dobras
20
2011
VERVE: Revista Semestral do NU-SOL - Núcleo de Sociabilidade Libertária/
Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais, PUC-SP.
Nº20 ( Outubro 2011 - ). - São Paulo: o Programa, 2011 semestral
1. Ciências Humanas - Periódicos. 2. Anarquismo. 3. Abolicio­nismo Penal.
I. Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Programa de Estudos
Pós-Graduados em Ciências Sociais.
ISSN 1676-9090
VERVE é uma publicação do Nu-Sol – Núcleo de Sociabilidade Libertária
do Programa de Estudos Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP
(coordenadores: Silvia Helena Simões Borelli e Edison Nunes); indexada no
Portal de Revistas Eletrônicas da PUC-SP, no Portal de Periódicos Capes e
catalogada na Library of Congress, dos Estados Unidos.
Editoria
Nu-Sol – Núcleo de Sociabilidade Libertária.
Nu-Sol
Acácio Augusto, Aline Passos, Anamaria Salles, Andre Degenszajn, Beatriz
Scigliano Carneiro, Edson Passetti (coordenador), Eliane Knorr de Carvalho,
Gustavo Ferreira Simões, Gustavo Ramus, Leandro Alberto de Paiva Siqueira,
Lúcia Soares da Silva, Luíza Uehara, Maria Cecília da S. Oliveira, Rogério H.
Z. Nascimento, Salete Oliveira, Sofia Osório, Thiago M. S. Rodrigues.
Conselho Editorial
Alfredo Veiga-Neto (UFRGS), Cecilia Coimbra (UFF e Grupo Tortura Nunca
Mais/RJ), Christina Lopreato (UFU), Clovis N. Kassick (UFSC), Doris
Accioly (USP), Guilherme Castelo Branco (UFRJ), Heliana de Barros Conde
Rodrigues (UERJ), Margareth Rago (Unicamp), Rogério H. Z. Nascimento
(UFPB), Silvana Tótora (PUC-SP).
Conselho Consultivo
Christian Ferrer (Universidade de Buenos Aires), Dorothea V. Passetti (PUCSP), Heleusa F. Câmara (UESB), João da Mata (SOMA), José Carlos Morel
(Centro de Cultura Social – CSS/SP), José Eduardo Azevedo (Unip), José
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Karam, Nelson Méndez (Universidade de Caracas), Pietro Ferrua (CIRA –
Centre Internationale de Recherses sur l’ Anarchisme), Robson Achiamé
(Editor), Silvio Gallo (Unicamp), Stéfanis Caiaffo (Unifesp),Vera Malaguti
Batista (Instituto Carioca de Criminologia).
ISSN 1676-9090
verve
revista de atitudes. transita por limiares e instantes arruinadores de hierarquias. nela, não
há dono, chefe, senhor, contador ou programador. verve é parte de uma associação livre
formada por pessoas diferentes na igualdade.
amigos. vive por si, para uns. instala-se numa
universidade que alimenta o fogo da liberdade.
verve é uma labareda que lambe corpos, gestos,
movimentos e fluxos, como ardentia. ela agita
liberações. atiça-me!
verve é uma revista semestral do nu-sol que
estuda, pesquisa, publica, edita, grava e faz
anarquias e abolicionismo penal.
sumário
Louise Michel:
226 diante do juiz, coragem e insubmissão
Nu-Sol
230 Julgamento de Louise Michel
235
Flecheira libertária, segunda seleta
Nu-Sol
Na velocidade da web,
245 o que é tragado e o que permanece
Acácio Augusto
Roberto Freire
uma existência libertária
252
Gustavo Simões e Gustavo Ramus,
João da Mata, Vera Schroeder
verve 20 continua atravessando o papel.
segue em dobras; e nos fluxos eletrônicos,
abre outras conversas e modos
de ler e ver.
a atualidade da comuna de paris emerge novamente pela
voz insurreta de louise michel, brava e corajosa, enfrentando o juiz e a condenação de uma sociedade assassina.
louise, aqui, e sébastien faure, na verve impressa, afirmam
o que de anarquista cortou a comuna.
nova seleta de flechas publicadas semanalmente pelo nu-sol expõe potências libertárias
diante dos militarismos, conservadorismos, terrorismos e
violências que marcaram o semestre que passou.
com fúria & ruídos, acácio augusto desdobra
sua nota impressa em verve sobre redson, a banda cólera e
os começos do anarco-punk no brasil.
a vida sensualizada de roberto freire se exibe quente e libertária, com imagens e palavras, olhares e perspectivas,
por gustavo simões, gustavo ramus, vera schroeder e joão
da mata.
assim, flui
verve dobras continua atravessando os fluxos eletrônicos.
segue na folha impressa de verve 20;
do aqui e do acolá;
e apartando-se da fixidez
atreve-se na fluidez vibrante do entre.
