O ENSINO DE CIÊNCIAS NA EDUCAÇÃO DO CAMPO: UMA PESQUISA EM DISSERTAÇÕES E TESES Kely Cristina Enisweler1 Claudia Regina Machado Kliemann2 Dulce Maria Strieder3 Resumo:O presente artigo apresenta a análise de dados obtidos por meio de um mapeamento de pesquisas sobre o Ensino de Ciências na modalidade de Educação do Campo, divulgadas em dissertações e teses entre 2011 e 2012. Os dados foram coletados por meio do sistema de busca do Banco de Teses da CAPES. As reflexões são pautadas em dados levantados por meio de pesquisa qualitativa, do tipo meta-estudo. Foram analisadas 90 dissertações e 21 teses, sendo que a busca realizada utilizou como recurso palavras-chave, relacionadas ao tópico de investigação, e o recorte ocorreu por área de conhecimento e programas vinculados a Educação. É importante ressaltar que trabalhos sobre o Ensino de Ciências especificamente na Educação do Campo, ainda são incipientes e por isso merecem um olhar mais atento da comunidade acadêmica sobre a temática, inclui-se aqui o incentivo a pesquisas na área. Palavras-chave: Ensino de Ciências; Educação do Campo; Análise de publicações. Introdução A Educação do Campo é uma modalidade de ensino em construção e reconstrução e pode ser caracterizada pela existência de políticas públicas conquistadas pelos movimentos da população do campo principalmente, para terem seus direitos garantidos, entre eles o direito a educação de qualidade no lugar onde vivem e trabalham. Entretanto, essas políticas públicas nem sempre são efetivadas. O Ensino de Ciências na Educação do Campo é uma temática recente e, pouco se sabe sobre o que se tem produzido sobre o assunto nas últimas décadas. Diante dessa lacuna, realizamos um estudo exploratório, que nos possibilitou identificar publicações sobre o tema nos Programas de Pós-Graduação, em nível de Mestrado e Doutorado. 1 Aluna do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE. E-mail: [email protected] 2 Aluna do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE. E-mail: [email protected] 3 Docente do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná/UNIOESTE. E-mail: [email protected] 764 O estudo realizado nesse artigo está pautado no mapeamento de 111 publicações, sendo 90 dissertações e 21 teses buscadas pela temática o Ensino de Ciências na Educação do Campo. Para o desenvolvimento desse trabalho, primeiramente fizemos um breve histórico da Educação do Campo, salientando desde a sua origem nas escolas rurais até a elaboração das políticas públicas específicas. Posteriormente, a partir da leitura dos resumos das dissertações e teses, estabelecemos categorias com o intuito de responder a seguinte questão: Quais são os temas de investigação nas dissertações e teses produzidas sobre o Ensino de Ciências especificamente na modalidade Educação do Campo? A análise dos dados e os resultados almejam um fortalecimento dessas reflexões nos Programas de Pós-Graduação. Breve histórico da origem da Educação do Campo A origem da Educação do Campo está atrelada a Educação Rural, que no Brasil emerge da necessidade de distintos grupos sociais em acessar a educação. “As “escolinhas” criadas no meio rural, geralmente multisseriadas e isoladas, eram poucas e questionadas pelas forças hegemônicas da sociedade quanto a sua eficácia no ensino” (ANTONIO; LUCINI; 2007, p. 179). Em sua maioria, eram escolas vinculadas a ações assistenciais originadas pela própria comunidade. No âmbito público, um olhar diferenciado sobre a formação escolar oferecida no meio rural teve início somente com o processo de urbanização no país. A concepção pedagógica que orienta a Educação do Campo remete, portanto, ao início do século XIX quando o poder público passou ao provimento de escolas no meio rural. Para Calazans (1993), a educação rural é vista de maneira romantizada, pois, entende-se como uma vocação agrária onde o homem retira da terra a sua felicidade. O entendimento da concepção de educação rural parece estar sedimentado, com a concepção de aprender a escrever, a ler e contar, sendo que as técnicas agrícolas aproximaram o homem do campo. É válido lembrar que transformações importantes ocorreram pouco antes da Proclamação da República quando operários passaram a solicitar a criação de bibliotecas populares e escolas operárias, com o objetivo de refletir sobre o que e o como ensinar crianças e adultos a partir “[...] da educação como atividade inserida nas lutas” (ANTONIO; LUCINI, 2007, p. 150). Esse movimento formado da ação dos operários ficou conhecido como Educação Popular no Brasil e remete a uma prática que norteia os movimentos sociais pela educação, em diferentes períodos da história da educação brasileira (PALUDO, 2001). 