PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS INSTITUTO DE PSICOLOGIA SER OU NÃO SER SUJEITO? REFLEXÕES ACERCA DA AUTONOMIA DO IDOSO INSTITUCIONALIZADO RUTE SANTOS PEREIRA Belo Horizonte 2005 2 RUTE SANTOS PEREIRA SER OU NÃO SER SUJEITO? REFLEXÕES ACERCA DA AUTONOMIA DO IDOSO INSTITUCIONALIZADO Monografia apresentada à disciplina de Estágio Supervisionado Monografia II da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – São Gabriel como requisito parcial à obtenção de título de bacharel em Psicologia. Orientadora: Luciana Kind Belo Horizonte 2005 3 Aos idosos que com todas as suas bagagens e experiências de vida despertam em mim um grande respeito e admiração. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço a Deus que traçou esse percurso, dando-me o sustento necessário para chegar até aqui. À minha mãe que com sua sabedoria inspirou-me reflexões acerca do ser humano. Às minhas irmãs, Nárli e Lídia, pela compreensão tida no simples fato de quererem o melhor para mim. Ao querido Tomé por participar de cada momento desta construção, ter estado próximo, e com sensibilidade ter apostado na minha capacidade. À orientadora Luciana Kind por ter estado tão próxima, e ter compreendido cada momento incentivando-me na luta por esta causa. Aos professores que não pouparam-me palavras de advertência na contribuição para formação da identidade como psicóloga. Aos amigos de caminhada, Rosana, e José Geraldo pelo companheirismo e empatia ao participarem das minhas construções. Aos residentes da Instituição pesquisada por me concederem a oportunidade de aprender. Aos profissionais da Instituição pesquisada pela aposta, atenção e incentivo. Ao psicólogo da Instituição pesquisada, que representa para mim, uma referência profissional. Às barreiras pelas quais aprendi que ao superá-las tem-se a continuidade da história. 5 Não quero velhice sem voz... descrente, carente. O belo é permanente; e na velhice, experiente, desperta, quero ainda tocar sinos... Cléo Reis 6 SER OU NÃO SER SUJEITO? Reflexões Acerca da Autonomia do Idoso Institucionalizado RESUMO: A presente pesquisa trata-se de um trabalho monográfico realizado no primeiro semestre de 2005, trazendo uma análise reflexiva do idoso em contexto institucional, a partir de alguns questionamentos que foram surgindo no decorrer da realização de outras pesquisas acadêmicas e de estágios extracurriculares. A relevância dessa pesquisa está na existência de dados comprovados de que a incidência de idosos no Brasil vem aumentando consideravelmente, presumindo-se uma repercussão deste quadro no aumento de instituições asilares. Tem-se como objetivo discutir a interferência político-social de modelos assistenciais de atendimento a idosos, no que tange a questão da autonomia ao se pensar como o idoso lida com os atravessamentos institucionais e, a partir disso, quais as possibilidades desse sujeito ser autônomo. A pesquisa foi realizada numa instituição asilar filantrópica em Belo Horizonte. Foram feitas entrevistas semi-estruturadas com idosos asilados, profissionais da saúde, representante da instituição e uma cuidadora, a fim de conhecer a noção que têm sobre a autonomia. Os dados foram analisados através da técnica análise temática. Os resultados mostraram que, em relação ao idoso, foi possível perceber que a autonomia é apontada através da utilização de estratégias, na tentativa de transporem as imposições institucionais e produzirem sua subjetividade. Foi observado que o idoso assistido demonstra outras necessidades que fizeram com que a instituição lançasse o olhar para a escuta do sujeito que busca alternativas para falar, mesmo que de forma indireta, sobre seus desejos e até mesmo críticas. Destaca-se a mediação do psicólogo, sendo este referência na construção deste lugar de fala. Palavras-chave: idoso, instituição, autonomia 7 SUMÁRIO 1 2 2.1 2.2 2.3 3 3.1 3.1.1 3.2 4 4.1 4.2 4.3 4.3.1 4.3.2 4.3.3 4.3.4 5 6 INTRODUÇÃO....................................................................................................... JUSTIFICATIVA, PROBLEMA E OBJETIVOS PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS NOTAS SOBRE A VELHICE............................................................................... A ENTRADA NA INSTITUIÇÃO MARCADA POR VULNERABILIDADES......................................................................................... A vulnerabilidade do estado de saúde................................................................... Vulnerabilidade econômica.................................................................................... Vulnerabilidade afetivo-familiar........................................................................... OS EFEITOS DA INSTITUIÇÃO NA VIDA DO IDOSO................................. Impressões do asilo antes e no decorrer do processo de institucionalização..... O significado da instituição para o idoso.............................................................. Rotina institucional: atitudes autônomas ou heterônimas?................................ AS CATEGORIAS DA AUTONOMIA NOS DIFERENTES DISCURSOS.... A autonomia no discurso biomédico .................................................................... Autonomia no discurso psicossocial: a subjetividade.......................................... Estratégias que apontam para a autonomia......................................................... A mediação do “outro”........................................................................................... Valores confrontados: o sujeito que age............................................................... Transgressão de regras........................................................................................... A autonomia pela produção................................................................................... CONCLUSÃO......................................................................................................... REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................. 08 09 11 14 19 20 22 26 31 32 34 35 39 39 40 43 44 45 46 47 50 54 ANEXO I - CARTA DE APRESENTAÇÃO E ROTEIROS DE 57 ENTREVISTA......................................................................................................... ANEXO II - TERMO DE CONSENTIMENTO.................................................. 59 8 INTRODUÇÃO O interesse pela Terceira Idade está relacionado a uma trajetória na área durante a graduação em psicologia, através de produções acadêmicas e de estágios extracurriculares. Destaca-se dessa trajetória uma prática investigativa (PEREIRA, 2002) que partiu da questão da existência ou não de propostas sociais que atendem a idosos, sendo feita uma comparação entre idosos asilados e não asilados. Com essa pesquisa pôde ser constatada a existência de propostas que apontam para a qualidade de vida dos idosos, mas as mesmas não eram bem divulgadas e nem o idoso, em geral, mantinha-se informado. Foi constatado também que o idoso asilado estava mais próximo de recursos oferecidos para a sua qualidade de vida, quando a instituição oferecia um suporte técnico composto por profissionais que o acompanhassem. Outra pesquisa (PEREIRA, 2003) teve como foco a violência doméstica na terceira idade, buscando verificar a incidência de registros contra a mesma nos órgãos públicos destinados a esse fim. Foi constatada a ausência de rigor no arquivamento de registros, não sendo possível ter acesso a todos eles e também, a dificuldade de comunicação entre os órgãos públicos envolvidos nessa questão. Verificou-se ainda que a maioria das denúncias sobre violência contra o idoso, era feita por terceiros. A primeira experiência de estágio extracurricular se deu no período de quatro meses, numa instituição asilar particular, na qual a atuação como estagiária de psicologia se deu através da formação de grupos com os idosos, utilizando dinâmicas de grupo, a fim de discutir temas diversos que os idosos propunham ou eram sugeridos pela estagiária. A segunda e atual experiência é numa instituição asilar filantrópica, onde a pesquisadora atua 9 há quase dois anos. Inicialmente o trabalho nessa instituição envolvia a condução de avaliações neuropsicológicas dos idosos residentes. Posteriormente, foi aberta a possibilidade de realizar atendimento clínico, com base na teoria psicanalítica. Através dessa experiência de estágio em instituições voltadas para o acolhimento e atendimento a idosos, foi sendo possível observar o papel social que as mesmas exercem ao promover o cuidado com o idoso. Ressaltam-se as instituições filantrópicas, que oferecem moradia, alimentação, e outros recursos para que o idoso abandonado ou sócioeconomicamente carente seja assistido em vários aspectos. Observando o contexto institucional, alguns questionamentos foram surgindo ao lidar diretamente com esses idosos. No contexto da avaliação neuropsicológica, por exemplo, foi observado que alguns idosos demenciados, sentiam-se algumas vezes constrangidos. Observando também sua rotina, algo chamava a atenção e ecoava como um questionamento: “Como está o sujeito nesse cenário?” Dessa forma, nesse percurso, foi possível perceber a dinâmica institucional. Foi observado que os residentes são submetidos a regras de funcionamento, tais como: horários predeterminados, adaptação ao espaço físico, e outras normas institucionais que organizam sua rotina de vida. Assim, foram surgindo questionamentos referentes ao posicionamento do idoso frente à instituição, levando à reflexão sobre a autonomia e produção de subjetividade no contexto asilar. JUSTIFICATIVA Aproximadamente no ano de 2025, o Brasil terá a sexta maior população idosa do mundo de acordo com BACELAR (2002). Com base nisso presume-se uma repercussão 10 deste quadro no aumento de instituições asilares. Daí a relevância de se desenvolver pesquisas que focalizem a população idosa neste país. Outra contribuição deste trabalho é a possibilidade de se discutir a interferência político-social de modelos assistenciais de atendimento a idosos. Um exemplo disso é a recente aprovação do estatuto do idoso, que mostra uma atenção maior, em nível federal, para esse público específico. Para a psicologia que lida com a questão da subjetividade, se faz importante compreender como se dá o processo de subjetivação do idoso no contexto institucional. A importância desta pesquisa também está no aprofundamento de questões relativas à Terceira Idade que tem sido construídas no decorrer das experiências em estágios e trabalhos acadêmicos voltados para esta área, como mencionado anteriormente, trajetória fundamental para a formação como pesquisadora. PROBLEMA E OBJETIVOS Sendo assim, a presente pesquisa foi realizada numa instituição asilar filantrópica em Belo Horizonte, com o objetivo geral de conhecer como se estabelece a relação entre idoso e instituição, a partir das representações que se tem sobre o modelo de política asilar e sobre a noção de autonomia dos sujeitos envolvidos neste contexto. Como objetivos específicos pretendeu-se descrever as concepções de autonomia do sujeito dentro dos modelos biomédico e psicossocial, no que tange a noção de qualidade de vida, identificando se a instituição asilar possibilita ao idoso sua autonomia e qual espaço ela favorece para que ele seja produtivo. 