pelas autoridades portuárias,
devem ser objecto de convergência ao nível da decisão, em primeiro lugar por parte das Câmaras Municipais, depois
por parte de um comité técnico que é o Conselho das Obras Públicas, de seguida haverá uma espécie de sentença,
positiva ou negativa, que será dada pelo Ministro do Ambiente e por fim, o documento deverá ser aprovado pela Câmara Municipal. Um dos aspectos mais fascinantes desta questão, prende-se com as dificuldades em chegar a acordo
com as autarquias locais relativamente ao PRP, e dizem respeito à ausência de instrumentos de decisão, ou seja, leis,
normas ou regulamentos que permitisse evitar uma situação de bloqueio entre a autoridade portuária e o município.
Neste momento, estamos a avaliar a possibilidade de alterar a legislação italiana que regulamenta as autoridades portuárias, tendo apresentado para o efeito uma proposta de lei junto do Parlamento italiano.
Todas as entidades têm que ser envolvidas - autoridade portuária, parlamento italiano, autarquias locais – para
se chegar a uma solução consensual, caso contrário, vamos paralisar o processo de aprovação dos PRP’s.
Por outro lado, estamos também a trabalhar no sentido de identificar linhas de orientação que possam tornar
mais flexível a programação das actividades portuárias; isto também deve ser aplicado aos PRP’s, ou seja,
necessitamos de uma espécie de lei-quadro que permita a aprovação mais célere dos PRP’s.
Propomos a distinção entre as áreas operacionais dos portos – onde se faz referência a passageiros, contentores, etc. – e o porto entendido como entidade global, enquanto segmento importante da cidade portuária.
É esta a subtileza que gostaríamos de incorporar na legislação italiana. Entendemos que as autoridades portuárias devem ser directamente responsáveis pela planificação das áreas operacionais, ou seja, tudo o que diz
respeito à configuração, às opções funcionais, à escolha dos terrenos onde devem ser construídos equipamentos e infra-estruturas, etc., devem ser da competência exclusiva das autoridades portuárias. É óbvio que
tudo isto deve ser feito sem conflitos nem polémicas com as administrações locais.
Por outro lado, existe o conceito de cidade-porto; trata-se de uma realidade mais complexa, mais global e, na
nossa proposta, esse conceito é definido de acordo com o que pensamos ser necessário para chegar a consenso
com os municípios. No sentido de articular mais e melhor o processo de planificação que está intimamente ligado
à autoridade portuária, propomos que a legislação seja mais flexível e contemple as autoridades portuárias operacionais, por um lado, e por outro lado, tentar através da nova legislação não bloquear a aprovação dos PRP’s.
Existe ainda o problema da interface entre a cidade e o porto. Não nos devemos iludir demasiado porque estas
recomendações não vão resolver para a eternidade estes problemas, trata-se somente de uma tentativa de modificação de uma situação que em Itália está bloqueada. Não podemos menosprezar nem a cidade a favor do porto
nem o porto a favor da cidade, temos que encontrar uma solução equilibrada para a interface cidade/porto. Ambas
as especificidades têm direito a afirmar-se, devemos trabalhar todos em benefício deste equilíbrio, uma vez que os
portos e as suas actividades comerciais são um importante instrumento para o desenvolvimento económico.
Seria errado pensarmos que deva prevalecer a tutela do Ambiente única e exclusivamente a nível urbano;
não podemos esquecer a relevância dos portos no desenvolvimento das cidades e de uma Nação.
Quer as instituições públicas, quer as instituições privadas e os profissionais, devem reunir esforços a favor
de uma solução de equilíbrio. Não podemos bloquear o desenvolvimento das áreas portuárias devido a uma
legislação pouco favorável. A Itália deve adaptar-se a novos instrumentos de planificação a nível portuário que
sejam adequados à nova procura que é solicitada pelos mercados internacionais. ❘❙❚
Intervenção de
Jorge Alejandro Gonzales Olivieri
Director Geral da Administração Portuária
Integrada de Veracruz, México
Porto e Cidade,
um duplo desafio económico
O México não está de fora dos problemas que existem na relação entre o porto e a cidade. O Porto de
Veracruz, o porto mais importante de todo o México, é o que tem as melhores ligações terrestres e o
melhor sistema de trabalho portuário. A sua estruturação data de 1994, com a criação de uma entidade
administrativa – o Conselho de Administração - com diferentes áreas de intervenção, nas quais se inclui o
planeamento. É sobre esta área que nos vamos debruçar. Trabalhamos com certificados de qualidade e dispomos de autonomia de gestão e auto-suficiência financeira, que suporta uma despesa corrente para manter
o funcionamento das instalações e, além disso, pagar ao Estado o arrendamento do porto. Enfrentamos, por
outro lado, um ambiente de concorrência com os outros portos do México.
Tempo da Cidade, Tempo do Porto, Como Harmonizá-los ?
Desde 1984 até 2003 o movimento do Porto de Veracruz aumentou significativamente - passámos de 3
milhões de toneladas para 16 milhões de toneladas; e de 25 a 572 mil contentores. 60% do investimento
no Porto de Veracruz tem origem no capital privado e 40% do próprio porto; o investimento privado é feito
na base de arrendatário do porto – este regime de landlord começou em 1994, quando os privados foram
convidados a entrar no capital do porto – 88% do capital social – sendo o restante de participação do Estado.
O porto opera através de vários terminais especializados – já não existem portos genéricos, procuramos
a especialização, portos com terminais de alta eficiência, neste caso terminais com contentores de graneis
agrícolas e terminais de automóveis.
Realizamos acordos de colaboração com outros portos em todo o mundo, o que tem permitido a actualização tecnológica da administração portuária.
Os principais investimentos do porto têm sido nos terminais automóveis e multiusos, na ampliação do espaço portuário, sobretudo na zona norte, instalação de gruas para a manutenção de silos e manutenção para
navios de cruzeiro; temos um sistema de controlo de tráfego marítimo dentro da administração portuária,
além de um sistema de controlo de acesso de mercadorias ao país; criámos, também, acessibilidades ao
porto, sem semáforos e sem paragens. Este ano vamos dar início ao prolongamento do porto, o que vai
permitir escoar o tráfego de mercadorias e de contentores por fora da cidade; vamos procurar trabalhar
no porto sem interferir com a evolução da cidade, pelo menos no que diz respeito ao tráfego rodoviário e
ferroviário; pretendemos ainda adquirir, nos próximos 2 anos, 300ha a norte do porto.
Do tráfego de contentores em todo o México, 33% são operados pelo Porto de Veracruz (571 mil TEU’s),
dos quais 56% são de granel agrícola, 75% de importações/exportações automóveis e 16% da carga geral.
No México, o proprietário dos portos é o Estado; o administrador é uma empresa detida pelo Estado a que se chama
administração portuária integral e que procede à sua concessão; o regime de landlord remete a responsabilidade das
operações para terceiros; as províncias e as edilidades intervêm nos portos através de directivas do próprio porto.
Uma das características do estatuto da administração do porto é a sua autonomia financeira; o Estado não
atribui verbas para o seu desenvolvimento ou para despesas correntes, ou seja, se queremos fazer alguma
coisa temos que fazer com os nossos próprios meios; todos os resultados líquidos são destinados ao reinvestimento na infra-estrutura portuária e na operacionalidade do porto.
As cidades e as províncias não são proprietárias dos portos, uma vez que toda a área portuária está excluída
da intervenção municipal, ficando reservada para o governo central. Neste contexto, as tomadas de decisão
são assumidas no próprio porto com a aprovação do poder central.
Os benefícios das províncias dotadas de um porto são vários: benefícios económicos, efeitos polarizadores
do investimento e o aproveitamento de negócios gerados pelas actividades operacionais do porto. Aqui
temos que ter em conta uma realidade – uma cidade pode existir sem um porto, mas um porto muito
dificilmente existirá sem uma cidade.
Onde é que há coincidência entre o porto e a cidade? - Pelo menos em três aspectos, quando procuramos
entender as necessidades de cada uma das partes: Crescimento; Serviços; Segurança.
Estes três pontos de convergência permitem-nos planear em conjunto a cidade e o porto, ou seja, envolver
o município e a autoridade portuária com o objectivo comum da convivência e do crescimento harmonioso – a cidade não pode ir à frente do porto nem o porto à frente da cidade. Como fazê-lo? – Através da
conjugação de esforços e de um intenso trabalho de cooperação ente as partes envolvidas; tarefa difícil de
empreender que é preciso ir consolidando, repartindo os recursos por ambas as entidades.
No México foi estabelecido o Programa Nacional de Desenvolvimento Urbano que atribui às regiões e
cidades um estatuto superior, para que não sejam só um mero suporte físico de pessoas e empresas, mas
que constituam um factor de produção que deve ser articulado rigorosamente com as estruturas económicas
e sociais e com o processo de urbanização. No documento, estabelecem-se, também, três objectivos a
atingir por parte dos portos: devem contribuir para o desenvolvimento económico regional e nacional, bem
como para a geração de emprego mediante a atracção de investimento nas zonas ribeirinhas e no hinterland;
devem garantir a modernização do sistema portuário e contribuir para a boa gestão das finanças públicas;
devem ainda melhorar a relação entre o porto e a cidade.
Assim sendo, deverão apresentar-se propostas ao Estado para conseguir os meios necessários e dotar a comunidade, neste caso a cidade, com meios semelhantes aos do porto, mantendo assim um ritmo de crescimento
que permita a ambos conviver; ao porto manter os seus recursos de investimento e, através da administração
central, fazer chegar à cidade algumas das vantagens provenientes da sua actividade comercial. ❘❙❚
ATELIER 1
39
Acessibilidades e Transportes
- Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
Como sabem, esta é a 9ª conferência de uma série que se iniciou em França, em Rouen, em
1988, onde estive presente como membro da comissão científica da AIVP.
Tenho assistido a algumas destas conferências e o tema das acessibilidades sempre foi uma
questão central. Por outro lado, as mercadorias e os cidadãos devem aceder facilmente aos
terminais portuários e aqueles devem, também, poder usufruir da zona ribeirinha.
Esta situação de conflito levou à deslocalização de algumas instalações portuárias, de modo a
permitir a expansão das cidades. Mas este movimento não aconteceu em todo o lado, ainda
podemos assistir à utilização incaracterística destes espaços nas zonas portuárias antigas. ❘❙❚
ATELIER 2
Jacques Charlier
Professor do Institut de Géographie UCL
Louvain-la-Neuve, Belgica
Presidente da Mesa
Intervenção de
Francisco Schmidt
Coordenador da Área Urbana
Faculdade de Arquitectura e Desenho,
Universidade Andres Bello, Chile
Infra-estruturas de transporte,
acessibilidade e integração
das zonas ribeirinhas
nas cidades portuárias chilenas:
novos desafios
Porto de Buenos Aires
O tema que vou tratar está relacionado com a infra-estrutura de transporte, acessibilidades e integração da
orla marítima nas cidades portuárias e o conflito cidade e porto, que tem origem precisamente na infra-estrutura de transporte.
Há três questões que importa debater: Para quem se constróem as cidades? Que papel podem assumir as
infra-estruturas de transporte no novo cenário internacional? Que tipo de medidas e que critérios de ajustamento
devem acompanhar o novo papel das cidades portuárias, a partir dessas infra-estruturas?
O Sistema de Infra-estrutura de Transporte (IDT) é a base de uma certa ordem urbana, representando as
cidades o principal activo social e económico de um país.
Hoje em dia os dados civilizacionais ao nosso dispor indicam-nos que estamos na presença de uma revolução urbana: no Chile, 85% da população vive mas cidades. Este desafio exige soluções qualitativas para que
possamos ter uma cidade melhor.
As infra-estruturas contribuem para estruturar os centros urbanos e inserem-se na lógica de uma rede mais
vasta de transportes, que engloba as transferências dentro da economia global num sistema de fluxos que
permite dar resposta às cidades, regiões, países e continentes e potenciar novas oportunidades de desenvolvimento. O sistema funciona como uma rede dotada de plataformas logísticas de operação, áreas de transferência, novos serviços urbanos complementares, novas tecnologias e sistemas de informação. O sistema
portuário é uma das cadeias desta rede.
As infra-estruturas de transporte geram uma dinâmica própria que pode e deve transmitir novos valores de
referência e um quadro de acessibilidades que transmite uma outra imagem da cidade, através da grandeza
e extensão das obras, atractividade para novos investimentos, quantidade de recursos e agentes que participam na iniciativa (sector público, sector privado, sectores mistos, etc.), pelos impactos funcionais, sociais e
económicos (acessibilidade, abertura, novos mercados e negócios, etc.), recuperação de zonas degradadas
e pelos factores externos positivos derivados da sua implantação (competência, concorrência, etc.).
Por outro lado, há que contar com os efeitos de uma abordagem funcional e sectorial das infra-estruturas
de transporte, baseada nos critérios de velocidade, poupança de tempo e combustível, engenharia do
trânsito, etc.
Os Tratados de Livre Comércio (TLC) que temos com vários países e regiões abrem novas oportunidades
comerciais para as cidades-porto e atraem novos investimentos, dando uma outra escala de operação neste
binómio; os portos transformam-se em centros de actividade industrial, comercial e de serviços, passando a
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
Porto de Antofagasta
integrar unidades territoriais e mercados de maiores dimensões - por exemplo, Mercosul, Ásia Pacífico, etc.
O Chile é um país marítimo; tem 5.000 km de costa no Oceano Pacífico, o que é praticamente a largura da
Europa; 22 cidades-porto abertas ao mundo, por onde transitaram 90% da mercadoria que entrou e saiu
do Chile nos últimos cinco anos.
No que diz respeito às cidades-porto do Chile pode dizer-se que, historicamente, a actividade portuária
esteve de costas viradas para esta realidade, gerando conflitos organizacionais, económicos e sociais; contribuindo para o abandono de grandes áreas da orla marítima, a sua deterioração e fragmentação funcional, a
contaminação ambiental, perda do património portuário, de oportunidades e de competitividade, reduzindo, também, o potencial de aproveitamento dos espaços portuário. Estes resultados dão uma má imagem
da orla costeira, esforçando-nos agora por tomar consciência deste problema e ultrapassá-lo.
As cidades-porto do Chile começam uma lenta recuperação urbana com base em dois factores complementares: A nova lei de portos -que estabelece uma nova dinâmica com base no Sistema de Concessões, o
aumento de capitais privados, um sistema multi-operador e a especialização de carga por terminais; Mudanças tecnológicas na operação portuária – o novo valor do espaço portuário, zonas de operação logística extra
portuária, sistemas de telecomunicações à distância, menos tempo de transferência e maior capacidade de
manobra.
O Porto de Antofagasta começou a transformação da orla costeira com base na nova lei de portos, mas é
ainda um porto subutilizado, apesar do capital investido e das enormes potencialidades para o turismo, em
benefício de uma outra estrutura portuária reconstruída a 60 km de distância.
A imagem da cidade esbarra com o porto, havendo uma barreira em matéria de acessibilidades às infra-estruturas que existem no seu território de influência, prejudicando também o intercâmbio cultural, o comércio, o lazer, o passeio, a recriação, o turismo, etc.
As necessidades de mobilidade sem hierarquia geram uma área de pressão sobre a orla costeira; por outro
lado, a crescente exigência da mobilidade urbana perante o aumento das taxas de motorização dificulta a
provisão de infra-estruturas de transportes numa perspectiva integral: o tráfego de passagem e de distribuição, exigências de estacionamento, áreas restringidas e áreas de transferência, áreas de carga e descarga e
necessidades de transporte público, etc.
Outro aspecto importante reside no sobredimensionamento que, historicamente, atinge as infra-estruturas
de transporte que, pouco a pouco, se foram separando da cidade.
Contentores
43
Nova York
Porto de Antofagasta
Surgem aqui externalidades negativas que criam perda de valor e põe em causa a existência da orla marítima.
A cidade de Nova York é um exemplo característico deste estado de coisas. Dispõe de uma infra-estrutura
portuária enorme separada por grandes auto-estradas que surgem como uma barreira entre a cidade o
porto. Há aqui, em conjunto, fragmentação espacial, segregação funcional, isolamento urbano, poluição
ambiental, deterioração e abandono das áreas da orla marítima e dos espaços portuários. Pouco a pouco
esta situação foi mudando e parte das antigas docas foram reconvertidas.
O exemplo da Cidade de Valparaíso –no Chile, dotada de uma orla marítima bastante interessante, expressa
como é que se pensavam, nos anos 60/ 70, as infra-estruturas de transporte decorrente de um conceito generalizado que vigorava na época, baseado na poupança de tempo e combustível, eficiência e velocidade. Tendo
em conta este conceito, o projecto propunha que se fizesse uma auto-estrada e se acabasse com a piscina pública, com a praia, a marina, o clube de veleiros, etc, cuja aplicabilidade teria como consequências a incapacidade
técnica de adaptação das infra-estruturas de transporte ao território e o conflito com a operação portuária.
O projecto foi suspenso, optando-se pela construção de uma auto-estrada marginal, depois de uma mobilização social muito importante, com as universidades a terem um papel fundamental. Os conflitos que
surgem dizem sempre respeito à acessibilidade, à ligação, à continuidade, à funcionalidade e à segurança.
Assistimos hoje a uma nova abordagem na área das infra-estruturas de transporte, que pouco a pouco vai ganhando forma, que consiste na transformação da orla marítima num novo espaço económico que gera valor
como espaço de oportunidades. O caso mais emblemático são as rotundas de Barcelona que conseguiram
estabelecer uma relação harmoniosa entre cidade e porto e entre vários perfis, ritmos, etc.
Antofagasta, uma cidade de 250.000 habitantes, muito dependente das minas de cobre, rege-se por uma
nova lei de portos que lhe atribui 20 ha da sua superfície; dispõe de um Plano Estratégico para usos portuários; há uma nova dinâmica urbana na qual as infra-estruturas de transporte têm um papel predominante.
A experiência da nova orla marítima é um processo de participação que começou na autoridade regional
de Antofagasta, que pretendia alterar o estado de deterioração do espaço urbano-portuário e dar um novo
impulso económico, uma nova imagem à cidade em torno de um projecto mobilizador. Fazia todo o sentido,
inserindo-se a proposta no âmbito das comemorações do bicentenário da independência do Chile.
O projecto está relacionado com a infra-estrutura de transportes que serve a Avenida Costanera. Toda esta
zona está bloqueada por estacionamentos, um clube ilegal de iates, construções ilegais, uma zona pesqueira, monumentos, património histórico, há muito trânsito rodoviário e ferroviário e ainda a sub-utilização e
poluição do espelho de água.
Este projecto, que foi aprovado pelo governo e pela cidade de Antofagasta, estende-se por 13500 m2 de área,
e está contemplado nos instrumentos de planificação urbanística e relacionasse com a estratégia de participa-
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
45
Porto de Antofagasta no futuro
ção dos cidadãos. Foram convocadas todas as forças vivas da cidade – universidades, sector industrial, sector
portuário, associações - e cada um apresentou as suas visões e, apesar dos conflitos, conseguiu-se chegar a
um acordo global. Isso deu origem a uma imagem positiva do projecto porto-cidade que está em fase de
elaboração, mas já tem financiamento por parte do governo e esperamos que chegue a bom porto.
O interessante é que o produto e o processo estão a decorrer em simultâneo. O objectivo é estabelecer
um novo traçado de 4.500 metros lineares, entre o norte e o sul da cidade, uma abordagem inovadora de
integração entre cidade e porto, uma nova acessibilidade ao centro histórico urbano, valor acrescentado e
condições de acessibilidade às propriedades adjacentes, uma outra fachada urbana para a orla marítima e
novos espaços económicos para a cidade (turismo, o comércio, o lazer, etc.).
Apesar de tudo isto e porque ainda temos muito trabalho pela frente, continuo a deixar em aberto as seguintes perguntas: Para quem se constróem as cidades? Qual o papel das infra-estruturas de transporte? Que
tipo de medidas e que critérios de ajustamento devem acompanhar o novo papel das cidades portuárias, a partir
dessas infra-estruturas? ❘❙❚
O porto precisa da cidade para se poder expandir, para resolver os seus problemas de acessibilidade e para
ganhar competitividade. A cidade precisa do porto para conquistar algumas frentes de rio, para promover
algumas operações urbanísticas emblemáticas. Mas há uma outra questão que vai além do que são os objectivos específicos do porto e da cidade. Trata-se da necessidade de obter uma visão mais vasta e mais global
que integre o porto como um elemento de promoção económica, mas onde a cidade seja também um
elemento de competitividade e de complementaridade à escala global. E isto tem riscos, independentemente
do planeamento que cada uma das entidades faz. É sobre isso que a minha comunicação vai incidir.
Sines é o porto atlântico mais ocidental do continente europeu. É um porto de águas profundas, não tem
problemas graves de aproximação marítima, está aberto 365 dias por ano e tem uma posição geoestratégica
muito importante. Situa-se numa região extremamente despovoada: o Alentejo. É a região com menos
população de Portugal Continental; no seu todo não chega a constituir aquilo a que a lei portuguesa chama
Área Metropolitana (com 350.000 habitantes).
Não surpreende, por isso, que desde sempre se tenha colocado a questão de inter-ligação entre os aglomerados urbanos de Sines, onde se localizou o porto no início dos anos 70 e de Santiago do Cacém, que
foi a sua retaguarda agrícola.
A parte norte do litoral alentejano é uma área extremamente vasta, mas é aí que se concentra a maior densidade populacional. Ao contrário de todo o Alentejo, o litoral tem taxas de crescimento positivas. Mesmo
Intervenção de
Fernando Nunes da Silva
Professor Catedrático Instituto Superior Técnico
Consultor da Câmara Municipal de Sines
A competitividade do Porto
de Sines: riscos e oportunidades
de desenvolvimento urbano
quando Portugal tinha numa taxa de crescimento relativamente moderada de 4%, estas regiões cresciam.
No entanto, são compostas por aglomerados urbanos de reduzida dimensão, com uma média na ordem
dos 10.000 habitantes.
Neste momento, Sines é o principal porto e centro energético do país, onde confluem todas as fontes de
energia actuais (o carvão, o petróleo e o gás natural).
Em 1971, foi criado por decreto-lei um gabinete para promover o desenvolvimento deste projecto portuário e industrial. Estávamos numa época de tentativa de abertura do regime ditatorial, em termos económicos
e em termos políticos, e havia uma aposta desenvolvimentista de transformar Sines no grande pólo industrial
do sul do país, com ambições em termos internacionais. Numa altura em que o Médio Oriente era já uma
área muito instável, Sines teria um terminal petrolífero ligado aos reservatórios da NATO, na Península Ibérica; em caso de conflito e de bloqueio da rota do mediterrâneo isso poderia ser um elemento de defesa
importante, pois aparecia como alternativa de abastecimento da Europa via Oceano Atlântico. Graças a esta
conjuntura, a região do litoral alentejano apresenta, ainda hoje, níveis de produtividade e níveis de rendimento per capita mais elevados que os de outras regiões não metropolitanas do país. Apesar de existirem poucas
pessoas e meia dúzia de indústrias petrolíferas ou petroquímicas, o PIB per capita é elevado.
A questão que presentemente se coloca é a de saber qual o papel que Sines pode desempenhar no contexto
da Península Ibérica. A Europa, à medida que se alarga para leste, vai-se aproximando daquilo que é um espaço económico-político assente em regiões. Não é possível ter uma imagem da Europa alargada, do Atlântico
aos Urais, mantendo uma visão de governo de país ou de conjunto de países. Terá assim de haver alguma
centralização em domínios fundamentais e em determinadas estratégias e, simultaneamente, uma descentralização e um reforço das comunidades regionais, que não faz sentido ser feito ao nível dos Estados, tal como
nós os conhecemos. Faz muito mais sentido a existência de grandes regiões, com alguma homogeneidade
cultural e identidade própria e, sobretudo, dinâmicas económicas e sociais muito próximas. A Península Ibérica é, tradicionalmente e desde há muitos séculos a esta parte, uma dessas identidades europeias muitíssimo
fortes, pois aqui conflui o Atlântico e o Mediterrâneo, aqui se estabeleceram os contactos mais duradouros,
entre povos europeus e do norte de África, o que lhe confere uma especificidade muito própria.
Sines na Península Ibérica
Sines tem a possibilidade e a ambição de ser um dos grandes portos atlânticos da península, atingindo o
hinterland de Madrid, que é de longe o grande mercado e o grande centro financeiro e industrial da Península
Ibérica e também da própria Área Metropolitana de Lisboa.
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
Porto de Sines
Em termos demográficos, o crescimento de Sines tem sofrido grandes oscilações, sobretudo associado àquilo que foram as experiências de industrialização que aconteceram no final do séc. XIX e primeira metade
do séc. XX, com a indústria corticeira, e a partir de metade dos anos 70, com o desenvolvimento portuário (porto de pesca, terminal petrolífero, petroquímico, carvão, multiusos, carga geral, marina, gás natural,
porto de contentores atlântico, zona logística, novo molhe), o fecho de linhas ferroviárias e a nova ligação
rodoviária ao porto.
O que acontece em toda a história de Sines é que é muito marcada por este tipo de situações: Temos uma
quebra forte na população quando há a Guerra Colonial em Portugal a partir dos 60, em 1961 rebenta a
guerra em Angola e depois são treze anos de Guerra Colonial até 1974, o que leva a emigrações profundas
e onde o Alentejo foi uma das regiões mais sacrificadas em termos de emigração; A crise petrolífera de 1973;
A Revolução de 25 de Abril de 1974 e a instauração da democracia.
Depois, com a abertura do terminal petrolífero, começa a grande aposta no projecto de Sines, iniciado em
1971 e consolidado a partir de 1978, resultando num forte crescimento até ao final da década de 80.
A partir daí o país entra numa grave crise económica. Apesar de tudo, enquanto todo o país tinha valores
negativos de crescimento, mesmo em termos demográficos, Sines consegue manter-se.
Nos anos 90 há um relançamento de todo um conjunto de construções de infra-estruturas portuárias e de
retoma do projecto de Sines. Hoje a cidade ultrapassou os 12.000 habitantes e não pára de crescer. É uma
mudança brutal entre a cidade que se afirmou como um porto comercial relativamente importante no séc.
XVII — era por Sines que se exportava madeira, vinho, cereais e mel produzidos no Alentejo, para Lisboa e
Setúbal — e a dimensão que a cidade hoje tem.
Quais são os desafios que agora se colocam?
Por um lado, é fundamental que para além das instalações portuárias ligadas à energia, se continue a processar o aproveitamento industrial dessas facilidades. Exemplo disso é o facto da refinaria, petroquímica e central
termoeléctrica estarem aí instaladas. A partir do momento em que a diversidade de fontes energéticas é total,
é preciso ir mais longe. Para além daquilo que está dependente do tráfego marítimo, Sines tem também
um dos maiores parques eólicos do país e estuda-se a hipótese de avançar também no aproveitamento de
energia solar.
Com a concessão da exploração do novo terminal de contentores à Port Singapure Authority que é um dos
maiores operadores portuários mundiais, o porto deu um salto em frente relativamente ao transhipment e,
para além disso, como porto de contentores. Aliás, não é por acaso que os tradicionais lobbies e máfias que
estão normalmente associados ao trabalho portuário já começaram a manifestar-se muito fortes no boicote
ao sucesso da operação de contentores em Sines - conseguiu fazer uma coisa extraordinária que foi apresentar preços de venda da manipulação dos contentores, sensivelmente metade daqueles que eram operados
em todos os portos do país; o resultado foi que os sindicatos dos trabalhadores portuários desencadearam
uma greve em todos os portos nacionais exigindo que sejam revistas algumas das situações de trabalho e de
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contratação no Porto de Sines, obrigando a empregar muito mais gente e consequentemente subindo os
preços. Isto demonstra bem o que está em jogo e quais os riscos que se correm.
Outra questão a abordar é o alargamento do hinterland à Península Ibérica e a toda a parte logística associada à cidade de Lisboa; a Área Metropolitana de Lisboa é de longe a grande área industrial e financeira do
país, contrariamente àquilo que se dizia há muito tempo que a zona da Área Metropolitana de Lisboa era
o lazer e a finança e o trabalho industrial estava na Área Metropolitana do Porto; isso foi assim até à crise
dos anos 80, mas nos anos 90 com as novas tecnologias e os novos investimentos de ponta em termos
industriais vieram alterar radicalmente esse panorama; hoje a Área Metropolitana de Lisboa é hoje a ponta
de lança da internacionalização da economia portuguesa, mesmo ao nível industrial mas tem um problema
de falta de espaço para actividades logísticas e grandes operações portuárias. O porto de Lisboa e o porto
de Setúbal estão condicionados nas suas expansões e, relativamente a isso, Sines pode desempenhar um
papel de plataforma alternativa.
Isso significa que Sines precisa de ter boas ligações rodo-ferroviárias com Madrid - e esse é um dos casos graves
que temos de atravessar; os últimos quatro ministros das obras públicas esqueceram-se que um porto precisa
de acessibilidades terrestres; assim, conseguiu-se fazer todas as obras portuárias, temos o fecho da linha ferroviária no porto, temos a nova rodovia no porto, mas falta a ligação para além da plataforma portuária.
Outra implicação dos novos desafios tem a ver com a interdependência entre Sines e a Área Metropolitana
de Lisboa que é fundamental, não só em termos da complementaridade das instalações portuárias, como
também uma ideia que temos ouvido nesta conferência e que ainda não chegou aos ouvidos dos decisores
portugueses, é que o sucesso da actividade portuária hoje passa pela especialização dos seus terminais. O
que é espantoso é que num país pequeno como Portugal continua-se a gastar centenas de milhões de Euros
a duplicar infra-estrutura portuária em portos que têm administrações diferentes e que distam entre eles 20,
40 ou 100 km. O que defenderam os partidos que estiveram no poder é que esta questão era resolvida pelo
mercado, o Estado não tinha que se meter no assunto, o mercado é que iria seleccionar qual dos três portos
- Lisboa, Setúbal ou Sines – seria o mais interessante. Na minha opinião parece-me que, e podemos ver isso
pelo sucesso de outros portos no mundo, a estratégia passa por uma articulação muito grande entra autoridade portuária, o poder político municipal e o poder político regional ou central, para criar as condições de
desenvolvimento de um porto, e não o alheamento dessas mesmas entidades.
Outro problema que enfrentamos é o da complementaridade de funções - Portugal é um país de tradição
municipalista, não só do ponto de vista da reivindicação política mas também da capacidade de mobilização
de vontades locais e de lobby no interior do espaço de poder governamental; assim, este poder municipal
leva a que, muitas vezes, tenhamos dificuldade em encontrar plataformas de entendimento entre municípios
vizinhos, independentemente de serem ou não governados pela mesma força política; quando temos dimensões de aglomerados urbanos de 12.000 habitantes, quando temos uma infra-estrutura portuária e uma
área industrial com esta dimensão, é forçoso que os municípios envolventes se entendam.
Zona Logística
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
Área Industrial Envolvente
Quer em termos de áreas logísticas, quer em termos de áreas de jurisdição sabemos que: mais de 600ha
estão sob a jurisdição do porto de Sines; o grande terminal de contentores acabou agora de abrir, começou a
operar no mês passado e recebeu o primeiro navio porta-contentores de última geração; dispõe-se de uma
zona para actividades com maior valor acrescentado e a uma distância relativamente curta do porto (2Km),
com acessibilidade rodoviária e ferroviária, e mais 125ha de terreno na sua retaguarda.
Outra questão importante é a localização geoestratégica de Sines no mercado da Península Ibérica: Madrid
tem quase 6 milhões de habitantes, Lisboa com 3 milhões, Badajoz e Cáceres com 1 milhão de habitantes e
5 milhões de turistas no Algarve o que pode ser importante em termos de abastecimento.
No desafio da integração ibérica deste sistema temos um problema resultante do facto de durante mais de
10 anos o governo português ter andado distraído relativamente à ligação ferroviária em bitola europeia;
como sabem a Península Ibérica tem uma bitola, uma distância entre carris que é sensivelmente mais larga
(tem 1.600 mm contra os 1.400 mm da bitola standard) o que faz com que todos os comboios que partam de uma estação na Península Ibérica tenham que mudar quando entram na rede francesa, o que põe
problemas graves do ponto de vista da mercadoria, chegam-se a perder alguns dias nas fronteiras por causa
dessas mudanças.
A Espanha começou a sua linha de alta velocidade em 1992 com a exposição universal de Sevilha e desde
aí tem vindo a construir e desenvolver essa mesma linha em bitola europeia e em velocidade elevada e alta
velocidade. Portugal andou distraído até ao ano passado em que foi posto perante um facto: ou liga à rede
espanhola em Badajoz, que é onde terminará a rede ferroviária de alta velocidade, ou então tem de fazer
tudo sozinho. Assim, o governo acabou por aprovar aquilo que era mais que evidente – a ligação Lisboa/
Madrid fazê-la por Badajoz que é onde vai haver maior concentração demográfica e económica.
Outra questão importante, que os instrumentos de planeamento à escala regional já colocam, é a da integração de Sines na Área Metropolitana de Lisboa. O plano elaborado pelas autoridades regionais da Área Metropolitana de Lisboa mostra claramente que Évora e Sines se assumem como o núcleo central da economia
e demografia do sul de Portugal. Por dificuldades de expansão no interior da sua própria área metropolitana,
Lisboa necessita de alguns elementos de descompressão, que são cidades localizadas quer a norte e oeste
49
Portos da Península Ibérica
— Torres Vedras e Évora — quer a sul de Portugal — o pólo Sines/ Santiago do Cacém/ Vila Nova de Santo
André. Estes três núcleos urbanos, um no litoral e dois no interior, sustentam o fim do corredor litoral, onde
se concentra mais de 80% da população do país e praticamente toda a sua actividade económica com maior
potencial de crescimento e internacionalização.
A localização dos grandes portos nacionais no conjunto da Península Ibérica demonstra a importância que
esta fachada atlântica pode ter na complementaridade com os grandes portos espanhóis, do Mediterrâneo
ou do Mar do Norte, e a questão que já tínhamos falado da importância fundamental de associar estes três
núcleos urbanos (Sines/ Santiago do Cacém/ Vila Nova de Santo André) para criar uma dimensão crítica do
ponto de vista demográfico que permite desenvolver a cidade.
É importante desenvolver todo um conjunto de actividades que neste momento estão em curso; estas questões têm a ver com planeamento, com monitorização ambiental (Sines foi a primeira zona do país que teve
as estações de medição de poluentes e de controlo de poluição), com o desenvolvimento urbano, etc.
No que diz respeito ao desenvolvimento urbano, e apesar das suas dificuldades financeiras, o município
desenvolveu um plano de urbanização para a cidade poder acomodar até 20.000 habitantes. Definiu e caracterizou as grandes obras de infra-estruturas urbanas a concretizar, programou os equipamentos colectivos
necessários, elaborou planos de pormenor (que neste momento já estão em construção por promotores
privados e pela própria Câmara Municipal) e desenvolveu um projecto de reabilitação do seu centro histórico, como elemento de memória.
Plano de Urbanização
O problema da integração da cidade e do porto foi muito conflituosa no início do desenvolvimento portuário; é bom perceber que a Administração do Porto de Sines dependia de um governo que era ligado ao
anterior regime, há um período revolucionário extremamente conturbado em 1974/1975, e portanto a
conflituosidade entre aquilo que eram os novos poderes locais emanados da revolução democrática instalados em 1976, relativamente àquilo que era o anterior gabinete foi complicada, mas conseguiu-se resolver,
e hoje a colaboração entre Administração do Porto e Câmara Municipal de Sines é plena, e aquilo que a vila
perdeu com o porto - uma enseada que desde o séc. XIX era procurada pelas grandes famílias latifundiárias
do Alentejo para veraneio – está agora a ser recuperado com a ajuda da própria instalação portuária que está
a desenvolver todo o projecto paisagístico da marginal.
Por outro lado, Sines integra-se numa área costeira extremamente importante e de paisagem natural: é
neste momento a única costa com esta dimensão e completamente selvagem que existe na Europa.Há uma
potencialidade enorme de desenvolvimento de novas tecnologias, de investigação e de trabalho em termos
de ambiente, indústria, etc.
E aqui é que aparecem os principais riscos e constrangimentos que têm a ver com: a dimensão e escala demográfica da zona – é um centro demasiadamente pequeno, mesmo que cheguemos aos 40 mil habitantes,
para servir de background a toda esta infra-estrutura portuária e industrial, daí a importância de se ligar com
a Área Metropolitana de Lisboa; as redes de transportes e a sua integração nas redes transeuropeias; falta de
liderança em termos industriais e logísticos – há várias agências, várias entidades a trabalhar para o mesmo e
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
51
não há uma cabeça, não há uma direcção; economia local extremamente débil; falta de nível de Administração
Pública intermédia regional – que esteja acima dos Municípios, mas que esteja abaixo do Governo e que seja
capaz de corporizar e protagonizar uma liderança político-administrativa reconhecida enquanto tal. Que hoje
não existe; coordenação dos projectos – coordenar no espaço e no tempo as várias entidades que desenvolvem projectos; recursos humanos – ainda recentemente uma fábrica de automóveis nipónica pretendeu
instalar a sua montagem para toda a Europa no Porto de Sines, até porque tinha muita facilidade de utilizar o
transporte marítimo quer para trazer as peças quer para levar os automóveis montados, e chegou à conclusão que não conseguia arranjar 5.000 operários especializados em toda a região do Alentejo e acabou por ir
para Espanha; os impactes ambientais.
A principal dificuldade a vencer prende-se com o facto da Administração Central e Regional, independentemente de quem está no governo, ainda não ter percebido a importância de: 1.coordenar os vários investimentos, a começar pelos públicos; 2. investir rapidamente nas infra-estruturas de ligação ao hinterland
— um porto sem ligações ao hinterland não se pode desenvolver; 3. financiar a investigação aplicada aos
aspectos ambientais — uma das grandes preocupações é que Sines venha a ser um local de instalação das
indústrias não desejáveis do país ou da Península Ibérica. É por isso importante assegurar que o que aí se
instala continue a ser monitorizado e continue a ter garantias ambientais; 4. assumir a liderança, por parte
das entidades públicas, na definição do que deverá ser a especialização funcional dos vários portos do sul do
país e não continuar a financiar, com dinheiro público, as infra-estruturas e a duplicar infra-estruturas na Área
Metropolitana de Lisboa.
Por último, é ainda necessário acabar com a enorme burocracia que caracteriza a nossa Administração
Pública, seja a nível central, regional ou local, o que obviamente acarreta um acréscimo de custos de oportunidade para qualquer instalação. ❘❙❚
Represento um porto de média/ grande dimensão no espaço espanhol, situado numa ilha atlântica, que faz
parte dum território integrado na UE (União Europeia). Para os portugueses estamos a 200 milhas náuticas
a sul da Madeira, e a 70/ 80 milhas daquilo que era o Sara espanhol com a possibilidade de servir de ponte
de ligação entre a Europa, a África e a América.
Em termos sócio-económicos, a ilha de Tenerife tem 2.500 km2 e 1 milhão de habitantes, enquanto a cidade
de Santa Cruz de Tenerife alberga 259 mil habitantes. Recebemos 5 milhões de turistas por ano.
Pouco a pouco, a cidade e o porto foram crescendo, havia espaço para tudo, tendência que se inverteu,
talvez devido à estrutura organizativa das nossas cidades e dos nossos portos, levando as duas entidades a
ficar de costas viradas.
Em 1981 a Câmara Municipal deu conta das preocupações dos cidadãos, diligenciando para a recuperação
da orla marítima que a cidade tinha perdido.
Lentamente, começa a haver sinais de aproximação entre a cidade e o porto, começando este a ceder zonas
obsoletas, ao mesmo tempo que a própria cidade inicia o processo de exclusão das refinarias de petróleo,
que tinham sido um factor determinante para o crescimento do porto, da grande indústria e motor de crescimento da cidade e do porto.
Assistimos aquilo que costumo chamar de crescimento inconsciente, um crescimento não estruturado da
actividade da cidade face à frente marítima e ao porto.
Na zona portuária foram efectuadas quatro intervenções em frente da refinaria de petróleo, sem incomodar
a cidade, que já tinha um plano geral e um plano arquitectónico muito urbanístico e generalista, faltando-lhe
embora o conceito de negócios.
O Palmetum é uma das intervenções previstas, edificado sobre uma lixeira e caracterizado pela sucessão de
palmeiras que o rodeia.
Realizámos outra intervenção importante, que foi fundamental para o crescimento da cidade; é um edifício
de Calatrava onde se localiza o Centro Internacional de Feiras e Congressos.
Começamos a falar da institucionalização da relação entre porto e cidade dinamizada por uma sociedade mista
Intervenção de
Luis Pedro Suarez Trenor
Presidente Autoridade do Porto de Santa Cruz
de Tenerife, Ilhas Canárias, Espanha
De frente de mar desqualificada
a opção estratégica
para a cidade/porto
em Santa Cruz de Tenerife
Porto de Santa Cruz de Tenerife
Palmetum
Auditorium
Centro Internacional de Feiras e Congressos
Parque Marítimo
Porto de Santa Cruz de Tenerife
constituída pelo Município e a Administração Portuária, cuja exploração começou em 1994/ 1995, com êxito.
Em primeiro lugar, porque atraiu as pessoas e, em segundo lugar, porque conseguimos, graças aos concessionários, um bom nível de qualidade de vida e serviços a que temos de habituar os nossos cidadãos.
Por fim, há uma última intervenção no porto que já não pertence à administração portuária; é mais um edifício de Calatrava - o Auditório de Música - que complementa o Centro de Congressos, unidos através do Parque Marítimo.
Da minha cidade tenho que dizer que ela felizmente se preocupou com as exigências dos cidadãos; não
privilegiando, nem o plano de negócios, nem o plano estratégico.
Em 1996, a nova lei de portos de Espanha foi fundamental para a política portuária espanhola porque tornava os portos autónomos, coordenados por um organismo; aumentando a competitividade entre eles e
levando muitas pessoas a pensar que o porto não era unicamente do interesse do Estado, mas também um
instrumento fundamental para o desenvolvimento regional da comunidade autónoma e da própria ilha. Foi a
partir daqui que os portos se tornaram mais técnicos; os presidentes das administrações portuárias passaram
a ser nomeados pela comunidade autónoma, e embora os bens e o património do porto continuem a ser
pertença do Estado espanhol, começou um novo diálogo com as entidades portuárias.
No porto de Santa Cruz de Tenerife movimentam-se 17 milhões de toneladas de mercadorias das quais
10 milhões são de graneis líquidos e 2 milhões graneis sólidos, acolhemos 1,5 milhão de passageiros, 9 mil
escalas de barcos e movimentamos praticamente 1 milhão de toneladas de bunkering; registamos um tráfego
de 250 mil veículos e 25 mil camiões de carga inter-ilhas; o que dá para ter uma ideia do volume de tráfego.
Conseguimos assim, tornarmo-nos num porto relativamente importante no mundo dos cruzeiros de turismo; só no ano passado tivemos cerca de 350 mil turistas e acolhemos 280 escalas no Porto de Santa Cruz
de Tenerife, porque tivemos a sorte e a inteligência de nos associar àqueles que a priori pareciam os nossos
concorrentes – Las Palmas e o Porto do Funchal. Criámos uma marca comum de cruzeiros. Conseguimos
oferecer aos melhores operadores turísticos 8, 9 e até 10 portos com excursões e pacote comum, obtendo
assim um lugar próprio no mercado. Hoje em dia somos o oitavo destino a nível mundial em número de
escalas – estamos a falar de 1500 escalas entre os três portos e de 1,5 milhão de passageiros.
Esta é uma das razões de ser do nosso trabalho porque significa o começo da modificação do Porto de Santa
Cruz de Tenerife - aproveitar o turismo em benefício do porto e dos cidadãos - como uma das linhas mestras
do plano estratégico. Há duas vertentes: as áreas de negócio de turismo de cruzeiros e as marinas de recreio.
Temos que tomar consciência que o porto é um centro de negócios, que tem de trabalhar para os cidadãos,
fazendo com que se aproveitem todos os recursos de modo a justificar os projectos perante outras entidades,
igualmente interessadas no território portuário. Tudo isto vai gerar uma forte dinâmica no conjunto portuário;
o trabalho específico do porto – é óptimo que haja muitos terminais e muitas companhias para enfrentar o expectável aumento do movimento de contentores que vai suplantar a capacidade de oferta dos portos.
Dentro desta linha de intervenção a nossa primeira opção foi analisar como é que poderíamos potenciar o
turismo de cruzeiros. A Câmara ajudou-nos e permitiu que os projectos se estendessem para além da zona
estritamente portuária. Quem ganhou o concurso foi a dupla de arquitectos Herzog Y De Meuron com uma
proposta que potenciava a actividade portuária e contemplava as necessidades da cidade.
Acessibilidades e Transportes - Gerir o Quotidiano e Preparar o Futuro
ATELIER 2
Proposta de Herzog Y De Meuron
O concurso que abrimos serviu de peça-chave para pôr em andamento um processo que vai sendo materializado em tempo de revisão do plano urbanístico da cidade, paralelamente às intervenções que estamos
a fazer no porto.
Tivemos muitas discussões, longas conversas, mas hoje em dia estamos a conseguir algo de positivo para
todos porque temos a ferramenta mais importante – o conceito de que a cidade e o porto têm de trabalhar
em conjunto.
A cidade tem de definir o seu novo modelo para o séc. XXI, que passará obrigatoriamente por aproveitar
toda a zona portuária e tentar que, pelo menos, 5 milhões de turistas visitem a ilha e entrem na cidade.
Descongestionámos as grandes vias, criámos desnivelamentos para absorver o tráfego rápido das rotundas
e, ao mesmo tempo, resolver os acessos à zona portuária, fizemos, também, parques de estacionamento ao
serviço da cidade e do porto. Em resumo, o porto colocou as suas instalações ao serviço dos cidadãos.
Por outro lado, procedeu-se aos trabalhos de preparação do futuro porto, que tem entre 16/20m de profundidade, com uma linha de acostagem de 1.200 metros lineares e 2.500 lugares de estacionamento, mais do
que suficiente para que estes terminais tenham capacidade, no futuro, para absorver o tráfego esperado.
Foi a partir do momento em que começámos a trabalhar em conjunto – o Município e o Porto – que conseguimos definir um novo modelo de cidade, preservando os edifícios antigos, e começando a utilizar o porto
para novas actividades.
A nossa linha estratégica privilegiou o aproveitamento de sinergias para colocar o Porto de Tenerife - um
terminal de passageiros com capacidade para navios de 3.600 passageiros - como porto base de cruzeiros.
Tudo isto que está a acontecer é importante para potenciar a capacidade financeira da autoridade portuária,
insistindo por isso na necessidade de se dispor de um plano e olhar para o porto como um centro de negócios ao serviço dos cidadãos que ali vivem, para não sermos engolidos pela cidade. ❘❙❚
Queen Mary II
53
Novos Poderes Institucionais
para Ultrapassar os Antagonismos
“Cidade/Porto”
Os novos desafios relacionados com a melhoria da ligação cidade/ porto obriga, muitas vezes, à criação de novas estruturas ad hoc de desenvolvimento e gestão das zonas ribeirinhas,
mediando os interesses portuários e urbanos. Tratam-se muitas vezes de instrumentos dinâmicos e abrangentes, orientados para o interesse das populações, potenciando as parcerias
entre o público e o privado. ❘❙❚
ATELIER 3
Vitor Caldeirinha
Director Comercial da Admin. do Porto de Lisboa,
Portugal
Presidente da Mesa
Intervenções de
Cor van Asch
e Perry Boomsluiter
Empresa de Desenvolvimento “cidade/ porto”
Roterdão, Holanda
A Cidade e o Porto de Roterdão
– Gerir um Futuro Comum
Área Sul do Porto
Área Central do Porto
Área Norte do Porto
1970-1990
1990-2010
2010-2030
Transformações no Porto 1970-2030
Vamos falar-vos sobre a empresa de desenvolvimento CityPorts Rotterdam e a área circundante ao porto,
que inclui toda a zona metropolitana de Roterdão e de Haia e um grande aeroporto internacional, envolvendo nesta abordagem os aspectos económicos e a estratégia de desenvolvimento.
O porto de Roterdão, o maior do mundo, era nos anos 30 a sede do maior porto dos Países Baixos; depois
da II Guerra Mundial esta situação alterou-se com a saída do aeroporto, fixando-se a sua ocupação em 65%
de terreno e 35% de zona marítima. A área à volta do porto, criada nos anos 50, 60 e 70, estende-se ao
longo dos 40Km entre a cidade de Roterdão e o mar. Tem 10.000ha de área total, dos quais cerca de metade é zona industrial; o movimento total chega aos 330milhões de toneladas; a área total de contentores é
a maior do mundo – em 2003 o trânsito foi de 7 milhões de TEU’s; em 2003 houve 30 mil embarcações
marítimas e 130 mil de cabotagem. Tem uma gestão de contentores de 2,8 milhões de toneladas (40%),
o total de carga em trânsito é de 42 milhões de toneladas (13%), tem 1.400ha de zona portuária, há 900
empresas no local, e 20.000 postos de trabalho.
A distância entre o Porto de Roterdão e Antuérpia é de 100Km e entre o de Roterdão e o de Amesterdão
é de 75Km.
A última ampliação surgiu na parte circundante da cidade de Roterdão e muito perto do centro da cidade.
Pensamos que a zona do Maasvlakte 2, uma área de 2000 ha, será um espaço muito atraente para grandes
empresas e para novas actividades imobiliárias, etc.
A partir de 1 de Janeiro de 2004 foi criada uma empresa que inclui o Porto de Roterdão e o Município de
Roterdão (50% para cada lado); para além disso há um acordo com o Porto de Roterdão no sentido de, a
partir de 2007, haver uma maior ajuda à nossa organização.
Com a empresa de desenvolvimento CityPorts Rotterdam mais envolvida, vai haver uma alteração no modo de funcionamento com o objectivo de promover a gestão dinâmica do projecto; tentando manter a qualidade existente,
utilizar novas oportunidades e aumentar o rendimento através do aproveitamento do território envolvente.
No dia 25 de Junho houve uma decisão muito importante - um acordo entre o Porto de Roterdão, o
Município e o Governo holandês para a criação do Maasvlakte 2 - as obras começarão em 2006 e estarão
concluídas quatro anos mais tarde, já com 1.000ha de zona industrial. O Governo Central, como accionista
da obra, investiu no Porto de Roterdão para que a obra do Maasvlakte 2 possa ser concretizada,
Esta transformação não é nada de novo para a cidade de Roterdão; as zonas a amarelo - requalificadas
entre os anos 70 e 90 – eram sobretudo construções do séc. XVII e incluíam a zona medieval da cidade de
Roterdão.
Novos Poderes Institucionais para Ultrapassar os Antagonismos “Cidade/Porto”
ATELIER 3
Estratégia de Desenvolvimento
Paralelamente, a cidade também precisa de espaço para se desenvolver. Estão contabilizados mais 1.000ha
de áreas industriais e logísticas e 60.000 habitações.
Vou agora falar-vos das primeiras ideias que tivemos para o futuro da área, começando por fazer um pequeno resumo relativamente à economia, ao ambiente e ao sector imobiliário.
Foi realizado, recentemente, um estudo relativo às actividades económicas na cidade portuária, onde se refere
que nesta área a maioria das oportunidades são para os serviços comerciais marítimos, para a tecnologia portuária e para a distribuição internacional; estes três pontos já estão presentes na área da cidade portuária.
Prevê-se que o sector do lazer e da economia criativa sejam bastante lucrativas no futuro, com a criação de
mais 10.000 postos de trabalho na zona, 40% dos quais serão novos.
Quanto ao sector imobiliário na cidade portuária de Roterdão o facto mais importante a reter é que não há
necessidade de se construirem novas casas antes do ano 2015, nem de carácter social, e quando isso acontecer será para um tipo de mercado mais caro, apesar das limitações ambientais devido ao ruído industrial e
à envolvente problemática da zona.
Relativamente ao ambiente é importante que desde o início do processo de requalificação da área se tente
abordar esta vertente; nos Países Baixos existe a tendência de começar a construção imobiliária e só quando
esta termina é que abordamos a questão ambiental, o que não parece ser a melhor solução. Temos aqui
uma boa oportunidade de dar início ao processo de construção de novas casas tendo em conta previamente
a vertente ambiental.
A necessidade de prevenir problemas actuando de uma forma mais inteligente e favorecendo a relocalização
de novas empresas; ajuda a encontrar outras soluções para as questões que vão surgindo.
A requalificação desta área não dá apenas oportunidades para as áreas suburbanas, mas também para as
empresas que aí estão sediadas.
A organização CityPort começou apenas no dia 1 de Janeiro de 2004, mas já estamos a trabalhar na estratégia de desenvolvimento para a cidade portuária de Roterdão. A nossa filosofia é acompanhar as empresas
de maior dimensão na área; tentamos também combinar no mesmo espaço funções portuárias e urbanas;
reforçar a relação entre a cidade, o porto e o rio de modo a proporcionar uma ideia geral e saber quais os
locais com maior qualidade na cidade portuária. Temos que criar situações inovadoras a nível ambiental.
A nossa estratégia de desenvolvimento vai ser realizada em duas fases: numa primeira fase vamos tentar reforçar
a situação económica no sul, a zona a roxo, e nos próximos 10 a 15 anos, quando parte dos terminais de contentores tiver desaparecido, vamos tentar desenvolver a zona a amarelo para áreas residencial e de escritórios.
O risco de investimento para as empresas nesta área é imprevisível, dado que não podemos antecipar a
eventual deslocalização dos terminais de contentores para a zona ocidental, criando prematuramente mais
infra-estruturas nas zonas a libertar.
57
A questão da água é muito importante porque se houver mudança dos terminais para outras zonas, haverá
menor utilização dos actuais espaços. Hoje em dia há 500ha de zona marítima e temos de pensar o que
vamos fazer prevenidos com o resultado de uma transformação anterior, mal aproveitada, havendo agora
necessidade de promover uma estratégia que tente utilizar os espelhos de água em benefício das pessoas
que gostam de usufruir destes espaços.
Ao nível da estratégia de desenvolvimento é bom lembrar que esta zona é de forte pendor económico e que a
população de Roterdão está muito consciente desta vertente dado que não frequenta esta zona portuária, que
não é apenas uma área suburbana. Para alterar esta realidade é preciso criatividade, zonas de lazer e competição
moderada com a cidade, enquanto não estiver completado o trabalho que há ainda a fazer no centro da cidade.
A vertente financeira é muito importante neste projecto de requalificação; estamos a tentar estudar as formas
de reprogramar o financiamento do seu desenvolvimento ou, por outras palavras, temos que saber quais os
programas necessários para atrair o financiamento, uma vez que o auto-financiamento é muito difícil.
Em resumo, para a organização da cidade portuária é fundamental garantir que a Autoridade Portuária e o
Município da cidade de Roterdão dispõem de serviços comuns articulados no que diz respeito à gestão do
processo, aos planos de desenvolvimento e às estratégias, aos projectos futuros e ao trabalho com todos os
parceiros tanto do sector público como do privado.
Para terminar, diria que temos que aprender e partilhar as ideias e inovações que nos chegam de outras
cidades portuárias. ❘❙❚
Intervenção de
Piotr Lorens
Professor Assistente Faculdade de Arquitectura
Universidade Técnica de Gdansk, Polónia
Gestão dos espaços de transição:
exemplos comparados na Europa
de leste, Europa ocidental
e América do Norte
Nesta apresentação vamo-nos deter sobre algumas questões: O porquê dos espaços de transição? O que são
espaços de transição? Que tipos de espaços de transição existem, nas cidades-porto? As zonas ribeirinhas e o seu
desenvolvimento; Quais os modelos possíveis de aplicar nestes espaços de transição?
Podemos dizer que os tempos em que vivemos, nas cidades pós-industriais reproduzem padrões de produção e de vida muito diferentes; isto aplica-se à deslocação da operação de contentores, mudanças que se
estão a operar ao mesmo tempo que o aparecimento de novas industrias.
Temos novos espaços urbanos resultantes do desenvolvimento das cidades, em zonas abandonadas, que já
não estão a ser utilizadas.
Existem parceiros-chave em todo este processo de desenvolvimento urbano: podem-se interessar em
reutilizar, reabilitar estes espaços de transição; diferindo o seu envolvimento de acordo com os diferentes
espaços. No caso das zonas ribeirinhas existem dois parceiros – a Municipalidade e a Autoridade Portuária
– mas podem também existir outros. No caso da Polónia, o maior protagonista em todo este processo é
uma empresa de transportes ferroviários que é proprietária de uma grande área de terreno e quer ter um
papel importante no processo.
O interesse destes parceiros também depende de outros factores que podem ser divididos em dois grupos:
o primeiro diz respeito à localização – certos espaços são interessantes a determinados parceiros; outro
factor é a identidade – o que conta não é saber se este espaço é necessário, mas sim se ele tem a ver com
a identidade marítima da cidade.
Apesar do desenvolvimento das cidades durante as últimas décadas ser bastante diferenciada, hoje em dia
parece que todas estão a seguir o mesmo padrão.
As zonas ribeirinhas são áreas-chave, com grande história e tradição marítima, exemplos de espaços de
transição que têm sido utilizados para fins industriais, com grandes áreas para desenvolver perto do centro
da cidade, por outro lado, são zonas muito atraentes em termos de habitação, mas com preços elevados
para os terrenos ribeirinhos.
Quando falamos em espaços ribeirinhos de transição falamos de modelos que podem basear-se em: Modo
de cooperação entre os parceiros do processo – Autoridades Portuárias, Município, Empresas de Caminhos de
Ferro, etc.; Modo de implementação dos projectos de grande escala, ou seja, um modelo de implementação
das novas funções dos novos projectos urbanos, sejam eles comerciais, de habitação, orientados para o
porto, etc. – a escolha deste modelo irá decidir sobre a eficácia de todo o processo de regeneração; Tipo de
novo programa urbano localizado nos espaços de transição – indica se o espaço será ou não atraente;
Há três abordagens possíveis que se verificam em várias cidades: A partilha da zona e criação de zonas do
interesse do porto e da cidade – baseia-se no facto de todos os parceiros terem interesses muito fortes na
Novos Poderes Institucionais para Ultrapassar os Antagonismos “Cidade/Porto”
zona de transição por várias razões; o porto, por exemplo, não pode sair do seu lugar porque não tem para
onde ir. Para criar um porto novo são necessários grandes investimentos, por isso, o porto tenta reutilizar a
zona que já existe. Isto cria conflitos entre o porto e o município. A solução é esta zona ser partilhada, mas
mesmo assim existe um processo de separação; existem zonas de actividade exclusiva do município e do
porto; Formação de uma zona cidade-porto – trata-se de criar uma zona comum entre a cidade e o porto.
É um grande desafio; muitos municípios gostariam de realizar este sonho, contudo é um projecto difícil de
executar. Muitas das actividades portuárias podem ser observadas, mas as pessoas não se podem deslocar a
esses locais por razões de segurança pessoal e de carga; o que acontece é que normalmente temos zonas
de actividade exclusiva. Esta zona comum é possível em certos tipos de logística ou actividades comerciais do
porto, por um lado, e com um programa urbano muito específico, por outro; é possível que haja habitação
nestas zonas mas esta localização não é adequada para casas onde habitem muitas crianças, por exemplo;
Retirada de um dos parceiros da zona de transição – este é o caso mais frequente nos projectos ribeirinhos;
relocaliza-se o porto e as antigas estruturas são aproveitadas para outros projectos.
Exemplo do primeiro modelo é a cidade de Gdansk, na Polónia, onde o porto, a empresa ferroviária e a
cidade estão a lutar para a posse desta zona e provavelmente iremos ter uma partilha entre os três parceiros.
A escolha desta cooperação entre parceiros é baseada em diferentes factores, três deles cruciais em termos
de decisão: Em primeiro lugar é fundamental analisar quais as necessidades das novas actividades portuárias e
qual a disponibilidade de espaço, se é necessário aumentar o porto com a construção de terminais novos temos
uma dificuldade – onde localizar estes novos terminais e estas zonas novas? Se tivermos espaço noutro lugar
isso é possível, mas noutros casos isso não é possível. Em segundo lugar é importante saber quem é o proprietário do terreno? Se pertence ao Estado ou a uma empresa privada, a força do Município é relativamente
fraca; se pertencem ao Município ou à Autoridade portuária a questão é diferente. Existem instrumentos de
planeamento e de propriedade, mas são precisos fundos para serem alterados. Em último lugar importa saber
quem é que decide em relação ao desenvolvimento deste processo? – pode acontecer que o porto pertença
ao Município e assim, o Presidente da Câmara será responsável pelo desenvolvimento do Município e do
porto mas poderá acontecer, como acontece na Polónia, em que a Administração do Porto é independente
da cidade e o Presidente da Câmara não tem voto na matéria em relação ao que acontece no porto; aqui os
parceiros são, de certa forma, equivalentes e não há uma forma simples de um se impor ao outro;
Baseado na análise de nível do envolvimento de fundos públicos em todo o processo de implementação de
projectos de grande escala existem quatro modelos principais: Financiamento directo – é o modelo que faz com
que seja possível executar rapidamente projectos novos; Parcerias entre o sector público e o privado - é preciso
que haja estreita cooperação entre os dois sectores; Zonas de regulamentos especiais – é muito promissor mas
não garante resultados rápidos; Programas de assistência profissional – algumas cidades optaram por este modelo
que entrega a iniciativa directamente ao parceiro de negócio, quer seja o porto ou outro qualquer.
No caso da Polónia temos a quinta opção que é não fazer nada. Os municípios, na Polónia, não estão muito
interessados; deixaram tudo nas mãos do sector privado ou então das autoridades portuárias.
No novo modelo de programa urbano localizado no espaço de transição temos dois elementos importantes:
As características globais do espaço de transição – podemos ter zonas de orientação para o porto (ex: Antuérpia), zonas de habitação (ex: Roterdão), espaços comerciais (ex: Nova York), zonas de lazer (ex: Lisboa)
e noutros casos temos a típica mistura urbana, um pouco de tudo (ex: Toronto); Os projectos específicos a
serem localizados – a tipologia dos projectos específicos de construção podem ser localizados em qualquer
destas zonas, a questão é saber quantos devem ser afectos a cada zona e a sua tipificação; Por exemplo, em
relação a habitação podemos ter nestas zonas desde a habitação social até à habitação de luxo.
Podemos concluir que a gestão deste espaço de transição ribeirinha necessita de um planeamento estratégico,
uma visão a longo prazo; isto pode parecer um pouco trivial, mas sobretudo em casos de cidades que estão a
pensar neste tipo de processo de reposicionamento e em cidades onde há falta de tradição de desenvolvimento
e planeamento urbano. Esta ideia pode ser inovadora. O planeamento estratégico é essencial a fim de definir o
futuro da zona portuária, ou da zona de transição, ou de toda a zona da cidade e do porto. Os parceiros interessados têm de se sentar à volta da mesma mesa e discutir este planeamento estratégico para evitar problemas.
Existem modelos de implementação diferentes e todos têm prós e contras; a decisão está nas mãos dos parceiros que têm de adoptar um modelo de acordo com os resultados que pretendem obter. É possível desenvolver
uma zona cidade-porto, mas é preciso definir o tipo de utilização dos terrenos, por acordo entre os parceiros;
se não quiserem e se não poderem contribuir para esse objectivo, é melhor optarem por outro modelo.
ATELIER 3
59
As estruturas do porto têm sempre um papel muito importante a desempenhar; são conhecidas como motor económico das cidades, mas nem sempre é assim; por vezes, os portos mais pequenos desaparecem e
deixam de ter significado em termos de economia da cidade.
O que é importante para muitas cidades do ponto de vista do planeamento urbano não é ter o porto dentro
da cidade; o que convém ter são características marítimas. Nalgumas das zonas de transição pode-se ter a
sensação de que se está no antigo porto; esta parece ser uma tendência nova que está agora a emergir.
É a necessidade de manter o carácter marítimo das cidades que contribui para a sua identidade e faz a diferença entre portos e entre uma cidade que tem porto e outra que não tem. ❘❙❚
Intervenção de
Gabriel Aldoney Vargas
Presidente da Empresa Portuária de Chile Vaparaiso,
Chile
O exemplo de Valparaiso – Chile
América do Sul
Valparaiso
CHILE
Valparaiso
Vou tentar transmitir-vos a experiência do caso Valparaiso, no Chile.
Nesta apresentação vou começar por falar-vos sobre o mercado da zona de influência de Valparaiso, em
seguida da cidade na sua vertente histórica e no seu desenvolvimento portuário e urbano; vou também falarvos do grande desafio que enfrentamos, do resumo dos investimentos e do plano director da orla costeira.
Valparaiso é uma cidade Património da Humanidade; em Julho de 2003, a UNESCO confirmou Valparaiso
como cidade Património da Humanidade. A cidade cresceu envolta por uma zona montanhosa onde se inclui
o porto, ganhando terreno ao mar.
A zona central do porto tem uma perspectiva urbana pelas suas soluções arquitectónicas e a sua riqueza
histórica; foi fundada no séc. XIX devido à imigração sobretudo europeia e alargou o seu território graças à
criação do Canal do Panamá.
O porto de Valparaiso está situado na parte central do Chile. A sua zona de influência tem 7, 6 milhões de
habitantes; onde está concentrada cerca de 50% da população do Chile e representa 46% do PIB nacional.
Valparaiso encontra-se a 120Km da capital Santiago e a 206Km da zona do paço fronteiriço Los Libertadores,
na Argentina.
Actualmente, o Porto de Valparaiso tem um trânsito de 5,1 milhões de toneladas, 320.000 TEU’s; o trânsito
principal é a fruta (1,2 milhões de toneladas) e em 2004 verificou-se um crescimento na ordem dos 20%.
Houve também um crescimento na ordem dos 141% no mercado dos cruzeiros. O Porto de Valparaiso tem
uma ocupação anual a rondar os 44%; durante a época alta (Março), a taxa de ocupação chega próximo dos
80%. Existe um tempo de espera em média por embarcação de 1:15 h.
Existe um problema muito grande que é a falta de espaço; temos de ser muito eficazes na utilização do pouco espaço de que dispomos. Juntamente com o terminal concessionado existe na parte central um terminal
não concessionado que se encontra localizado dentro da cidade; e um outro concessionário privado para
um terminal de passageiros.