765 Entre os movimentos ligados a concepção de Educação popular é possível mencionar entre 1950 e 1960, os Movimentos de Cultura Popular (MCP), do qual fazia parte Paulo Freire, o Movimento de Educação de Base (MEB), criado pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), e os Centros Populares de Cultura (CPC), criados pela União Nacional dos Estudantes (UNE). Em 1960, a partir de Paulo Freire, as classes populares passam a ter uma pedagogia que contempla esses grupos sociais. Em 1980, o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) passa a ter mais força, tendo como seu principal foco a educação, resultando em políticas públicas para a Educação do Campo como modalidade de ensino. O MST estabelece uma estreita relação com a educação popular e o pensamento de Paulo Freire. Essas linhas teóricas “[...] nascem colados à terra e foram cultivados em contato estreito com os camponeses, com suas redes de socialização, de reinvenção da vida e da cultura” (ARROYO, 2000, p. 14). Diante das ações desumanizadoras vividas pelos camponeses, a Educação Libertadora sugerida por Paulo Freire torna-se um meio de libertação e organização do movimento (ANTONIO; LUCINI, 2007). A nomenclatura Educação Rural foi reformulada e surge a denominação Educação do Campo, que passa a ser compreendida a partir de uma concepção de produção da vida em diferentes esferas, sendo estas culturais, econômicas, políticas e sociais. Também as diferenças entre os povos passam a ser salientadas e os direitos afirmados: [...] quando discutimos a Educação do Campo estamos tratando da educação que se volta ao conjunto dos trabalhadores e das trabalhadoras do campo, sejam os camponeses, incluindo os quilombolas, sejam as nações indígenas, sejam os diversos tipos de assalariados vinculados à vida e ao trabalho no meio rural (ARROYO, 2000, p. 14). É na Pedagogia Libertadora que os sujeitos do campo encontram subsídios para discutir os aspectos didáticos e organizadores do currículo da escola. “A educação popular é, portanto, uma prática política, constituindo-se num tencionamento, para que a realidade se transforme a partir de propostas populares em educação” (ANTONIO; LUCINI, 2007, p. 184).A educação dos trabalhadores urbanos e do campo se configura por estar colocada em contextos diferentes da formação social, em contradição a necessidade econômica e social. (PAIVA, 1987). 766 Alguns encaminhamentos foram legitimados, inicialmente, como artigo 28 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), nº 9394/96, que garante a Educação Básica para a população rural, sendo que os conteúdos curriculares e metodológicos devem ser apropriados a realidade dos alunos da zona rural, entre outras conquistas (BRASIL, 1996). Posteriormente, em 2001, foram aprovadas as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo, as quais destacam que o campo “[...] mais do que um perímetro nãourbano, é um campo de possibilidades que dinamizam a ligação dos seres humanos com a própria produção das condições da existência social e com as realizações de sociedade humana” (BRASIL, 2001, p. 1). Além disso, o Parecer 3/2008 do Conselho Nacional de Educação que define orientações para atender a Educação do Campo e aperfeiçoar o conceito de Educação do Campo acrescentou políticas públicas à Educação do Campo (BRASIL, 2008). No âmbito do Estado do Paraná, foi criada a Coordenação da Educação do Campo, departamento específico para atendimento ao setor, na Secretaria de Estado da Educação (SEED), em 2002. Mas, somente em 2006, dez após a publicação da atual LDB, foram publicadas as Diretrizes Curriculares da Educação do Campo (PARANÁ, 2006). Assim, a Educação do Campo se configura no cenário da educação brasileira como um processo em constante transformação, de forma a considerar as particularidades presentes no campo e, consequentemente, esta deve permear o processo de ensino e aprendizagem dos sujeitos do campo. Na Educação do Campo o Ensino de Ciências tem suas especificidades em relação a outras modalidades de ensino. É importante que “[...] os futuros educadores do campo aprendam a ensinar ciências da vida e da natureza baseando-se em contextos de vivência e de significados para os estudantes das comunidades em que vivem e educam (LIMA et al. no prelo). Fato é que, não apenas no campo, mas também na cidade, o ensino contextualizado é uma premissa na prática