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2011
Louise Michel:
diante do juiz, coragem e insubmissão
nu-sol
Julgada pela sua ativa presença na Comuna de Paris, em
1871, Louise Michel foi deportada, em 1873, para a distante
colônia francesa da Nova Caledônia. Após o poema em verve
dobras 19, pelo qual Louise Michel, destemida e forte, enfrentou seus juízes, esse número traz outro instantâneo de
seu julgamento. Trata-se da transcrição do interrogatório
de Louise Michel pelo juiz do tribunal do 6° Conselho
de Guerra, “Le jugement de Louise Michel” [“O julgamento
de Louise Michel”], no qual ela segue no tom corajoso e
desafiador, negando-se a aceitar a justiça daquela corte.
Seu desacato à instância do tribunal culmina ao ponto de
Louise Michel, diante da tentativa de extração de confissão, arrependimento e resignação, afirmar que se eles
não a fuzilarem é porque são uns frouxos. Esse texto foi
editado, em 1880, como uma brochura chamada “Louise
Michel devant le 6e conseil de guerre” [“Louise Michel
diante do 6º conselho de guerra”], pelo jornal Le Citoyen [O
Cidadão], que se apresentava como um “diário radical, socialista e político”.
226
verve dobras, 20: 226-227, 2011
verve dobras
Louise Michel: diante do juiz, coragem e insubmissão
Neste ano, o governo da Terceira República francesa
(1870-1940) anistiou os communards condenados quase
uma década antes. No entanto, os anos de prisão e exílio
os tinham deixado em situação muito difícil. Por isso, o
Le Citoyen começou uma campanha para a arrecadação
de fundos destinados aos communards a partir da venda de
brochuras como essa. Um registro de um momento de inflexão do movimento anarquista e socialista europeu, que
mostra a coragem de lutadores como Louise Michel e o
medo que os governos tinham dessas existências inquebráveis. Situa uma prática utilizada pelos anarquistas no
final de século XIX: explicitar, no tribunal, o direito como
campo de batalha assimétrico e a justiça criminal como
via de extermínio das classes populares, seja pela condenação direta, seja pelo deixar morrer ao admitir a volta de
desterrados que haviam perdido tudo com o massacre da
Comuna de Paris (1871).
Além disso, a anistia do governo francês não prescindiu
da continuidade da repressão a socialistas e anarquistas,
produzindo um ambiente político sufocante, complementado pelas acomodações de forças em partidos amansados
e sindicatos voltados às negociatas com capitalistas e governo.
Foi nessa França, de perseguições e reações conservadoras, que Louise Michel voltou a viver, não se conformando
ao papel de anistiada que abandonou suas lutas, tampouco
aderindo aos lugares pacificados nos partidos e sindicatos.
Ao contrário, seguiu escrevendo, ensinando, discursando,
discutindo. Enquanto isso, outros anarquistas, jovens e insurretos, negaram com contundência a adesão ou o conformismo lançando-se ao terrorismo contra o Estado e a sociedade.
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2011
Quando Louise Michel morreu, em 1905, a França –
como outros países na Europa e, mesmo, nas Américas –
já havia tremido após mais de duas décadas de atentados
anarcoterroristas. A bravura de gente livre como Louise
Michel seguiu vibrando, nesses anos conservadores, pelo
destemor de homens como Ravachol (1859-1892) e Émile
Henry (1872-1894), que mostraram com a “voz da dinamite”, como disse Henry, que a verve libertária encontraria
– ou explodiria – brechas para seguir viva e indomesticável.
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20
2011
Julgamento de Louise Michel
Presidência do Coronel Delaporte1
Os jornais da época descreviam assim esse julgamento:
“Esse caso foi um dos mais originais que se desenrolaram diante dos conselhos de guerra; a acusada é uma
mulher inteligente; recebeu mesmo uma educação e instrução superiores, como o relatório constata.”