11 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Num primeiro momento a proposta foi encaminhada à coordenação da instituição asilar mencionada anteriormente. O trabalho foi ao encontro da expectativa daquela gestão de produzir um conhecimento aprofundado sobre seus residentes, bem como, identificar como a instituição tem se posicionado diante das questões subjetivas do idoso que emergem no decorrer do seu processo de institucionalização. Nessa fase, que pode ser caracterizada com exploratória, observou-se que a instituição asilar pesquisada assemelha-se a uma “casa” com os residentes circulando por suas dependências, e também numa praça externa em frente à unidade asilar, extensiva à mesma por se localizar no centro das unidades que compõe a instituição como um todo. A instituição oferece recursos que visam assistir o idoso de uma forma integral através de uma equipe técnica formada por profissionais da área de saúde e também com o apoio de cuidadores, cozinheiras e equipe de limpeza, todos eles participantes ativos da rotina institucional. Tanto os idosos como os profissionais, cuidador e coordenação se prontificaram em participar da pesquisa ao serem convidados, assinando um Termo de Consentimento1, no qual constava uma explicação minuciosa sobre a pesquisa e o resguardo dos direitos dos participantes quanto a esclarecimentos sobre a mesma, a liberdade de desistirem se caso não quisessem prosseguir, e também o sigilo dos relatos. As entrevistas foram realizadas no período do mês de março a abril de 2005, sendo gravadas, transcritas e posteriormente analisadas tendo como referência a análise temática (BARDIN, 1988). Foi feito o levantamento de categorias que foram selecionadas a partir de temas gerais, sendo estes 1 Vide Anexo II – Termo de Consentimento. 12 últimos aglutinados pela recorrência nos discursos ou pelo seu destaque. Os temas levantados serão apresentados nos capítulos subseqüentes. Um total de treze sujeitos fez parte da pesquisa, embora duas entrevistas com idosos tenham sido realizadas, sem gravação, como pré-teste do roteiro de entrevista, anexado à carta de apresentação2 da pesquisa. Três dos profissionais entrevistados apresentaram discursos similares no ponto de vista biomédico, tendo sido possível, entretanto, transcrever somente uma dessas entrevistas. Sendo assim, apenas onze das treze entrevistas foram transcritas. Nelas estão incluídas as entrevistas dos seguintes sujeitos: seis idosos asilados lúcidos, sendo quatro do sexo masculino, dois deles antigos moradores de rua, e duas do sexo feminino, uma cuidadora, um gestor, uma assistente social, uma médica e um psicólogo. Foi observada a presença de uma expectativa inicial dos participantes ao duvidarem se saberiam responder a todas as perguntas. Essa expectativa foi sendo superada na medida em que as entrevistas foram se desenrolando. Dessa forma, no decorrer das mesmas foi possível perceber a riqueza dos dados que iam sendo produzidos. Em relação aos idosos, foi possível perceber uma tensão inicial pela verbalização de alguns deles de que não saberiam se suas respostas contemplariam as perguntas feitas pela pesquisadora. Essa tensão foi sendo amenizada enquanto falavam do seu passado e da rotina institucional. Afinal, eles mesmos são protagonistas da sua história de vida. Embora algumas vezes o horário das entrevistas coincidisse com algum afazer da rotina institucional, alguns idosos negociavam a continuidade da mesma com a pesquisadora ou com a instituição, como, por exemplo, reservar o almoço para que pudessem se alimentar num outro momento. Isso demonstra a consciência e a prontidão dos mesmos em 2 Vide Anexo I – Carta de Apresentação e Roteiros de Entrevista. 13 participarem de uma pesquisa que tem como pressuposto mapear o conhecimento que os idosos possuem sobre sua vivência institucional. Com relação aos profissionais, cuidador e gestora, mesmo sendo os horários atravessados pelos seus afazeres, foi possível negociar o tempo para a entrevista. O presente trabalho será apresentado, então, em quatro capítulos. No primeiro capítulo serão abordadas algumas perspectivas que se voltam para o estudo do envelhecimento em diferentes abordagens que passam pelo discurso biomédico, psicossocial e pelas leis que regulamentam o direito do idoso. O segundo capítulo reflete, a partir da discussão dos resultados, as situações que poderiam ser nomeadas como “vulnerabilidades” que marcam a entrada do idoso na instituição. O terceiro capítulo traz a discussão acerca dos efeitos da instituição na vida do idoso no decorrer do processo de institucionalização. O quarto capítulo alinhava a discussão trazendo a noção de autonomia no discurso institucional e do idoso. 14 1 NOTAS SOBRE A VELHICE A velhice pode ser compreendida a partir de diferentes olhares, no que tange à multiplicidade de abordagens que tratam dessa questão. Não tendo a pretensão de esgotar as inúmeras teorias que contribuíram para que a velhice se tornasse uma especialidade cientifica, serão pontuadas neste trabalho três perspectivas fundamentais para a compreensão da mesma, a saber, a velhice como um processo biológico, psicológico e psicossocial. Dentro da abordagem biológica destaca-se a geriatria, especialidade médica que busca a compreensão da velhice a partir do ponto de vista orgânico. Há um foco na influência da idade cronológica, que diz respeito aos anos reais de vida do sujeito, e da idade biológica, que é relativa à idade do corpo funcional, ou seja, ao declínio fisiológico do organismo. Esta descrição refere-se ao envelhecimento normal. No campo social um autor que pesquisou sobre as implicações da velhice foi DEBERT (1999), comentando sobre o crescimento demográfico da população idosa que desencadeia problemas para a economia e gera políticas voltadas para aposentadoria. A velhice deve ser, dessa forma, analisada do ponto de vista psicossocial. A análise psicológica da velhice corresponde a aspectos subjetivos do envelhecimento ligado ao modo com que o idoso lida com as suas perdas biológicas e cognitivas. Conforme pontuou GATTO (2002): (...) perdas e crises estão sempre presentes, embora vivenciadas e superadas de maneira diferente por cada idoso.(...) o surgimento de doenças crônicas deteriorando a saúde, a viuvez, morte de parentes e amigos próximos, ausência de papeis sociais valorizados, isolamento crescente, dificuldades financeiras decorrentes da aposentadoria, afetam de tal forma nossa auto-estima, culminando na maioria das vezes, com uma crise. (GATTO, 2002, p.109) 15 A crise à qual a autora se refere diz respeito a doenças que podem surgir a partir dos acontecimentos que acompanham o processo de envelhecimento. Em relação ao aspecto psicológico é importante ressaltar a idade psicológica que remete à idade que o sujeito sente que tem. A psicanálise parte do pressuposto de que o inconsciente é atemporal por não seguir uma lógica linear como a do tempo cronológico, pois, fatos ou cenas da vida de um indivíduo podem ser vivenciados num dado momento com a mesma veracidade e fidelidade à cena real vivenciada num momento anterior, como por exemplo, na infância. Partindo dessa noção, MUCIDA (2004) pontuou que: (...) o inconsciente não se ordena em conformidade a um tempo cronológico no sentido de uma história linear ou desenvolvimentista (...) a não alteração dos traços, uma vez inscritos, eles não se perdem jamais. Nesse sentido, o sujeito enquanto efeito do significante não envelhece jamais. (MUCIDA, 2004, p. 46). Pontuadas algumas perspectivas sobre a velhice, foram surgindo asilos pela aglomeração de idosos num mesmo espaço que facilitasse o desenvolvimento de saberes e práticas sobre essa população. Dentro disso, segundo BEAUVOIR (1990), a geriatria passou a existir em meados do século XIX na França, quando houve a criação de grandes asilos nos quais muitos velhos eram reunidos, facilitando a coleta de dados clínicos sobre os mesmos. A mesma autora ressalta que com o aumento da população idosa, “tanto na França quanto em outros países, os médicos passaram a observar doenças degenerativas que se desenvolviam numa situação senil”. BEAUVOIR (1990, p. 28) Dessa construção sistemática ressalta-se a descrição de envelhecimento patológico, nomeado como “senilidade”. De acordo com o dicionário de psicologia de NORBERT (1998), o termo senilidade está ligado 16 (...) ao enfraquecimento simultâneo das capacidades físicas e mentais, devido ao envelhecimento. A senilidade é a aceleração dos processos normais do envelhecimento. Ela não tem uma idade precisa, variando de um indivíduo para os outros, sendo influenciada por fatores hereditários e pessoais (antecedentes patológicos, intoxicação alcoólica, estafa, etc). Também possuem um importante papel, na data de aparecimento do estado senil, as condições sócio-econômicas e afetivas. (NORBERT, 1988, p.213) O autor conclui que o sentimento de desvalorização gerado por todos esses fatores contribui para o aceleramento do envelhecimento. A soma desses fatores psicossociais podem contribuir para a criação de estereótipos relacionados à figura do idoso como um sujeito marcado por “perdas”, ao apresentar uma série de vulnerabilidades, sendo essas associadas a efetivas perdas cognitivas e biológicas como alteração da linguagem e memória, diminuição de sua resistência global, facilitando o surgimento de doenças crônicas ou agudas. Contudo, o risco de se rotular a velhice como doença, sugere a restrição que é feita da capacidade do idoso, servindo como um argumento para a segregação do mesmo. Isso pode ser observado em alguns discursos: “(...) não. Vontade eu tenho, vontade eu tenho. Mas a gente as vezes sente cansada, as pernas dói. aquela coisa toda né? Mas se tivesse jeito, mas agora não tem, eu não tenho mais idade pra isso não. Eu to com 80, vou fazer 81 anos (...) Elas comentam boba, nada boba, você vai descansar, você já trabalhou muito, aquela coisa toda, vai descansar um pouco você já trabalhou bastante, já deu o que tinha que dar, então a gente vai nessa né?” (S2, idosa)3 “Com essa idade minha nem penso em projeto mais não”. (S3, idoso) Percebe-se a limitação que o idoso constrói a respeito de sua capacidade física e intelectual quando a justifica por estar velho. Essa representação dificulta que o idoso tenha atitudes autônomas. 3 As falas dos sujeitos entrevistados foram transcritas sem correções. 17 Com base em estudos já mencionados, voltados para essa dimensão mais ampliada sobre a velhice, a gerontologia, aliada à geriatria, buscou a compreensão do envelhecimento não só a partir do processo fisiológico, mas também dos envelhecimentos psicológico e social do sujeito. O envelhecimento é um processo inerente à vida, bem como o nascimento, o crescimento e a morte. A velhice, então, é observada em suas repercussões nos vários âmbitos não só da medicina como também do campo social. Isso é demonstrado pela regulamentação do novo Estatuto do Idoso no Brasil (2003), que define a velhice a partir da caracterização do sujeito pela sua idade cronológica, sendo apontado o marco inicial dos 60 anos. Tendo esta idade como um requisito, o sujeito passa a ter uma série de benefícios respaldados por leis que regulamentam a absoluta prioridade dos direitos inerentes ao ser humano como vida, saúde, alimentação, educação, cultura, esporte, lazer, trabalho, cidadania, liberdade, dignidade, respeito e convivência familiar e comunitária. As novas regulamentações do estatuto do idoso levam em consideração o aproveitamento da capacidade funcional do idoso. No capítulo VI do estatuto, nos artigos 26 e 27, é regulamentado o direito do idoso à atividade profissional, vedando-se a discriminação de sua idade ou limite fixo da mesma para o exercício de uma função. Isso sugere um apontamento importante para a questão da autonomia que será tratada no decorrer do presente trabalho. Com a contribuição das abordagens mencionadas, é importante compreender a velhice numa dimensão maior. Conforme MORAGAS (1997) que pesquisou a Gerontologia Social (...) para uma valoração integral da pessoa, a variável idade deve estar acompanhada de outras variáveis originárias como sexo, raça, origem familiar, e de variáveis adquiridas como educação, carreira profissional, status social, família, (ou de matrimônio), etc... Desta 18 maneira, é substituída uma valoração subjetiva e parcial por uma visão integral da pessoa. (MORAGAS, 1997, P. 21) Com base nessa reflexão, percebe-se que todos esses elementos em conjunto (envelhecimento normal, patológico, condições econômicas, relações familiares, imagem construída acerca da velhice e do sentir-se velho) contribuem para situar o cenário atual no Brasil sobre o envelhecimento. Esse cenário se caracteriza pela criação de políticas voltadas para o idoso como o estatuto, a criação de centros de convivência e o aumento de instituições asilares, em função do crescente aumento da população idosa. Com essa problematização, busca-se compreender como o próprio idoso que passa pelo processo de institucionalização tem se implicado nessas questões. A seguir, o capítulo dois apresenta a discussão de como se dá a entrada do idoso na instituição, a partir de “vulnerabilidades” que se destacam dos campos orgânico, econômico e social. 