educativa. Entretanto, a cultura e a própria relação que estes sujeitos estabelecem com a terra, requer que estes significados e significantes sejam incorporados no planejamento de aulas. Assim, neste trabalho, nosso objetivo principal é identificar se no campo da pesquisa estão ocorrendo estudos sobre o Ensino de Ciências, disciplina básica do ensino fundamental, especificamente na Educação do Campo e tentar identificar nessas pesquisas quais as temáticas que se encaixam nesse tema. 767 Metodologia A presente investigação tem por objetivo identificar o que revelamos resumos das teses e dissertações publicadas nos anos de 2011 e 2012, sobre o Ensino de Ciências na Educação do Campo. O recorte temporal é justificado por estar disponível no portal da Capes somente os trabalhos destes anos, pois o site encontra-se em atualização de dados. O mapeamento realizado no Banco de Teses da Capes, utilizou como instrumento de coleta de dados o recurso de “busca avançada” disponibilizado no provedor de serviços. Nos itens intitulados “todos os campos” foi selecionada a opção de busca “é exato”. E para o recorte temático recorreu-se as seguintes palavras-chave: “Ensino de Ciências” e “Educação do Campo”, especificando a opção “todas as palavras” para efetivar a busca. A base de dados apresentou como resultado 163 publicações produzidas no Brasil. Como o arquivo permite a delimitação por “Área do Conhecimento”, selecionamos a opção: “Educação”, e o “Programa”, também na área “Educação” restringindo a pesquisa ao nosso campo de atuação profissional, o resultado obtido foi de 111 publicações, sendo 90 dissertações e 21 teses. Após a realização do mapeamento dos resumos, passamos para a etapa da codificação, sendo que as teses foram nomeadas de “T” seguidas pela sequência numérica e as dissertações de “D”. Para a ordem da sequência numérica consideramos o sobrenome dos autores por ordem alfabética. O quadro abaixo exemplifica essa codificação. Quadro 1: Exemplo de codificação D.1 AFONSO, A. M. A educação de jovens e adultos nas escolas públicas municipais do meio rodoviário de Manaus.2012. s/p. Dissertação (Mestrado). Faculdade de Educação da Universidade Federal do Amazonas. 2012 D.2 ALTO, R. L. M. Saberes e fazeres quilombolas: diálogos com a educação do campo. 2012. 136f. Dissertação (Mestrado em Educação). Universidade de Uberada, 2012. T.1 ALBUQUERQUE, J. de O. "Crítica à produção do conhecimento sobre a educação do campo no Brasil: teses e antíteses sobre a educação dos trabalhadores no campo no início do século XXI". 2011. s/p. Tese (Doutorado). Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação. Campinas/SP, 2011. T.2 BARBOSA, A. I. C.A organização do trabalho pedagógico na licenciatura em educação do campo/UnB: do projeto às emergências e tramas do caminhar. 2012. 351f. Tese (Doutorado). Faculdade de Educação. Universidade de Brasília. 2012. Fonte: Pesquisa Própria Após a codificação, procedeu-se a leitura dos resumos e os temas foram categorizados com o intuito de responder a seguinte questão: Quais são os temas de investigação nas teses e 768 dissertações produzidas sobre o Ensino de Ciências especificamente na modalidade Educação do Campo? Foram elaboradas 9 categorias, sendo elas: Metodologias ou práticas de ensino, Formação inicial, Formação continuada, Recursos didáticos, Pesquisas em documentos e leis, Meta-estudo, Análise conceitual, Efetivação da Educação do Campo e Outras temáticas, conforme apresentado no quadro a seguir: Quadro 2: Do Ensino de Ciências e na Educação do Campo Categorias Códigos Metodologias D.6; D.16; D.18; D.19; D.26; D.27; ou práticas D.34, D.32; D.35; D.38; D.39; D.42; de ensino D.46; D.47; D.51; D.53; D.57; D.62; D.63; D.70; D.73; D.78; D.83; D.84; D.85; D.87; D.89; D.90; T.2; T.4; T.5; T.11; T.14; T.17; T.19. Formação D.12; D.13; D.15; D.43; D.44; D.50; inicial D.564; D.71; D.72; D.79; D.81; D.86; D.88; T.6; T.10; T.12; T.16; T.18; T.20; T.21. Formação D.49; D.58; D.67. continuada Recursos D.33; D.82. didáticos Pesquisas em D.28; D.29; D.36; D.40; D.41; D.45; documentos D.48; D.52; D.59; D.61; D.64; D.65; e leis D74; D.75; D.77; D.80; T.8. Meta-estudo D.54; D.66, D.69; D.76; T.1. Discussões Empreendidas Análises sobre metodologias e práticas educativas desenvolvidas e sobre a Pedagogia da Alternância na Educação do Campo. Investigações sobre a formação pedagógica dos professores, os desafios na sua formação para a educação básica nas escolas do campo e a identidade docente. Formação continuada de adultos do campo e de professores