Eis seu retrato:
“Trinta e seis anos; cabeleira abundante e negra; testa
descoberta, olhar brilhante, nariz afilado, sorriso sarcástico; essa é, em resumo, Louise Michel.”
Esse retrato é exato.
Durante a leitura do relatório, ela ergue a cabeça e olha
fixamente o escrevente.
O relatório enumera as acusações que pesam sobre a
acusada:
1º Atentado visando mudar a forma do governo;
2º Incitação à guerra civil;
3º Porte de armas aparentes e de uniforme militar; uso
dessas armas;
4º Falsificação de documento particular por usurpação
de identidade;
5º Uso de um documento falso;
230
verve dobras, 20: 230-234, 2011
verve dobras
Julgamento de Louise Michel
6º Cumplicidade, por provocação e maquinação, em
assassinato de pessoas retidas, por assim dizer, como reféns pela Comuna;
7º Cumplicidade em prisões ilegais seguidas de torturas e de morte, assistindo, com conhecimento de causa, os
autores da ação nos fatos que eles consumaram.
Interrogatório
Presidente – A senhora escutou os fatos que pesam
contra si. Como responde a isso?
L. Michel – Não quero nem me defender nem ser defendida; pertenço à Revolução social e aceito a responsabilidade pelos meus atos! Quanto ao assassinato do general
Lecomte, confesso que teria atirado no general se eu estivesse presente quando ele ordenou que se abrisse fogo
contra o povo; mas, uma vez tendo se tornado nosso prisioneiro, sua pessoa era sagrada.
Sou acusada de ter proposto o incêndio de Paris. Sim,
eu queria opor uma barricada de chamas contra o exército
de Versalhes! Eis porque propus incendiar Paris.
Aceito inteiramente a responsabilidade por essa proposta e declaro em alta voz que eu não tinha cúmplices.
Sou a única que deve ser responsabilizada. Quanto a ser
cúmplice dos atos da Comuna, eu o sou, pois a Comuna
queria a Revolução e eu a queria também. Mas declaro
que a Comuna não pode ser responsabilizada pelos incêndios e o assassinato dos reféns; os assassinos são agentes
de polícia que se escondem, e que talvez, um dia, sejam
231
20
2011
descobertos! Assisti a algumas sessões da Comuna, e juro
que nelas nunca foram discutidos assassinatos ou incêndios. Confesso que propus a Ferré2 que invadíssemos a
Assembleia de Versalhes; e lamento que Ferré não tenha
aceito minha proposta; mas, com a invasão da Assembleia,
eu desejava fazer somente duas vítimas: o Sr. Thiers3 e eu!
Estava oferecendo minha vida em sacrifício.
Presidente – Em uma de suas declarações, a senhora
propôs que a cada vinte e quatro horas fosse fuzilado um
refém importante.
L. Michel – Isso não é exato; eu propus apenas que
se ameaçasse fuzilar os reféns, o que é muito diferente.
Em primeiro lugar, repito que não quero me defender. Os
senhores têm o rosto descoberto, eu também. Eu os olho
face a face: os senhores são o conselho de guerra, eu sou
uma mulher da Revolução social!
Defender-me... serve de quê? Isso não mudaria em nada
sua sentença. Estou em suas mãos, os senhores têm posse total de minha pessoa; façam de mim o que desejarem.
Mas, antes de me sentar, faço questão de glorificar a memória daqueles que acabaram de ser fuzilados em Satory!
Sim!... eu o saúdo bem alto: são mártires da Revolução
da qual me vanglorio ser uma das promotoras.
Louise Michel pronuncia essas últimas palavras com força.
Mestre Marchand, o defensor, declara que como a acusada
não quer ser defendida, ele respeita sua vontade.
232
verve dobras
Julgamento de Louise Michel
Presidente – A senhora tem algo que queira acrescentar à sua defesa?
L. Michel – Uma única palavra. Não para me defender,
mas para reclamar que os senhores me julguem definitivamente por decreto irrevogável. Os senhores não devem
me deixar viver; pois, enquanto eu viver, irei persegui-los
com meu ódio, e incitarei meus irmãos à vingança!
O que reclamo dos senhores é um lugar na planície de
Satory junto a meus irmãos, ao lado de nosso caro Ferré!...
Se os senhores não me fuzilarem, serão covardes!