19 2 A ENTRADA NA INSTITUIÇÃO MARCADA POR VULNERABILIDADES A vulnerabilidade é um conceito utilizado por algumas abordagens para descrever uma determinada condição ou situação do sujeito. Em dicionário da língua portuguesa (FERREIRA, 1999), o termo vulnerável figura com significados tais como, “o lado fraco”, ou “do ponto de vista pelo qual alguém pode ser atacado ou ferido”. O termo vulnerabilidade também é encontrado na análise dos direitos do idoso pelo Decreto-Lei nº 7.930 referente à Política Municipal do idoso de Belo Horizonte (1999). No artigo 4º, alínea “j” desse documento é pontuada a oferta de benefícios eventuais ou continuados que cubra vulnerabilidades em relação ao idoso. Essas vulnerabilidades dizem respeito à agressão física e moral (feitas por filhos, netos e/ou vizinhos); carência sócio-econômica; uso indevido da pensão ou benefício; abandono material, pessoal ou familiar; restrição da liberdade pelos familiares; desinformação quanto aos direitos; maus tratos no transporte coletivo; isolamento social; sobrecarga de responsabilidades; falta de cuidados apropriados; falta de moradia ou sua apropriação e invasão por familiares e vizinhos. Percebe-se que de acordo com a Política Municipal de Assistência social de Belo Horizonte, o quadro de vulnerabilidades é classificado a partir dos direitos humanos com base no estatuto do idoso, numa visão ampliada do que seria a vulnerabilidade passando também por relações familiares e sociais e pelas condições básicas de sobrevivência como moradia, condições econômicas e falta de cuidados pelos familiares. O termo vulnerabilidade também é utilizado em documento apresentado a esta pesquisadora em entrevista numa investigação anterior (PEREIRA, 2002), feita na Delegacia Especializada de Proteção ao Idoso em Belo Horizonte – DEPI/MG. Conforme a entrevista realizada com Delegada Dra. Suely Paixão a classificação das vulnerabilidades 20 na terceira idade se apresenta por: lesão corporal, maus tratos, constrangimento ilegal, ameaça, abandono material, perturbação do trabalho ou do sossego alheios, perturbação da tranqüilidade, dentre outros. Nota-se que cada abordagem que trata da questão da vulnerabilidade, à conceitua a partir de sua especificidade, ou seja, em concordância com a finalidade institucional e da lógica própria da instituição. Nesse sentido, pensando na instituição asilar como aquela que se presta a oferecer assistência ao idoso, o termo vulnerabilidade ganha contornos próprios, respeitadas suas características e normas. Assim, nesta presente pesquisa, em que se apresenta um estudo de caso sobre uma dada instituição asilar, o termo vulnerabilidade corresponde ao encontrado no discurso biomédico ao falar da reabilitação física e mental, às condições financeiras e às relações familiares. Os itens que se seguem apresentam os resultados da pesquisa em diálogo com a bibliografia consultada no desenrolar da investigação, sendo eles: a vulnerabilidade do estado de saúde; a vulnerabilidade econômica e a vulnerabilidade afetivo-familiar. 2.1 A vulnerabilidade do estado de saúde O discurso biomédico aborda a noção de qualidade de vida voltada para o bem-estar físico, mental e a capacidade de executar atividades. A busca pela qualidade de vida em geral sustenta a discussão sobre a saúde do idoso. PASCHOAL (2002), aponta que o conceito de saúde nos últimos 50 anos foi sendo reelaborado. Este conceito deixa de estar ligado à ausência de doenças para o bem-estar físico, psíquico e social, mesmo que o indivíduo seja portador de alguma doença. Aquele que conseguir ser ativo no desempenho de funções no convívio social é considerado saudável. 21 Este mesmo autor ressalta que há doenças inerentes à velhice como hipertensão arterial, diabetes, dentre outras. Por essa razão não cabe o conceito de saúde ligado à ausência de doenças. Nesse sentido a proposta de qualidade de vida está ligada à preservação da capacidade funcional física e mental frente às doenças, de modo que o indivíduo não se torne dependente em suas atividades da vida diária em função disso. Para o autor em questão, a incapacidade funcional representa um fator de risco para a institucionalização do idoso que vive num contexto de dependência, eventualmente, morando sozinho ou com filhos casados. O que se percebe é que idosos nessas condições são encaminhados para instituições asilares. A instituição pesquisada tem como critério de admissão, a prioridade a idosos considerados debilitados físico e cognitivamente. Isso é demonstrado pelo relato da representante da instituição asilar e da assistente social: “(...) a gente tem os critérios de internação e damos preferência né, a assistência ao idoso debilitado, o idoso que tem doenças crônicas degenerativas e este idoso a gente vê numa forma de cuidar em dar qualidade de vida, né, por ser um idoso que teve uma condição precária de vida, que tem várias doenças, faz uso de várias medicações, a gente entende o nível, né, de limitações...” (S8, gestora) “(...) então a gente tem a visão daquele idoso é...fotografia do idoso brasileiro mesmo, né? Aquele idoso que é sofrido, com uma perspectiva de vida pequena porque não teve qualidade de vida durante sua história toda, então quando ele veio para instituição, já veio um idoso que teve assim a história de vida dele toda, foi sem assistência, assistência quase nenhuma em todos os sentidos, né? Principalmente assistência á saúde.” (S9, assistente social) Também chama a atenção que em todos os discursos dos idosos aparece que a sua entrada na instituição se deu a partir de vulnerabilidades ligadas ao seu estado de saúde. Sendo assim, a “escolha de ir para o asilo” passa por esta questão ficando implícito o desejo 22 da reabilitação física neste primeiro momento e não necessariamente a instituição como moradia. “(...) olha vê se a senhora arruma outro hospital pra por ela lá pra ela tomar o remédio, até ela tomar o remédio todo. Aí ela telefonou para outro hospital e não tinha vaga, aí ela falou, há eu vou telefonar lá ... Telefonou pra aqui então eu vim pra tomar remédio” (S1, idosa ) “(...) então quando eu fiquei assim, meia doente né?, eu já tinha aposentado, já tinha aposentando e precisei muito de médico, então eu tinha muita dificuldade de sair pra marcar consulta, pra fazer consulta, buscar remédio, pra ir pra padaria pra buscar um pão, pra buscar alguma coisa pra comer, tinha muita dificuldade porque onde eu morava, eu não tinha pessoas que me ajudassem nesse sentido”. (S2, idosa) “(...) eu vim, eu morava debaixo do viaduto, lá no Riacho das Pedras, então eu bebia muito, então a dona pediu aqui pra mim...sabe...na primeira vez não arranjou, depois então eles falaram que já tinha vaga, então eu vim pra cá.” (S3, idoso) Os dados refletem uma espécie de avaliação pelos residentes e pela administração, de que a entrada na instituição é marcada pela vulnerabilidade em relação à saúde, mostrando compatibilidade da relevância do discurso biomédico apontada por PASCHOAL (2002), que considera a qualidade de vida como a reabilitação tanto física quanto cognitiva. Ao entrar na instituição, o idoso deseja a sua recuperação. No primeiro momento tem-se essa expectativa. A melhora do quadro clínico traz para o idoso outras expectativas que serão mencionadas no capítulo 3, que reflete sobre os efeitos da instituição na vida do idoso. 2.2 Vulnerabilidade econômica Ao falar do envelhecimento sob uma ótica social, DEBERT (1999) discute a questão da aposentadoria como fazendo parte de “transformações que acompanharam o desenvolvimento capitalista e estabelecem uma relação indissociável entre o fim do 23 trabalho assalariado e o último estágio de vida”. (DEBERT, 1999, p.59). Esta autora faz menção à criação de benefícios para esse público específico, o que resultou na criação de um novo mercado que atende a esse público, seja no campo da informação, com revistas que trazem matérias específicas sobre a velhice ou no campo da farmacologia, pensando-se na vulnerabilidade ligada à saúde. Vale ressaltar a imagem construída sobre a velhice dentro de uma cultura que legitima a juventude. Com isso, tanto a mídia quanto o mercado voltado para o culto ao corpo, investem na plasticidade como uma forma de retardar o processo de envelhecimento, através de cirurgias que simulam um estado de juventude. Em seu texto intitulado “Idoso na Mídia”, DEBERT (2002) ressalta que a juventude é tida como um parâmetro, um valor que precisa sempre ser reconquistado independente da idade. Dessa forma, o próprio mercado se apropria desse valor para “ditar” as transformações físicas que garantem ao idoso uma posição que não seja ser velho, mas alguém rejuvenescido. Esta mesma autora destaca que com a atenção voltada para o público idoso o termo velhice passa a ser substituído por “terceira idade”. Com isso novas terminologias são usadas para definir a velhice conforme as representações que são feitas da mesma, embora, como mencionado anteriormente, haja a tentativa de conter esse processo. Com base no Estatuto do Idoso (2003) que deferiu leis que garantem ao idoso o direito à educação, cultura, esporte e lazer, a aposentadoria ganha uma conotação de momento de descanso e recolhimento de todo o trabalho executado durante a vida ativa, como também, momento de atividade e lazer. Em relação à Previdência Social, no capitulo VII do Estatuto do Idoso, art. 29º, tem-se como base para a aposentadoria “critérios de cálculo que preservem o valor real dos salários sobre os quais incidiram contribuição, nos termos da legislação vigente”. 24 No capitulo VIII, art. 34º foi deferido “aos idosos, a partir de 65 (sessenta e cinco) anos, que não possuam meios para prover sua subsistência, nem de tê-la provida por sua família, é assegurado o benefício mensal de 1 (um) salário-mínimo, nos termos da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS”. Isso demonstra que nem todos os idosos em sua história de vida, aposentam-se por tempo de contribuição, pois, não contribuíram para nenhum regime de previdência, como por exemplo, os trabalhadores da zona rural, onde muitos ali cresceram e viveram. Portanto, a realidade social e econômica da maioria dos idosos no Brasil acaba tendo a marca do legado da aposentadoria de salário mínimo. Conforme o “Relatório das visitas às instituições filantrópicas de longa Permanência para idoso em Belo Horizonte”, fornecido pela Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte Os idosos institucionalizados representam menos de 1,0% da população com 60 anos ou mais. Com a transição demográfica que vem ocorrendo no Brasil desde a década de 70, e o aumento significativo do número de idosos, cresceu a procura pelas instituições de longa permanência (ILPs). Diversos outros fatores como sócio-econômicos, a fragilidade da saúde dos idosos e o grau de dependência foram indicadores relevantes da necessidade de institucionalização. (SARTINI, 2003, p.09) Com base no que foi colocado pela geriatra SARTINI (2003), pensando no idoso que vai para uma instituição asilar filantrópica, suas condições financeiras são quase sempre precárias. O que se estimou para a aposentadoria enquanto um momento de descanso ou de lazer converteu-se num momento em que o idoso continua tendo que arcar com sua sobrevivência e seus gastos. Os que sobrevivem com 01 (um) salário mínimo não tem como prioridade o lazer. Conforme pontuou DEBERT (1999): (...) o aposentado se representa como alguém que trabalhou a vida toda e, no momento do direito à aposentadoria, tem dificuldade de manter a família e os dependentes. Apresenta-se portando, como um provedor do lar e não como alguém preocupado 25 exclusivamente com a sua sobrevivência ou satisfação individual. (DEBERT, 1999, p. 175) Dessa forma, a questão econômica pode ser caracterizada como uma vulnerabilidade para o idoso. Com base nisso, a ida para a instituição asilar pode representar a única saída diante