O porto inclui várias áreas operacionais muito limitadas mas tem um desenvolvimento de alta eficácia; actualmente, por exemplo, temos em média um rendimento próximo dos 50 contentores por embarcação
e quanto ao máximo rendimento tivemos índices próximos dos 80 contentores por embarcação. Quanto
ao crescimento da operação portuária em termos de eficácia este cresceu nos últimos quatro anos mais de
200%; a filosofia por trás desta constatação é que devido ao problema de espaço, os contentores têm de
estar o mínimo de tempo possível no porto.
Quando a cidade cresceu, cresceu à volta de toda a actividade portuária; actualmente assegura uma considerável vertente portuária, com forte impacto na criação de postos de trabalho e a nível económico local. No início
do séc. XX, a taxa de emprego era superior a 60% estando todas as actividades centradas na zona portuária.
Houve uma alteração do eixo do comércio externo; já não era preciso dar a volta pelo Estreito de Magalhães
mas sim aproveitar o Canal do Panamá.
Começaram a aparecer várias tendências centralistas no Chile e a indústria na cidade de Valparaiso deslocou-se para a capital Santiago; começámos a verificar importantes aumentos ao nível do congestionamento
na actividade portuária sem esquecer as alterações provocadas devido à utilização de novas tecnologias no
sector dos transportes.
O porto continuou a manter a sua importância como infra-estrutura portuária mas com uma influência menor a nível da economia local e da cidade, tendo vindo a perder o seu encanto para os cidadãos locais, que
estão a afastar-se progressivamente.
Um olhar comparativo com o passado leva as pessoas a perceber que os benefícios que recebiam já não se
Novos Poderes Institucionais para Ultrapassar os Antagonismos “Cidade/Porto”
verificam no presente. Como é que podemos inverter esta situação? A solução reside na complementaridade entre a cidade e o porto.
Todos nós sabemos que para o desenvolvimento de uma cidade portuária são precisas determinadas condições: têm de haver portos de abrigo, águas profundas, acessibilidades, tecnologia, boas relações de trabalho,
boa gestão operacional, comercial, ambiental e a nível da segurança; tudo isto para que exista concorrência
a nível dos portos de forma a criar benefícios e a melhorar a produtividade e a eficácia.
Para o porto se desenvolver tem de conseguir alcançar o apoio logístico da cidade; existem serviços financeiros e culturais, qualidade de vida garantida, sobretudo a nível da segurança, do ambiente e do lazer, e que
haja criatividade. Para que o porto se consiga desenvolver precisa do apoio da cidade. Não deveria haver
esta contradição entre os objectivos do porto e os objectivos da cidade; cidade e porto deveriam trabalhar
em conjunto.
Os aspectos mais negativos provocados pelo porto na cidade são o congestionamento, a poluição e a estética. Os portos não devem apenas ser núcleos industriais no coração da cidade - do ponto de vista estético
o porto não está em sintonia com as vontades urbanísticas da cidade.
Tem de haver actividade económica para que possamos criar os postos de trabalho necessários; sabemos
que os portos estão a criar cada vez menos emprego, mas à volta de todas estas actividades devem ser
criadas outras actividades interessantes para a cidade.
Não deve haver limite para o cidadão comum ao nível da utilização da orla costeira, um bem escasso.
Embora tenhamos uma costa de cerca de 4.000Km, não podemos estar sempre a construir portos porque
as condições nem sempre são propícias. Para o desenvolvimento portuário futuro existem limitações materiais ao nível do acesso à orla costeira por parte da população.
Assim, surgiu um novo conceito de porto: Criação de um centro de negócios; com Inserção na cadeia logística
– pensamos que aumenta muito o rendimento quando conseguimos coordenar as actividades do centro
gerador de carga; desta forma podemos reduzir a quantidade de camiões que se deslocam para o porto;
Utilização das tecnologias de informação para o transporte dos contentores.
A relação cidade-porto é a chave para o desenvolvimento do porto como centro de negócios; tem que
existir um ciclo harmonioso entre a concorrência portuária e o desenvolvimento urbano; o novo conceito
de gestão portuária é a administração de um espaço da orla costeira com alto valor económico, cultural e
de recreio.
Assim, o nosso objectivo foi abrir o porto à cidade, à sua orla costeira, em harmonia com o desenvolvimento
portuário. Aqueles que pensam que é possível abrir a orla costeira diminuindo ao mesmo tempo a actividade do porto, em nossa opinião estão a cometer um grave erro, porque a abertura da orla costeira para o
cidadão exige as actividades que o próprio porto gera; devemos, por isso, pôr fim ao antagonismo entre a
cidade e o porto.
Como é que podemos enfrentar este desafio? Criando áreas de expansão futura – o Chile não conta com
espaços marítimos naturais para expandir a capacidade dos seus portos. Para resolver os problemas de espaço o porto tem que ser construído fora da zona portuária; foi criada uma zona extra portuária de actividades
logisticas que irá permitir aumentar a superfície operacional do porto de 36ha para 82ha.
Gerando novas acessibilidades – para nós é extremamente difícil desenvolver a ligação a esta zona através de
caminho-de-ferro, por isso vai ser realizada uma obra para fazer a ligação viária; o acesso a Valparaiso não
será feito pela cidade, mas pelos arredores. Esta acessibilidade é importante, não apenas para o porto, mas
também para a cidade, fora da parte mais elevada da zona montanhosa, ou seja, haverá uma zona muito
alargada de acesso a Valparaiso e também uma zona residencial, etc.
Paralelamente a isto foram efectuados investimentos através de concessões privadas para melhorar a Estrada
68, a sul; esta estrada vai assegurar um novo acesso ao porto.
Desenvolvimento do porto através das novas tecnologias, optimizando as infra-estruturas e atraindo investimentos para a zona portuária; a certificação advém das normas ISO 9001, ISO 14001 e do código ISPS.
Incentivos à participação das companhias privadas – são necessários investimentos para criar novas actividade,
melhoria da tecnologia e aumento da capacidade. O investimento mais recente foi um investimento privado
para a criação de um terminal de passageiros.
Levar a cidade a aproximar-se à orla costeira – os nossos cidadãos têm de voltar a recuperar o entusiasmo que
tinham pela orla costeira; a estratégia escolhida consistiu na realização de vários eventos.
Procurar o acordo entre os representantes das cidades - foi criado um conselho de desenvolvimento da orla
ATELIER 3
Valparaiso
61
costeira com o objectivo de incentivar, promover e facilitar as acções e as obras que irão confirmar o projecto de desenvolvimento da orla costeira da cidade de Valparaiso.
Desenvolvimento de iniciativas concretas de curto prazo – estas iniciativas tiveram um forte impacto na requalificação da área; uma delas foi o passeio pedestre do Molhe Baron, uma zona que já não é utilizada para as
actividades portuárias mas que permite olhar para a cidade através do mar.
Vista da cidade de Valparaiso
Vela
Infra-estruturas para desportos náuticos
Também demos início a projectos para a criação de infra-estruturas para desportos náuticos; é óbvio que o
desporto principal nesta zona deveria estar relacionado com o mar, dispondo de uma infra-estrutura pública
para que os cidadãos pudessem praticar os desportos náuticos, mas no Chile existem apenas clubes desportivos privados; este será o primeiro caso de investimento público no sector de desportos náuticos.
Preparação do desenvolvimento de longo prazo acoplado ao plano director da orla costeira, existem vários
objectivos; temos de criar novas oportunidades e atrair os cidadãos e novos visitantes para conseguir obter
financiamento através dos investidores privados.
Os investimentos directos no Porto de Valparaiso ascendem aos 260 milhões de dólares e os investimentos
indirectos (os acessos, por exemplo) ascendem aos 1.000 milhões de dólares.
O modelo de negócios para o projecto da orla costeira baseia-se em: 19ha que são fornecidos pela Empresa
Portuaria Valparaiso; É necessário escolher um investidor privado; Existem três tipos de contratos a serem
realizados: em sociedade, através de concessões ou pelas vendas no sector imobiliário; Garantimos ao investidor estabilidade das regras para o investimento; O espaço a ser construído deve garantir à cidade livre
acesso aos cidadãos; Estão previstas novas infra-estruturas: na área da cultura, hotéis, comércio, terminal de
passageiros, parques de estacionamento, habitação, escritórios, etc. No período de construção deverão ser
criados 3.400 postos de trabalho e no sector operativo 2.200 postos de trabalho em igual período, com
um rendimento de 10 milhões de dólares por ano; relativamente ao município 3,2 milhões de dólares. É
precisos criar um ciclo harmonioso duma maior actividade turística e de envolvimento da cidade no desenvolvimento dos seus projectos portuários.
Novos Poderes Institucionais para Ultrapassar os Antagonismos “Cidade/Porto”
Em conclusão insisto na ideia de: Existência de um ciclo harmonioso entre a competitividade portuária e o
desenvolvimento urbano; Existência de um compromisso claro do porto de Valparaiso para desenvolver
este projecto; Para haver o desenvolvimento da orla costeira é necessário que a cidade cresça de uma
forma integrada e não como um local isolado; O processo de abertura da orla costeira envolve uma forte
componente participativa dos cidadãos; Realização de grandes esforços para criar as condições de atracção
do investimento privado e para convencer os cidadãos de que este é um projecto com condições para se
desenvolver. ❘❙❚
ATELIER 3
63
Cidade/ Porto - Estratégias
Diferentes num Projecto Comum
Os principais operadores marítimos mundiais tentam, hoje em dia, impor estratégias de
desenvolvimento às cidades e a todas as zonas portuárias do mundo. Para assegurar o desenvolvimento sustentável das cidades portuárias e ao mesmo tempo permitir o desenvolvimento das funções portuárias é importante que haja negociação e diálogo permanente entre os
cidadãos, os representantes dos cidadãos e os operadores internacionais. No fundo, trata-se
de, e esta poderá ser uma das soluções, encarar a questão do porto e da cidade como um
objectivo ambicioso comum a todos os intervenientes.
Neste painel pretende-se compreender, por um lado quais são os objectivos e as preocupações do ponto de vista do porto - o porto na sua relação directa com a cidade, em termos
de modernidade e de competitividade e, por outro, compreender quais são os objectivos da
cidade e qual é a mais valia que o desenvolvimento do porto pode trazer à cidade. Trata-se
de tentar desenvolver uma relação tripartida entre a cidade, o porto e as empresas, de modo
a que a cidade possa beneficiar do porto e o porto da cidade, através de um objectivo claro
de diálogo entre as três entidades. ❘❙❚
SESSÃO II
Ana Teresa Vicente
Vice-Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa,
Portugal
Presidente da Mesa
Intervenções de
Antoine Rufenacht
Presidente da Câmara de Le Havre, França
Jean-Pierre Lecomte
Presidente do Porto Autónomo de Le Havre, França
Competitividade e modernidade:
desafios cruzados para a cidade
e para o porto de Havre
Estaleiro do Port 2000
Esta apresentação tem quatro vertentes: Um forte crescimento do tráfego de contentores; Extensão da capacidade
portuária e mudanças de escala; As recomposições no perímetro portuário; As expectativas territoriais para o porto.
Apesar do forte crescimento do tráfego internacional de contentores, em Le Havre a quantidade movimentada no ano passado foi menor que em alguns portos da Europa. Situação que, se por um lado nos limita,
por outro aumenta as nossas ambições.
Apesar de tudo, começamos a recuperar do atraso que tínhamos, como se pode ver pela taxa de crescimento do tráfego de contentores. A sua duplicação é muito importante para a nossa política de desenvolvimento,
questão que já nos preocupa desde 1996. Assistimos, como a maior parte dos portos, a uma extensão das
suas capacidades, mas também a uma alteração de escala.
Com o projecto Port 2000, a nossa estratégia, que representa 10% do mercado continental, vai obrigar a
duplicar novamente o desempenho em termos de contentorização nos próximos anos.
Para esse efeito tivemos de pensar na construção de um novo porto cujos trabalhos terminarão dentro de
oito ou nove meses; esperamos que em Fevereiro de 2005 as infra-estruturas sejam entregues aos operadores. Podemos verificar que estas extensões não tocam na cidade; desenvolvem-se no próprio Rio Sena
em abertura total para o oceano.
Os terminais actuais têm cerca de 1,5 milhões de TEU’s, com o Port 2000 teremos mais 3,5 milhões de
TEU’s e esperamos que em 2006/2007 a nossa estratégia venha a representar 5 milhões de TEU’s.
O estaleiro do Port 2000 integra o porto actual com depósitos de petróleo e de contentores e a cidade de Le Havre.
Qual a base do Port 2000?
Abordagem local – começámos por organizar localmente um debate público sobre a legitimação e a metodologia à volta do projecto; Abordagem nacional – depois do projecto ter sido acolhido localmente foi alargado
ao âmbito nacional e aceite como uma iniciativa de interesse global; Abordagem ambiental – engenharia
portuária ao serviço da restauração do estuário; Abordagem económica - a região de Le Havre é muito
importante em termos económicos e sociais, daí a necessidade de aproveitar o desenvolvimento portuário
para promover o crescimento da economia a longo prazo, aspecto muito importante para a cidade. Neste
contexto, entende-se a elaboração de parcerias entra a cidade, os agentes económicos, o porto, etc.
Fizemos novas alianças para nos adaptarmos às novas parcerias com os operadores marítimos, numa base de
estabilidade e de continuidade no tempo, de modo a permitir uma atitude reactiva em tempo útil.
Procedemos, por um lado a uma certa adaptabilidade dos nossos processos, tentando no ordenamento a
longo prazo introduzir convenções para a exploração dos terminais em parceria com os operadores de transporte marítimo; neste cenário existe a noção da exigência de níveis de qualidade segundo critérios europeus
assentes em compromissos relacionados com o tráfego. Quer isto dizer que, quando acabarmos de construir
o Port 2000, o seu modelo organizativo e gestionário já estará assumido com os parceiros envolvidos.
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
SESSÃO II
Docas Vauban – Complexo de Cinemas
As pressões sobre a organização espacial do porto exercem-se sobre: Ambiente – introdução de uma componente ecológica na engenharia portuária, dadas as condições favoráveis existentes no estuário, em contraste com outros territórios ecologicamente frágeis, que no custo total do projecto representa um investimento
de cerca de 5%; Riscos industriais – reforço das exigências industriais em matéria de prevenção de acidentes,
no respeito por padrões tipo na organização espacial, nomeadamente no que diz respeito a urbanizações;
Segurança e Protecção – crescente encerramento dos espaços portuários ao público.
No que diz respeito à inserção territorial surgem algumas questões pertinentes: Como compatibilizar a duplicação na ocupação do espaço com a expectável triplicação do tráfego no horizonte de 2012? - isto vai exigir
uma nova organização na estrutura portuária. Quais as lógicas de localização espacial e de racionalização da
vertente do emprego ligado ao porto? – em 2002 já tínhamos mais de 15.000 empregos portuários, dos quais
cerca de metade estão localizados em meio urbano.
Quanto às actividades logísticas, sobretudo no que diz respeito à circulação dos veículos pesados, elas encontram-se implantadas mais para leste, deixando livres os bairros urbanos do centro da cidade.
Le Havre tem uma situação excepcional; estamos numa fase de duplicação da nossa capacidade, tentando
assegurar o desenvolvimento urbano e favorecer a interface entre a cidade e o porto.
A modernização do porto é também um ponto de partida para a renovação urbana e económica; 800ha de
terreno, sobretudo nos bairros do sul, beneficiam de um programa de planeamento urbano, dinamizado
com grande competência pelo Porto Autónomo de Le Havre.
A cidade apoia-se fortemente numa parceria de coordenação, entre o porto, a Câmara de Comércio e
Indústria e as autoridades locais. A estratégia prende-se com a valorização do litoral e do respectivo desenvolvimento económico, comercial, logístico, geográfico, histórico, urbano e humano, afirmando o carácter
portuário da cidade e das suas actividades; isto poderá ser válido para turismo, o lazer e a cultura, sem esquecer os projectos de valor económico que foram inseridos tendo em conta todas as interfaces portuárias.
Integradas neste programa de recuperação urbana e de ordenamento do espaço público estão diversas
infra-estruturas, incluindo um parque automóvel, um parque de desportos de Inverno e intervenções na
parte histórica da cidade.
Da série de projectos previstos vamo-nos deter, sobretudo, em dois deles:
Les Docks Vauban foram construídas de acordo com o modelo das docas do séc. XIX; fazem parte de um
património – 60.000 m2 - de grande qualidade, cedido pelo porto à cidade, que será restaurado como
centro comercial e onde apenas existirão ruas pedonais. Tudo pensado com o objectivo de dar uma nova
imagem da cidade e do porto de Le Havre.
Pretende-se acolher um grande número de turistas na região. Este programa prevê a construção de um parque de 10.000 m2 com uma floresta tropical, locais para desportos náuticos, cafés, discotecas e um complexo de cinemas com 12 ou 14 salas. A operação está em curso e tudo estará concluído até ao final de 2007.
É um projecto ambicioso, que depois de terminado poderá receber mais de 1 milhão de pessoas por ano.
Construímos também um Centro de Mar na fronteira entre a cidade e o porto, símbolo de arquitectura
internacional, cuja ambição é associar, em simultâneo, traços de modernidade contemporânea e a ancestral
navegação marítima, a competência técnica do nosso porto, a caracterização industrial e económica do estuário, bem como o desenvolvimento das zonas litorais e a sua relação com as actividades económicas que
estão concentradas nesta zona costeira.
Docas Vauban
67
O desenvolvimento sustentável é uma questão essencial e, por isso, é necessário ter em conta todas as
alternativas e atender às prioridades dos vários agentes envolvidos.
O arquitecto escolhido, Jean Nouvel, propôs-nos um projecto bastante ambicioso: duas plataformas sobrepostas, uma de 1.000 m2 com 45 m de altura e outra, num plano superior, de 2.000 m2 com 95 m de altura,
numa estrutura metálica, em forma de torre. Este edifício é um exemplo de modernidade que caracteriza a
cidade de Le Havre, exemplo de desenvolvimento sustentável e duradouro, que são traços essenciais para
o séc. XXI. ❘❙❚
Intervenções de
Connie Bacon
Secretária da Comissão do Porto de Tacoma, EUA
Bill Baarsma
Presidente da Câmara Municipal de Tacoma
Tacoma, uma cidade acolhedora
e dinâmica com um porto
de nível internacional:
equilíbrio delicado
para um êxito partilhado
Tacoma e o porto
A cidade de Tacoma situa-se no Noroeste dos EUA, no Estado de Washington, uma verdadeira porta aberta
para o Pacífico, com grandes e belas montanhas à nossa volta – incluindo o famoso Mount Rainier.
Para mostrar a importância da parceria entre a cidade e o porto, vamos falar da história, do trabalho, dos
planos e das estratégias futuras para o crescimento de um porto de sucesso numa cidade revitalizada.
Os primeiro viajantes provinham da Europa e da América, procurando uma vida mais próspera. Na verdade,
as raízes da nossa cidade eram económicas. As pessoas deslocavam-se para o Oeste à procura da riqueza
dos recursos naturais que a fronteira oferecia - lenha, terras agrícolas férteis, carvão, pesca – até ouro, a Este
do nosso Estado.
Trinta anos antes de os caminhos-de-ferro chegarem à cidade, o transporte de uma carga de madeira para
S. Francisco foi o primeiro serviço prestado à região por uma companhia de navegação. Isso aconteceu há
150 anos, em 1853. Em 1888, depois da recuperação parcial do terreno de baixios, que permitiu aumentar
a profundidade do canal, foi criada a maior empresa de tratamento de madeira de Tacoma, que passou a ser
considerada como a capital mundial da madeira.
Há mais de 100 anos que a cidade de Tacoma está relacionada com a actividade do seu porto. A ligação
ferroviária ao Porto de Puget Sound elegeu a cidade como um grande foco do comércio nacional e internacional. Nessa altura, Tacoma era maior que Seattle.
A ligação intermodal transformou-se numa parte essencial do sucesso do Porto de Tacoma, desenvolvendo
um nicho de mercado na área dos transportes para fazer face às necessidades dos seus clientes.
O serviço trolley, que começou em 1914 para levar os trabalhadores dos baixios para os seus postos de
trabalho, transformou-se, anos mais tarde, num ramal de caminho de ferro de transporte de mercadorias da
área do porto para as principais linhas ferroviárias.
Hoje em dia, a Tacoma Rail – que é propriedade da cidade – é uma das maiores companhias ferroviárias de
pequeno curso dos EUA e uma parte crítica do sistema de transportes intermodal do porto.
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
Em 1873, quando a Northern Pacific Railroad escolheu a cidade de Tacoma em vez de Seattle ou Port Townsend, fizeram-no devido a vários factores: na Baía de Commencement podiam atracar mais de 50 navios ao mesmo
tempo; a baía tinha profundidade para qualquer tipo de navio; havia muitas milhas de zona ribeirinha que permitiam
alargar as docas para utilização futura; a terra era abundante, podendo-se dragar a baía um custo reduzido.
Mas, sendo os caminhos de ferro os donos das companhias de navegação, os habitantes de Tacoma queriam
ter uma palavra a dizer nas actividades do porto. A população queria um porto público, controlado localmente. A 5 de Novembro de 1918, os cidadãos votaram numa base de 5 para 1 pela localização da gestão
do porto de Tacoma. Depois disso, os eleitores aprovaram uma emissão de obrigações de 2,5 milhões de
dólares para ajudar ao planeamento do porto e na construção de infra-estruturas. O nosso primeiro plano
incluía 97ha de terrenos na zona de baixios de Tacoma.
O porto continuou a alargar o seu espaço de intervenção nas décadas seguintes. Em 1940, estabeleceu o
Industrial Development District - e aumentou o número de hectares que possuía. Atraiu empresas como
a Kaiser Aluminum, Philadelphia Quartz and Ohio Ferro Alloys. Mesmo durante a Grande Depressão e a II
Guerra Mundial, quando o tráfego de comércio marítimo baixou até 90% do normal, o porto concentrou-se
em atrair novas empresas para a zona de baixios.
Durante 85 anos da nossa história, a propriedade da terra foi uma parte crítica da estratégia de sucesso do
porto. Hoje em dia, o porto possui 810ha na área industrial dos baixios.
A construção de um nicho de transporte intermodal e a modernização do sistema de cargas, também desempenharam um papel importante no sucesso do porto e dos negócios que lhe estão associados. Melhorámos assim a mobilidade e as condições de trabalho no Estado que serviu de estímulo para a criação de um
modelo de cooperação na área do transporte modal.
Desde meados dos anos 90, o governo local associou-se às companhias ferroviárias e ao departamento de
transportes do Estado para financiar projectos no valor de 400 milhões de dólares. Estes projectos destinamse a separar o tráfego rodoviário do ferroviário, melhorando a eficácia dos nossos clientes e criando estradas
mais seguras para os cidadãos.
Através de outra parceria regional chamada Regional Access Mobility Project, estabelecemos prioridades para
os transportes locais, que também foram adoptadas regionalmente. Reunimos empresários, trabalhadores
e governo para falar a uma só voz com as autoridades federais sobre os projectos de transportes de cuja
implementação dependia o nosso sucesso. Só assim foi possível conseguir, não só financiamento adicional,
mas também prioridade ao financiamento disponível através das autoridades locais participantes.
Trabalhámos muito para fazer outros melhoramentos. No início dos anos 80 fomos pioneiros nos ramais
ferroviários nas docas, que tornam o serviço muito eficiente, atendendo ao facto de mais de 70% da mercadoria oriunda do estrangeiro chegar, pouco tempo depois, a Chicago e Nova York. Estas facilidades poupam
às nossas companhias de navegação tempo e dinheiro.
SESSÃO II
69
Associada ao êxito do Porto de Tacoma – que tem atraído cada vez mais empresas de todo o mundo - a
cidade expandiu os seus horizontes. Passámos de cidade provinciana a centro mundano, abraçando a nossa
herança marítima e celebrando-a devidamente. Transformámos um passado industrial devidamente reconhecido num factor chave para o nosso desenvolvimento futuro.
Em 1991, a Câmara Municipal decidiu comprar 10,5ha de terrenos no outro lado da baía, uma das zonas
mais poluídas da Nação; o ambiente tinha pago um elevado preço pelo passado industrial de Tacoma, levando o porto e outras entidades a desempenharem um papel importante na limpeza da zona ribeirinha, que
antecedeu a sua transformação numa área para investimento privado - Foss Waterway Development Authority.
Um terreno industrial ao lado do porto foi transformado num espaço aberto onde existem museus de dimensão mundial - como o Museum of Glass, desenhado pelo arquitecto Arthur Erickson, e a Chihuly Bridge
of Glass – que ligam o porto ao centro urbano, galerias de arte, apartamentos, comércio, percursos públicos
e belos espaços abertos ao longo da zona ribeirinha. Para encorajar a revitalização desta zona urbana, a
cidade investiu 2 mil milhões de dólares nos últimos cinco anos.
Outro símbolo do passado industrial de Tacoma é a renovada fábrica Alber’s Mill que agora dispõe duma
galeria de arte junto ao Museum of Glass.
Museu do vidro
Metro de Superfície
Centro de Convenções
Relativamente à nossa história ferroviária, nos finais dos anos 80 conseguimos renovar a estação central. Ao
lado situa-se o Washington State History Museum e o novo Tacoma Art Museum. Do outro lado da estrada,
encontra-se a University of Washington Tacoma campus e o Tacoma Institute of Technology, numa zona
onde, em vez de se deitarem abaixo prédios antigos, procurou-se recuperá-los com a ajuda do porto. Existe
uma ligação psicológica e física entre o centro da cidade, a área cultural e a zona ribeirinha – chamada Esplanade - um paredão onde se pode gozar momentos de lazer, passear ou ver os navios chegar ao ponto de
atracação. Para facilitar a vida a toda a gente dispomos do primeiro metro de superfície da região - o Tacoma
Link. É gratuito e faz lembrar os trolleys da primeira era industrial de Tacoma, que levavam os trabalhadores
para os seus postos de trabalho nos baixios.
Nos últimos 10 anos tivemos um desenvolvimento muito acentuado e, em breve, teremos mais um exemplo disso, com a edificação do Tacoma Convention and Trade Center. Um investimento de 89 milhões de
dólares com capacidade para atrair à cidade 275 mil visitantes por ano.
Tendo em vista um novo capítulo do nosso desenvolvimento económico futuro, Tacoma concentra-se em
atrair empresas para as áreas urbanas e em alargar essa revitalização a todos os bairros à volta do centro. Foi
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
devido a estas preocupações que a cidade recebeu o The Washington, D.C.-based Partners for Livable Communities, em Abril, um galardão atribuído por ser um dos locais dos EUA mais agradáveis para viver.
Tacoma é uma cidade de futuro, sem esquecer o seu porto que durante 85 anos desempenhou um papel
muito importante no desenvolvimento económico da cidade.
O porto continua a crescer e é o motor económico da região. Somos o quinto porto de contentores da
América do Norte e estamos a reforçar a nossa posição como o principal porto no Noroeste do Pacífico.
O comércio trans-Pacífico contribuiu para o aumento do volume de comércio de 12% em 2003, conseguindo o porto de Tacoma ultrapassar o crescimento comercial de todos os portos da costa ocidental
em 18,2%.
Também investimos muito. No ano passado, mais de 106 milhões de dólares em projectos ambientais
e de construção, entre os quais se encontra o novo Evergreen Terminal, que é um dos maiores projectos
da nossa história, exemplo de capacidade de realização e de boa gestão orçamental. Este terminal com
171 acres, custou 210 milhões de dólares, e vai ter uma capacidade para tratar de 840.000 contentores
por ano, para além dos restantes projectos que desenvolvemos nos outros terminais. O projecto criou
mais de 1.600 postos de trabalho na área da construção e quando começar a operar absorve mais 900
empregos.
O Porto de Tacoma é também uma porta aberta para o comércio com o Alaska, que representa 30% dos
contentores movimentados no porto. Na realidade, mais de 70% dos bens consumidos no Alaska passam
pelo Porto de Tacoma. Outros desenvolvimentos recentes incluem a abertura de uma nova área para rollon/roll-off que poderá movimentar 185.000 veículos importados por ano.
Todos estes projectos de investimento estão a criar milhares de postos de trabalho na área da construção
- mais de 28 mil postos de trabalho novos na nossa área e cerca de 102 mil em todo o Estado - e a injectar
milhões de dólares na região. A nossa contribuição económica é importante para a região – paga as escolas,
os parques, os transportes e outros melhoramentos que a tornam muito agradável.
De todas as perspectivas em equação, estamos a avançar com a construção do terminal intermodal mais
eficiente da América do Norte e a primeira porta de saída da América para a Ásia.
O porto concentra-se no desenvolvimento económico, mas a cidade tem uma missão mais vasta. Enquanto
aquele fornece serviços na área do comércio marítimo e traz benefícios económicos para a comunidade, a
cidade está vocacionada para satisfazer as necessidades da população – segurança, serviços sociais, serviços
de cultura, infra-estruturas, assim como para promover o desenvolvimento económico local.
A Câmara Municipal de Tacoma e a Comissão do Porto estão a trabalhar em conjunto, o que nos vais ajudar
a produzir melhor e a colaborar mais no futuro, no sentido de: Desenvolvimento económico – da nossa comunidade; Transportes – para tratar das necessidades de transporte no Estado; O outro lado da baía – temos
um plano conjunto para East Side of the Foss.
O desenvolvimento económico neste lado da baía foi um sucesso, como se constata pela procura que a
cidade tem tido. Naturalmente que há também pessoas interessadas noutras zonas, por isso estamos abertos
a explorar oportunidades para toda a baía em sintonia com o porto, de modo a garantir que as soluções
adoptadas são as mais adequadas.
Muitas cidades como Tacoma têm a sua história associada aos centros industriais – uma imagem que residentes e políticos querem mudar. A vida política local desempenha um papel importante nessas mudanças
mas, infelizmente, os interesses das grandes empresas de navegação não facilitam a sua participação ao nível
do quadro de decisões.
Os acordos que existem para proteger o porto de actividades indesejáveis para o seu funcionamento, como
o ruído e o tráfego de camiões, ao lado de zonas residenciais, podem ser postos em causa pelo partido
que ganhar as próximas eleições, funcionando esse facto como condicionante da capacidade de decisão das
autarquias nesta matéria.
Em Tacoma, estamos todos entusiasmados com o desenvolvimento da zona costeira mas, ao mesmo tempo, é preciso garantir que isso não vai retirar o estilo de vida e o movimento do centro urbano.
Compreendemos que estas mudanças são extremamente encorajadoras, mas queremos garantir que o
porto e a cidade trabalham em conjunto para gerir o entusiasmo popular e a elaboração de um planeamento urbanístico consensual. Trabalhando com a cidade, queremos continuar a encorajar o crescimento e a
qualidade do emprego, para que não apareçam postos de trabalho mal pagos, num quadro de decisões que
comprometa o futuro.
SESSÃO II
71
Tacoma
Aprendemos as nossas lições olhando para as experiências pouco conseguidas noutras cidades. Muitas vezes, os
portos sentem-se atacados pelas cidades. Mas a nossa Câmara Municipal reconheceu que o Porto de Tacoma é
muito importante para a cidade e para a região. É por isso que queremos tratar articuladamente das políticas de
desenvolvimento, antes que se transformem num problema prejudicial à comunidade e à nossa região.
Há interesse local, regional e nacional para que os nossos portos consigam funcionar com uma eficácia
cada vez maior no tratamento do comércio que chega do exterior, prevendo-se um aumento de 50% nos
próximos 10 anos. Temos de ter coragem para falar com a indústria e com as comunidades sobre os nossos
recursos limitados. Temos que sensibilizar os utentes para a importância do seu esforço fiscal. Precisamos
que a comunidade marítima participe nas políticas locais.
Estabelecemos comités em três áreas-chave – desenvolvimento económico, transportes e desenvolvimento
da baía - East Side of the Foss Development, que reúnem regularmente para tentar antecipar problemas e desenvolver soluções em parceria. Há três vertentes em que estamos a trabalhar para alcançar este objectivo:
Um planeamento urbano e industrial bem definido graças ao trabalho desenvolvido com a Câmara Municipal, o
que permite ao porto demonstrar o que são utilizações transitórias apropriadas no interface porto/cidade.
Mudar o padrão de transporte da saída dos baixios para minimizar os efeitos das zonas industriais nas zonas
urbanas. Desvio do tráfego do interior do porto, mas há a preocupação por parte da Câmara para saber de
que forma isso vai restringir a acessibilidade. O porto tem comprado terrenos para que não haja especulação
imobiliária no período de transição, na área entre o porto e a zona envolvente..
O Porto de Tacoma propõe-se trabalhar com os seus clientes e continuar a expansão de modo a manter
a posição de líder no comércio mundial. Reconhecemos também que fazemos parte de uma comunidade
mais vasta e que temos de trabalhar em conjunto com as autoridades locais para garantir que a revitalização
económica seja uma realidade concreta.
É verdade que vamos ter que chegar a compromissos em relação à utilização dos terrenos, sabendo-se que.
todas as cidades ribeirinhas querem aproveitar os espelhos de água, não só por razões económicas, mas
também para benefício dos cidadãos. Por isso, os portos têm de trabalhar com as autarquias na identificação das prioridades e no planeamento das áreas de transição entre as zonas residenciais e as necessidades
industriais dos portos.
Estamos conscientes que temos pela frente um trabalho longo e difícil, mas se não o assumirmos iremos
pagar um preço demasiado elevado pelo insucesso, tanto para o porto, como para a cidade e para os nossos
cidadãos. ❘❙❚
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
SESSÃO II
Se o fenómeno urbano é actualmente indissociável de uma rede complexa de comunicações com o exterior,
tempos houve em que essa rede se reduzia aos caminhos da água, quando só estes uniam e a terra separava. Por isso, as grandes cidades, enquanto processos de concentração, desenvolveram-se junto ao mar, a
grandes rios ou na sua confluência.
O rio Douro também desempenhou esse papel histórico, gerando-se na proximidade da sua foz uma
estrutura portuária para acolher embarcações de múltiplos destinos. Ancoradas a essa dinâmica portuária,
desenvolveram-se nas suas margens duas cidades – Porto e Gaia, cuja relevância é anterior à nação a que
acabaram por dar o nome, a partir dos topónimos portus e cale.
Durante séculos, o porto do Douro serviu o comércio das duas margens, com intensidade significativa no
que tocava à exportação para Inglaterra e norte da Europa (avultando como mercadoria o vinho do Porto,
entre outras) e para o Brasil, tornando-se um pólo fundamental destas trocas triangulares, além de servir um
importante comércio de cabotagem e fluvial. As duas margens do rio cobriram-se então de ancoradouros e
de estaleiros, uns mais estruturados e controlados, outros mais informais: era preciso acostar tanto os veleiros de longo curso, como as embarcações que juncavam o rio para as travessias entre as duas margens, para
o subir e descer, para a pesca ao largo, enfim, para descargas de navios que não podiam acostar e o faziam
para barcaças; por outro lado, os estaleiros eram estruturas que asseguravam a produção dos vários tipos de
embarcações, devendo sublinhar-se que desde a Idade Média o Douro era o alfobre de importantes centros
de construção que forneciam não só os particulares como as armadas reais, nomeadamente para a empresa
das grandes descobertas. As margens do rio, numa longa extensão, transformam-se então em plataformas
de actividades ligadas directa ou indirectamente à navegação.
Mas, desde os finais do século XVIII, que as dificuldades de operação no porto do Douro se tornaram muito
nítidas, dados os múltiplos obstáculos naturais e o assoreamento da barra do Douro, a que acresciam os
efeitos desastrosos de frequentes cheias, o que levantava problemas face aos novos desafios de navegação
(navios maiores, crescente intensidade de tráfego), pondo em causa as funções de metrópole regional que
o Porto desempenhava.
Não se resignando ao estiolamento da sua actividade económica, o Porto tentou prolongar a viabilidade
das suas estruturas portuárias, multiplicando os esforços para dotar de melhores condições a barra e o
canal de navegação, através de dragagens, quebramento de rochas e construção de alguns molhes. E tentou ainda dotar alguns dos ancoradouros de melhores estruturas de acostagem. Dos esforços realizados,
resultaram transformações significativas nas suas margens, com relevo para o encanamento do rio, para
o qual se ergueram muros de suporte e terraplenos em largas extensões da margem direita, ao longo
da qual se construiu a estrada marginal que hoje bordeja o rio, por ocasião da Exposição Internacional
de 1865, realizada no Palácio de Cristal. Dessas intervenções duas alteraram por completo a fisionomia
marginal: A ligada à construção do Edifício da Alfândega (1860/70), que eliminou a praia de Miragaia, erguendo-se ali o terrapleno que permitiu estabelecer não só o edifício como as ligações subsequentes, a
saber, a estrada que liga a Ribeira à estrada que se iniciava na Arrábida (desde 1790, iniciada por acção da
Companhia das Vinhas do Alto-Douro), bem como a estrutura ferroviária que passava a ligar o edifício a
Campanhã, através de um túnel, escavado em circunstâncias muito complexas para a tecnologia disponível
na altura; O aterro que sustenta o actual jardim do Passeio Alegre, inaugurado em 1888, urbanizando-se
uma área que antes estava preenchida por praia e fortes penedias, onde estava estabelecido de há muito
um núcleo piscatório que ali estabelecia as suas armações para montagem de redes, descarga de pescado,
etc. Na maré-alta, as águas circundavam o actual Castelo da Foz e aproximavam-se das casas que hoje
são fronteiras ao Jardim. Foi entre essas penedias que se verificou o célebre naufrágio do vapor Porto, em
1852. Na década de 1860, sob a orientação de Nogueira Soares, implantou-se o muro de suporte que
rectificava o alinhamento de toda a marginal, destinando-se então o aterro a funções de jardim, com as
actividades piscatórias a serem deslocadas para a zona da Cantareira, então dotada de acessos e novos
ancoradouros.
Mas, desde 1852, que a referida tragédia do Vapor Porto que, naufragou à vista de todos contra as penedias
da Foz, provocando 66 mortos, tinha estimulado o governo central a tomar medidas e a mandar oficialmente a procurar outro local apropriado para se organizar uma nova estrutura portuária, embora o processo
se desenrolasse muito lentamente. Melhorar o Douro ou criar um porto alternativo? Ou encontrar uma
solução de compromisso, que articulasse um novo porto de abrigo com o porto tradicional, através de
um canal artificial ou com o apoio de novos meios de comunicação, como o caminho-de-ferro? A foz do
Intervenção de
Emílio Brogueira Dias
Administração dos Portos do Douro e Leixões
Douro e Leixões:
um porto, várias cidades
As cheias
A barra do Douro
73
Porto de Leixões
rio Leça, em articulação com as penedias que a rodeavam, a que a tradição designava de «leixões», desde
cedo se configurou como alternativa a aproveitar, dado o abrigo natural que já constituía e que poderia ser
potenciado através da intervenção hidráulica, entretanto possibilitada em maior escala das obras pelo uso da
energia a vapor.
Num ambiente de grande tensão entre os diferentes interesses económicos e administrativos e em desespero de sobrevivência, vão multiplicar-se projectos e obras, cruzaram-se teorias e utopias, que fizeram
das experiências do Douro e de Leixões um autêntico laboratório de experiências hidráulicas ao longo dos
séculos XIX e XX, um verdadeiro banco de ensaios sobre os usos da água para funções de transporte.
Iniciada em 1884 as obras do então designado «porto de abrigo» de Leixões, hoje conhecidas como anteporto, foram dadas como terminadas em 1892, passando desde logo a receber navios que aí aportavam,
recusando-se a vir ao Douro, cuja afluência de embarcações começou a declinar.
O redimensionamento das embarcações com a revolução do vapor revelou o esgotamento das estruturas
portuárias do Douro de forma a posicionar-se nos circuitos das carreiras transatlânticas que se estruturaram
a partir dos finais do século XIX. A solução passou pela amplificação sucessiva das estruturas em Leixões,
criando docas interiores para albergar os vários tipos de navios, num processo gradual, no decorrer do qual
foi adaptado o vale do Leça a funções portuárias, e que se arrastou desde 1908 (plano de Adolfo Loureiro)
até à década de 80, com obras hidráulicas que são referenciadas como das mais notáveis da engenharia
nacional. Desde 1942, que para ali foi transferido obrigatoriamente o movimento comercial, deixando as
companhias comerciais de receber carga no Douro.
A desactivação das áreas portuárias do Douro, em que apenas persistiram algumas áreas residuais (cais
privativo da Secil - de cimentos, na margem direita, e instalações da Mobil, - para gás butano, na margem
esquerda), trouxe outro tipo de preocupações para a autoridade portuária, a APDL – Administração dos
Portos do Douro e Leixões, cuja área de jurisdição cobre toda a faixa marginal de domínio público hídrico,
que se alonga no rio Douro até 200 metros a montante da ponte de D. Luís I e se estende desde a praia de
Lavadores, em Gaia ao longo de mais de 5 km da orla marítima até próximo do farol da Boa Nova, em Leça
da Palmeira. Essas preocupações derivavam da degradação das velhas áreas praticamente abandonadas ou
com actividade residual, impondo-se a sua recuperação, no sentido de as devolver às respectivas cidades.
A isso acrescia o fenómeno muito sensível da evolução da restinga do Cabedelo na barra do Douro, que
apresenta um gradual recuo no seu posicionamento (o cabedelo está hoje cerca de 600 metros atrás do
posicionamento que ocupava há cem anos), permitindo uma mais fácil penetração do mar por ocasião dos
temporais e das marés vivas, o que levantou a necessidade de proteger as habitações da zona de Cantareira/Sobreiras, para além da necessidade de manter as condições de navegabilidade destinada ao destino
potencial do Alto-Douro e do núcleo piscatório da Afurada.
Reabilitar as áreas marginais do Douro, conferindo-lhes qualidade e dotando-as de equipamentos de lazer e
serviços, de novos postos de acostagem e de linhas fluviais de interligação, de diferentes configurações: eis
a missão recuperadora que tem vindo a ser assumida nos últimos anos pela APDL, em colaboração com os
municípios em que se integram.
Essa função não se confina, porém, ao porto do Douro desactivado, mas também ao porto de Leixões,
numa perspectiva ordenadora, tendo em conta a evolução da dinâmica portuária e as novas formas de movimentação das cargas, face à emergência da contentorização e novos processo roll on-roll off, bem como a
articulação com a zona envolvente e o seu hinterland.
Recuperar zonas portuárias como antigas oficinas desactivadas e conferir-lhes novas funcionalidades, criar
linhas de circulação no interior do porto, estruturando vias próprias nos cais de forma a separar o movimento
das áreas de carga/descarga, desenvolver ligações mais eficientes com o exterior, melhorando as acessibilidades face aos crescentes níveis de trânsito urbano, estas têm sido iniciativas também da APDL, para além
das suas preocupações essenciais de modernização do porto, na garantia da competitividade e na melhoria
das condições de operacionalidade.
Importa, então, passar em revista as principais iniciativas que no Douro e em Leixões têm vindo a ser
desenvolvidas no campo do relacionamento das áreas sob jurisdição portuária com as cidades em que se
integram.
A intervenção que culminou no arranjo urbanístico da zona de Cantareira/Sobreiras, começou a desenvolver-se por motivos de segurança (em 1979, o temporal destruiu o arruamento marginal e causou grandes
prejuízos em casas da orla ribeirinha). O recuo do areal do Cabedelo tornou essa ameaça frequente, com
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
o mesmo efeito destruidor a verificar-se em 1990. Tentando resolver a situação, a APDL criou inicialmente
(1990/91) um prisma de enrocamento com cerca de 200 metros para proteger a zona mais exposta. Em
1997, a APDL foi mais longe, lançando concurso para a construção de um novo muro de betão, apoiado
sobre o prisma de enrocamento, com o respectivo terrapleno, conquistando assim espaço ao rio e afastando
o afrontamento das marés da proximidade das casas. O terrapleno foi objecto de arranjo urbanístico, contemplando um passeio marginal em granito, pista para patins, skates e bicicletas, dois parques de estacionamento, áreas ajardinadas e outras infra-estruturas, sendo depois lançado concurso para dois equipamentos
de restauração, constituindo-se um novo espaço de lazer e de convívio com o rio.
O cais de Vila Nova de Gaia foi tradicionalmente reivindicado como uma estrutura fundamental para o
comércio do vinho do Porto. Porém, só em 1934 foi desenvolvido um plano visando um projecto de cais
e de armazéns em cimento armado, para entreposto de vinho e outras mercadorias, o qual seria realizado
por fases, à medida que se cessassem as várias licenças atribuídas a particulares que aí tinham estabelecido
rampas de madeira, sem estruturas que permitissem aos navios acostar. Só nos anos 50 se concretizaram
as construções previstas, criando-se um cais acostável com cerca de 300 metros, com um terrapleno de 3
hectares e um armazém de 2500 m2. Nos inícios de 60 estava operacional, mas uma década passada essa
estrutura ficava desactivada pelas más condições de penetração na barra do Douro e pelo difícil acesso
rodoviário, dado se inserir em plena zona urbana com características históricas, sendo então o respectivo
movimento transferido para Leixões. Dada a sua desactivação, foi utilizado parcialmente para actividades
culturais pela respectiva Câmara Municipal até 1994. A partir daí, a APDL desenvolveu um projecto com o
sentido de requalificar e rentabilizar o respectivo espaço, assegurando por um lado funções portuárias na
vertente de passageiros, de parques de estacionamento rodoviário, espaços polivalentes para a realização
de actividades culturais e desenvolvimento de actividades comerciais e de restauração que valorizassem a
ligação cidade/rio.
Foi desenvolvido um projecto de criação de infra-estruturas para dotar o espaço de condições necessárias
aos novos usos e o lançamento de um concurso (1999) para atribuição de espaços comerciais, com a respectiva construção a obedecer a um plano de conjunto da responsabilidade do futuro concessionário.
Para além disso, a APDL e a Câmara Municipal de Gaia desenvolveu a requalificação de toda a linha marginal,
iniciando-a pela zona entre o cais de Gaia e a ponte de D. Luís I, na qual foram também instaladas unidades
de restauração, também concessionadas por concurso público. Com a concretização deste projecto criou-se
uma nova centralidade em Gaia, vocacionada para o lazer e o turismo que arrasta até si um fluxo considerável de público.
Através do Programa Polis foi estendida a requalificação da margem esquerda, praticamente até à foz do rio.
A zona entre a Ponte de D. Luís I e o cais da Estiva incluído, na zona histórica da cidade e, durante muitos
anos, o único cais acostável do Douro, para além da função portuária de passageiros, ligada a barcos de turismo e de recreio no rio, tem sido objecto de uma importante intervenção, que segue os mesmos princípios
das intervenções anteriores (Gaia, Sobreiras). Verificam-se arranjos ao nível do pavimento e da criação de
infra-estruturas, o acesso ao trânsito foi condicionado, a abertura ao público e a instalação de um bar tornaram-na numa nova área de lazer e recreio, fronteira à de Gaia, com o aliciante de se inserir em pleno centro
histórico declarado património da humanidade.
Também a restante área tem vindo a ser francamente intervencionada, por programas articulados com a
autarquia, que visam a requalificação de toda esta soberba ribeira.
Estabilizar as margens e minorar impactes ambientais, bem como dar condições de segurança ao canal de
navegação na foz do Douro, de forma sustentada, para aproveitar o potencial de navegação turística da região, ao mesmo tempo que se asseguram as condições de funcionamento do núcleo piscatório da Afurada,
foram as razões que levaram a APDL a desenvolver um novo projecto, o da construção de novos molhes
destinados a conter a agitação marítima no interior do estuário. Só conhecidas polémicas relativas ao enquadramento paisagístico levantadas por parte de um grupo de cidadãos impediu que essa obra estivesse já
realizada, embora o projecto tenha sido recuperado e esteja em fase de viabilização e concerteza a obra será
uma realidade na corrente década do séc. XXI.
As intervenções recentes no porto de Leixões têm obedecido ao Plano Geral de Ordenamento e Desenvolvimento, datado de 1996, que, no seu todo, continha as seguintes linhas fundamentais de acção: Acessibilidades Terrestres; Ordenamento do Porto; Organização e Simplificação de Procedimentos; Segurança;
Formação; Política de Concessões.
SESSÃO II
Cantareira-Sobreiras
Cais de Gaia
Cais da Ribeira
Novos molhes do Douro
75
Ordenamento do Porto de Leixões
Intervenção de
João Paulo Velez
Dir. de Marketing e Comunicação da Parque Expo 98 SA
Porta-Voz do Conselho de Administração
Visita Técnica: os projectos
cidade/porto e a intervenção
urbana no «Parque das Nações»
Fixemo-nos, porém, nas duas primeiras linhas, pois foram elas que contemplaram a realização de intervenções
que vão no sentido da optimização da ligação portuária com a cidade de Matosinhos: Acessibilidades Terrestres Ter boas acessibilidades tanto do lado mar como do lado terra é condição essencial para qualquer porto prestar
um bom serviço. O crescimento de Matosinhos e de Leça conduziu a que a envolvente urbana cercasse hoje
completamente o porto de Leixões. São mais de 1500 veículos pesados, levando e trazendo mercadorias para
o porto, que diariamente conflituam com o tráfego local, já de si muito congestionado. A agravar a situação
temos no coração do porto a Gare de Mercadorias da CP, a Silopor - cereais e a proximidade da Petrogal
– combustíveis, todas gerando tráfego pesado também na ordem das largas centenas de veículos dia.
Consideramos esta situação a principal ameaça ao porto e para a resolver elegemos como projecto prioritário a construção, de uma via de acesso privativo, ao longo do vale do rio Leça, que ligará o porto à rede viária
nacional sem passar pelo interior do espaço urbano. É a VILPL (Via Interna de Ligação ao Porto de Leixões)
com cerca de 3 km e que está concluída, faltando agora que o Instituto de Estradas de Portugal conclua as
suas obras complementares, para articulação com a rede nacional, acções inseridas num projecto que foi
assumido de forma conjunta.
Ordenamento do Porto - O ordenamento do espaço portuário é essencial para o sucesso de qualquer
projecto que vise o aumento da produtividade.
Foi esta constatação que esteve subjacente à decisão de se construir, ao longo de toda a área portuária,
uma via que permitisse segregar o espaço de circulação das zonas de operação. A Via de Cintura Portuária,
concluída no ano de 2000, foi decisiva para Leixões hoje poder usufruir de um espaço particularmente bem
ordenado. E o ordenamento é um imperativo maior quando nos confrontamos com a necessidade de potenciar activos escassos, como é o caso do espaço portuário.
Para além destas intervenções estruturantes que estabelecem novas relações com a cidade, registe-se a
requalificação verificada nas antigas oficinas, que deram lugar ao Auditório e Sala de Exposições Infante D.
Henrique e ao Centro de Formação Eng.º Afonso Nogueira Soares, numa recuperação arquitectonicamente
adequada. A construção de novas vedações, para separar o porto da cidade mas ligando-os visualmente.
Estas intervenções incluem-se num projecto mais amplo que tem vindo a ser implementado por fases de renovação de toda a zona envolvente ao edifício central da APDL e das construções que lhe estão próximas.
Um novo «plano estratégico de desenvolvimento do porto de Leixões», aprovado em 2004, aprofunda os
objectivos de integração urbana, reconhecendo o facto de o porto se encontrar «encaixado» por dois núcleos urbanos de forte atracção turística, declarando: «agir no sentido de permeabilizar o porto, criar espaços
de ligação e continuidade visual com os projectos de renovação das duas marginais (Leça e Matosinhos),
relocalizar dentro do próprio porto actividades com maiores impactes directos nas pessoas, encontrar novos
espaços para ‘dar à cidade’ em torno das margens do rio Leça a montante do porto, são projectos que tornarão mais coesa a relação urbana da estrutura portuária».
Estão previstas, nomeadamente, para além de medidas relativas à operacionalidade portuária e relacionamento com os parceiros, acções de intervenção a diferentes níveis com impacto na relação urbana, tais
como: Substituição da ponte móvel com alargamento do vão; Abertura da VILPL e criação de uma portaria única;
Revitalização e reabilitação de espaços e edifícios; Incremento de espaços de sociabilidade do porto; Melhoria de
espaços de fronteira e colmatação de frentes urbanas; Implementação do parque urbano do vale do Leça. ❘❙❚
Vou fazer uma breve introdução daquilo que irão encontrar na viagem pelo Estuário do Tejo até à zona
oriental de Lisboa.
Em 1993, o Governo português decidiu criar a Parque Expo para realizar a Exposição Mundial de 1998.
O desafio era complexo: o nosso país nunca tinha organizado um evento mundial desta complexidade e
à primeira vista podia até parecer que Portugal, que é uma pequena nação com 10 milhões de habitantes,
poderia ter outras prioridades políticas.
O objectivo era duplo: por um lado, organizar uma exposição com a melhor qualidade possível, dedicada
aos oceanos enquanto património para o futuro; ao mesmo tempo, conceber um projecto urbano baseado
numa operação de renovação que fosse capaz de atrair investimento privado em larga escala.
Havia apenas cinco anos para desmantelar uma velha plataforma industrial de 330 ha ao longo de 5Km de frente
rio, que era composta pela mais antiga refinaria de petróleo de Portugal, com dezenas de tanques de armaze-
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
nagem de combustível e de gás em seu redor; incluía também um antigo matadouro industrial que servia toda
a região de Lisboa; um velho depósito de material de guerra ainda do tempo das guerras coloniais; e um aterro
sanitário que já estava com a sua capacidade esgotada e que ameaçava desmoronar-se para dentro do rio Tejo.
O projecto da Expo 98 deveria ser feito com o mais limitado investimento possível do Estado português,
como sempre acontece nestas operações. Para este fim, a Parque Expo, uma empresa pública criada pelo
Estado e pelos Municípios de Lisboa e de Loures, solicitou ao Governo da altura dois poderes especiais:
• A disponibilização de terrenos, alguns dos quais pertencentes à Autoridade Portuária;
• A concentração dos poderes administrativos neste território, para que houvesse uma única entidade com
capacidade de fazer a gestão deste processo, dados os prazos muito curtos que tínhamos pela frente.
A Expo 98 teve um êxito extraordinário, teve um número record de 160 países e organizações internacionais
presentes, foi um momento de grande afirmação em termos nacionais e internacionais, um momento de
encontro de vários países e de cidadãos que puderam reflectir sobre o mar enquanto património para o
futuro. Foi também um momento também de afirmação política muito importante que permitiu a Portugal
ter em Lisboa representantes ao mais alto nível de dezenas de nações de todo o mundo, que assim puderam
mergulhar um pouco na nossa história de quinhentos anos ligados aos oceanos, através de um debate e de
uma reflexão sobre a importância do mar nos nossos dias.
Todos os participantes contribuíram para realizar, nessa ocasião, o maior evento cultural e multimédia de
sempre, tendo como lema os oceanos. A Expo conseguiu atrair mais de 10 milhões de visitantes que puderam observar as diferentes formas como os diversos países abordaram o tema dos oceanos e assistir a 9
mil eventos culturais durante 132 dias de Expo o que, como se pode imaginar, obrigou a uma capacidade
logística muito importante e que penso foi determinante para conquistar uma certa experiência que agora
acabámos de repetir do ponto de vista organizativo com o Euro 2004.
Os trabalhos de construção, limpeza e reconversão desta zona tiveram lugar apenas durante quatro anos até
ao período Expo e no momento de maior concentração este foi o maior estaleiro da Europa, chegando a
ter 11 mil trabalhadores simultaneamente.
Foi definido desde o início um plano urbano; não interessava só fazer uma grande festa durante quatro meses
e meio, interessava que essa festa tivesse um sentido útil posterior e portanto deu muito trabalho, foi mais
difícil, mas teve de se conceber ao mesmo tempo um plano para o período Expo e um plano para o período
após a Expo. Um plano urbano que combinasse várias funções urbanas e que pudesse criar uma nova centralidade nesta zona oriental de Lisboa que durante muitos anos estava esquecida, estava abandonada como
velha plataforma industrial e de actividades, muitas das quais já obsoletas.
O modelo urbano tem uma componente importante de habitação - cerca de metade da capacidade de
construção - mas procura combinar várias funções urbanas como os escritórios, funções comerciais, de
lazer, etc., e reside precisamente nesta combinação um dos méritos maiores do projecto que foi ter sabido
equilibrar num mesmo território vários tipos de ocupação.
Os projectos foram concebidos pensando não só na Expo mas também no período posterior e houve vários
equipamentos âncora, vários equipamentos fundamentais para estruturar esta zona. O primeiro deles é o
Oceanário de Lisboa, à época o mais importante aquário da Europa, concebido segundo um projecto de
um arquitecto americano Peter Chermayeff e que continua hoje, vários anos depois da Expo, a receber um
milhão de visitantes em média por ano, consagrando-se assim como um equipamento muito importante
para a atracção não só de portugueses mas também de visitantes estrangeiros a Lisboa.
O Pavilhão Atlântico que é a grande sala de espectáculos indoor para música, desporto, convenções, congressos, etc. que Lisboa não tinha e que acolhe hoje, só em eventos com bilhete pago cerca de 500 mil pessoas
por ano e que é um elemento que tem sido, ao longo dos últimos cinco anos, extremamente importante
para colocar Lisboa na rota dos grandes acontecimentos culturais e musicais do mundo inteiro.
Uma das áreas internacionais feitas para a Expo 98 que acolheu os vários países que participaram na Expo, foi
concebida de raiz para ser depois o novo centro de exposições, a nova Feira Internacional de Lisboa (FIL);
ela é hoje explorada pela Associação Industrial Portuguesa tendo o projecto sido já feito de acordo com as
especificações técnicas do cliente final; isto foi extremamente importante para garantir o uso, para dar um
sentido a este equipamento que duplicou a capacidade da FIL, antes existente na zona ocidental.
Dado muito importante foi também o ter-se conseguido evitar um momento de paragem ou de interrupção
no projecto; verificou-se que noutros projectos de grande dimensão, após concluído o evento, havia um
período de interrupção ou paragem que é extremamente nefasto à continuação do projecto em que ele
SESSÃO II
Pré-Expo - Refinaria
Pavilhão Atlântico
77
Espaços Públicos
está inserido. Neste caso, duas semanas depois de fechar a Expo, abriu-se outra vez o espaço ao público
delimitaram-se apenas as zonas estritamente necessárias para com isso se evitar a sensação de abandono, de
deserto; no fundo mostrou-se às pessoas que aquele território não ia morrer.
A previsão inicial apontava 2010 como o ano em que terminaria a venda dos terrenos mas o ritmo de construção e a resposta do mercado foi muito superior àquilo que se pensara, isto porque já se venderam até
hoje 96% dos terrenos desta área, o que vai fazer com que em 2006 ou 2007 no máximo o projecto esteja
completado nas suas vendas.
A criação de um centro urbano com funções complementares atraiu a esta zona um ritmo de vida intenso. A
habitação é seguramente uma componente fundamental (estamos a falar de oito mil apartamentos para cerca
de 25 mil habitantes), muitas empresas já se começaram a instalar na zona, um centro comercial arrancou
logo no início do processo e ajudou também a estruturar a urbanização; seis hotéis estão previstos (três dos
quais já em funcionamento e outros três em projecto ou em construção); e existe toda uma infra-estruturação e um conjunto de acessibilidades que foi muito importante.
A Ponte Vasco da Gama é um projecto à parte, desenvolvido autonomamente, que ficou pronto um mês e
meio antes da Expo abrir as suas portas e veio fazer com que esta zona a partir desse momento se passasse
a situar no coração da Área Metropolitana de Lisboa.
Subitamente, uma zona que era vista como periférica, como algo marginal no extremo nordeste da cidade de
Lisboa, transformou-se numa área absolutamente central e aí pudemos ver a importância que teve a ponte e o
conjunto de acessibilidades na Área Metropolitana de Lisboa e também de conexão com as zonas mais afastadas.
Por outro lado, a Estação do Oriente foi a primeira grande plataforma a juntar vários modos de transporte
(metropolitano, comboio, autocarros, táxis, estacionamento para viaturas privadas), num projecto emblemático do arquitecto espanhol Santiago Calatrava e que deu também a esta zona um sentido urbano, um
sentido de integração muito forte desde o início, permitindo, logo no período da Expo, que as pessoas
chegassem à exposição através do transporte público.
Houve toda uma acessibilidade local que também foi desenvolvida no sentido de separar os vários tipos de
tráfego, a qualidade do trabalho ao nível da recuperação da frente rio que era bastante degradada e infra-estruturas modernas, de nova geração, utilizando por exemplo uma rede de galerias técnicas por onde passam
o essencial das infra-estruturas - as condutas de fibra óptica, as telecomunicações, a recolha pneumática de
lixos, a central de águas frias e águas quentes, tornando a manutenção de todas estas infra-estruturas muito
mais confortável e conveniente. Tratou-se de um investimento mais volumoso à cabeça mas que, a longo
prazo, é uma opção, que pelo menos neste caso, se revela muito adequada. Foi criado também um sistema
de controlo do ambiente com a monitorização da qualidade do ar, da água, do ruído.
Todo este conjunto de infra-estruturas e a nova relação com o rio, a redescoberta do rio Tejo, tem contribuído para atrair numerosas empresas que estão a mudar as suas sedes para o Parque das Nações.
Consequência desta operação, em cinco anos, o preço médio por m2 nesta área mais do que duplicou; passouse de uma média de 280/m2 para um valor que neste momento já é superior a 600/m2; ou seja, aquilo que por
Cidade/ Porto - Estratégias Diferentes num Projecto Comum
SESSÃO II
Estação do Oriente
muitos era visto como um local de abandono de repente transformou-se numa zona nobre, através de uma intervenção que permitiu, com estas várias funções combinadas, criar um pólo de qualidade nesta zona oriental.
Globalmente, o investimento bruto da Parque Expo em todo o projecto – incluindo a Expo 98, propriamente dita, os pavilhões, a operação da exposição e toda a infra-estrutura urbana e obra de transformação
urbana - foi de cerca de 2.000 milhões de euros. Este investimento foi feito maioritariamente através de
empréstimos bancários, com o aval do Estado português.
A contribuição líquida do Estado português para este investimento, feita quase na totalidade já depois da
Expo 98, foi de cerca de �561 milhões, ou seja, cerca de 27% do investimento global; por outro lado, a
comparticipação dos fundos europeus para as obras de infra-estruturação urbana e para os trabalhos de
descontaminação dos solos, somou 200 milhões de euros, ou seja 9,7% do investimento total.
A previsão final de receitas directas para este projecto, através das vendas imobiliárias e as receitas da exposição (ticketing, sponsors, merchandising), ronda os 1800 milhões de euros.
A renovação urbana neste caso provou ser auto-sustentável e sobretudo temos aqui um indicador macroeconómico que nos parece extremamente importante - para uma contribuição do Estado português de 561
milhões de euros, o mesmo Estado português vai buscar a este projecto, através das receitas de impostos
ao longo do desenvolvimento do empreendimento, um total de 4435 milhões de euros. Ou seja, o Estado
português recolhe com este projecto um montante quase oito vezes superior aquele que investiu aqui.
Se para o Estado o projecto é muitíssimo positivo, já para a Parque Expo o retorno não é tão bom porque
no início a maior parte do investimento teve de ser feito com recurso a empréstimos bancários e portanto
houve que suportar o custo desses empréstimos.
A capacidade de concepção, planeamento e gestão de Expo 98 ajudou a que tivéssemos, poucos anos depois, conquistado o direito a organizar o Euro 2004 e acabámos de demonstrar que esse evento também
foi um grande sucesso.
O Parque das Nações também aqui continua a funcionar como centro urbano por onde passam todas as
grandes realizações do Portugal moderno. Muitos acontecimentos pós 98 têm tido como cenário este espaço, já completamente apropriado pela população. No Pavilhão Atlântico, por exemplo, funcionou o centro
de imprensa do Euro2004 e foi também nesta zona que foi criado pela UEFA o primeiro fanpark de uma
competição, um espaço para os fãs.
A Parque Expo não terminou a sua missão, obteve um forte know-how com esta experiência, quer na organização de grandes eventos quer na requalificação urbana e ambiental que é presentemente a sua actividade.
Um factor decisivo nessa actividade de regeneração urbana é a qualidade do espaço público: a experiência da
Expo mostra-nos que para além da arquitectura, para além do design, a qualidade da intervenção no espaço
público é decisiva e é por isso que a Parque Expo está hoje em dez cidades portuguesas desenvolvendo
projectos de regeneração ambiental, colabora com entidades públicas e privadas em parceria em diversos
projectos urbanos, em vários pontos do nosso país e também no estrangeiro começa a estar envolvida em
diversas operações, ajudando sempre a transformar a utopia em realidade. ❘❙❚
79
Desafios da Valorização
do Património Portuário
Numa cidade portuária globalizada o património portuário contribui para a afirmação da sua
identidade local. Além disso, a apropriação desse referencial, não só pelos actores públicos
e privados mas também pelas populações, abre a via ao desenvolvimento e ao aparecimento
de actividades ligadas ao ambiente urbano e portuário. A sua recuperação contribui plenamente para a afirmação das competências e do saber-fazer dos sítios portuários. Reforça a
coesão local e favorece a projecção da cidade portuária no plano internacional.
Este painel tem por objectivo procurar elementos de resposta para as seguintes questões:
Que valores atribuir ao património construído na negociação cidade/porto? que lugar para o
urbano no contexto do património marítimo e do gigantismo das infra-estruturas portuárias?
Como é que a afirmação dos valores identitários veiculados pelo património portuário pode
participar na competitividade do espaço portuário? Como conservar, valorizar, mas também
assegurar a manutenção dos equipamentos portuários para novos usos urbanos? Como associar os actores privados à valorização do património da cidade portuária?
Questões que continuam sem resposta e vão ser aqui abordadas. ❘❙❚
SESSÃO III
José Dias Inocêncio
Presidente da Câmara Municipal de Alcochete,
Portugal
Presidente da Mesa
Intervenção de
Ingacio Saiz Mugica
Chefe da Área de Planeamento
e Ordenamento do Território
Ente Publico Puertos del Estado, Madrid, Espanha
O património do sistema
portuário espanhol: inventário,
conservação e novas utilizações
Torre de Hércules
Todas as cidades portuárias têm um património emblemático que a representa e que deve ser preservado,
embora, por vezes, seja necessário reconvertê-lo, transformá-lo.
No que diz respeito ao transporte de mercadorias, os portos espanhóis movimentam cerca de 380 milhões
de toneladas por ano, sendo o porto de Algeciras aquele que apresenta maior volume de tráfego total, com
60 milhões de toneladas / ano.
O sistema portuário espanhol está organizado em 27 autoridades portuárias que gerem 50 portos de carga
geral. O conjunto destes portos distribuídos ao longo dos 8.000 km de costa é o mais expressivo de todos
os países da UE. Segundo os dados disponíveis, a distribuição dos portos de interesse geral é, em média,
cerca de um porto por cada 160 km de costa.