Nesse momento, o presidente detém a acusada e se retira à
sala das deliberações, Após um quarto de hora de espera, o conselho condena Louise Michel à deportação numa prisão fortificada.
Este relatório tendo sido submetido a L. Michel, ela acrescenta de seu próprio punho:
“Esses senhores esqueceram que eu denunciei a Comissão de
Misericórdia à justiça da humanidade, à vingança de nossos
irmãos”.
Tradução do francês por Martha Gambini.
Notas
A tradução foi realizada a partir do fac-símile disponível no site da Biblioteca Nacional da França em: http://gallica.bnf.fr/ark:/12148/bpt6k5473161v.
r=louise+michel.langPT, do qual se reproduz a capa (N.E.).
1
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2011
2
Théophile Ferré (1846-1871) foi poeta, escritor e ativo defensor libertário
da Comuna de Paris. Preso com a derrota da Comuna, em 1871, Ferré foi
julgado por ter ordenado a execução, dentre outros, do arcebispo de Paris,
em retaliação ao assassinato de homens e mulheres pelas tropas francesas
apoiadas pelos prussianos. Condenado à morte, foi fuzilado no quartel de
Satory, próximo a Paris. Ferré e Louise Michel conheceram-se na luta da
Comuna e viveram uma intensa paixão em meio à experiência communard
(N.E.).
Louis-Adolphe Thiers (1797-1877) foi primeiro-ministro no reinado de
Napoleão III e, quando da derrota francesa diante do exército prussiano, em
1870, assumiu como presidente negociando com os vencedores. Foi Thiers
quem acertou o apoio das forças prussianas para reprimir violentamente a
Comuna de Paris, em 1871. Manteve a presidência do país até 1873, período no qual ordenou o julgamento de communards que os levou ao exílio, à
prisão ou ao pelotão de fuzilamento (N.E.).
3
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verve dobras
Flecheira libertária, segunda seleta
flecheira libertária, segunda seleta
nu-sol
A segunda seleta das flecheiras libertárias em verve dobras
reúne comentários do Nu-Sol sobre acontecimentos no
planeta, publicados entre abril e setembro de 2011. Produzidos no calor, no fogo dos momentos, os breves textos
afirmam uma perspectiva de análise anarquista e abolicionista penal libertária da vida e de seus embates.
A seleta reúne textos que problematizam as datas cívicas e seus agenciamentos políticos, como o 1º de maio
e os 25 anos do acidente nuclear de Chernobyl. Diante
do assassinato de Osama Bin Laden ou das dezenas de
crianças em escola no Realengo, Rio de Janeiro, as flechas
interpelam as guerras e as campanhas de desarmamento
– que seguem complementares à incessante produção da
indústria bélica – afirmando o contundente antimilitarismo anarquista. As marchas pela descriminalização da maconha, no Brasil, e as manifestações de jovens na Espanha
ou Inglaterra foram confrontadas com as insurreições do
maio de 68, explicitando o tom modorrento, morno e conservador desses contemporâneos protestos, mas, também,
verve dobras, 20: 235-244, 2011
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2011
a potência de jovens libertários que seguem acesos, atentos e vivos.
Publicada todas as terças-feiras, a flecheira libertária
atiça a atenção libertária ao agora, produzindo uma ágil
e forte história do presente. Procura, assim, evitar que as
lutas se pacifiquem, estanquem ou decantem. Essa segunda seleta da flecheira libertária pretende atiçar acontecimentos, de novo, mas desde outra perspectiva, convidando
para leitura em um novo espaço, num outro tempo.
Atiçando o agora, flechas são lançadas nos fluxos eletrônicos.
As flechas vivas têm alvo.
236
verve dobras
Flecheira libertária, segunda seleta
memória ossificada
O primeiro de maio é uma data que marca a luta dos trabalhadores de Chicago, quando oito dos nossos foram executados pelo governo. O que deve ser lembrado é a luta, não
sem dores, dos que se dispuseram a enfrentar os patrões, a
polícia, o Estado e a parte da sociedade que queriam vê-los
morrer dóceis no interior das fábricas. Exercitava-se, na
fábrica, a disciplina, mas os que a recusaram fizeram do
local de trabalho um espaço de resistência. Relembrar essa
coragem, no entanto, vem acompanhado, hoje em dia, do
inevitável questionamento: onde estão essas lutas e o que
se faz nos locais onde se exerce o controle hoje?
debaixo do tapete ‘verde’
25 anos depois do acidente nuclear, Chernobyl abriu-se
para o turismo. A radiação continuará intensa por milhares
de anos, a visitação em alguns locais não pode ultrapassar
quinze minutos. No entanto, deu-se grande destaque à volta dos animais selvagens à região das florestas radioativas,
especialmente na Floresta Vermelha, que reaparece com
ares de santuário de um “milagre ecológico”. Esta floresta
fora cortada e enterrada a metros de profundidade quando
a contaminação da nuvem radioativa espalhada com o acidente fez com que as folhas das árvores ficassem vermelhas.