de uma situação econômica precária, exigindo uma atenção maior ao idoso. Isso pode ser percebido na fala da representante da instituição: “(...) por ser um idoso que teve uma condição precária de vida, que tem várias doenças, faz uso de várias medicações, a gente entende o nível, né, de limitações.” (S8, gestora) Alguns idosos também ponderam sobre a vantagem econômica de permanecerem dentro da instituição. Analisando a sua realidade econômica, falam da incompatibilidade de se sobreviver com um salário mínimo fora da instituição, ao passo que sendo acolhidos pela mesma, não têm gastos com alimentação, medicamentos, tratamento médico, transporte. Isso possibilita que muitos deles invistam parte do seu dinheiro da aposentadoria com seus familiares. “(...) depois eu trabalhei toda vida, fui responsável pelas minhas coisas, e tudo enfim, não tive essa oportunidade, não tinha dinheiro, e aqui eu to tendo tudo isso...graças a Deus, graças a Deus (...) não sobreviveria com 01 salário mínimo lá fora...” (S2, idosa) “(...) eu me senti desamparado porque eles [familiares]não tinha condição e não tenho...porque se adoecer, ficar ruim, eles vão ligar pra cá, eles não tem condição nenhuma...eu não tinha nenhuma condição e não tenho (...) eu não daria conta de fazer tratamento de saúde que fiz aqui, lá fora, mesmo alguns filhos de criação eu tenho uma porção de filhos de criação, são abastados, eles não tem condições para fazer o tratamento que eu to fazendo aqui não.” (S4, idoso). “(...) se tivesse condições financeiras viveria lá fora, é pouco pra viver lá fora (...) não saio daqui, não sou bobo...se sair vou ter que pagar pra mim dormir.” (S5, idoso). Analisando os discursos dos idosos, estes demonstram uma consciência a respeito das dificuldades econômicas que enfrentaram e enfrentariam fora do contexto institucional. A 26 instituição favorece um amparo nesse sentido. Ao mesmo tempo fica implícito que o trabalho asseguraria essas condições e se as tivessem, a saída poderia não ser a instituição. Isso confirma que as vulnerabilidades fazem o idoso pensar voluntariamente na possibilidade da institucionalização. É importante destacar que os princípios existentes em lei nas políticas de assistência ao idoso como apontado no estatuto não abrangem com suficiência a realidade econômica do idoso em questão. O fenômeno da institucionalização surge como uma ou a única saída para esse desfalque financeiro da família. Pode-se também confirmar o que DEBERT (1999) ressalta sobre o significado da aposentadoria para esses idosos que por mais que não tenham gastos, os quais são supridos pela instituição, o dinheiro que possuem acaba sendo destinado para a manutenção da família. 2.3 Vulnerabilidade afetivo- familiar Dentro dos vários arranjos familiares que fazem parte da história de vida do idoso que vai para a instituição asilar, se faz importante compreender como a dinâmica familiar interfere nessa questão. LEME e SILVA (2002) ressaltam a importância da família do ponto de vista da gerontologia. Esses autores analisam a família como sendo “a base e a raiz da estrutura social, pode se inferir que o estudo do relacionamento do idoso com a família é de primordial importância no estudo das peculiaridades da vida e da saúde nesta fase da vida” (LEME e SILVA, 2002, p.92). Analisando esse fragmento de texto, a família representa o ambiente mais íntimo de interações que o idoso tem. É também relevante pensar a família 27 no que se refere ao encontro transgeracional ao serem envolvidos no contexto familiar, os filhos e os netos. Na relação dessas diferentes gerações, questiona-se como o idoso é visto em suas necessidades conforme pontuaram LEME e SILVA (2002, p. 92). Os autores avaliam que o idoso “exige cuidados, têm costumes que se referem a outras épocas, ‘manias’”. “A abertura”, continuam os autores, “particularmente nos jovens, começa quando se reconhecem as diferenças entre as pessoas e se notam as suas necessidades”. Pensando na multiplicidade de arranjos familiares que se formam em função de fatores como econômicos, de relações afetivas e de valores peculiares, por exemplo, algumas vezes o ambiente familiar conduz à não assistência dos idosos. A família que exige que todos os seus membros trabalhem para seu sustento, para ilustrar essa colocação, expõe o idoso a uma situação de vulnerabilidade por não ter a presença de alguém que ofereça atenção às suas necessidades, seja de ordem básica como alimentação, cuidados pessoais ou de ordem afetiva, como companhia de alguém que o acolha. Na instituição pesquisada, percebe-se que a entrada do idoso é mediada por um terceiro, geralmente por um próximo ao idoso, seja familiar, amigo. Com base nestes dados, percebe-se que a questão da escolha pra entrada na instituição muitas vezes não é uma saída natural, mas, uma escolha forçada. Nesta pesquisa os idosos apontam a dificuldade nas relações familiares, no que diz respeito à dificuldade do familiar detectar essa necessidade do idoso e se implicar no cuidado ou assistência a ele. Situações de desamparo são relatadas nos discursos dos idosos: “eu adoeci né e meus familiares não deu conta de olhar pra mim então aí eu tive que procurar um lugar, eu vim aqui e consegui... foi na após a inauguração dessa Casa. (...) é melhor do que lá em casa, por mais que os parentes seja bons não vai parar com a vida deles pra acompanhar a gente.” (S4, idoso) 28 “(...) a filha só vem aqui atrás de dinheiro, quando eu vivia na rua, eles não vinha atrás de mim me ajudar em nada, agora eu tô numa boa aqui, só vem atrás de dinheiro”. (S5, idoso4 4) “(...) estava na casa da filha, não estava em condições de ficar sozinho. Não conseguia ou se esforçava para tomar banho, pois, perdi o equilíbrio do braço” (S6, idoso ) Da mesma forma que esses fatores podem contribuir para a entrada do idoso numa instituição asilar, os laços familiares são imprescindíveis para a saúde do mesmo. Com base nisso, LEME e SILVA (2002) pontuam que “(...) tal realidade social reflete uma realidade mais profunda e pessoal dos idosos como dependentes da estrutura familiar, que representa, muitas vezes, seu mais efetivo vínculo com a saúde e a normalidade”. (LEME e SILVA, 2002 p. 94). Analisando essa fala dos autores, percebe-se que o ambiente familiar de certa forma traz segurança ao idoso por se caracterizar como um local de proteção. Contudo, conforme pontuaram os mesmos autores, “(...) a velhice carrega consigo uma queda geral da capacidade de adaptação. Tal situação ocorre de maneira objetiva nos diferentes sistemas orgânicos do paciente idoso, manifesta-se de maneira ainda mais evidente em suas características psicossociais” (LEME e SILVA, 2002, p. 92). Os autores ressaltam além da dificuldade de adaptação psíquica do idoso frente a fatos que causam impacto como alterações no quadro físico e cognitivo, problemas financeiros, dificuldade de aceitação de certos ambientes, fazem com que haja dificuldade do idoso em adaptar-se socialmente. Na instituição pesquisada, preservar os laços familiares do idoso implica na contribuição para que o mesmo não perca a sua referência primária que é a família. Porém, 4 S5 era antigo morador de rua. 29 mesmo com essa tentativa, fica nítido que a instituição ocupa esse lugar de referência por assumir a responsabilidade de amparo ao idoso. “Percebo assim na totalidade, né, desde a fundação da casa, que eles tem um ganho muito grande, mesmo percebendo o quanto é importante a família, é o lar que eles tinham, né, mas eles mantêm um vínculo dos familiares, da casa, mas, esta instituição ela torna uma casa deles, tanto é, que eles vão pra casa e dizem não deixa de me buscar, a instituição passou a se a referência deles de família de moradia, então eles tiveram muito ganho” (S8, gestora) “(...)tudo foi bom, inclusive eles não desliga a gente da família, né? não desliga pra gente não ficar assim... pensando em família, essas coisas...” (S2, idosa) “(...) inclusive nosso familiares, inclusive lã em casa, se a mulher sai e fala com um filho dela que é pra ir ao teatro, fala assim olha o A que ele ta ruim, se ela fira as costa pra lá, ele vai catar passarinho, vai dançar e vai lá ate hoje eles vão acontece isso, eles não são ruim mas eles tem a vida deles...eles não vão parar...” (S4, idoso) Nos discursos os próprios idosos a manutenção dos laços familiares é relevante mesmo que seja por algum interesse financeiro ou até mesmo afetivo. Muitos laços familiares são rompidos quando o idoso entra na instituição com o histórico de dificuldades nesse sentido, como se pôde perceber na fala do sujeito S2 ao falar dos seus sobrinhos: “(...) depois eles crescem como cresceram hoje, estão todos casados, nenhum lembra de mim, lembra quando me vê...Ah tinha M. pra aqui, tia M. pra lá...quando me vê mas pergunta se algum dá telefonema pra mim? Nenhum não dá...nenhum... (S2, idosa asilada). As vulnerabilidades destacadas por essa investigação parecem, portanto, marcar o idoso institucionalizado, pois as mesmas definem a sua entrada na instituição. É importante ressaltar que as vulnerabilidades compõem um quadro de carência, seja da ordem biológica como também afetiva, ligadas aos laços familiares. 30 No capítulo que se segue serão apresentados os efeitos da instituição na vida do idoso, fazendo um recorte do cenário do idoso marcado por essas vulnerabilidades ao chegar na instituição e outros efeitos que ocorrem ao longo do processo de institucionalização. 31 3 OS EFEITOS DA INSTITUIÇÃO NA VIDA DO IDOSO Falar do idoso em contexto institucional implica em abordar o que se entende por instituição, e também compreender como, no processo de institucionalização, esse idoso pode expressar autonomia através de suas ações, em outras palavras, como ele pode produzir subjetividade. De acordo com CASTORIADIS (1982) uma instituição possui características tanto no aspecto econômico funcional, quanto nos aspectos simbólico e imaginário. O aspecto econômico funcional se caracteriza pela forma como a instituição se organiza para atender às necessidades vitais da comunidade que assiste. Pensando numa instituição asilar, no aspecto econômico funcional, pode-se entender seu papel de oferecer aos seus residentes um acolhimento de forma que satisfaça suas necessidades vitais como alimentação, moradia, promoção à saúde física e mental, dentre outras. Porém, CASTORIADIS (1982) aponta que as instituições não se limitam a essas características, pois, a compreensão sobre a instituição torna-se mais complexa ao serem questionadas quais são as reais necessidades da comunidade que atende. Essas necessidades não se restringem somente ao aspecto biológico, de modo que outros espaços precisam ser preenchidos. CASTORIADIS (1982 ) pontua que: Uma sociedade só pode existir se uma série de funções são constantemente preenchidas (produção, gestação, e educação, gestão da coletividade, resolução dos litígios, etc.) mas ela não se reduz só a isso, nem suas maneiras de encarar seus problemas são ditadas de uma vez por todas por sua “natureza”; ela inventa e define para si mesma tanto novas maneiras de responder às suas necessidades, como novas necessidades. (CASTORIADIS, 1982 p.141) 32 Sendo assim, essas novas necessidades podem ser analisadas também pelo aspecto simbólico que se caracteriza pela presença de símbolos que definem a instituição. Num asilo, é possível inferir que o plano simbólico pode ser localizado nas regras que são colocadas aos residentes, tais como, horários a serem cumpridosou demarcações que fazem com que o local seja apropriado para abrigar os idosos, como a presença de corrimão nos corredores que é um símbolo geralmente presente numa instituição asilar. Outro aspecto apresentado pelo autor é o do imaginário social que se caracteriza pelas representações que são feitas nas relações institucionais. Isso inclui as significações dadas aos símbolos que fazem com que a realidade do residente tenha algum sentido dado por ele. Pensando na instituição asilar, os idosos incorporam valores a partir dos novos símbolos que definem a instituição na qual estão inseridos. Em relação às entrevistas realizadas, foi possível observar a presença das categorias a seguir, que vêm ao encontro da discussão proposta sobre o processo de institucionalização e suas repercussões na vida do idoso. 