Na minha exposição não vou falar apenas de uma cidade, mas dar uma perspectiva geral de todas as experiências e de todos os estudos realizados no âmbito das cidades portuárias espanholas.
O património histórico é algo que interessa tanto ao porto como à cidade. Representa a herança do passado
que suscita uma actuação prioritária no presente. Representa também a esperança futura na conservação da
própria identidade do espaço portuário.
Cada cidade portuária tem de manter os seus próprios valores representativos, aqueles que a distinguem das
outras e que a ligam, de alguma forma, ao passado. Nestas cidades, o património histórico vai contribuir de
forma significativa para se obter essa cumplicidade, tão necessária à fixação da identidade local. No entanto, o
património histórico portuário está sujeito a riscos de contexto que podem implicar a sua perca definitiva.
Os portos sofrem constantes mutações que os obrigam a esforços de adaptação às vicissitudes a que são
sujeitos. Neste processo, têm que ser compatíveis com vários objectivos – além da prossecução das suas
próprias metas funcionais, têm de conservar uma parte do património histórico. Como todos sabemos,
nestas transformações podem existir zonas de abandono ou degradadas a requerer renovação.
A remodelação dos espaços portuários tem sido uma clara opção colectiva para a revitalização económica
de uma parte do litoral, a que acresce a possibilidade de introduzir usos sociais nas zonas ribeirinhas – praias,
zonas de entretenimento e desportivas, actividades turísticas, etc. – de forma compatível com a actividade
comercial dos portos.
Temos de colocar a nós próprios uma série de perguntas sobre o património portuário: Qual o património que
deve ser conservado? Quais os novos usos a dar ao património? Quais os custos de manutenção do património
e quem os deve assumir? Como participam os agentes públicos e privados na conservação do património?
O património enquanto valor simbólico e emblemático de uma cidade portuária é um dos elementos básicos
dos seus activos imateriais, que deve ser devidamente aproveitado pelos responsáveis.
A legislação estabelece que as autoridades portuárias devem levar a cabo a gestão das infra-estruturas do domínio público portuário, com critérios de rentabilidade e eficácia. Desta forma, para que os portos possam tirar
partido das novas oportunidades económicas, é necessário que se maximize a valorização do seu património espaços e imóveis incluídos - convertido num dos principais activos financeiros das administrações portuárias.
É também fundamental a criação de novas fontes de investimento e o aproveitamento das vantagens competitivas. Os principais desafios no domínio da valorização do património portuário são: a realização de um
inventário seguido de decisão sobre os elementos a preservar; a execução das tarefas de manutenção e a escolha
de novas utilizações para as zonas portuárias a remodelar.
No sistema portuário espanhol temos que destacar as intervenções realizadas nos faróis - 187 faróis distribuem-se ao longo da costa, existindo um farol por cada 40 km de costa - e o património cultural das cidades
portuárias.
O mais antigo de todos é o farol da Torre de Hércules, na Corunha, que faz parte do património da autoridade portuária local, constituindo, ao mesmo tempo, uma representação simbólica daquilo que é a própria
cidade. A tradição diz que a sua antiguidade remonta à 3000 anos, tendo sido reconstruído por várias vezes.
Actualmente está integrado num museu e parcialmente aberto ao público.
A legislação em vigor admite que, com o objectivo de conservar o património arquitectónico representado
pelos faróis, os espaços de domínio público portuário poderão ser aproveitadas para funções distintas da
actividade marítima, sem condicionar a prestação dos serviços tradicionais.
Estes bens patrimoniais têm sido objecto de uma série de declarações de interesse cultural, tendo alguns
deles ascendido à categoria de monumento. Designadamente a Torre de Hércules (que foi proposta como
Património da Humanidade), os Faróis da Pechigera, em Lanzarote, e de Punta Delgada; e os cabos de Palos
e de Orchilla, para os quais foi solicitada a mesma declaração.
Desafios da Valorização do Património Portuário
O Farol de Orchilla entrou em funcionamento em 1865, conhecido por farol das rotas atlânticas dada a sua situção na
ponta mais ocidental das ilhas, é o primeiro que se vê quando se chega da rota americana para as Ilhas Canárias.
O Farol de Castro Urdiales tem pendente um projecto de centro cultural.
O Farol Aiedes na Comunidade Autónoma das Astúrias, é um exemplo de reabilitação desenvolvida por uma
autoridade portuária, destinado a tarefas de formação e ensino cultural.
Várias administrações, como as Autoridades Portuárias de Santander, Las Palmas, Corunha, Avilés, Baleares,
Tarragona e Barcelona, têm tido um papel distinto nessa matéria, aproveitando esses espaços para uso complementar à sua missão original.
Estas iniciativas foram complementadas com a associação de alguns faróis ao desenvolvimento de actividades
culturais e de ensino, turísticas e de entretenimento, estabelecendo-se critérios em função de propostas
apresentadas pelas entidades interessadas no seu aproveitamento turístico.
O projecto de investigação sobre o património cultural portuário foi desenvolvido pelo Professor Júlio Pozueta, perspectivado em duas vertentes: A análise histórica e evolutiva no sentido físico-funcional das relações entre
o porto e a cidade no conjunto dos principais portos espanhóis: Alicante, Barcelona, Bilbao, Huelva, Corunha,
Las Palmas e Málaga.
Esta investigação foi feita para um trabalho intitulado “O Porto na História das Cidades Marítimas Espanholas”,
mais tarde complementado por três publicações, cada uma delas constituindo um acervo com datas precisas
sobre edifícios e conjuntos emblemáticos, operações portuárias e ferrovias, porto e cidade, matérias que
constituem as bases de dados sobre o inventário da gestão que os portos deixaram nas cidades espanholas.
Para o efeito, foram catalogados os edifícios e os conjuntos de interesse geral para o porto e completadas
345 datas, nas quais se encontram os anos de construção, o autor, as utilizações original e actual.
Quanto às datas históricas, os portos deram números relativos às áreas e aos elementos urbanos, onde se
mostram as datas de transferência dos espaços portuários para os actuais usos urbanos. Foram catalogadas
65 operações em 19 portos de interesse geral.
Noutra base, faz-se referência à execução dos projectos de construção dos acessos das ferrovias. Estas obras
tiveram uma grande influência na estrutura urbana da cidade. Foram inventariados 17 projectos em igual
número de cidades portuárias.
Das novas utilizações, as mais visíveis nas operações históricas catalogadas relacionam-se com ruas, passeios,
praças, bairros, vivendas, uso residencial, parques e jardins, etc.
Os resultados obtidos com esta investigação aplicam-se à evolução histórica da relação entre o porto e a
cidade, onde podemos avaliar não só o crescimento do porto, mas também o desenvolvimento do próprio
porto em cada um dos casos analisados.
No conjunto das análises efectuadas, uma das conclusões a tirar tem a ver precisamente com a posição e a
função central que desempenha o porto em relação à cidade.
Como conclusão geral deste trabalho, podemos destacar: a importância quantitativa e qualitativa do património edificado urbano-portuário; a importância do património como componente essencial, às vezes emblemática,
da imagem das cidades portuárias; a capacidade de adaptação a distintas funções e actividades; a alta valorização das suas potencialidades tanto ao nível funcional, como representativo.
Nas bases de dados dos edifícios podem visualizar-se uma série de planos de cada uma das cidades portuárias, com a localização de cada um dos elementos objecto do catálogo.
Outra base de dados preparada com objectivo diferente, relaciona-se com as intervenções no porto-cidade,
caracterizadoras de diferentes períodos históricos e ilustrativas das actuais remodelações. Surgem dados
sobre o ano, o autor, a descrição e observações.
Quanto à base de dados das ferrovias, ela permitiu integrar o porto no mercado e ampliar os hinterlands,
potenciando o desenvolvimento urbano e influenciando a localização das suas actividades.
A base de dados das remodelações espanholas tem uma série de campos que se referem a elementos
como: o Plano de Utilização ou o Plano Especial, os acordos, contratos, concursos, concessões, etc. que
foram feitos; as datas em que foram celebrados; o autor do projecto; os custos; o sistema de gestão/ financiamento; os usos; o desenvolvimento.
Vamos agora identificar algumas ideias sobre a conservação e manutenção das infra-estruturas portuárias:
Os portos são obras públicas com uma vida limitada, requerendo trabalhos de conservação quantificados;
A manutenção adequada deste património exige que se dê um novo uso ao edificado que perdeu a sua
funcionalidade inicial; É igualmente necessário introduzir novos regulamentos nesta área.
SESSÃO III
Farol de Pechiguera - Lanzarote
Farol de Orchilla
Farol de Castro Urdiales
Farol Aiedes
83
O enquadramento jurídico das novas utilizações dos espaços portuários estabelece a necessidade da aprovação de planos de utilização dos espaços portuários, bem como de planos especiais de ordenamento. A lei
define as utilizações permitidas e as proibições nos espaços portuários, como, por exemplo, a utilização para
áreas residenciais. Neste enquadramento, são bem recebidos equipamentos culturais, recreativos, feiras,
exposições e outras actividades que não prejudiquem o desenvolvimento futuro do porto.
Quanto à gestão dos espaços portuários remodelados, como se trata de uma utilização do domínio público
portuário, exige-se que cada ocupação esteja sujeita a autorização prévia, por exemplo através de concessão. Assim sendo, a autoridade portuária pode ceder a gestão directa ou indirecta, através de uma empresa.
A gestão de espaços de utilização pública criou uma série de problemas em determinados locais, sendo
necessário ter em conta esta situação nos acordos a estabelecer com os municípios. Quanto à desafectação
dos espaços portuários, a legislação espanhola considera-a uma excepção, que só se pode concretizar em
circunstâncias muito específicas.
Em conclusão, diria que as perguntas efectuadas anteriormente continuam presentes, na ausência de uma
resposta universal imediata. Temos que encontrar a solução mais adequada a cada uma das cidades portuárias, na procura do seu próprio projecto de futuro que contemple a preservação do património. Não
havendo uma fórmula única de aplicação geral, devemos avançar tendo em conta a participação dos cidadãos
e a necessidade de concertação de posições com as administrações municipais e portuárias. ❘❙❚
Intervenção de
Zenon Michniewicz
Director Geral da Propriedade Marítima
e Divisão dos Recursos
New South Wales Waterways Authority, Austrália
Revitalizar os Velhos Cais
– exemplos de Sidney
Sidney
Transferência do porto
A Waterways é a autoridade reguladora que trata da segurança das vias de navegação, do ambiente marítimo,
actividades comerciais, etc. A principal das actividades comerciais que asseguramos decorre do facto de sermos
os proprietários da Baía e do Porto de Sidney, o primeiro da Austrália, e responsáveis pelos antigos cais.
Esta história remonta aos anos 60 e 70, momento em que se efectuaram aterros entre os pontões, junto à
ponte de Walsh Bay, para a construção do terminal de contentores.
A importância comercial da cidade portuária de Sidney passou entretanto para um novo local, Port Botany,
distante 8 a 10 km, sem qualquer controvérsia, porque para a cidade era mais importante aproveitar esta
área para utilização urbana do que para actividade portuária, dada a sua pouca utilização.
Sidney não tem problemas com docas vazias ou com áreas a cair em desuso; logo que estão desocupadas
são vendidas facilmente ao sector imobiliário.
Desafios da Valorização do Património Portuário
SESSÃO III
Plano Walsh Bay
As duas áreas de que vamos falar (Walsh Bay e King Street Wharf), referem-se a terrenos libertados recentemente, alvo de requalificações muito distintas.
As orientações para o desenvolvimento destas áreas assentam em parcerias entre o sector público e o sector
privado, com os seguintes pressupostos: O Governo cede o terreno e recebe várias contrapartidas públicas;
o sector privado fornece o know-how e o financiamento e obtém as mais-valias financeiras; O Governo
mantém a propriedade do terreno, mas aluga-o por períodos de 99 anos. Como é que este modelo se
concretiza: Temos que definir objectivos de interesse público – o que é que queremos ver nestas áreas? Em
que fase de planeamento é que definimos o tipo de utilizações que queremos para os terrenos? Quais os
pressupostos que justificam o convite ao sector privado para apresentar propostas? Que tipo de negociação
Plano King Street Wharf
85
Cais de Contentores (1995)
Intervenção de
Jim Gill
Director Geral, Liverpool Vision, Reino Unido
A recomposição da frente
ribeirinha no centro
da cidade de Liverpool
Albert Dock anos 80
estabelecer com quem ganhou os concursos para a elaboração dos contratos, etc. Quanto ao projecto de
implementação – ele deve incluir a construção, as rendas, as vendas e a gestão corrente.
Há 20 anos que trabalhamos no cais de Walsh Bay, por exemplo. Estes projectos demoram muito tempo
a concretizar-se, dependendo muito do valor do imobiliário e dos ciclos de valorização dos terrenos.
Temos de ter paciência e ser persistentes. Gostamos de ver as coisas a acontecer e estamos dispostos a
aguardar para alcançar os nossos objectivos, que são os de preservar o património portuário e assegurar
uma actividade de relevo para o porto de Sidney, organizando mini cruzeiros de duas ou três horas e
recepcionando navios de cruzeiro nas nossas docas. Por isso, decidimos que este era o local ideal para
esta actividade turística no centro de Sidney, onde se criaria, também, um pontão para os ferry-boats e
parqueamento para os autocarros de turismo poderem estacionar. Eram necessários também hotéis,
aparthotéis, apartamentos, etc.
Em 1995 estava tudo a degradar-se no local onde a história europeia na Austrália tinha começado. Estes cais
pertenciam ao nosso património afectivo e era importante manter as estruturas antigas e utilizá-las de uma
forma construtiva, sem as transformar em museus. O que decidimos fazer foi reconverter esta área numa
zona cultural, voltada para as artes. Também queríamos aceder a todas as áreas ribeirinhas – hotéis, áreas
culturais, áreas comerciais, áreas residenciais, etc. – e isto tinha que ser compatível com o funcionamento da
actividade portuária, mesmo ao lado, sem pressões excessivas sobre a área do porto que ainda estava operacional. O aumento do preço do m2 nos últimos anos tornou a ideia exequível. O dinheiro que obtivemos
das rendas residenciais permitiu-nos reconstruir todas as áreas públicas.
King Street Wharf era uma área pouco utilizada; de vez em quando aparecia um navio de cruzeiro mas basicamente nada se passava. O comércio para Sidney já tinha passado para o novo porto, por isso já tínhamos
estas áreas em desuso.
Assim, queríamos manter o elemento de património marítimo e uma actividade importante para o porto de
Sidney e para os turistas – fazer um mini-cruzeiro de duas ou três horas, com ou sem almoço, para dar uma
volta à Baía de Sidney, mas não tínhamos nenhuma base onde todos os navios de cruzeiro pudessem atracar
e carregar todos os seus mantimentos, descarregar o lixo, para além de embarcar os passageiros. Por isso,
decidimos que este era o local ideal para esta actividade turística no centro de Sidney. Também queríamos
passeios ao longo da baía, um pontão para os ferryboats, um sítio para os autocarros turísticos poderem
estacionar. Eram necessários também hotéis, aparthotéis, apartamentos, etc., tudo isto compatível com o
porto que continuava a funcionar ao lado.
Ainda não acabámos de desenvolver o plano, nomeadamente as áreas de escritórios, artes e cultura, mas já
podemos apreciar os cerca de 80 % do projecto concluído. ❘❙❚
Liverpool tem uma longa história. Em 1207 foi-lhe atribuída a Royal Charter; em 1715 foi estabelecida a primeira doca flutuante do mundo para fins comerciais; em 1815 alargou-se a doca para 12ha; em meados do
séc. XIX foram construídos alguns dos principais armazéns na Albert Dock e na Stanley Dock; em 1882 foram
acrescentados mais 127ha de docas; até aos anos 70 do séc. XX a zona portuária de Liverpool sofreu grandes reveses que acabou mesmo com o encerramento das docas do sul em 1972; em 1981 criou-se uma
estrutura patrocinada pelo governo para gerir a zona da doca - Merseyside Development Corporation (MDC)
-, o que permitiu estabelecer uma grande plataforma logística e desenvolver bastante a zona portuária.
A MDC é uma empresa de direito privado, criada pela autoridade local e pelas agências de desenvolvimento
local e nacional, que visa a revitalização do centro da cidade. Não possui fundos, nem património próprio,
funciona apenas como gestor das instalações.
Liverpool é uma cidade bastante mais pequena que Lisboa, tem uma zona de doca muito inferior, mas é uma
cidade compacta, sobretudo o centro.
O declínio do sistema portuário prendeu-se em grande parte com o declínio económico do centro da cidade. Nos anos 80 a recuperação destes espaços foi considerado como objectivo prioritário pela Comunidade
Europeia, processando-se o seu desenvolvimento com recurso a fundos comunitários, e com conclusão
prevista para 2007.
Esta oportunidade não podia ser alienada na perspectiva do interesse da cidade e do seu desenvolvimento
económico, muito dependente do turismo, que tem vindo a aumentar ao longo dos anos. O facto de termos
ascendido a património mundial deu-nos uma grande visibilidade externa, que pretendemos aumentar, intro-
Desafios da Valorização do Património Portuário
duzindo novos equipamentos para fomentar o turismo. A zona ribeirinha é a chave deste desiderato.
A zona ribeirinha do Porto de Liverpool foi estabelecida no ano 2000. O que fizemos foi qualificar a cidade,
organizá-la ao nível económico, comercial, social, etc., tentar identificar as suas principais lacunas e focarmonos nos aspectos que precisavam de incentivo ao nível comercial, económico e cultural, numa perspectiva
de médio e longo prazo.
Existem alguns projectos onde se estabelecem objectivos para cada uma das zonas referidas. Para a zona
ribeirinha norte, temos planos para uma área de cruzeiro, sobretudo na Prices Dock de forma a sobrepor-se
ao Canal Nacional de Liverpool que actualmente termina na Stanley Dock e alargá-lo até à Albert Dock, de
modo a dar mais animação a este espaço. Esta zona esteve vedada para fins comerciais, tendo sido restaurada nos anos 80, nomeadamente o património hidráulico e o aproveitamento de novos canais; no entanto
persiste ainda uma espécie de isolamento entre estas duas docas.
A Albert Dock era a bandeira da MDC. Uma grande área com enormes capacidades, mas muito mal explorada. Ao estabelecer-se esta visão desenvolvimentista da Albert Dock pretendia-se restaurar o sistema
hidráulico das docas, garantir os visitantes e a parceria com o sector privado. A empresa, nessa altura, detinha
a posse dos terrenos e tinha de financiar o projecto de restauro e as respectivas obras.
Quanto ao papel do sector privado, consistia sobretudo na gestão das obras de restauro e dos próprios
edifícios, actuando também como agente de promoção e gestão deste espaço.
O custo total previsto em 1984 era de 251 milhões. A MDC contribuiu com 60 milhões, o sector público
com 8,5 milhões e o sector privado com 182,5 milhões.
No fim dos anos 90 existiam mais de 110.000m2 de espaços comerciais, com 86 unidades residenciais e
mais de 1000 postos de trabalho no sector; recebíamos também entre 4 e 6 milhões de visitantes por ano,
que podiam usufruir já de uma série de museus e galerias locais.
SESSÃO III
Zona Ribeirinha de Albert Dock
Princes Dock em 2004
A Princes Dock localiza-se a norte do pontão e próximo da estação de comboios. Ao contrário da Albert Dock,
esta doca manteve-se na posse da autoridade portuária.
A revitalização do espaço portuário foi um dos principais objectivos da MDC, com visão de futuro e como
parceira do desenvolvimento, apoiando o seu planeamento e financiamento. Para terem uma ideia, 7 milhões foram concedidos para a construção de hotéis e 8,5 milhões para infra-estruturas.
A Autoridade Portuária celebrou uma Joint Venture com a iniciativa privada o que permitiu desenvolver a zona
e dar-lhe uma perspectiva de continuidade. Há mais de 140 camas em hotéis de quatro estrelas, 21.000 m2
de escritórios e estão previstos mais hotéis, instalações de comércio local, zonas residenciais e parques de
estacionamento automóvel.
A Albert Dock é hoje um dos principais centros de turismo de Liverpool e um dos locais mais animados da cidade.
A imagem actual da Princes Dock contempla escritórios e algumas zonas residenciais, à sua direita, estando
a zona vazia, à esquerda, sujeita a um grande debate na cidade. Há quem queira desenvolver nesse espaço
um edifício personalizado numa arquitectura de sucesso.
A zona de Kings Water Front, remonta a sua origem ao final dos anos 60, época de consolidação da marina.
Zona Ribeirinha de Kings 2004
87
Esta doca – mais de 14 ha - é explorada por uma parceria inglesa privada. Prevê-se que acolha no seu interior
áreas de conferência com mais de 1500 lugares e 7.450 m2 para área de exposição, 1.500 lugares de parque
automóvel, 1.700 edifícios residenciais, 16.700 m2 para zonas de escritório, 10.500 m2 para zonas de lazer,
serviços e comércio local, etc.
O financiamento destas infra-estruturas de interesse público vem, em grande parte (200 milhões de euros),
de empresas detidas pela Câmara Municipal, que enquadram a visão global do projecto, garantem o planeamento e a operacionalidade da área de congressos, até ser criada uma nova empresa para a gestão desta
área, numa perspectiva de longo prazo.
O Plano Director da área de intervenção integra uma zona de congressos, a doca, o parque de estacionamento, o hotel, as praças públicas, a área residencial e de escritórios, alguns museus e empresas, etc.
Fourth Grace
Aquilo que pretendemos ver no terreno - actualmente há já na doca grande desenvolvimento cultural, feiras
locais, concertos de música, etc. - é um projecto de desenvolvimento exemplar e moderno, que represente
a confiança de Liverpool no seu futuro.
Há dois anos atrás levámos a cabo um concurso público, ganho por um consórcio privado, um construtor
nacional muito conhecido, que assentava num esquema comercial onde se incorporava o novo museu de
Liverpool e um projecto de desenvolvimento para a zona ribeirinha. Esta iniciativa foi promovida e financiada,
parcialmente, pelo sector público, ficando o Museu Nacional como ocupante desta zona. Pretendemos que
o espaço funcione dia e noite e que tenha várias utilizações.
O edifício Fourth Grace deverá incorporar a zona de museu, o espaço de lazer, as áreas residenciais e de
escritórios e a zona comercial, etc.
O custo total previsto para este projecto era de 386 milhões de euros, que entretanto já aumentou. O sector privado irá contribuir com 220 milhões e o sector público com mais ou menos 160 milhões.
As actividades do porto são hoje marginais, não assumindo relevância para o centro da cidade de Liverpool.
Estamos a tentar trazer mais actividades de lazer para esta zona.
Tentamos sempre promover parcerias entre o sector público e o privado apesar de nem sempre o resultado
ser o mais desejado. O sector público tem funcionado na restauração de edifícios, no fornecimento de infraestruturas e como importante financiador. O sector privado tem sobretudo o papel de arranque, tomando
a iniciativa e assegurando, muitas vezes, o financiamento.
Pretende-se que seja esta a imagem de marca da zona ribeirinha de Liverpool. ❘❙❚
Desafios da Valorização do Património Portuário
SESSÃO III
89
Terá o Património Portuário
um Valor Económico?
O tema deste painel prende-se com a relação possível entre o porto, a sua herança e o seu
valor económico. Será que a herança portuária tem valor económico?
Esta simples pergunta leva-me a tecer algumas considerações. O facto de ela se colocar significa que a resposta não é simples. Na realidade, se pensarmos nos anos 70, as áreas obsoletas
dos portos eram consideradas zonas de valor diminuto, conceito que se foi alterando devido
aos resultados de algumas experiências.
Durante este período, apenas algumas organizações reconheceram a importância histórica
da herança portuária, caracterizada por armazéns e docas, etc. Todas estas instalações eram
locais a ignorar, muitas vezes até identificadas como obstáculo ao desenvolvimento e à organização das áreas portuárias.
Felizmente, em anos mais recentes, surgiu uma maior consciencialização sobre esta matéria, não só ao nível da identidade e do seu significado histórico, mas igualmente sobre a
importância do seu valor económico. Creio que esta nova abordagem se deve, também, ao
trabalho feito pelas entidades locais e autoridades portuárias.
Nos últimos anos, em alguns portos do mundo, houve uma significativa mudança nas mentalidades dos decisores, expressa numa série de novos projectos relativos à reconversão e à
reutilização destes espaços. ❘❙❚
ATELIER 4
Rinio Bruttomesso
Director do The Internacional Centre Cities on Water,
Veneza, Itália
Presidente da Mesa
Intervenção de
Francisco Javier del Olmo Llarza
Presidente da Autoridade Portuária de Santander,
Espanha
Identidade e património portuário;
valor acrescentado para a cidade.
O caso de Santander
Ao longo da história, uma parte significativa das cidades determinantes na evolução da humanidade tiveram
a sua origem nos portos, infra-estruturas que assumiram um papel dinamizador da actividade económica
destes núcleos, funcionando como focos articulados de uma rede mundial, continental ou regional de intercâmbios de bens e conhecimentos, com vocação e capacidade para se transformar numa importante fonte
de riqueza material e imaterial para os seus habitantes.
Hoje em dia, os portos, tal como o resto das actividades planetárias, enfrentam os reptos da globalização.
As cidades portuárias estão na vanguarda das novas transformações e, por isso mesmo, enfrentam com
maior intensidade estes desafios, de tal forma que os espaços urbanos e portuários, se vêem afectados por
uma metamorfose com incidência na prática das actividades em que se concentram.
Na expectativa de novos desafios, as relações entre o porto e a cidade, sempre singulares, entraram numa
nova e complexa fase, em que ambas as partes, impulsionadas pela necessidade de se manterem competitivas na nova rede mundial, estão em busca de um pacto com um duplo objectivo: resolver os problemas de
convivência diária e estabelecer uma cooperação mais dinâmica e criativa que estimule o desenvolvimento de
sinergias e crie novas oportunidades nos planos económico, territorial, ambiental, cultural, institucional, etc.
A cidade não pode prescindir da competitividade, nem estrangular as actividades portuárias. Numa economia
globalizada, os portos desempenham um papel estratégico no funcionamento do sistema produtivo, não só
assegurando a sua ligação com os circuitos e as redes do comércio internacional, como gerando focos de
riqueza para a cidade.
Os portos são cada vez mais dependentes de infra-estruturas e serviços urbanos que impulsionam a sua
competitividade, a produtividade e capacidade de reconversão (instalações para gerar conhecimento, processamento e distribuição de informação, elevada qualificação de serviços financeiros e dos recursos educativos, níveis altos de qualidade de vida que atraiam ou retenham os grupos profissionais mais instruídos,
desenvolvimento de um tecido empresarial dinâmico e empreendedor, etc.), mas, também, cada vez mais
conscientes do seu papel ao serviço da sociedade, capazes de assumir novas responsabilidades e exigências
na definição da sua missão, objectivos e filosofia de gestão.
Trata-se de um pacto que, do ponto de vista das autoridades portuárias, tem de ter em atenção pelo menos
dois níveis: num primeiro nível, estão os acordos, as alianças e os planos de cooperação com as instituições
políticas (administração pública local e regional). Uma das tendências dominantes na era da globalização é
a redefinição do papel dos governos locais e regionais, cujas competência e tarefas se vêem reforçadas e
ampliadas.
Num segundo nível, situa-se a necessidade de dar resposta a outro dos efeitos da globalização: as exigências
de responsabilidade social por parte da comunidade. Nas sociedades mais desenvolvidas, os cidadãos, hoje
em dia, já não são meros espectadores dos acontecimentos diários que os rodeiam. Os indivíduos já não
mantêm uma atitude passiva face àquilo que lhes interessa ou afecta directa ou indirectamente e expressam
as suas opiniões e interesses através de mecanismos tão variados como os mercados, os meios de comunicação, as movimentações públicas e o voto.
Em consequência disto, a actividade diária dos portos, a formulação e implementação dos seus planos de
futuro, etc. estão expostos às exigências, observações, juízos, queixas e felicitações de uma cidadania organizada numa variada rede de agentes (colectivos, sectores intelectuais e profissionais, etc.) cujas opiniões e
acções têm uma incidência cada vez maior sobre o seu funcionamento e competitividade configurando-se,
ao mesmo tempo, uma fonte de oportunidades e ameaças.
Nos nossos dias, para legitimar as suas actividades, aos portos, como ao resto das empresas e instituições, já
não lhes basta cumprir com a função de prestar com eficiência os seus serviços. Os cidadãos, além de lhes
exigir que os informem sobre as suas actividades e de reclamar maior transparência na gestão, julgam-nos e
valorizam-nos pela sua capacidade de resposta, nível de envolvimento com a comunidade e compromissos
institucionais assumidos. Cada vez mais os portos são vistos pela população como um parceiro social que
deve contribuir para o desenvolvimento comum, participando nas diversas esferas da vida da comunidade:
respeito pela natureza e pelo meio ambiente, apoio à cultura, à ciência à investigação, à qualidade de vida, a
programas educativos e profissionais, ao desporto, etc.
Em Espanha, os portos não ficaram à margem das exigências de responsabilidade social, que se reforça pelo
próprio carácter público das autoridades portuárias. Todas as iniciativas que vou indicar destinam-se a sensibilizar os cidadãos para a actividade portuária, dando mostras de transparência na gestão e de legitimação
das actividades portuárias.
Terá o Património Portuário um Valor Económico?
Santander, como centro de reflexão e estudo da problemática porto-cidade tem estado, nos últimos dez anos,
presente em fóruns internacionais, participado em actividades de formação, organizando seminários e actividades de investigação, como por exemplo estudos de impacto económico, de imagem e percepção social e de
regulamentação ambiental. Todas estas iniciativas vão no sentido de reforçar as relações porto-cidade.
No que diz respeito ao protagonismo social, o porto de Santander pretende manter e fomentar uma relação
mais fluida entre o porto e a envolvente urbana.
Com esse objectivo, temos estado a trabalhar em várias áreas: na formação e investigação – criámos uma
disciplina de assuntos do mar, bolsas de estudo práticas para cursos ou estágios; nas Actividades de divulgação
– visitas ao porto, edição de publicações e muitas coisas relacionadas com cultura e património.
O que a cidade recebe do porto é uma cultura marítima e portuária. A cultura, para além de testemunho
da vida humana, é fundamental na produção de valores de identidade e na coesão social das comunidades,
permitindo ao indivíduo identificar-se com o pensamento colectivo, com um território concreto, com um
passado e um presente.
O porto de Santander, comprometido com a responsabilidade de ser veículo transmissor de cultura, tem
actuado em vários níveis que podem ser resumidos em três aspectos: A salvaguarda do património – que
compreende acções destinadas à preservação, conservação, revitalização e estudo de diversos aspectos
do património: infra-estruturas, edifícios, embarcações, fundos documentais, história, etc. A potenciação do
património – inclui actividades destinadas a favorecer a criação de um novo património marítimo e portuário,
fundamentalmente através de novas edificações e do fomento da criatividade artística. A sensibilização para o
património – abarca as iniciativas destinadas a: promover o reconhecimento, o respeito e valorização social
da identidade, cultura e património marítimo portuário; realizar a sua função na comunidade e facilitar a sua
transmissão e acesso público mediante acções de divulgação tais como exposições, publicações ou acções
específicas orientadas para o público infantil.
No plano das relações porto-cidade, estas acções, para além de testemunharem o compromisso e a participação social e cultural da autoridade portuária no seio da comunidade, converteram-se em: canal privilegiado
para o reencontro do porto com os cidadãos; suporte indutor de novas atitudes e sensibilidades na população; meio de transmissão da identidade e valores do porto; via para impulsionar e facilitar a cooperação com
entidades e colectividades locais, regionais, nacionais e internacionais e manter, assim, relações mais equilibradas com a sua envolvente, fonte geradora de personalidade pública, indutora de uma imagem favorável e
respeitada, impulsionadora de activos imateriais tais como: credibilidade, prestígio, etc.
As acções desenvolvidas no âmbito da salvaguarda do património foram classificadas em três grupos: as destinadas à protecção, manutenção e reutilização de instalações, equipamentos e embarcações portuárias; as
relacionadas com a arqueologia subaquática; e as dedicadas à recuperação da memória portuária através de
iniciativas como a conservação dos fundos documentais do porto, a iconografia e o passado do porto.
A reabilitação e conservação de instalações portuárias tem a ver com infra-estruturas portuárias, edificações,
reutilização de sinais marítimos, equipamentos e embarcações portuárias.
No domínio das infra-estruturas, o molhe de Calderón e a doca de Molnedo estavam deteriorados, tendo
sido regenerados pela autoridade portuária. Os trabalhos de recuperação e saneamento terminaram em
1995, no molhe de Calderón e em 1996, na doca de Molnedo. A utilização destas zonas como passeio
urbano inicia-se uns anos mais tarde, através de um convénio firmado pela autoridade portuária e o Governo
Regional de Cantábria para a execução das obras de saneamento integral da baía de Santander. Depois da
instalação do colector projectado para esta zona, procedeu-se à construção de um passeio marítimo para os
cidadãos, com prédios de uso residencial.
O dique de Gamazo é uma das peças mais valiosas e singulares da paisagem e da identidade marítima e portuária de Santander. É um antigo estaleiro que deixou de funcionar na década de 70/ 80, recuperado em 1994.
No campo das edificações, o Palacete del Embarcadero é um edifício emblemático do porto, situado na
doca de Calderón. Este imóvel, que simboliza o vínculo histórico de Santander com o mar, foi sempre uma
referência na paisagem urbana. Inicialmente destinava-se a estação marítima e a escritórios da alfândega, mas
depois da sua reabilitação em 1984, passou a albergar actividades culturais e sociais: exposições, conferências, etc.
A Nave Sotoliva foi ocupada inicialmente por uma empresa de fabrico de azeite que utilizava os desperdícios
de peixe como matéria-prima. Depois da reabilitação passou a ser utilizado como sala de exposições e local
para receber visitas de escolas, actos sociais, etc.
ATELIER 4
Palacete del Embarcadero
93
A praça do bairro Pesquero, é outra notável obra de recuperação de antigas instalações portuárias, anteriormente destinadas ao armazenamento de maquinaria e a oficinas de reparações. A sua reabilitação foi promovida pelo município de Santander com o objectivo de melhorar a estética do bairro e atrair novas iniciativas
de desenvolvimento social e económico. Constituiu-se um Centro de Iniciativa Empresarial Artesanal com
aulas de formação, criou-se o museu da navegação e da pesca relacionado com as actividades piscatórias do
bairro, e uma praça temática da pesca, concebida como um espaço multi-funcional para receber actividades
sociais lúdicas e pedagógicas.
A estação marítima é outro edifício singular na paisagem portuária que tem sido alvo de intervenções, mas
sempre com a preocupação de preservar as condições estéticas e arquitectónicas do edifício original.
Pretende-se que o Farol de Castillo de Santa Ana seja utilizado para actividades de interesse social e cultural
e sinalização marítima. As obras de restauro têm como finalidade a criação do museu Flaviobriga destinado a
albergar obras de carácter arqueológico, etnográfico, sacro, etc.
O farol de la Cerda antes de ser farol era um edifício utilizado como fortificação defensiva. Após a sua reabilitação passou a destinar-se a usos académicos, constituindo-se um centro de formação e estudos.
O farol de Cabo Mayor está a dar os primeiros passos na promoção de um projecto que tem como finalidade
transformá-lo na sede permanente de um Centro de Arte e Cultura Contemporânea, comprometido com a
criação e interpretação de manifestações artísticas contemporâneas inspiradas no universo marinho.
A entrada em funcionamento da Grua de Pedra foi um acontecimento para a cidade e para o porto, mantendo-se em serviço até ao séc. XX. Hoje constitui um importante vestígio de arqueologia industrial.
A necessidade de melhorar a acessibilidade marítima ao porto permitiu à autoridade portuária o desenvolvimento de acções concretas, como o projecto “Bahía de Santander”, no âmbito do qual foi elaborado um
programa de arqueologia naval e subaquático que, na prática, concretizou-se em três projectos distintos:
estudo de prospecção geofísica e exploração submarina da baía de Santander; exposição de arqueologia
subaquática na Cantábria: um património secular em perigo; exposição de Barcos e estaleiros: a construção
naval na Cantábria.
No que diz respeito ao património documental, a autoridade portuária é herdeira de uma volumosa e variada colecção de documentos que contêm informação muito valiosa, tanto para a sua própria história como
para a da cidade. Contamos com uma biblioteca e hemeroteca com mais de cinco mil livros e 130 colecções
de revistas, em grande parte especializadas em engenharia portuária. Conscientes do valor destes fundos
documentais, o porto de Santander tem feito um grande esforço para a sua conservação e organização,
dotando-os de meios e instrumentos para facilitar o acesso e a consulta interna ou externa.
Relativamente à recuperação da imagem histórica, desenvolveu-se o programa “Memória Visual de Santander e do seu Porto”, destinado à recuperação, inventário, catalogação e difusão do património visual gerado
ao longo do tempo em torno de Santander e do seu porto. Neste contexto desenvolveram-se três projectos
independentes e diferenciados pelo seu conteúdo: o primeiro dedicou-se à fotografia, o segundo centrou-se
na pintura, desenho e gravura e o terceiro focalizou-se na cartografia.
Respeitando o passado, mas aberto às inquietações do presente, a autoridade portuária procura favorecer a
criação de novo património arquitectónico, do qual podemos destacar: Jardins do Paseo de Pereda, Centro
Especializado de Alto Rendimento de Vela Príncipe Felipe, Doca de Pedreña, Centro de Transformação Eléctrica de Raos, Centro de Controlo de Acessos a Raos, Plaza de Pesquera e Nova Central de Peixe.
Outro pilar fundamental sobre o qual a autoridade portuária tem sustentado o enriquecimento do património portuário é o estímulo à criatividade artística através da formação de vínculos culturais entre a produção
de arte e o porto como local de destino.
O complemento necessário para as actividades de conservação e criação, são as acções de divulgação,
destinadas a sensibilizar para a cultura e para o porto, os mais variados públicos. Os trabalhos de difusão
materializaram-se, fundamentalmente, através de exposições, publicações ou de um conjunto de projectos
específicos destinados à população infantil e escolar.
Têm havido múltiplas actividades musicais no âmbito do programa “Música para o Porto”; todos os anos
patrocinamos concertos ao vivo e edição de cd’s de música.
Para além disso o porto mantém também uma interessante relação com as artes cénicas, facilitando a rodagem de filmes cuja temática precise do cenário portuário.
Com todas estas iniciativas, os cidadãos de Santander absorvem intelectualmente o porto e a sua envolvente
como património global de toda a comunidade. ❘❙❚
Terá o Património Portuário um Valor Económico?
A Cidade de Rouen e o seu aglomerado de 400.000 habitantes, entra no séc. XXI com a ambição de ocupar
um lugar privilegiado, uma vez que é há muito tempo cruzamento de grandes eixos terrestres e marítimos,
como testemunham os textos que descrevem a actividade do porto, há dois milénios.
A cidade aris a 120 km e a 1 hora de comboio, 22 milhões de habitantes num raio de 200 km, o hinterland
mais denso e mais rico de França: a Bacia Parisiense, armazém agro-alimentar da França.
A cidade de Rouen nasceu no seu rio, um dos maiores de França, vive dele e desenvolveu-se em torno da
sua existência. A história deu-lhe um património muito rico de que soube tirar partido, desenvolvendo uma
actividade industrial muito significativa para o desenvolvimento económico da cidade.
A sua complexidade geográfica representa uma ruptura entre a margem norte e sul do rio, com as colinas a
norte, a estabelecer uma espécie de nova fronteira entre a baixa e a alta da cidade.
As etapas importantes da história de Rouen podem estruturar-se em cinco períodos essenciais: antes de
1870 - A partir do séc. XVIII, a separação medieval entre cidade e porto esbate-se no espaço portuário que
é remodelado para se integrar na paisagem urbana. A margem direita está ao centro das mudanças. Consciente dos riscos, o município procedeu à melhoria e ao embelezamento dos cais, gradualmente libertados
pela demolição de fortificações. Em causa estavam a lei Freycinet e a revolução industrial, ou a invenção do
porto moderno;
Depois de 1870 - a evolução das infra-estruturas é a consequência da revolução industrial que, tanto em
terra como no mar, perturba as actividades portuárias. Um novo ordenamento portuário foi elaborado pelo
Estado, no âmbito da lei Freycinet em 1879. Seguindo o exemplo de Londres ou Antuérpia, o porto abre-se
ao exterior, dota-se de ramais ferroviários, novos cais, gruas hidráulicas e hangares destinados à triagem de
produtos e aos controlos aduaneiro e comercial;
Entre as guerras - É nesta época que o porto toma a sua fisionomia actual. Os cais do porto de comércio,
edificados entre 1885 e 1914 sobre a margem direita, são limitados por hangares de trânsito que vêm juntarse aos hangares já existentes;
A guerra e a reconstrução - O porto e a cidade pagam um pesado tributo decorrente da destruição de infraestruturas durante a Segunda Guerra Mundial. O peso da influência urbana sobre este sector, e as oportunidades emergentes de exploração portuária industrial, favorecem a extensão do porto e a sua localização
noutra zona. A partir desta época, aquilo a que hoje chamamos l’Espace des Marégraphes, torna-se a parte
do porto mais próxima na ligação com a cidade;
ATELIER 4
Intervenções de
Edgar Menguy
Vereador responsável pelo Urbanismo,
Câmara Municipal de Rouen, França
e Bernard Kovarik
Director do Ordenamento e do Ambiente do Porto
Autónomo de Rouen, França
A criação do Espaço
dos Marégrafos em Rouen
Porto de Rouen
95
Porto de Rouen
Espaço dos Marégrafos
O porto contemporâneo - A partir de 1960, a arquitectura portuária evolui em função das novas formas do
tráfego e navios. Entre 1965 e 1980, a inovação e a generalização dos contentores provocou uma natural
perturbação no funcionamento das infra-estruturas portuárias, comparável à mudança de 1880.
Se existe um porto fundamentalmente fluvial em Rouen é graças ao Sena e ao facto de ele ser navegável
para o interior. A largueza do seu estuário permite acolher navios numa frente ribeirinha com mais de
100 metros. Ocupa uma posição estratégica perto da mais importante concentração humana, industrial
e agrícola de França, está vocacionado para o tráfego de mercadorias em sistema intermodal (mar, rio,
estrada, caminhos-de-ferro), e para a área da logística. A sua localização na confluência dos tráfegos
norte/sul – atribui-lhe uma forte especificidade e reconhecido valor acrescentado, nomeadamente no
transporte fluvial.
É um porto de mercado, com uma componente de armazenagem, sobretudo de cereais e produtos agroalimentares, mas que recebe igualmente produtos petrolíferos e outro tipo de mercadorias, escoada através
de filiais portuárias que servem um país portuário muito vasto. É também importante ao nível do consumo
energético, uma vez que privilegia meios de transporte que respeitam o ambiente.
Quando nos lançámos neste projecto, que se prolonga por décadas, identificámos quatro grandes desafios
que se nos colocavam: é uma etapa fundamental para o desenvolvimento da cidade, para os próximos 50
anos; a importância na conservação da identidade da cidade – são os habitantes de Rouen que exigem a
notoriedade a dar a estes aspectos históricos; a criação de novos espaços para novos modos de vida – são,
mais uma vez, os próprios habitantes que nos pedem para criar uma cidade melhor adaptada à vida de hoje;
a disponibilização de mais espaços verdes e uma maior relação com a zona ribeirinha.
Acabámos por ter um protagonismo duplamente vencedor, uma vez que tanto a cidade como o porto podem gozar dos benefícios deste projecto comum.
Em 1995 o município fez da reciclagem do cais de Rouen, uma das acções prioritárias do seu projecto
urbano. Apesar dos problemas provocados pela reconstrução, surge a oportunidade de construir de novo
relações de proximidade entre a cidade e o porto, com os trabalhos de consolidação de 5 km de cais para
que o público possa usufruir das margens do rio.
De acordo com o plano director do aglomerado Rouen-Elbuef, os bairros ocidentais de Rouen apresentam oportunidades excepcionais de desenvolvimento e são portadores de uma imagem forte no conjunto
da metrópole, dispondo, além disso, de uma localização privilegiada em relação ao rio, na parte superior
do porto.
Por outro lado, a sua localização está no centro das infra-estruturas de transporte que servem adequadamente toda a comunidade, facilitando o contacto cada vez mais próximo com o rio.
Um aspecto importante para o desenvolvimento desta área consiste em fazer dela um pólo importante de
equipamentos urbanos; mais escritórios, 500 habitações e um centro de comércio e lazer. Há instalações
que já estão em funcionamento ou em fase de edificação: a faculdade de direito; a construção de 80.000
m2 de escritórios destinados ao sector terciário está também a ser desenvolvida; a área de habitação assume particular importância para o acolhimento de novos habitantes, contribuindo para o desenvolvimento
demográfico da cidade.
Existem uma série de projectos estruturantes com referências urbanas muito significativas, relacionados com
a sensibilidade identitária da própria cidade. A ponte antiga de Rouen, por exemplo, será um dos elementos
que vai contribuir para a notoriedade da cidade, fazendo a interface entre a cidade e o porto e estabelecendo
a ligação entre o passado e o futuro de Rouen.
Outra referência urbana diz respeito ao bairro Luciline, uma área de 200.000 m2, pensada a partir de
um hangar portuário, com actividades mistas de lazer e comércio, que irá começar a ser implementado
em breve.
Os marégrafos usavam-se, no século passado, como acumuladores hidráulicos que geravam na água a pressão necessária para servir as gruas portuárias.
A Carta de objectivos do Espaço dos Marégrafos, foi assinada a 14 de Novembro de 2000, demonstrando
a vontade comum da Cidade e do Porto em lançar uma acção concertada com o objectivo de valorizar os
espaços portuários, favorecendo a sua integração urbana.
Os grandes princípios da Carta eram os de: melhorar a percepção urbana da zona portuária (iluminação);
criar um cais atractivo (passeio contínuo, bancos); dar mais lugar ao vegetal; criar legibilidade nos espaços
(sinalética); manter a polivalência de certos espaços; valorizar o património arquitectónico portuário (os
Terá o Património Portuário um Valor Económico?
ATELIER 4
97
marégrafos, os hangares); favorecer os projectos de implantação de novas actividades (cafés, actividades
desportivas, culturais ou comerciais); reforçar a protecção contra as inundações.
Os principais objectivos consistiam em: iniciar uma parceria para a qualificação da interface entre cidade e
porto; definir um método de trabalho e a distribuição das responsabilidades; definir o ordenamento; tratar
dos aspectos jurídicos; elaborar um programa de intenções.
A abordagem desenvolvida neste projecto é, por conseguinte, multidisciplinar e permite responder à complexidade da evolução urbana dos bairros ocidentais,.
Tendo em conta a qualidade do património construído e a sua coerente integração no espaço envolvente,
julgou-se indispensável impor um caderno de exigências arquitectónicas para todos os projectos de reabilitação e implantação de actividades, confiado a um gabinete de arquitectos, cujo trabalho foi validado em Julho
de 2002, pela Cidade de Rouen e Porto Autónomo.
A criação do Espaço dos Marégrafos em Rouen favorece a implantação de comércio e de actividades novas,
mais urbanas, e de maior valor acrescentado, ligadas à restauração, ao desporto, à cultura, que substituem
o comércio grossista de materiais de construção e de acessórios para automóveis, etc, sem negar o rico
passado portuário e marítimo do cais e armazéns antigos. O poder atractivo das novas actividades junto do
público consumidor provocará uma frequência acrescida destes novos espaços de descoberta e uma animação renovada de todo o conjunto urbano-portuário.
A salvaguarda e a recuperação deste património portuário de qualidade (marégrafos, hangares, etc.) associa
o Porto e a Cidade a uma operação de alcance urbano e ambiental, que quebra com certos clichés sobre a
degradação dos espaços portuários antigos. ❘❙❚
Rouen
A área da cidade de Rosário está configurada pelos rios Paraná e Paraguai, tem um sistema hidrográfico com
mais de 3.200 km de vias potencialmente navegáveis.
A cidade de Rosário e a sua área metropolitana contribuem com 50% do PIB da província e em 5% do PIB
da Argentina.
A configuração da nossa área metropolitana é feita sobretudo pela integração de mais de vinte municípios
que caracterizam politicamente de forma variada esta zona. Tanto na cidade como no porto convivemos
com várias cores políticas e níveis de administração diverso, pelo que se torna muito difícil chegar a consenso,
necessário ao desenvolvimento de políticas estáveis e eficazes.
O porto de Rosário é o principal porto fluvial da República da Argentina. Está próximo do rio Paraná, dista
Intervenção de
Juan Carlos Venesia
Presidente da Enapro – Ente Administrador
Puerto de Rosario, Argentina
As estratégias cidade-porto
em Rosário, porto do Rio Paraná
300 km da capital Buenos Aires e 150 km da capital da província de Santa Fé, onde habitam três milhões
de pessoas. A estrutura portuária é uma área de transferência de cargas, por excelência, reunindo mais de
vinte terminais de onde saem cerca de 35 milhões de toneladas de produtos agrícolas, o principal cluster
da Argentina no campo das exportações. Está actualmente em pleno processo de renovação com o objectivo de aumentar para 38 pés a profundidade do rio.
Da sua história centenária registe-se o peso do transporte fluvial no conjunto do País: em 1855 movimentava já 24 mil toneladas/ano, passando em 1905 a mais de 2,5 milhões de toneladas.
Depois da Primeira Guerra Mundial veio a expansão económica que se fez sentir em toda a Argentina
registando, nessa altura, o movimento de mercadorias mais de 6,5 milhões de toneladas.
Apesar das crises económicas subsequentes, na década de 60 o porto manteve a sua importância e expandiu-se, convertendo-se no principal pólo exportador da República da Argentina, apesar de ter passado
das mãos privadas para o Estado.
A partir de 1985 deu-se uma profunda deterioração nos nossos terminais portuários, influenciando a
frente fluvial do Rosário.
Na década de 90, quando na Argentina se procedeu a uma série de reprivatizações, surgiu uma lei que permitiu, de uma forma geral, o acesso da iniciativa privada a alguns sectores de actividade, passando a tutela do
porto de Rosário para o domínio da província de Santa Fé, dando lugar a uma nova autoridade portuária.
A área dos terminais 1 e 2 foi concessionada em 2002, a um consórcio formado entre a Argentina e a
Catalunha, por um prazo de trinta anos. É uma área onde se mobilizam cargas gerais e mercadorias contentorizadas, nomeadamente fertilizantes, vegetais e produtos siderúrgicos.
A área dos terminais 6 e 7, que são basicamente de granéis, são concessionadas pelo Estado.
Temos ainda uma estação fluvial de passageiros que assegura o transporte para a ilha situada em frente,
contribuindo para o seu desenvolvimento e para a dinamização de actividades lúdicas.
Finalmente, existe uma zona de reserva na área sul, que tem potencial para novos empreendimentos.
No nosso plano de gestão, que será desenvolvido nos próximos noventa dias, reconstituímos a ideia de
trabalhar de uma forma consensual com métodos de planificação estratégica, e em conformidade com as
componentes da vida portuária local na procura, sobretudo, do desenvolvimento das infra-estruturas da
área portuária e do transporte multi-modal, aproveitando as infra-estruturas ferroviárias locais.
Os eixos essenciais de acções-chave que pretendemos desenvolver no nosso plano estratégico têm a ver
com: a racionalização administrativa da entidade gestionária; desenvolvimento da infraestrutura portuária - prende-se sobretudo a consolidação do transporte ferroviário na Argentina, que
mobiliza 300 milhões de toneladas de mercadorias na área metropolitana de Rosário, um importante nó
de transportes ferroviários e fluviais; todo o desenvolvimento dos espaços de utilização portuária também faz parte deste plano; Rosário é basicamente uma cidade que nasceu cidade portuária e
temos que manter essa configuração; programa de promoção comercial; processo de integração
territorial e de posicionamento regional.
Para atingir estes objectivos, considerámos dois programas específicos no plano estratégico: A integração
entre a cidade e o porto, que se prende sobretudo com a obtenção de um consenso entre as autoridades
municipais e as várias confederações profissionais para desenvolver a interface entre a cidade e o porto.
Para tal, é preciso ter em atenção o corredor norte, uma área emblemática da cidade do Rosário, uma
intervenção que se destina a comércio, escritórios, laboratórios de investigação e universidades.
Uma frente territorial que abrange quase toda a área sul da cidade, que obriga a quatro grandes intervenções: Um parque com um corredor verde com mais de 15ha a recuperar, um comprimento de mais de
300 metros e uma largura de cerca de 3.000 metros, que vai permitir alargar a área de uso portuário e
dar-lhe uma vertente ambiental, tendo em conta a manutenção do nível de qualidade de vida com que
pretendemos dotar esta cidade portuária; pretende-se, também, integrar o desenvolvimento urbano da
cidade com a vertente ambiental; o desenvolvimento da estação terminal ferroviária de passageiros. A
Argentina perdeu o transporte de passageiros de grande distância, concentrando-se essencialmente no
transporte de mercadorias. O novo governo nacional procura reactivar os ramais históricos, nomeadamente o de Rosário a Buenos Aires, instalando um terminal de passageiros na cidade de Rosário. Na área
sul da cidade, procuramos que a zona se reconverta numa área desportiva, com cerca de 8ha, junto a uma
zona de marinas que tem 3.000 navios registados para uso particular; Acesso directo aos nossos terminais,
sobretudo os de granel, com investimento no transporte ferroviário.
Terá o Património Portuário um Valor Económico?
A implementação destes programas permitir-nos-ia uma recuperação urbanística de 25ha e desenvolver
o nosso plano estratégico, fundamentalmente em acções de recuperação e integração entre a cidade e
o porto, que durante muitas décadas viveram de costas voltadas. É urgente recuperar essa interacção. ❘❙❚
ATELIER 4
99
As Marinas como Instrumento
de Valorização dos Portos
Os portos de recreio são uma mais valia para as cidades actuais, mas é necessário termos em
conta o contexto onde estão inseridos.
Atendendo às restrições ambientais que existem neste tipo de infra-estrutura, estes projectos são vistos pelas associações comerciais e pelas entidades que têm a seu cargo os portos,
a gestão do tráfego marítimo, a marinha de pesca e a marinha de guerra, como alternativa
bastante interessante.
Em França, falamos mais de portos de lazer, vocacionados para a náutica de recreio, e menos
de marinas, que estão muitas vezes associadas aos condomínios de habitação.
O objectivo deste painel é abordar estas questões e trocar experiências sobre as realidades
existentes em diversos países. ❘❙❚
ATELIER 5
Guy Daher
Arquitecto Urbanista
Membro do Conselho Superior da Navegação de Lazer
e Desportos Náuticos, França
Presidente da Mesa
Intervenção de
Greg Haigh
Director da Ove Arup & Partners Limited
Presidente da Autoridade Marítima e da Associação
dos Engenheiros Civis, Reino Unido
Localização e construção
de uma marina num porto
Bacias de Chatham
Ponte levadiça
Marina de Chatham
Marina de Glasson
O tema da minha apresentação são as antigas docas, as marinas e o modo como podemos utilizá-las.
O exemplo que vou apresentar-vos vem do Reino Unido e diz respeito a um projecto que ilustra uma série
de conflitos que existem quando se tenta transformar uma instalação portuária numa marina.
Chatham localiza-se no Sudeste de Inglaterra, condado de Kent. No início dos anos 80 era uma das três grandes bases navais do Reino Unido, acolhendo nas suas bacias hidrográficas instalações de apoio para fragatas
e submarinos, uma tradição marítima com 300 anos de existência.
Em 1984 o estaleiro naval foi encerrado pelo governo conservador, tendo como resultado o desemprego
de 20 % da força de trabalho e efeitos muito negativos na economia local.
Uma das bacias foi mantida como porto comercial e, neste momento, é explorada por uma companhia privada.
Existe uma parceria entre o sector privado e a Agência de Desenvolvimento para o Sul de Inglaterra, que
investiu bastantes recursos em infra-estruturas, para o desenvolvimento da marina, apesar da existência de
algumas barreiras físicas que decorrem da grande densidade populacional.
Em torno da marina, preparada para receber trezentas embarcações, foram construídas várias infra-estruturas de apoio, incluindo uma ponte levadiça, acessos viários, posto de abastecimento de combustível,
armazéns para barcos e parque automóvel.
O desenvolvimento do Porto de Chatham despertou alguma controvérsia devido à grande quantidade de
detritos e amianto depositados. Era urgente tratar toda a área circundante que estava contaminada com
metais pesados, sujeita a grandes inundações e dotada de infra-estruturas insuficientes.
Em vez de retirar os edifícios tentou-se recuperá-los, colocando-os numa única zona do estaleiro. Para o
efeito, fez-se um grande aterro de 20 metros de altura por 100 metros de largura onde se depositaram
todos os materiais contaminados, verdadeira zona tampão entre o porto comercial e a zona residencial. A
vantagem desta abordagem é que não existe risco de contaminação das áreas circundantes.
Mas havia outras preocupações ambientais relacionadas com os sedimentos depositados na doca. De facto,
não conhecíamos as condições de segurança dos navios antigos estacionados no porto e movidos a energia
nuclear; resolvemos o assunto utilizando um sistema de protecção que permite fazer a limpeza dos fundos
da bacia, sem retirar o sedimento.
Outro problema com que nos deparámos foi a burocracia; havia oposição à edificação de uma marina na
doca, por parte da English Nature, uma associação ambientalista. Esta organização estava preocupada com a
saída do estaleiro e com o previsível fluxo de iates de recreio, o que provocaria o aumento do tráfego fluvial.
Foram despendidas verbas públicas para preparar uma acção judicial contra a organização, mas felizmente
conseguiu-se chegar a acordo.
Na presença de uma doca já em desuso, devemos ter em conta alguns pressupostos antes de se pensar na
localização de uma marina: o mercado, as condições atmosféricas, os activos físicos, as questões de segurança operacional, a análise da qualidade da água e o financiamento dos projectos.
É necessário atender às potencialidades do mercado local mas, antes de mais, temos que conhecer as características
de cada país. Por exemplo, na Noruega existe um barco por cada seis pessoas, no Reino Unido a relação é de 1 para
100 pessoas, nos EUA um barco por 17 pessoas, já na Irlanda a relação é de um barco por cada 360 pessoas.
Quando analisamos o mercado é extremamente importante a localização pretendida, que está relacionada
com a concentração populacional. No norte de Inglaterra, na costa oeste, surge a doca de Glasson, já sem
utilização, situada no limite de um canal. No local, existe apenas uma pequena área comercial, uma marina
com muito espaço livre e poucos barcos.
A doca tem capacidade para muito mais navios, mas a cidade de Lancashire é bastante pequena, ficando
Manchester e Liverpool a 100 km de distância, o que explica a falta de tráfego no porto.
Outro aspecto importante consiste em fixar destinos e hábitos de permanência. Na costa sudoeste há uma
série de locais que se podem frequentar, com muitas actividades na área do lazer e investimentos consideráveis na economia local.
Outro factor essencial é a meteorologia. O tempo na Grécia e em Portugal é extremamente favorável à
navegação, o que não acontece no norte da Noruega, por exemplo.
Uma questão igualmente importante são as condições de entrada na marina. Na doca de Glasson, por exemplo, é extremamente difícil entrar devido à maré. No Mediterrâneo esse problema já não se põe.
Uma das grandes dificuldades ao tentarmos utilizar uma doca antiga para a transformar em marina é a questão dos activos físicos do espaço portuário que estão, normalmente, muito degradados e não são fáceis de
utilizar pela indústria náutica, por isso não escolhemos portos desactivados há mais de 30 anos.
As Marinas como Instrumento de Valorização dos Portos
É preciso também avaliar se as águas são ou não as ideais para velejar. O acesso por terra também é importante; para que as pessoas acedam facilmente à zona de animação ribeirinha é preciso tornar mais fácil as
acessibilidades para os centros urbanos e vice-versa. São ainda necessários parques automóveis, armazéns
para os barcos, etc.
Outro aspecto a ter em conta se queremos aproximar as pessoas das actividades da marina, são as questões
da segurança, porque esta nova realidade traz, muitas vezes atrás de si, aspectos de insegurança, roubos,
etc.
Em termos de segurança operacional, o número de acidentes é relativamente baixo, atendendo ao tráfego
de navios de cruzeiro, grandes ferryboats e outros navios que cruzam estas águas. Para prevenir perigo de
colisão é necessário haver uma gestão operacional adequada e zonas de exclusão rigorosas.
Noutra vertente, é de salientar que a transparência da água é muito importante para aqueles que financiam
o desenvolvimento comercial dos projectos, mas nem sempre é sinal de água de qualidade.
O nível de nutrientes na água, a concentração de materiais pesados e de matéria orgânica, a identificação
de matéria patogénica (muitas vezes associada aos esgotos) e a variação de salinidade, são factores a ter em
conta quando se fala de qualidade da água. O importante é tentar controlar as fontes de contaminação e
manter a qualidade da água no interior da própria bacia.
Se analisarmos as docas profundas, onde existe uma mistura de água doce e salgada, podemos ter problemas
de detritos no fundo e de má qualidade da água. Se tivermos uma doca com pouco fundo, muitas vezes
haverá um sobreaquecimento da água que conduzirá ao desequilíbrio na fauna e na flora.
Quanto ao financiamento, é possível, em certas situações, que a marina pague os custos associados à sua
manutenção, ao pessoal, etc, recorrendo à ajuda financeira do governo central ou de entidades locais
para tratar de problemas mais complexos que não sejam comportáveis com as verbas da marina. Uma
forma de aumentar os seus proventos, consiste em criar estações de serviço para venda de combustível
aos navios.
Neste quadro de intervenção podemos dizer que as marinas são, indiscutivelmente, compatíveis com a
regeneração dos portos comerciais.
Por exemplo, em relação a Swansea podemos apreciar as diferenças entre a desaproveitada doca dos anos 70
e a moderna marina, com mais de 500 navios, que lhe sucedeu.
No caso da doca de St Katharine, já com 40 anos de actividade, está a ser repensada a sua exploração comercial, de forma a torná-la mais lucrativa.
Em suma, se temos uma doca para reabilitar é necessário estudar, em primeiro lugar, o mercado local, pensar nas fontes de financiamento e ter em conta que, respeitando as premissas das práticas de engenharia,
esses espaços podem ser transformados em oportunidades de reabilitação urbana. É necessário fazer uma
análise in loco de todas as condições para se chegar a uma solução óptima na qual possamos minimizar as
despesas e maximizar a rentabilidade. ❘❙❚
Vou dar-vos algumas informações sobre a localização da nossa ilha, a história e a economia de Curaçao e
da sua capital – Willemstad; do relacionamento simbiótico entre a cidade e o porto, as políticas portuárias
relevantes e os projectos baseados neste relacionamento.
Curaçao é uma pequena ilha com 444 km2 e 135.000 habitantes, e uma história colonial muito marcada pela
presença holandesa a que se sobrepõe uma cultura local muito própria.
A população é predominantemente mesclada de origem africana, europeia e asiática, que têm como principais línguas faladas o papiamento, holandês, espanhol, inglês e até o francês.
O PIB é de cerca de 1,6 mil milhões de dólares, isto é 13.000 dólares per capita.
Para além do sol, do mar, de portos naturais e de alguns recursos minerais, Curaçao não tem muito mais
valias, tornando-se necessário desenvolver uma economia orientada para os sectores do turismo, refinação
de petróleo, transportes e a banca internacional.
Willemstad é a maior e mais importante ilha das Antilhas Holandesas. Está localizada mesmo em frente à costa da Venezuela, a sul da República Dominicana, da Jamaica e de Cuba. A cidade de Willemstad divide-se em
duas partes: uma designada por Punda e a outra por Otrobanda, ligadas em 1988 por uma ponte flutuante
que ainda hoje está em funcionamento.
ATELIER 5
Doca de Swansea - anos 70
Doca de Swansea - actualmente
Doca de St Katharine
Intervenção de
Agustin Diaz
Director da Autoridade do Porto de Curaçao,
Antilhas Holandesas
O caso de Curaçao
– o desenvolvimento do porto
e da cidade de Willemstad
103
Willemstad
Ponte Juliana
A história moderna de Willemstad começa com a chegada dos holandeses em 1634, mas a sua fundação data
de 1648, no local de Punda, do lado direito da cidade e construída como área comercial à volta do forte.
No séc. XVII o comércio de Punda cresceu de uma forma relevante devido ás actividades da Companhia
das Índias Ocidentais. Nos finais do séc. XVII e no séc. XVIII a cidade começou a crescer para além das suas
muralhas, para Scharloo e Otrobanda. Até ao final do séc. XIX a actividade mais importante em Waaigat e
Otrobanda relacionava-se com o estaleiro naval.
No séc. XX, mais precisamente em 1916, a refinação de petróleo industrializou rapidamente a ilha, que prosperou
com os fornecimentos efectuados durante a II Guerra Mundial; A introdução dos automóveis e o tráfego aéreo após
o conflito teve um impacto muito significativo no desenvolvimento da cidade, levando à construção da ponte Juliana,
que liga as duas margens da St. Anna Bay, permitindo o tráfego automóvel e o movimento de peões.
No final dos anos 80 início dos anos 90, iniciativas do sector privado apoiadas pelo governo e com a ajuda
holandesa, deram início a um grande programa de restauro e reabilitação de monumentos que resultou, em
1997, na atribuição do estatuto de Património Mundial da UNESCO, despoletando novas iniciativas na baixa
da cidade, particularmente na área de Otrobanda.
Desde 1995 têm vindo a crescer, gradualmente, os fluxos turísticos, devido à construção de instalações
portuárias na costa de Otrobanda, para grandes navios de cruzeiro, que pelo seu porte já não conseguem
entrar em St. Anna Bay.
Baseando-se no sucesso de Otrobanda, o governo deu início ao Plano de Desenvolvimento Urbano, designado por SOP, visando uma parceria entre os sectores público e privado, para a reabilitação e o desenvolvimento equilibrado de toda a cidade.
O Plano de Desenvolvimento Urbano (SOP) decorre do Plano de Desenvolvimento da Ilha e do Programa Económico a longo prazo, integrando assim os desígnios de planeamento urbano com a dinâmica de
desenvolvimento económico. O objectivo é reforçar as várias funções e actividades na baixa da cidade,
nomeadamente as funções que envolvem os aspectos culturais, sociais e económicos, mantendo o estatuto
de património Mundial da UNESCO. O desenvolvimento destas políticas exige uma abordagem integrada,
baseada numa parceria sólida e eficiente.