Os animais do “milagre” contam, porém, com altos índices
de radiação. As raízes das novas árvores estão levando a radioatividade de volta à superfície. Não adianta varrer partículas radioativas que escaparam dos procedimentos para
baixo de um tapetinho verde para consolar. A decisão para
usá-las é que precisa ser varrida dos procedimentos técnicos.
[ n. 202, 3 de maio de 2011].
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osama morto: justiça para quem precisa
Obama veio à televisão e anunciou: “Osama está morto,
foi feita a Justiça”. De imediato, estadunidenses foram às
ruas, com seus bonés e loiras-líderes-de-torcida, para celebrar a vingança. Passado um pouco o barulho, alguns
“críticos” denunciaram como os EUA teriam violado o
direito internacional: ignoraram a soberania do Paquistão
e eliminaram pessoas sem o chamado devido processo legal. Ora, o que comentar sobre a “soberania do Paquistão”,
uma ditadura militar sustentada pelos Estados Unidos?
E o que dizer sobre o “direito”? Os EUA se apresentam
como um país cioso de suas instituições e leis republicanas, dentre as quais se destacam a igualdade formal dos
cidadãos e a observação dos ritos judiciais. Mas não se
pode esquecer que os estadunidenses crêem ser um povo
ungido por Deus cujo destino manifesto é ser grande na
defesa da liberdade.
osama morto: justiça para quem precisa 2
Os estadunidenses acreditam que a Justiça está com eles e
que as instituições devem servir ao cidadão na realização
dessa Justiça. Por isso, se o direito internacional não prevê
a chamada guerra ao terror, o problema está no direito
internacional. Por isso, o assassinato de Osama é a consecução da Justiça. E o direito? Ele pode vir depois, legalizando o que a política instaura. Os milhares de filmes
de Hollywood que celebram o tribunal convivem com as
outras milhares de fitas estreladas por honrados Charles
Bronson e John Wayne, autorizados pela moral a fazer
Justiça com as próprias mãos.
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verve dobras
Flecheira libertária, segunda seleta
tortura reloaded
Enquanto Obama une cidadãos estadunidenses e divide
comentaristas no mundo todo sobre a justiça e legalidade
no assassinato de Osama, presta um grande serviço para
a legitimação da tortura. Junto com isso, redime seu antecessor e a estratégia que sustentou a guerra ao terror. A
prática da tortura por Estados não é novidade nem aqui,
nem ali. O que o governo Bush procurou orquestrar foi a
legalização da tortura como o mal menor na caça aos terroristas. Obama foi eleito com o discurso de fechamento
de Guantánamo e proibição da tortura (sic). Guantánamo
segue, Obama segue, a tortura segue. E o terrorismo?
fechem as portas... das fábricas de armas!
O Ministério da Justiça decidiu adiantar a nova campanha
pelo desarmamento depois dos assassinatos cometidos pelo
serial killer tupiniquim do Realengo. Promete-se anonimato e recompensa financeira para quem entregar suas armas.
Fala-se na necessidade em aplicar para valer o Estatuto do
Desarmamento, proibindo a venda de armas e controlando
melhor as fronteiras do Brasil para evitar o contrabando.
Ninguém fala, no entanto, da produção mundial de armas:
dos bilhões de dólares gerados anualmente pela indústria bélica e do volume de armas leves e pesadas que excede todos
os orçamentos militares do planeta. Ninguém ousa falar no
fim do maior negócio do mundo, ao lado do narcotráfico.
Afinal, as armas são necessárias para que continue existindo
o Estado, o regime da propriedade, a economia globalizada.
Quem acha bacana o Estatuto do Desarmamento deveria
se perguntar: pra que serve uma arma? É difícil a resposta?
[n. 203, 10 de maio de 2011]
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mais praças, mais emprego, mais democracia, mais...