3.1 Impressões do asilo antes e no decorrer do processo de institucionalização Um cientista social que pesquisou sobre a instituição foi GOFFMAN (2001) que trouxe uma reflexão interessante ao apresentar o conceito de instituição total e suas características. O autor fala das novas identificações que são introjetadas pelo sujeito ao ser admitido numa instituição, pois, a esta possui regras e características de funcionamento. Ao deparar-se com a situação, novas construções terão que ser feitas pelo sujeito, de modo que seu comportamento passe a ser norteado pelas regras institucionais. GOFFMAN (2001, p.27) pontuou que "(...) o processo de admissão numa instituição se dá como despedida e 33 um começo e o ponto médio, a nudez”. Nesse fragmento, o autor discute o que nomeia como “mortificação do eu”, no sentido de que o sujeito chega na instituição com uma série de concepções de si, tomando como referência, até então, o seu mundo doméstico. Porém, no processo de institucionalização, esse sujeito passa a ser orientado com base nos valores institucionais, de modo que ele passa a ser despido dos valores construídos no mundo anterior à instituição. Por essa razão, o autor utiliza o termo “nudez”. De acordo com a análise dos dados, percebe-se que a entrada na instituição gera no sujeito idoso, um sentimento denominado por eles, como estranheza, frente a um novo ambiente e à situação de mudança que gera expectativas. Percebe-se também que no decorrer do processo de institucionalização, há pouca crítica sobre mudanças no espaço físico e dos recursos que a Casa oferece. Este dado remete a categoria a ser analisada sobre a rotina institucional, que de certa forma faz com o idoso se acomode pela limitação dos estímulos, visto que, a rotina se caracteriza pela repetição de tarefas e atitudes. Avaliando sua própria trajetória os idosos falam do impacto da chegada da instituição, eventualmente referindo-se ao “antes” do processo de institucionalização. “No dia que eu cheguei aqui achei muito esquisito, chorei porque vim pra cá, achava que não ia dar certo, a gente chora sabe quando a gente vem para um lugar que não conhece...” (S1, idoso) “A gente quando chega, a gente assim acha estranho né? (...) Adaptação? No começo é igual eu te falei no começo a gente sente que a gente ta acostumado lá na rua né?...” (S3, idoso) Também emerge das falas da administração da instituição asilar, de profissionais e dos próprios idosos o que ocorre durante o processo de institucionalização, enfatizando a necessidade de “adaptação às regras”. “(...) alguns sentem no princípio, dificuldade de adaptação, né?, principalmente caso de rua, por estar lidando com normas rotinas, horários...” (S8, gestora) 34 “(...) mas eu fui conversando com todo mundo ia em um pátio ia num outro, nós conversava e eu fui acostumando (S1, idosa) “ (...) vão para o lugar onde você tem tudo. Só que quando você chega aqui, ele tem que se adequar a uma série de regras”. (S11, psicólogo) É possível perceber na fala dos idosos uma dificuldade inicial de adaptação, justamente por serem remetidos a uma vida anterior coberta por outros valores. Ao falar da “mortificação do eu” GOFFMAN (2001) aponta para um “eu” que passa a ser fragmentado pela interferência dos novos valores que vão se adentrando na vida do sujeito. Na medida em que o sujeito vai se adaptando, a instituição passa a ser concebida de outra forma, pois muitas vezes, representa uma única saída diante das vulnerabilidades que cercam o idoso. Essa única saída, que é a institucionalização, pode ser analisada pela presença do termo “acostumar-se”, presente na maioria das falas dos idosos. Cabe aqui, alinhavar esse processo à uma categoria que remete às novas significações que a instituição passa a ter na vida do idoso. 3.1.1 O significado da instituição para o idoso De acordo com os relatos dos idosos a instituição passa a ter novas significações conforme as representações que fazem da mesma. Isso ocorre a partir da necessidade inicial que os levaram a serem admitidos na instituição. “(...) bom, eu no pensamento entendo como um hospital, sabe, é igual um hospital aqui (...) pelo modo de tratar dos doentes...” (S1, idosa) “(...) sabe porque eu não tive impressão nenhuma, impressão ruim nenhuma porque eu tava disposta mesmo sabe? Inclusive cheguei aqui achei muito bonito, eu não chamo aqui de asilo, eu falo que aqui é Hotel, hotel 5 estrelas” (S2, idosa) 35 A análise desses discursos vem ao encontro do que CASTORIADIS (1982) definiu como plano imaginário da instituição. Os idosos representam a sua realidade de acordo com suas necessidades e expectativas. Ao definir a instituição como um “hospital”, S1 deixou claro na entrevista que o objetivo de estar na instituição foi ser medicada a fim de que os remédios curassem sua anemia. Com isso, S1 descreve a instituição remetendo-a a um contexto hospitalar. Da mesma forma, S2 representa a instituição como um “ hotel 5 estrelas”. No decorrer da entrevista S2 deixou claro que foi para a instituição de livre e espontânea vontade, dizendo que os passeios eram o que mais lhe agradava. Ao ser convidada a esclarecer o significado de “hotel”, S2 respondeu que este representa, para ela, um local que se vai para passear. É importante ressaltar que por mais que os idosos criem uma representação da instituição para lidarem com a realidade, atravessada pela rotina e regras institucionais, é possível perceber que os mesmos fazem distinção entre a instituição e a sua moradia anterior. Sendo assim, o termo “casa” surge em alguns momentos dos discursos dos idosos, ao falarem do acolhimento proporcionado pela instituição, mas em outros momentos este mesmo termo aparece quando se referem aos seus familiares ou a um momento anterior à instituição. 3.2- Rotina institucional: atitudes autônomas ou heterônimas? Fazendo uma reflexão sobre a relação idoso/instituição, é pertinente pensar sobre as significações que são dadas à instituição e qual a visão de ser humano na qual se 36 fundamenta uma política institucional asilar. Para isso é relevante investigar a noção que ambas as partes, idoso e representantes da instituição, tem a respeito da autonomia. Em seu texto, "O papel do sujeito humano na dinâmica social", ENRIQUEZ (2001) aborda a constituição do sujeito através de um processo, mas que antes, o indivíduo se situa dentro de correntes distintas, que são a heteronomia ou a autonomia. A heteronomia, segundo o autor, é a introjeção de regras e valores sociais sem questionamento. Ao contrário, a autonomia seria a tentativa de se ter um olhar fora do contexto em que esse indivíduo está inserido, e que o mesmo possa ter uma visão questionadora do lugar que ocupa dentro dessa dinâmica social. Para tornar-se sujeito, segundo ENRIQUEZ (2001), o indivíduo se posiciona e se questiona frente aos valores transmitidos pela sociedade, deixando de se apresentar como um ser individualizado, diluído numa massificação de pessoas que incorporam tais valores. É a tentativa de se introduzir uma mudança na sua interação com as relações sociais. A partir do momento em que o indivíduo se coloca como sujeito, vai se tornando autônomo, visando a mudança, e se vê num movimento em que sabe que seu lugar de amparo social nunca estará totalmente assegurado. Dentro da perspectiva de ENRIQUEZ (2001), é possível pensar que se o idoso outorga à instituição, a manipulação de suas ações, seus atos, ele não é transformador de sua realidade, conseqüentemente não é sujeito e sim um indivíduo heterônimo. A reprodução de regras implica na falta de atuação e criatividade, o que para ENRIQUEZ (2001) são requisitos para a constituição do sujeito. Sendo assim, ser atuante é provocar mudanças. A rotina institucional pode ser compreendida como situações cotidianas. De acordo com as entrevistas feitas, percebe-se que a rotina institucional é aceita pelo idoso no sentido de que o seu tempo possa ser preenchido para que as horas passem rápido. Alguns idosos 37 usaram o termo “distrair” ao falarem do tempo que precisa passar rápido. Contudo, não há implicação do idoso quando se percebe que certos afazeres como assistir televisão ou até mesmo alguma atividade proposta são realizados como um passatempo. “(...) gosto, tricô, sempre eu tenho uma coisinha pra fazer, né? Então a gente leva o tempo assim, né? 09:30 hs. tem a fruta, e o dia passa assim, a gente sempre tem uma coisinha pra mexer ...então eu passo o dia e quando não tem nada pra mexer...quando chega sextafeira eu fico doida porque a T.O. vai embora...” (S2, idosa) “(...) não, tem outro jeito, né, as horas tem que passar, se for pra gente ficar assim deitado nesse calor cedo, a cama esquenta, mas esquenta mesmo igual a fogo, não tem jeito de ficar parado, então eu durmo mais tarde um pouco”. (S3, idoso) “no grupo do psicólogo, o jornal eu tô ali parado, mas como já tem aquelas coisa antiga, aquelas mesma coisa, eu algum acontecimento do mês, é repetido todo ano, todo mês é os mesmos, eu passo os acontecimento do mês” . (S4, idoso) Percebe-se que nos discursos os idosos transmitem uma posição passiva frente às situações cotidianas, o que revela uma atitude heterônima. Pensando sobre a concepção de autonomia proposta por ENRIQUEZ (2001), é importante fazer um recorte do cenário "idoso institucionalizado", para assim se pensar que esse indivíduo é heterônimo enquanto admitir regras da instituição na qual está inserido, sem questioná-las. Assim como a sociedade, a instituição assume um papel paternalista e acolhedor, e segundo ENRIQUEZ (2001), é mais fácil estar neste lugar a confrontá-lo. Nas palavras do autor “… é mais fácil deixar-se guiar que conduzir sua própria vida, mais fácil imitar que inventar, mais fácil idealizar que sublimar...” (ENRIQUEZ, 2001 p.42). Analisando esse fragmento do autor, é pertinente pensar que a instituição supre possíveis faltas que o sujeito possa apresentar, sendo elas, básicas como já foi comentado no capítulo anterior, ou de ordem afetiva. De certa forma, a instituição responde por esse idoso, pois o mesmo a delegou o cuidado sobre sua vida, sobre suas coisas, até mesmo 38 sobre seus documentos que se remetem à identidade desse sujeito. Dessa forma, é possível pensar que o idoso eventualmente se assujeita na relação com a instituição por ter com ela uma dívida por todo acolhimento que lhe é proporcionado. “(...) toda vida eu fui cozinheira, modéstia à parte, comida muito bem feita... graças a Deus... tudo isso quando eu entrei para aqui acabou minha comida bem feita... Ah! elas vão dizer que eu to querendo mandar... é por isso que eu não falo... ‘ela ta querendo mandar também, ela não é nada, não é diretora, não é nada aqui...’” (S1, idosa) “(...) mas aqui boba é muito, como se diz não precisa de propor nada porque aqui tem tudo, eles são uma pessoa, então não tem nada pra gente falar, tem que fazer isso, tem que fazer aquilo, não, não tem não, aqui ta tudo nos trinques! Ta tudo legal! (... ) Tem que marcar, tem que falar com elas, tem que levar o remédio conforme o dia que a gente ficar lá...tem que avisar, né? Porque eles tem que saber que a gente esta fora, aonde a gente está... com quem está, né? Essa coisa toda... mas isso é bom pra gente também né? (S2, idosa ) Analisando esses discursos é possível perceber que muitas vezes a opinião do idoso não é revelada diretamente por achar que ocupa um lugar que não lhe dá esse direito. Isso demonstra uma posição heterônima. Ao mesmo tempo estar neste lugar de acatar as regras institucionais representa uma dívida com a instituição. Contudo, em alguns momentos estratégias que apontam para a autonomia ocorrem em algumas situações relatadas pelos idosos, dentro dessa perspectiva de ENRIQUEZ (2001). A autonomia passa por diferentes visões, tomando como referência a dinâmica institucional, com a colaboração dos diferentes profissionais que assistem o idoso. No próximo capítulo, será abordada a possibilidade de autonomia dentro da instituição através de estratégias que os idosos encontram que indicam que algo do sujeito precisa reascender, mesmo com todos os atravessamentos institucionais que influenciam na sua identidade. 