A experiência e o conhecimento do modelo da cidade de Roterdão foram aproveitados para conceber o Plano
de Desenvolvimento Urbano (SOP), que identifica quatro áreas na cidade, cada uma delas com as respectivas
zonas prioritárias. As áreas ocidental e oriental, localizados na margem da Otrobanda, em St. Anna Bay, têm património portuário muito importante. As áreas do norte e do sul, do lado do Punda incluem Scharloo Abao e Waaigat. Tanto as áreas do norte de Punda como as do sul incluem também infra-estruturas de grande dimensão.
O SOP é um documento muito relevante das políticas desenvolvidas pelas autoridades portuárias de Curaçao - CPA (Curaçao Ports Authority) - que participa de uma forma muito activa nos vários processos de
consulta e implementação.
Os cinco cais de Otrobanda, do lado esquerdo da entrada do porto, dentro da St. Anna Bay, têm uma função
combinada de cais de cruzeiros e bunkers, fornecendo serviços turísticos e serviços públicos. As novas mega-instalações estão localizadas na área de Rif Otrobanda, uma antiga zona industrial, dispondo de uma grande piscina e
de um antigo estádio de basebol, e ainda um plano director para o desenvolvimento de actividades desportivas.
Do lado de Punda temos os principais pontos de atracção turística, com estabelecimentos comerciais, bares,
restaurantes etc. Encontra-se também nesta área o famoso mercado flutuante de Waaigat onde as barcaças
venezuelanas vêm vender legumes.
Neste conjunto, há três pontes - património do governo - e dois cais para ferries - em Punda e Otrobanda
– na baixa da cidade, que também são propriedade do governo. Mas as autoridades portuárias do Curaçao
são as entidades responsáveis pela operacionalidade do porto.
Desde a chegada dos holandeses até hoje, Willemstad e o seu porto têm sido a razão de ser da existência de
Curaçao como centro internacional de comércio, contribuindo o porto com cerca de 210 milhões de dólares americanos para a economia, ou seja, cerca de 12% do PIB. Mais de 6.000 pessoas trabalham directa
ou indirectamente no sector marítimo, ou seja, 11% da mão-de-obra total.
O centro da cidade perdeu a sua função tradicional mas pode aumentar consideravelmente o seu valor se for integrado em projectos de desenvolvimento da baixa, particularmente nas áreas do turismo, áreas cultural e social.
Este desenvolvimento implica que grande parte das actividades portuárias tenham de ser relocalizadas para a
baía de Schottegat e New Harbor, abrindo novas oportunidades para o desenvolvimento comercial da zona
ribeirinha a norte de St. Anna Bay, a financiar por uma parceria entre o sector público e o privado.
As Marinas como Instrumento de Valorização dos Portos
As questões que se levantam são as seguintes: Quais são as actividades portuárias tradicionais mais importantes? Qual o impacto do porto na economia e na cidade?
Relativamente ao tráfego, cerca de 1.600 navios de contentores, 1.200 navios de carga e 200 de cruzeiro
atracam no porto de Willemstad anualmente, movimentando cerca de 10 milhões de toneladas de produtos
petrolíferos, um milhão de toneladas de carga sólida a granel e 70.000 TEU’S de carga contentorizada.
No que diz respeito ao tráfego de cruzeiro temos cerca de 300.000 visitantes por ano, concentrados sobretudo no período de Outubro a Abril.
A CPA é uma empresa privada criada em 1981, com 95% das suas acções a pertencer ao governo de Curaçao
e 5% ao governo holandês. Os objectivos da empresa são: a regulamentação do tráfego portuário, a gestão das
infra-estruturas portuárias que representam o património da empresa e a promoção do porto no estrangeiro.
Para levar a cabo estas tarefas, a CPA tem várias filiais, incluindo empresas de rebocadores e a Curaçao Pilot Organization (CPO). Existem também a Curaçao Towage Company e ainda a Dutch-Caribbean Consultants que é uma
entidade privada em que 50% das acções pertencem à CPA e as restantes 50% pertencem aos holandeses.
No total, os activos da CPA elevam-se a cerca de 50 milhões de dólares americanos e o volume de negócios
chega aos 15 milhões de dólares.
A Curaçao Ports Authority tem um papel específico a desempenhar como parceiro do plano de desenvolvimento urbano e catalisador dos novos esforços de revitalização urbana, tencionando investir, designadamente, na construção e reabilitação de pontes e cais, e no desenvolvimento do turismo de cruzeiros.
O seu plano de negócios estabelece objectivos a médio e longo prazo e descreve as acções a realizar para
atingir esses objectivos, incluindo um manual de descrição de qualidade ISO (Organização Internacional de
Normalização) e o programa de acção comercial, envolvendo as actividades de negócios e de marketing, o
plano de recursos humanos, etc.
Para além disso, a autoridade portuária criou um grupo de trabalho para o turismo de cruzeiros envolvendo
vários parceiros locais, como o departamento de turismo de Curaçao, a Câmara de Comércio, etc., com o
objectivo de promover e desenvolver este sector de actividade. Na área do marketing portuário, a CPA em
conjugação com os serviços portuários de Curaçao e com a empresa de estiva, criou igualmente um grupo
de trabalho para dinamizar essas actividades.
Entidades privadas e parceiros institucionais têm vindo a contribuir significativamente para apoiar os nossos
esforços através de empréstimos e contributos privados. Foi assim possível reabilitar cais e docas com a ajuda
do governo holandês.
Entre 1998 e 2003, o sector privado investiu em novas mega instalações para acostagem de grandes navios, na
reabilitação da ponte sobre Waaigat, ligando Punda a Scharloo, e na dragagem da doca de Waaigat com o objectivo de criar, na baixa, uma marina segura para a acostagem de embarcações, estimulando ao mesmo tempo
o movimento de cruzeiros no nosso porto com o apoio de serviços de reparação e manutenção de iates.
Tal como muitos outros, o nosso governo está a atravessar uma fase financeira difícil e isso faz com que para
ultrapassar este desafio seja necessário o envolvimento do sector privado, o apoio do governo das Antilhas e
uma gestão rigorosa dos recursos de modo a assegurar que a CPA continue com as suas políticas activas de
desenvolvimento do porto de Willemstad e do centro urbano.
Com o grande enfoque no desenvolvimento do turismo, o governo de Curaçao pretende que Willemstad
continue a desenvolver-se como um grande ponto de atracção de nossa ilha. Se formos bem sucedidos,
antevejo uma nova era de ouro para a cidade de Willemstad e para o seu porto, no séc. XXI. ❘❙❚
Hamburgo tem um porto extremamente activo, que inclui um terminal de contentores muito movimentado. Estamos em segundo lugar na Europa, logo a seguir a Roterdão, e talvez no futuro possamos subir ao
primeiro lugar em termos de tráfego de contentores.
Por outro lado, tentamos manter as actividades portuárias bastante próximas do centro urbano, com o acontece com o porto de HafenCity, que é parte integrante da cidade, através de um tipo de desenvolvimento
misto, onde coabitam gabinetes relacionados com a actividade do porto, zonas de entretenimento, zonas
residenciais, etc.
O porto de HafenCity caracterizava-se há vinte anos pelas suas actividades portuárias e industriais ( fábricas,
estações de gás, etc ).
ATELIER 5
105
Otrobanda
Zona ribeirinha de Punda
Intervenção de
Reiner Nagel
Director Executivo Adjunto
do Hafencity Hamburg GmbH, Alemanha
Animação das zonas ribeirinhas
e ordenamento dos espaços
públicos em Hamburgo
Porto de Hamburgo
Nos anos 80 e 90 iniciou-se uma estratégia de mudança com o objectivo de associar a zona histórica que se
desenvolveu ao lado do rio com a zona portuária. Neste contexto, a cidade de Hamburgo decidiu, em 1998,
assumir a posse desta zona específica e financiar a recuperação das infra-estruturas.
Conseguimos aliar as vantagens da cidade mercante que caracterizava HafenCity e o centro da cidade,
aproveitando as mais valias do bairro e a sua atmosfera, e recuperando-o como espaço público com vias
pedonais, pontes, estradas, etc.
A localização de Hamburgo expõe a cidade a inundações provocadas pelo caudal das marés – 3,5 metros
– obrigando, através de um sistema de diques e pontes a elevar de 4,5 metros para 7,5 metros, acima do
nível do mar, para manter os edifícios fora de situações de risco.
Sistema de diques e pontes
O projecto, todo ele pensado em termos de desenvolvimento do centro da cidade, associado às suas
funções metropolitanas, foi objecto de um concurso público para a requalificação desta zona, ganho por
Enrique Miralles e Benedetta Tagliabue. As zonas coloridas a vermelho e laranja estão neste momento em
construção; enquanto os edifícios a verde e a amarelo estão ainda em projecto.
A importância dos transportes públicos não foi descurada, tendo sido construída uma nova linha de metropolitano com o objectivo de levar as pessoas a visitar o distrito. Também o estilo arquitectónico foi orientado
tendo em conta a proximidade da água e a correcção de alguns erros cometidos nos anos 80, restaurando
os edifícios existentes ou construindo novos, mas sempre em harmonia com os elementos tradicionais da
envolvente urbana.
No que diz respeito à função cultural da cidade planeámos um centro de espectáculos, um museu marítimo,
um oceanário e um centro de exposições.
Outra questão importante é a do espaço público. Se tivermos 100ha de terrenos só podemos construir em
16 ou 17ha, ficando os restantes para espaço público. Assim, é extremamente importante requalificar os
pontões, os parques e a relação com a frente marítima, uma vez que o espaço público será o pano de fundo
para os utilizadores desta zona.
Projecto de recuperação do porto
As Marinas como Instrumento de Valorização dos Portos
ATELIER 5
107
Actividades em meio aquático
O conceito de aproveitamento lúdico do elemento água para HafenCity projecta-se em torno de funções
exercidas dentro do meio aquático, como por exemplo, uma marina de recreio, um porto para embarcações maiores, pontos de atracação para os ferries e zonas onde se podem visualizar alguns palcos flutuantes
para espectáculos e concertos.
Está já a funcionar um terminal de barcos de cruzeiro apoiado num edifício provisório, havendo que
esperar por 2009 para dispor de um edifício definitivo que funcione como retaguarda de apoio aos passageiros, que poderão desembarcar comodamente e visitar Hamburgo, dando uma nova vida à zona de
HafenCity.
Relativamente à relação nocturna do porto com a cidade, é importante que exista iluminação nos passadiços de modo a transmitir uma atmosfera mística ao local, onde a água será apenas um espelho de luz no
horizonte.
Com projectos como este esperamos daqui a 20 anos poder trazer uma nova vida ao porto de HafenCity. ❘❙❚
A estrutura da administração portuária equatoriana é liderada pelo Conselho Nacional de Marinha Mercante
e Portos que é o organismo regulador de todas as políticas navais e marítimas do país, tendo como entidade de supervisão a Direcção Geral da Marinha Mercante e do Litoral, seguindo-se, nos outros lugares
da hierarquia, as entidades portuárias – quatro públicas e nove privadas – responsáveis pela execução das
orientações.
O Equador tem uma orla costeira banhada pelo Pacífico, com uma extensão de cerca de 700 km, onde se
localizam quatro portos públicos comerciais: o porto de Guayaquil (criado em 1958), o mais importante do
país, o porto de Manta (criado em 1966), o de Esmeraldas (criado em 1967) e o porto Bolívar (criado em
1970), que manipulam 95% do volume de carga do comércio exterior no Equador.
A cidade de Guayaquil, na província de Guayas, tem aproximadamente 2,5 milhões de habitantes e nela está
a ser desenvolvido um projecto de recuperação urbana que acompanha o desenvolvimento do porto, um
dos onze principais portos da América do Sul e das Caraíbas, movimentando cerca de 70% da carga gerada
no país - 5.600 milhões de toneladas de carga geral e cerca de 470 mil TEU’s/ ano e 80 milhões de dólares
por ano. No primeiro trimestre de 2004 houve um aumento de 22% no volume de carga, comparativamente ao observado em períodos anteriores, enquanto no segundo trimestre o aumento foi de 20%.
O porto de Guayaquil, localizado a 10 km da cidade com o mesmo nome, começou a operar em 1958,
durante o governo do presidente Camilo Ponce Henríquez. Desde então, a cidade foi ajudando a construir um porto à sua dimensão, capaz de receber todo o género de mercadorias e de se assumir como
pólo exportador de produtos nacionais, sem que essas valências interfiram excessivamente com as áreas
urbanas.
Palcos flutuantes
HafenCity
Intervenção de
José Davila
Gerente da Autoridade Portuária de Guayaquil,
Equador
O caso de Guayaquil – Equador
Porto de Guayaquil
Malecón
Zona balnear La playita
O terminal portuário opera numa área com cerca de 250ha, dos quais 97ha correspondem a áreas já construídas, estando os restantes reservados para desenvolver uma zona franca, uma área de movimentação
de contentores, novos molhes e infra-estruturas portuárias. Dispõe ainda de um terminal multiusos, um
terminal de contentores e um outro de carga a granel.
A profundidade do canal de navegação de acesso ao terminal marítimo é de 9,75 metros na maré mais
baixa, tem início na entrada do golfo, e apresenta-se como uma via interior de água calmas, praticamente
com ausência de ventos durante todo o ano, o que constitui um excelente abrigo da acção das correntes e
dos ventos
Guayaquil e o seu porto estão ligados por uma história comum, que não pára de crescer como o demonstra a modernização das infra-estruturas e a construção de uma grande doca de passageiros, decidida pela
autoridade portuária.
Malecón, o passeio da zona ribeirinha que fica perto do rio Guayas, é uma das duas vias de acesso à cidade
de Guayaquil. O mar dista da cidade 51 milhas, o que constitui um dos seus grandes inconvenientes, dada a
necessidade de dragagem e manutenção anual, função que fica a cargo da autoridade portuária.
O governo juntamente com a autoridade portuária construiu também a zona balnear de La Playita, destinada
a pessoas com menos recursos, que não se podem deslocar às nossas belas praias no litoral equatoriano.
Estamos actualmente a fazer grandes investimentos no porto – 7 milhões de dólares – especialmente relacionados com o código de protecção dos navios e a segurança das instalações portuárias, por imposição
da Organização Marítima Internacional (IMO). Este grande investimento tornou o porto muito competitivo,
capaz de concorrer com qualquer instalação portuária internacional em matéria de controlo de segurança
das operações de manuseamento de cargas.
No futuro pretendemos entregar a concessão do porto de Guayaquil a um único operador que nele pretenda investir, podendo este ter um ou mais operadores a prestar serviços. O modelo a adoptar na concessão
do porto é do tipo landlord, ou seja, a autoridade portuária assume a sua propriedade, enquanto o concessionário presta serviços a quem o solicite, sem discriminação e com base nos trâmites contratuais.
Actualmente o porto de Guayaquil dá à cidade aquilo que em tempos a cidade lhe deu; faz dela a cidade
mais importante do Equador, motor do desenvolvimento do comércio externo, com um assinalável desenvolvimento urbano e social. ❘❙❚
As Marinas como Instrumento de Valorização dos Portos
ATELIER 5
109
Equipamentos Públicos,
Privatização, PPP...
Questão de Dinheiro ou de Ambição?
As inter-relações cidade/porto e os elementos patrimoniais que lhes estão afectos suscitam
intervenções urbanas complexas. Os custos de reabilitação das infra-estruturas e de gestão são
elevados. Por isso, é preciso definir na fase de negociação com os potenciais investidores quais
as modalidades de parceria entre o sector público e o sector privado que se podem desenvolver sem comprometer uma lógica de desenvolvimento sustentável para cada zona portuária.
• Quais as diferentes etapas a prosseguir no processo de valorização do património portuário?
• Como identificar o conjunto dos elementos patrimoniais e associá-los à população, de
modo a ser possível uma tomada de consciência colectiva sobre a sua importância?
• Que opções técnicas e financeiras são oferecidas aos gestores do património edificado,
para que a sua valorização se inscreva numa realidade económica aceitável?
• Que parcerias são possíveis de realizar entre os sectores público e privado e quais os
riscos associados?
Hoje em dia, as diferenças entre as práticas públicas e privadas são difíceis de identificar.
• Pode-se considerar privado o equipamento gerido por uma empresa privada num espaço público?
• É suficiente a declaração de utilidade pública para que um equipamento privado possa
ser considerado de interesse público?
• Quais são os limites das privatizações?
• Há empresas privadas que detêm parcerias com o sector público. Será que a sua participação no capital social pode realizar-se através da venda livre de acções por si detidas?
• Podem vender-se livremente as acções de uma empresa pública cujos activos resultam
da expropriação de terrenos?
As respostas a todas estas perguntas suscitam imediatamente debate. Não se pode pensar que
operações desta dimensão sejam realizadas exclusivamente pelo sector privado, ou por iniciativa
pública. É importante que exista uma liderança pública que pode assumir naturezas diversas: administração local, regional ou central, outras entidades públicas. Em muitos sistemas jurídicos do
mundo a figura da concessão administrativa destes espaços permite, também, regular a excessiva
especulação económica que pode surgir. Evita também que as mais valias geradas fiquem nas
mãos do sector privado. Este tipo de projectos de reabilitação desenvolvem-se em várias fases,
com prazos difíceis de cumprir, atendendo a que os terrenos têm de ser requalificados, e há todo
um conjunto de serviços a prestar, nomeadamente a execução dos acessos, que exige tempo. As
parcerias público / privado são uma preocupação da Comissão Europeia desde 1994, procurando-se definir desde então um conceito de gestão público-privado que vai desde o contrato de
construção até à concessão administrativa. O objectivo é acordar sobre a divisão das responsabilidades, riscos e benefícios entre o sector público e o sector privado, de modo a fazer aprovar
uma directiva europeia sobre a matéria. ❘❙❚
ATELIER 6
José Pablo Rodriguez
Marin Sastre
Gerencia Urbanistica Port 2000, Barcelona, Espanha
Presidente da Mesa
Intervenções de
Patrice Vergriete, Denis Cronier
e Nicolas Joncquel
AGUR – Agence d’Urbanisme de Dunkerque, França
Que futuro para o património
portuário de Dunkerque?
Edifício dos Estivadores
Dunkerque é uma cidade portuária do norte de França, com um aglomerado populacional de cerca de 200
mil habitantes. A zona industrial do porto está, desde há cerca de 20 anos, a ficar progressivamente abandonada, em benefício do porto moderno a oeste da aglomeração urbana.
No fim dos anos 80, do outro lado do canal de entrada do antigo porto localizavam-se os estaleiros navais,
que foram encerrados em 1987. Face a esta deslocação do porto e ao encerramento dos estaleiros navais
como é que as autoridades actuaram no princípio dos anos 90? Lançaram um projecto importante – o projecto Neptune – de recuperação dos terrenos libertados pelos estaleiros navais e pelo porto e fizeram deles
o coração da cidade.
Para o efeito, foi definido um plano director e houve várias adaptações ao longo do tempo. Previa-se o desenvolvimento de um centro marítimo, o que permitiu aumentar a actividade comercial do centro da cidade,
o aparecimento de uma universidade junto da cidadela, de um museu ao lado de uma pequena marina e de
um certo número de edifícios. As primeiras operações de realojamento mostraram que havia mercado para
que este projecto funcionasse.
Esta iniciativa e a relocalização do porto induziram-nos a uma questão ainda mais decisiva sobre o património. Durante a primeira década os projectos de transformação patrimonial tiveram dificuldade em obter
consensos junto da edilidade local, da autoridade do porto e de certas associações. Nesses momentos os
debates só funcionaram numa lógica casuística, quando se demolia um edifício, ou quando havia perigo de
desaparecimento de qualquer memória patrimonial.
No entanto, apesar dos trabalhos de classificação de elementos de referência portuária e da defesa da conservação do património feita pelas colectividades locais, este período também resultou em algumas demolições. Há cerca de seis ou sete meses foi demolido o escritório central das manobras dos estivadores, que
talvez tenha sido o ponto de viragem desta intervenção, atendendo a que o método casuístico não podia
continuar a ser a base das políticas patrimoniais.
As colectividades locais e a autarquia de Dunkerque queriam mudar de paradigma e pensar na estabilização
de uma verdadeira política patrimonial. Tornava-se necessário estabelecer uma base de diálogo como forma
de exercício de poder e ter uma visão global sobre a conservação dos antigos edifícios portuários e a sua
futura utilização.
Uma das especificidades de contexto em Dunkerque é o facto de o centro da cidade ter sido destruído a
80% durante a II Guerra Mundial. Fenómeno este repetido várias vezes durante outras guerras.
Outra das diferenças assenta na rapidez do desenvolvimento do seu porto, projectado em várias fases. Em
1935, para leste, o desenvolvimento industrial para oeste, em 1965, e a partir de 1975 a implementação
do porto moderno, com uma frente de 17 km de comprimento, directamente acessível aos barcos sem
necessidade de exclusas.
O porto ficou cada vez mais activo, o tráfego de carga é cada vez maior – acima de 170 mil toneladas – mas
a cidade está afastada deste património comum.
Outro elemento importante que marca a vida em Dunkerque é o encerramento dos estaleiros navais em
1987, com a eliminação de 3 mil postos de trabalho, que abalaram economicamente a população residente,
para além de terem posto em causa uma tradição que assegurava a todas as famílias de Dunkerque, pelo
menos uma pessoa a trabalhar para os estaleiros ou para empresas associadas aos estaleiros.
O consenso geral que surgiu à volta do projecto Neptune, no início dos anos 90, foi no sentido de dar um
futuro a Dunkerque: “casar” com o seu porto histórico e minorar os traumas do encerramento dos estaleiros
e da crise económica.
Esta ideia também se alargou ao sector imobiliário, com um acordo entre os parceiros - cidade, sociedade
civil e porto - para transferir a propriedade imobiliária do porto para a cidade e permitir, assim, a reconversão
das instalações portuárias em lugares urbanos.
Outro elemento presente no contexto de Dunkerque são os modos de protecção do património do porto
através da Base Mérimée, um inventário estabelecido pelo serviço estatal que recenseia todos os bens patrimoniais ( faróis, docas, edifícios ) por razões de interesse público.
Ainda outro factor a ter em conta são os riscos industriais. Dunkerque é uma cidade industrial enorme pelo
que é necessário ter isso em atenção quando se fala em urbanismo. Há determinadas zonas em que a reconversão dos edifícios portuários não pode ser destinada à habitação devido aos riscos de contaminação
industrial; é necessário, por isso, que haja perímetros de segurança entre as zonas industriais e as zonas
habitacionais.
Equipamentos públicos, privatização, PPP...questão de dinheiro ou de ambição?
O facto que provocou a maior crise foi a demolição das instalações centrais dos estivadores antes da reforma
do seu estatuto, em 1992, que gerou conflitos muito intensos entre os partidários pró e contra a demolição:
o porto que queria encontrar um terreno para desenvolver outras actividades, as instituições que tinham
dificuldade em encontrar projectos credíveis para serem financiados, os estivadores que encontravam neste
sítio um símbolo de opressão e os defensores da salvaguarda do património arquitectónico.
Este importante conflito levou-nos a propor como método de trabalho, um ano para reflectir sobre a criação
de um programa partilhado à volta de três eixos:
• Debate público aberto a toda a sociedade civil;
• Aprendizagem e partilha de saber – organização de conferências com a universidade do litoral,
definição dos termos de referência para o património e partilha de conhecimentos sobre este tema;
• Sensibilização, apropriação dos espaços e valorização patrimonial – organização, por
exemplo, de visitas às docas para devolver aos habitantes o gosto de contactar com o porto.
Era importante associar todos os actores nesta tarefa: o Estado, as entidades portuárias enquanto proprietários do
património físico, as instituições universitárias e culturais para avaliar os projectos de reconversão e utilização do
património, as colectividades organizadas, como as associações e federações e a população de Dunkerque.
Neste contexto, já realizámos debates públicos e conferências em parceria com a universidade, lançámos uma revista
trimestral que dá informação regular à população sobre a conservação do património. Organizámos, também, debates e audições com os agentes interessados, inclusive profissões representadas como, por exemplo, os estivadores.
A autoridade portuária quis também contribuir para o debate apresentando uma lista com as demolições
mais urgentes e promoveu uma conferência de imprensa para defender que o porto não se opõe à conservação do património, indo participar em todos os projectos de desenvolvimento, mas com a condição básica
de que sejam globais e financiados em conjunto.
É importante também sensibilizar o público para o património portuário; não o que está no centro da cidade, mas
o que existe no actual porto industrial. Desenvolvem-se nesses espaços programas culturais, como por exemplo
espectáculos no Le Bateu-Feu, exposições no Fundo Regional de Arte Contemporânea, reedição de textos sobre as
memórias dos estivadores pela Companhia dos Mares do Norte e prevê-se o alargamento do museu portuário.
Outro aspecto importante que podemos retirar destes debates tem a ver com a iniciativa privada que começou a explorar um edifício do porto que estava abandonado, através de uma associação de jovens artistas
que o recuperou para aí exercer a sua arte. Isso contribuiu para que uma doca enorme, já sem actividade, se
convertesse num lugar cultural muito importante, onde há exposições e uma vida artística muito própria.
No âmbito do debate patrimonial era necessário entrevistar estas associações, pedir a sua opinião e conhecer os seus
projectos, pois era preciso integrá-los num programa de intervenção cultural em torno de algumas propostas:
• Uma rede europeia de artistas das cidades portuárias;
• Implementação de um sistema de trocas culturais técnicas e físicas;
• Implementação de um sistema de arte monumental nas docas.
Neste sentido, pode-se dizer que a iniciativa privada veio valorizar o património portuário.
Depois dos debates e das audições públicas, tomámos consciência de que também existe um património
imaterial: a história, as paisagens, os ambientes, as tradições, as profissões, de difícil conservação, na opinião
dos nossos interlocutores, e fazendo parte de uma memória muito volátil.
Em resumo, o projecto Neptune não pode consistir apenas numa acção de reabilitação, é necessário estabelecer parcerias, alargar o seu público, encontrar soluções financeiras e dispor de visão abrangente, para que
o sucesso possa ser atingido. ❘❙❚
O porto de Ravenna é, hoje em dia, um dos mais importantes da Europa e um dos principais portos de
Itália com 25 milhões de toneladas movimentadas, líder no tráfego de cereais, alimentos e adubos, mas
também no de produtos metalúrgicos e barro para a indústria cerâmica. Ravenna tem ligações com o
resto do mundo e lidera no comércio com o Mediterrâneo Este e o Mar Negro (com cerca de 30% do
total nacional).
Este porto é também líder no transporte de cabotagem no Mar Adriático e tem ligações com Catania, tendo
recentemente lançado uma nova ligação com o porto croata de Rijeka, utilizando um navio ro-pax, isto é,
uma ligação com a rede de transportes Pan-European utilizando o Corredor n.º 5, ramo B.
ATELIER 6
Edifício portuário
Doca flutuante - Património portuário
Edifício recuperado por iniciativa privada
Intervenção de
Mariliana Moschona
Autoridade Portuária de Ravenna, Itália
A revalorização
das docas de Ravenna:
programação e localização
do património construído
113
Porto e centro da cidade de Ravenna
Parque Theodoric e Mausoleum
A área do porto estende-se por 2.080ha (dos quais 1.500ha já estão urbanizados ou em processo de urbanização) e 580ha de frente de mar. Ao longo dos cais, que se estendem por uma superfície total de 12,5 km,
com profundidade de 10,5 metros até San Vitale, vinte empresas receberam autorização para trabalhar este
ano (como operadores de terminais) utilizando tecnologia moderna para carregar e descarregar diversos
tipos de produtos.
Ravenna surgiu recentemente no sector de cruzeiro. Em 2003, cerca de 50 mil passageiros de cruzeiros
embarcaram ou desembarcaram no seu porto.
A autoridade portuária, foi criada por decreto-lei em 1994 e desempenha um papel importante no planeamento, concepção e execução de infra-estruturas necessárias para o desenvolvimento do porto.
O Plano Director do porto prevê que as intervenções podem ser divididas em três categorias:
• Acessibilidade pelo mar e condições de segurança, ou seja, aumentar a profundidade do porto até
11,5 metros, alargar o canal, construir zonas de rotação, iluminação e sistemas de gestão de tráfego marítimo;
• Construção de novos terminais portuários (como cais, estaleiros e outros projectos urbanísticos);
• Ligação com o hinterland, ou seja, a melhoria dos acessos, execução de infra-estruturas de caminhos-de-ferro e rodovias no interior do porto e com ligação com as redes nacionais.
As autoridades portuárias adquiriram recentemente o terminal de passageiros (que se tornou operacional em
2001) com o objectivo de alargar a actividade da infra-estrutura existente.
Esta área, em grande parte envolvida nas actividades industriais e portuárias, e já abandonada, é definida no
Plano de Geral Desenvolvimento da Cidade de 1993 (Piano Regolatore Generale di Ravenna 1993 – PRG’93)
e no Programa de Requalificação Urbana para as Docas da Cidade de Ravenna, estende-se desde o Candian
Canal e cobre os 12 km desde o Porto Cosini até à estação de caminhos-de-ferro de Ravenna, junto ao
centro da cidade.
A zona de docas ocupa 136ha e estende-se por 1.600 milhas. A zona ocidental encontra-se junto ao centro
da cidade, confrontando-se a parte sul com os seus limites. Do lado norte, as docas ficam junto a áreas
urbanas, onde está a importante presença arqueológica do Mausoleum Theodoric. A parte industrial do porto
de Ravenna encontra-se do lado oriental, sobre a parte mais antiga do canal, e entrou em actividade no fim
do séc. XIX, início do séc. XX, com a construção da linha-férrea Bolonha-Ravenna.
Aproximadamente 12ha dos 136ha das docas correspondem à área do Candian Canal, onde cerca de 100ha
são propriedade privada, 14ha pertencem às autoridades locais e cerca de 10ha são do Domínio Marítimo.
A zona mais importante corresponde às actividades portuárias: são 32ha que ocupam uma área útil de cerca de
210.000 m2. Cerca de um terço destas actividades estão a ser alvo de um processo de encerramento definitivo.
O Plano Geral de Desenvolvimento da Cidade está a ser articulado com o Programa de Requalificação
Urbana (PRU) para a elaboração de um plano específico para as docas, que inclui uma zona verde à volta da
cidade, a fim de redefinir os seus limites urbanos e ao mesmo tempo limitar a sua expansão.
As áreas verdes, de acordo com a lei, têm uma capacidade de construção de 0,1 por m2, que pode ser
utilizável no caso de haver acordo de transferência para as áreas das docas.
Estão previstos prémios e incentivos para os proprietários destas subdivisões nas docas, de acordo com
o Plano Geral de Desenvolvimento da Cidade, como motivação para aceitarem as mudanças programadas.
O PRU para as docas prevê a transformação completa de da área portuária em zona residencial, de acordo
com o projecto do Plano Geral de Desenvolvimento da Cidade, a ser levado a cabo por proprietários privados no respeito pelos planos de pormenor elaborados para o efeito.
Em apoio ao PRU existem mais cinco sub-projectos:
• O Parque Theodoric – prevê-se um aumento de cerca de 10ha no parque existente na zona do
Mausoleum. O trabalho foi completado no ano 2000;
• A reclamação do Candian Canal - para recuperar o canal e o cais, incluindo um sistema de
saneamento básico;
• A Requalificação dos distritos de habitação subsidiada, (Via Trieste), sobretudo a inclusão de
áreas ao ar livre;
• A intervenção na estação dos caminhos de ferro - com ligação às docas para eliminar a barreira
entre estas duas zonas da cidade;
• A arqueologia industrial - com recuperação do património mais importante edificado pelo porto,
para utilização pelas universidade ou outros serviços públicos e/ou privados. Estas intervenções são feitas
pelo sector privado, embora com contribuições públicas na base de 30% ou 50%.
Equipamentos públicos, privatização, PPP...questão de dinheiro ou de ambição?
ATELIER 6
Os 5 sub-projectos
do Programa de Requalificação Urbana
A zona das docas tem-se subdividido em três faixas que correspondem a combinação de actividades residenciais e comerciais.
O PRU opera numa perspectiva de médio/ longo prazo ( 20/25 anos ), pois este será o calendário necessário
para completar uma operação tão complexa e ambiciosa;
As primeiras duas fases envolverão a municipalidade e outros organismos públicos e privados durante um
período de 15 anos, de 1995 a 2010.
Todas as actividades precisam de ser completadas mas, dependendo a sua conclusão de investimentos efectuados mais recentemente, foram colocadas na terceira fase da intervenção no terreno. Existe ainda uma
quarta fase, para os operadores que pediram que as suas actividades ficassem na área das docas.
O Programa de Requalificação Urbana tem as seguintes características:
• As artérias principais estão localizadas nos limites da área;
• A rede viária interior é diferenciada. Há avenidas largas com árvores dos dois lados, que atravessam as
duas zonas do canal com uma função específica: formar uma área central pavimentada, com árvores, bancos, fontes, restaurantes e pequenos negócios e lugares de lazer, transportes públicos etc. Ambos os lados
do canal serão destinados a peões e ciclistas, existindo apenas um só sentido destinado ao trânsito lento;
• Os edifícios terão actividades comerciais: lojas, bancos, escritórios, etc.
O projecto de Arqueologia Industrial foi elaborado directamente pelo município e engloba o património
edificado, localizado no interior das docas, ao qual foi dada prioridade no Plano Geral de Desenvolvimento da Cidade, atendendo à investigação universitária e aos institutos de pesquisa. A intervenção está
a ser feita por investidores privados com a contribuição do sector público, que varia entre 33% e 49%
dos custos, trabalhando em estreita colaboração com a Universidade de Bolonha, que se comprometeu
a gerir a estrutura e a fornecer os acabamentos e os pormenores.
Alguns dos edifícios, que são propriedade da capitania do porto, fazem parte da terceira fase deste projecto: a Refinaria Almagià, o Edifício Platani, a Nova Pansac e a Cooperativa Muratori Cementisti (CMC).
Os Silos Granari estão localizados a nordeste. Do lado norte, há ainda o edifício de escritórios da capitania do porto e a Fiorentina S.R.l., edifícios da primeira e segunda fase.
As actividades já realizadas e a calendarização do programa, bastante dilatada no tempo, permite identificar, minimizar ou resolver alguns dos problemas que ainda existem, como por exemplo:
• Necessidade de coordenação entre o Estado e os diversos sectores;
• Aumento da capacidade do Município para investir;
• Coordenação dos planos de investimento público;
• Coordenação com os particulares e grandes empresas;
• Necessidade de controlar os acordos feitos com os particulares;
• Ultrapassar os obstáculos criados pelos proprietários;
• Necessidade de identificar locais estratégicos.
Programa de Requalificação Urbana
115
A transformação das docas requer a saída das actividades incompatíveis e a transformação das áreas degradadas;
requer também que seja criado um ambiente agradável e uma atmosfera urbana atractiva. E aqui, existem dois
imperativos: em primeiro lugar, é essencial que o tráfego do porto termine - são movimentadas anualmente
cerca de 720 mil toneladas de mercadorias - assim como a retirada de certas actividades das docas e que se
proceda à limpeza das águas do canal. O segundo imperativo, é a procura de uma arquitectura de qualidade.
O Município de Ravenna tem pensado sobre várias hipóteses para a gestão do empreendimento: intervenção directa da autarquia, ou através de uma agência especializada, criando para o efeito algumas empresas
para ajudar na transformação da cidade de acordo com os projectos existentes, se os proprietários privados
não quiserem assumir eles próprios a implementação do plano da cidade. O caderno de encargos contempla
as seguintes actividades:
• Monitorização e transformação dos processos;
• Coordenação das partes envolvidas ( intervenção pública e privada );
• Disponibilização dos fundos necessários à partilha de responsabilidades (público –privado);
• Gestão de expropriações:
• Planeamento e locação dos contratos;
• Promoção de iniciativas para aumentar a qualidade e o interesse pela área.
Os parceiros institucionais que vão estar envolvidos podem ser divididos em dois grupos. O primeiro engloba as instituições ( públicas e privadas ) convidadas a participar no capital social e que já declararam essa
vontade. O segundo, é composto por entidades que embora não estejam presentes na estrutura accionista
poderão cooperar com a Agência.
O primeiro grupo é formado pela Autoridade Portuária, agência de habitação Azienda Casa Emilia-Romagna
(ACER), Câmara de Comércio e Indústria e Província de Ravenna.
No segundo grupo, estão a Capitania do Porto, os Caminhos-de-Ferro e a Enel, organizações ou empresas
controladas pelo Estado que podem gerir áreas dentro do perímetro das docas que irão ser intervencionadas
no âmbito do programa de requalificação. ❘❙❚
Intervenção de
Fernando Menendez Rexach
Presidente da Autoridade Portuária de Gijón, Espanha
As parcerias público-privadas
e a relação cidade/ porto.
As experiências do porto de Gijón
e o projecto NEW-EPOC
Porto de Gijón
A cidade de Gijón está situada no norte de Espanha e tem uma população de cerca de 300 mil habitantes. A
cidade antiga tem uma história de mais de vinte e cinco séculos com antecedentes celtas, romanos e visigodos. A cidade moderna começa a configurar-se a partir do Renascimento (séc.XVI).
O porto de Gijón tem um tráfego de 20 milhões de toneladas/ano de produtos como o carvão, o cimento,
o petróleo, produtos químicos e carga geral.
Os principais clientes são as grandes empresas, a maioria das quais estão localizadas nos arredores da cidade
de Gijón.
A construção no séc. XVI do Puerto Local, apoiado na barreira ocidental do Cerro de Santa Catalina, iniciou
o desenvolvimento portuário da cidade, que até ao final do séc. XX esteve limitado às ampliações do mesmo. Em meados do séc. XIX, o porto velho converteu-se num factor básico para a localização da primeira
industrialização. A maior parte das construções fabris nessa época, localizavam-se num triângulo delimitado
pelos caminhos-de-ferro do Noroeste e de Langreo e pelo mar.
Nos primeiros anos do séc. XX começa a construção do porto de El Museu ao abrigo do Cabo de Torres,
no extremo ocidental da baía, pelo que toda a zona de costeira entre os dois portos passou a ser zona portuária, fechando-se, assim o acesso da cidade a esta zona.
Como consequência, o desenvolvimento urbano das zonas residenciais dirigiu-se para Este e ocupou os
areais da praia de San Lorenzo. A partir de 1980 e em simultâneo com a crise industrial, um novo conceito
de urbanismo fez aumentar a pressão para a libertação da orla costeira subutilizada e ocupada por instalações
industriais obsoletas.
Na posse destes dados, a autoridade portuária responsável pela gestão da frente costeira compreendida
entre o Cerro de Santa Catalina e o Cabo de Torres, tomou a iniciativa de recuperar para a cidade os espaços
portuários que não estavam a ser utilizados, começando pela transformação do antigo Puerto Local em Puerto
Deportivo, actuação que culmina em princípios de 1990.
Paralelamente, iniciaram-se estudos para tentar recuperar a frente de praias que existiu até ao final do séc.
XIX entre o porto e El Museu. Nesta zona a areia tinha desaparecido devido à existência de instalações
industriais e à construção de muros e diques para proteger os aterros ganhos ao mar.
Equipamentos públicos, privatização, PPP...questão de dinheiro ou de ambição?
Aproveitando o espaço libertado pelo abandono de alguns ocupantes, projectaram-se praias; a de Poniente,
adjacente e na continuidade do porto desportivo, com uma área seca de 60.000 m2 e a de Arbeyal, apoiada
no dique de La Osa, com uma superfície de areia seca de 28.000 m2.
Com a construção das novas praias, que propiciaram a abertura ao mar de toda a zona Oeste da cidade e a
transformação do Puerto Local e do Puerto Deportivo, deu-se lugar à deslocação do desenvolvimento urbano
de Gijón, tradicionalmente dirigido a Este, para as zonas limpas do areal de San Lorenzo, e recuperaram-se
espaços urbanos na zona Oeste que o desenvolvimento industrial tinha degradado e afastado dos cidadãos.
A Autoridade Portuária de Gijón tem as suas actividades gestionárias reguladas pela Lei de Portos 40/1992,
com posteriores alterações em 1997 e 2003. O modelo vigente promove a privatização dos serviços, mas
não do espaço portuário, que é gerido como domínio público mediante autorizações e concessões a empresas privadas, públicas ou mistas.
As autorizações estão sujeitas a uma prévia concessão outorgada pela Autoridade portuária de Gijón e dizem
respeito às actividades que se desenvolvem no espaço portuário que não necessitem de obras ou instalações
específicas e a ocupação do domínio público portuário com instalações desmontáveis ou com bens móveis,
sujeitos a prévia autorização da autoridade portuária. O prazo de vencimento será determinado nos contratos de concessão, mas não excede os três anos, a não ser em casos excepcionais.
Projectos realizados desde 1986:
• Dique de Santa Catalina (1986) – O Puerto Deportivo está protegido da ondulação excessiva das marés
pelos diques verticais de Santa Catalina a Este e Curvo a Oeste.
• Dársena de Fomentín (1988) – Como complemento do projecto anterior, projectou-se para a doca del
Fomentín um talude para evitar perturbações no interior do porto;
• Edificio de La Rula (1990) – O edifício da antiga alfândega do porto, construído em finais do séc. XIX ,
já foi alvo de várias reformas, e é composto por um corpo central e duas naves dispostas simetricamente.
No corpo central do novo edifício funcionam os serviços da administração geral do Puerto Deportivo e
na ala oeste localiza-se um restaurante. A ala este está afecta a sala de exposições Antigua Rula, onde a
autoridade portuária organiza, desde 2002, três eventos anuais.
• Muelle de La Madera (1992) – O molhe de La Madera configura-se como uma extensão do edifício
de La Rula.
• Paseo del Muelle (1992) – O passeio da Rua Claudio Alvargonzález, Paseo del Muelle, configura-se como
um passeio tradicional; está separado da estrada por um parque de estacionamento e uma linha contínua
de árvores com bancos intercalados.
• Doca de Fomento (1994) – É uma zona de águas calmas que foi aproveitada para ganhar espaço ao
mar, através da edificação de uma ampla plataforma onde podem assentar edificações e serviços relacionados com a actividade desportiva.
• Playa de Poniente (1995) – Como complemento ao Puerto Deportivo, a autoridade portuária e a
Câmara Municipal de Gijón promoveram a construção desta grande praia artificial na zona dos antigos
estaleiros navais.
• Playa del Arbeyal (1995) – Esta praia é parte integrante do Plano Integral de Saneamento da zona de
Gijón, apostado em recuperar toda a frente marítima que nos finais dos anos 80 tinha vocação industrial
e estava de costas voltadas para a cidade.
• Paseo Poniente (1996) – O dique curvo de Fomento fecha o porto a oeste e prolonga o seu limite até
ao início da Rua Mariano Pola.
• Paseo de Fomento (2002) – Aqui localiza-se a Estação Náutica Gijón Costa Verde, que oferece muitas
possibilidades para desfrutar da cidade e dos seus arredores. O seu objectivo é a promoção e o desenvolvimento do turismo náutico da zona; oferecendo todo o tipo de actividades ligadas ao mar e outras
complementares, dirigida tanto aos visitantes como aos habitantes de Gijón, mediante concessões a
empresas privadas de hotelaria.
• Aparcamiento de Fomento (2002) – A escassez de lugares de estacionamento no centro das cidades
portuárias é um problema comum que tem tendência a agravar-se no Verão. Por baixo do Paseo de
Fomento construiu-se um parque de estacionamento, que oferece um importante serviço urbano.
• Quinta La Veja (2004) – Este edifício do bairro de Jove estava abandonado, numa zona sem valor urbanístico. A autoridade portuária reabilitou-o e hoje é sede do Instituto Portuário de Gijón, que se dedica
à formação, ao meio ambiente, à qualidade e à investigação.
ATELIER 6
Paseo del Muelle
117
Farol de Cabo de Torres
Projectos em curso e previstos (2004 – 2008)
• Faro de Cabo Torres (2004) – A autoridade portuária e o município de Gijón firmaram, em 2002, um
convénio de colaboração com o objectivo de promover uma acção com vista ao desenvolvimento do
Parque Arqueológico de la Campa de Torres, que inclui a reabilitação do Farol de Torres equipado com
escritórios, salas de exposições, arquivos e um observatório de aves marinhas. Prevê-se que abra em
2004, antes do fim do Verão.
• Centro de Recepción (2005) – Trata-se de um edifício construído em 1906, dedicado à produção de
energia eléctrica. Em Setembro de 2003 abriu-se um concurso público para o reabilitar. Está prevista a
entrega deste centro de acolhimento para o final do ano 2004.
• Acuario de Poniente (2006) – A construção do aquário de Poniente começou em Abril de 2004. Contará com 67 piscinas, sala de projecção, oficina de pedagogia e divulgação, restaurante panorâmico,
observatório de aves marinhas. Prevê-se a sua abertura em finais de 2006.
• Centro de Talasoterapia (2007) – Em Junho de 2004 acordou-se que a autoridade portuária cederia
ao município uma frente ribeirinha de 7.000 m2 entre o Dique del Oeste e a Praia Poniente, para que um
investidor privado construísse um centro de talassoterapia. Prevê-se a sua inauguração no ano 2008.
O Projecto NEW-EPOC 2003-2006 está a ser realizado na cidade portuária de Gijón, inserido no programa
INTERREG III. O seu objectivo próximo é analisar as experiências de cidades portuárias europeias com
processos de reconversão industrial, identificar modelos de comportamento, políticas de recuperação económica e iniciativas inovadoras, com o objectivo de transferir experiência e conhecimentos a outras cidades
portuárias que no futuro possam encontrar-se em situações semelhantes.
O programa INTERREG III destina-se à melhoria de políticas e técnicas que acelerem o desenvolvimento
regional e a coesão, mediante a conexão em rede, prestando especial atenção a regiões com baixos níveis
de desenvolvimento.
O consórcio NEW-EPOC é bastante alargado, incluindo várias instituições, municípios de Inglaterra, Espanha, França, Itália, Alemanha, Grécia, Rússia. Em Espanha, por exemplo, inclui a Câmara Municipal de Gijón,
a Autoridade Portuária de Gijón e o Museu Marítimo Ria de Bilbau.
O projecto destina-se a enriquecer os conhecimentos em áreas que podem ajudar à sua concretização:
• Desafio económico e urbano, que será a base de conhecimento para a tomada de decisões sobre os
modelos de desenvolvimento portuário, em matéria empresarial, de emprego e ambiental. Neste caso,
ocupa-se da recuperação da frente marítima da cidade, mediante a reutilização dos espaços portuários
abandonados ou degradados; por exemplo a recuperação de praias, Porto Desportivo de Gijón, Aquário
de Poniente e Centro de Talassoterapia.
• Património cultural, através de acções de preservação e valorização do património marítimo e portuário e das especialidades artesanais que deles derivam, como, por exemplo, a reabilitação do Farol de
Torres e das Ruínas de Tangón.
• Inclusão social, para melhorar a coesão uma vez que, muitas vezes, as mudanças económicas e sociais
conduzem à exclusão. Neste caso trata-se de reabilitar zonas urbanas socialmente degradadas. Por
exemplo, mediante a formação dos trabalhadores portuários em novas tecnologias – Quinta de La Veja.
O Porto de Gijón, foi, é e será um factor dinamizador na evolução económica, industrial e social da cidade de
Gijón. O seu desenvolvimento influenciará directamente o presente e o futuro da cidade. ❘❙❚
Equipamentos públicos, privatização, PPP...questão de dinheiro ou de ambição?
ATELIER 6
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Área Metropolitana de Lisboa
– O Regresso ao Rio
Todos sabemos que as cidades portuárias têm, em termos de atractividade, um sortilégio
muito especial. São territórios de encontros e desencontros, de chegadas e partidas e de
muitos relacionamentos, de intercâmbios de culturas, povos, ideias, mercadorias e afectos.
Lisboa é, seguramente, tudo isto; é uma cidade de muitos encantos, sedutora. Lisboa é a
cidade que acolhe esta conferência sobre um tema que também é de sortilégio porque as
paisagens e os territórios portuários são muito especiais.
Relativamente ao tema desta sessão, e antes de passar a palavra aos oradores, gostaria só de
recordar que em finais dos anos 80, princípios de 90, com o Dr. Jorge Sampaio na Câmara Municipal de Lisboa, uma das nossas preocupações centrais era a ligação da cidade ao rio. Foi um
tema objecto de muitas batalhas para conseguirmos ter na cidade de Lisboa uma zona ribeirinha, onde se pode, desde há uns anos, dispor do privilégio de passear e namorar à beira-rio.
Recordo que em 1989 o rio estava vedado à cidade pela administração portuária, assim
como pelas actividades portuárias e pelo respectivo património.
Depois de dois anos de tentativas junto da administração do porto de Lisboa e com propostas muito
concretas, o porto respondeu-nos com o Plano de Ordenamento da Zona Ribeirinha de Lisboa o
célebre POZOR. Era a prefiguração de uma zona de betão, substituindo a barreira das actividades
portuárias tradicionais por uma barreira de valorização imobiliária. Recordo este episódio como um
episódio de mudanças que têm sempre partos difíceis, não o recordo com qualquer animosidade
em relação ao Porto de Lisboa, até porque hoje a realidade é muito diferente. Contudo, também
recordo a importância da opinião pública e da participação nas questões do planeamento.
Nessa altura houve um forte contributo de diversos sectores da sociedade e da Câmara Municipal de Lisboa para resolver a questão do planeamento, mas foi fundamentalmente a opinião
pública que derrubou esse Plano de Ordenamento da Zona Ribeirinha de Lisboa; permitindo
que a zona ribeirinha do Tejo fosse usufruída pelas populações, e hoje aí temos as Docas de
Alcântara, o Parque das Nações, o Jardim do Tabaco e muitas outras zonas abertas ao rio.
Recordo que em 1989 o rio estava barrado à cidade pela administração portuária, assim como
pelas actividades portuárias, pelo património portuário.
É evidente que em Lisboa ainda falta fazer um grande esforço na zona central, particularmente
no Cais do Sodré, Terreiro do Paço e Santa Apolónia, a zona nobre da cidade, que em ligação
com a baixa tem de ser transformada num espaço para fazer reviver aquilo que é a zona histórica e a respectiva aproximação ao rio. Mas não é só Lisboa que tem sede de rio, como este
seminário tem demonstrado. Sabemos que desde Almada, com o Programa POLIS da Caparica, até Vila Franca de Xira, muitos outros municípios desenvolvem projectos e iniciativas com a
pretensão de criar novos espaços qualificados de relação dos cidadãos com a frente marítima.
É isso que as pessoas que têm trabalhado nesse sentido vão partilhar connosco. ❘❙❚
SESSÃO IV
António Fonseca Ferreira
Presidente da CCDRLVT, Portugal
Presidente da Mesa
Intervenção de
Teresa Craveiro
Directora do Dep. de Planeamento Estratégico
Câmara Municipal de Lisboa, Portugal
A importância de uma estratégia
cidade/porto na revitalização
da cidade de Lisboa
O tema proposto: Modernidade e Identidade das cidades portuárias constitui hoje para os dirigentes e
planeadores da cidade de Lisboa um dos grandes desafios, já que as Zonas Ribeirinhas, simultaneamente,
constituem áreas de oportunidade para fazer uma cidade moderna e multifuncional, reforçando a sua identidade no património natural e industrial.
Ao longo desta Conferência serão diversas as intervenções sobre o “processo” de Lisboa com início na
última década e no qual tive o privilégio de participar por parte do Município, retomando também agora o
enquadramento de novas áreas de articulação cidade-porto, onde se virá a exigir uma maior parceria entre
a Administração Portuária, a Cidade e os agentes económicos para que a monofuncionalidade portuária não
seja apenas substituída, por facilitismo, por uma outra emergente – bares e restaurantes – mas também pela
introdução da cultura e do lazer, etc.
Lisboa é actualmente o centro de um complexo sistema urbano e metropolitano situado nas margens do Tejo,
onde o espaço portuário marca a paisagem e as oportunidades económicas como define o Plano Regional de
Ordenamento do Território (PROT), aprovado em Resolução do Conselho de Ministros n.º 68/2002, de 8 de
Abril, e que o PDM de Lisboa, em revisão, está a incorporar no Modelo de Estrutura Espacial, nomeadamente no
que diz respeito à Qualificação Urbanística da frente ribeirinha e Ordenamento da logística urbano-portuária.
Mais do que simplesmente uma “cidade - estuário”, como muitas que há pelo mundo, Lisboa representa o
paradigma de um modo português de fazer cidade, ou seja, nasceu da “combinação de uma baía ou enseada
abrigada e de uma colina fragosa” constituindo portos de escala abertos a todas as gentes e mercadorias,
como sistematizou o grande geógrafo português Orlando Ribeiro.
Assim é a imagem de Lisboa: as Colinas, as “Baixas”, as “Altas”, a omnipresença do rio, que é como quem
diz, a abertura ao “Mar Oceano”, valor simbólico da partida dos portugueses para o mundo e do seu papel
na 1.ª globalização – as Descobertas.
O processo de industrialização, que a partir da segunda metade do século XIX, levou à expansão da cidade para
norte, determinou igualmente a regularização da frente ribeirinha, mercê do recurso a aterros, passando também a acolher as indústrias, ao lado das novas infra-estruturas portuárias, ambas servidas por eixos ferroviários
e viários que se implantaram paralelamente ao rio, constituindo, até á data, uma barreira visual e urbanística, que
nalguns troços deverá merecer uma avaliação para a retoma do enterramento da via ferrea, nomeadamente na
área classificada como Património Mundial, frente ao Mosteiro dos Jerónimos, onde nos encontramos.
Consequentemente o estuário do Tejo constitui um Património Global, em que estão presentes, não só os
recursos naturais e o seu valor económico, mas também a cenografia do rio com os elementos do património industrial associados à diversidade das malhas urbanas ribeirinhas e do sistema de vistas.
Assim, no Primeiro Plano Estratégico de Lisboa (1992) definia-se como uma das potencialidades da cidade a
sua localização geoestratégica, onde o Estuário do Tejo constituía um património global da cidade. Situada na
extremidade ocidental da Europa, Lisboa – e o seu porto – é um dos pólos das rotas mundiais de navegação,
o que a torna uma excelente plataforma de ligação entre os Continentes Europeu, Africano e Americano.
Também como estratégia assente estabeleceu-se a necessidade da “devolução do rio à cidade”, a bem da
qualidade de vida dos cidadãos, da afirmação e da projecção internacional desta Capital Atlântica da Europa.
Com efeito, o Município estabeleceu como objectivo estratégico para o Arco Ribeirinho, “ligar a cidade ao
rio” sem que isso signifique – bem pelo contrário – a subestimação do seu porto como elemento potenciador da actividade económica e do relacionamento com o exterior, com realce para a logística e terminais de
cruzeiros. Lisboa pretende, como tal, ganhar o rio sem perder o porto.
Numa 1.ª etapa, a actuação do Município de Lisboa neste contexto incidiu numa estratégia que designámos de “Colar de Pérolas”, lançamento de planos de ordenamento na envolvente da frente ribeirinha tendente à sua reabilitação
e requalificação, como foi o caso do Plano de Pedrouços e dos diversos Planos para a Área da Ajuda/Belém.
Simultaneamente, foi lançado um conjunto de operações prioritárias de carácter pontual e localizado, indutoras de processos de revitalização e requalificação tais como as passagens pedonais de Pedrouços e Rocha
de Conde de Óbidos e ainda o segmento mais nobre da envolvente da frente ribeirinha de Lisboa, entre o
Terreiro do Paço e Belém. O programa foi viabilizado mediante o envolvimento e empenhamento de um
vasto leque de agentes públicos e privados.
As operações prioritárias foram: Cordoaria - Reabilitação – função temática – Museu do Tejo; Standard
Eléctrica – Reabilitação; Alcântara-Rio – Programa urbanístico e soluções de acessibilidade ao porto;
Janelas Verdes - Passagem Pedonal; Aterro da Boavista - Programa urbanístico; Terreiro do Paço
– Projecto de requalificação, com saída do estacionamento automóvel.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
Estas acções permitiram que se fosse reforçando a articulação institucional entre cidade e porto, o que veio a contribuir para a redefinição das zonas portuárias de Alcântara e Santa Apolónia, pelas características naturais (profundidade dos fundos) e consequentemente, a permitir efectuar uma reconversão da zona ribeirinha não portuária,
iniciada a partir de 1992, com a introdução de novo usos urbanos. Apesar da polémica do Plano de Ordenamento
da Zona Ribeirinha (POZOR), em discussão pública em 1994 considero que o mesmo permitiu dar consistência
a este processo a que se seguiu a própria modernização do porto entre o período de 1995-2002.
Mas, porque a sustentabilidade da intervenção nestas zonas também pressupõe a multifuncionalidade, o Município
enfrenta agora novos desafios no diálogo com a APL (Administração do Porto de Lisboa) tendente à introdução
de funções de lazer, culturais e reforço da atractividade turística naqueles espaços, que no nosso ponto de vista
implicam parcerias com os novos segmentos de mercado, podendo também constituir “áreas de negócios”.
Não se trata de duplicar funções, trata-se de introduzir complementaridade. Assim, pensamos que o desafio
é muito mais forte, neste momento, do que foi no início porque tem de se encontrar a montante partenariados, consórcios para desenvolver áreas, algumas delas que pressupõem uma transformação brutal de
infra-estruturas, de descontaminação de solos, de novas actividades de tecnologia e de conhecimento e que,
portanto, não podem apenas ficar como planos, esperando pelo licenciamento, e pelo mercado, mas sim
com uma estratégia concertada previamente, onde o porto tem também um papel a desenvolver.
Nesta óptica passamos a identificar como Novas Áreas de Oportunidade de articulação cidade-porto:
Pedrouços - perdida a aposta da organização do America’s Cup 2007, pretende-se na área de Pedrouços-Algés
introduzir a multifuncionalidade da oferta de funções habitacionais, hotelaria, lazer no domínio da náutica e a criação de
novos sectores produtivos de tecnologia ligada ao mar, salientando-se a construção de um edifício que retome a simbólica das Portas de Algés. Esta intervenção exigirá um partenariado forte para a reconversão desta área da cidade;
Alcântara-Rio - Está em curso um Plano de Reestruturação com os seguintes objectivos:
1. Resolver a ligação à zona portuária adjacente mediante a articulação de projectos de passagens pedonais, incluindo a integração urbanística das infra-estruturas de transportes da zona e uma nova solução para o nó de Alcântara;
2. Definir as soluções urbanísticas adequadas à articulação da zona com as malhas urbanas envolventes e
integrar o património e edifícios de interesse industrial existentes.
3. Proporcionar a instalação de usos mistos de Habitação, Terciário e novos Sectores Produtivos;
4. Requalificação desta área da cidade com uma estrutura verde e equipamentos de proximidade que possa
servir o bairro de Alcântara renovando-o com novos segmentos populacionais.
Cais do Sodré -Aproveitamento dos terrenos municipais (anterior mercado de fruta e peixe) para funções desportivas e comerciais em articulação com a interface intermodal do Cais do Sodré que interliga as duas margens
do estuário do “Tejo” contribuindo para uma melhor acessibilidade ao centro da cidade e a esta zona, requalificando mais uma praça virada ao rio – o Cais do Sodré. É neste contexto que, neste local, se vai instalar a Agência
Europeia de Segurança Marítima, importante projecto âncora com uma dimensão de pesquisa científica.
Ribeira das Naus - Para a zona do Cais do Sodré ao Arsenal estamos perante uma oportunidade única da
retoma do valor patrimonial do Cais da Ribeira das Naus com a instalação, também simbólica, da Fragata “D.
Fernando”, navio “Creoula” e “Sagres”, que reforçarão a memória de localização geoestratégica da cidade.
Terreiro do Paço - Pretende-se transformar numa praça multifuncional com a saída dos Ministérios e aproveitamento das arcadas para hotelaria e funções culturais, sem perder o valor simbólico do poder. Trata-se de
reconverter um espaço ligado à Capital do Império que reflicta a retoma de Portugal e de Lisboa, enquanto
Capital de um país na interface do Atlântico com a Europa, na procura do seu novo papel no mundo, nomeadamente na Comunidade Europeia.
O Terreiro do Paço pela sua importância patrimonial e simbólica, apresenta ainda uma posição de charneira
entre a Zona Ribeirinha e a Baixa, paradigma de modernidade do urbanismo português, que hoje se pretende divulgar mundialmente à semelhança da relação de Barcelona com o arquitecto Gaudi.
Terminal de Cruzeiros - Na cidade portuária juntamente com a náutica de recreio, verifica-se uma
crescente procura de sectores estratégicos – contentorização e aumento de cruzeiros turísticos - o que
corresponde a uma perspectiva de manutenção e revalorização da função portuária.
O reconhecimento de Lisboa como Capital de Cruzeiros justifica o actual enquadramento que o Município
de Lisboa está a elaborar para o novo terminal de cruzeiros da APL pretendendo minimizar o impacto das
respectivas acessibilidades com vista à sua integração urbana no centro da cidade e no bairro histórico de Alfama - na encosta do Castelo – constituindo-se numa nova centralidade na óptica duma “operação integrada”
a que designámos de “Alfama 21”.
SESSÃO IV
Nó de Alcântara
Cais do Sodré
Terreiro do Paço
Terminal de Cruzeiros
123
Depósitos da Matinha
Intervenção de
Luís Jorge Bruno Soares
Arquitecto, Portugal
Transformações portuárias e
reconfiguração urbana
na reconstrução da identidade
ribeirinha de Lisboa
Zona Ribeirinha Oriental - Integra a área envolvente da zona de intervenção da EXPO 98, e está a ser
abrangida por um Plano de Urbanização, em articulação com diversas entidades entre as quais se destaca a
Administração do Porto de Lisboa, estando-se já a enquadrar novos Projectos de infra-estruturas e áreas de
projectos urbanos, com os seguintes objectivos:
1. Enquadrar as transformações resultantes do desenvolvimento da zona de intervenção da EXPO 98;
2. Enquadrar a integração urbanística das infra-estruturas de transportes existentes e previstas, nomeadamente as áreas de apoio à futura rede de transportes;
3. Definir as condições de reordenamento urbanístico da área, tendo em atenção o desenvolvimento de uma
área multifuncional com actividades económicas com recurso a novos sectores de tecnologia e conhecimento;
4. Salvaguardar o património industrial e reabilitação dos núcleos de interesse histórico e conjuntos urbanos
(Caminho do Oriente);
5. Garantir a ligação das áreas habitacionais ao rio através do reforço e requalificação urbanística dos eixos
urbanos apoiados nas Avenidas Gomes da Costa, de Berlim e de Pádua.
Num dos vazios urbanos que constitui esta área industrial abandonada, é de realçar pela sua importância o
Projecto de Loteamento Braço de Prata do arquitecto Renzo Piano, para o espaço da Antiga Fabrica de Armamento do Braço de Prata. A área do projecto estende-se por 9ha, localizada na parte ribeirinha de Lisboa,
não muito afastada da Zona da EXPO. A proposta de desenho urbano estabelecido é semelhante ao tecido
envolvente, principalmente no que concerne à estrutura reticular das ruas, orientada perpendicularmente ao
rio. O uso dos edifícios com residências, escritórios, serviços e actividades económicas, irá permitir, estamos
certos, um novo tecido urbano coeso, onde se pretende que os diversos recursos socio-económicos possibilitem trazer a qualidade a este “pedaço da cidade” reforçando o espaço público e o uso do verde.
Acresce ainda o Projecto Urbano da área da Matinha onde se pretende construir um tecido urbano coeso
em torno dos edifícios de património industrial e dos gasómetros (arqueologia industrial), que não só passam
a ser preservados como utilizados para equipamentos em espaços verdes.
Para finalizar queria acrescentar que, neste momento, se deverá proceder à reavaliação do Plano Estratégico
Portuário que passa pela redefinição do plano de ordenamento e gestão do porto e onde se definam as áreas
exclusivamente portuárias que deverão ser utilizados e geridos de uma forma intensiva e eficaz, reordenando
o seu espaço para melhor coexistir com as novas actividades urbanas.
Em conclusão, para uma nova estratégia de desenvolvimento global da relação entre o porto e a cidade
no âmbito das operações de requalificação urbana - iniciada a partir de 1990 - através de projectos âncora,
há ainda que efectuar uma profunda reestruturação funcional da zona ribeirinha com introdução de outras
funções - residencial, lazer e cultural - capazes de reforçar a ligação da cidade ao rio no aproveitamento do
Estuário enquanto espaço de museologia, de lazer, de estética: espelho de água e de luz.
Espero, enquanto técnica, que o reordenamento da área portuária seja a grande oportunidade, por um lado,
de se revitalizar o porto e por outro de criar um “espaço urbano-cultural” que dê visibilidade à sua memória
histórico-cultural, ou seja a oportunidade de se criar uma frente urbana ribeirinha com espaços funcionais,
morfológicos e arquitectonicamente diferenciados e identificáveis.
Estamos, assim, face a um novo ciclo de gestão da articulação da cidade-porto que levará, estamos certos, ao
repensar de um Modelo de Gestão Mista que virá a contribuir para o desenvolvimento sustentável da cidade
e da área ribeirinha enquanto Área Estratégica de Intervenção que operacionaliza, em simultâneo, as diversas
vertentes da Nova Visão Estratégica de Lisboa, que dará origem ao II Plano Estratégico de Lisboa. ❘❙❚
A relação com o Rio e com o Mar constitui uma marca, não só geográfica, mas, sobretudo, histórica e cultural que tem influenciado tanto os modos de vida como o urbanismo de Lisboa.
Importa ter presente que esta marca é, hoje, um património e um importante recurso para a reconstrução
da identidade ribeirinha e para a organização de novas formas de convivência de Lisboa com o seu Porto.
1. Ao longo de mais de quatro séculos, desde o princípio do Séc. XVI até meados do Séc. XIX, Lisboa foi
uma cidade ribeirinha por excelência, expressa na relação física da cidade com o Rio, na sua base económica,
na sua vida quotidiana, e nas suas memórias e tradições.
Aspecto paradigmático de Lisboa – Cidade ribeirinha é a presença, junto ao Rio, dos centros do poder
político e económico representados em alguns dos seus edifícios e espaços mais emblemáticos.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
Frente ribeirinha de Lisboa
A viragem da cidade medieval, recolhida e defensiva, para a cidade moderna, aberta e cosmopolita, dá-se
exactamente com a passagem do Paço Real da parte alta da cidade para junto do Rio, por decisão do Rei D.