em serviço. Atividades práticas e litúrgicas, e elaboração de materiais pedagógicos. Investigações em documentos e leis referentes á Educação do Campo. Análises sobre a proposta educacional das escolas e perspectivas dos docentes em torno do currículo. Análise D.11; D.23; D.24; T.3; T.7; T.9. Análises sobre as políticas públicas e os conceitual conceitos da Educação do Campo, e o MST na luta pelo direito à escola. Efetivação da D.1; D.2; D.4; D.8; D.17; D.20; D.22; Investigações sobre a efetivação das Educação do D.30. políticas públicas da Educação do Campo e Campo o processo de nucleação das escolas rurais. Outras D.3, D.5, D. 7, D. 9, D.10, D.14, Investigações sobre temáticas distintas da temáticas5 D.25, D.31; D.37; D.55; D.60; D.68; temática em estudo. T.13 e T.15 Fonte: Pesquisa Própria Análise de Dados 4 A busca do Portal da Capes possibilitou o mapeamento do Ensino de Ciências e da Educação do Campo, entretanto, a temática foi explorada distintamente nas dissertações e teses, sendo que somente em D.56 a formação de professores para docência do ensino de Ciências na Educação do Campo foram efetivamente problematizadas em conjunto. 5 Das categorias analisadas 10 delas não se encaixaram na temática, sendo 8 dissertações e 2 teses 769 A primeira categoria inclui os trabalhos que investigaram as „metodologias ou práticas de ensino‟ utilizadas na Educação do Campo, as concepções e práticas dos professores das escolas do campo, em classes multisseriadas, em assentamentos e na Educação de Jovens e Adultos (EJA). Como por exemplo, a utilização de proposta temática como alternativa no desenvolvimento de um conteúdo na tentativa de aproximá-lo da realidade dos educandos, além de apresentar alguns desafios enfrentados na utilização de práticas de ensino. Além disso, esta categoria compreende análises sobre a Pedagogia da Alternância, os seus limites e as suas contradições como modelo para a educação no meio rural e reflexões sobre a utilização de metodologia formal e urbana na escola do campo. Essas pesquisas apontaram para necessidade de momentos de reflexão e de análise sobre o fazer pedagógico e que as práticas educativas e, principalmente, as concepções dos professores devem estar relacionadas com o currículo pensando condições para a efetivação de propostas para Educação do Campo. Foi observado, ainda, que a Educação do Campo enfrenta muitas dificuldades de financiamento e estrutura e, na maioria das vezes, o sistema de escola multisseriada é tratado como sendo uma organização que prejudica a metodologia do professor e aprendizagem dos alunos. Na segunda categoria estão listadas as publicações que abordam a „formação inicial‟ de professores, analisando e, em alguns resumos, problematizando (os limites, as dificuldades, as possibilidades e as contradições) sobre o conhecimento proporcionado no processo formativo do curso. Aos professores também foi possibilitada a constituição da identidade docente para atuar na educação básica em escola do campo, de maneira que o campo seja pensado como espaço de vida e seus educandos como sujeitos do campo. Os resultados obtidos nestas pesquisas indicam que a formação do educador do campo deve estar aliada aos princípios da Educação do Campo, contribuindo na construção de uma identidade docente. Apesar da importância da graduação, os cursos apresentam dificuldades e limites de ordem pedagógica e estrutural que compromete, em parte, a qualidade da educação. Porém, sua implementação representa a possibilidade de reconhecimento dos sujeitos do campo. Apesar disso, segundo os autores dos trabalhos analisados ainda existe um vasto caminho a ser percorrido para atingir uma educação autônoma e que cumpra com os pressupostos da Educação do Campo. De acordo com Foerste (2013, p. 16) a fragilidade de “[...] políticas públicas em relação à carreira dos profissionais do ensino é considerada uma questão problemática, que 770 dificulta o trabalho docente na Educação do Campo”, sendo que a ausência dessa preocupação com a formação do professor é um dos motivos da desvalorização da educação. Na terceira categoria intitulada „formação continuada‟ identificamos pesquisas que estão relacionados às práticas na perspectiva dos movimentos sociais no curso de Pedagogia, além de formar educadores do campo da Educação Infantil como agentes de saúde com compreensão de primeiros socorros. De modo geral, as pesquisas apresentam a formação continuada como uma concepção, que está em descompasso com a formação esperada pelos educadores do campo, e a