39 4 AS CATEGORIAS DA AUTONOMIA NOS DIFERENTES DISCURSOS Levando-se em consideração a autonomia nos pontos de vista psicossocial e biomédico, a visão sobre a mesma no presente trabalho vai além do bem-estar orgânico e psíquico para a execução de atividades e da reabilitação do idoso. A autonomia aqui abordada, além da capacidade funcional para o bem-estar do idoso institucionalizado, refere-se à implicação do idoso no seu modo de vida ou se há alguma atuação do mesmo que provoque mudanças em si ou no seu meio. Essa atuação remete à proposta de sujeito trazida por ENRIQUEZ (2001) e a capacidade dos idosos de se contextualizar, problematizar suas relações, ser produtivo, não a partir de uma regra ou discurso institucional, mas, a partir da sua própria subjetividade não assumindo uma posição passiva frente a esse discurso. A seguir, serão apontados discursos de alguns profissionais referente ao que compreendem sobre autonomia. É importante observar que pela atuação da equipe técnica, junto à proposta institucional dentro do discurso do cuidado, é possível mapear as bases da concepção de autonomia que na qual a instituição se apóia. Será pontuado se existe correspondência entre o que a instituição propõe e o que os idosos apontam como estratégia para a obtenção da autonomia. 4.1 A autonomia no discurso biomédico Conforme a visão de PASCHOAL (2002) a autonomia dentro do discurso biomédico se liga à capacidade de decisão do indivíduo sobre seus atos e ao bem estar físico e psíquico 40 para a realização das atividades da vida diária. A independência se liga à capacidade do idoso de se autogerir. “numa instituição, é até difícil a gente falar de autonomia, né, é o que a gente mais preza é a autonomia e independência, é, autonomia a gente procura trabalhar, é, do que no mínimo ele pode realizar, né, se é no vestir se é no auto-cuidado, se é no alimentar se é no sair, fazer alguma coisa, por ele, se ele tiver condição de sair, aqui por perto, de ir em um familiar, então vai depender muito, assim, da condição né, de saúde, emocional é psicológica do idoso, sabe, mas, tem, nós, é trabalhamos voltados para essa autonomia”. (S8, gestora) “(...) a ´C´ mesmo [abreviatura do nome da idosa] ela só fica naquele canto, não faz nada aí eu falo assim: ‘ô filha, cê vai lá arruma a sua cama, arruma ao menos a sua cama que é bom pra você movimentar, né, com as mão e tudo, senão suas mão vão ficar só assim aí né? Tando movimentando é bom pra você, pra cabeça, pras mão, tá fazendo alguma atividade né?’” (S7, cuidadora) “(...) autonomia... é uma pessoa que seja independente...que consegue andar, que consegue alimentar, fazer sua higiene sozinho ou com um pouco de ajuda. Autonomia cognitiva é aquele que vai dar conta de se expressar, quanto a sua vontade, né? Quando ele tem um pouco de lucidez... autonomia afetiva, dar conta dos problemas que está enfrentando...” (S10, médica) Pelas vulnerabilidades do idoso que são atendidas pela instituição, percebe-se que a figura do médico é marcante. A visão sobre a autonomia passa pela questão da reabilitação física e cognitiva, conforme pontuou PASCHOAL (2002), mas existe uma preocupação com o lado psicológico em relação à afetividade. Por essa razão, a equipe técnica trabalha em conjunto e a questão da autonomia passa também pela questão da expressão de desejos e escolhas. 4.2 Autonomia no discurso psicossocial: a subjetividade Ao falar de passividade do idoso frente aos rótulos que lhe são atribuídos, COUTO (1994) pontua que os idosos assumem um caráter de alienação diante da sociedade que os 41 posiciona à margem da mesma, de forma que esse significante passa a ser introjetado pelo idoso. Mesmo o prazer e o desejo, muitas vezes ditados pelo sistema capitalista que os relaciona ao consumo, faz com que o idoso não seja produtivo, conseqüentemente não sirva para consumir. Assim sendo dentro desse ponto de vista, o prazer passa a ser negado ao idoso. Tanto a autonomia, quanto o desejo são fatores chaves no processo de subjetivação do sujeito, em especial, para este trabalho, do idoso institucionalizado. A concepção de subjetividade está intimamente ligada à concepção de sujeito. O verbete “subjetivo” (dicionário Cia Melhoramentos de São Paulo, 1992), é relativo ao sujeito, individual, pessoal, particular, opondo-se ao mundo físico. De acordo com BACELAR (2002), desde a modernidade, a subjetividade é concebida por diferentes áreas do conhecimento como a filosofia, a linguagem, a religião, a economia, dentre outras. A subjetividade então é construída em diferentes contextos, pois liga-se à "(...) mudanças sócio culturais e políticas nas quais o homem atravessa" (BACELAR, 2002 p.66). Por essa razão a subjetividade pode ser vista como um processo, pois o homem é influenciado por sua história, cultura que também influenciam na sua singularidade e espontaneidade. Pensando no processo de subjetivação do ser humano contemporâneo, dentro do contexto de mudanças paradigmáticas, como amostra disso temos a família e a sexualidade. Antigos padrões como o modelo da família nuclear, a heterossexualidade foram sendo desestruturados por diferentes modelos de família e de sexualidade, e esse ser humano passa a ser atravessado por novos valores, como por exemplo, a busca pela unidade política, cultural e econômica dos sujeitos, através da Globalização. Sendo assim, conforme BACELAR (2001) desde que o homem nasce, possui influências da presença do "outro" no 42 seu processo de subjetivação, seja familiares, sistemas políticos, econômicos, culturais, dentre outros. Fazendo um recorte dos idosos institucionalizados que vivem dentro de um universo com determinados valores, situados no contexto institucional, mas também influenciados por uma organização social maior que estabelece políticas que assistem a esta população específica através da criação de um estatuto, este idoso também está num processo de subjetivação. O caráter processual se faz presente na medida que se entende subjetividade como algo que é "(...) contínuo e ininterrupto, abala, destrói, dificulta esse indivíduo, tornado-o diferente, porque assume, introjeta tudo aquilo que, anexado à sua história, o transforma" (BACELAR, 2002, p.81). Fazendo um paralelo com a proposta de ENRIQUEZ (2001), na tentativa de tornar-se autônomo, o idoso tem a possibilidade de transpor seus ideais, sua subjetividade quando conseguir se reconhecer neste espaço enquanto um ser atuante e não mero coadjuvante da dinâmica institucional na qual está inserido. Essa noção de autonomia se faz presente nos seguintes relatos: “Autonomia sobre escolha, sobre desejos dele, sobre falar assim: ‘eu não quero ir ao grupo; eu não quero ir ap passeio; eu não quero ir ao atendimento’. Isso para mim é a maior autonomia.” (S9, assistente social) “Autonomia é aquele sujeito que tem total condição de fazer e da forma que bem entender o que deseja e de ter a liberdade de ir e vir, e ter o direito de questionar quando perceber que algo não condiz com a expectativa e criticar quando é confrontado”. (S11, psicólogo) Analisando esses discursos, percebe-se que por mais que o idoso possa optar por não fazer algo, ele de fato não expõe o que pensa diretamente, pois está entrelaçado à instituição. GOFFMAN (2001) ressalta que as novas identificações do sujeito partem da 43 assimilação do que a instituição deseja. Contudo, o idoso usa algumas estratégias que não garantem a sua autonomia nessa perspectiva, mas elas apontam para a mesma como um movimento instituinte. 4.3 Estratégias que apontam para a autonomia Dentro das pontuações feitas acerca da autonomia nos diferentes discursos e também da subjetividade, é possível pensar em dois movimentos dentro do processo de subjetivação. No sistema político, por exemplo, o sujeito é influenciado a partir de uma condução do seu comportamento frente às leis que determinam sua conduta, sua obediência às mesmas, que possibilitam o convívio social, ou seja, o sujeito é atravessado por uma subjetividade construída sócio-historicamente. O outro movimento seria a própria singularidade do sujeito sendo refletida nas suas ações no mundo. Por essa razão, de acordo com ROLNIK (1997), a subjetivação tem um movimento exterior, sendo influenciada por fatores externos representados pela cultura, política, economia, dentre outros, e fatores internos como o modo de pensar e agir do sujeito que é singular. Dessa forma, "subjetividade é o perfil de um modo de ser, de agir, de sonhar, de amar, etc. - que recorta o espaço, formando um interior e um exterior" ROLNIK (1997, pp. 25-30). Sendo marcante a questão da singularidade ao falar de subjetividade, foi necessário investigar como os próprios idosos lidam com essas questões. Dessa forma, foi possível compreender que por todas as questões institucionais analisadas, a autonomia no aspecto psicossocial, é um movimento instituinte, ou seja, através de estratégias, os idosos tentam transpor sua subjetividade, muitas vezes de forma indireta, seja pela mediação de um profissional, familiar e também de forma direta quando seus valores são confrontados. 44 4.3.1 A mediação do “outro” Por mais que possa parecer contraditório analisar a autonomia pela mediação de um “outro”, pela riqueza dos dados coletados, foi possível compreender que essa mediação é uma estratégia para que algo seja dito por parte do idoso. A própria instituição traz esse movimento, ao compreender a importância de oferecer uma escuta desses idosos através de reuniões com os familiares e através da equipe técnica que nos seus diferentes saberes, possibilita o espaço para que essa escuta aconteça, conforme pontuam os sujeitos: “(...) a gente faz grupos interativos, assembléias com os idosos, né? Seminários, é, abertura da Casa, para estagiários... voluntários, porque, se eles [idosos] sentem retraídos em passar alguma coisa daqui, achando que vai contrariar, vai tá falando alguma coisa que a gente não vai, vamos dizer assim, ficar satisfeito, ele pode ficar inibido de me passar uma reclamação, uma queixa, mas, ele tem um espaço, ou com familiar, por isso que a gente faz reunião com a família mensal, porque o familiar, quando ele sabe alguma coisa que o idoso comenta, ele procura a gente, e essas reuniões com a família já é uma abertura para isso, tá, (...) é uma forma da gente está reavaliando, e então através dessas atividades a gente permitir que o idoso coloque ou pra um ou pra outro alguma coisa que ta insatisfeito...” (S8, gestora) “(...) que organizou essa equipe pra ouvir o pessoal que tava começando aqui eu usei aqui uma pessoa que eu vi, eu notei que eu não tinha condição de falar... então eu escolhi uma pessoa da direção [psicólogo] pra falar pra mim”. (S4, idoso) “(...) às vezes a gente coincide da gente ter que guardar alguma roupa, elas [idosas] começa contando caso ali a gente fica, né? Escuta um pouquinho, né? De cada uma, né? A gente não deixa de escutar não, né? Eu mesma num deixo não. É sempre quando vão conversar eu falo assim ó, depois eu volto aí pra gente contar o caso de novo, né? Mas acaba ficando, né? Pra poder escutar” (S7, cuidadora) Analisando esses discursos, percebe-se que o idoso demanda a escuta, seja através do cuidador ou do profissional. Um dado interessante é a psicologia destacada como referência justamente por ter como instrumento de trabalho, a escuta. Existe a preocupação dos representantes da instituição em oferecer esse espaço, por saber, conforme pontuou a 45 administradora que existe uma resistência por parte do idoso de chegar e falar abertamente. Isso comprova o que GOFFMAN (2001) ressaltou sobre a relação instituição/sujeito. A instituição cria regras e o sujeito as assimila. 