Manuel I (1505). A partir desse momento, o Palácio Real convive com estaleiros, cais e ancoradouros, e com
os espaços da vida portuária e comercial de Lisboa. A nobreza segue o exemplo e constrói as suas novas
moradas nas margens do Tejo ou na sua proximidade.
A orla ribeirinha de Lisboa passa a ser assim, simultaneamente frente e traseiras da cidade, isto é, uma fachada
nobre e rica e uma traseira popular e das actividades urbanas menos qualificadas. A partir do Séc. XVI, Porto
e Cidade são entidades indissociáveis que estão na base da ideia de Cidade e do seu desenvolvimento.
Ao longo do Séc. XV as caravelas e naus portuguesas exploraram o Atlântico e as costas de África e chegaram
à Índia e ao Brasil. As novas rotas marítimas tornaram Lisboa no principal entreposto Comercial da Europa
no início do Séc. XVI. A partir desse momento, e durante vários séculos, o Terreiro do Paço tornou-se no
espaço de referência de Lisboa.
Até ao Séc. XIX, as decisões régias e os projectos urbanos adoptam o Tejo como directriz do crescimento
urbano e como tema da sua renovação e revalorização urbanística.
A ideia da construção de um grande cais de Xabregas a Belém é uma ideia recorrente dos grandes projectos para
a expansão de Lisboa. São projectos para uma Lisboa Ribeirinha modernizada e monumental em que a cidade e
porto se misturam, e em que, ao grande cais, estão associadas ruas, praças, passeios públicos, igrejas e habitações.
Nos Séc. XVII e XVIII, a fachada ribeirinha foi objecto de vários projectos que associaram a expansão do
porto ao crescimento da Cidade ao longo da margem do Tejo.
Lisboa Séc. XVI
(Gravura do Museu da Cidade de Lisboa
– Câmara Municipal de Lisboa)
125
2. A ruptura com esta ideia de cidade ribeirinha dá-se no Séc. XIX, quando os conceitos associados às transformações da Revolução Industrial entram nos projectos do Porto de Lisboa.
Com o início das obras de expansão do porto, (1887) a zona ribeirinha de Lisboa é destinada, quase em exclusividade, às actividades portuárias e às suas novas máquinas de movimentação de mercadorias, e, também,
ao Caminho de Ferro e às infra-estruturas urbanas ligadas às novas tecnologias e à economia emergente.
Para Lisboa, a “aliança porto-indústria” representou a segmentação do espaço urbano, a funcionalização da
frente de Rio na lógica das actividades portuárias e industriais, e o consequente isolamento da vida urbana
em relação ao Rio. Isto dá-se ao mesmo tempo que a “cidade burguesa” encontra a sua área de eleição
na expansão para o interior com apoio no polémico projecto da Avenida da Liberdade e nos traçados das
Avenidas Novas.
Esta conjugação de estratégias baseadas na separação territorial entre Cidade e Porto, mas convergentes
quanto aos interesses em jogo, levou ao afastamento da vida quotidiana de Lisboa do Rio e ao abandono
da ideia pré-industrial da Cidade Ribeirinha. Ao longo do Séc. XX consolida-se o modelo de uma cidade
interiorizada, em que a frente do Rio é ocupada pelas actividades portuárias, industriais e logísticas, e gerida
com total autonomia em relação à gestão municipal à qual se sobrepunha em situações de divergência ou
de conflito.
Contudo, talvez pelas características topográficas da cidade que mantém a presença da água na cena urbana,
o Rio permaneceu um elemento incontornável da imagem de Lisboa e no imaginário dos lisboetas.
O Plano de Melhoramentos do Porto de Lisboa (1887) projecta extensos aterros na margem do Tejo para
a instalação de áreas portuárias. A Praça do Comércio é o único espaço urbano que “resiste” ao corte da
ligação da cidade histórica com o Rio.
3. O Concurso de Ideias para Zona Ribeirinha de Lisboa promovido pela Associação dos Arquitectos Portugueses em 1988 marca um momento de mudança desta situação, não tanto pela novidade das ideias
apresentadas, mas por catalisar e tornar pública uma vontade de “Voltar Lisboa ao Rio”, que se generalizava
nos meios culturais e políticos, a qual implicava romper com a barreira da ocupação industrial e portuária, e
ao mesmo tempo questionar a hegemonia da Administração do Porto de Lisboa sobre as margens do Tejo.
Esta iniciativa deu-se num contexto de profunda obsolescência e decadência dos usos e ocupações gerados pela industrialização do princípio do Séc. XX que se traduziram (i) na reconversão ou deslocalização de instalações industriais
e logísticas (ii), na necessidade de modernizar e renovar infra-estruturas de transporte, (iii) e, sobretudo, na urgência
de reorganização e redimensionamento das infra-estruturas e espaços portuários e de alteração das suas formas de
gestão. Ao mesmo tempo, verificou-se uma revalorização social e cultural das frentes de água acompanhada por uma
crescente procura dos espaços ribeirinhos de acesso público para o recreio e lazer das populações urbanas.
Ocupação da Frente Ribeirinha 1970
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
Nesta conjuntura dão-se, em Lisboa, quatro acontecimentos decisivos que abrem as portas a uma nova
relação da cidade com o Rio e com o Porto.
Em primeiro lugar, verifica-se uma nova atitude e preocupação da Administração do Porto de Lisboa no respeitante à reorganização dos espaços portuários e à racionalização da sua exploração, a qual leva à realização de
diversos estudos e planos de ordenamento, de entre os quais o POZOR - Plano de Ordenamento da Zona Ribeirinha (1993/94) tem por objectivo articular usos portuários – logísticos com usos urbanos e equipamentos de
recreio e lazer ligados à água. Rompe-se assim a barreira institucional que se interpunha entre Lisboa e o Rio.
Em segundo lugar, as eleições autárquicas de 1989 elegem a relação da Cidade com o Rio como um dos
temas centrais das campanhas das principais forças políticas em competição.
Assim, a intervenção na frente ribeirinha de Lisboa tornou-se numa das áreas mais importantes da actuação
municipal no mandato 1990-1994 e abriu uma nova fase nas relações entre Câmara Municipal de Lisboa e
Administração do Porto de Lisboa.
Em terceiro lugar, surge como grande projecto de Estado, a construção do Centro Cultural de Belém (1992)
o qual reforça a polarização do sector ocidental da zona Ribeirinha na área cultural, e dá, já no início da década de 90, um forte sinal de vontade política de promover o regresso de Lisboa ao Rio.
Por último, concretiza-se, na segunda metade daquela década, a transformação da zona industrial Oriental
numa nova área urbana ligada ao Rio e ao Estuário do Tejo o Parque das Nações, cujo motor foi a realização
da Exposição Internacional, Expo 98.
Entre estes acontecimentos desenvolveram-se, entretanto, diversos projectos, de maior ou menor impacto
que, de uma forma alargada, vão contribuindo para criar novas frentes de vida urbana junto ao Rio e para
estabelecer uma nova relação e integração, Cidade-Porto. De referir, por exemplo, as diversas infra-estruturas portuárias construídas para a náutica de recreio, a construção de novas interfaces de transporte terrestre-fluvial, a valorização de edifícios portuários e industriais com interesse histórico e cultural, bem como a
construção e arranjo paisagístico de espaços para o recreio e lazer urbanos.
Em 2004, Lisboa dispõe de cerca de 11 km de espaços urbanos ribeirinhos nos seus 18 km frente ao Tejo,
situação privilegiada em relação a outras grandes cidades portuárias europeias.
Pode assim dizer-se que, em pouco mais de uma década, Lisboa entrou numa nova fase histórica do seu
desenvolvimento assente numa nova relação Cidade-Rio.
A reorganização do porto de Lisboa e o reordenamento das áreas portuárias e industriais permitiram alargar
a frente de contacto da cidade com a Água.
4. Atravessando todas estas fases históricas, o Terreiro do Paço / Praça do Comércio manteve-se como
a referência urbana da relação de Lisboa com o Tejo. É o espaço que traduz a histórica ligação de Lisboa ao
Ocupação da Frente Ribeirinha 2004
127
Praça do Comércio 2004
Mar, transportando uma forte carga simbólica de ligação dos poderes e dos interesses da sociedade portuguesa, ao longo de mais de quatro séculos, ao Mar e às Rotas Oceânicas, e a outros continentes.
Nesta fase de grandes transformações da frente ribeirinha, o Terreiro do Paço / Praça do Comércio,
sendo o espaço histórico mais importante para a reconstrução da identidade ribeirinha de Lisboa, é, também, um dos espaços mais frágeis e mais sensíveis face a intervenções apressadas e de fácil mediatização,
que, hoje, se vão esboçando perante a inexistência de uma ideia de Cidade e, sobretudo, de um novo
paradigma de Cidade Ribeirinha para Lisboa.
Depois das duas grandes intervenções realizadas a Ocidente com o Centro Cultural de Belém, e a Oriente com o
Parque das Nações, a chave do regresso de Lisboa ao Rio está agora na revalorização da zona histórica central e,
em particular, do Conjunto Monumental da Praça do Comércio. Aqui deverá desenvolver-se uma nova centralidade política e cultural de dimensão nacional e europeia, para a qual a instalação de instituições internacionais como
a Agência Europeia de Segurança Marítima e outras instituições ligadas à União Europeia, e a criação de espaços
culturais relacionados com os temas dos oceanos, das navegações oceânicas, do Terramoto de 1755 e da reconstrução Pombalina de Lisboa, poderão restabelecer a sincronia entre os usos urbanos e a simbólica deste espaço.
Nesta linha, a candidatura da Baixa a Património da Humanidade pode ser uma iniciativa mobilizadora importante e constituir o quadro político adequado para a montagem e implementação de uma operação de
revalorização deste sector estratégico de Lisboa.
O Conjunto Monumental do Terreiro do Paço é a “pedra de fecho” da regeneração da Frente Ribeirinha de
Lisboa iniciada nos anos 90. ❘❙❚
Intervenções de
Nuno Ventura Bento
Urbanista
e Jorge Bonito Santos
Arquitecto, Urbanista
Câmara Municipal da Moita, Portugal
Estuário do Tejo
e realidades urbanas.
Uma abordagem sistémica
na perspectiva da valorização
urbana em contexto ambiental
Mais do que listar e mostrar possibilidades de intervenção, gostaríamos de abordar um conjunto de questões
que se colocam ao trabalho local da gestão das frentes de rio em aglomerados de pequena dimensão.
A população do Estuário do Tejo sempre viveu com o rio, as dinâmicas económicas dos seus aglomerados
urbanos sempre estiveram relacionadas com as funções ribeirinhas e, no futuro, a gestão das frentes de água
será estratégica para o seu posicionamento e enquadramento num sistema urbano-portuário global.
As frentes urbanas ribeirinhas, que desde sempre sustentaram as actividades de transporte fluvial e marítimo
e de construção e manutenção naval, constituíram também um território propício a alguns dos grandes desenvolvimentos urbano-industriais dos séc. XIX e XX. A herança que ainda hoje temos dessa época – um
conjunto de antigas áreas industriais hoje já desactivadas - constitui o grande potencial de desenvolvimento e
renovação da maioria das cidades com frentes de água.
Contudo, nesses mesmos rios, estuários e frentes marítimas permaneceram e surgiram outras actividades,
mantendo a um conjunto de aglomerados urbanos cujo desenvolvimento esteve sempre ligado ao rio e ao
mar través da pesca, do transporte fluvial, da pequena indústria artesanal e, até, do lazer, conquistando assim
um posicionamento complementar na “rede de portos global”.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
Hoje, no Estuário do Tejo, procura-se conjugar a optimização da função portuária com o imperativo urbano
de “virar” a cidade para o rio.
Introduzem-se pontualmente as áreas residenciais, comerciais e de usos mistos, resultando numa diversidade paisagística, cultural, económica, tecnológica e logística.
Surgem projectos e intervenções de renovação portuária e requalificação urbana de grande escala como a Expo
98/ Parque das Nações, em Lisboa, a Lisnave/ Margueira, em Almada, e a CUF/ Quimiparque, no Barreiro,
com estratégias próprias, por vezes até divergentes, num mesmo Estuário, ou ainda de expansão urbana, como
a Quinta da Fonte da Prata, na Moita, processo de loteamento urbano iniciado ainda no fim dos anos 60 início
dos anos 70, cuja primeira fase, de um conjunto urbano previsto para aproximadamente 3.500 fogos, foi edificada entre 1977 e 1983. A promoção deste empreendimento foi retomada na segunda metade da década de
90 com a recente conclusão da sua segunda fase, aproximadamente 600 fogos, totalizando actualmente cerca
de 1.400, encontrando-se actualmente a ser desenvolvidos estudos tendentes à sua conclusão.
O Concelho da Moita, com aproximadamente 55 km2 e 67.500 habitantes, inscreve-se na vasta área ribeirinha da Margem Sul do Estuário do Tejo. Durante muitos séculos a economia do Concelho assentou na
exploração salineira, na cabotagem, no trânsito de produtos e de pessoas e na exploração dos produtos da
charneca. Este sistema económico tradicional alterou-se com a construção do caminho-de-ferro, com o
processo de arroteamento das terras e com a instalação de indústrias ligadas à cortiça.
A frente ribeirinha do Concelho da Moita, com aproximadamente 20 km, é constituída por um enorme conjunto de estruturas construídas pelo Homem para defesa das terras e produção de sal e peixe, bem como
por alguns moinhos de maré e respectivas caldeiras. A grande beleza panorâmica e paisagística destas áreas
vocaciona-as para o uso lúdico ou como santuários de vida selvagem, sempre que a sua exploração não seja
economicamente viável ou ambientalmente sustentável.
As únicas actividades económicas que se mantêm em estreita dependência da zona ribeirinha são os estaleiros navais de Sarilhos Pequenos e Gaio-Rosário. De forma a dinamizar o necessário processo de intervenção
foi elaborado, ao abrigo do Pró-Tejo – Programa de Valorização da Zona Ribeirinha promovido pelo Município, um plano estratégico tendo em vista a valorização ambiental e a qualificação do território.
A freguesia de Sarilhos Pequenos, com uma área de aproximadamente 256ha, tinha, em 2001, 1.050 habitantes, dos quais 25% eram idosos, apresentando um índice de envelhecimento de 205% e um índice de
dependência de 60%; 55% da sua população trabalhava nos sectores primário e secundário, valor superior
ao valor médio do Concelho que era então de 44%. A decadência das actividades ribeirinhas – onde somente resiste o estaleiro naval, hoje uma referência nacional; a sua situação excêntrica relativamente aos actuais
fluxos e eixos de ligação viária e, também, o declínio e subaproveitamento das suas unidades agrícolas, são
os principais factores responsáveis pelo envelhecimento e fraca vitalidade de Sarilhos Pequenos.
A tradição ficou bem presente na população que resistiu, nas famílias que embora já não vivam do rio vivem
com ele – através da posse de um pequeno barco tradicional para recreio ou da simples participação na
Associação Naval Sarilhense. Esta população, muito próxima no trabalho, na partilha e na vivência urbana,
desenvolveu ao longo de muitas décadas um forte sentido comunitário, com reflexos em inúmeras iniciativas
culturais, económicas e desportivas, à escala do aglomerado.
O núcleo urbano de Sarilhos Pequenos forma-se numa relação directa com o rio, organizando-se numa
dependência do esteiro. Encontra-se praticamente envolvido por unidades agrícolas de grande dimensão
que espartilham o seu crescimento urbano, condicionando-o a uma actividade agrícola e salineira na dependência dessas mesmas unidades, além da actividade ribeirinha, de pesca e cabotagem. Todo o crescimento
que se operou no sentido do esteiro traduz uma forma urbana e uma tipologia de edificação próprias de uma
povoação ribeirinha nas margens do Estuário do Tejo. A malha urbana de Sarilhos Pequenos desenvolveu-se
em forma de estrela, com as ruas a desembocar num largo central e com o rio nas traseiras; é também de
referir a existência de um conjunto de ruas e caminhos que acabam em portões de quintas, nas salinas, na
área de embarque e no estaleiro naval.
Num aglomerado urbano de pequena dimensão, que parece assumir agora uma posição estratégica no mercado de residência unifamiliar – como primeira ou segunda habitação – e do lazer, onde qualquer pequena
promoção privada introduz alterações significativas na imagem urbana local e induz dinâmicas várias na orgânica funcional do aglomerado, pretendeu-se responder de forma dinâmica e precisa às necessidades expressas pelos promotores imobiliários para materializar os seus empreendimentos, garantindo e potenciando a
concretização das suas intenções em estruturas sistemicamente equilibradas e dotadas de qualidade urbana.
SESSÃO IV
Localização do Concelho da Moita
Sarilhos Pequenos
129
Renovação das instalações do Centro Náutico
Nova via distribuidora estruturante
Moita Urbana ribeirinha
Com a elaboração de um Estudo Urbanístico Orientador, naturalmente concertado com o processo de
Revisão do Plano Director Municipal actualmente em curso, estabeleceram-se as directivas programáticas
para as áreas de expansão de Sarilhos Pequenos e conseguiu-se o desenvolvimento de um conjunto de
orientações que servirão de base a algumas operações de loteamento urbano, sempre à luz de uma linha
estratégica global para o aglomerado urbano.
A renovação e ampliação das instalações do Centro Náutico da Associação Naval Sarilhense e a criação de
uma zona de recreio e lazer confinante com o rio, no limite nascente do aglomerado, constituem duas formas
de estimular e incentivar um maior envolvimento nas actividades náuticas e de permitir, através da criação de
percursos lineares de atravessamento do núcleo urbano que possibilitam ligações directas numa articulação
correcta com a malha existente, uma maior aproximação, com carácter lúdico, da população ao rio.
O desenho e a construção de uma nova via distribuidora estruturante - circular ao aglomerado urbano existente, marginal à zona ribeirinha e geradora de acesso às novas zonas urbanas que interliga – permitirá libertar o
centro da povoação de alguma da circulação viária que hoje o atravessa (restituindo o uso predominantemente
pedonal de alguns dos espaços centrais) e ligar a quase totalidade dos equipamentos existentes e a criar, optimizando assim um sistema de circulação à escala local e possibilitando a introdução de uma rede de ciclovias.
A expansão para Sul do aglomerado de Sarilhos Pequenos – loteamento urbano e unidade hoteleira - é um
exemplo de como a pré-definição da estrutura e da forma urbana pelos serviços camarários permitiu ao
promotor implementar o seu programa salvaguardando, através de uma relação adequada com a envolvente
– o aglomerado urbano pré-existente e a zona de mata e maciços arbóreos contígua, a existência de sistemas
de circulação diversificados e alternativos, a inclusão de equipamentos, o desejável enquadramento urbano
e o equilíbrio ambiental para uma zona naturalmente muito sensível.
Através do contacto com os vários intervenientes, activos e latentes em Sarilhos Pequenos, procurou-se estabelecer um clima de confiança mútua, de clareza no diálogo, tirando partido da reduzida dimensão do aglomerado. Como iniciativas dos promotores privados surgiram a recuperação do edificado, a construção de uma
unidade hoteleira e de dois lares para idosos, a reabilitação de uma taberna, de uma salina, a criação de um
observatório de aves e de novos equipamentos desportivos. O caminho pode passar pela reposição sustentada
das vivências quase perdidas, dos valores únicos das várias realidades ribeirinhas deste imenso Estuário.
Só deste modo, através de uma articulação de esforços e desenvolvimento de parcerias entre a administração, os promotores, as associações e colectividades locais e a população, se conseguirá promover um
desenvolvimento urbano que constitua uma mais valia para todos, conciliando as intenções dos vários intervenientes no processo com aquilo que é verdadeiramente importante para a sua integração urbana – um
entendimento das características da envolvente construída com que se vai relacionar e do ritmo urbano que
daí decorre, em alternativa a processos de concepção e de análise distantes dos intervenientes e dos utilizadores directos; só assim haverá lugar para o aparecimento de soluções susceptíveis de inovar e de contribuir
para uma verdadeira evolução dos conceitos e da qualidade da vida urbana.
No Concelho da Moita, tal como em todo o Estuário do Tejo, o rio é suporte da diversidade e variedade; de facto,
nada têm a ver o Parque José Afonso na Baixa da Banheira, o Largo do Descarregador em Alhos Vedros e a frente
ribeirinha de Sarilhos Pequenos – diferentes realidades, diferentes necessidades, diferentes intervenientes, diferentes capacidades e oportunidades de fazer – obrigando a uma criteriosa abordagem, adequada a cada situação mas
tendo por base uma estratégia concertada e coerente de valorização ambiental e qualificação do território.
Hoje, quando as preocupações se dirigem, maioritariamente, para um sistema portuário global
onde Singapura articula com Antuérpia ou Sines, e para uma reabilitação do Estuário onde a
requalificação do tecido urbano e a recuperação da relação ancestral com o Tejo aparenta conseguir-se através de intervenções de grande dimensão dotadas de estratégias de próprias e individuais, importa estar atento à diferença e à diversidade potenciando todas as possibilidades
de intervenção através da definição de uma estratégia global, concertada à luz do respeito e da
vivência ambiental e tendo sempre presente que o sistema tem várias escalas.
Em Sarilhos Pequenos procura-se, através da prática de um processo de planeamento integrado, baseado
numa política pró-activa, flexível e dinâmica, fazer convergir os vários interesses envolvidos e potenciar oportunidades, permitindo materializar, gradualmente, o rumo traçado para o seu desenvolvimento.
Aqui a herança cultural é a vivência do rio, onde o passado nos fala de uma economia ribeirinha e de uma
tradição desportiva, numa zona única de grande valor ambiental constrói-se o presente com vista à criação
de um aglomerado sustentável, onde os valores do passado promovam as dinâmicas do futuro. ❘❙❚
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
A situação do Concelho de Vila Franca de Xira assume neste encontro uma característica especial, dado que,
não possuindo instalações portuárias em actividade, parte significativa da zona ribeirinha na margem direita do
rio Tejo, é propriedade e está sob a jurisdição da Administração do Porto de Lisboa.
Trata-se de uma estreita faixa que, no interior do Concelho, vai desde a Póvoa de Santa Iria, a sul, até à Ponte
Marechal Carmona na cidade de Vila Franca de Xira.
Por outro lado, é ao longo desta faixa ribeirinha que, desde muito cedo, o homem se foi radicando, aqui
construindo as suas habitações, aqui desenvolvendo as suas actividades económicas – a agricultura e a
pesca, certamente, mas também a actividade comercial fluvial, aproveitando as condições naturais do
Estuário do Tejo, e, mais recentemente, a actividade industrial, tendo o séc. XX assistido à localização
na margem direita do rio, de empresas de grande dimensão, de que se destacam a Solvay, as OGMA, a
Cimpor, ou a Cimianto.
A fixação de pessoas e empresas numa faixa tão estreita, conduziu a um tipo de ocupação territorial longitudinal, que constitui, hoje em dia um verdadeiro contínuo urbano, desenvolvido ao longo do Tejo, mas também
ao longo das grandes vias rodoviárias e ferroviárias nacionais que atravessam o Concelho.
Este tipo de ocupação, potenciado pela proximidade da grande cidade (Lisboa), criou igualmente condições de alguma sub urbanidade e desqualificação do espaço urbano, traduzido pela consideração, em
sede do Plano Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROTAML)
de um conjunto de regras visando: a contenção da expansão urbana; a concretização dos espaços
necessários à implementação da Reserva Ecológica Metropolitana, em especial os Corredores Estruturantes Primários e Secundários e as Áreas Vitais, na transição do arco urbano envolvente norte com a
frente ribeirinha; a afectação a espaço público das áreas de baixa aluvião localizadas na zona ribeirinha
do concelho de Vila Franca de Xira; a libertação do espaço ribeirinho de ocupações pesadas, em especial de ordem industrial com estrutura contínua, no sentido de permitir a criação de corredores não
edificados transversais e longitudinais ao longo da margem do Tejo.
Por outro lado, a margem ribeirinha direita no território concelhio está afectada por um outro conjunto de
condicionantes, com áreas afectas à propriedade da APL, afectas ao domínio público marítimo, integrando
a Reserva Natural do Estuário do Tejo, situando-se uma parte significativa em leito de cheia máxima, o que
conduz a evidentes restrições na ocupação destes territórios.
Terra ribeirinha, o desenvolvimento do Concelho de Vila Franca de Xira no século vinte, contribuiu para um
afastamento deste factor essencial da identidade comunitária local, agravado pela construção da via-férrea,
que se constitui como uma barreira artificial, dificultando o acesso ao rio, acompanhado pela ocupação de
largas faixas da margem direita por unidades industriais e militares.
A inversão desta situação, coloca o Concelho perante um desafio estratégico:
Como requalificar e revalorizar o Estuário do Tejo, o que implica (i) promover o diálogo entre os
diversos actores com acção na faixa ribeirinha (AGPL, ICN, proprietários, investidores, etc.; (ii) desenvolver
os estudos necessários e concretizar as intervenções neles preconizadas; (iii) potenciar as sinergias de articulação entre as iniciativas de requalificação ambiental/revalorização da área ribeirinha e outras acções decorrentes das grandes orientações estratégicas definidas ou a definir para o Concelho; e (iv) integrar o esforço
de recuperação das margens num contexto mais alargado de devolver ao Rio Tejo o seu antigo papel de
espinha vertebral do Concelho, quer na dimensão económica, quer como trave estruturante do imaginário
de identificação territorial dos munícipes.
O papel fundamental que queremos venha a ser assumido de novo pelo rio Tejo, enforma as opções estratégicas que estão definidas em sede do Plano Estratégico Concelhio e de que se destacam, pela sua relevância:
a aposta na abertura ao mundo que fortaleça as vantagens da sua localização e das novas infra-estruturas
aeroportuárias, rodoviárias e ferroviárias, definindo políticas activas de captação de investimentos industriais
e de serviços; a aposta na qualificação urbana, a todos os níveis; a aposta no dinamismo empresarial; a aposta
na qualificação dos recursos humanos.
Pretende-se criar um Concelho de Vila Franca de Xira: Competitivo, reforçando a orientação de aproveitamento das oportunidades que potenciam o incremento do desenvolvimento da economia local e
regional; com Identidade, capaz de contribuir para o conceito de comunidade vilafranquense, criando
níveis identitários com o território e com as práticas colectivas e com as ideias e valores colectivos; de Qualidade, assente na reorganização dos espaços urbanos e na consolidação das novas áreas de expansão,
enquanto elementos fundamentais para a criação de um município com qualidade.
Intervenção de
131
Ramiro Matos
Vereador da Câmara Municipal
de Vila Franca de Xira, Portugal
Requalificar e revalorizar
o Estuário do Tejo, enquanto
elemento identitário do
Concelho de Vila Franca de Xira
e factor de competitividade
acrescida do Porto de Lisboa
Concelho de Vila Franca de Xira
Área de recreio e lazer
Porto de recreio
Competitividade, Identidade e Qualidade constituem, deste modo, os três vértices fundamentais
para a definição de uma estratégia de desenvolvimento sustentado que pretendemos para o Concelho.
É neste contexto que o rio Tejo e a sua margem ribeirinha direita assumem papel de relevância especial,
mas igualmente onde as questões do desenvolvimento sustentável ganham maior acuidade.
Na verdade, esta faixa ribeirinha da margem direita onde se concentram a ocupação urbana e as
actividades económicas, mas que constitui também a interface com a área protegida, é uma zona
de grande fragilidade onde as intervenções devem ser particularmente cuidadas, mas é também,
pelas suas características e pela proximidade das áreas urbanas, uma zona de grande qualidade para
as actividades compatíveis com a salvaguarda dos valores ambientais que levaram à criação da área
protegida. É assim uma área de eleição para o recreio e lazer da população local e para algumas
actividades turísticas, mas é também uma área muito apetecível pelos factores locativos claramente
favoráveis.
Assim, e se as intervenções a realizar nesta faixa devem contribuir para a ligação dos aglomerados ao Rio,
para o qual têm estado “de costas voltadas”, reforçando outras intervenções municipais que visem a recuperação (com nova perspectiva) do valor do Rio para a cultura e a vida locais, não pode esta estratégia
ser desenvolvida no esquecimento ou na proibição pura e simples de qualquer outra ocupação humana,
nomeadamente pela compatibilização com a fixação de algumas actividades económicas.
Pretende-se, deste modo:
• Considerar a zona marginal do Rio Tejo como um elemento estratégico fundamental para a qualificação da paisagem e vida urbanas;
• Promover a protecção, valorização e salvaguarda dos valores naturais, paisagísticos, patrimoniais e
culturais, ligados ao rio Tejo;
• Conjugar os interesses das diversas jurisdições (APL, DPH, RNET, ICN e ZPE e proprietários), sobre
as zonas marginais do rio Tejo, de modo a permitir a definição de uma política coerente de utilização,
recuperação e qualificação.
Neste sentido tem vindo a Autarquia a desenvolver um conjunto de projectos e iniciativas, de que
destacamos:
• Intervenção nos Avieiros de Vila Franca de Xira e de Alhandra; Portos de recreio de Vila Franca
de Xira e de Alhandra; Parque Urbano de Vila Franca de Xira; Caminho pedonal Vila Franca
de Xira/Alhandra; Parque Urbano Ribeirinho de Alhandra; Parque Urbano Ribeirinho do Sobralinho/Alverca; Parque Urbano Ribeirinho do Forte da Casa; Parque Urbano Ribeirinho da Póvoa
de Santa Iria.
Com o cenário acima apresentado pretendeu-se traçar um quadro de referência da relação Concelho de
Vila Franca de Xira/Administração do Porto de Lisboa, cujos contornos principais são:
• A faixa ribeirinha da margem direita do rio Tejo entre a Póvoa de Santa Iria e a cidade de Vila Franca
de Xira é pertença da APL;
• Esta estreita faixa (em média de 50 metros de largura) coincide, na sua quase totalidade, com o limite
da Reserva Natural do Estuário do Tejo;
• Desta faixa somente pequenos troços se poderão considerar disponíveis para o desenvolvimento do
Porto de Lisboa, dado que os restantes espaços estão ocupados quer pela própria cidade – Alhandra
e Vila Franca de Xira -, quer por áreas militares – Marinha em Vila Franca de Xira e Força Aérea em
Alverca, quer por unidades industriais – Solvay na Póvoa de Santa Iria, OGMA em Alverca, Cimpor e
Cimianto em Alhandra, entre outras, quer, ainda, por ocupações que têm vindo a ser contratualizadas
entre a Autarquia e a APL;
• Os terrenos confinantes com as áreas sob jurisdição do Porto de Lisboa são propriedade privada.
A relação entre a Autarquia e a APL tem sido excelente, permitindo encontrar os caminhos adequados
aos processos em curso de requalificação da margem ribeirinha direita, e criando as condições para que o
rio Tejo readquira o papel estruturante do imaginário de identificação territorial dos munícipes. Torna-se,
no entanto, urgente que o Porto de Lisboa defina de forma clara quais as suas intenções no que se refere
à expansão/relocalização de actividades portuárias no território concelhio, face aos constrangimentos que
temos vindo a apresentar. Na verdade, e exceptuando uma intenção manifestada em tempos, em sede de
Comissão Técnica de Acompanhamento do processo de revisão do Plano Director Municipal, de reserva de
terrenos na zona do Forte da Casa, não conhece a Autarquia quaisquer outras intenções a APL.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
133
No que se refere a esta intenção, a mesma esbarra com alguns constrangimentos de peso:
• Propriedade dos terrenos;
• Afectação à Estrutura Ecológica Metropolitana, Corredor Ecológico Principal, à Reserva Natural do
Estuário do Tejo e área muito sensível do ponto de vista da avifauna;
• Integração em Área Crítica a Conter e a Qualificar nos termos do PROTAML;
• Dificuldade de acessos viários, pois esta zona encontra-se separada das vias principais (A1 e EN10)
pela linha-férrea e com uma localização afastada dos centro logísticos do Concelho (Póvoa de Santa
Iria, Vialonga, Alverca e Sobralinho).
Considera-se, deste modo, não existirem condições para que esta pretensão da APL seja coroada de êxito,
antes se perspectivando uma outra tipologia de actividades portuárias, claramente compatíveis com os objectivos estratégicos definidos pela Autarquia para a margem ribeirinha e que passariam por:
• Desenvolvimento de um conjunto de terminais pesqueiros, junto aos ancoradouros dos avieiros já
existentes em Vila Franca de Xira, Alhandra e Póvoa de Santa Iria, permitindo o desenvolvimento
de um sector de pesca fluvial, tornado rentável pelo crescente povoamento piscícola do Estuário do
Tejo;
• Criação de portos de recreio, em Vila Franca de Xira, Alhandra e Póvoa e Santa Iria;
• Reactivação dos cais já existentes, em cooperação com as unidades industriais, potenciando o uso do
rio como via de escoamento de produtos, alternativa à via ferroviária e/ou rodoviária.
Das propostas apresentadas ressalta claramente que, no nosso entender não é compatível, quer com as
propostas de requalificação da margem ribeirinha, quer com os constrangimentos colocados pelas condicionantes existentes, uma utilização portuária dita “pesada” e ocupando áreas significativas da margem
direita do Tejo, antes se considerando que as ocupações a prever se devem constituir como um factor
acrescido da qualificação daquele espaço, contribuindo ao seu nível para o alcançar dos objectivos estratégicos definidos.
Trata-se, antes de mais, de compreender que os investimentos a fazer pela APL no território concelhio, não
poderão integrar os objectivos maiores de desenvolvimento do Porto de Lisboa enquanto grande infra-estrutura internacional, mas, sim, enquanto instrumento de desenvolvimento local e regional.
Torna-se, deste modo, essencial que as propostas a apresentar pela Administração do Porto de Lisboa,
naturalmente traduzindo as opções de desenvolvimento estratégico do Porto de Lisboa, sejam consensualizadas com a Autarquia, com a RNET (Reserva Natural do Estuário do Tejo), com a CCDR (Comissão de
Coordenação e Desenvolvimento Regional) e, naturalmente com os outros parceiros, nomeadamente os
agentes económicos.
O trabalho em comum que vem sendo realizado entre a Autarquia e a APL, traduzido nos resultados anteriormente enunciados, define já um quadro de relacionamento para o futuro que, estamos certos, permitirá
requalificar e revalorizar o Estuário do Tejo, enquanto elemento identitário do Concelho de Vila Franca de
Xira e factor de competitividade acrescida do porto de Lisboa. ❘❙❚
Um tema que tem vindo a merecer a nossa especial atenção é: Área Metropolitana de Lisboa – regresso
ao rio.
Pensamos ser este, sem dúvida, um espaço privilegiado para o debate de uma questão cada vez mais
pertinente nos dias de hoje, ou seja, a criação de uma nova identidade porto/cidade, na qual as actividades
portuárias se integram harmoniosamente na paisagem urbana.
Nos últimos anos, e no âmbito do movimento generalizado da valorização das frentes de água por parte das
cidades, tem vindo a constituir um interessante tema de análise a forma como o porto e a cidade se afectam
mutuamente em termos de uso do espaço, surgindo, muitas vezes, uma relação de conflitualidade. Este
conflito deriva do facto de se cruzarem num mesmo espaço, duas entidades com interesses e objectivos
aparentemente distintos: o porto com uma componente económica muito marcada e muito orientado para
o negócio, e a cidade com a sua comunidade, orientada para a promoção do bem-estar e qualidade de vida
dos seus cidadãos.
O desafio que se coloca às cidades portuárias é, assim, o de esbater contrastes que surgem desta conflitualidade, promovendo uma cooperação positiva entre o porto e a cidade e conjugando o desenvolvimento
económico com a qualidade de vida urbana.
Intervenção de
Vítor Caldeirinha
Director Comercial da Administração
do Porto de Lisboa, Portugal
Lisboa: Uma nova identidade
porto/cidade. A actividade
portuária como função urbana
Zona multifuncional de Alcântara
Doca de Santo Amaro
Acesso à zona de lazer
Terminal de cruzeiros – Santa Apolónia
Nesta matéria, a zona multifuncional de Alcântara constitui um dos exemplos mais marcantes no que respeita
à necessidade de conciliar os interesses distintos das diferentes actividades: operacionais portuárias, complementares e de lazer, desenvolvidas no porto de Lisboa. Estão aqui, em Alcântara, localizados o principal
terminal de contentores do país, dois terminais de cruzeiro, duas docas de recreio, actividade marítimo-turística (restaurantes flutuantes, embarcações para passeios no rio, etc.), assim como um dos principais locais
de atracção turística da cidade – as docas.
Anteriormente ocupada com instalações portuárias degradadas, a Doca de Santo Amaro constitui hoje um
exemplo de reconversão de frentes ribeirinhas. Após a requalificação do plano de água para a doca de
recreio, os armazéns portuários em grande parte desactivados, foram reconvertidos em equipamentos comercias, mantendo-se a volumetria e a traça arquitectónica das antigas instalações portuárias.
Na realidade, as intervenções realizadas para a modernização dos espaços portuários e reconversão das
frentes ribeirinhas sem actividade operacional, para áreas de lazer, a Administração do Porto de Lisboa
(APL) teve sempre a preocupação de respeitar o carácter histórico dos locais e valorizar o seu património
arquitectónico.
Como facilmente se compreende, esta é uma zona onde se cruzam interesses muito distintos, facto que
coloca à autoridade portuária o desafio de geri-los da forma mais harmoniosa possível. Com o objectivo de
minimizar os conflitos emergentes de usos tão diferentes a APL construiu, a jusante da doca de Stº Amaro,
uma nova entrada para a zona de lazer, servida por um parque de estacionamento com capacidade para
cerca de 700 viaturas.
Por outro lado, para a melhoria dos acessos terrestres à zona portuária de Alcântara, a autoridade portuária
em conjunto com a autarquia de Lisboa e a REFER (empresa gestora da rede ferroviária), está a estudar a
substituição do actual viaduto, provisório há mais de trinta anos, por uma solução mais vantajosa. A APL e a
REFER chegaram ontem a acordo quanto à solução a adoptar no referente aos estudos e projectos. Dessa
forma, separam-se os tráfegos produzidos por duas actividades distintas, desenvolvidas na mesma zona: as
actividades operacionais portuárias e as de lazer.
É neste jogo de equilíbrio que o porto de Lisboa cumpre a sua função portuária e as populações beneficiam
da paisagem do maior e um dos mais belos estuários da Europa.
Sendo por todos reconhecida a importância do sector dos cruzeiros para um maior protagonismo das
cidades portuárias, é inegável o desenvolvimento desta actividade no porto de Lisboa; tem contribuído de
forma muito significativa para a internacionalização da cidade. De facto, em 2003 o porto de Lisboa registou
264 escalas de navios de cruzeiro, detendo a liderança entre os mais de oitenta portos associados da Cruise
Europe, na fachada atlântica.
Para fazer face ao crescimento deste segmento de tráfego e no sentido de procurar oferecer serviços de
maior qualidade a um mercado cada vez mais exigente, a autoridade portuária prevê, para breve, a criação
de um novo terminal de cruzeiros moderno e eficiente que, garantirá uma melhor relação dos turistas com
a cidade.
O novo terminal de cruzeiros permitirá a acostagem em simultâneo de vários navios e estará dotado de
equipamentos de segurança, por forma a cumprir os requisitos exigidos pelo mercado de cruzeiros.
À luz das novas tendências mundiais segundo as quais as gares marítimas se estão a transformar, cada vez
mais, em pólos de lazer e de comércio, contribuindo para a valorização do porto enquanto destino de
cruzeiro pelo seu conforto e atractivos, o projecto do novo terminal de cruzeiros do porto de Lisboa contempla, na sua envolvente, a criação de um conjunto de espaços lúdico-comerciais. Este conjunto de espaços permitirá por um lado uma maior rentabilização desta infra-estrutura, colmatando assim os problemas
inerentes à sazonalidade deste tipo de tráfego em Lisboa, e por outro lado a criação de mais um local de
aproximação da cidade ao seu porto.
Ainda relativamente aos novos projectos para a frente ribeirinha, é de salientar o projecto da Embaixada do
Japão que consiste num jardim na zona de Belém, com 461 cerejeiras japonesas a assinalar os 461 anos da
chegada dos portugueses ao Japão.
Mais a jusante, a nascente da Doca do Bom Sucesso, na área ocupada actualmente por um edifício que
pertenceu à Marinha, está prevista a construção de uma unidade hoteleira de cinco estrelas que integrará
serviços de apoio complementar à actividade da náutica de recreio. Este projecto com o traço do Arq.º Manuel Salgado integra-se no processo de requalificação da zona de Belém e Bom Sucesso que procura manter
uma qualificada valorização funcional da charneira doca Bom Sucesso.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
135
Esta intervenção de requalificação só se torna possível após longos anos de negociação com a Marinha Portuguesa, em que ficou acordada a entrega à APL das áreas degradadas do Bom Sucesso, das quais faz parte
o edifício, recebendo a Marinha como contrapartida, com elevados custos para a APL, um novo edifico em
Alcântara para a instalação dos seus serviços.
Um outro projecto de revalorização das áreas ribeirinhas degradadas será o da zona da Docapesca, em
Pedrouços, onde se pretende converter a doca existente para a náutica de recreio, uma actividade portuária
complementar. A envolvente da doca será objecto de reconversão urbanística, à luz da resolução do Conselho de Ministros n.º 162 de 2 de Outubro de 2003, onde é declarado o interesse público da requalificação
urbanística da área entre Pedrouços e Dafundo, sob jurisdição da APL.
Neste sentido, será também interessante salientar que os grandes projectos da cidade de Lisboa, com alguma proximidade à frente ribeirinha que se encontra em fase desenvolvimento segundo o traço de arquitectos
de renome internacional, prevêem infra-estruturas com vista a uma maior ligação com a frente de rio. É
disso exemplo o projecto Jardins do Braço de Prata, que implicará um rearranjo da área do domínio público
hídrico, criando franca abertura do novo núcleo urbano ao rio.
Na frente ribeirinha fronteira ao empreendimento serão promovidos usos marcadamente de superfície com
actividades lúdicas de ligação ao espaço edificado.
O porto de Lisboa na sua especificidade obriga à definição de estratégias assentes na diversidade que, tendo
sempre presente por um lado o desenvolvimento da actividade portuária e por outro a preservação da herança cultural, contemplem também a criação de um conjunto de usos dos espaços de forma a que estes se
constituam com ambientes atractivos e acessíveis para todos no presente e no futuro. Só assim, neste jogo
de equilíbrios se conseguirá que a cidade se aproprie do seu porto e que a paisagem portuária seja naturalmente assumida como paisagem urbana.
É nesta lógica que a APL tem vindo a promover a qualidade da relação porto-cidade enquanto factor crítico
de sucesso, procurando encontrar modelos de excelência sustentáveis num porto com laços ancestrais á
cidade. Torna-se assim crucial a saudável coabitação dos diversos poderes envolvidos na gestão de um tão
vasto e complexo estuário, bordejado por onze municípios e que inclui, para além de importantes infraestruturas portuárias, uma extensa área de Reserva Natural. Só desta forma será possível conseguirmos
o nosso propósito na linha que vem defendendo a AIVP, ou seja, favorecer a competitividade de lugares
portuários respeitando as expectativas dos cidadãos em termos de qualidade de vida e do desenvolvimento
sustentável. ❘❙❚
São onze os municípios da Área Metropolitana de Lisboa que discutem a forma de desenvolverem e modernizarem as suas orlas ribeirinhas e esquecem-se muitas vezes do próprio estuário em si, ele que reúne todos
o municípios que o envolvem. Era bom que quando pretendemos conquistar e desenvolver as nossas orlas
ribeirinhas em relação ao mar não nos esquecêssemos também de que o mar nos pode ligar. Raramente
se vêem movimentações no sentido de juntar todos os municípios com frente ribeirinha, de forma a discutirem opções de desenvolvimento para o futuro, como foi o caso nos finais da década de oitenta, aquando
da elaboração do Plano Regional de Ordenamento de Território de Lisboa, em que foi possível produzir,
durante cerca de dois anos, imensos documentos que foram totalmente subscritos pelos executivos de
todos os municípios da Área Metropolitana de Lisboa e pelos técnicos ligados às estruturas de planeamento,
criando-se uma mais valia de conhecimento e uma mais valia de potencial desenvolvimento que depois,
infelizmente, se perdeu.
Com o estuário do Tejo passa-se mais ou menos a mesma coisa. Há um denominador comum que é o
estuário, há uma Autoridade Administrativa que tutela, mas parece-me que deveríamos começar a tentar
encontrarmo-nos em conjunto, para estabelecer as estratégias de desenvolvimento para todo este território
que tem um potencial imenso, em que os recursos disponíveis para cada um são diferentes e em que por
vezes não se conseguem fazer com maior celeridade defesas patrimoniais ou ambientais porque os recursos
são escassos; quase que deveria existir uma espécie de fundo de compensação de ocupação das margens
ribeirinhas, uma espécie de “Protocolo de Quioto” para o estuário do Tejo, em que se comprasse a taxa
de ocupação para que fosse possível preservar as condições ambientais, históricas e culturais que o estuário
tem, através de um fundo compensatório visando estabelecer condições de sustentabilidade.
Intervenção de
Manuel Quaresma
Arquitecto, Câmara Municipal de Oeiras, Portugal
Complementaridade
e diversidade do Estuário do Tejo
Mergulho da Baleia
Piscina Oceânica de Oeiras
Passeio Marítimo - Oeiras
Geyser – Paço de Arcos
Apesar da frente ribeirinha do estuário do Tejo ser território do Concelho de Oeiras, a sua jurisdição
administrativa está cometida à Administração do Porto de Lisboa (APL), o que não tem inibido a Câmara
de, através do diálogo e do estabelecimento de parcerias construtivas, prosseguir activamente na modernização, recuperação e qualificação de toda esta faixa, o que se acentuará nos tempos mais imediatos.
Com base num protocolo de aplicação geral assinado entre a Câmara Municipal de Oeiras (CMO) e a
APL, a que se associam protocolos específicos para projectos caso a caso, tem sido possível desenvolver
estudos, projectos e obras, de iniciativa de uma, outra, ou ambas as entidades, com resultados já visíveis,
e que demonstram o empenho desta autarquia em prosseguir o acentuado ritmo de desenvolvimento do
Município em todas as suas vertentes, nomeadamente na qualificação ambiental de todo o território.
Há obra feita, há obra em curso, há obra em estudo e a ser lançada. O estuário do Tejo é um património ambiental, económico e sócio cultural que deve ser protegido, qualificado e optimizado através
de uma grande diversidade de ambientes e equipamentos, adequados aos locais próprios em que se
instalam, e em regime de complementaridade entre todos os territórios ribeirinhos.
Cada sítio é um sítio, cada local é um local e quando se actua é necessário ver bem o que se passa à
volta, porque cada sítio tem a sua própria solução e potencial de benefícios imensos se não se fechar o
olhar só para o seu próprio umbigo.
Entrando na costa em Oeiras, começamos pelo Forte de S. Julião da Barra sobranceiro à Praia da Torre
e demais equipamentos, requalificados, ara os quais a Câmara executou os acessos, parqueamentos e
arranjos paisagísticos que a tornam num exemplo correcto de ordenamento litoral.
Aqui nasce o passeio marítimo que virá a desenvolver-se até ao limite do Concelho e onde está uma escultura
referente às baleias que em tempos idos se avistavam, por vezes trazidas pelas correntes quentes do Golfo.
Seguindo o passeio marítimo chega-se à piscina Oceânica, já concluída, a qual faz parte de um projecto
mais vasto que inclui o Porto de Abrigo de Oeiras para a náutica de recreio, cujo molhe e contra-molhe
já estão a ser construídos, e em que a 2ª fase da obra respeitante aos lugares de amarração e equipamentos de apoio estará concluída em 2005, oferecendo mais de 250 lugares de amarração, manutenção e reparação, assim como o apoio de restauração e de comércio, aplicado ao local.
O passeio marítimo contorna o Forte de Catalazete e chega às piscinas do Inatel estando a partir deste
ponto já executado o seu prolongamento até ao Forte das Maias, na ponta nascente da Praia de Stº
Amaro de Oeiras. Esta obra, pronta em Abril de 2002, engloba a reformulação de todos os equipamentos da Praia de Stº Amaro de Oeiras os quais, acopolados ao passeio e dispondo de todas as infra-estruturas, permitirá passear a pé, tranquilamente, de S. Julião da Barra a Stº Amaro de Oeiras, com apoio
diversificados e correctamente instalados a que se junta o aumento do areal da praia, com a inclusão de
um pontão em cada extremo, que permitirão a recolha e manutenção da areia.
A partir da praia de Stº Amaro de Oeiras encontra-se em projecto de execução o prolongamento do
passeio marítimo até à praia de Paço de Arcos e também a reformulação da plataforma das Fontainhas,
área de excepção, que irá conter equipamentos de recreio e lazer, nomeadamente uma nova piscina
oceânica, de características diferentes da de Oeiras, assim como restauração e eventual equipamento
hoteleiro (dos chamados “hotéis de charme”) os quais se enquadrarão no passeio marítimo.
A praia de Paço de Arcos será associada às Fontainhas no domínio das questões relativas à acessibilidade
e parqueamento e à utilização do areal e dos equipamentos de apoio, dispondo-se assim de condições
de maior qualificação na oferta de serviços aos frequentadores.
Passando a Doca da Direcção Geral de Faróis, que deverá ser olhada de modo a optimizar a utilização
daquele espaço, chega-se à Praia Velha ou dos Pescadores, em Paço de Arcos, em que ao edifício do
Clube Náutico se associou a recuperação do “molhe pombalino”, o “geyser” e a nova sede do Clube.
Estão em desenvolvimento os projectos finais para o novo edifício dos pescadores e a praça pública
sobranceira à praia velha.
O troço do Passeio Marítimo entre este local e Caxias, está actualmente em fase de elaboração de projecto tendo em conta a sua relação com a frente urbana de Paço de Arcos e considerando intervenções
que possam criar sinergias com o espaço urbano existente e com a protecção física ao mesmo, visto
ser um local de forte agressividade marítima.
Na frente de caxias, junto à curva do Mónaco, encontra-se já concluída a recuperação do Forte de S.
Bruno e espaço envolvente, a que se adicionará junto ao desnível da marginal um conjunto de apoios
incluindo uma galeria comercial para artesanato, café-bar, etc.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
A possibilidade de execução do passeio através da obra recente de protecção ao caminho de ferro nas
curvas da Cruz-Quebrada irá potenciar a utilização deste espaço, assim como uma melhoria das condições
de acesso através de uma passagem inferior em Caxias. A recuperação dos Fortes é um objectivo da Câmara Municipal, que já está a desenvolver os estudos necessários à recuperação do Forte do Areeiro (Stº
Amaro de Oeiras) o qual foi recentemente disponibilizado à Autarquia através do protocolo celebrado com
a Marinha.
O encerramento da Lusalite e dos Fermentos Holandeses na área da Cruz Quebrada permite o estabelecimento de parcerias entre a CMO, a APL, REFER/CP e a iniciativa privada, que deverá incluir o desenvolvimento de equipamentos e serviços, assim como uma marina e uma nova piscina pública, reordenamento
da distribuição de tráfego de acessos ao Estádio Nacional, a duplicação da Marginal a Sul da via férrea, assim
como a continuidade do passeio marítimo entre a curva do Mónaco e a frente ribeirinha de Algés-Dafundo,
estabelecendo-se uma articulação correcta entre os dois elementos naturais.
A frente ribeirinha Algés-Dafundo, com obras já bem visíveis no seu lado nascente, como é o caso do VTS
(Sistema de Vigilância e Controlo de Tráfego Marítimo), as áreas de apoio à náutica de recreio e as áreas para
equipamentos de recreio e lazer, a que se associa uma praça multiusos para espectáculos e outros eventos
ao ar livre, vai em breve ser alvo de uma 2ª fase de intervenção que se prolongará até ao Jamor, incluindo
instalações para os pescadores, novas instalações para o Sport Algés e Dafundo e para a Federação Nacional
de Vela, assim como um pequeno porto de recreio e equipamento hoteleiro, tudo isto enquadrado por
amplos espaços verdes e pela continuação do passeio marítimo que termina no edifício VTS. ❘❙❚
Portos, frentes de água, requalificação das zonas ribeirinhas, reapropriação das áreas portuárias e dos espaços ribeirinhos pelas populações, desafios de intervenções e gestão sustentáveis, tudo isto são conceitos e
preocupações que cada vez mais alargado número de decisores e responsáveis de cidades portuárias transporta consigo e para as quais procura encontrar respostas.
Trata-se, pois, de um conjunto de problemas reais, designadamente das cidades ribeirinhas, que nos junta
aqui nestes dias, pois as situações de separação física, urbana, económica e social entre as frentes ribeirinhas
e as suas cidades ganhou tal dimensão que urge pôr em prática soluções que, respeitando as vocações
portuárias instaladas e as valias económicas associadas, restabeleça uma ligação harmoniosa com as estruturas urbanas adjacentes e as respectivas populações e anulem o divórcio existente com áreas que possuem
normalmente um elevado valor ecológico e paisagístico.
A cidade de Setúbal também padece desse problema, em resultado de o seu porto estuarino e as respectivas
administrações portuárias terem concentrado ao longo de décadas – como aliás sucede em outras cidades
portuguesas – competências sobre largas faixas de territórios sem actividades portuárias, impedindo-se assim
o seu adequado uso para funções urbanas e retirando-se também às populações a possibilidade de fruírem
o bem-estar e a qualidade de vida que proporciona uma sadia relação com a água.
Urge, portanto, alterar esta situação, através de acções conjugadas de natureza jurídica, urbanística, económica e paisagística, optimizando as funções portuárias e libertando as restantes áreas para outras actividades
que não sendo afectas à actividade portuária clássica, possam conferir novas dinâmicas de desenvolvimento
sustentável às áreas ribeirinhas.
É necessário devolver aos Municípios a jurisdição sobre espaços ribeirinhos, bem como atribuições e competências em domínios ligados com o ordenamento do território e planeamento ambiental que, por via dos
estatutos e orgânicas das administrações portuárias, lhes têm estado incorrectamente atribuídas. Têm estado, assim, os Municípios arredados de exercerem competências constitucionais em parcelas importantes,
em termos de áreas e valor real e potencial do seu território, pesar de possuírem legitimidade democrática
conferida pelo voto popular, o que não acontece com as administrações portuárias.
Assim, no plano estritamente jurídico, haverá que redefinir o estatuto das autoridades portuárias, as suas
competências e áreas de jurisdição, principalmente no que toca às não afectas directamente a funções portuárias. O que implica, em termos de planeamento e gestão dos territórios ribeirinhos, a clarificação das
frentes de água destinadas aos vários tipos de movimentação de cargas, das áreas que deverão ser afectas a
náutica de recreio (que deverá ser privilegiada) e definição de critérios de ordenamento e desenvolvimento
urbanístico, ambiental, desportivo e lúdico destas últimas.
SESSÃO IV
137
VTS - Sistema de vigilância e controlo do tráfego
marítimo / Algés
Intervenção de
Carlos de Sousa
Presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Portugal
As populações na cidade portuária
global: o caso de Setúbal
O futuro das áreas ribeirinhas: o caso de Setúbal. O movimento encetado na década de noventa
no sentido de os portos e as suas cidades deixarem de viver de costas voltadas é hoje irreversível, como
bem o demonstra esta conferência. Deverá ser também o caso de Setúbal, estando a sua Câmara Municipal
fortemente motivada para se envolver nesse processo, incluindo este objectivo nas suas opções estratégicas
para o futuro de progresso que desejamos construir.
Estando os interesses das populações, como é compreensível, no centro das nossas preocupações, também
o futuro sustentável das áreas ribeirinhas do Sado terá, a nosso ver, que ser desenhado com base no objectivo de reapropriação das áreas portuárias e dos espaços ribeirinhos pelas populações da cidade de Setúbal,
numa linha idêntica à que já se defende e pratica noutras cidades portuguesas e da Área Metropolitana de
Lisboa, como é o caso de Lisboa. Com efeito, o Plano Estratégico de Lisboa do início dos anos noventa e
os seus desenvolvimentos posteriores na transformação, ainda que por vezes discutível, da zona ribeirinha
da cidade de Lisboa e consequente reformulação do Porto de Lisboa – com especial relevo para a profunda
transformação da Zona Ocidental da cidade com a EXPO98 – transmite-nos alguns ensinamentos que merecem reflexão e estudo atentos.
À luz das experiências já iniciadas ou concretizadas a que hoje é possível, e desejável, acrescentar de forma
assumida os princípios que informam políticas de desenvolvimento sustentável do território, com especiais
cuidados quando se trata de espaços de maior sensibilidade, tanto pela sua localização junto dos planos de
água como pela sua riqueza ecológica – Estuário do Sado – é, desde já, possível enunciar algumas bases de
orientação para o que a Câmara Municipal de Setúbal entende dever ser a futura relação da cidade como o
seu porto e, fundamentalmente, com o seu estuário do Sado.
Porto de Setúbal
Critérios específicos de ordenamento territorial e de planeamento ambiental sustentável
a observar nas frentes ribeirinhas. Portanto, para além das questões jurídicas e institucionais que se
colocam no actual e no futuro relacionamento dos Municípios com as actuais entidades portuárias, há que
estabelecer princípios e regras que, seja qual for a forma política ou institucional que venha regular as intervenções futuras nas frentes ribeirinhas, permitam perspectivar a aplicação de critérios adequados de ordenamento
territorial e ambiental, por forma a ser possível em todas as áreas, independentemente do seu uso, promover
a sua sustentabilidade actual e futura.
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
Sem pretensão de ser exaustivo, parece ser oportuno enunciar, então, alguns princípios guia para as intervenções futuras nas frentes ribeirinhas:
• Delimitar, conter e disciplinar os usos a atribuir aos diferentes espaços ribeirinhos;
• Desenvolver projectos integrados de regeneração e qualificação do território ribeirinho, tendo em
conta que os mesmos deverão passar a ser tratados de acordo com os critérios de multifuncionalidade adequados ao diferentes usos a adoptar;
• Aplicar critérios e consequentes medidas de preservação e valorização de importantes áreas patrimoniais que existem nas áreas portuárias;
• Promover a preservação e valorização dos aspectos ambientais destas áreas, dada a particular sensibilidade ecológica das margens ribeirinhas, especialmente as estuarinas;
• Promover a reapropriação pública das frentes de água e criar espaços públicos de uso polivalente,
adoptando-se o mesmo critério para as instalações desafectadas de usos portuários;
• Estabelecer vantajosas relações institucionais com entidades públicas e privadas, tendo em atenção
e como objectivo central criar condições de gestão integrada deste território, o que pressupõe o
estabelecimento de formas de cooperação e parceria com os diversos actores que intervêm nas
áreas portuárias.
Bases para uma nova ligação da Cidade de Setúbal ao Estuário do Sado. Como se tem referido, a reapropriação das áreas portuárias e dos espaços ribeirinhos não afectos directamente a actividades
portuárias pelas populações da cidade de Setúbal, deve constituir o objectivo principal de qualquer intervenção nestas áreas. Isto implica a definição e o desenvolvimento de estratégias articuladas/coordenadas
entre a Câmara Municipal de Setúbal e a entidade portuária (Administração dos Portos de Setúbal e
Sesimbra - APSS), que possibilitem:
• A progressiva eliminação da segregação física e visual das áreas portuárias em relação ao território
envolvente com a redução do efeito barreira dos espaços portuários entre a cidade de Setúbal e
o estuário;
• A reapropriação dos edifícios de arqueologia industrial, bem como a preservação e valorização da
identidade patrimonial e ambiental das zonas ribeirinhas;
• A promoção da apropriação pública das frentes de água, conferindo utilidade social ao espaço sob
jurisdição portuária, especialmente os que forem sendo libertados de funções ligadas à actividade
portuária;
• Aquisição e manutenção das frentes de água como propriedade pública;
• Diversificação das actividades económicas nos espaços ribeirinhos, associadas ao incremento da náutica de recreio, dadas as excelentes potencialidades da Baía de Setúbal e do plano de água do seu
estuário, designados, justamente, membros do restrito “Clube das Mais Belas Baías do Mundo”;
• Redimensionamento e modernização das condições de acostagem, parqueamento e movimentação da frota de pesca e desenvolvimento de instalações de frio que contribuam para relançar a
actividade económica da pesca de mar na cidade e na região de Setúbal;
• A criação de áreas de espaço requalificado para uso público sem restrições. E utilização polivalente
dos espaços e instalações segundo critérios de planeamento, gestão e requalificação urbana, com a
introdução das funções habitação, equipamentos sociais, culturais e desportivos que tirem partido
das frentes de água. É o que se espera, no essencial do Programa Polis de Setúbal que envolve uma
parcela significativa de terrenos do porto de Setúbal;
• A criação de condições para projectar Setúbal e o seu porto como um destino turístico e centro de
náutica de recreio, através da reabilitação e ampliação das docas existentes e da criação de estruturas de marina seguindo padrões de nível internacional assentes em conceitos de Desenvolvimento
Sustentável.
Naturalmente que o desenvolvimento destas bases deverão ter posterior suporte de adequados estudos
e projectos que rompam com a tradicional quase exclusividade da actividade económica “movimentação
de cargas” que caracteriza ainda hoje o porto de Setúbal. É de uma nova visão e de um novo desígnio para
os estuário do Sado e suas áreas ribeirinhas que se trata, obrigando, nomeadamente a:
• Uma abordagem multifuncional das operações de reconversão e requalificação das áreas ribeirinhas
do estuário, que assentem numa correcta combinação de usos, assegurando uma ocupação equilibrada entre funções portuárias, funções de apoio à pesca e funções urbanas;
SESSÃO IV
139
• Uma inter-ligação entre a recuperação e requalificação das frentes ribeirinhas do estuário e a reabilitação do Centro Histórico de Setúbal;
• O reordenamento da circulação na zona ribeirinha e nas áreas envolventes com a retirada do tráfego
pesado do centro da cidade;
• O saneamento ambiental das frentes mais degradadas e poluídas, envolvendo medidas de limpeza,
adopção de tratamento de efluentes e resíduos ou novas tecnologias e, em caso extremo, transferência de localização ou mesmo medidas tendentes ao encerramento da actividade.
Quanto à adopção de desenvolvimento sustentado na náutica de recreio como actividade âncora do estuário
do Sado, ela explica-se quase por si, olhando com inteligência para a convergência de várias e excelentes
condições naturais disponíveis e, até hoje, pouco aproveitadas a favor dos interesses de Setúbal.
De facto, quer a simples observação quer trabalhos realizados por entidades públicas e privadas, permitem
concluir que a náutica de recreio e lazer tem tido uma posição secundária no porto de Setúbal, com consequência negativas, provocando, inclusive, a necessidade de procura de estacionamento de embarcações da
população local em Lisboa e no Algarve e o desvio de importante tráfego marítimo potencial, que passa ao
largo de Setúbal para outras paragens.
Por outro lado, o desenvolvimento de funções e actividades de náutica de recreio num estuário como o do
Sado cria importantes sinergias nas áreas envolventes tanto de natureza comercial e turística, como desportiva e cultural, além de criar e promover uma vasta rede de actividades associadas com tradições em Setúbal
e, por isso, com boas condições para criação de emprego.
Quando se fala em náutica de recreio pensa-se logo em marina como uma actividade meramente complementar de uma operação imobiliária especulativa que, no limite, provoque uma “privatização” dos usos
que se querem públicos nas áreas ribeirinhas requalificadas. É certo que existem exemplos que permitem
consolidar essa tese e, também é certo que a instalação de marinas valoriza o imobiliário existente, promovendo mesmo a necessidade da sua recuperação e reabilitação, e pode reclamar associação com novas
construções, por razões logísticas e de equilíbrio económico do conjunto da operação. Contudo, existem
também bons exemplos de instalações de náutica de recreio e de lazer que, se bem dimensionadas e geridas
valem só por si, com pequenas intervenções imobiliárias associadas.
Há, portanto, que combater um certo mito da operação especulativa ligada à instalação de infra-estruturas e
equipamentos de náutica de recreio e procurar, racionalmente e com base em critérios e desenvolvimento
sustentável, valorizar de forma adequada as excelentes condições naturais da Baía de Setúbal.
Baía de Setúbal
Área Metropolitana de Lisboa – o Regresso ao Rio
SESSÃO IV
Docapesca – Setúbal
Quanto ao objectivo do redimensionamento e modernização das instalações portuárias, de refrigeração e
de comercialização ligadas à pesca no porto de Setúbal, ela representa uma assumida estratégia de contribuir
para o relançamento de uma importante e tradicional actividade económica da cidade e da região de Setúbal.
Responde também ao facto de, com o encerramento das instalações da Docapesca em Pedrouços (Lisboa),
se abrir uma oportunidade para se fixar em Setúbal, o porto mais próximo de Lisboa, com tradições neste
sector, um forte núcleo de desenvolvimento de uma actividade económica de indiscutível interesse regional
e nacional e com forte impacto na dieta e gastronomia nacionais.
Ao mesmo tempo, dada a reconhecida qualidade de todo o pescado de Setúbal, não será porventura excessivo traçar também como objectivo estratégico, aliado a este sector, promover a criação de um “Centro
de Excelência do Peixe” em Setúbal.
Em conclusão:
• Prosseguir estratégias de integração cidade/ porto/ estuário;
• Requalificar os espaços existentes e a ganhar para funções urbanas nas frentes ribeirinhas;
• Preservar e valorizar as identidades patrimoniais e ambientais das frentes ribeirinhas do estuário;
• Promover o saneamento ambiental das frentes de rio fortemente degradadas e intervir nas actividades
poluidoras existentes;
• Reforçar o carácter público dos espaços a apropriar pela cidade e pela sua população;
• Criar e impulsionar factores de desenvolvimento económico sustentável nas frentes ribeirinhas, incluindo complementaridades de actividade marítima comercial com náutica de recreio e actividades
de relançamento e apoio à pesca de mar.
São estes os pilares fundamentais de uma reconciliação da cidade de Setúbal com o seu porto, o seu estuário
e o seu rio, e marcarão o início de uma futura nova vida em comum. ❘❙❚
141
Viver e Trabalhar na Cidade Portuária
A qualidade ambiental é o novo desafio para as cidades portuárias, condição que não se coaduna, muitas vezes, com a caracterização das zonas industriais dos portos tradicionais. ❘❙❚
SESSÃO V
Christel Wiman
Directora de Gestão, Stockolms Hamn AB, Suécia
Presidente da Mesa
Intervenção de
Giorgio Pagano
Presidente da Câmara Municipal de La Spezia, Itália
Modernidade e identidade
da cidade portuária:
o exemplo de La Spezia
A relação entre a cidade de La Spezia e a sua frente marítima é difícil e muito contestada.