necessidade de políticas públicas voltadas para formação de educadores do campo. Segundo Gatti e Barreto (2009) a formação continuada deve vir para acrescentar ao educador e não algo compensatório. Nesse caso, a reflexão sobre as concepções de ensino e de aprendizagem, entre os professores, “[...] acabam ficando para um segundo plano e seu aprimoramento profissional, via cursos aperfeiçoamento e pósgraduação, nem sempre estão entre as suas prioridades” (MALACARNE, 2007, p. 38). A quarta categoria refere-se a trabalhos sobre os „recursos didáticos‟, mais especificamente recursos a partir de ideias ecológicas, com materiais que empreendam o lúdico e a aprendizagem. Segundo os autores das pesquisas analisadas a partir da elaboração de materiais didáticos é possível o reaproveitamento de resíduos sólidos, em geral descartados no próprio meio escolar. Os materiais criados são desde jogos, brinquedos e brincadeiras o que possibilita o educador transformar a sua prática pedagógica, sendo mais lúdica e criativa e “[...] com a utilização de recursos didático-pedagógicos pensa-se em preencher as lacunas que o ensino tradicional geralmente deixa, e com isso, além de expor o conteúdo de uma forma diferenciada, faz os alunos participantes do processo de aprendizagem” (CASTOLDI; POLINARSKI, 2009, p. 985). A quinta categoria trata de „pesquisas em documentos e leis‟ para a Educação do Campo, tais como as Diretrizes Operacionais para a Educação Básica nas Escolas do Campo e o Decreto nº 7.352/2010, planos municipais de educação, documentos da SEMED, políticas para Educação Especial no Campo, orientações legais das condições de trabalho do pedagogo do campo, entre outras. As pesquisas mencionam a necessidade firmar convênios, com universidades, entidades sociais e/ou órgãos públicos, visando a implementação de ações educativas na área dos assentamentos da reforma agrária, para que o jovem possa voltar a estudar, considerando as leis que garantem o acesso a universidade da população do campo. 771 A discussão de uma educação de qualidade para todos, segundo Alves e Santos (2012, p. 5) é um desafio, o autor avalia que para “[...]“superação” dos problemas sociais, exige quatro pilares: aprender a conhecer, aprender a viver juntos, aprender a fazer e aprender a ser, onde acredita que eles darão subsidio a uma educação de qualidade”. Na categoria „meta-estudo‟ estão classificadas as teses e dissertações em que são empreendidas discussões a partir do mapeamento de instituições escolares do campo com objetivo de verificar o projeto pedagógico, o plano de ensino e o diário de classe, para compreender as perspectivas docentes em torno do currículo. As pesquisas referem-se ao desejo de compreender qual a situação da Educação do Campo e dos professores, salientando a necessidade de maior atenção de políticas públicas condizentes com a realidade da escola do campo. A importância do meta-estudo é salientada por Rossani (2006, p.21), pois tem como característica “[...] comparar vários elementos presentes nos artigos como, por exemplo, metodologia, referencial teórico, base epistemológica, levantando algumas conclusões sobre determinado campo do conhecimento ou disciplina”. A categoria sobre a „análise conceitual‟ apresenta investigações sobre as políticas públicas da Educação do Campo buscando a sua efetivação na Educação Básica e na EJA, os conceitos da Educação do Campo como a concepção de campo e de povos do campo presente na escola hoje. Assim como, o resgate do contexto histórico do campo e a atuação do MST na luta pelo acesso à educação escolar para os trabalhadores rurais. Dessa forma, é possível identificar nos resumos analisados, que a Educação do Campo ainda está sendo incorporada ao cenário da educação brasileira, nestes trabalhos assume grande importância na tentativa de modificar os preconceitos estabelecidos na sociedade, para a construção da identidade e da cultura camponesa no Brasil. Quanto a EJA, Bär, Pires e Malacarne (2012, p. 3) problematizam a formação de professores, esta ainda carece a seu ver da inserção de “[...] conhecimentos e saberes necessários para uma boa atuação nessa área. Compreende-se que melhorias na formação inicial e continuada, destes [professores] são indispensáveis para se obter resultados positivos”. A oitava categoria, „efetivação da Educação do Campo‟ apresenta investigações, que incorporam reflexões sobre como a Educação do Campo. Vem se efetivando entre os povos do campo (quilombolas, assentados, pequenos proprietários). Avalia também a efetivação