4.3.2 Valores confrontados: o sujeito que age Analisando essa categoria, foi possível perceber que de fato existe a “mortificação do eu” que GOFFMAN (2001) conceituou ao falar das novas identificações que ocorrem no sujeito institucionalizado. Contudo, diante de alguns valores essenciais para o idoso, que são confrontados ou ameaçados, algo desse sujeito é transposto através da fala ou atitudes. “(...) colocou no papel lá... constou lá no relatório mas não fala quem que é não (...) Ah! eu não sei apareceu aqui aí eu falei, mas eu quero saber, uma que eu não ia aceitar ninguém me dar banho, falei mesmo, eu não ia aceitar, pôs no relatório aí a toa. Porque eu não aceito mesmo”. (S1, idosa) “(...) e vou.... se caso eles... porque a pessoa já com essa idade ficar detido, sem ter o direito de andar, fazer isso, fazer aquilo, e tal é uma prisão, né?” (S4, idoso) De acordo com as entrevistas, fica claro que certos valores como privacidade ao tomar banho, liberdade de ir e vir, como os demonstrados nos discursos acima, são valores que ao serem confrontados, impelem o sujeito a falar, se expor, não importando com as conseqüências no momento em que falam. De acordo com ENRIQUEZ (2001), transpor os ideais, é uma tentativa que aponta para a autonomia. Inclusive, algumas regras são sutilmente transgredidas. 46 4.3.3 Transgressão de regras A questão da transgressão de regras pode ser compreendida com um subterfúgio diante de um desejo ou da rotina institucional do idoso. Esse movimento diz sobre um lugar do sujeito que quer reascender e aponta para a autonomia. “(...) por aqui não. Eu bebi um golinho [bebida alcóolica] mais foi no dia que fui com a assistente social lá na minha terra ela é da minha terra. Eu tenho uns irmão lá”... (S3, idoso) “(...) na hora que as faxineiras começam a limpeza eu levanto agora eu deito 11 horas, 02 horas, eu fico num vizinho aí entretido lá com o pai da M. [funcionária]” (S4, idoso) Nos relatos o idoso aponta para algo que é “proibido” dentro da instituição que seria o uso de bebida alcoólica. Porém, fora do espaço institucional, a regra é transgredia, pois ele estava sobre a responsabilidade de uma representante da instituição. Outra situação é do idoso que ultrapassa o horário proposto pela instituição, dando prioridade ao entretenimento fora desse espaço. Mesmo sendo a transgressão de regas algo ilícito frente aos valores institucionais, essa categoria lança a problematização de indicadores de que o sujeito institucionalizado se insinua para dizer algo que é implícito e que precisar ser ouvido. Pensando sobre possibilidades, a escuta é algo que realmente merece atenção, levando em consideração que o idoso pode não se sentir à vontade para falar, mas de alguma forma ele age. 47 4.3.4 A autonomia pela produção Sendo esclarecida a importância do processo de subjetivação para entender como se dá a autonomia, é importante também entender a questão da produtividade. No significado de dicionário da língua portuguesa (FERREIRA, 1999), a palavra "produtividade" é derivada de "produzir", que significa gerar, criar, fazer existir, ocasionar. Levando-se em consideração a noção de sujeito autônomo, quando o mesmo passa a causar pela sua produção, passa a modificar seu espaço. Dentro da instituição asilar, a produtividade é uma chave para a autonomia. Segundo BACELAR (2002) a: atividade dever ser de caráter altruísta, visando a uma participação social e não apenas a si mesmo ou a seus familiares(...)Sendo assim, é possível pensar na autonomia do idoso institucionalizado numa repercussão maior, ultrapassando o espaço institucional, pois a mesma esbarra-se nos sistemas políticos, sociais e culturais da sociedade. BACELAR (2002, p.128) A análise das entrevistas trouxe um dado interessante sobre a questão da produtividade ligada à autonomia, sendo que esta última pertence a um histórico de atitudes do sujeito anterior à instituição. Isso quer dizer que se o sujeito foi heterônimo, de certa forma esse comportamento se repete no contexto institucional. Se o sujeito foi agente ou autônomo, esse comportamento tende a repetir-se dentro da instituição. Conforme a fala: “(...) não tolero nada do que vocês julgam que tá mais, eu largava os empregos assim agora, agora, agora e acabou”. (S4, idoso) No relato desse idoso, foi possível perceber um histórico de atitudes autônomas no decorrer de sua vida ocupacional, anterior à sua entrada na instituição. Da mesma forma, o idoso se posiciona de forma autônoma frente a alguns valores. 48 A autonomia pela produção se liga a atividades ocupacionais que acompanharam à vida ativa dos idosos antes do processo de institucionalização. Quando os idosos têm a oportunidade de exercer essas ocupações dentro da instituição, não como cumpridores de uma rotina institucional, mas com sua implicação naquilo que fazem, de certa forma, eles apontam para a autonomia. Conforme as falas: “(...) toda a vida eu fui cozinheira, modéstia parte, comida muito bem feita...graças a Deus (...) a T.O comprava carne tudo, de desejo adorava fazer isso, arrumava tudo muito bem arrumado, temperado, a psiquiatra a médica a assistente social, a coordenadora falava, nossa!! Ta cheirando, eu quero um pedacinho, eu sei arrumar carne muito bem arrumada, temperada, então eu adoro fazer estas coisas, mas agora não tem condições de fazer isso mais “(...) a cozinha é pequena, fica cheia de gente e quer fazer todo mundo tanta coisa, provar um pedacinho, não é bom não”. (S1, idosa) “(...) aqui? Não faço porque não pode. Como se diz não queria perder o hábito. Eu trabalhei no Sarah K., uma vez internou lá uma velhinha parteira, ela tava com 92 anos, então ela já não trabalhava mais, então ela continuava vestindo bonitinha igual ela trabalhava antes... não tirou o uniforme não... ela internou lá pra se cuidar de saúde, mas bonitinha igualmente ela trabalhava nos hospitais. No caso eu tenho vontade de trabalhar aqui, de ajudar as meninas com medicamento, essas coisas mas não pode. Acho difícil porque a gente ta meio debilitada, cansada, né? Mas se eu pudesse, tivesse força ainda eu faria”. (S2, idosa) Através das falas, fica explícito o desejo dos idosos exercerem habilidades que foram constituintes da sua identidade. Porém, são indicadas algumas barreiras, seja por dificuldade de reivindicarem um espaço no caso de S1, ou seja, pelo atravessamento de estereótipos que faz com que a velhice ocupe um lugar à margem, como no caso de S2. Conforme pontuou BACELAR (2002) a produtividade implica numa participação social. Os idosos muitas vezes se vêem limitados em executar atividades restritas ao espaço institucional, o que confirma o que COUTO (1994) pontuou sobre o caráter de alienação dos idosos frente à sociedade que os marginaliza. 49 Contudo, é importante pensar que mudanças podem ocorrer no espaço institucional para que a autonomia não passe somente pela questão física ou cognitiva, mas também pensar na dimensão da autonomia no sentido de que idosos são sujeitos e dentro da perspectiva de ENRIQUEZ (2001), sujeito é ser atuante, transformador. O sujeito é atravessado por uma história de vida, e no espaço institucional essa história não é anulada. Ela aparece mesmo que de forma subentendida. Cabe escutar esses sujeitos. É relevante dizer que a instituição pesquisada segue o caminho por essa escuta, a começar pelos espaços proporcionados para que ela aconteça. Novas possibilidades podem surgir, partindo duma concepção de velhice que não seja reproduzida pelo discurso social da improdutividade conforme pontuou o psicólogo: “(...) o sujeito é capturado por isso, quando a cultura aí intervém não dando ao sujeito a opção de continuar e que resta o lugar da menos valia, que é o lugar da improdutividade, que é o lugar da incapacidade e que necessariamente e culturalmente ele é colocado à margem... (S11, psicólogo) Dessa forma, se faz necessário lançar o olhar para essas estratégias que clamam por um lugar que quer valer, o lugar da subjetividade. 50 CONCLUSÃO A experiência de estar inserida numa instituição e ao mesmo tempo me distanciar para que seja possível ter uma atitude de pesquisadora, foi um desafio. Do lugar de estagiária, sendo representante da instituição, cabe oferecer ao residente um serviço através do qual pode-se assisti-lo e, ao mesmo tempo, marcar a eficiência da instituição por oferecer recursos para tal. Ocupa-se, assim, um lugar em que marcado pelo discurso institucional, que atravessa posturas, verbalizações e ações do pesquisador, por também fazer parte da rotina institucional. Porém, no contato com cada elemento que compõe o cenário da instituição, tanto o espaço físico, quanto os sujeitos, laços foram formados, fazendo aflorar em mim a sensibilidade de enxergá-los com respeito e admiração por fazerem parte do meu aprendizado e crescimento profissional. É, portanto, desse lugar, o de pesquisadora ciente das suas misturas e distanciamentos, que posso dizer que cada relato foi analisado com muito cuidado e respeito, contando com a abertura dada pelos sujeitos pesquisados, que foi essencial para a efetivação dessa pesquisa. É relevante dizer que em muitos momentos fui surpreendida com descobertas que os dados traziam, o que me instigava, cada vez mais, a aprofundar na análise dos mesmos. Porém, pesquisar implica dispor-se, mas ao esbarrar com as limitações de tempo e de outras responsabilidades, foi necessário, nessa pesquisa, fazer escolhas e recortes diante de todo o volume de dados encontrados. Isso dá margem à continuidade de investigações num momento futuro, ampliando os questionamentos levantados nesta investigação. A abertura dada pela instituição para a investigação representa um passo importante na valorização do conhecimento dos seus residentes, oferecendo o espaço para que os mesmos possam reviver recortes de sua história, compondo um cenário que caracteriza a 51 subjetividade, num movimento reflexivo no percurso da vida anterior e o decorrer do processo de institucionalização. Neste percurso, se deparam com o encontro do que foram, são e podem ser. Isso aponta para uma atitude autônoma ao falarem da sua história de vida, ao remanejarem o horário de outras atividades, para darem espaço para que as entrevistas ocorressem, seja negociando horário de almoço ou adiando alguma atividade. Através das observações feitas foi possível perceber o empenho da equipe técnica em proporcionar o espaço para a autonomia. Porém, a mesma é conceituada de acordo com a especificidade de cada área, sendo priorizada a autonomia no discurso biomédico, marcado pela figura do médico. Contudo, foi observado que o idoso assistido demonstra outras necessidades que fez a instituição lançar o olhar para a escuta do sujeito que busca alternativas para falar, mesmo que de forma indireta, sobre seus desejos e até mesmo críticas. A instituição teve o movimento de criar espaço para essa escuta através de reuniões com familiares dos residentes, com os profissionais, o cuidador que se tornou um porta-voz do idoso, observando nele a demanda da escuta, proximidade e conversa. Destaca-se também a mediação do psicólogo pontuada pelos próprios idosos, sendo este referência na construção deste lugar de fala. Foi possível localizar então, a autonomia no discurso psicossocial, que permite identificar que a subjetividade aflora na relação com a instituição e seus diversos atores. Mas o idoso não se expõe diretamente, a não ser pelo uso de estratégias que apontam para a autonomia. Isso pôde ser compreendido pelo alcance do objetivo geral dessa pesquisa que foi conhecer como se estabelece a relação entre idoso e instituição, a partir da hipótese da existência de uma laço muito forte marcado pela submissão do idoso à instituição. Essa 52 submissão se remete ao acolhimento oferecido, ficando aí uma dívida do idoso com a instituição. Na fala de alguns idosos, ficou implícito um certo lugar de impotência frente aos gestores da instituição, pois estes são imaginados como a materialização das regras institucionais. Por isso o idoso fala, mas com o que está próximo de si, que é outro idoso ou familiar, e com um profissional que crie um laço através da escuta. Transgressões de regras, atitudes frente à ameaça aos seus valores e mediação do outro, representam algumas estratégias que fazem reascender o sujeito identificado por uma longa história de vida que não é anulada, mas atravessada pelos valores institucionais que marcam a saída, ou melhor, a única saída que esse sujeito teve diante das vulnerabilidades que o fizeram