Durante muitas décadas a nossa cidade tinha uma monocultura industrial, ou seja, nas faixas litorais havia actividades relacionadas com os estaleiros navais e o arsenal militar. Com o tempo, o porto tem vindo a assumir
um papel cada vez mais importante, devido aos investimentos feitos ao nível tecnológico.
Nos últimos anos, graças à intervenção de um grupo privado, conseguimos organizar novas actividades industriais, tentando sistematizar tudo o que diz respeito à vida portuária e às actividades da cidade de La Spezia.
Assistimos ao aparecimento de actividades náuticas de luxo junto ao porto e à revitalização do turismo visto
que a cidade foi sempre, durante séculos, um destino turístico importante.
Um dos pontos principais do planeamento territorial em la Spezia foi o relacionamento com o mar: permitir
à cidade redescobrir a sua própria identidade.
Os objectivos fundamentais do processo de transformação que levamos a cabo têm a ver com a coordenação de três pólos tradicionalmente conflituosos: a vocação portuária, a vocação turística da cidade e as
actividades portuárias propriamente ditas. Relativamente ao primeiro aspecto, elaborámos um plano – Plano
de Zona – que, em Itália está definido graças a dois instrumentos: por um lado o Plano Regulador do Porto
(PRP) e por outro lado o Plano Urbanístico da Cidade (PUC).
O primeiro plano propicia a restituição à cidade de uma série de actividades de grande importância estratégica,
visto que há uma linha de continuidade entre, por um lado o centro urbano e, por outro, a frente marítima.
Tentamos expandir o porto a montante e a jusante, fazendo essa ligação graças ao Plano Regulador do Porto.
Temos vindo a trabalhar arduamente no Plano Regulador do Porto e na sequência desse plano elaborámos e
definimos o que era o PUC. Chegou-se a um acordo entre as autoridades portuárias e os municípios, depois
de um longo processo de negociações e de concertação no que respeita à definição das áreas de intervenção
e de competência entre o porto e a cidade.
O PUC desempenha um papel insubstituível na conjugação de várias vocações portuárias, urbanas, turísticas,
náuticas, etc, procurando definir os limites e fronteiras das respectivas actividades, dinamizar a economia da
cidade e o papel que deve desempenhar a zona ribeirinha.
Por outro lado, requalificámos, também, a zona da marina que já existia, mas que estava degradada criando,
assim, novas áreas portuárias; como é o caso de Canaletto e Fossamastra.
O PUC define ainda a zona de área portuária da primeira bacia de Mirabello, com os edifícios urbanos e
sistemas multiusos. Foi graças a este plano que construímos um hospital junto dessa área que dinamiza a
prestação de serviços às diversas actividades aí existentes.
A ênfase foi colocada nos temas principais que dizem respeito à transformação da relação entre a cidade e o
mar, sem sacrificar as actividades portuárias.
Se por um lado é verdade que a expansão portuária prevista vai desenvolver-se, sobretudo a montante do
porto, também é verdade que o PUC identifica uma série de elementos que estão relacionados com a requalificação da faixa litoral, através da reconversão da zona a montante do bairro de Fossamastra, que incluiu a construção de um canal interior, permitindo reformular a circulação do tráfego de contentores. Isto para dizer que os
locais onde se encontram os contentores vai ser desafectado para dar lugar à reconversão da faixa litoral.
Do outro lado da cidade também prevemos a construção de um pequeno porto turístico na enseada de
Borgo di Cadimare para fins meramente turísticos.
Tentamos garantir a compatibilidade das novas expansões do porto com a vida nos bairros, no centro da
cidade, tendo em conta as condições de qualidade urbana, o aumento das actividades de produção e do
número de postos de trabalho e, sobretudo, a reconversão dessas zonas para fins turísticos.
Esta estratégia, a dois níveis, pretende sobretudo fazer com que La Spezia se torne num verdadeiro centro
logístico e turístico desta região de Itália, o que pressupõe a reconversão total da cidade.
Não obstante a extraordinária vocação da cidade, o porto não tem uma história antiga; a nossa história recente resulta de actividades de produção localizadas neste território, sobretudo no arsenal militar e, também,
na especialização ao nível do tráfego de mercadorias.
Foi só no final dos anos 80 que La Spezia se tornou no principal porto italiano em transporte contentorizado
de mercadorias; dotado para esse efeito de infra-estruturas ferroviárias e rodoviária muito sólidas, não obstante o reduzido espaço disponível e a ausência de algumas infra-estruturas.
Neste cenário nascem os primeiros conflitos com a cidade. É verdade que o porto representa um elemento
estratégico nacional importante, mas também é verdade que os bairros da cidade sofreram penalizações que decorrem do desenvolvimento do porto e não da cidade. Procurámos construir acessibilidades entre as áreas por-
Viver e trabalhar na cidade portuária
tuárias, o centro urbano e as zonas periféricas de La Spezia, aproveitando a construção da marina de Canaletto.
A partir deste momento o conflito entre cidade e porto foi-se agravando, apesar de durante alguns anos o
porto ter sido o motor económico que permitiu a La Spezia ultrapassar, durante os anos 80, a grave crise
que se verificou nos estaleiros navais e no sector militar.
Para além de todos os aspectos que dizem respeito às infra-estruturas, à dimensão e às características tecnológicas das áreas portuárias de La Spezia, tivemos que contribuir para o debate urbano sobre a cidade,
dinamizado pelo PUC.
Nas últimas décadas levámos a cabo uma série de iniciativas empresariais no âmbito da cidade, ou seja,
criámos uma nova dinâmica na economia, o que tornou menos traumático e doloroso o declínio do velho
modelo de desenvolvimento da cidade.
A cidade, do ponto de vista histórico, nunca usufruiu duma relação positiva com o mar, menosprezado
que foi o papel económico que o mar representa a vários níveis. Por outro lado, as iniciativas empresariais
importantes que nasceram nos últimos anos desenvolveram-se espontaneamente e dizem respeito, exclusivamente, a algumas actividades comerciais.
As contradições e os conflitos deste processo são evidentes. Por um lado, temos um porto que sufoca os bairros limítrofes da cidade, por outro, temos pequenos portos turísticos, enclaves pouco interessantes do ponto
de vista logístico, estaleiros que sofrem as consequências da presença de um turismo muito agressivo, etc.
A verdade é que não podemos continuar a descurar os aspectos que dizem respeito à realidade da frente
marítima. Graças a um programa específico conseguimos ultrapassar, nos últimos dois anos, estas dificuldades,
definindo aquilo que são as fronteiras do porto comercial e recuperando a primeira bacia com fins lúdicos e
turísticos, ou seja, elaborámos programas que visam a reconversão desta faixa costeira. E tudo isto foi feito
com base numa parceria entre o município, as autoridades portuárias e todos os operadores marítimos.
O que significa a reapropriação do mar? Significa que todas as entidades, públicas ou privadas, têm a possibilidade de intervir nos projectos de reabilitação previstos para a zona. Significa, igualmente, que temos de
regular a reconstrução física entre a cidade e o mar.
Não podemos esquecer, também, as potencialidades naturais das enseadas que caracterizam esta zona da
Itália, de que é exemplo a reconstrução da enseada de Cadimare e de uma avenida que permite belíssimos
passeios nessa zona.
Desta forma, o PUC e o PRP permitem o desenvolvimento portuário comercial, náutico e turístico, melhorando a relação entre a cidade, o porto e a orla costeira.
As características da planificação partilhada são:
• A existência de um único porto comercial;
• Limpeza e requalificação da zona antiga da bacia portuária para fins turísticos;
• Racionalizar a acessibilidade por via férrea, graças à introdução de novos troços ferroviários;
• Transferência das marinas actuais - Fossamastra e Canaletto – para a zona nova do porto de Mirabello,
graças à disponibilização de uma zona de terrenos pertencentes à Enel.
Temos um único porto; a montante, a zona turística e a náutica; e a jusante, as zonas comerciais. No meio
existe a marina de Levante e o canal interno que permite a entrada e saída de navios.
A administração municipal propôs a transformação da zona ribeirinha em colaboração com as autoridades
portuárias, no quadro do PUC e do PRP, de acordo com determinadas características:
• Requalificar a avenida marginal e dinamizar o passeio marítimo Morin;
• Criar novos espaços limítrofes ao centro urbano;
A recuperação urbana da primeira bacia representa para esta cidade uma ocasião preciosa para a valorização
da frente portuária e marítima, numa tentativa de abrir a cidade ao mar, mantendo a configuração da avenida
marginal, mas valorizando o passeio marítimo, restituindo-o assim à cidade e aos cidadãos.
Desta forma, a nossa intervenção tem de ser flexível, funcional e qualitativa, sempre na tentativa de tornar
a ligar a frente marítima ao centro urbano. Por essa razão procurámos desenvolver actividades culturais e
colectivas, actividades empresariais, etc.
Trata-se, assim, de uma intervenção extremamente importante que visa a requalificação do tecido urbano na
zona central da cidade, promovendo a revitalização da primeira bacia de La Spezia, enquanto expansão do
centro urbano na zona portuária.
A partir do prolongamento da avenida marginal junto ao mar – Morin – criámos zonas para os peões e,
sobretudo, tentámos organizar o trânsito rodoviário nessa zona.
SESSÃO V
145
Marina de Mirabello
Intervenção de
Sylvie Brosseau
Professora-auxiliar, Universidade de Waseda,
Tóquio
Os parques marítimos
do porto de Tóquio
Os critérios gerais para a implementação deste plano estão ligados, como já referi, à requalificação da primeira bacia de La Spezia; trata-se de um desenvolvimento longitudinal de cerca de 700 m, o que significa que
reconfigurámos totalmente as praças e outras zonas de edifícios, graças à eliminação de alguns edifícios antigos. É óbvio que os arquitectos também se preocuparam com a traça urbana junto da Avenida Itália, onde
se construíram edifícios comerciais e de habitação, etc, tentando manter a traça arquitectónica dos finais do
séc. XIX, que caracteriza a arquitectura desta zona.
Por outro lado, construímos uma marina para acolher os navios de cruzeiro e outros serviços turísticos.
Criámos também zonas de uso exclusivo para os peões junto à zona da Aurelia e, por fim, reconfigurámos
as zonas dos parques de estacionamento junto da primeira bacia de La Spezia.
Deve dizer-se que tentamos equacionar este plano de intervenção numa área de cerca de 45.000 m2, com
funções integradas (comerciais, culturais, náuticas, recreativas, lúdicas, etc.), incluindo a reconversão de uma
zona de 6.000 m2 a sul de La Spezia, sobretudo para zonas comerciais especializadas ligadas às actividades
de lazer e náutica de recreio.
É óbvio que, antes da intervenção, levámos a cabo estudos de viabilidade económica e ambiental.
Em síntese, as intervenções previstas são as seguintes:
• Cadimare: requalificação do centro urbano do pequeno porto turístico;
• Mirabello: criação de uma marina para a náutica de recreio;
• Avenida Morin: requalificação dos espaços públicos e do passeio marítimo;
• Primeira bacia portuária: recuperação urbana da zona de Calata Paita;
• Marina de Canaletto e de Fossamastra: substituição da actividade existente por serviços para fins turísticos agências de viagem, etc.;
• Marina de Levante: construção de uma gare marítima e localização de actividades comerciais.
La Spezia não virou as costas ao mar; pelo contrário, tentou aproximar-se do mar pela via da harmonia e,
sobretudo, pela via do diálogo entre a frente marítima e o centro urbano. ❘❙❚
O porto de Tóquio tem uma memória histórica, representada no papel essencial que desempenhou no
desenvolvimento da cidade de Edo (antigo nome de Tóquio) desde o séc. XVI, mas também um reconhecimento recente, dado que obteve o seu estatuto de porto internacional, apenas em 1941. É um lugar central
da história da cidade e da sua formação; é também um espaço que acumulou, durante algumas décadas,
todas as perguntas relativas à ruptura dos equilíbrios entre a cidade e o desenvolvimento económico, a degradação do ambiente e o desenvolvimento urbano.
Durante o período do “Alto Crescimento” (1955/1975), que fez do Japão uma grande potência económica, foram concentradas mais actividades e população na região de Tóquio; sucederam-se os planos de
ampliação do porto, procurando adaptar-se à inovação tecnológica com a construção do primeiro terminal
de contentores em 1967. Actualmente, voltado para as necessidades específicas da capital, a sua função é
sobretudo o armazenamento de bens de consumo (alimentos, papel e materiais de construção). Em termos
de valor comercial declarado, Tóquio é o primeiro porto do Japão, à frente de Yokohama, Nagoya, Osaka e
Kobe. É também o primeiro porto nacional no que diz respeito ao número de contentores movimentados.
À imagem da capital, o porto de Tóquio é também rico e moderno.
Durante esta época de crescimento, a poluição aumentou, o urbanismo cresceu, mas os recursos naturais
diminuíram, drasticamente, em proporção à excepcional riqueza do ambiente natural da cidade até ao início
da guerra. Com efeito, a população de Edo excedia já um milhão de habitantes no séc. XVIII, mas a natureza
(cursos de água, mar e litoral, vegetação e vida selvagem) estava muito presente. Havia uma cultura específica e rica, ao mesmo tempo douta e popular, que se foi consolidando ao longo dos séculos, e que teve o
seu ponto alto em Edo, acompanhando uma série de fenómenos naturais (fenómenos sazonais ou climáticos
como o vento, a neve...) percebidos através de paisagens e inscritos em práticas sociais.
A degradação do meio ambiente é um fenómeno concreto e tangível para os habitantes de Tóquio, que ficaram
completamente privados do mar, em resultado do desenvolvimento industrial e portuário da baía. Actualmente,
a superfície total de terraplanagens representa cerca de 4.500ha, ou seja, a superfície dos três bairros centrais da
cidade, divididos em cerca de trinta blocos cada vez mais distantes da baía. Além disso, foi construído um dique a
fim de proteger as zonas urbanas da subida das águas. Esta barreira isolou ainda mais os habitantes, do mar, que
Viver e trabalhar na cidade portuária
se tornou cada vez mais inacessível, ou mesmo invisível. O mar é considerado como fonte de desastres potenciais e não de benefícios. A baía tornou-se um local precioso, não pela proximidade do oceano, mas porque é
um local onde se pode construir. O equilíbrio entre a cidade e o porto quebrou-se, portanto.
O aproveitamento das zonas de terraplanagem vai desenvolvendo o porto, sobretudo a sua estrutura urbana e industrial, além de permitir outra função importante que é a do alargamento da rede rodoviária em direcção ao porto.
Esta realidade foi vista pelos habitantes como causa de aborrecimentos, prova de que o ordenamento urbano
está sempre voltado para o desenvolvimento das actividades económicas, em detrimento da qualidade de vida.
Apesar de tudo, ainda é possível usufruir da beleza da paisagem marítima a partir dos terraços em redor da baía
(templos, santuários, jardins abertos ao público). O mar tem um papel estético e recreativo importante, além
de funções insubstituíveis na vida quotidiana e na economia local, como a pesca e a recolha de algas.
No fim dos anos 60, assiste-se a numerosas controvérsias e discussões sobre a baía e o futuro do domínio marítimo, com os cidadãos a fazer valer as suas exigências através de associações e de “movimentos de habitantes”.
No plano industrial foi também muito marcante o tratamento de resíduos que vinham precisamente das
indústrias poluidoras, continuando a baía a reabsorver os desperdícios, mas de forma controlada. Dadas as
exigências dos habitantes formuladas nos anos 60, em 1970, o princípio de criação dos parques marítimos
é suspenso pelas autoridades metropolitanas. Uma comissão nomeada para o efeito, fez uma síntese dos
dados sobre a situação local, e em 1972 são propostas três orientações:
• Tornar o mar cada vez mais acessível, em toda a extensão do domínio marítimo de Tóquio;
• Ter em conta a continuidade da orla litoral formado pelo mar e pelas margens, tanto do ponto de vista
do equilíbrio ecológico, como da acessibilidade, a fim de permitir actividades recreativas variadas;
• Integrar a participação dos habitantes, aproveitando os seus conhecimentos e experiências, na concepção e gestão dos parques.
O projecto dos parques ribeirinhos situa-se no cruzamento de duas grandes preocupações. Por um lado, a recuperação da zona, tentando diversificar os modos de ocupação do solo e conciliar as actividades portuárias e
urbanas. Por outro lado, multiplicar os planos para criar mais zonas verdes na cidade e promover a protecção da
natureza, aproveitando a tendência para considerar os parques como equipamentos absolutamente indispensáveis
para a melhoria da qualidade do ambiente e para compensar as degradações do passado. Os objectivos são de
ordem quantitativa, mas também qualitativa, não apenas de um ponto de vista estético, mas também em termos
de qualidade ambiental. O que significa a mesma coisa, pois o que é apreciado no Japão, é a presença da natureza
inserida na cidade e na vida quotidiana, reconhecida e procurada nas suas expressões concretas e particulares.
Em 1975, a comissão dos parques ribeirinhos apresentou o conteúdo de um programa que compreendia a
protecção global do ambiente tendo em conta, ao mesmo tempo, o desenvolvimento do porto e da cidade.
Actualmente os 42 empreendimentos construídos em todo o domínio marítimo de Tóquio, representam 310ha de
terreno e 474ha de planos de água acessíveis. Acrescentam-se ainda quatro parques metropolitanos, ou seja 170ha,
administrados pela Direcção dos Espaços Verdes de Tóquio, enquanto que os parques marítimos dependem da
administração portuária. Estão ainda em projecto 200ha, para um total de 57 locais. Estes “parques marítimos” são
classificados em três tipos que correspondem à sua disposição, situação, utilização e a paisagens diferentes:
• 7 Parques litorais, com dimensão entre os 7 e os 86ha, cujo objectivo é a revitalização do litoral em coexistência
com actividades lúdicas. Três deles possuem praias reconstruídas. Neles é possível pescar, observar os pássaros
ou a vida aquática, fazer churrascos ou mesmo acampar. As instalações públicas dão a possibilidade de praticar
determinados desportos como o surf, a vela ou o golfe, num terreno de 54ha, todos eles a preços reduzidos;
• 19 Jardins portuários, com dimensões entre os 0,6 e os 5ha, cujo objectivo é melhorar a qualidade
ambiente urbano e aproximar o porto. Estes espaços servem de tampão à volta das instalações portuárias ou dos cais recuperados e oferecem zonas de lazer aos empregados do porto, constituindo,
ao mesmo tempo, janelas de observação ao dispor dos habitantes da cidade, sobre as instalações e as
actividades portuárias;
• 16 Paredões e vias pedonais que formam uma rede cujo objectivo é ligar entre si os diferentes parques
e jardins.
Os quatro parques metropolitanos propõem igualmente equipamentos de referência, como por exemplo o Yumenoshima: perto da marina de Tóquio, uma estufa de plantas tropicais de 1.500 m² é aquecida pelo calor recuperado
de uma fábrica de processamento dos desperdícios. O parque de Yumenoshima, “a ilha dos sonhos”, quer-se como
uma montra para a tomada de consciência do problema dos detritos, uma vez que foi este o local por excelência da
descarga a céu aberto, dando agora lugar a uma floresta de eucaliptos.
SESSÃO V
Zona de pesca
Zona de barbecue e campismo
Jardim portuário
147
Symbol Promenade
Parque dos pássaros da baía
A partir de 1985, um novo plano de urbanismo é projectado sobre uma ilha artificial de 480ha, situada no
centro do domínio marítimo de Tóquio. Hoje, a capital é “porto dos mares, dos ares e da informação”, e
pretende ser uma cidade de referência no coração da economia mundial, como Londres ou Nova Iorque.
No ano seguinte, este centro foi designado como um dos sete centros secundários de Tóquio, doravante
planificado como cidade multipolar. O programa retoma a fórmula clássica no que diz respeito à requalificação da zona ribeirinha, dividindo-a em quatro zonas funcionais: um centro de negócios, uma zona de lazer
e de comércio, uma zona residencial, e um centro internacional de exposições.
Contudo este projecto levanta numerosas críticas. O conflito entre os habitantes e o governo metropolitano
volta a acender-se. Para os primeiros, o desenvolvimento da frente marítima não tem outra ambição senão
a extensão do centro cidade; é conduzida por ambições políticas e económicas em detrimento da qualidade
do ambiente e da solução dos problemas urbanos. Em reacção a este projecto, os cidadãos de Tóquio vão
eleger, em 1995, como governador o candidato que se opõe ao projecto. A especulação veio desacelerar
esta operação, mas sem que isso conduzisse ao seu abandono. A construção de escritórios e alojamentos
está longe de atingir o que estava previsto. Nem o conjunto, nem os edifícios construídos apresentam
qualidade urbanística ou arquitectónica muito original. No entanto, a frente marítima é um verdadeiro êxito
popular, devendo-se o sucesso aos parques, paredões e espaços públicos, generosos em superfície e bem
ordenados, antes mesmo de as construções estarem projectadas.
Um exemplo desta realidade está patente em – Symbol Promenade, constituído por dois paredões em cruz,
com a dimensão de 80 m e um comprimento total de 4 km,– formando o maior espaço ao ar livre de
Tóquio, com um miradouro por cima da praia reconstruída, em frente à cidade e um percurso à beira de
água, passando por um ilhéu fortificado com vestígios da época da cidade de Edo, terminando num jardim
japonês que separa a zona portuária do sector terciário. Estes 4,5 km de caminho, proporciona um conjunto
panorâmico sobre a cidade e o porto.
O impacto do desenvolvimento da frente marítima é notável, sobretudo porque os meios de acesso foram
consideravelmente melhorados. Actualmente, linhas de monocarril, duas linhas de comboio e de metro
servem esta zona. O esforço feito para melhorar as ligações entre a cidade e o sector portuário através
de um passeio urbano, despertou as consciências para a constituição de uma rede entre os diferentes
parques e espaços verdes, sendo agora possível atravessar todo o domínio marítimo a pé ou de bicicleta.
Os exemplos não faltam:
• Tôkyôwan Yachôkôen - Parque dos pássaros da baía de Tóquio, 24ha, aberto desde 1989. A baía de Tóquio era um lugar de passagem muito importante para numerosos pássaros migratórios. As obras no litoral
suprimiram os pântanos e lagoas e destruíram as possibilidades migratórias bem como o habitat natural de
numerosas espécies animais, o que provocou reacções de vários movimentos de habitantes.
Os espaços verdes ocupados pelas obras foram posteriormente recuperados, permitindo que a fauna e a
vida selvagem reaparecessem. Em 1978, a cidade de Tóquio decidiu satisfazer os pedidos da sociedade,
tomando uma série de medidas de protecção dos pássaros. O parque de 24ha pôde abrir em 1989, com
postos de observação que permitem ver evoluir 140 espécies diferentes, em redor dos três principais lagos.
Desde o início do projecto, a cidade, através da Administração do Porto de Tóquio, confiou a concepção e
a administração deste parque à sociedade de protecção das aves. Equipas de voluntariado vão-se revezando
para organizar visitas e actividades educativas, enquanto os especialistas continuam a desenvolver as suas
investigações. A criação deste parque inspirou a ideia de constituir uma rede de santuários para os pássaros
no perímetro da baía. O domínio marítimo de Tóquio compreende, actualmente, seis reservas.
• Minatogaoka Futôkôen - Jardim da Colina do Porto. Em 1990, para tornar o porto mais próximo e mais
familiar, desenvolveu-se a ideia de criar jardins em toda a zona portuária, que oferecessem perspectivas paisagísticas sobre os canais e os terminais. Além disso, a zona portuária é considerada como demasiado plana e
uniforme, por conseguinte difícil de orientar. Neste jardim estabelecido num terreno de forma triangular, no
centro da zona comercial do porto, há uma colina de 20 m de altura com miradouros e vistas panorâmicas.
Este cenário domina a actividade portuária e com bom tempo pode-se ver as montanhas de outro lado da
baía. Por baixo, ao pé da colina, encontra-se um lago onde se pode apreciar a vida aquática e outros fenómenos naturais. Este lugar desempenha ao mesmo tempo o papel de “janela” sobre o porto, deixando ver
a sua actividade altamente mecanizada e a natureza concentrada no lago.
• Kasai Rinkai Kôen - Parque Litoral Kasai, 80ha, aberto em 1994. Este parque muito vasto situa-se no limite
de Tóquio, na embocadura do rio Arakawa. Um aquário e um hotel, gerido pela edilidade local, fazem parte
Viver e trabalhar na cidade portuária
SESSÃO V
149
dos equipamentos. Tem ainda um miradouro que oferece uma vista esplendorosa sobre toda a baía de
Tóquio. Existem também grandes jardins que descem até ao mar, chegando até uma ponte que conduz a
uma ilha artificial, com uma língua de areia de 800 m de comprimento. Esta ilha tem o acesso interdito dado
que é uma reserva de aves. Com base em estudos efectuados por associações de protecção da natureza, os
projectistas decidiram recriar praias artificiais para lazer e outras de acesso interdito, necessárias ao equilíbrio
do meio marinho. Na franja terrestre, do lado leste do parque, os ecossistemas dos pântanos (água doce) e
das lagoas (água salobra), característicos da baía de Tóquio, foram igualmente reconstituídos, permitindo aos
visitantes observar os pássaros selvagens.
Em conclusão, podemos dizer que, paradoxalmente, é a partir da artificialidade, dado que a maioria destes
parque foram criados a partir do nada, que foi de novo possível reencontrar a natureza e o contacto com
o mar e renovar as práticas antigas, como pescar, apreciar a paisagem, ou descobrir novos divertimentos,
como o surf. Por exemplo, aquilo que está agora na moda, o birdwatching – observação de pássaros, é uma
das novas maneiras de apreciar fenómenos naturais, como as migrações ou as nidificações, uma prática que
já existia na época Edo. Da mesma forma, o barbecue é uma nova maneira de reactivar e perpetuar utilizações e atitudes profundamente enraizadas. Nestes parques há uma série de percursos que se entrecruzam,
propondo diversos temas (actividade desportivas ou de lazer, descoberta didáctica ou sensibilização para a
natureza, passeios culturais ou históricos) com uma série de sequências que se encadeiam e enquadram uma
série de paisagens sucessivas. A originalidade destes parques consiste em associar protecção da natureza com
sensibilidade ambiental, assegurando o seu sucesso junto dos cidadãos.
O programa do parque marítimo de Tóquio, tal como foi concebido e depois realizado, não se limita a produzir
espaços verdes junto à água, mas apresenta-se simultaneamente como um projecto ambiental e de fruição urbana.
Projecta-se à escala de todo o território metropolitano (pela dimensão e pela natureza dos equipamentos, das superfícies, e das acessibilidades) vocacionado para a criação de um espaço público comum a toda a colectividade urbana.
Na cultura japonesa, a paisagem e a natureza estão profundamente enraizadas na vida quotidiana, assumindo
estes rituais sociais uma forma de integrar os indivíduos na sociedade. A identidade comum é reafirmada numa
paisagem que seja símbolo do grupo. A baía de Tóquio, que tanto contribuiu para o desenvolvimento de
Edo como forma urbana e cultural, já desapareceu para sempre. No entanto, surgem hoje novos processos
naturais, biótipos que se regeneram, e outros equilíbrios inéditos que alimentam factos naturais e significados
simbólicos associados à cultura, enriquecendo-se mutuamente e dando lugar a novas formas de vida. ❘❙❚
Existe um conflito entre cidade e porto, apesar dos portos serem uma parte das cidades e com elas manterem uma forte relação de interdependência, se mais não fosse porque, naturalmente, os portos consomem
os serviços que são disponibilizados pelas cidades.
Na maior parte das cidades marítimas existe um passado histórico que está intimamente ligado aos portos o
que explica a expansão e o crescimento das próprias cidades. Por sua vez, os portos necessitam de espaço
para fazer frente às expectativas de crescimento do tráfego marítimo.
A presença dos portos é determinante para a vitalidade e modernização das cidades. Por outro lado, assumemse como agentes económicos que contribuem para o desenvolvimento sustentado dessas mesmas cidades. Na
maior parte dos casos, pode dizer-se que os portos se encontram no cruzamento de várias realidades.
Em Mombaça, uma cidade antiga e cosmopolita que lida muito bem com a modernidade, existe um diálogo permanente entre as várias culturas e entre o passado e o presente, coexistindo através de uma intensa actividade cultural.
Tendo em conta o posicionamento do porto e o seu desenvolvimento, existe hoje a necessidade de promover investimentos em infra-estruturas, nomeadamente no domínio da contentorização, embora o porto de
Mombaça seja um porto comercial.
O alargamento do porto actual começou na zona Oeste da cidade, contemplando a modernização da zona
interior do porto de Mombaça, sendo preciso recuar a 1896, para situar a primeira grande intervenção ao
nível do desenvolvimento, em Kilindini, provocada pela necessidade de incrementar o tráfego de mercadorias com o Uganda e o Quénia.
Mais tarde, em 1926, foi preciso desenvolver zonas para acolhimento dos navios de mercadorias, acrescentando mais capacidade instalada aos dez postos de atracação já existentes. Há uma zona que ainda não foi
intervencionada, mas que será igualmente afecta a terminais para navios porta-contentores.
Intervenção de
Gichiri Ndua
Director de Serviço Corporate,
Autoridade Portuária do Quénia, Quénia
O papel do porto de Mombaça
na conservação
do ambiente urbano
Cidade de Mombaça
Terminal de transportes
Kenya Ports Authority
Em 1876 foi desenvolvida a zona comercial da cidade, graças ao Banco Comercial do Quénia, construído
nessa altura, que provocou o desenvolvimento de uma série de infra-estruturas à volta da zona do porto.
Construímos em 1891 um dos hospitais mais prestigiados da zona; em 1901 foi a vez da estação de caminhos-de-ferro que se encontrava circunscrita à zona do porto, reconvertida, posteriormente, em 1906; em
1923 construímos a Holy Ghost Cathedral.
Foram precisos vultuosos investimentos para desenvolver a interface entre o porto e a cidade, dotado de
terminais de transportes que ligam a zona portuária ao centro da cidade.
Apesar de tudo, torna-se importante criar novas sinergias ao nível do investimento, que promovam ainda
mais o desenvolvimento, quer do porto quer da cidade, atendendo a que, nomeadamente, o porto de
Mombaça e a região envolvente em que se inscreve, contribui com 40% para o PIB do Quénia.
A cidade de Mombaça deve ser apreciada, não só enquanto estrutura portuária, mas também como elemento dinamizador da economia local, criando mais de 5.000 postos de trabalho junto do porto, ligados às
respectivas actividades.
É óbvio que estamos preocupados com a proximidade dos armazéns industriais localizados nessa zona e que
interferem com as actividades comerciais.
Outro aspecto importante que criou alguns conflitos, foi o facto de termos tentado expandir o porto de
Mombaça a jusante dos terrenos que representavam a zona limite do porto. Neste contexto, vamos utilizar
terrenos que tinham sido desocupados anteriormente e que, neste momento, são a condição sine qua non
para o desenvolvimento do porto.
Infelizmente, quando olhamos para o que aconteceu ao turismo de cruzeiros no nosso porto nos últimos
dez anos, verificamos que houve um crescimento de 6,5% até ao ano 2000 e depois, a partir do 11 de Setembro, o tráfego diminuiu. Este acontecimento negativo teve repercussões no fluxo de turistas estrangeiros
devido à possibilidade de ataques terroristas.
Não obstante estes factos, vamos tentar recuperar os lucros provenientes da actividade turística, insistindo no
turismo de cruzeiros, que pode desempenhar um papel muito importante na retoma da economia, segundo
a tendência global nos anos 90. Devido à capacidade instalada e ao facto dos portos se estarem a equipar
para receber navios de cruzeiro, o marketing promocional destes pacotes turísticos, pode ser crucial, e vai
ser desenvolvido através da Cruise Indian Ocean Association.
O projecto de construção de terminais de cruzeiro está relacionado com uma iniciativa generalizada, que diz
respeito a todos os países do sul da África, de promover o seu potencial turístico, dotando essas zonas com
equipamentos modernos e promovendo as aldeias turísticas tradicionais localizadas em zonas de montanha,
junto à costa ou no interior dos rios, muito interessantes do ponto de vista geográfico e histórico; tudo isto
é possível encontrar, também, em Mombaça.
A avenida principal que liga o porto à cidade tem uma característica que a distingue os Tusks – Presas de
Elefante – um elemento de atracção para os turistas, a que se pode associar as potencialidades culturais do
Museu Marítimo.
Por outro lado, o porto está ligado a importantes portos e aeroportos no continente – Cape Town, Maurícias, Nairobi, etc, constituindo por isso uma plataforma logística extremamente rica. O aeroporto dista 3 km
do porto e é possível chegar a Nairobi após um voo de 40 minutos.
A 120 km do porto podemos desfrutar de reservas naturais, com fauna própria e variada, e ir, por exemplo, ao Kilimanjaro, que não é longe de Mombaça, sem esquecer uma visita ao Forte de Jesus e a muitas
outras zonas turísticas. Para aqueles que gostam da natureza, a 15 km do porto há um parque natural
enriquecido com uma floresta verdejante onde se pode fazer safari’s, e apreciar a vida selvagem em toda
a sua extensão.
Outra atracção turística situa-se nas ruínas de Gede, datadas do séc. XV, de origem árabe, e construídas com
pedra e coral, que se encontram no meio da floresta.
A dez minutos do centro urbano de Mombaça encontramos o porto antigo – Lamu Town, uma cidade fascinante pela particularidade de nela só existir um único carro, sendo as deslocações feitas com animais.
O nosso projecto está submetido a uma calendarização específica. A primeira fase tem a ver com a reabilitação das zonas antigas utilizadas para cargas e descargas; a segunda, com a frente ribeirinha e zona de
restaurantes e conferências.
Vamos investir ao nível das infra-estruturas portuárias, através de parcerias estratégicas, tendo em conta,
sobretudo, a requalificação urbana e a traça arquitectónica. ❘❙❚
Viver e trabalhar na cidade portuária
SESSÃO V
Saint-Nazaire, situada no vale do estuário do Loire, é uma cidade pequena com 150.000 habitantes concentrados no centro e uma periferia urbana com mais de 250.000 habitantes. Nascida da criação do porto, a
partir de meados do séc. XIX, a cidade esteve durante muitos anos de costas voltadas, e só a partir dos anos
80 é que se reconciliou com o porto.
O projecto da base de submarinos iniciada no princípio dos anos 80 foi o pólo central da intervenção urbanística a
cargo de M. de Solà Morales, um arquitecto de Barcelona; até aqui a base era uma barreira entre a cidade e o porto.
A primeira fase do projecto era um desafio importante tanto ao nível cultural como identitário, económico,
urbano e operacional, baseado na necessidade de assegurar a ligação entre o centro da cidade, o porto e a
base de submarinos. O seu objectivo, a desenvolver entre 1994 e 2002, contemplava alguns pressupostos:
• Metamorfosear a imagem da cidade;
• Disponibilizar 15ha para ajudar ao desenvolvimento da cidade;
• Criar novos equipamentos e condições de acolhimento para novas actividades;
• Potenciar o investimento público para atrair capitais privados;
• Promover o porto como destino turístico.
Em determinada altura, houve a intenção de destruir a base de submarinos, mas agora é proibido fazê-lo, uma vez
que representa um momento historicamente marcante da cidade e até passível de aproveitamento para actividades de índole social e recreativa. Pode-se dizer que a primeira fase do projecto tinha quatro eixos principais:
• Económico – criação de um destino turístico;
• Social – qualidade arquitectónica das habitações;
• Urbano – requalificação da base de submarinos;
• Ambiental – despoluição das zonas industriais.
Quantificados da seguinte maneira:
• 35.000 m2, para fazer 540 habitações; 2.500 m2 de escritórios; 4.200 m2 de comércio; 3.000 m2 de
equipamentos turísticos e culturais; 30.000 m2 de espaços públicos; 2.000 lugares em salas de cinema.
O investimento previsto ascende a um valor total de 68 milhões de Euros, dos quais 45 milhões de Euros são
investimento privado. Depois desta fase marcada pela colocação da base de submarinos ao dispor da cidade,
numa segunda fase (2006-2012 ) tratava-se de prolongar a operação com outra ambição, para que ela se
tornasse o cerne do aglomerado de 250.000 habitantes, alargada desde o centro da cidade até ao estuário;
com preocupações ambientais - a base, antes da intervenção era a lixeira da cidade - e determinação económica, uma vez que constituímos hoje um pólo importante no Atlântico, com uma identidade suficientemente
forte para não cair na periferia da cidade. Para o efeito, trabalhámos com:
• Peritos – para ajudar a formular o projecto e a promover debates;
• Parcerias – Europa, Estado, Região, Município, investidores e promotores privados;
• Uma equipa de projecto – para comandar e avaliar;
• Um estudo de definição – para apropriação do projecto;
• Um projecto de obra urbana – através de concurso.
A ambição deste novo projecto cidade/ porto é criar ambientes atractivos entre a cidade e o porto, a cidade e o estuário, a cidade e a metrópole, acumulando neste espaço actividades lúdicas, turísticas e oferta comercial acrescida.
Toda a zona será reabilitada com equipamentos públicos, um teatro numa antiga estação, a relocalização da
Casa do Povo e vamos desenvolver, na base de submarinos, um espaço para espectáculos ao vivo.
Noutra zona temos as actividades económicas resultantes de investimentos privados, onde se pretende concretizar um espaço comercial com 17.000 m2, um hotel, habitações e relocalizar as actividades portuárias.
Esta será a fase até 2006.
Ainda há muito a fazer para a requalificação dos espaços públicos, nomeadamente a criação de uma avenidajardim com muitos espaços verdes, a recuperação das margens do rio e dos cais portuários.
Nesta segunda fase da operação pretende-se a realização de:
• 10.000 m2 de equipamentos públicos (culturais e de lazer); 29.000 m2 de actividades económicas;
35.000 m2 para 450 habitações; 40.000 m2 de espaços públicos dispondo-se para o efeito de um
investimento avaliado em 150 milhões de Euros, dos quais apenas 50 milhões dizer respeito a investimento público, contemplando a criação de 800 postos de trabalho.
Para concluir, direi que este projecto incluído na Agenda 21 tem como objectivo apresentar uma proposta
urbana inovadora, baseada na vontade, na experiência política e no domínio da engenharia de projecto, com
ambições a longo prazo, partilhadas pelos parceiros públicos e privados. ❘❙❚
Intervenção de
151
Joël Guy Batte ux
Presidente da Câmara Municipal de Saint-Nazaire
Presidente da Comunidade Intermunicipal
da Região de Saint-Nazaire e do Estuário, França
Cidade/ Porto,
projecto e estratégia
de desenvolvimento para uma
área portuária diferenciada
Saint-Nazaire
Base de Submarinos
Zona de espectáculos
Relocalização do espaço portuário
A Cidade Portuária,
um “Eldorado” Turístico?
O tema da envolvente marítima das cidades portuárias é uma questão apaixonante que me
leva a tecer três considerações:
• Diversidade da Cidade Portuária - nem todas as cidades portuárias são iguais na
sua configuração, e nem todas têm as mesmas oportunidades turísticas. Acaba por haver
uma interface natural entre o urbano e o portuário que obriga à renovação das estruturas
obsoletas, com o objectivo de desenvolver o turismo, dando assim uma nova vivência à
cidade – é neste contexto que aparecem os portos urbanos.
Quanto ao porto comercial, ele é deslocado para onde não possa interferir com a mudança de uso, no interesse do público;
• Actividades Turísticas - a cidade portuária pode concentrar vários tipos de actividades:
marinas, desportos náuticos, navios de cruzeiro, etc, se existirem infra-estruturas portuárias adequadas. Mas quando falamos de actividade turística e do seu desenvolvimento
associado à cidade portuária, estamos a pensar nos navios de cruzeiro, funcionando como
hotéis flutuantes, que mobilizam muita gente e absorvem a maior fatia do negócio.
Neste contexto, a cidade portuária fica envolvida numa multiplicidade de actividades que
têm que ser desenvolvidas no âmbito daquilo a que chamamos turismo urbano, como
por exemplo: centros comerciais, restaurantes, hotéis, etc.
Além disso, a cidade que dispunha já de zona ribeirinha, assume outros atractivos turísticos relacionados com o aproveitamento do ambiente, das praias, etc.
• Eldorado – porque é que só há alguns anos se valoriza a cidade portuária como centro
de atracção turística? A resposta está relacionada com o desenvolvimento comercial e a
falência da indústria, acabando por transformar a cidade portuária em cidade de oportunidades turísticas.
Estamos a adequar o porto e a cidade para aproveitar essas oportunidades, sabendo que
em todas estas acções está presente a ideia da vantagem económica, tanto para a cidade,
como para o porto.
Tendo em conta o título desta conferência – Modernidade e Identidade da Cidade Portuária
– é preciso avaliar se a actividade turística da cidade portuária tem contribuído para desenvolver um perfil de modernidade; por outro lado, temos que analisar se a actividade turística
da cidade portuária consolida a identidade da cidade. Assim sendo, gostaria que entre todos
debatêssemos as ideias de modernidade e identidade. ❘❙❚
ATELIER 7
Rosa Castejon
Professora da Facultad Geografia e Historia,
Universidad de Barcelona, Espanha
Presidente da Mesa
Intervenções de
Bojan Hlaca
Director Executivo da Autoridade Portuária
de Rijeka, Croácia
Vojko Obersnel
Presidente da Câmara Municipal de Rijeka, Croácia
Desenvolvimento da frente
marítima de Rijeka em torno do
novo terminal de cruzeiros
Porto de Rijeka no futuro
Porto de Rijeka na última fase de construção
Porto de Rijeka - Projecto
Em resposta à pergunta sobre se uma cidade portuária pode ser um “eldorado” turístico, eu diria que sim,
apresentando Rijeka como um exemplo acima de qualquer expectativa.
É um caso-tipo de sucesso na relação cidade / porto. Desde há cerca de dois séculos, o porto de Rijeka tem
ajudado a desenvolver a cidade para grande benefício de ambas as entidades. Agora, chegou a altura de privilegiar os habitantes da cidade, procurando criar novas valências, como o terminal intermodal, e favorecendo
a abertura do porto aos visitantes.
Por outro lado, as suas características naturais favorecem a condição de porta entrada para a Europa de Leste.
Rijeka, situada no centro da Europa, tem 150.000 habitantes no centro da cidade e 250.000 na periferia,
onde desenvolvem actividades no comércio, na indústria e nas tecnologias da informação, contribuindo para
transmitir uma imagem moderna da cidade.
Identificada como destino turístico, é precisamente nessa actividade que estamos a concentrar esforços crescentes, criando infra-estruturas de serviços públicos para sustentar o desenvolvimento económico. O grande
desafio do futuro da cidade é o de harmonizar o crescimento, nomeadamente no sector portuário, com a
preservação do ambiente e a herança cultural, visando a melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes.
Neste contexto, tem-se desenvolvido o turismo urbano, tendo em conta as instituições culturais existentes
na cidade, através de um plano de recuperação dos edifícios históricos e das zonas pedonais, dando origem
a uma nova vida urbana.
Para facilitar o acesso ao porto, respeitando o ambiente, estamos a desenvolver o sector ferroviário e pretendemos construir uma nova auto-estrada para ligar o porto com o resto do país, contando com o envolvimento da autoridade portuária de Rijeka, criada pelo governo da Croácia através do Acto dos Portos Marítimos, no
qual está regulamentado o funcionamento da administração e as suas competências sobre a área portuária.
O projecto para a zona ribeirinha divide-se em três intervenções: O terminal de passageiros, localizado no
coração da cidade, irá acolher os futuros pontões para servir os navios de cruzeiro e marinas; A zona de
acesso ao Mediterrâneo será transformada em marina, com área para a prática de desportos e outras actividades lúdicas; O estuário Delta está muito presente nos nossos projectos. Queremos transformá-lo num
centro de entretenimento e comércio, substituindo os armazéns portuários actuais.
O desenho do projecto contempla, também, a libertação do pontão de Carolina do tráfego, transformandoo numa zona de lazer.
Pretendemos, em suma, abrir o porto à cidade e aos seus habitantes, para que eles beneficiem da proximidade do mar. Para isso desenvolvemos várias iniciativas: promovemos regatas, organizamos uma feira internacional, festejamos o Carnaval (este ano tivemos mais de 10 mil máscaras e mais de 100 mil visitantes; é o terceiro
Carnaval mais importante a seguir aos do Rio de Janeiro e Veneza), também acolhemos eventos culturais no
Verão. Em 2004 fomos a cidade anfitriã da UNIMA (Congresso internacional do Teatro de Marionetas).
O porto de Rijeka, dadas as vantagens atribuídas pelo estatuto de zona franca, tem vindo a assistir a um
movimento crescente de carga contentorizada entre 1999 e 2003, com cerca de 10 milhões de toneladas
de carga no total. Há também uma grande actividade no serviço de rebocadores. Quanto à responsabilidade
pelas actividades portuárias, elas foram atribuídas a quatro empresas sob a forma de concessão: JANAF, LUKA
RIJEKA, ADRIATIC GATE e GANZ LUKA RIJEKA.
Os objectivos da modernização do porto de Rijeka – The Rijeka Gateway Project - são:
• Atrair possíveis utentes ao porto;
• Conseguir investidores para o pontão que será construído no próximo ano;
• Reabilitar e modernizar todo o complexo portuário;
• Harmonizar todo o desenvolvimento da zona ribeirinha de Rijeka.
Os benefícios económicos mais relevantes deste projecto são: a criação de mais de 2.000 postos de trabalho em
actividades comerciais e lúdicas e contribuir para a criação de mais de 15.000 postos de trabalho na região.
Obviamente, que a vertente ambiental está sempre presente na concepção deste projecto, inclusive na
construção de novos edifícios.
Como principais actividades, temos um terminal de passageiros, o pontão de Viena, o pontão de Praga para
carga geral, um corredor para a infra-estrutura portuária e o novo pontão Zagreb, para onde se perspectiva
a construção de uma nova doca, a demolição dos actuais armazéns e a construção de novos, etc.
No próximo ano, vamos desenvolver um estudo para a primeira doca flutuante que também fará parte deste projecto.
O novo terminal de passageiros ficará dentro da área de requalificação urbana e aumentará o volume de
negócios do actual terminal. ❘❙❚
A Cidade Portuária, um “Eldorado” Turístico?
ATELIER 7
Os objectivos principais da minha intervenção são três: partilhar experiências com membros de países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento; discutir os desafios e as oportunidades; e inventariar recomendações sobre algumas das questões abordadas.
Vou abordar a importância da indústria do turismo para os países em vias de desenvolvimento, o papel das
zonas ribeirinhas como portas de entrada para o turismo, os desafios e as oportunidades emergentes.
Neste contexto, pode dizer-se que:
• Temos uma grande margem de crescimento sustentável – dado o carácter permanente e o potencial
ilimitado dos recursos humanos;
• Podemos funcionar como mecanismo de diversificação económica – quando um país quer desenvolver o seu sector de serviços, o turismo é um bom meio para o fazer;
• Podemos oferecer um produto diferenciado e único - dependendo da nossa cultura e do património,
no conjunto das ofertas existentes;
• O turismo é muito importante para a criação de emprego.
Neste contexto, as zonas ribeirinhas desempenham um papel relevante na promoção do turismo, principalmente nas cidades que já têm portos e aeroportos, e se essa zona for revitalizada pode constituir-se, de
facto, como atracção turística.
Depois da instalação de equipamentos na zona ribeirinha, podem-se desenvolver facilmente outras actividades complementares. Na Cidade do Cabo, por exemplo, na zona costeira, começámos há quinze anos com
restaurantes e bares e actualmente já temos centros de congressos, hotéis, etc.
Neste momento, a zona costeira da Cidade do Cabo é a mais visitada na África do Sul, tanto por turistas domésticos, como por estrangeiros, contribuindo este fenómeno para a criação de 20.000 postos de trabalho,
o que teve um grande impacto na vida social e económica da cidade.
A cooperação entre países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, desenvolve-se através de diversas
organizações que apoiam a recuperação das zonas ribeirinhas. A PIANC, uma associação responsável pela
aplicação de normas internacionais nas zonas marítimas, assinou um acordo com a COPEDEC (Engenharia
Costeira e Portuária nos Países em Vias de Desenvolvimento), plataforma de apoio aos países em vias de
desenvolvimento, com o objectivo de partilharem experiências nestes domínios; por outro lado, a COCOM
(Comissão Permanente de Cooperação Internacional), uma subdivisão da PIANC, trabalha na difusão de
informação aos países em vias de desenvolvimento.
O acordo entre a PIANC e o COPEDEC conduz à criação de zonas costeiras mais aprazíveis e eficientes,
pelo menos em África.
Os desafios com que somos confrontados dizem respeito a:
• Procedimentos jurídicos e barreiras burocráticas – existe legislação comercial muito restritiva nos países em vias de desenvolvimento para a criação de empresas, o que atrasa todo o
processo;
• A validade das concessões – muitas vezes, as concessões atribuídas pelas autoridades locais não
estão de acordo com a legislação local;
• A divisão de responsabilidades e a repartição de poder entre o poder central e as autoridades
locais não estão claramente definidas.
Alguns desenvolvimentos recentes têm ajudado a enfrentar a estes desafios:
• Fóruns de investimento – onde os investidores e as autoridades locais podem dialogar entre
si;
• Fomento das parcerias internacionais;
• Tecnologias de informação – para fornecer informações actualizadas e com rapidez;
• Normalização da legislação fiscal e imobiliária, para que todos os critérios se possam aplicar
uniformemente numa área mais vasta.
No que diz respeito à titularidade dos terrenos, os desafios são:
• Alguns países ainda têm legislação muito ambígua – a titularidade da propriedade não está
bem definida, o que afasta os investidores;
• Diferenças consideráveis na legislação, de país para país.
Também nesta área há que proceder a mudanças necessárias, porque já se percebeu que a propriedade dos terrenos é muito importante para os detentores do capital. Muitos investimentos têm um
período de retorno de 20 anos, o que aconselha os investidores a exigirem garantias; as parcerias
Intervenção de
Rolf Canto
Engenheiro da ENTECH Consultants (PTY) Lda.,
Stellenbosch, África do Sul
Desenvolvimento das frentes
marítimas com fins turísticos
nos países emergentes
155
público/privado incluem disposições que protegem os empresários e a autoridade local; há também
uma diferenciação entre terrenos agrícolas (alugados por períodos de 100 anos) e terrenos urbanos
(podem ser comprados).
Outra questão que temos de ter em atenção nos países em vias de desenvolvimento é a qualidade das
infra-estruturas existentes. Por vezes, estes equipamentos são de má qualidade (esgotos, fornecimento
de água, estradas, etc.); quando há um projecto de construção de infra-estruturas a decorrer, o controlo da qualidade da obra e a sua manutenção são difíceis de executar, porque não lhes é dada a devida
importância.
Recentemente, o que tem acontecido é que grandes iniciativas políticas com o NEPAD, têm estimulado o
investimento em infra-estruturas, em África, particularmente nas zonas costeiras e têm estabelecido parcerias
entre as autarquias dos países desenvolvidos e em vias de desenvolvimento, promovendo a transferência de
conhecimentos e uma maior autonomia opinativa destes últimos.
O processo de planeamento e a informação técnica existente continua a ser um desafio; deve-se dedicar
tempo suficiente a um planeamento adequado (arquitectura, estudo de impacto ambiental, trabalhos de
engenharia, estratégia de financiamento, etc.); por enquanto a informação técnica disponível é restrita e
está desactualizada, por isso, temos de depender dos conhecimentos profissionais obtidos localmente para
tomar decisões.
Recentemente, tem aumentado a cooperação entre os investidores e as autoridades locais no processo de
planeamento; relativamente ao nível de transferência de conhecimento há formação a nível oficial; as tecnologias de informação também serão muito importantes – um número cada vez maior de autarquias tem
informação digitalizada em base de dados central, o que torna mais fácil o acesso à informação.
O desenvolvimento de competências a longo prazo é extremamente importante, no entanto enfrentamos
o problema de continuar a ter muita falta de mão-de-obra qualificada, o que atrasa o desenvolvimento;
para além disso, muitos países continuam a ter o problema do brain drain “fuga de cérebros”, perdendo-se
pessoas com formação superior para os países desenvolvidos.
Esta situação também está a mudar. Temos visto o governo a incentivar as pessoas mais qualificadas a ficarem
no seu país de origem (melhorámos as condições de trabalho, nomeadamente na área da saúde, instituímos
seguros de saúde, etc., o que tem permitido manter as pessoas); criámos acções de formação e estamos
apostados em promover programas de troca de experiências e a organizar conferências, que são muito
importantes nesta batalha permanente por aprender mais e melhor, uns com os outros.
Outro desafio que temos pela frente, diz respeito ao facto de ser muito dispendioso fazer negócios nos
países em vias de desenvolvimento, o que causa um impacto negativo de falta de concorrência no sector
terciário.
Apesar de tudo, recentemente, os incentivos ao investimento começaram a aparecer para ajudar ao desenvolvimento das indústrias locais, provocando a desejável abertura, controlada, dos mercados em nome de
um ambiente mais competitivo; outro aspecto importante diz respeito à primazia dada à utilização de mãode-obra manual, em prejuízo da mecanização excessiva do trabalho.
O financiamento dos projectos enfrenta desafios consideráveis: há grandes dificuldades para financiar projectos porque o nível da dívida é muito elevado; os financiamentos são obtidos a taxas de juro muito altas,
provocando desinteresse por parte dos potenciais investidores; por outro lado, o financiamento de grandes
projectos é muito complexo, dada a pesada burocracia necessária para os concretizar.
Constata-se recentemente que, aos poucos, está a ser encorajada a participação dos investidores locais,
através da atribuição de incentivos fiscais para promover a formação profissional dos trabalhadores locais e a
divisão dos projectos por fases, para uma gestão mais fácil.
Para terminar, quero relembrar que:
• Vamos ouvir falar na iniciativa NEPAD nos próximos 10 anos;
• Queremos ver reconstruídos os serviços públicos (gás, água, electricidade, esgotos);
• A realização dos fóruns de investidores vai, também, ser muito importante para reunir investidores dos
países desenvolvidos e dos países em vias de desenvolvimento;
• É desejável o aumento da cooperação e das parcerias para o desenvolvimento.
O objectivo final é criar um quadro relacional onde toda a gente saia beneficiada: o investidor, que obtém o
retorno esperado, e os países em vias de desenvolvimento, que beneficiam de oportunidades para aumentar
o nível de emprego e para melhorar a qualidade de vida. ❘❙❚
A Cidade Portuária, um “Eldorado” Turístico?
ATELIER 7
A nossa apresentação será centrada, por um lado nos projectos de modernização e de desenvolvimento
ligados às infra-estruturas e à superestrutura turística, a cargo da nossa companhia na área portuária de
Tulcea, por outro, na influência destes projectos para o desenvolvimento económico, social e turístico da
cidade.
A fim de melhor compreendermos a importância destes projectos e a sua influência sobre o ambiente local
- vou fazer uma curta apresentação em torno das preocupações romenas entre 2001 e 2004, no que diz
respeito à modernização de todas as actividades ligadas ao desenvolvimento do turismo náutico na Roménia
e a outras actividades tradicionais na zona.
O Danúbio é uma via importante, uma verdadeira espinha dorsal que liga nove Estados do continente europeu até ao Reno, onde acaba por se transformar no maior e mais importante curso de água da Europa.
As iniciativas turísticas que tiveram lugar nestes últimos anos na Roménia, podem situar-se em dois planos
principais. Um deles relaciona-se com a manutenção de programas e projectos turísticos com resultados
positivos e muita gente envolvida.
O outro plano, que consideramos como mais importante, refere-se ao lançamento de novos programas de
turismo e de outras actividades ligadas à promoção do País no exterior, e tem por principal objectivo atrair
mais turistas estrangeiros, bem como impor a Roménia como destino turístico de eleição entre os países
europeus.
No âmbito deste plano de acção, pretendemos encorajar o turismo náutico e o turismo ecológico, incluindo
programas dedicados ao Delta do Danúbio, porque consideramos que esta área específica não é muito
conhecida dos turistas e, em nossa opinião, oferece imensas oportunidades de desenvolvimento, tanto para
instalações turísticas, como para outras actividades ligadas ao turismo náutico, condensadas no programa
turístico – “Cruzeiros no Danúbio” - com instalações oferecidas pelos portos turísticos MARINA, em Tulcea
e TOMIS, em Constantza.
Considerando a situação actual do porto turístico de Tulcea e tendo em conta as necessidades de desenvolvimento no que se refere às infra-estruturas turísticas exigidas pelos programas já oferecido aos visitantes, é necessário completar alguns projectos relativos ao transporte fluvial dos passageiros que passam pelo porto.
O desenvolvimento do porto é muito importante para o crescimento da cidade, especialmente no que diz
respeito à sua vida económica e, sobretudo, à utilização eficaz da mão-de-obra qualificada, que pode levar
a uma real diminuição da taxa de desemprego, e o correspondente impacto na melhoria dos indicadores
macro e micro económicos.
Ao mesmo tempo, os projectos de modernização existentes devem promover o desenvolvimento harmonioso do porto e da cidade. É neste sentido que as iniciativas levadas a cabo pela nossa companhia
- APDM-L’Administration des Ports sur le Danube Maritime Galati – procuram alargar-se às regiões já mencionadas:
• O desenvolvimento do porto turístico de MARINA – Tulcea;
• A modernização e a consolidação da Estação Fluvial de Tulcea,
A APDM é uma empresa estatal dependente do Ministério dos Transportes, criada em 1991, que actua como
autoridade portuária nesta área, com o objectivo de garantir a todos os utentes o funcionamento eficaz das
instalações portuárias.
A construção do porto turístico MARINA – Tulcea, faz parte de um plano geral para o desenvolvimento e a
reorganização da economia romena, a fim de responder às exigências do mercado turístico internacional.
Com a sua actual política, o governo romeno quer promover a reactivação e o desenvolvimento das actividades turísticas, tanto sob a forma de melhoria da qualidade dos serviços turísticos como através do desenvolvimento das infra-estruturas necessárias, incluindo a atracção de investidores nacionais e estrangeiros.
O projecto MARINA Porto Turístico tem como principal objectivo contribuir para o desenvolvimento
económico e social da cidade de Tulcea, através da promoção de actividades turísticas que ajudem
a desenvolver a área portuária e o segmento de pequenas e médias empresas. Com este projecto,
pretendemos, também, alargar a influência do turismo náutico e lúdico ao nível regional, incluindo ao
Delta do Danúbio. Ao mesmo tempo, esperamos obter vantagens importantes de âmbito económico,
criar novos postos de trabalho, aumentar o nível tecnológico e a capacidade de atracção da região de
Tulcea. O projecto será realizado através de uma parceria público/privado, para concepção, construção
e gestão. A autoridade pública planeia e executa o processamento do investimento em cooperação com
o investidor privado.
Intervenção de
157
Florin Popa
Director Geral da Administração dos Portos
da Zona Ribeirinha do Danúbio, SA, Galati, Roménia
Modernização e desenvolvimento
das infra-estruturas de transporte
turístico no porto de Tulcea
Tulcea
Porto de Tulcea
Marina - Projecto
Futura estação fluvial
A construção do porto turístico MARINA tem por objectivos:
• A manutenção de uma bacia com a superfície total de 25.500 m2, o que permitirá a atracação de
embarcações de recreio a cais equipados com água e electricidade;
• Dotar o Danúbio com uma frente infra-estruturada de 225 metros;
• Recuperar a área de docas para mais de 18.000 m2;
• Construir um complexo administrativo para o porto turístico equipado com: Edifício administrativo;
oficina de reparação de navios; central eléctrica; estação de serviço de combustível;
• Instalar redes de infra-estruturas eléctricas, canalização de água, ventilação, ar condicionado e instalação térmica;
• Instalação de lavabos ecológicos e zona de depósito dos desperdícios;
• Vigilância contínua da zona portuária.
O custo total do projecto será de cerca de 6,5 milhões de Euros; com um tempo de execução estimado
em dois anos.
A modernização da Estação Fluvial de Tulcea é feita com base na análise das oportunidades actuais, tanto na
área portuária como na cidade:
• Possibilidade considerável de desenvolvimento do turismo a longo prazo, devido às múltiplas belezas
naturais e condições favoráveis ao entretenimento no Danúbio e no Delta do Danúbio;
• Facilidade de acesso às principais infra-estruturas de transporte, o que pode facilitar a circulação das
mercadorias e passageiros;
• A existência de um grande número de propostas de empresários privados relativas o desenvolvimento
da actividade turística;
• A existência de uma mão-de-obra qualificada, que actualmente não é usada em pleno.
Tendo em conta a situação geográfica do porto de Tulcea - a porta do Delta do Danúbio, e a expectável
integração da Roménia na União Europeia, o desenvolvimento do turismo náutico romeno impõe a sua
modernização e um melhor aproveitamento dos recursos materiais.
O custo total do projecto é de cerca de 3 milhões de euros, com um prazo de execução de 20 meses.
Estamos neste momento a seleccionar a empresa que executará o projecto.
Os dois projectos apresentados fazem parte de uma estratégia nacional e local de desenvolvimento a longo
prazo, com o objectivo de obter resultados positivos para a comunidade, nomeadamente:
• O aumento da capacidade de atracção da região de Tulcea;
• O aumento dos turistas e das empresas de ambiente;
• O aumento do nível da mão-de-obra;
• O aumento do volume de negócios de entidades com capital romeno;
• A atracção de investimentos estrangeiros;
• O aumento da qualidade dos serviços e a adaptação às normas europeias;
• A redução da taxa de desemprego;
• A integração harmoniosa das construções no ambiente natural;
• Um impacto positivo no desenvolvimento económico a nível local, regional e nacional;
• O aumento da competitividade das pequenas e médias empresas e a melhoria da qualidade dos serviços e dos produtos;
• Estimular o desenvolvimento de actividades e diversificá-las.
O impacto negativo destes projectos no meio natural é mínimo. Não haverá grandes alterações na vida
das diferentes espécies da flora e fauna selvagem. Com efeito, o desenvolvimento dos projectos mencionados produzirá um impacto ecológico muito positivo, graças à tomada de medidas ambientais na região
de Tulcea.
Podemos igualmente mencionar as consequências positivas para outros sectores de actividade económica,
como os serviços de turismo, o pequeno comércio, o comércio grossista, serviços bancários, seguros, etc,
com reflexos no aumento das receitas locais, o que permitirá fazer novos investimentos públicos para os
habitantes da cidade.
Também no campo da despesa é possível detectar o impacto positivo dos projectos mencionados, através
da redução da factura social e pela criação de novos postos de trabalho nos sectores dos serviços e da
educação. ❘❙❚
A Cidade Portuária, um “Eldorado” Turístico?
ATELIER 7
O arquipélago da Madeira localiza-se no oceano Atlântico entre a Europa Ocidental (a Nordeste), a costa marroquina
da África Ocidental, o Arquipélago dos Açores (a Noroeste) e o das Canárias (a Sul). Este arquipélago, é formado pelas
ilhas habitadas da Madeira e do Porto Santo e ainda por dois grupos de ilhas inabitadas: as Selvagens e as Desertas.
O transporte marítimo teve sempre uma dupla valência no Arquipélago da Madeira – como transporte interno e
externo, possibilitando uma melhor acessibilidade e conectividade inter-ilhas, quer ao nível da deslocação de pessoas,
quer de mercadorias, e constituindo a principal forma de movimentação de mercadorias entre o exterior e a região.
Se desde os seus primórdios o porto do Funchal assegurou as ligações da Madeira com o exterior, concentrando praticamente todo o tráfego de mercadorias e passageiros, era também através dele que se efectuavam as ligações entre o Funchal e as restantes povoações da ilha localizadas ao longo da linha de costa.
Face aos constrangimentos das ligações terrestres, era através da navegação de cabotagem que eram escoados
para o Funchal, o principal centro de consumo da ilha, os produtos da terra e que era efectuado o abastecimento das populações. Os portos e os transportes marítimos desempenhavam um importante papel económico
e social, assegurando para além do abastecimento das populações, as idas ao médico ou aos serviços públicos,
funções tão simples mas importantes face às grandes carências das populações fora da cidade do Funchal.
Com o início dos descobrimentos no séc. XV e, posteriormente, o desenvolvimento do comércio atlântico
nos séc. XVII e XVIIII, toda a vida económica e social do Arquipélago, e em especial da ilha da Madeira e da
cidade do Funchal, passam a estar relacionados com as rotas marítimas comerciais.
O porto do Funchal constituiu um importante porto aquando do inicio da globalização enquadrada no período das
descobertas – o apoio às grandes potências, a troca de bens (matérias-primas por produtos transformados) e a troca de experiências/novos conhecimentos, faziam do porto do Funchal uma escala importante para os navios, funcionando, também, como um importante ponto de defesa militar entre a Europa e a América. Desde a descoberta
da Ilha da Madeira que o porto e a cidade do Funchal se transformaram numa importante base para a exploração
marítima desta área do atlântico e para a segurança e protecção das frotas das grandes potências marítimas.
Intervenção de
João Figueira de Sousa
Vice-presidente do Instituto de Dinâmica do Espaço
Universidade Nova de Lisboa, Portugal
O Porto do Funchal
na Ilha da Madeira: modificação
das funções portuárias impactes
na interacção urbano-portuária
e na modernização de uma
cidade atlântica
O aglomerado urbano do Funchal
(num primeiro momento histórico).
Fonte: Arquivo Histórico Militar, sem data.
A relação entre os territórios conhecidos e os descobertos é claramente demonstrada pelas relações de
troca entre produtos manufacturados e matérias-primas, promovendo o desenvolvimento dos territórios
e, consequentemente, da urbanização, comprovando a importância dos transportes marítimos e das ilhas
como pontos estratégicos neste desenvolvimento.
A Madeira, à semelhança das Canárias, eram favorecidas pela sua situação face ao percurso dos ventos alísios, dominantes nesta área do Atlântico, que colocavam estes dois arquipélagos nas rotas que ligavam a Europa à América, à
África ou Ásia, favorecendo as escalas que eram aproveitadas para o descanso das tripulações, para o abastecimento
dos navios e para importantes transacções comerciais. Estas operações comerciais faziam-se nos dois sentidos: os
armadores aproveitavam para vender produtos manufacturados e outros bens de consumo necessários para a
população da ilha e adquirirem, em troca, os abastecimentos necessários para a viagem ou produtos primários para
fazerem os seus negócios nas regiões de destino. A importância dos produtos comercializados estava relacionada
com os ciclos económicos associados às diferentes culturas, bem relatados pelos historiadores das ilhas atlânticas,
destacando-se o ciclo do trigo e os dois mais importantes associados ao açúcar e ao famoso vinho da Madeira.