do Programa Escola Ativa e o projeto Escola em Tempo Integral na Educação do Campo. Além de apresentar reflexões sobre o fechamento das escolas rurais e o processo de nucleação 772 escolar, relativas ao processo educativo desenvolvido nas escolas rurais multisseriadas e à efetivação de políticas públicas para alunos do campo com necessidades especiais. Nos estudos analisados, foi possível observar a ocorrência de contradições entre teoria e prática, os conteúdos explorados, os princípios da Educação do Campo e, em algumas situações, o início da transição da concepção de educação rural tradicional à concepção de Educação do Campo. Entretanto, a Educação do Campo, o Programa Escola Ativa e a Escola de Tempo Integral na Educação do Campo tem a aprovação dos envolvidos, pois o saber científico adquirido embasa os valores no trabalho, família, território e educação, e ainda se configura como uma tentativa na valorização dos sujeitos do campo. Dessa forma, de acordo com os resumos analisados, observamos que a política de nucleação é equivocada para a formulação de uma proposta de Educação do Campo, pois não há como compreender o processo educativo desenvolvido nas escolas rurais multisseriadas por meio de metodologia, avaliação e controle escolar formal e urbano. Para Santos e Silva (2007), a relevância de programas e projetos na Educação do Campo possibilitou a formação de uma identidade para a Educação do Campo e para a formação de educadores. Fazem parte da última categoria intitulada „outras temáticas‟, as publicações que, segundo a análise dos resumos, não se enquadraram na temática investigada, com temas relacionados a estudos sobre o homossexualismo no contexto de uma educação cidadã, sobre a crença religiosa para a conservação do ambiente, as diversas concepções éticas que envolvem a Ecologia Humana, entre outros. Analisando o trabalho desenvolvido, referente aos resumos das publicações analisadas, é possível observar que a Educação do Campo é um tema bastante relevante e tem vários estudos envolvendo-a, fato que demonstra a importância da sua implantação pelas diversas leis que envolvem o tema, mas a sua implementação, ou seja, a consolidação da Educação do Campo ainda vem acontecendo, de forma lenta. Entretanto, para o binário Ensino de Ciências e Educação do Campo, as pesquisas revelaram-se incipientes, no período investigado. Considerações finais A Educação do Campo tem suscitado diferentes temáticas de investigação, desde as relativas as políticas públicas, passando pela formação docente, processos de ensino e aprendizagem, até as outras modalidades da Educação Básica, ente elas a EJA, entre outros 773 temas de pesquisa. Entretanto, em relação ao ensino de Ciências na Educação do Campo, não se constituiu ainda um amplo acervo bibliográfico de pesquisa na pós-graduação, dentro do período analisado, evidenciando a necessidade de aprofundamento e o fortalecimento dos grupos de pesquisa sobre o tema. Considerando os dados apresentados e as interpretações realizadas, podemos afirmar que a Educação do Campo é uma política pública presente no território nacional e está inserida na Educação Básica sob a forma de modalidade de ensino, sendo na maioria das vezes, implantada, entretanto, poucas vezes efetivada. Da mesma forma, as discretas experiências de pesquisa publicadas que envolveram o ensino de Ciências revelaram que ainda há muito para contribuir objetivando um ensino de Ciências na Educação do Campo de qualidade, com base nas suas especificidades. Fazem-se necessárias, ainda, várias medidas para consolidar a Educação do Campo como prática, dentre elas, adequar as metodologias utilizadas no processo de ensino e aprendizagem, pois a Educação do Campo não existe fora de seu contexto, e qualquer prática deve vincular os saberes próprios de cada estudante, inerentes à sua realidade, e os conceitos aprendidos, na elaboração do conhecimento científico com o intuito de viabilizar o ensino de forma a ter sentido e significado para o estudante do campo, caracterizando-os como sujeitos do campo, mas não os limitando a este espaço. REFERÊNCIAS ALVES; E. F. de S., SANTOS; C. E. F. dos. A política de educação do campo em alguns documentos oficiais. Revista Eletrônica de Culturas e Educação: Entrelaçando. Universidade Federal do Recôncavo da Bahia. V. 2, n. 7, Set-Dez 2012. Disponível em: <http://www.ufrb.edu.br/revistaentrelacando/edicoes-entrelacando/edicao7>. Acesso: 15 fev. 2015. ANTONIO; C. A., LUCINI; M. 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