ir para a instituição. Estas se configuram pela presença de alguma patologia ligada ao estado de saúde ou pela condição econômica ao esbarrarem com o desafio de sobreviver com um salário mínimo da aposentadoria. Por ser uma instituição filantrópica, pressupõe-se que esses idosos são economicamente carentes. Outra vulnerabilidade encontrada foi a afetivo-familiar, que salienta a questão do desamparo que surge pelo “choque” transgeracional ao ser constatado que cada membro possui seus valores e ocupações. Vale ressaltar que a família é uma referência primária que muitas vezes é quebrada pela entrada do idoso na instituição. A tentativa de resgate desses laços no que tange à identidade do idoso é um passo interessante ao ver que a instituição possui trabalhos nesse sentido junto ao serviço social e psicologia. A prova de que o idoso também carrega a sua história é que atitudes autônomas na vida anterior à instituição, tendem a repetir-se no espaço institucional, bem como atitudes heterônimas. Porém, a questão é se de fato esses sujeitos atingem a autonomia. Conforme a análise dos dados, a autonomia no sentido de transpor a subjetividade é um movimento 53 instituinte. As regras institucionais são um padrão de vida no qual o idoso tem que se adequar. Sendo assim, este não é inteiro na exposição de seus pensamentos, atitudes, pois, dessa forma ocuparia um lugar de afronta e ameaça constante à instituição. Então o idoso se cala para que possa se readaptar diante de algo que lhe traga instabilidade. Foi visto que existem possibilidades de diálogo entre o idoso e a instituição no sentido de negociar aquilo que deseja. E esse é um caminho interessante. É importante ressaltar a atenção para a escuta a fim de que as estratégias utilizadas pelos idosos não passem desapercebidas. Elas comunicam um movimento do idoso. Pensando em novas possibilidades de investigação, é interessante refletir sobre uma interlocução maior entre idoso e sociedade, de forma que o idoso ganhe força para confrontar também o discurso e estereótipos culturais sobre o envelhecimento, tais como improdutividade e segregação, conforme pontuaram alguns autores que balizaram este trabalho. Esse discurso é reproduzido em algumas falas dos idosos. As considerações trazidas pela presente pesquisa indicam a possibilidade dos idosos darem continuidade à atividade ocupacional marcada em sua trajetória de vida, através de parcerias ou programas que invistam na autonomia desse sujeito. Um trabalho de pesquisaação poderia ser desenvolvido nesse sentido, marcando novamente a abertura institucional que garantiu a riqueza desta investigação. Indica-se aqui, portanto, um ponto específico para continuidade da pesquisa. A autonomia pode ser compreendida como um movimento constante dos elementos sociais, culturais e políticos, além da vida intrapsíquica do sujeito, pois o mesmo não se fecha, é marcado por construções como visto nas leituras que acompanharam a pesquisa. Ficam algumas indagações. Será então o espaço institucional a única saída para a Terceira Idade? É relevante dizer que idosos com grau elevado de demenciação 54 representam um caso à parte, que merece investigação específica. Pelo comprometimento cognitivo, muitos perdem a própria referência, desafiando o conceito de autonomia aqui enfocado. Com isso, é difícil pensar em atitudes autônomas para além da perspectiva biomédica. Enfim, pensar em novas possibilidades é, sobretudo, “ressignificar” a velhice, repensar a instituição e abrir novos caminhos para a possibilidade da autonomia efetiva desses sujeitos. 55 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BACELAR, Rute. Envelhecimento e Produtividade: processos de subjetivação. 2.ed. Recife: Fundação Antônio dos Santos Abranches- FASA, 2002 BEAVOIR, Simone, de. A velhice. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1990 CASTORIADIS, Coernelius. A Instituição e o Imaginário: Primeira Abordagem. A instituição Imaginária da Sociedade. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.pp. 139-159. COUTO, Sônia Maria de Araújo. A dificuldade de Idosos Asilado relativa à sua autonomia e a possibilidade da reversão de tal quadro . Cadernos de Psicologia, Belo Horizonte: PUC Minas. Departamento de Psicologia. v.2 nº 3.p.37-41, dez,1994. DEBERT, Guita Grin. A Reinvenção da Velhice: socialização e processos de reprivatização do envelhecimento. São Paulo: Edusp-Fapesp, 1999. DEBERT, Guita Grin. Idoso na Mídia, 2002. Texto. Disponível em: http:// www.comciencia.br/reportagens/envelhecimento/texto/envoahtm-30k. Atualizado em 10/09/2002. Acesso em 25/05/05. ENRIQUEZ, Eugène. O Papel do Sujeito Humano na Dinâmica Social. In: MACHADO, Marília Novais da Mata, (orgs). Psicossociologia: Análise Social e Intervenção. Belo Horizonte. Autêntica, 2001. p. 27-44. ESTATUTO DO IDOSO. Disponível em www.setras.ba.gov.br/arquivos/estatutoidosopdf. Acesso em 20/04/05. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda; ANJOS, Margarida dos; FERREIRA, Marina Baird. Aurélio Século XXI: o dicionário da língua portuguesa, 3 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999. GATTO. Izilda, Barros, de. Aspectos Psicológicos do Envelhecimento. In: PAPALÉO NETTO, Gerontologia: A Velhice e o Envelhecimento em Visão Globalizada. São Paulo: Atheneu, 2002. p.109-113. GOFFMAN, Erving. Manicômios, prisões e Conventos. 7a ed. São Paulo, Perspectiva, 2001. LEME, Luis Eugênio Garcez. SILVA, Paulo Sérgio Carvalho Pereira da. O Idoso e a Família. In: PAPALÉO NETTO, Gerontologia: A Velhice e o Envelhecimento em Visão Globalizada. São Paulo, Atheneu, 2002. p.92-97. MELHORAMENTOS, Cia. São Paulo. Melhoramentos Mini Dicionário da Língua Portuguesa. 1ª Ed. São Paulo: Melhoramentos, 1992. 56 MORAGAS, Moragas, Ricardo. Gerontologia Social: envelhecimento e qualidade de vida. São Paulo: Paulinas, 1997. MUCIDA, Ângela. O sujeito não Envelhece: psicanálise e velhice. Belo Horizonte: Autêntica, 2004 PASCHOAL, Sérgio Márcio Pacheco. Autonomia e Independência. In: PAPALÉO NETTO, Gerontologia: A Velhice e o Envelhecimento em Visão Globalizada. São Paulo: Atheneu, 2002. p.313-323. PEREIRA, Rute, Santos. et.al. Terceira Idade: a construção de novas propostas sociais. Artigo apresentado à disciplina de estágio supervisionado II da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Unidade São Gabriel, Belo Horizonte: 2002. Mimeografado p.01-13. PEREIRA, Rute, Santos. et al. A violência Doméstica na Terceira Idade. Artigo apresentado à disciplina de estágio supervisionado IV da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Unidade São Gabriel, Belo Horizonte: 2003. Mimeografado p.01-11. SARTINI, Cristina. Relatório das visitas às instituições filantrópicas de longa permanência para idosos em Belo Horizonte: atenção à saúde do idoso. Secretaria Municipal de Saúde de Belo Horizonte. Belo Horizonte, 2003 p. 1-11 SILLAMY, Norbert. Dicionário de Psicologia Larousse; trad. Francisco Franke Settineri. Porto Alegre: Artmed, 1998 p-213-214 ROLNIK, Suely. Uma Insólita Viagem à Subjetividade: Fronteiras com a Ética e a Cultura. In LINS, Daniel (org.) Cultura e Subjetividade: Saberes Nômades. Campinas: Papirus, 1997. 57 ANEXO I CARTA DE APRESENTAÇÃO E ROTEIROS DE ENTREVISTA TÍTULO DO PROJETO: SER OU NÃO SER SUJEITO? REFLEXÕES ACERCA DA AUTONOMIA DO IDOSO INSTITUCIONALIZADO. Esta pesquisa diz respeito ao trabalho monográfico de final de curso da aluna Rute Santos Pereira, graduanda do 9º período de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Unidade São Gabriel. O objetivo deste estudo é conhecer como se estabelece a relação entre o idoso e instituição a partir das representações que se tem sobre o modelo de política asilar e sobre a noção de autonomia dos sujeitos envolvidos neste contexto. Para tanto, são propostas entrevistas semi-dirigidas com idosos, profissionais da equipe técnica, coordenação e cuidadores da instituição. É importante ressaltar que a pesquisa é de base qualitativa com a finalidade de responder questões específicas como citadas no objetivo acima. De todo material colhido será preservado sigilo e as entrevistas serão feitas voluntariamente. Os registros serão analisados e publicados no trabalho monográfico, não sendo os sujeitos identificados. Esta pesquisa é uma prática investigativa que irá contribuir para um melhor entendimento do idoso no processo de institucionalização. Abaixo segue o roteiro de entrevista: IDOSOS: 1- Como você veio para a instituição? (impressões iniciais da instituição, dos idosos, da Casa e dos profissionais). Quais as impressões atualmente sobre os idosos e os profissionais da instituição? 2- Como é a sua rotina dentro da instituição? Realiza atividades? Quais? O que você mais gosta de fazer? O que menos gosta de fazer? O que você gostaria de fazer e não faz? 3- Se fosse mudar a sua rotina da Casa, o que proporia? 4- Você tem acesso a vida fora do asilo? (familiares, amigos, etc). 58 5- O que a instituição significa para você? CUIDADORES: 1- Como você vê o idoso na instituição? 2- Como é o cuidar do idoso, em sua rotina de trabalho? 3- O que você entende por autonomia em relação ao idoso? 4- Como você contribui com o seu trabalho para ajudar o idoso preservando a sua autonomia? TÉCNICOS: 1- Como você vê o idoso na instituição? O que você entende por envelhecimento? 2- Como é a sua rotina de trabalho? 3- Como a sua intervenção contribui para oferecer assistência ao idoso? 4- O que você entende por autonomia em relação ao idoso? Como a sua profissão contribui para isso? COORDENAÇÃO: 1- Como a instituição vê o idoso? 2- Quais os efeitos da instituição na vida do idoso? 3- Como a instituição promove o espaço para o idoso expor as suas opiniões, desejos? 4- Como a instituição acolhe a demanda do idoso? 5- Quais as ferramentas que a instituição disponibiliza para a qualidade de vida do idoso, preservando a sua autonomia? 59 ANEXO II TERMO DE CONSENTIMENTO Você está convidado(a) a participar da pesquisa para trabalho monográfico de final de curso da aluna Rute Santos Pereira, graduanda do 9º período de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Unidade São Gabriel. O objetivo deste estudo é conhecer como se estabelece a relação entre o idoso e instituição a partir das representações que se tem sobre o modelo de política asilar e sobre a noção de autonomia dos sujeitos envolvidos neste contexto. Para tanto, são propostas entrevistas semi-dirigidas com idosos, profissionais da equipe técnica, coordenação e cuidadores da instituição. Se concordarem participar deste estudo você será solicitado a responder a uma entrevista semi-dirigida, cujos dados obtidos serão analisados e publicados em trabalho monográfico. Você não será identificado quando o material de seu registro for utilizado. A participação neste estudo é voluntária. Você tem o direito de não querer participar ou sair deste estudo a qualquer momento. Você receberá uma cópia deste termo onde consta o telefone do pesquisador principal, podendo tirar suas dúvidas sobre o projeto e sua participação, em qualquer momento. Declaro que tive tempo suficiente para ler e entender as informações acima. Declaro também que toda linguagem técnica utilizada na descrição deste estudo de pesquisa foi satisfatoriamente explicada e que recebi respostas para todas as minhas dúvidas. Confirmo que recebi uma cópia do formulário de consentimento. Compreendo que sou livre para me retirar do estudo a qualquer momento. Dou consentimento de livre e espontânea vontade para participar como contribuinte desse estudo. _________________________________ Nome do participante _________________________________ Assinatura do participante ou representante legal Data, ___/___/___. 60 Atesto que expliquei cuidadosamente a natureza e o objetivo deste estudo, os possíveis riscos e benefícios e passando o mesmo, junto ao participante e/ou seu representante autorizado. Acredito que o participante e/ou seu representante recebeu todas informações necessárias, que foram fornecidas em uma linguagem adequada e compreensiva e que ele/ela compreendeu esta explicação. __________________________________ Assinatura do pesquisador Tel. 3435-2986 Data,___/___/___.