159
Transbordo de mercadorias
na praia em frente à cidade do funchal
Movimento de residentes e passageiros
no cais da cidade
O Pilar de Banger
O factor localização afigura-se como o mais importante no desenvolvimento/ crescimento das cidades, em
particular nas cidades marítimas. Com uma localização litoral, a cidade do Funchal teve a necessidade de se relacionar com o mar desde os seus primórdios, dando origem a uma relação necessária e intimista com o porto.
O processo de povoamento fez-se, num primeiro momento histórico, de um modo natural sem modificarem a condição e fisionomia do solo. A povoação iniciou-se em terrenos muito irregulares e acidentados,
sem qualquer ideia ou plano preconcebido.
Com o aumentar da importância deste centro populacional dentro do desenvolvimento da colonização, a inicial povoação do Funchal foi elevada à categoria de vila em 1451 e 50 anos depois, em 1508, é elevada à categoria de cidade.
A cidade do Funchal esteve no centro da primeira experiência portuguesa fora da Europa, beneficiando de
todo o processo marítimo e da consequente dotação de infra-estruturas de apoio, facto que estimulou o
crescimento e expansão da cidade.
A partir dos fins de séc. XVI a conjuntura económica vai possibilitar que o controlo do comércio marítimo no
arquipélago se concentre no Funchal, tornando-se a cidade do Funchal numa importante peça no processo
de desenvolvimento regional. No entanto, apenas no séc. XVIII se sentiu a necessidade de criação de uma
verdadeira estrutura portuária, registada na Carta Régia de D. José I, de 22 de Março de 1756.
O Porto natural do Funchal, formado pela baía e pela praia em frente à cidade onde se processava todo o
movimento marítimo e portuário, concentrava a quase totalidade destes tráfegos, mas durante séculos mantiveram-se as limitações no apoio à navegação e a necessidade de criar infra-estruturas portuárias. O transbordo de mercadorias e passageiros era efectuado directamente na praia, acarretando perigos e acidentes
que ocorriam no Outono e do Inverno devido ao mau tempo pelo facto de a Baía não oferecer condições
de abrigo aos ventos do quadrante Sul.
O desenvolvimento da navegação atlântica e a necessidade de melhorar as condições em que se processava
a carga e a descarga de mercadorias e passageiros e também as condições de segurança dos navios, obrigou
à realização de algumas obras para tornar mais acessível e seguro o porto do Funchal.
Para facilitar o embarque e desembarque das mercadorias nas pequenas embarcações que as transportariam de ou
para bordo dos navios ancorados na baia, foi construído, em 1798, Pilar de Banger, junto à linha de costa, mais precisamente na rua da Praia. Porém, este método revelou-se impraticável e o pilar foi comprado por Blandy Brothers & Co.
em Março de 1873. Desde essa data foi usado para içar no seu topo as bandeiras das companhias de navegação representadas (cuja agência era exercida) pela Blandy Brothers, funcionado como um marco para os que chegavam à ilha.
Ao longo dos séc. XIX e XX assistiu-se à evolução dos tráfegos e ao desenvolvimento das infra-estruturas
portuárias assumindo-se definitivamente o porto do Funchal como o grande e único porto comercial da
Madeira, por onde transitavam todas as mercadorias importadas e exportadas pela região.
A partir dos fins do séc. XVIII, o aumento dos fluxos comerciais das potências europeias com as suas colónias
da África e da Ásia fez com que parte deste tráfego, por razões logísticas, passasse pelo Funchal: a cidade do
Funchal com o seu porto de mar funcionava como um ponto estratégico dentro das rotas marítimas, local
A Cidade Portuária, um “Eldorado” Turístico?
de reabastecimento e importante entreposto de comércio, facto que determinou a criação de estruturas de
apoio no processo de carga e descarga de mercadorias.
A baía e o porto do Funchal foram as portas por onde circulou o grosso da actividade comercial da cidade,
um crescimento e importância que tornou o porto do Funchal no único porto economicamente significativo
da ilha. A frente marítima concentrava as funções ligadas às actividades marítimo-portuárias, mas também o
comércio e os serviços próprios de uma cidade virada para o mar.
Ao longo dos tempos, o porto foi desempenhando um papel central no desenvolvimento da cidade e da ilha,
pois com o aumento do número e frequência dos navios e da maior quantidade de passageiros, aumentou
o volume de negócios na cidade, o crescimento da população e originou uma distinta aculturação própria de
meios de convergência de diferentes pessoas e culturas, próprias de qualquer cidade portuária.
Com o desenvolvimento do transporte transatlântico de passageiros, o Funchal assumiu-se como um importante porto de escala dos grandes paquetes. O porto e a navegação, criadores de riqueza, constituíram,
também, um factor de desenvolvimento social, pois possibilitaram a existência de uma sociedade cosmopolita, fruto do contacto com a informação actualizada e com modernos produtos, que chegavam por via
marítima. Durante décadas, o Cais e a sua a Alameda, funcionaram como a porta de entrada da cidade, local
de chegada e de partida dos passageiros dos grandes transatlânticos e de convívio entre as populações.
Neste contexto, a cidade actual é o resultado de uma conjugação entre o processos recentes de desenvolvimento
e um passado profundo, onde o porto e a navegação são um elemento presente na recordação e no quotidiano
das pessoas – o movimento marítimo, a presença dos navios, a importância da frente marítima e do cais da cidade
são ainda hoje um elemento importante na vivência das populações e de todo o ambiente marítimo da cidade.
Como já se referiu ao porto e a navegação marítima desempenhavam um papel de extrema importância no
desenvolvimento e crescimento económico da cidade mas, durante um largo período, as limitações das infra-estruturas portuárias, contribuíram para que todo o movimento marítimo, de passageiros e mercadorias,
se processasse directamente no “calhau” em frente à cidade.
As modificações que se verificaram na organização do transporte marítimo (principalmente após a II Grande
Guerra), o desenvolvimento do transporte aéreo, a concorrência de outros portos insulares vizinhos e a
inadequação das suas infra-estruturas e, por fim, a perda de tráfego entre a metrópole e as ex-colónias ditaram o afastamento do Funchal das principais rotas marítimas, tendo-se assistido, desde então, a importantes
alterações ao nível das suas funções portuárias.
As transformações ocasionadas a partir da II Guerra foram esvaziando de valor funcional muitas das estruturas
que se instalaram sobre a orla marítima do Funchal, restando apenas as imagens desses modos e costumes
que a vivência apagou. Contudo, o porto continuou a desempenhar um papel fundamental no desenvolvimento socio-económico de todo o Arquipélago da Madeira, permitindo o abastecimento dos bens de consumo e de produção, necessários à sua economia, e mantendo, simultaneamente, a importante função de
escala de navios de cruzeiros, que vieram substituir os grandes transatlânticos que atravessavam o atlântico e
utilizavam o Funchal como base de escala.
Actualmente o Funchal é um importante porto de escala de cruzeiros - 200.140 passageiros e 238 navios de
cruzeiro em 2002 – sendo o principal porto nacional no que se refere às escalas de navios de cruzeiros e um
dos principais nesta área do atlântico. Paralelamente à aposta na promoção e no marketing, as autoridades
portuárias continuam a trabalhar para melhorar as condições de acolhimento dos navios e dos passageiros.
O plano de desenvolvimento do porto, já em execução, prevê a beneficiação das infra-estruturas portuárias,
a criação de equipamentos de acolhimento aos passageiros, a melhoria da integração urbano-portuária e a
instalação de novas actividades associadas ao turismo, ao recreio e ao lazer, concebendo as condições para o
desenvolvimento sustentado do porto e para a modernização e a afirmação da cidade do Funchal como uma
verdadeira cidade portuária insular e atlântica, reforçada pela sua forte tradição marítima.
A conclusão do novo porto comercial na região, com a respectiva deslocação do tráfego de mercadorias,
criará as condições necessárias para que o porto do Funchal se especialize no tráfego de passageiros, nomeadamente dos cruzeiros turísticos, do tráfego inter-ilhas e da náutica de recreio – mantendo a identidade da
cidade portuária com a inserção de novos equipamentos que estimulem a sua atractividade – uma cidade
moderna que preserva o seu passado, origem e evolução.
Estes objectivos conjugam-se com a estratégia de desenvolvimento da cidade do Funchal que assenta, sobretudo, na
exploração do mar e na sua reafirmação como cidade marítima e atlântica, através do desenvolvimento do turismo
náutico, da organização de grandes eventos marítimos e melhoria das condições de escala dos navios de cruzeiro. ❘❙❚
ATELIER 7
161
O movimento comercial do porto do Funchal
(1930)
O porto e a cidade do Funchal na década de 70
A cidade do Funchal no centro do turismo
internacional
A Questão Ambiental:
um Novo Trunfo para os Portos?
Nesta sessão vamos contar com três oradores de distintos países.
O primeiro orador vem da África do Sul, da cidade portuária de Richards Bay. Esta cidade
portuária tem cerca de 200 mil habitantes, localiza-se na costa ocidental da África do Sul e
está sujeita a uma pressão de desenvolvimento relativamente acentuada.
Este porto, num país com riquezas naturais extraordinárias, está rodeado de áreas de grande
valor natural, mas está também rodeado de indústrias, algumas pesadas, que contribuem
para a degradação da qualidade ambiental nas áreas portuárias.
A apresentação que este orador aqui nos trás pretende responder basicamente a duas grandes questões:
• Será possível gerir o desenvolvimento cidade/porto, com o fim de integrar o desenvolvimento industrial, a protecção da natureza e a qualidade de vida?
• Será possível integrar o desenvolvimento sustentado no conceito industrial da cidade/porto?
O segundo orador vem da China, do porto de Kaohsiung que tem à sua volta cerca de 1,5
milhões de habitantes. Uma zona que, de certa forma, tem características semelhantes ao
porto de Lisboa.
A sua intervenção assenta na relação porto/ cidade. Á medida que o porto e a cidade se vão
desenvolvendo, verifica-se que há uma maior necessidade de cooperação entre a autoridade
portuária e as entidades de gestão municipal.
O terceiro orador representa o porto de Valência, o terceiro maior de Espanha, que teve
a felicidade de ser escolhido para receber a Taça América em 2007. Vamos ver como este
porto integrou algumas políticas de desenvolvimento sustentado e ambiente e que relação é
que essas políticas e esses projectos tiveram com a Taça América.
Estamos perante um porto que tem preocupações sérias com as questões ambientais e
que tem tratado seriamente a questão do desenvolvimento sustentado e da protecção dos
recursos naturais. ❘❙❚
ATELIER 8
José Manuel Marques
Biólogo, Portugal
Presidente da Mesa
Intervenção de
Mark Jury
Director do Departamento de Estudos Ambientais da
Univ. de Zululand, Kwadlangezwa, África do Sul
Richards Bay, uma cidade
portuária verde em África
No início do séc. XX, Richards Bay, na costa Sudeste de África, era uma pequena cidade portuária com
200.000 habitantes, dedicada à pesca, tornando-se, nos anos 50, numa estância costeira.
Durante a expansão verificada nos anos 70, acolheu muitas indústrias pesadas que contribuíram para aumentar os seus rendimentos, com as inevitáveis consequências ambientais.
Richards Bay, dispõe de um clima favorável, boas estruturas rodoviárias e um planeamento urbano que
permite conciliar as exigências das actividades económicas, acessibilidades, transportes, etc, com os espaços
verdes existentes.
O seu previsível crescimento económico incluirá a componente dos serviços (comércio e turismo) e o reforço das infra-estruturas que tratam metade da carga marítima movimentada em África - justificando a existência de projectos específicos dirigidos ao seu desenvolvimento. Quanto às condições sócio-económicas, o
rendimento per capita é elevado, mas existem algumas zonas bastante pobres.
As estruturas existentes são ainda insuficientes para as necessidades de desenvolvimento da cidade, mas podemos constatar que há um desenho urbano dotado de espaços públicos recreativos perto da praia, zonas
residenciais, comércio, e as zonas industriais, a norte do porto.
Estrutura da cidade
Richards Bay
Eco-turismo
Não houve grande desenvolvimento nos últimos dez anos nesta zona da cidade, apesar de existirem projectos para esse fim, que integra um aglomerado urbano com ciclovias, a zona administrativa do porto, praia, a
entrada do canal onde estacionam alguns iates, comércio e restaurantes. Existem, também, algumas ilhotas
com potencial para o eco-turismo, que ainda não foi suficientemente desenvolvido.
Ao analisarmos a cidade podemos dizer que há aspectos positivos:
• Um clima ameno; um porto eficiente; um Município bem organizado; rendimentos elevados para
certos extractos sociais; características ecológicas (zonas pantanosas, lagos, dunas com vegetação,
etc.)
... e negativos:
• 30% ou mais da população é pobre, está desempregada e com problemas de saúde; taxa de criminalidade bastante elevada; indústria poluente; serviços ecológicos e culturais subvalorizados.
No entanto, esta situação está a alterar-se com a disponibilização de verbas tendentes a estabelecer compromissos, dando prioridade aos projectos ambientais e contribuindo para o desenvolvimento sustentável e
a melhoria da qualidade de vida dos seus habitantes:
• O território e a zona costeira - Controlar os indicadores ambientais e apresentar relatórios anuais
através de um Sistema de Informação de Recursos Ambientais; identificar oportunidades para residências ecológicas na cidade e, de acordo com isso, rever o planeamento de ocupação do território;
desenvolver o Plano da Zona Costeira; estudar a influência dos fluxos de sedimentos e da qualidade
da água nos habitats ecológicos; implementar projectos para melhorar a envolvente às zonas de praia,
porto e lago; desenvolver e implementar programas de educação ambiental nas escolas, para melhorar a informação ecológica; avaliar a degradação do território e identificar áreas sujeitas a erosão, e que
necessitem de reabilitação.
A Questão Ambiental: um Novo Trunfo para os Portos?
ATELIER 8
165
• Ar - Identificar áreas para a localização de novas indústrias e reservar zonas protegidas perto das
mesmas; compilar um inventário de fontes de poluição e continuar com o programa de monitorização da qualidade do ar; elaborar estudos e definir objectivos no combate à poluição atmosférica e os
respectivos impactos na saúde.
• Água - Implementar sistemas de monitorização da qualidade da água e as suas implicações ecológicas; implementar um plano de gestão para proteger os lagos interiores e as zonas pantanosas;
melhorar os sistemas de saneamento para reduzir as contaminações; desenvolver projectos de
poupança de água.
• Biodiversidade - Compilar um inventário sobre a riqueza das várias espécies marinhas, nomeadamente nas zonas pantanosas; criar um sistema de protecção de áreas a preservar; promover
campanhas para reabilitar zonas cobertas por vegetação inútil; promover projectos educacionais de
sensibilização para as áreas mais sensíveis.
• Desenvolvimento económico - Identificar projectos que conduzam à criação de postos de trabalho e que melhorem o valor económico desta zona, atraindo mais investidores; analisar os obstáculos
ao desenvolvimento sustentável e implementar as mudanças apropriadas.
Já muito se falou sobre o sucesso dos portos onde a gestão é partilhada entre os Municípios e as administrações portuárias. Um dos desafios que encontramos nesta nova democracia que é a África do Sul, é
a necessidade de deslocar o rendimento proveniente de impostos locais para onde os recursos são mais
necessários.
Outro desafio que temos de enfrentar é a burocracia que, muitas vezes, atrasa a aprovação dos projectos. É
necessário analisar todos estes aspectos minuciosamente, sem politizar as decisões, e deixar que as pessoas
que sabem possam decidir e avançar com os projectos.
Num país em desenvolvimento seria mais fácil preocuparmo-nos com os aspectos negativos (desemprego, insegurança, saúde), mas uma incidência excessiva nestas preocupações não nos leva a lado
nenhum. É necessário tirar partido dos aspectos positivos e, se conseguirmos avançar, os problemas
desaparecerão. ❘❙❚
Há quatro portos comerciais internacionais em Taiwan: Keelung, Taichung, Hualien e Kaohsiung.
Kaohsiung tem uma população de 1,5 milhões de habitantes, é a segunda maior cidade no coração industrial
de Taiwan, do aço às petroquímicas, passando pelos estaleiros navais e indústrias cimenteiras e o seu porto
marítimo é o maior do país, onde se manuseia aproximadamente dois terços do total das importações e
exportações do país.
Na actualidade, o desenvolvimento industrial de Kaohsiung está a caminhar para a alta tecnologia, automação, logística e indústrias sofisticadas de capital intensivo, para criar valor acrescentado e minimizar a poluição
ambiental.
Em 2003, o porto movimentou cerca de 8,84 milhões de TEU’s, 138,8 milhões de toneladas de carga,
incluindo granel, carga geral, químicos, petróleo bruto e contentores.
No seu currículo regista, também, a condição de ser um dos principais portos de movimentação de contentores no mundo.
O desenvolvimento do porto-cidade de Kaohsiung projecta-se na construção de uma zona de lazer no porto
através da criação de uma zona ribeirinha de lazer com espaços multi-usos para convívio, melhorando assim
a imagem do porto e aproximando-o da cidade e dos cidadãos:
• Construção de uma via exclusiva para transporte de contentores e tráfego de veículos
pesados, de modo a resolver problemas de trânsito nos terminais.
• Projecto South Star Land Reclamation – o governo da cidade tem um projecto de valorização dos
terrenos que, no futuro, serão usados para a expansão do novo aeroporto internacional de Kaohsiung, para
construção de um porto deep-water e para outros projectos de desenvolvimento da cidade.
• Extensão da rede de metropolitano – terá 42,7 km e haverá 38 estações, 28 das quais são subterrâneas, 2 de superfície e 8 elevadas.
• Projecto para um porto franco – trará várias vantagens, nomeadamente uma administração mais
simples, gestão autónoma para as empresas operadoras e o exercício de actividades comerciais por
Intervenção de
Yu-i Teng
Director Geral Adjunto, Kaohsiung Harbor Bureau,
Taiwan, China
Kaohsiung, a cidade portuária
marítima de Taiwan
empresas internacionais. O porto franco de Kaohsiung terá uma área de 397,69ha e irá começar a
funcionar em Janeiro de 2005, mantendo-se as operações relacionadas com a movimentação de contentores, ao mesmo tempo que se prevê o desenvolvimento de novas áreas de actividade.
No porto de Kaohsiung, existe uma relação de consensualidade entre as entidades públicas (locais, regionais
e nacionais) e as entidades privadas, sobre o desenvolvimento portuário. Por outro lado, as relações de
proximidade existentes ajudam estas entidades a definir objectivos comuns:
• Envolvimento em questões relacionadas com o controlo ambiental da poluição - Obteve-se uma opinião consensual a respeito das fontes de poluição, da confirmação dos itens a serem
trabalhados e da implementação de planos de melhoria, bem como a atribuição de responsabilidades
a diferentes unidades;
• Relações com o mundo dos negócios - A mesma metodologia de cooperação aplica-se nas
relações do porto com a comunidade local e com as organizações empresariais, tendo em vista a
organização de várias acções de promoção do porto e do seu desenvolvimento comercial, de modo
a assegurar um clima favorável ao desenvolvimento dos negócios;
• Envolvimento com as universidades – há parcerias entre os responsáveis do porto e as universidades locais, tanto ao nível de professores como de estudantes. A partilha de recursos é benéfica
para ambas as partes, e tem já visibilidade no envolvimento de funcionários do porto nos programas
educativos e na colaboração de pessoal nosso no treino dos estudantes;
• Relações com os media - O gabinete do porto de Kaohsiung tem mantido boas relações com os
meios de comunicação social para assegurar a divulgação de informação adequada sobre as actividades
e as necessidades do porto, no seu próprio interesse e no da cidade;
• Acessibilidade ao porto – A administração portuária vê a questão da acessibilidade ao porto como
um factor relevante na relação com a comunidade local e com os seus clientes nacionais e internacionais. As visitas podem ser efectuadas através dos operadores privados e públicos, sendo desejável o
seu incremento numa estratégia de promoção do porto.
Porto de Kaohsiung
Hoje em dia, o porto de Kaohsiung enfrenta problemas que são bem mais complicados do que há uns anos
atrás. O nosso objectivo não reside só na expansão das operações portuárias, mas também na transformação do porto num espaço com múltiplas funções. Para isso concorrem muitos aspectos, presentes no nosso
planeamento, tais como o mercado, as capacidades instaladas, os aspectos financeiros, a política de aquisição
de terrenos, as questões ambientais e o desenvolvimento urbano.
Ao rever a situação do porto, os gestores portuários necessitam de despender mais tempo a comunicar e a
resolver as diferentes problemáticas concentradas no porto e na relação com a cidade, por forma a perpetuar o bom relacionamento entre as duas entidades. ❘❙❚
A Questão Ambiental: um Novo Trunfo para os Portos?
ATELIER 8
Ao longo desta apresentação vou falar-lhes da pressão ambiental na cidade portuária, da interface porto/cidade e dos mecanismos que implementámos para ajudar na gestão da protecção do ambiente, tanto no porto
como na cidade de Valência.
A Comunidade de Valência absorve 10% da população espanhola, representa 10% do PIB, detém, também
14% do comércio exterior e 12% do tráfego portuário total, dos quais 19% é carga geral, 20% contentores
e 32% do comércio externo de contentores em toda a Espanha.
Estes indicadores estão relacionados com o facto de cerca de 70% da população da Comunidade Valenciana
viver a 8 km da orla marítima; na comunidade temos um total de 40 portos, 5 dos quais são de interesse
geral e 35 são portos regionais de menor dimensão.
Vamo-nos centrar no binómio porto / cidade e nas intervenções previstas para responder às necessidades
da organização da Taça América 2007. Veremos como é que a celebração de um acontecimento desta importância pode melhorar as relações entre o porto e a cidade.
Passámos já por outras experiências da integração porto / cidade na Comunidade Valenciana, algumas delas
muito importantes, como é o caso dos Portos de Alicante, Castellón e Valência.
Todos eles beneficiaram de programas tendentes a aproximar as cidades das frentes de água. Mas, nem
todos os portos têm de desenvolver projectos muito complexos, precisam apenas de se adaptar à realidade
de cada região e de cada zona.
Os três elementos fundamentais que pressionam o ambiente portuário são as seguintes:
• Factores económicos e de funcionamento – os portos (e o transporte marítimo em geral) foram
confrontados com o aumento considerável do tráfego nos últimos anos a que corresponde o aumento
da possibilidade de impactos negativos;
• Factores ecológicos – os portos marítimos são interfaces terra-mar em equilíbrio difícil com o
ambiente, dado que os ecossistemas do litoral são muito sensíveis à acção humana e todas as acções
que favoreçam a sua protecção revestem-se de singular importância. Isto adquire ainda maior ênfase
no litoral mediterrânico, onde quase todos os portos são artificiais;
• Factores sociais – O desenvolvimento das áreas portuárias para dar resposta aos fluxos contínuos
de tráfego local, entra, por vezes, em conflito com as zonas de vivência urbana. Os cidadãos têm, cada
vez mais, consciência desta realidade e o desejo de viver num meio que respeite o ambiente.
A conjugação destes factores, necessários ao desenvolvimento equilibrado da sociedade, exerce pressão
sobre o porto exigindo-lhe que se ocupe da protecção do ambiente na sua zona de influência.
Quando falamos da cidade portuária pensamos que os aspectos ambientais podem ser semelhantes aos gerados em
qualquer outro contexto, mas a verdade é que, para além da complexidade da gestão do ambiente urbano, com a sua
multiplicidade de actores e actividades, acresce a zona ribeirinha, como um elemento adicional de preocupações.
Na Europa, por exemplo, nem sempre a administração responsável pela gestão da cidade é a mesma que
exerce a gestão do porto (é o caso dos portos franceses, italianos, espanhóis, etc.). Mesmo nos casos em
que essa gestão é comum (como nos portos alemães e holandeses) a responsabilidade pela gestão do ambiente encontra-se disseminada, existindo disfunções dentro da mesma administração.
Em Valência criou-se a Fundación Instituto Portuario de Estudios y Cooperación de la Comunidad Valenciana
com o objectivo de fomentar a inovação e a actividade nos portos e a sua aproximação à sociedade. Desta
fundação fazem parte a Generalitat Valenciana, a Autoridad Portuaria de Alicante, a Autoridad Portuaria de
Castellón e a Autoridad Portuaria de Valencia.
A interface ambiental porto-cidade é a zona de confluência das responsabilidades da administração portuária e da administração local, no interior da qual se geram as interdependências dos impactos. A luta contra a poluição nos portos
é, infelizmente, uma realidade conhecida que, desde há alguns anos, vem exigindo respostas integrais e rápidas.
Vale a pena referir algumas das soluções propostas:
• O projecto ECOPORT, lançado em1997 pela autoridade portuária de Valência pretendia projectar
modelos de gestão ambiental para os portos, de modo a permitir ao gestor portuário avaliar o estado
do ambiente, traçar políticas e comparar, de forma sistemática, os resultados obtidos. É um projecto
pioneiro e nele participaram sete dos principais concessionários do porto;
• O projecto ECOPORTS, no qual estão envolvidos treze administrações portuárias dos principais
portos do europeus e dez instituições de formação e investigação, pioneiras nesta área. Neste projecto
trabalha-se com o objectivo de definir regras comuns de gestão ambiental entre os portos do continente
e desenvolver ferramentas e planos de acção comuns.
Intervenção de
167
Juan Manuel Diez Orejas
Director da Fundação IPEC
da Comunidade de Valência, Espanha
Protecção ambiental na interface
cidade/ porto. Modelos de gestão
Porto de Alicante
Porto de Valência
A Agenda 21 local é um veículo específico para o desenvolvimento sustentável, melhorando a qualidade de
vida dos cidadãos, numa perspectiva integrada das áreas ambiental, económica e social.
Muitas das cidades portuárias desenvolvem programas semelhantes, nos quais pretendem: Definir qual é a
situação ambiental existente no Município; estabelecer objectivos a curto e a longo prazo; definir as acções
prioritárias, a sua programação temporal e os instrumentos de gestão e de financiamento necessários; desenvolver sistemas de acompanhamento do cumprimento e da eficácia das acções desenvolvidas; fomentar
a participação estruturada dos agentes sociais, grupos de opinião e colectivos de cidadãos que podem ser
parte activa na definição de objectivos e co-responsáveis pelo controlo do processo.
A gestão ambiental da interface porto-cidade faz-se coordenando três aspectos fundamentais:
• Questões ambientais específicas geradas na interface;
• Gestão das questões ambientais – não basta conhecer a realidade, é necessário estabelecer medidas
conjuntas, por parte do porto e da cidade, que permitam diminuir o seu impacto;
• Projectos concretos no binómio porto-cidade.
No que se refere à experiência de Valência, o porto e a cidade trabalham há já bastante tempo com o objectivo de melhorar e desenvolver estes sistemas de gestão. Tanto a cidade como o porto foram pioneiros no
projecto ECOPORT, promovendo o desenvolvimento de sistemas de controlo da qualidade da água, da atmosfera e do ruído. Promoveram, também, projectos de definição de sistemas de indicadores e participaram
em projectos de cooperação para conhecer as melhores práticas disponíveis noutros sistemas portuários.
Valência assinou a Carta de Aalborg que estabelece um compromisso no domínio da sustentabilidade e, por
sua iniciativa, elaborou a Carta Xátiva, que é a adaptação do documento de Aalborg às especificidades de
Valência. Encontra-se, também, em processo de implantação a Agenda 21. Por outro lado, a cidade viu reconhecido o seu trabalho em matéria de inovação ambiental (foi a cidade que recebeu mais fundos europeus
- LIFE), esperando-se agora que o plano estratégico melhore ainda mais a sua qualidade ambiental, para que
Valência seja considerada a cidade verde europeia.
É neste contexto que nasce o projecto SIMPYC (Sistema de Integración Medioambiental en la interfaz Puerto
Y Ciudad), que tem os seguintes objectivos:
• Demonstrar a importância socio-económica dos portos para a vida da cidades;
• Coordenar os processos de gestão ambiental desenvolvidos no meio urbano e no meio portuário;
• Desenvolver iniciativas conjuntas de controlo do ambiente na interface porto/ cidade;
• Sensibilizar os cidadãos para a importância da zona ribeirinha e para a necessidade da sua preservação.
Os resultados esperados deste projecto são:
• Elaboração de um Programa de Acção Ambiental que harmonize as medidas a desenvolver;
• Estabelecimento de sistemas de controlo integrado da poluição atmosférica e de acompanhamento do
ruído derivado das actividades portuárias;
• Criação de um sistema de indicadores conjuntos – para o porto e para a cidade;
• Desenvolvimento de uma campanha de sensibilização da população, especialmente dirigida aos mais
jovens.
Neste projecto, além do porto e da cidade de Valência (Espanha), está Toulon (França), Livorno (Itália), e
outros portos de menor dimensão da Comunidade Valenciana, etc.
Em Novembro de 2003, a candidatura de Valência foi escolhida para acolher a Taça da América em 2007,
o que acarreta mudanças significativas para a cidade, para além de a consagrar como referência do desporto
e turismo náutico mundial
Este caderno de encargos implica a criação de um espaço específico para acolher as embarcações participantes na regata – as boxes – que vão ser localizadas num cais interior.
O projecto de certificação ambiental da Taça América é emblemático para uma cidade portuária como a
nossa, pelo que devemos ser muito cuidadosos se queremos que este evento se realize sem afectar o
ambiente da cidade.
A complexidade de que falei tem a ver fundamentalmente com os seguintes aspectos:
• Vai haver uma multidão de actores no mesmo espaço físico, dependendo de organizações distintas e
com diferentes níveis de responsabilidade;
• Vamos ter uma actividade descontínua na sua forma;
• Um movimento pouco habitual junto à costa;
• Vai ser preciso colocar, durante algum tempo, instalações temporárias junto das instalações fixas.
A Questão Ambiental: um Novo Trunfo para os Portos?
ATELIER 8
Cais interior
Os principais impactos ambientais que vão surgir durante o evento estão ligados às actividades náuticas (a
produção de resíduos provenientes dos óleos e filtros de motores) e ao aumento da população flutuante, o
que provoca o agravamento das emissões de óleos e hidrocarburetos pelos tubos de escape.
As acções que vamos desenvolver dentro dum quadro de gestão ambiental com estas características, são
as seguintes:
• Coordenação dos Planos de Gestão de Resíduos; Elaboração de Planos de Emergência; Elaboração
de um Plano Integrado de Gestão Ambiental da interface; Acções de sensibilização dirigidas a participantes, visitantes, etc.
As oportunidades que se nos apresentam estão relacionadas com:
• Formação de uma parceria sólida envolvendo todos os actores dos quais depende a qualidade do
ambiente na zona portuária. Queremos, também, assegurar que as actividades, tanto de preparação
como de execução, deixem um legado de protecção do ambiente;
• Possibilidade da Comunidade Valenciana se converter numa referência de boas práticas ambientais nas
instalações náutico-desportivas, perante a comunidade internacional.
É preciso também ter presente que, acontecimentos como a Taça América, são de extrema importância para
o desenvolvimento de qualquer porto ou de qualquer cidade, constituindo uma oportunidade única para
testar qualidade da gestão ambiental da cidade portuária. ❘❙❚
169
Viver nas Zonas Ribeirinhas…
a que Preço?
Existem certas zonas portuárias que caíram em desuso e que já não são necessárias para
o funcionamento do porto, podendo ser requalificadas e aproveitadas para habitação. O
problema é que estas áreas, como não são parte integrante da cidade, foram esquecidas,
deixando uma imagem bastante negativa.
Neste contexto, colocam-se várias questões:
O que fazer para melhorar as condições de habitabilidade nestas áreas, com preços acessíveis
para a população local que é, muitas vezes, aquela que dispõe de menores recursos financeiros? Como integrar estas novas zonas de habitação no tecido urbano, evitando o seu isolamento? Como associar o parque habitacional às estruturas portuárias? Como estabelecer o
interface entre as antigas zonas de habitação económica e as zonas residenciais mais caras? ❘❙❚
ATELIER 9
Dick Schubert
Prof. Universidade Técnica de Hamburgo, Alemanha
Presidente da Mesa
Intervenção de
Mike Galloway
Director de Planeamento e Transportes
da Câmara Municipal de Dundee, Reino Unido
Um porto de estuário
em fase de transição
Cidade de Dundee
Aeroporto de Dundee
Riverside Park
Dundee localiza-se na costa do Mar do Norte, à mesma distância de Edimburgo e Aberdeen, tendo como
principal atractivo o seu cais natural.
Antes da Revolução Industrial, as actividades principais eram a pesca, a caça à baleia e o comércio tradicional;
depois veio a juta, combinando o óleo de baleia com o cânhamo barato vindo da Índia, fazendo enriquecer
muitas pessoas graças a estas actividades.
A população da cidade cresceu dez vezes e o cais medieval foi alargado para se integrar no estuário e dinamizar um complexo de docas comerciais que servem a nova cidade industrial de Dundee.
O primeiro grande êxito do porto de Dundee assentou no facto de estar muito perto dos seus parceiros
comerciais da Escandinávia.
No entanto, os dias da juta não duraram muito. Apesar de um novo fôlego durante as duas Guerras Mundiais,
a base económica de Dundee foi posteriormente posta em causa pela concorrência do Terceiro Mundo e
pelo aparecimento das novas tecnologias, deixando-se, também, superiorizar por Aberdeen na condição de
capital do petróleo do Mar do Norte. O futuro do porto tornou-se, portanto, incerto e o complexo de docas
entrou em decadência, com muitas delas a encerrar as actividades.
A subalternidade do porto foi então acompanhado pelo declínio da cidade. A crise que se instalou deu origem a várias iniciativas, com o apoio do Governo, no sentido de revitalizar a economia, alterando a estrutura
produtiva. Nos últimos dez anos, na cidade de Dundee surgiram novas indústrias na área da biotecnologia e
da comunicação digital em resultado do envolvimento das duas universidades da cidade; contribuindo para a
reanimação das actividades comerciais, do turismo e dos serviços.
Contraditoriamente, está a verificar-se em Dundee um fenómeno de desertificação. Depois de se atingir um
pico nos anos 70, os últimos trinta anos registaram uma queda de 25%. Este declínio está ainda a verificar-se,
atingindo em média uma redução de 7,5% em cada década e 15% por geração; o que é mais preocupante
é que a maior perda populacional é no escalão etário dos jovens adultos, depois de terminarem os seus
cursos superiores. A natureza desta emigração não afecta apenas o estatuto da cidade, mas também distorce
o perfil etário da nossa população. Prevê-se que crie problemas graves para a economia nos sectores da
saúde e dos serviços públicos.
Por estas razões, a principal preocupação dos responsáveis políticos em Dundee centra-se no fenómeno da
perda de população, situação que urge inverter através da tomada de medidas de natureza estratégica em
torno de três elementos-chave:
• Continuar o crescimento das indústrias baseadas no conhecimento com o objectivo de manter e atrair
licenciados;
• Continuar a melhorar a fisionomia da cidade e a sua imagem;
• Diversificar a oferta habitacional de modo a torná-la atractiva a um segmento da população mais
abrangente.
O desafio da localização de quadros qualificados surge em paralelo com uma maior diversidade na oferta
das tipologias habitacionais para atrair jovens adultos. Primeiro, queremos criar cinco novas aldeias nas áreas
verdes circundantes à cidade para racionalizar os usos de ocupação do solo. Em segundo lugar, regenerar as
áreas de habitação social situadas na periferia e desenvolver uma zona antiga dominada por edifícios industriais. Por fim, devido à atracção que as frentes de mar exercem, vamos repovoar a zona ribeirinha no centro
da cidade. Esta estratégia afigura-se muito importante porque:
• Atingimos um bom nível de desenvolvimento harmonioso entre as zonas verdes e as antigas zonas
industriais;
• Existe oferta habitacional diversificada nestas zonas;
• Há condições para repensar integralmente a interface entre o rio, as docas e a cidade.
A frente ribeirinha é formada pelo centro da cidade, a universidade principal de Dundee, a zona residencial
ocidental, a leste, o Retail Park e a zona residencial oriental, encimada junto ao estuário por duas pontes: a
ponte ferroviária construída no séc. XIX e a ponte rodoviária construída nos anos 60 e que dá acesso ao
centro da cidade.
Estes elementos criam uma interface muito interessante entre a cidade e a zona ribeirinha, mas nesta área de
transição existem ainda outras importantes infra-estruturas:
• Aeroporto de Dundee – os voos comerciais que chegam ao aeroporto são muito importantes para
a economia da cidade;
• Riverside Park
Viver nas Zonas Ribeirinhas… a que Preço?
ATELIER 9
• Porto operacional – O porto principal de Dundee é muito importante para a economia da cidade,
e já foi alvo de interesse por parte de algumas empresas e do sector petrolífero do Mar do Norte. A
qualidade de vida da cidade de Dundee exige que se proteja o porto de utilizações indesejáveis.
O desenvolvimento da frente ribeirinha distribui-se por três zonas:
• City Quay – que está a ser construído em duas docas, de acordo com o Plano Estratégico. É uma
instalação de uso misto que irá incluir novas habitações, lojas, bares, restaurantes, escritórios e um
hotel; os armazéns históricos das docas foram mantidos e requalificados para serem transformados
em edifícios contemporâneos;
• Antiga zona ferroviária, a oeste do centro da cidade – esta zona já foi alvo de requalificação
na última década, com a construção de uma via pedonal e o desenvolvimento do projecto Discovery
Quay, o navio histórico do Capitão Scott que o levou na sua viagem de exploração ao Pólo Sul. Esta
zona também beneficiou da construção do Centro de Ciência e do Centro de Arte Contemporânea,
uma referência arquitectónica dos nossos dias; foram construídos novos edifícios com vista para a
frente ribeirinha, ocupados por serviços governamentais que estão a ser descentralizados de Edimburgo. Mas a parte principal da área projectada ainda está disponível para novas construções (habitações
particulares, lares para estudantes e zona de escritórios) de acordo com o Plano Estratégico;
• Zona ribeirinha central – esta zona está dominada por mega estruturas, como a ponte de Tay
Road, que embora tenha sido uma decisão importante para a cidade comporta efeitos ambientais
indesejáveis, e o edifício sede da Câmara Municipal.
Recorremos a uma consultora especializada para avaliar quais seriam as oportunidades de desenvolvimento nesta zona. A resposta foi a seguinte:
- Em primeiro lugar, deveria haver contenção do tráfego no centro da cidade – esta área é dominada pela presença do automóvel, justificando-se o seu reordenamento viário e a construção de
avenidas mais modernas e eficientes;
- Em segundo lugar, a criação de uma praça verde para ocupar a parte central desta zona, ficando no
centro da relação entre a cidade e o rio;
- Em terceiro lugar, deveria haver flexibilidade de usos nas áreas para habitação, comércio, escritórios e actividades de lazer.
- Finalmente, e muito importante, a frente marítima deveria ser habitada, ter animação e equipamentos de restauração.
Elaboração do Plano Estratégico
173
Todo este exercício reflexivo terminou com a elaboração do Plano Estratégico, onde se prevê:
• A construção de duas avenidas que atravessam o centro da cidade, tanto a leste como a oeste;
• A sua interligação com as ruas que se estendem desde o centro da cidade até à zona ribeirinha, no
sentido norte-sul;
• A criação de um eixo central composto por uma praça e uma nova marina, para aproximar a cidade
do mar;
• A criação de novas zonas urbanas;
• A construção de uma nova estação de caminhos-de-ferro em Dundee, em substituição da actual que
vai ser recuperada.
No ano passado, submetemos este projecto à apreciação do Governo e foi-nos garantido o financiamento
para as primeiras fases. A primeira das quais irá começar em Janeiro de 2005. A intenção é transformar uma
área não qualificada numa nova extensão do centro da cidade, no prazo de doze anos.
Relativamente ao impacto dos ataques terroristas ocorridos nos EUA, a autoridade portuária está a introduzir
um novo sistema de segurança para todos os visitantes do porto, que, na minha opinião, terá um forte impacto na cidade de Dundee, permitindo tirar o máximo partido das capacidades do porto.
Em conclusão, podemos dizer que os bairros habitacionais da frente ribeirinha de Dundee têm um enorme
sucesso; a interface porto / cidade está bem encaminhado, estando a sua construção a ser planeada através
de uma estratégia urbana aberta e participada; o desenvolvimento da interface fará com que estas zonas se
tornem ainda mais atractivas para o segmento habitacional.
O turismo é muito importante para o futuro de Dundee, exigindo uma forte aposta ao nível dos investimentos.
Resumindo, a chave para a integração da componente ambiental nos projectos da cidade e do porto é dispor de um bom Plano Estratégico; trabalhar em consonância com o público e estabelecer parcerias entre a
Câmara Municipal e a Autoridade Portuária. ❘❙❚
Intervenção de
Ruurd Gietema
Director KCAP bv Architects and Planners, Roterdão,
Países Baixos
Viver nos portos
Wijnhaveneiland – projecto
No livro A História da Cidade, Leonardo Benevolo define a transição de aldeia para cidade como sendo o
momento em que as pessoas começam a desenvolver profissões diferentes. Ou seja, quando redes sociais
complexas se começam a desenvolver de uma forma gregária no meio urbano.
Por analogia, podemos, mil anos depois, definir a nossa noção de urbano, como sendo o momento em que
novas ou inesperadas redes sociais surgem da combinação de antigas redes, ou seja, os locais onde as novas
formas de vida da cidade se desenvolvem são, muitas vezes, antigos portos e estações de caminhos-de-ferro.
Estas zonas, por vezes, salvam o conceito de urbano, introduzindo novos conteúdos no espaço físico. A sua
capacidade deriva de vários factores, como a localização próxima do centro da cidade, bons acessos, uma
mistura equilibrada de elementos históricos e contemporâneos, permitindo o desenvolvimento de diferentes actividades, numa verdadeira simbiose cultural. Neste contexto, estamos empenhados em desenvolver
cinco áreas principais:
As zonas de porto são espaços disponíveis a requerer novas estratégias para o seu
desenvolvimento. É preciso reconhecer que estes terrenos abandonados podem sustentar o
desenvolvimento de estruturas sólidas, dando origem a áreas urbanas e culturais que, normalmente, de acordo com os processos de planeamento tradicional, não teriam oportunidade para
se instalarem. Muitas vezes, as zonas industriais antigas não são protegidas devidamente e ficam
vulneráveis a aproveitamentos indevidos; o desenvolvimento de directivas para estas áreas é, assim, muito importante para o seu futuro. A ideia não é manter o terreno livre, nem o status quo,
é mais a de orientar os projectos para se desenvolverem de uma forma sistemática e aberta, onde
a qualidade das estruturas e as actividades consolidadas sejam reconhecidas como complemento
da vida urbana.
Dois exemplos desta ideia:
• Wijnhaveneiland no centro da cidade de Roterdão – uma área de escritórios muito monótona, construída sobre a zona dos portos, nos anos 70, alvo de intervenção urbana com o objectivo de desenvolver
uma área de construção moderna, que permitiu perspectivar a zona de uma forma mais aberta e com
usos mistos.
Viver nas Zonas Ribeirinhas… a que Preço?
• Hafencity, em Hamburgo – esta zona fica situada entre a parte antiga da cidade e o rio Elba; a ideia não era
fazer um plano pronto a executar, mas pensar em orientar as dinâmicas de planeamento para os próximos
25 anos e desenvolver estratégias de transformação arquitectónica do local, dotando-o de capacidade
habitacional, zonas comerciais e um ambiente moderno. Este projecto faz parte do Plano Estratégico.
Cidade como loft - o conceito a cidade como loft aplica-se a um espaço para viver e trabalhar, utilizado,
normalmente, por pessoas ligadas a actividades culturais. É um espaço com grande carácter e de grandes
dimensões, que pode ser recuperado com poucos meios, desde que sejam eficazes. Estes locais - os lofts
- recuperados aos antigos portos, devem transformar-se em espaços de arquitectura adaptáveis, concebidos
com muita luz, tectos altos, etc. O conceito pode ser aplicável no contexto mais geral de planeamento urbano, onde os espaços abertos criam uma unidade espacial arquitectónica com impacto, dando uma orientação
exclusiva ao local e consolidando-o no meio da cidade.
A Cidade sem planeamento - em Roterdão, uma cidade sem planeamento, criada sobre o porto,
podemos encontrar uma área de instalações arquitectónicas muito marcantes que se identificam de forma
instantânea com o local, e sequencialmente com a vivência humana dos que lá habitam. Convidámos vários
arquitectos a apresentar soluções para diferentes edifícios desocupados. As suas ideias forma aplicadas e
os edifícios intervencionados, com a integração de diferentes elementos susceptíveis de criar espaços com
intimidade, carácter e identidade.
Catalisadores urbanos - a ilha KNSM, em Amsterdão, é uma área do antigo porto onde se edificaram
casas novas, convivendo com uma malha urbana tradicional de má qualidade. Alguns dos edifícios existentes
foram ocupados por actividades informais: cooperativas de barcos à vela, teatro, sem-abrigo, etc. Os responsáveis da cidade e os investidores institucionais comprometeram-se a não demolir parte dos antigos edifícios,
que se mantiveram ocupados, para serem integrados no novo plano para aquela área.
Esta composição mista de actividades e edifícios fez com que a ilha se tornasse num centro urbano com vida
própria, em vez da zona degradada até aí existente.
Entretanto, uma ideia semelhante foi desenvolvida no norte de Amsterdão, onde o modelo operativo já
não tem origem nos accionistas institucionais, mas sim nas entidades interessadas nos negócios locais. A
inventariação bem pensada de um conjunto de actividades para um mesmo local conduziu ao desenvolvimento de uma cultura urbana sustentável materializada numa espécie de gestão integrada com todos os
protagonistas.
Escalas e diversidade de utilizações - o tradicional contraste de escalas entre infra-estruturas portuárias
e áreas urbanas sofre aqui um aumento significativo, patente na perspectiva contrastante entre os altos edifícios loft e as casas uni-familiares, geminadas, com terraços no último andar e estacionamento em frente dos
edifícios. Este é o tipo de habitação ideal para a classe média holandesa.
ATELIER 9
Wijnhaveneiland
Hafencity
Edifícios com contrastes de escalas
175
Casas uni-familiares
Intervenção de
Laurence Levis
Arquitecto.
Vice-presidente da BEA International Inc.,
Coral Gables, EUA
Frentes marítimas urbanas:
equilíbrios a obter entre novas
formas e funções urbanas
Uma cidade no Canadá
Em Amsterdão temos, por exemplo a experiência da ilha Java, projectada por Sjoerd Soeters. O autor dividiu
o cais em cinco áreas separadas por canais e projectou prédios à moda da Europa Central, concebidos sob a
forma de módulos, por arquitectos diferentes e distribuídos de uma forma aleatória no local.
A sobreposição de tipologias e funções também está a ser conseguida. Há armazéns transformados em lofts,
escritórios, clubes, lojas, surgem, também, novos edifícios, um terminal de cruzeiro, hotel, teatro, habitação
social, e apartamentos muito caros. Uma mistura de escala grande/ pequena, formal/ informal, que cria o
ambiente fantástico de um novo urbanismo que apenas pode aparecer nas zonas portuárias.
Apesar destes exemplos, na maioria das áreas portuárias falta, ainda, a mistura radical de funções urbanas
tradicionais com elementos de grande escala da sociedade contemporânea, como centros de distribuição,
instalações fabris limpas e transparentes, etc.
Estamos, neste momento, em conjunto com a universidade, a pensar como é que se podem integrar nas
actividades tradicionais do porto os programas idealizados para a cidade, explorando todo o potencial de
urbanidade contemporânea que aí existe.
A estratégia de marketing promocional para a zona, passou por associar programas de cultura erudita, dotados
com pequenos orçamentos, com programas de cultura popular pensados para orçamentos mais elevados. ❘❙❚
Vou falar-vos na recuperação dos terrenos que já não são necessários para as actividades tradicionais do
porto e dos novos projectos para estas zonas, tendo por base quatro estudos de situação.
A palavra-chave é planeamento – sobretudo atendendo a que o planeamento é tradicionalmente uma competência da esfera pública.
O Estudo do caso nº1 - uma cidade no Canadá; era um projecto para a indústria da madeira, com
ligações à indústria piscatória que nos anos 80 estava em grande declínio, como atesta a redução populacional, que passou de 30.000 para 20.000 habitantes. Em 1985, na elaboração do Plano Estratégico, criado
com o objectivo de revitalizar a zona ribeirinha, foi contemplada a criação de uma zona comercial, um novo
elemento no contexto urbano da cidade.
O projecto, concebido a dez anos, consiste em criar no centro da zona ribeirinha, que antes era uma zona
de trânsito para o transporte de matérias primas para o porto, uma doca flutuante e uma nova zona de
recepção para passageiros dos navios de cruzeiro. Depois de dois anos de debates com todas as partes
envolvidas: entidades responsáveis da cidade, a comunidade local e as pessoas que desenvolviam actividades
comerciais na zona, ressalta o ponto-chave de todo o projecto: como é que se atraem as pessoas para o
centro da cidade?
Viver nas Zonas Ribeirinhas… a que Preço?
ATELIER 9
Uma cidade no Canadá
No ano anterior já tínhamos feito algo semelhante em Long Beach, na Califórnia; a ideia principal era criar
um molhe afastado do espaço portuário, mas mais perto do centro da cidade, mantendo a preocupação em
tornar o local acessível ao público e em condições de segurança.
Estudo do caso nº2 - Portland, Maine; estamos em presença de uma cidade com 100.000 habitantes,
transformada para apoio portuário, com uma faceta menos industrial. Pretendia-se também que se transformasse num espaço de interesse público, facilitando o acesso dos cidadãos à zona ribeirinha.
A partir de 2001, iniciou-se um projecto com participação pública, envolvendo as autoridades locais
e o governo. A área entre os dois molhes é um espaço multifunções com zonas de estacionamento
subterrâneo e áreas que ainda não estão construídas, como é o caso do terminal de ferry-boats, etc,
que terá a sua rentabilidade assegurada através do fornecimento de serviços à cidade (exposições,
etc).
Estudo do caso nº3 - Quebec; depois da consultoria que foi realizada para o estudo deste caso, uma
cidade maior com 750.000 habitantes, foram identificadas algumas zonas da cidade apropriadas para acolher
navios de cruzeiro e áreas de embarque e desembarque de passageiros.
Por outro lado, havia uma grande preocupação em aproximar a frente ribeirinha dos cidadãos, protegendo,
ao mesmo tempo, a cidade antiga, património da UNESCO, que não podia ser alvo de congestionamento
provocado pelos autocarros de transporte de passageiros oriundos dos navios de cruzeiro. Tivemos de
trabalhar com a autoridade portuária para definir uma zona apenas utilizada para o estacionamento dos
autocarros.
No entanto, este plano inicial não resultou, devido ao sentimento exagerado de prevenção em matéria de
segurança. Voltámos então a condicionar o acesso a uma única embarcação, em vez da presença de dois
navios. Esta decisão teve bastante êxito, porque os passageiros podiam sair tranquilamente do navio através
de uma ponte – passerelle – reduzindo-se assim o impacto negativo da afluência excessiva de turistas a um
equipamento construído pela cidade nos anos 80 e os receios securitários.
Este é um projecto obrigatoriamente multifunções porque o porto do Quebec apenas tem embarcações
durante quatro meses por ano, sendo obrigado, no resto do tempo, a produzir receitas. Neste sentido, insere-se a requalificação de um armazém com funções de terminal, mas também para banquetes e exposições,
a cargo de um operador independente.
Estudo do caso nº 4 - Norfolk, Virgínia; é a sede da marinha norte-americana, onde houve necessidade de desenvolver um novo terminal para cruzeiros porque há cada vez mais navios a demandar Norfolk.
Para além disso, os navios de guerra precisam de ter acesso fácil a esta zona de interesse estratégico numa
situação de emergência nacional.
Portland, Maine
Quebec
Norfolk, Virgínia
177
Tentámos transformar o edifício já existente para acolhimento dos passageiros, aproveitando o tempo de
espera com as burocracias alfandegárias para levá-los a visitar o museu localizado no mesmo espaço.
A solução urbanística encontrada centrou-se na criação de uma ponte levadiça sobre a marina, completada
com a instalação de restaurantes na vizinhança do museu, sem esquecer as medidas de segurança, acrescidas
nos dias de entrada e saída de navios.
Em suma, antes de se avançar para um projecto deste tipo é preciso saber se existe mercado para navios de
cruzeiro e ferry-boats; depois, um a dois anos para começar a planear, sendo necessária a sua integração no
Plano Estratégico (a cidade já dispõe de Plano Estratégico, sendo preciso completá-lo com a função turismo
de cruzeiros); deve haver também no terminal outras valências e a devida interligação entre elas. Dentro
deste conceito cabe, também, a criação de centros de conferências, centros de exposições e lojas nas zonas
circundantes ao porto.
As diversas fases de desenvolvimento do projecto devem manter-se fiéis ao plano projectado para um horizonte de 20 anos, na perspectiva de uma visão a longo prazo. ❘❙❚
Intervenção de
Stavros Hatzakos
Coordenador dos Jogos Olímpicos
Autoridade do Porto de Pireu, Grécia
Infra-estruturas de acolhimento
no Porto do Pireu para o programa
de alojamentos flutuantes
dos Jogos Olímpicos 2004
Porto de Pireu
Porto nos anos 90
A Grécia é o país anfitrião dos Jogos Olímpicos deste ano, tendo para o efeito de planear infra-estruturas,
instalações diversas e hotéis flutuantes, em torno de um projecto que desenvolvemos ao longo dos últimos
quatro anos.
Aproveitando esta oportunidade, tratámos de alterar a imagem e as condições de operacionalidade do porto
para acolher um tipo de hotelaria de passagem – hotéis flutuantes - mas com todos os problemas inerentes
a um hotel tradicional.
O porto de Pireu é a porta de entrada da Grécia e um dos mais movimentados em todo o mundo, com
cerca de 11 milhões de passageiros de tráfego local e a recepção a 2.500 navios, anualmente.
A situação do porto nos anos 90 caracterizava-se pela existência de um terminal de passageiros para navios
de cruzeiro, terminais de carga e de contentores, e armazéns. A necessidade de racionalizar a utilização do
espaço conduziu à retirada das actividades mais barulhentas. Para isso tivemos de trabalhar, não apenas com
a Câmara Municipal de Pireu, mas com mais quatro autarquias com competências na área de influência do
porto, num diálogo supramunicipal e de temporalidade indefinida, de modo a consagrar decisões estáveis, que
de outro modo poderiam ser postas em causa por eventuais mudanças resultantes dos ciclos eleitorais.
Por outro lado, foram retiradas as actividades de carga do porto central, dada a necessidade de instalar
terminais de passageiros para tráfego doméstico e de cruzeiro, demolindo os armazéns desnecessários, e
obtendo-se em resultado desta iniciativa uma área nova de 20.000 m2. Decidiu-se, igualmente, reabilitar os
edifícios existentes, ao abrigo das disposições previstas no Plano Estratégico, em vigor desde o ano 2000.
Era necessário concentrarmo-nos nos diversos projectos sectoriais que faziam parte do projecto principal:
• O primeiro projecto diz respeito à criação de novas instalações portuárias para navios de cruzeiro: a
construção de uma parede cais com 900 m na área de Palataki, com uma profundidade de 11,5 m,
para acomodar grandes navios; a criação de três novos cais de desembarque para navios de cruzeiro;
e a construção de um terminal de passageiros na mesma zona.
• O segundo projecto, um dos mais importantes para o porto, dizia respeito ao fornecimento da água
e sistema de saneamento básico. Para o conseguir aumentámos a capacidade instalada e criámos uma
rede de saneamento nova, para poder retirar as águas residuais dos navios atracados. O projecto foi
pensado não apenas para o terminal de cruzeiros, mas, também, para toda a área central do porto, de
modo a responder às necessidades dos ferry-boats.
• O terceiro projecto incidia na reabilitação e requalificação da zona portuária e da zona de cruzeiros,
na construção de uma estrada circular com novas entradas e na instalação de redes de electricidade,
iluminação, telecomunicações, etc, infra-estruturas fundamentais para o êxito do programa de hotéis
flutuantes.
Tivemos, também, a ideia de construir uma base de helicópteros, já existente, mas que, infelizmente, não
poderá ser utilizada durante os Jogos Olímpicos por questões de segurança.
• No que respeita ao quarto projecto, decidimos reabilitar a maior parte dos edifícios existentes, sobretudo o edifícios principal da administração portuária, que se encontra no porto central, para aí localizar
a Comissão Organizadora de Atenas 2004 e a divisão de segurança. Decidimos, igualmente, adaptar o
Viver nas Zonas Ribeirinhas… a que Preço?
piso térreo para centro médico e criar mais espaço para o serviço de apoio aos passageiros.
O terminal Xaverios foi alargado para prestar melhor serviço aos visitantes e restaurou-se o ex-pavilhão real,
um edifício histórico que se encontra nesta área.
• O quinto projecto diz respeito à construção de outras instalações, como um quartel de bombeiros,
um novo edifício para os pilotos e um posto para a polícia marítima.
O custo total destes projectos, já concluídos, está avaliado em 22 milhões de Euros.
Dos projectos não concluídos ou em fase de plano, refiram-se um parque de estacionamento com capacidade para 700 automóveis, suspenso por terem sido encontradas ruínas arqueológicas, a criação de um hotel
de cinco estrelas na zona de Palataki, construção imobiliária no cais Hietiohnian que, neste momento, não
tem utilização comercial, e a construção de um sistema de transportes ligando a estrada circular ao centro do
porto, de modo a descongestionar o tráfego local. ❘❙❚
ATELIER 9
Zona intervencionada
179
As Vantagens de um Porto Interveniente
na Interface “Cidade/Porto”
Neste painel vamos abordar sobretudo as questões relacionadas com a segurança.
Após o 11 de Setembro, e agora mais recentemente com o atentado de Madrid, foi grande
a tentação para aumentar a segurança nos espaços cidade/ porto, com uma grande panóplia
de leis e regulamentos, inclusive da própria segurança do porto.
Relativamente a este tema podemos levantar uma série de questões:
O debate sobre a integração urbana dos portos e o seu relacionamento com a cidade e os
seus habitantes será abalado pelos imperativos de segurança que têm surgido?
Será que certas funções portuárias estão condenadas a desaparecer da proximidade do núcleo urbano?
Será que as funções que têm maior valor acrescentado também se encontram em perigo de
desaparecer como, por exemplo, o tráfego de contentores e de produtos alimentares, que
são os elementos que têm maior envolvência com o tecido urbano?
Será que a questão da segurança, ao contrário da nossa ética tradicional, vai pôr em causa os
princípios fundamentais de liberdade e defesa de pessoas e bens?
Será que o porto acaba por ser um factor de discriminação? Será que estes meios de protecção em vez de constituírem uma vantagem acrescida, prejudicam os portos dos países em
vias de desenvolvimento, que não estão preparados para satisfazer uma série de requisitos
obrigatórios?
Vamos tentar responder a estas questões. ❘❙❚
SESSÃO VI
Charles Huygens
Director do Porto de Bruxelas, Bélgica
Presidente da Mesa
Intervenção de
Gideon Golber
Director do Porto de Eilat, Israel
Coexistência:
porto-comunidade e cidade
Recife de golfinhos
Intervenção de
Mamsie Khoapa
Planeamento e Desenvolvimento
Autoridade Nacional dos Portos da África do Sul
Desenvolvimento das frentes
marítimas após o 11 de Setembro
Eilat é uma pequena cidade com 45.000 habitantes, que tem desenvolvido grande actividade turística em
coexistência com as actividades portuárias tradicionais.
Desde 1965 que o porto de Eilat tem servido para o Estado de Israel como uma porta de saída para o Oriente, África do Sul, Austrália, etc., reduzindo a necessidade de passagem pelo Canal Suez.
Por duas vezes, em 1989 e em 1995, o Governo declarou este porto, localizado no sul de Israel e com um movimento portuário de 200 milhões de toneladas por ano, como um bem nacional, dada a sua importância estratégica.
Muitas das suas áreas foram devolvidas à cidade, como é o caso de uma antiga refinaria onde hoje está
instalado um centro de arte.
Os portos marítimos e as fronteiras do Estado de Israel, mesmo antes do 11 de Setembro, sempre estiveram
bem protegidos pelos serviços de segurança.
O acesso ao porto de Eilat era restrito, e mesmo sem existir o código ISPS já cumpríamos as normas de segurança, verificando toda a carga dos navios antes da sua atracação. Contudo era permitido a ocorrência de
eventos culturais, mas com as naturais limitações de segurança. Quanto ao ambiente, a entidade portuária de
Eilat tem demonstrado uma grande sensibilidade em relação ao equilíbrio ambiental, trabalhando, nomeadamente, com o porto de Aqaba e com o Ministério do Ambiente, no que diz respeito à poluição no golfo.
Para cumprir as disposições legais relativas à poluição do ar e marítima e às cargas perigosas ( fósforo e fosfatos ), o porto de Eilat planeou e implementou um projecto para lidar com estes materiais, transformando
as instalações em infra-estruturas amigas do ambiente. Esta adaptação inclui, por exemplo, a cobertura do
tecto dos contentores, fechando os pontos de descarga e evitando, ao mesmo tempo, a fuga de poeiras.
Este projecto irá custar 6,5 milhões de dólares.
Para além destas preocupações, o porto comprou um sistema de monitorização de ar com cinco estações
para medir as poeiras. As estações ambientais são colocadas à volta do porto e podem registar todas as variações ocorridas. Estes sistemas fornecem relatórios em tempo real aos ministérios em causa, o que permite
determinar, no momento, o nível de poluição.
O porto controla 90% do acesso à zona ribeirinha, sendo por isso necessário o seu envolvimento para a desafectação parcial de terrenos para utilidade pública. Nalguns destes locais operamos diferentes actividades, como o equipamento Palm Beach, uma atracção turística com golfinhos, propriedade do porto, que os visitantes gostam muito.
No campo da música, há já dezassete anos que se realiza no porto de Eilat, o Festival Internacional de Jazz
– “Jazz on the Red Sea”, que atrai artistas de todo o mundo. Os espaços de concerto são construídos com
contentores e todo o trabalho é realizado por trabalhadores do porto, como parte da contribuição solidária
da autoridade portuária para com a comunidade local.
Apesar de existir um plano do governo onde se recomenda a relocalização da base naval para instalar no território do porto um projecto estimado em 65 milhões de dólares, o porto de Eilat apresentou uma proposta
alternativa de afectação parcial da superfície da base aero-naval, para uso público, com um custo estimado
em 15 milhões de dólares, já aceite pela comissão de avaliação constituída pelos Ministérios dos Transportes
e da Defesa, Autoridade Portuária e Câmara Municipal.
Na área dos transportes, o governo decidiu que a ligação ferroviária de Eilat ao centro de Israel era muito
importante e tinha significado económico como ponte entre a Ásia, o Extremo Oriente e a Europa, em alternativa ao Canal Suez, ao mesmo tempo que desenvolvia a infra-estrutura industrial no eixo Eilat / Negev.
A escolha técnica deverá recair na proposta que defende a chegada do comboio junto do centro urbano da
cidade, em detrimento da alternativa baseada na descarga directa dos navios para um ramal ferroviário no
porto, mais económica do ponto de vista dos custos de transporte. ❘❙❚
Uma das preocupações que tenho como membro da autoridade portuária é a de saber como e onde é que
os desenvolvimentos ribeirinhos devem ocorrer, principalmente nos países em vias de desenvolvimento.
Tal como os aeroportos, os portos comerciais têm de reavaliar a sua vulnerabilidade a ataques e a actividades perigosas; atendendo aos potenciais danos provocados na economia local o no desenvolvimento de qualquer país.
Os regulamentos da organização marítima internacional definem as normas que devem ser respeitadas nas
zonas costeiras, mas não prevêem medidas para o tipo de ameaças à segurança que resultam das mercadorias que entram no país. Daí a necessidade de se tratar esta questão de uma forma integrada, no conjunto
das relações entre os portos e as autoridades locais.
As vantagens de um porto interveniente na interface “cidade/porto”
Do ponto de vista nacional, o novo paradigma de segurança apresenta desafios que temos de resolver no
futuro: a importância da capacidade de crítica nos países em vias de desenvolvimento, níveis de segurança,
inconsistência na utilização das estruturas portuárias e quadro legislativo.
Depois desta introdução, vou apresentar o papel da autoridade portuária, concentrando-me em três infraestruturas portuárias: os portos de Richards Bay, Durban e Cidade do Cabo.
A NPA – National Ports Authority é a entidade responsável pelo planeamento, desenvolvimento e gestão
portuária, incluindo o financiamento de toda a infra-estrutura e superestrutura, landlord em oito portos comerciais: Richards Bay, Durban, East London, Elizabeth, Ngqura, Mossel Bay, Cidade do Cabo e Saldanha.
Relativamente às suas características, refiram-se os portos de águas profundas (Richards Bay e Saldanha),
um porto para contentores (Durban), um terminal fruteiro e de reparação naval (Cidade do Cabo), e ainda
portos para veículos (East London), e um entreposto de carga geral (Mossel Bay), etc.
O desenvolvimento das zonas ribeirinhas na África do Sul ocorreu isoladamente e virado para o interior do
país. Mas desde 1994, deu-se uma viragem de sentido contrário, principalmente na Cidade do Cabo, com a
chegada de investidores estrangeiros. Tal como acontece em todos os portos, as áreas portuárias degradadas
foram adaptadas para outro tipo de desenvolvimento costeiro, como aconteceu com o porto de Richards
Bay, vocacionado para acolher pequenos barcos de recreio, restaurantes, escritórios e habitações para as
classes média e média alta.
No porto de Durban o desenvolvimento urbano/portuário vai ocorrer no extremo do canal de entrada, que
está a ser alargado, e onde existem muitas preocupações ao nível da segurança. Para o local estão projectadas lojas, apartamentos para as classes média e média alta e uma marina.
No futuro, o porto da Cidade do Cabo será dotado com uma marina, área residencial para a classe alta,
zona comercial, etc.
O maior problema é saber como é que conciliamos os interesses da autoridade portuária com os timings de
desenvolvimento do país. Quais são as prioridades: é o desenvolvimento das zonas ribeirinhas ou a educação
das nossas crianças?
Os principais desafios que temos de enfrentar relacionam-se com:
• Desenvolvimento das frentes ribeirinhas nos países em vias de desenvolvimento, assente no relacionamento saudável entre a autoridade portuária e a municipalidade;
• Problemas legislativos com incidência na área da segurança;
• Utilização inconsistente dos espaços portuários;
• Falta de colaboração entre todas as autoridades oficiais envolvidas.
No balanço que fazemos entendemos que qualquer projecto de desenvolvimento deve ter associado a
actividade comercial, importante para o crescimento económico, e ter sempre presente, na avaliação prévia,
critérios baseados em:
• Valor económico do porto;
• Localização estratégica;
• Volume de carga movimentada;
• Contribuição fiscal indirecta para o PIB;
Deste exercício resultam códigos de zona, que podem ser atribuídos a cada porto. Os Zoning Codes abrangem a Zona 1 (Vermelho – Mais Restritivo); a Zona 2 (Verde – Segundo Mais Restritivo) e a Zona 3 (Azul
– Menos Restritivo).
Os Zoning Codes são instrumentos de planeamento utilizados para dar resposta às mudanças e acomodar
estilos de vida, sem esquecer a protecção da saúde pública, a segurança, o bem-estar dos cidadãos e as
pressões urbanísticas junto das zonas ribeirinhas.
A tabela da classificação atribui a categoria do zoning (hierarquia portuária) de cada porto e alinha-a a uma
concepção de desenvolvimento de determinada zona ribeirinha a ser incentivada pelo porto, tendo em vista
o planeamento das suas funções no futuro.
A base de avaliação resulta num sistema de pontuação que permite classificar cada porto de acordo com um
código estruturado da hierarquia portuária.
É imperativo que a autoridade portuária e todas as entidades governamentais sejam flexíveis e se adaptem
aos paradigmas da mudança. A aplicação destes princípios, em articulação com as recomendações existentes
ou disposições na área do ordenamento portuário, deriva da necessidade de ser assegurado o desenvolvimento sustentável, quer do porto, quer da cidade.
SESSÃO VI
Porto de Durban
Porto da Cidade do Cabo
183
Zoning Codes
Zone 1: RED
Waterfront
Development
Types Permitted
“Working”
Waterfront
Development
– Only Preference.
(Highest zone classification - Most restrictive measures)
Setbacks required
Strong Greenbelt as buffer zone
No residential development
Water dependent Developments only
Building/Height Restrictions
Low densities
Security and Safety Restrictions
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Conditional Shopping Components
- World trade center concept
- Office spaces
- Passive recreation
Zone 2: GREEN
Waterfront
Development
Types Permitted
Semi-Working
Waterfront with
small % of mix-use
activities aligned
with Time-Sensitive
uses to Port
Operations, especially
if abutting proposed
development.
(Second Highest zone classification - Moderate restrictive measures)
Setbacks required
Strong Greenbelt as buffer zone
Building/Height Restrictions
Security and Safety Restrictions
<5% residential development (Low density)
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Shopping
- World trade center concept
- Office spaces
- Low densities
- Passive recreation
Zone 3: BLUE
Waterfront
Development
Types Allowed
Limited “Working
waterfront” with
low-medium mix-use
and residential
component provided
it is aligned with
Port master plan.
(Third Highest zone classification - Least restrictive measures)
Setbacks required
Greenbelt as buffer zone and passive recreation opportunities
Building/Height Restrictions
Security and Safety Restrictions
5%<>30% residential development
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Shopping
- World trade center concept
- Office spaces
- Med-Low densities
- Passive recreation
Por exemplo, as autoridades gestionárias dos portos de Mossel Bay, Durban e Cidade do Cabo, foram confrontadas com algumas questões para se avaliar o tipo de desenvolvimento da zona ribeirinha mais adequado
a cada um deles.
É importante dizer-se que uma avaliação rigorosa das classificações e de outras variáveis que podem influenciar a pontuação final do zoning está sempre presente ao longo do desenvolvimento do processo.
No porto de Durban, por exemplo, a melhor estrutura é a Zona Vermelha, ou seja, só vai ser permitido
desenvolver a zona ribeirinha se esta promover actividades produtivas ligadas ao mar e não for permitida a
construção de apartamentos.
Já a Cidade do Cabo, que fica na Zona Verde, está sujeita a medidas restritivas, mas menos condicionantes
que as da Zona Vermelha.
As vantagens de um porto interveniente na interface “cidade/porto”
O porto de Mossel Bay, na Zona Azul, tem uma classificação menos restritiva, e já é permitida a componente
residencial.
Ports
Zoning Code Waterfront type
General Guidelines
Durban 1
“Working” Waterfront Setbacks required (500 minimum if in port proximity)
Development – Only
High Security and Safety Restrictions
Strong Greenbelt as buffer zone
No residential development
Water dependent Developments only
Building/Height Restrictions
Low densities
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Conditional Shopping Components
- World trade center concept
- Office spaces
- Passive recreation
Cape
Town
2
Semi-Working
Waterfront with
small % of mix-use
activities aligned
with Time-Sensitive
uses to Port
Operations, especially
if abutting proposed
development.
Setbacks of a minimum 300 meters
if outside of port boundaries
Strong Greenbelt as buffer zone
Building/Height Restrictions
High Security and Safety Restrictions
No residential development
Low-med density
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Shopping
- World trade center concept
- Office spaces
- Low densities
- Passive recreation
Mossel
Bay
3
Limited “Working
waterfront” with
low-medium mixuse and residential
component provided
it is aligned with
Port master plan.
Setbacks required
Greenbelt as buffer zone and passive recreation
opportunities
Building/Height Restrictions
High Security and Safety Restrictions
<5% residential development
Time sensitive uses, e.g.
- Restaurants
- Shopping
- World trade center concept
- Office spaces
- Med densities
- Passive recreation
Estes procedimentos servem para nos assegurarmos que as medidas são razoavelmente restritivas e servem,
também, para minimizar os impactos negativos tendo em vista a necessária sustentabilidade dos projectos. As
grandes linhas de orientação que balizam a nossa política são, em suma, os seguintes:
• O desenvolvimento das zonas ribeirinhas e as suas qualificações deverá ser baseado numa hierarquia
portuária – Zoning System;
• A definição de um conceito tipo que funcione para todos os portos comerciais;
• Os projectos imobiliários a desenvolver devem obedecer a requisitos previamente definidos;
SESSÃO VI
185
• Existência de zonas verdes que funcionem como tampão paisagístico entre as diferentes áreas;
• Melhoria dos acessos às áreas de actividade portuária e minimização dos engarrafamentos através da
aplicação de programas de gestão de trânsito;
• Aplicação de conceitos de defesa que integrem na sua formulação as questões de qualidade de vida e
medidas de segurança;
• Fomentar as relações de proximidade entre as autoridades portuárias e as autarquias;
• Encorajar o investimento na inovação e a colaboração entre o sector privado, a autoridade do porto
e as autarquias;
• Garantir o acesso do púbico aos projectos que se desenvolvem junto à costa, assegurando que não há
privatização do espaço público e incentivar a celebração de parcerias público/ privados.
O quadro de desenvolvimento das zonas ribeirinhas tem de ter por base princípios de planeamento já definidos, adaptando-os às técnicas e ferramentas de planeamento actuais, para enfrentar os desafios do futuro.
Temos de garantir que haja unidade e transparência nos nossos critérios de avaliação do desenvolvimento,
facilitando o diálogo e a colaboração entre as cidades e as autoridades portuárias.
Por outro lado, há que promover o planeamento integrado com responsabilidade colectiva em matéria de
segurança. Esta questão não tem só a ver com a segurança dos portos, as autarquias têm de compreender
que desempenham um papel importante como garantes da segurança colectiva. ❘❙❚
Intervenção de
Wo Guozhong
Dalian Port Corporation, Lda., China
A coabitação entre actividades
portuárias e os novos bairros
urbanos da Baía de Dalian
Porto de Dalian
Dalian é um dos maiores portos internacionais e o maior da China, muito importante para o desenvolvimento do nordeste asiático. É o verdadeiro motor do transporte de mercadorias de toda a região sul da Ásia para
as Américas, beneficiando de muitas obras de requalificação, realizadas a partir de 1935.
O porto de Dalian tem oito terminais, 66 cais de acostagem, que dão abrigo a actividades turísticas, armazenamento e distribuição de mercadorias e serviços de animação local, dispõe de capacidade para movimentar cerca
de 70 milhões de toneladas de carga e mantém ligações regulares para mais de 130 países em todo o mundo.
O Plano Estratégico do porto de Dalian tem seis centros de actividade: transporte de contentores, granulado
por grosso, distribuição de produtos químicos, distribuição de carga por grosso, transporte de veículos e
transporte de carga geral.
O nosso Plano Estratégico assenta em três bases concretas: base logística internacional de Dagushan, zona
industrial de Dalian e a zona de passageiros e logística urbana de Dagang, interligadas por redes de autoestradas, redes ferroviárias e transporte marítimo.
O investimento total de 2001 a 2010 prevê-se que chegue aos 27 mil milhões de ren-min-bi (RMB).
As obras localizam-se na parte leste do terminal Shiergou do porto de Dalian, numa área superior a 305ha,
dos quais, 245ha, já estão ocupados.
Os dez projectos-chave são:
• 2ª Fase da Baía de Dayao;
• Terminal de crude;
• Terminal para minerais;
• Terminal para produtos petrolíferos;
• Parque logístico internacional;
• Zona industrial;
• Terminal para automóveis;
• 3ª fase da Baía de Dayao;
• Auto-estrada Jin-Yao e canal de distribuição da Baía de Dayao;
• Reconversão do antigo porto e terminal de cruzeiro.
O planeamento a longo prazo está presente em vários projectos:
• Um parque logístico para contentores (Dayao Bay);
• Um porto de logística de produtos petrolíferos (Xingang);
• Um porto de logística de transporte;
• Um porto logístico de granel por grosso;
• Um porto de logística de carga geral (Dalian Bay).
• Um porto de turismo e de roll-on, roll-off.
As vantagens de um porto interveniente na interface “cidade/porto”
O nosso investimento ascende a 4 mil milhões de RMB, para a recuperação do antigo porto, vamos envolver também 4 mil milhões de RMB, o investimento externo será de 6 mil milhões de RMB, o mercado de
acções vai financiar-nos com 2 mil milhões de RMB e através de empréstimos bancários conseguimos mais
11 mil milhões.
Até ao final de 2005 pretendemos ter a operar 93 cais, com capacidade até 150 milhões de toneladas; até
ao final de 2010 esperamos ter 109 cais, com capacidade para 200 milhões de toneladas, um rendimento
total de 6 mil milhões de RMB e um capital próprio de 30 mil milhões de RMB.
A partir de duas propostas – da PSA, uma das concessionárias da zona, e da TVS - a cidade de Dalian elaborou um novo projecto de reconstrução, donde se destacam como principais pontos fortes:
• Definição das redes de transportes rodoviários tendo em atenção a ligação com o resto da cidade;
• Organização das funções urbanas –através da criação de blocos funcionais de áreas comerciais,
espaços para serviços, equipamentos culturais, escritórios, etc;
• Prolongamento dos eixos urbanos existentes até ao mar, reforçando o carácter marítimo de
toda a cidade;
• Respeito pela identidade cultural e histórica através da recuperação dos antigos molhes portuários,
respeitando a traça e a história dos locais intervencionados;
• Redimensionamento e localização dos espaços verdes, de leste a oeste, que serão sempre um
elemento estruturante de todo o projecto;
• Zona ribeirinha de lazer, numa extensão de 4 km, composta por actividades turísticas, áreas lúdicas,
equipamentos culturais, etc.; os responsáveis locais pretendem que a zona litoral se torne o elemento mais
atractivo da cidade, para as populações e para o turismo internacional;
• Organização da paisagem urbana – a concepção dos edifícios está organizada e dimensionada de
forma a projectá-los sobre o mar. Construções mais elevadas a ocidente e a sul; mais baixas a leste e a
norte, ao longo da margem;
• Serviços públicos – rede hidrológica, de electricidade, gás e telecomunicações, serão ligadas de forma
articulada aos bairros vizinhos. ❘❙❚
SESSÃO VI
Proposta da PSA
Proposta da TVS
Porto de Dalian no futuro
187
CONCLUSÕES E SÍNTESE
Gostaria de iniciar este painel com três comentários prévios. O primeiro diz respeito à
questão-chave que justifica a existência da AIVP: a relação cidade/porto. O segundo incidirá sobre o tema desta conferência: modernidade e identidade. Finalmente, o terceiro
comentário relaciona-se com o significado dos resultados obtidos ao longo destes três dias
de debate.
Nos últimos 20 anos generalizou-se um discurso que contém uma série de elementos
comuns.
O reforço do diálogo e da cooperação entre autoridades locais e portuárias, a regeneração
urbana de frentes de água, o recurso sistemático a parcerias entre entidades públicas e privadas, a participação pública como forma de legitimação dos projectos propostos e a procura
de níveis elevados de qualidade ambiental e de segurança, constituem os ingredientes principais de uma nova ortodoxia.
Este discurso, com tradução em estratégias e projectos hoje visíveis um pouco por todo o
mundo, constitui uma reacção ao facto de os portos se terem transformado num enclave que
separava a cidade do mar ou do rio. A abordagem das frentes de água representa, por isso, a
reconquista da área do porto pela cidade e pelos cidadãos. Muitos hectares são desafectados
dos seus anteriores usos portuários, dando origem a projectos de requalificação baseados
numa ocupação mista de lazer, turismo, residencial e empresarial.
A abordagem das frentes de água teve uma grande ressonância social e mediática. Cidadãos,
autarcas, urbanistas e arquitectos, entre outros, publicitaram amplamente estas operações
de requalificação urbana, produtoras de novas áreas que são, simultaneamente, de fruição
para os residentes e de atracção para os visitantes.
A ênfase excessiva neste tipo de operações pode, no entanto, desencadear dois efeitos subliminares em termos de opinião pública e de comunicação social. Por um lado, deixa passar,
tacitamente, a mensagem de que as actividades portuárias correspondem a um sector obsoleto, à excepção dos portos de lazer e de turismo (marinas, portos de cruzeiro). Por outro
lado, sugere a existência de um conflito estrutural entre cidade (qualidade de vida urbana)
e porto (actividades económicas). Como resultado, generaliza-se a ideia, ainda que, muitas
vezes, de forma apenas implícita, de que os portos comerciais e industriais são incompatíveis
com uma localização urbana, pelo que devem ser relocalizados, libertando o solo para novos
usos paisagísticos e urbanos.
O valor indiscutível das frentes de água não pode representar uma certidão de óbito para as
cidades portuárias. A excessiva importância atribuída às operações de requalificação urbana
nas frentes marítimas e ribeirinhas deve, por isso, ser compensada por uma abordagem que,
por oposição, poderíamos designar por retaguardas de terra.
João Ferrão
Investigador Principal do Instituto de Ciências Sociais,
Universidade de Lisboa, Portugal
A relação cidade/porto:
iniciar um novo ciclo de debate
Modernidade e identidade:
reimaginar novas estratégias
de diferenciação
num mundo globalizado
9ª Conferência da AIVP:
rumo a uma nova agenda
Os portos, para serem eficientes, precisam de melhorar a sua relação com as cidades e com
as regiões envolventes, promovendo a sua integração territorial. As novas áreas de expansão, as acessibilidades terrestres, as zonas logísticas de apoio, as plataformas intermodais, a
organização do complexo cluster de actividades associadas ao porto, devem ser pensadas de
forma sistémica e à escala regional. Aliás, o mesmo se passa no que se refere aos aspectos
biofísicos. No futuro, a relação cidade/porto tem de ser mais qualificada e inteligente e, por
isso, planeada de forma mais integrada. É, portanto, sobre a integração territorial das cidades
portuárias, e não das cidades ex-portuárias, que precisamos de saber mais.
A modernidade e a identidade são aspectos cruciais para o futuro sustentado das cidades
portuárias. Foi, por isso, oportuna a sua escolha como tema desta Conferência.
A aposta na modernidade das cidades portuárias – isto é, das actividades do porto e da relação porto/cidade – implica profundas alterações: organizacionais, tecnológicas, financeiras,
etc, ajustadas aos modelos políticos e institucionais de cada país e região.
As cidades portuárias têm, no entanto, histórias, memórias e patrimónios muito diversificados, que lhes conferem singularidade diversa. Ao mesmo tempo, num contexto em que os
portos estão cada vez mais expostos a influências de natureza global, a especialização através
da integração em cadeias internacionais multimodais surge como um caminho inevitável.
Nos últimos anos, a identidade das cidades portuárias tem sido construída a partir da conjugação de dois factores: a valorização do património portuário e a produção de novos ícones
urbanos. A construção de novas imagens urbanas, sobretudo nas frentes de água, tem contribuído para recriar a identidade destas cidades, agora mais associada a actividades culturais
e de lazer e a estilos de vida cosmopolitas.
A identidade das cidades portuárias não pode, no entanto, prescindir daquele que é o seu
principal ícone: o porto. Defender a modernidade e a identidade das cidades portuárias
significa, hoje, conciliar os avanços próprios da sociedade do conhecimento com as estratégias de diferenciação funcional e de imagem inevitáveis no mundo globalizado em que
vivemos.
Reimaginar a modernidade e a identidade das cidades portuárias a partir de uma visão
integrada cidade/porto é, pois, uma condição essencial para uma relação mais sustentada, porque mais competitiva, entre as particularidades locais e os actores e tendências
globais.
Esta é a 9ª conferência internacional organizada pela AIVP. É, portanto, o nono evento de
uma trajectória, já longa, de aprendizagem colectiva, onde a apresentação de projectos, a
troca de experiências, o confronto de resultados e o debate de visões e estratégias tem permitido enriquecer o nosso entendimento sobre a complexa relação cidade/porto. Cumpriu-
se, assim, um dos objectivos deste tipo de iniciativas: partilhar informação e conhecimento,
reforçar competências e capacidades, num contexto comparativo internacional.
Ao mesmo tempo, as sucessivas conferências foram marcando, ainda que por vezes apenas
de forma implícita, uma agenda discursiva e de acção. Ao definir determinadas prioridades
em termos de visões, conceitos, temas e projectos, as conferências da AIVP funcionam como
um poderoso e eficiente palco de agenda-setting. E a agenda discursiva e de acção que assim se vai colectivamente construindo, não só contribui para fortalecer a existência de uma
comunidade de interesses organizada em torno das relações cidade/porto, como concorre
para a sua necessária modernidade e identidade.
À luz destas observações, proponho duas questões genéricas aos membros do painel e ao
público presente na sala:
• Qual o valor acrescentado desta Conferência? O que aprendemos com ela?
• Que implicações se podem retirar da Conferência? Qual a nova agenda da AIVP para
os próximos anos, e sobretudo para o encontro a realizar em Sidney?
A palavra é vossa. ❘❙❚
Intervenção de
Dick Schubert
Professor da Universidade Técnica de Hamburgo,
Alemanha
Intervenção de
Roberto Converti
Arquitecto, Buenos Aires, Argentina
Relativamente ao valor acrescentado desta conferência penso que tivemos óptimas apresentações e excelentes discursos, mas apenas alguns oradores falaram em concreto dos problemas das zonas ribeirinhas.
Como foi possível, por exemplo, implementar determinados projectos em certos locais e não foi possível
fazer o mesmo noutros?
Creio que precisamos de mais informação sobre os processos, os agentes e os interesses envolvidos na
revitalização das zonas ribeirinhas, nomeadamente ao nível local, regional, nacional e até internacional.
Posto isto, e na posse dessa informação, podíamos então compreender porque é que uns projectos podem
ser implementados e outros não.
Gostava também de saber o porquê da demora na execução destes projectos.
Quanto às melhorias sentidas penso que se prendem com a gestão do próprio processo de planeamento
onde todos os interessados intervêm e onde a cooperação público-privado ocupa um lugar absolutamente
necessária.
Seria desejável pensarmos em organizar uma conferência apenas sobre os projectos que não foram implementados e as razões que levaram a essa impossibilidade. Pode ser um pouco frustrante, mas talvez possamos aprender mais com as ideias que não passaram do projecto.
Até aqui fizeram-se duas coisas:
- Construíram-se novos terminais de contentores na periferia, de que são exemplo Sidney, Portland, Roterdão, Londres, etc., reabilitando os portos para outras actividades.
Aparentemente, Lisboa é uma excepção a esta tendência, porque os terminais não foram transferidos,
optando-se por construir instalações para receber os grandes navios e, por outro lado, prosseguiu-se a
revitalização dos antigos portos.
Desde o princípio da industrialização, tem-se assistido, na Europa, ao desenvolvimento das cidades à volta
dos portos. Por isso, é muito fácil integrar ou reintegrar o porto com a cidade, podendo até tirar-se partido
das sinergias locais. A sua reabilitação é, normalmente, uma boa oportunidade para criar novas zonas residenciais e de escritórios.
É aquilo que nos EUA se chama SHE (Seaford History Entertainement), o aproveitamento de sinergias entre
alojamento, entretenimento e transportes marítimos.
Do meu ponto de vista, no entanto, o mais importante é que acaba por haver uma certa descontinuidade
entre o centro e a periferia, evitável e desnecessário.
Há duas tarefas importantes a realizar: a revitalização (trabalho de arquitectos) e o planeamento de novos
terminais de contentores na periferia ( competência dos estrategas do porto e das autoridades).
Muitas vezes, no entanto, as instalações portuárias estão afastadas da cidade e longe dos transportes públicos,
o que dificulta a sua aproximação à cidade.
A grande tarefa que temos no futuro é a capacidade visionária para antecipar a futura utilização das áreas
que vão ser desocupadas. Por um lado, temos um porto que ainda está em funcionamento, por outro, a
possibilidade de revitalizar parte dessas áreas.
Tentando responder à segunda pergunta – a agenda futuro da AIVP - ela tem de ser revista, obviamente. É
preciso planear melhor estes encontros para que no futuro tenhamos uma agenda de trabalhos com informações mais específicas sobre estas matérias e sabermos como levar os empresários a ajudarem à reabilitação ou relocalização das áreas portuárias.
Muitas vezes, os problemas que surgem no longo prazo têm a ver com a falta de planeamento. Mas, também é verdade que precisamos de conceber planos com horizontes mais próximos, porque não é possível
perspectivar tudo no longo prazo. Neste contexto, temos de ter em atenção o conjunto como um todo,
aquilo a que poderíamos chamar de visão global e integrada.
Concluindo, a questão que deixo é a seguinte:
- Como lidar com estas zonas sensíveis e com as suas fragilidades, no futuro? ❘❙❚
Foram colocadas à mesa duas perguntas muito concretas às quais vou tentar responder de forma igualmente
concisa.
No que diz respeito ao valor acrescentado deste encontro, creio que as apresentações que foram feitas,
representam o fim de um ciclo ou, se quisermos ver de forma mais positiva, o começo de um outro.
CONCLUSÕES E SÍNTESE
193
Isto significa que ao analisarmos a problemática da reconversão das áreas portuárias, devemos fazê-lo numa
perspectiva próxima da realidade, centrada na visão académica dos anos 70, que transformou o modo de observar a tarefa de planeamento das cidades; até aí perspectivada a partir de uma matriz conservadora, que tinha
a ver, sobretudo, com a ideia de governabilidade, com a acção directa sobre a transformação das cidades.
É assim que surgem, em meados dos anos 80, novos conceitos que apontam para a ideia de projecto urbano
e do modo como se pode responder melhor às mudanças constantes nas cidades. Um dos pontos-chave
foi o entendimento da cidade como espaço de residência reinventado pelos cidadãos e a complexidade das
alterações a fazer ao nível das infra-estruturas. Se analisarmos bem, veremos que não só os portos se transformaram, como também a sua conexão com as infra-estruturas ferroviárias, rodoviárias, nomeadamente
auto-estradas, instalações aeroportuárias, etc., foi completamente alterada.
Quando uso a expressão “fim de um ciclo” refiro-me ao facto deste modelo ter dado sinais importantes de
que há mudanças em curso. A primeira, diz respeito à importância que deve ser dada a uma maior identificação com a logística, o transporte e as acessibilidades às áreas portuárias. O que é que isto significa? Significa
que temos de tomar consciência de que a cidade foi protagonista central desta nova relação porto/cidade.
Assumindo um papel importante no processo de crescimento e transformação da realidade, sobretudo nas
áreas portuárias obsoletas ou não utilizadas.
Os portos, tal como os aeroportos, as auto-estradas, as ferrovias, etc., serão sempre fundamentais para o
desenvolvimento das cidades, contribuindo para a sua qualificação como lugares de intercâmbio, de troca
e de contacto.
A primeira etapa para pensar o porto como peça fundamental e protagonista de pleno direito de uma nova
era, passa pela utilização dos lugares deixados pelo porto, atribuindo-lhe funções próprias na sua integração
como uma peça estratégica, fundamental e chave do espírito da nova cidade.
Entra agora a segunda pergunta sobre a nova Agenda.
Temos de ter em conta os dados de contexto ao falarmos da Europa, América Latina, América do Norte ou
África, etc, pois há identidades e culturas diversas, que terão reflexos nos projectos desenvolvidos em áreas
geográficas muito diferenciadas. Estas diferenças estratégicas têm de estar presentes neste novo ciclo. Creio
que se abre uma oportunidade fantástica para que entidades como a AIVP tenham um papel fundamental a
desempenhar, sobretudo na criação deste novo quadro de conhecimentos.
Dou conta, resumidamente, de uma prioridade de Agenda em que, através de um programa da própria comunidade europeia, será possível aproximar experiências envolvendo cidades latino-americanas e europeias:
Marselha, Bilbao, Valparaiso, Rosário, Montevideo, Rio de Janeiro.
Para terminar, diria que este novo ciclo está enraizado no conhecimento. Ultrapassou-se uma etapa e lançou-se um tema para debate, começando agora a entendermos as consequências de muitas acções, que
evidentemente tiveram coisas boas e más, mas também é certo que se abriu a porta a uma das maiores
mudanças que ocorreram nas cidades. A diferença entre cidade e infra-estrutura portuária acabou, e hoje as
cidades são um complexo e moderno centro de actividades comuns, onde os portos desempenham um papel estratégico e identitário, no caminho aliás da sua tradição histórica: ser ponto de cruzamento de culturas,
uma ambição que todas as cidades importantes procuram para os seus destinos. ❘❙❚
O meu ponto de vista, mais teórico, parte da observação de quem acompanhou a transformação da relação
entre a cidade e o porto de Saint Nazaire.
A um dado momento já não sabíamos muito bem para que é que servia a cidade em Saint Nazaire. Pensamos
sempre que se trata de um mercado, de um fórum, mas não. A cidade é um teatro acima de tudo, um local de
todas as representações. Dizia-se anteriormente em França que os burgueses tinham uma montra. Sabíamos
exactamente quem eram, aquilo que faziam, o que queriam e aquilo que podíamos esperar deles.
O valor acrescentado desta conferência foi a redescoberta de uma evidência: as cidades- porto são cidades
modernas com uma forte identidade e de fácil acesso dada a sua proximidade com o mar.
A modernidade advém do facto de o porto abrir-se ao mundo, a qualquer mundo, deixando passar pelo seu
território os maiores fluxos de conhecimento e de civilizações na história da Humanidade.
As cidades também querem ter uma montra, uma montra para a rua, o que no nosso caso significa o mar. Temos que saber utilizá-la inteligentemente porque a maior parte das cidades portuárias deve o seu nascimento
Intervenção de
Joël Guy Batteux
Presidente da Câmara Municipal de Saint-Nazaire
e Presidente da Comunidade Intermunicipal
da Região de Saint-Nazaire
à existência de um porto, o que as fez reviver e respirar. Mas as cidades modernas também podem abafar
o porto e é aí que reside a dificuldade. Sabemos que sobrevivemos graças ao porto, mas ao mesmo tempo
também sabemos que a nossa cidade, pela sua extensão, pode igualmente estar a abafar o porto. Estou a
pensar, nomeadamente, em Génova. Sabemos que é difícil conservar o que é essencial mesmo havendo
uma relação congénita entre a cidade e o porto.
O nosso colega do Quénia lembrou-nos isso mesmo, que as cidades surgiram a partir dos portos. Elas são
modernas porque, além das mercadorias, passam pelos portos indivíduos, culturas e conhecimentos. Um
porto é um elemento físico, mas não só, é também um grande acontecimento cultural.
Há vários tipos de cidade na história da Humanidade: as cidades com minas e as cidades de troca. As cidades-mina são aquelas que se construíram para explorar uma mina e que tendiam a empobrecer assim que
deixavam de a explorar. As cidades de trocas são espaços de passagem obrigatória de mercadorias, e serão
eternas, como a natureza das trocas. Estas últimas cidades são as cidades-porto. ❘❙❚
Intervenção de
Giuliano Gallanti
Presidente da Association Internacionale Villes et Ports
Graças a esta conferência conseguimos ficar com uma visão abrangente daquilo que está a acontecer no
mundo. Graças aos senhores, conseguimos obter informações que desconhecíamos, o que nos permite
continuar a investigação que iniciámos há uns anos atrás, em torno do seguinte conceito: O que é uma cidade portuária moderna nos dias de hoje?
Vou dar um exemplo: Londres. Sejamos honestos, Londres não é uma cidade portuária, já não há porto
em Londres.
Algeciras, por exemplo, é um porto importante que realiza actividades de transhipment; com excelentes
resultados, mas é uma cidade portuária.
O presidente da mesa falou da reconquista do porto pela cidade. Essa filosofia ainda existe, mas temos de ser
claros. Há um espaço que foi abandonado pelo porto, como aconteceu em cidades da Europa e no mundo
inteiro, mas isso não quer dizer que a cidade conquistou o porto, apenas conquistou espaços que eram
portuários e foram recuperados para funções urbanas: funções comerciais, funções de lazer, etc. mas essas
actividades não têm nada a ver com as actividades portuárias. E aí surge um problema. As cidades portuárias
estão a desalojar os portos tornando-se, pela tendência emergente, em verdadeiros museus.
Como salvaguardar a identidade de uma cidade portuária com uma história notável? Como fazer com que
elas se tornem modernas? Existem problemas de ocupação por contentores e outro tipo de mercadorias,
poluição, circulação, sendo necessário construir infra-estruturas em redor da cidade, criar serviços, etc, tudo
isso é preciso resolver com equilíbrio, em nome do desenvolvimento sustentável entre o porto e a cidade.
Mas neste momento e, paradoxalmente, o porto já não necessita da cidade. A mercadoria, nos nossos dias,
passa directamente pelo porto.
Na actualidade existem quatro grandes grupos de transporte marítimo que asseguram 50% do mercado
mas, ao nível dos terminais explorados por privados, acontece exactamente a mesma coisa, existem quatro
entidades que asseguram 40% do tráfego dos contentores. No entanto, só teremos condições para manter
e aumentar a procura se a cidade oferecer serviços que antes não oferecia: bancos, seguros, etc.
Os diversos oradores fizeram-me ver que nos grandes portos, como os de Dalian e Tóquio, por exemplo,
desenvolvem-se esforços para fazer as duas coisas: desenvolver o porto, sem o afastar das suas actividades
principais e, ao mesmo tempo, contribuir para que o porto ofereça a qualidade de serviços que a cidade
presta. O porto não se pode tornar num deserto.
E sobre esta matéria a AIVP tem reflectido muito. Penso que a próxima conferência irá debruçar-se em torno
desse tema porque, como disse o arquitecto de Rosário, a fase de desenvolvimento do waterfront terminou.
Há projectos mais bonitos do que outros, mas entre Puerto Madero, Docklands ou Barcelona, os modelos
de desenvolvimento são mais ou menos os mesmos. Naturalmente que existem conflitos: o porto de Génova está estreitamente ligado com a cidade; e não se pode desenvolver nem para este nem para oeste por
causa das zonas urbanizadas. Mesmo mais para norte, em Roterdão, existem problemas enormes com a
cidade e os cidadãos. Antuérpia também teve casos terríveis, assim como a Alemanha.
Por essa razão, penso que é necessário encontrar uma plataforma de discussão com os cidadãos, para
que se entendam naquilo que representa uma cidade portuária: desenvolvimento, riqueza, ambiente
saudável. ❘❙❚
CONCLUSÕES E SÍNTESE
195
Depois destas intervenções tão inteligentes, brilhantes e completas, há pouco para dizer.
Vou abordar os dois conceitos fundamentais desta conferência: modernidade e identidade e introduzir o das paisagens novas e históricas. Esta ideia não foi abordada, mas por trás dela há, também, um conteúdo portuário.
A modernidade traz à cidade portuária uma paisagem nova em cumplicidade com a cidade aberta. A cidade
portuária actual, num cenário de globalização, está mais disponível ao apelo do mar, é mais cosmopolita e,
se tivermos em conta o outro conceito básico desta conferência - a identidade – assume-se como herdeira
de um passado histórico.
Esta abertura ao mundo, ou este cosmopolitismo, permite-nos falar de dois espaços distintos da cidade
portuária: por um lado, o porto comercial moderno que, de alguma forma, gere o tráfego comercial e que
supõe a implantação de uma rede de transportes multimodal. Neste espaço a relação cidade/porto nem
sempre é boa, por ausência do efeito das sinergias, e da separação espacial dos serviços e dos negócios.
Portanto estamos perante uma paisagem distinta, parecida com a das instalações industriais. Por outro lado,
na cidade portuária actual encontramos outros exemplos de paisagem diferente, nem portuária nem urbana.
É aquilo a que chamamos portos urbanos. São velhos cais remodelados, próximos do centro histórico, onde
podemos encontrar símbolos de abertura. Durante anos e anos a cidade e o porto estiveram separados por
impedimentos físicos e constrangimentos mentais.
Este é um tipo de paisagem mas, nos últimos anos, como as modas turísticas foram mudando, chegaram ao
porto hotéis flutuantes que transmitem outro tipo de paisagem à cidade.
Este porto urbano levanta duas questões:
- os molhes que antigamente eram portuários e agora são urbanos, onde há aquários, lojas, cinemas e uma
série de outras actividades lúdicas, também acolhem outras actividades que recordam o meio portuário – o
hotel flutuante. Temos, portanto, na cidade moderna aberta, duas paisagens.
- a outra ideia que foi colocada nesta conferência, a da identidade, leva-nos à noção da paisagem histórica, ou
seja, a cidade é herdeira de um passado, com resquícios que nos transportam à arqueologia industrial, à ideia
do património, e isto é o que se pretende aproveitar para lhe dar o conceito de identidade física ou de imagem
da cidade portuária, que pode ser utilizado como imagem de marca. Mas eu não estou muito convencida
desta ideia de identidade, tenho algumas dúvidas, porque nesta conferência falou-se muito ex-catedra.
Creio que o importante é que exista debate, que haja até polémica.
Apenas mais uma pequena achega para referir o destaque que a conferência deu aos efeitos que as alterações na conjuntura mundial provocam no transporte marítimo e na cidade portuária. Há muitos exemplos,
sejam modas turísticas, concorrência comercial, conflitos bélicos, seja o 11 de Setembro ou o 11 de Março,
em Madrid. ❘❙❚
Intervenção de
Trabalho numa área que está relacionada com o desenvolvimento das superfícies portuárias, e estou de
acordo que aprendemos muitas lições com a reabilitação das áreas que eram anteriormente exclusivamente portuárias.
Surge-me uma dúvida, em termos de longo prazo: será que estaremos a criar novas valências em locais
onde, eventualmente, se irão reproduzir problemas que existiam no passado? É sempre preferível dispor de
zonas ribeirinhas activas para poder integrar novas actividades, seja elas de cruzeiros, ferries, marinas, áreas
residenciais, de restauração, etc., mesmo correndo o risco de ter de enfrentar novas questões que surgem
com a mudança de uso.
Uma das ideias marcantes que levo desta conferência, é que talvez as autoridades portuárias tenham que
ter um papel mais activo na informação pública sobre a importância das actividades portuárias para a cidade
e para a região. No noroeste de Inglaterra e no caso de Liverpool, muitas vezes a dificuldade está na não
divulgação dos benefícios económicos que as áreas portuárias introduzem na vida local, reflexo do desenvolvimento da indústria. Comparativamente, há vinte ou trinta anos, o número de empregos nos portos era
muito menor, mas isso não é devidamente explicado à população.
Há também mudanças no que diz respeito à celebração de parcerias entre as companhias de navegação e os
diferentes agentes envolvidos nas actividades portuárias, o que nos obriga a pensar nestas questões a longo
prazo, quer no que diz respeito ao planeamento urbanístico e residencial, quer ao próprio planeamento dos
transportes nas cidades.
Intervenção de
Rosa Catejon
Professora da Facultad Geofrafia e Historia
Universidad de Barcelona, Espanha
Jim Gill
Director Geral da Liverpool Vision, Reino Unido
Outro ponto que me parece importante tem a ver com a compreensão pela forma como os portos contribuem para o aparecimento de outras iniciativas na cidade, tenham elas a ver com o turismo, que é a mais
óbvia, ou com uma panóplia de actividades para as quais o porto pode contribuir.
É preciso, portanto, criar um tipo de organização capaz de resolver estas problemáticas do domínio público,
de forma a desenvolver a ideia dos clusters dos portos, apoiando o seu desenvolvimento.
Contrariamente à opinião dos outros oradores, para mim a principal valia desta conferência foi a capacidade
de intercâmbio de ideias, vindas de todo o mundo e de pessoas com diferentes experiências no desenvolvimento das áreas portuárias. ❘❙❚
Intervenção de
Connie Bacom
Secretária da Comissão do Porto de Tacoma, EUA
Intervenção de
Claire Petrich
Presidente da Comissão do Porto de Tacoma, EUA
O valor acrescentado desta conferência foi, na minha opinião, o de ouvir uma imensa diversidade de opiniões relacionadas com os portos e as cidades. Também é interessante referir que temos muitos pontos a
partilhar em comum, independentemente de estarmos perante realidades diferentes, quer seja um porto
africano, europeu, asiático ou, no nosso caso, norte-americano. Persistem, no entanto, algumas dificuldades
que resultam do modo diferente como os portos são governados.
Estas diferenças podem ser de dois tipos: uma governação em que o porto pertence à autarquia, e outra em
que o porto está afastado desse modelo de gestão. Ambos os modelos encerram desafios e visões diferentes
na abordagem dos problemas presentes no funcionamento do porto e da cidade.
Em Tacoma, por exemplo, a solução nunca deveria ter sido afastar o porto da cidade. E isto aconteceu na
nossa história quando as actividades do porto foram retiradas das áreas costeiras junto à cidade, para uma zona
a que nós chamamos os baixios, os tideflats. Esta grande zona ribeirinha está agora acessível à população. O
desafio actual é que o porto e a autarquia têm de rentabilizar ao máximo essas áreas para que todos compreendam a necessidade do porto poder crescer e continuar a ser o motor económico da nossa região.
Vamos ter que olhar de forma diferente para algumas coisas, aproveitando as potencialidades existentes:
carreiras marítimas, áreas imobiliárias e outras, o que se calhar nos obriga a repensar as nossas prioridades
de negócio para apoiar o desenvolvimento da cidade, mantendo, embora, a função principal de fornecer
equipamentos e infra-estruturas para o transporte marítimo e aumentar as receitas do provenientes de
operações de leasing.
Concordo que quando se fecha uma porta deve abrir-se outra, procurando melhorar o desempenho das nossas tarefas, mas não perdendo nunca a noção daquilo que temos de fazer em primeiro lugar, que é aumentar
o conhecimento sobre a cidade e ajudar ao desenvolvimento do porto. Por isso mesmo, em vez de cada um
tentar defender os seus interesses individuais, vamos tentar defender os interesses comuns da população. ❘❙❚
Como contributo para a Agenda de futuras conferências do AIVP, tenho quatro ideias que gostaria de apresentar:
A primeira diz respeito às diferenças entre as estruturas gestionárias do porto. Que tipo de estrutura organizativa para o porto é mais eficaz? Porque lidamos com realidades diferentes de país para país e isso reflecte-se, naturalmente, nos modelos de gestão. No todo nacional, temos portos centrais, locais e regionais,
geridos por entidades autónomas, e outros que pertencem às autarquias. Em Tacoma somos uma entidade
completamente independente da autarquia.
A segunda ideia, diz respeito ao que vários oradores disseram na conferência sobre as novas técnicas utilizadas na construção de edifícios junto às zonas portuárias (isolamento das janelas, por exemplo, nas áreas que
estão mesmo ao lado da actividade portuária). Neste sentido, seria interessante associar a estes encontros
uma exposição de materiais, equipamentos, e tecnologias portadoras de soluções novas para o futuro.
Relações com os meios de comunicação – é importante que as cidades e os portos trabalhem em conjunto
para definir o que é mais importante para todos. Através dos meios de comunicação é possível chegar junto
das populações de modo a que compreendam a importância do trabalho que fazemos.
Uma outra área a desenvolver tem a ver com a qualidade das relações entre os portos e as cidades. Mas o
que nós sabemos é que as relações entre os portos e as cidades têm por base as relações entre pessoas. E
se algumas dessas pessoas tiverem capacidade de liderança e conseguirem atrair outros cidadãos para as sua
ideias, as cidades e os portos terão muito a ganhar, e poderão justificar-se junto das populações. ❘❙❚
CONCLUSÕES E SÍNTESE
Creio que foi evidente para todos que a mensagem essencial que saiu das conclusões deste encontro foi no
sentido de que a próxima conferência deve tentar introduzir alguns temas que são cruciais para a discussão
daquilo que é o aspecto fundamental deste debate, a relação cidade/porto no mundo contemporâneo.
De tudo quanto eu ouvi permitia-me salientar cinco pontos que me parece serem particularmente decisivos
para esse reequilíbrio do ponto de vista tanto da discussão teórica, como do ponto de vista da intervenção
em termos de planeamento e também da concretização de projectos. Cinco aspectos que no fundo de um
modo ou de outro foram referidos, senão por todos, pela maioria das pessoas que hoje fizeram aqui uma
intervenção e que eu relembrava muito rapidamente.
• A próxima conferência devia explorar melhor uma perspectiva verdadeiramente integrada da relação
porto/cidade, tanto do ponto de vista de visão estratégica, como do ponto de vista de planeamento e
do ponto de vista da concretização em projectos;
• A próxima conferência devia também explorar aquilo que foi um dos aspectos talvez mais interessantes desta conferência que é a possibilidade de comparabilidade internacional. E era importante que
surgissem estudos que eles próprios fizessem essa comparabilidade internacional. Ficou aqui claro
que a comparabilidade internacional era particularmente interessante ou urgente no que se refere
ao modo como diferentes modelos políticos e institucionais condicionam as soluções que podem ser
desenvolvidas;
• Outro elemento que pode e talvez deva ser explorado na próxima conferência é a avaliação de
resultados obtidos. Nós tivemos a apresentação de muitos projectos, precisamos agora de dar mais
um paço e esse novo passo implica termos dados concretos em termos de avaliação dos resultados
obtidos. Porque é que as coisas tiveram êxito? Porque é que falharam? Porque é que ficaram numa situação intermédia? Porque é que nem se quer se concretizaram? Precisamos desse passo estruturado
em termos de avaliação de resultados;
• Outro tema fundamental que também esteve presente, de vários modos, ao longo dos vários dias
desta conferência é a particular vulnerabilidade que resulta da exposição, dos portos e portanto da
relação porto/cidade a processos que são globais e portanto sendo globais ultrapassam muito claramente a capacidade de controlo a partir desses portos e dessas cidades. Exemplos concretos desta
vulnerabilidade, deste risco, exemplos concretos de como eles podem ser geridos, nomeadamente
de uma forma antecipada seriam bem-vindos porque permitiriam perceber melhor em que medida as
questões que têm vindo a ser aqui desenvolvidas, podem no futuro ser geridas de forma diferente;
• Finalmente um tema que eu penso que foi focado em várias comunicações mas que merecia também
uma exploração mais profunda, é a resposta a esta questão: Em que medida as novas tecnologias
permitem produzir novas paisagens urbanas no sentido deste reequilíbrio da relação porto/cidade que
falámos durante os vários dias e nomeadamente na sessão final.
Fazer uma síntese final, apresentar conclusões é sempre um exercício ingrato, não se pode ser exaustivo.
Talvez a lição mais importante a retirar desta conferência é que, como em tudo na vida, necessitamos de ter
uma visão estratégica porque só uma visão estratégica permite identificar prioridades. Esse é o papel que a
AIVP tem vindo a desenvolver nestes últimos anos desde a sua existência, esse é o papel destas conferências
e dos resultados que aí são obtidos e portanto, do meu ponto de vista como presidente desta primeira
sessão da manhã de hoje resta-me agradecer sinceramente quer à AIVP, quer à AML, nomeadamente à
presidente que está aqui presente esta oportunidade e este privilégio de, como disse no início, desenvolvermos duas actividades que são fundamentais: por um lado aumentar a nossa inteligência colectiva, isto é,
um processo de aprendizagem que ganha e que é suportado pela troca de informações e de visões, e por
outro lado conseguirmos de forma colectiva marcar ou identificar aquilo que pode ser a agenda futura desta
discussão essencial que é uma relação mais qualificada, mais inteligente entre o porto e a cidade. ❘❙❚
197
Intervenção de
João Ferrão
Investigador Principal do Instituto de Ciências Sociais,
Universidade de Lisboa, Portugal
ENCERRAMENTO OFICIAL
Damião Martins de Castro
Presidente do Conselho de Administração
do Porto de Lisboa, Portugal
Foi com grande satisfação que recebemos em Lisboa, uma cidade profundamente ligada ao seu porto, a 9ª
Conferência Internacional da AIVP, na semana que se segue ao culminar do Euro 2004, um evento que muito
nos orgulhou pelo sucesso alcançado, tanto pela sua organização como pelo acolhimento demonstrado por
todo o povo português.
Lisboa sempre foi, sem dúvida, uma cidade com condições naturais favoráveis para oferecer ao comércio
internacional um porto de mar amplo e abrigado.
Foram, aliás, as magníficas condições de navegabilidade e segurança do estuário do Tejo que favoreceram,
desde os tempos mais remotos, a presença humana na área, sendo indiscutível o papel do porto de Lisboa
no desenvolvimento e internacionalização da cidade de Lisboa, que com ele nasceu e prosperou.
Ao porto de Lisboa coube, também, um papel essencial na constituição e defesa da nacionalidade, assim
como nos Descobrimentos, tornando possível o pioneirismo de Portugal na descoberta e revelação de
mundos e rotas de navegação até então completamente desconhecidas.
Aliás, é interessante recordar que foi aqui, em Belém, que, no século XV, estes importantes feitos foram
antecedidos de grandes discussões em torno do arrojo dessa iniciativa, em que os mais visionários foram
duramente criticados por aqueles que tão bem foram apelidados pelo famoso poeta português, Luís Vaz de
Camões, na sua magnífica obra “Os Lusíadas”, de “Os Velhos do Restelo”.
Foi neste palco que assistimos, nos últimos dias, a esta importante conferência que proporcionou o
debate sobre questões tão importantes como a competitividade portuária, a modernidade urbana, os
desafios da valorização do património portuário, o regresso ao rio das cidades portuárias, entre muitas
outras.
Na realidade, este evento ofereceu a todos os participantes momentos únicos de reflexão sobre questões
relacionadas com o binómio cidade/porto e com a evolução que este tem vindo a sofrer, em particular, nos
últimos anos.
As intervenções que têm vindo a ser efectuadas nas frentes ribeirinhas de Lisboa espelham, de forma exemplar, a procura de equilíbrio e harmonia entre o desenvolvimento económico e a qualidade de vida das
populações.
Com condições físicas e tipos de ocupação muito diferenciados ao longo das margens dos onze municípios
da sua área de jurisdição, a revitalização das frentes ribeirinhas do porto de Lisboa constitui um caso de
estudo de relevo.
A par da modernização das zonas operacionais portuárias, com consequente melhoria da qualidade do
serviço prestado, temos vindo a investir na requalificação das restantes frentes de água para actividades lúdico-culturais em zonas multifuncionais onde se têm de compatibilizar os interesses dos concessionários de
ambos os tipos de actividade, tanto operacionais portuários como de lazer, trabalhando, para isso, sempre
em estreita colaboração com as autarquias ribeirinhas.
De facto, são diversas as parcerias que a Administração do Porto de Lisboa tem vindo a estabelecer com as
diferentes autarquias ribeirinhas do estuário do Tejo com vista a uma melhor coordenação de esforços em
matéria de ordenamento e protecção das frentes de água na sua área de jurisdição.
Essa cooperação é essencial para que a actividade do porto de Lisboa se assuma, cada vez mais, como um
elemento determinante para a competitividade da região de Lisboa e Vale do Tejo, a mais rica do país e a
principal no que se refere ao consumo nacional.
Na realidade, o porto de Lisboa constitui um importante factor na base sócio-económica da região
de Lisboa e Vale do Tejo e até mesmo do país, quer através da criação, directa ou indirecta, de portos de trabalho, quer de um grande volume de negócios, uma vez que gera anualmente mais de 4,5
milhões de euros de valor bruto de produção, o que corresponde a 5% do Produto Interno Bruto
(PIB) nacional.
Por tudo o que fica dito, consideramos ser cada vez mais importante a estreita colaboração entre a autoridade portuária e as restantes entidades intervenientes no sector para que, em conjunto, se valorize o porto
de Lisboa tornando-o num porto mais moderno e com maior qualidade, preservando, ao mesmo tempo, a
sua melhor integração nos tecidos urbanos.
Estamos conscientes de que só promovendo esta cooperação positiva entre o porto e a cidade se conseguirá estabelecer um equilíbrio em que a função portuária seja cabalmente cumprida e, ao mesmo tempo,
as populações beneficiem da paisagem do maior e um dos mais belos estuários da Europa – o Estuário
do Tejo. ❘❙❚
ENCERRAMENTO OFICIAL
Nesta zona privilegiada em que nos encontramos e com a luminosidade que emana o Tejo, aqui ao lado, énos certamente mais fácil entender, depois dos debates que esta Conferência permitiu, os enormes desafios
e potencialidades das cidades portuárias em pleno século XXI.
Sendo certo que a primeira preocupação de todo o autarca é contribuir para que os seus munícipes usufruam
de uma qualidade de vida cada vez mais consentânea com a modernidade;
Sendo certo que os problemas que as urbes hoje enfrentam estão directamente relacionados com essa mesma modernidade e com o almejado bem-estar dos cidadãos; é igualmente verdade que as cidades portuárias
transportam em si mesmas questões problemáticas mas, em paralelo, propostas de soluções mais dinâmicas
e, quiçá, mais exequíveis.
Mercê das suas próprias características as “Cidades / Porto” permitiram desde sempre um saudável
e profícuo leque de oportunidades, desde o contacto com outros mundos, gentes e mentalidades
diversas, até a novas formas de negociar ou às próprias inovações de cariz científico e tecnológico.
Esse foi, sem dúvida, o melhor contributo, gerador desde sempre, de enormes avanços para as
populações.
Nos nossos dias, com a globalização, esta questão é mais pacífica, mas continua, de forma discreta, a
verificar-se.
Hoje, verifica-se uma tendência para preservar o património histórico que conferiu a estas cidades o seu
cunho indiscutível.
Em simultâneo, pretendemos apetrechá-las do ponto de vista de design arquitectónico e de equipamentos
que lhes permita manter as suas características, que as definiram no passado, e prepará-las para enfrentar os
novos desafios de uma forma moderna, futurista.
Sabe-se que a reabilitação das zonas portuárias, principalmente daquelas que no passado viveram séculos
de intensa actividade e que mercê das condições físicas ou económicas, têm hoje um papel mais discreto,
sabe-se, dizia eu, que tem custos elevadíssimos.
Tratando-se de uma reabilitação ao nível da arqueologia industrial, sabemos que se trata de um ónus
suplementar para as autarquias mas todos reconhecemos igualmente quão importante é para as populações que habitam as “Cidades / Porto”, a dignificação dessas áreas portuárias. A recuperação ao nível
da arqueologia industrial é, pelas próprias características dos materiais e equipamentos, extremamente
onerosa.
O caso mais gritante e coroado de êxito, foi bem recentemente a zona portuária de Lisboa recuperada e
valorizada para a realização da Expo 98.
Mercê de um enorme esforço financeiro, a conjuntura favorável permitiu realizar um trabalho, direi exemplar, que restituiu à cidade um espaço que, para além de reabilitar uma zona degradada, devolveu aos
lisboetas o orgulho pela sua história marítima e pelo “vai-vem” de gentes e embarcações, a que sempre se
habituaram.
Não é fácil para os autarcas e técnicos, conscientes destas questões, realizar esta tarefa que passa sobretudo
pela satisfação do orgulho regional ou nacional, mas que configura uma tarefa de engenharia financeira, de
cosmética, de equipamentos, de acessos e até de roturas.
É uma tarefa árdua, financeiramente elevada e de um trabalho interdisciplinar que nunca poderá perder de
vista dois aspectos: a memória histórica do espaço, a sua dignificação e adaptação técnica e tecnológica face
às exigências presentes e futuras.
Toda e qualquer intervenção nas “Cidades-Porto” poderá e deverá contemplar variadíssimos itens que foram
referidos ao longo destes dias e que à laia de conclusão, gostaria de focar:
- Em primeiro lugar a satisfação do orgulho das populações que nela habitam;
- A dignidade, seja através de projectos urbanísticos que respeitem o espírito do lugar, seja a própria recuperação portuária;
- O elevado interesse turístico que estas zonas podem e devem representar, através da sua recuperação
e adaptação a novas funcionalidades, ou pela dotação de infra-estruturas que possam tornar estes locais
apetecíveis;
- A modernização das zonas portuárias, surgindo as marinas como instrumento de valorização dos portos.
Esta opção pode ser uma excelente via, desde que salvaguardadas as legítimas reticências, mas que tem
vindo a permitir um dinamismo ímpar em zonas que se apresentavam abandonadas e que geravam bolsas
de marginalidade;
201
Fernando Seara
Vice-Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa,
Portugal
Exmo. Senhor Secretário de Estado da Administração
Local; Exmo. Senhor Presidente da AIVP; Exma.
Senhora Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa;
Exmo. Senhor Presidente da Administração do Porto
de Lisboa; Minhas Senhoras e Meus Senhores.
- As questões de segurança máxima a que estas zonas obrigam observando-se a legislação específica,
nacional e internacional bem como todos os requisitos comunitários e/ou outros a que nos devemos
adaptar.
É certo que Sintra é o “Glorioso Éden” de que falava Lord Byron e que desde há séculos tem atraído
poetas e artistas. Mas é igualmente certo que foi o desafogo económico, a partir da época de “Quinhentos”, que permitiu a fixação no Concelho de Sintra de famílias nobres ou nobilitadas em função
dos Descobrimentos.
A Quinta da Penha Verde, do Vice-Rei da Índia, D. João de Castro, a Quinta dos Riba Frias, hoje propriedade da Câmara Municipal de Sintra, a construção da ala manuelina do Palácio Nacional da Vila, mandada
executar por esse Rei venturoso, D. Manuel I, em pleno auge do percurso marítimo, são apenas os
exemplos mais emblemáticos, num convite expresso a visitar Sintra, Paisagem Cultural classificada pela
UNESCO.
Bem aqui ao lado, usufruímos da Torre de Belém e do Mosteiro dos Jerónimos, classificados igualmente pela
UNESCO, e que são reflexo da influência marítima na Arte e no quadro mental dos portugueses.
Igualmente, em Setúbal e em Sines podemos usufruir desse reflexo ímpar dos Descobrimentos no desenvolvimento de novas mentalidades.
Permitamos nós, enquanto autarcas do futuro, ao mesmo tempo conciliadores do passado e visionários do
nosso tempo, que as nossas cidades e municípios progridam harmoniosamente para conforto económico e
estético dos que neles habitam.
Permitam-me que termine citando um grande poeta português, Alexandre O’Neill. Num pequeno trecho ele dizia-nos (…) O infinito, o infinito, deixa o infinito que entre, faz bem ao infinito estar entre a gente
(…).
Sentimo-nos bem como munícipes da Área Metropolitana de Lisboa tê-los tido aqui em Lisboa, em Sintra,
em Vila Franca de Xira, em qualquer bocadinho deste nosso espaço.
A todos o meu muito obrigado. ❘❙❚
Giuliano Gallanti
Presidente da Association Internationale
“Villes et Ports”, França
Sr. Secretário de Estado; Sr.ª Presidente da Junta
Metropolitana de Lisboa; Sr. Presidente do Porto de
Lisboa; Sr. Presidente da Câmara Municipal de Sintra.
Chegámos ao fim de quatro dias tão participados e interessantes e de um debate muito importante sobre o
tema que elegemos para esta conferência.
Antes de mais quero agradecer à cidade de Lisboa, a Sintra, ao Porto de Lisboa, à Área Metropolitana de
Lisboa (AML) por tudo aquilo que nos proporcionaram. Participei em muitos painéis e de facto foi fantástico
o acolhimento dispensado.
Agradeço particularmente à Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa, Maria da Luz Rosinha, também
Presidente do nosso Conselho de Administração.
Num destes jantares, falando da qualidade do evento, comentámos que vai ser difícil superar o nível da
organização da conferência de Lisboa, mas seguramente que Sidney vai tentar fazê-lo, a bem do sucesso da
nossa organização.
Para os membros do Conselho de Administração de Cidades e Portos e para a Comissão Científica, nomeadamente a parte portuguesa, que participaram na organização e na definição dos temas a debater, com ideias
muito interessantes, vai também o meu agradecimento.
Agradeço ainda a Olivier Lemaire e à sua equipa, um património da AIVP (Association Internacionale Villes et
Ports) que é uma das razões de força desta organização.
Vou dar-vos alguns números que demonstram o êxito da nossa conferência. Mais de 600 participantes
estiveram presentes na sessão de abertura, representando cerca de 140 cidades portuárias de mais de
52 países.
Uma socióloga americana que tinha participado no nosso encontro de Marselha definiu as cidades portuárias
como Work Cities. Todos percebemos o que isso quer dizer, somos de facto uma rede global de cidades
portuárias. Não existe uma rede de cidades agrícolas, industriais, etc., mas existe uma rede de cidades portuárias e esta conferência, neste sentido, apresentou um resultado particularmente significativo. Creio que cada
um de nós teve a possibilidade de trocar experiências com representantes de cidades portuárias de todo o
mundo e este é o ponto de partida para a agenda de futuros encontros.
ENCERRAMENTO OFICIAL
203
Quero agradecer sinceramente a todos os membros da nossa Associação aqui presentes, e em particular
aos convidados, porque através deles podemos desenvolver novas ideias e prepararmo-nos para enfrentar
o grande desafio do futuro.
Temos que resolver problemas muito graves que dizem respeito à vida portuária, como a protecção, a
segurança, etc.
Conhecemos bem os processos de globalização, sabemos da concorrência do meio e isso leva-nos precisamente a conjugar interesses. Esta conferência não se resume ao intercâmbio de ideias, serve fundamentalmente para encontrarmos plataformas de cooperação.
Esta conferência teve, por isso, um enorme significado. Trata-se agora de continuar a trabalhar em conjunto, com menos apresentações “bonitinhas”, passo a expressão, mas a falar mais dos problemas, sabendose que a modernidade e a identidade não são uma inovação, não são slogans, representam a realidade
histórica da cidade portuária que quer ser modernizada. Cada uma das nossas cidades portuárias tem a
sua história, mas essa identidade tem de se tornar contemporânea, moderna e é este o nosso desafio. Em
conjunto podemos construir um projecto, uma ideia para o futuro da vida portuária, avaliando melhor os
desafios que se projectam à nossa frente. Se não formos nós a fazê-lo alguém o fará por nós.
Eu dizia no primeiro dia, na minha breve introdução, que tinha algumas dúvidas quanto ao futuro, nomeadamente no que diz respeito à possível perda da identidade portuária, que de resto já aconteceu em
algumas cidades.
Os navios da actualidade são bem diferentes dos navios de antigamente. O problema da segurança já existe
há 50 anos, mas é completamente diferente nos dias de hoje. O mundo em que vivemos é outro e na cultura da nossa vida portuária é necessário incluir estes parâmetros e saber enfrentar o desafio. Temos, por isso,
que continuar a debater estes temas, assumidos como agenda prioritária do nosso futuro.
Muito obrigado pela vossa presença. ❘❙❚
Quando em 2002, na cidade de Paris, aprovaram a candidatura da Área Metropolitana de Lisboa à realização da 9ª Conferência Internacional da AIVP, tinha plena consciência das responsabilidades que estávamos a
assumir, mas também a certeza de que iríamos honrar o compromisso.
Os testemunhos que fui recebendo ao longo destes dias, veio confirmar a oportunidade da nossa candidatura e a capacidade organizativa para levar a “bom porto” um evento com esta dimensão.
É uma constante no mundo de hoje, à escala planetária, ver países e cidades afirmarem-se pela disputa da
organização de eventos de nível mundial, na procura dos limites das suas capacidades, promovendo a visibilidade externa, os seus símbolos, usos e costumes, e os valores identitários de referência.
Também o fizemos, na certeza de que a cidade de Lisboa saberia acolher como ninguém tão ilustres
convidados, dando resposta à sua tradição hospitaleira, uma experiência que espero seja inesquecível
para todos vós.
Nos últimos dez anos, um pequeno país como Portugal, e, particularmente, a Área Metropolitana de Lisboa,
acolheu eventos da maior relevância internacional, como a escolha de Lisboa- Capital Europeia da Cultura; a
Expo 98, na zona oriental da cidade; o festival de música Rock in Rio e, mais recentemente, o Campeonato
Europeu de Futebol de 2004.
Muitos se surpreenderam com tamanho arrojo e capacidade empreendedora, mas na actualidade e cada
vez mais, há razões de forte interesse nacional e de auto-estima, que justificam o esforço desenvolvido na
organização destas iniciativas, que é já parte integrante das estratégias de promoção dos países e das cidades,
correspondendo a expectativas criadas na economia, na restauração, na hotelaria e no turismo, em geral.
Dito isto, é já com saudade – esse sentimento tão português – que me despeço dos meus queridos amigos,
permitam-me que os trate assim, desejando-lhes um óptimo regresso a casa, na certeza de que contarão
sempre connosco, nesta grande família que é a Associação Internacional Cidades e Portos.
Boa viagem e voltem depressa! ❘❙❚
Maria da Luz Rosinha
Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa, Portugal
Paulo Pereira Coelho
Secretário de Estado da Administração Local
Ministério das Cidades, Ordenamento do Território
e Ambiente, Portugal
Senhora Presidente da Junta Metropolitana de Lisboa;
Senhor Presidente da AIVP; Senhor Presidente da
Câmara Municipal de Sintra; Senhores Presidentes de
Câmara da Área Metropolitana; Senhor Presidente
do Porto de Lisboa; Senhores Participantes; Senhores
Convidados, Minhas Senhoras e Meus Senhores
Cumpre-me estar aqui hoje a representar o Governo, agradecendo o convite que nos foi dirigido, que
naturalmente muito nos honra. Começo por felicitar os organizadores desta iniciativa, sendo certo que a
temática é, obviamente, da maior importância em termos mundiais e para Portugal tendo em conta a sua
situação geográfica e a sua tradição.
Diria que atravessamos, como todos sabem, um tempo de alterações económicas, de alterações culturais
e neste ritmo impressionante de alterações, se determinado tipo de actividades que de alguma forma estão
ainda em plena mutação acabam, muitas vezes, por encontrar algum tipo de dificuldades para se integrarem
noutros espaços, noutras solicitações que as cidades e os países mais desenvolvidos procuram, através desse
novo estímulo ao desenvolvimento que de alguma forma possa encontrar resposta em áreas tão diversas
como por exemplo na questão dos portos.
É evidente que esse desenvolvimento económico impõe novas respostas para áreas tão sensíveis como a
integração dos portos no desenvolvimento das cidades.
Importa também que não se esqueça a vertente económica e a importância que os portos devem continuar
a ter para as regiões onde se inserem e para os Estados de acolhimento e por isso é bom que haja uma
plena integração das políticas, quer na vertente económica, quer na vertente urbanística que muito preocupa
as cidades e os seus legítimos representantes que necessitam de ter uma intervenção cada vez maior na
determinação daquilo que é a reabilitação e a recuperação das áreas portuárias e a sua plena integração nas
dinâmicas que cada cidade e os seus legítimos representantes entendem que deve ser prosseguida.
No nosso caso temos agora uma nova realidade que são as novas áreas metropolitanas, com competências
reforçadas, que envolvem as áreas portuárias, exactamente pela importância económica e social que têm,
não se esgotam no espaço meramente territorial em que se encontra implantado o porto. É por isso que no
âmbito das comunidades urbanas emergentes vamos encontrar novas competências que esperemos sejam
aprofundadas, e tenham reflexos neste sector, de modo a que a administração portuária e a administração
central entendam bem as vantagens do diálogo entre os vários níveis de poder, no interesse, não só das
actividades económicas, mas também no interesse das pessoas em dispor de melhores serviços.
Houve um tempo em que talvez não tenhamos sabido perspectivar a evolução da actividade económica estritamente relacionada com os portos, e por isso não tenhamos sabido antecipar a evolução tecnológica e os
sinais da economia. Daí que os problemas que hoje se colocam de reabilitação urbana e de reaproveitamento destes espaços sejam mais difíceis de resolver. Por isso, importa que tenhamos a humildade de aprender
com os erros do passado e que aqueles que estudam a fundo este tipo de questões possam contribuir para
antecipar outros problemas e encontrar soluções para esses problemas, para que não voltemos a cair em
impasses, em atrasos estruturais que dificultam cada vez mais as soluções que pretendemos encontrar.
É nesse aspecto que eu entendo que esta conferência e o vosso contributo é fundamental para que se
compreenda esta problemática em termos de futuro e se antecipem as soluções que se impõem para um
melhor ordenamento territorial.
Termino com um agradecimento à vossa participação, ao empenho técnico e científico nesta causa e também a todos aqueles que aqui transmitem as componentes política e social que são determinantes para um
bom entendimento e uma melhor rentabilização. A todos os participantes, nomeadamente aqueles que nos
deram o prazer de virem até Portugal queria deixar uma mensagem de simpatia e dizer que Portugal, um
país acolhedor que tem provado ser capaz de receber bem e organizar melhor, os acolhe com simpatia e
faremos tudo para que possam voltar sempre e ser recebidos com o mesmo agrado e fazendo votos para
que com o vosso saber aprendamos a colher os frutos desses ensinamentos, melhorando as nossas infraestruturas.
Muito obrigado a todos! ❘❙❚
ENCERRAMENTO OFICIAL
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Área Metropolitana de Lisboa
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Secretariado de redacção
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Director Criativo
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