No centro de Barcelona e de Madri, em suas praças principais, concentram-se centenas de jovens que lá acampavam
para protestar contra a crise e pedir mais emprego e “democracia real”. O governo catalão decidiu “higienizar” a praça
com uma ação truculenta da polícia com o objetivo de deixar o local “limpo” para a celebração da vitória da Copa dos
Campeões pelo Barcelona. Além de ferir pessoas e destruir
barracas, a polícia tomou equipamentos de comunicação e
informática, utilizados pelos indignados para dar visibilidade
ao movimento por meio de redes sociais, blogs e o YouTube.
Os manifestantes não deixaram a praça e mobilizaram-se
para protestar em outras praças da Espanha e de outros países. Apressados articulistas já comparam o que ocorre na praça da Catalunha com o Maio de 68. Esquecem-se que aquela
juventude queria tudo e mais que emprego e democracia.
89, 99. século XXI?
O que mais é elogiado e comemorado por comentaristas
de jornal é que o 15M possui uma pauta clara de reivindicações e faz uso da internet, celular e redes sociais digitais
como efeito de um movimento novo, não atrelado a partidos e sindicatos. Alguns falam da chegada das revoluções
árabes na Europa. Diante de uma pauta que pede emprego,
separação de poderes e democratização das instituições
do Estado, não há o que buscar em 1968. Chamar isso de
revolução é fazer eco ao argumento liberal das chamadas
revoluções de veludo, na época, para designar o esgotamento do mundo socialista.
[n. 206, 31 de maio de 2011]
240
verve dobras
Flecheira libertária, segunda seleta
a caminho da institucionalização
A marcha pela maconha obteve do Supremo Tribunal
Federal autorização para desfilar. Todavia, setores religiosos e organizações internacionais contra o uso livre
de substâncias não recomendadas pelos proprietários da
saúde e da farmacologia vão pondo a cabecinha para fora,
tentando inviabilizar qualquer mudança. Pronunciam-se
favoráveis à livre manifestação de ideias e, como todos
conservadores, são adeptos de ideias que não produzam
práticas inovadoras. São os defensores da liberdade que
lhes satisfazem: deixar tudo proibido.
um trajeto de mudança
Está aí uma ótima oportunidade para os defensores da
descriminalização da maconha ampliarem seu objetivo
restrito e proporem a liberação das drogas. Aglutinarão
mais e mais pessoas que não dependem do aval médico e
psiquiátrico para saborearem estados alterados. Todavia,
aceitando autorizações de superiores, terão de negociar
com outras autoridades morais para tentar obter uma descriminalização restrita à terapia e ao julgamento de juízes
a respeito de quem é usuário e traficante.
diante de outros percursos
Se a marcha se transformar em movimento, será possível
problematizar o tráfico, a lavagem de dinheiro, a moral
proibicionista, a liberdade de proibir... Quanto ao possível
crescimento do consumo com a ampla liberação, ou somente com a descriminalização da maconha, isso é apenas
efeito dos negócios capitalistas: não há capitalismo sem
241
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2011
consumo ampliado. O argumento dos puritanos e moralistas é frouxo, como sempre! A coragem dos abolicionistas da proibição é incomensurável: não se conforma nas
fronteiras dos marchadores.
god save the queen
Em abril, antes do casamento real, a polícia invadiu espaços
anarquistas na cidade de Londres e mais de 20 jovens foram
presos. Agora, no mês de agosto, um aviso antiterrorismo
circula pela cidade. Convoca os cidadãos a denunciar à
polícia qualquer um que seja identificado como anarquista. O comunicado foi emitido pela polícia do bairro de
Belgravia, como parte do projeto Griffin, que visa orientar
agentes e funcionários de segurança privada ou estatal sobre ações contra o terrorismo. Enquanto a convocação à
denúncia ronda a cidade e desdobra-se em construção de
bancos de dados para localização de subversivos, as práticas
liberadoras contra uma autoridade centralizada não cessam.
A existência e a insubmissão de um anarquista é insuportável para o Estado, é preciso estar atento para afirmar
práticas de liberdade e desestabilizar hierarquias, assim
como permanecer alerta para não ser o bode expiatório
de sempre.
a inconfessável preferência
Bomba e tiros na Noruega. Desde que um extremista assassinou quem pôde no país do Nobel da Paz, especialistas começaram a afirmar que a ênfase dada ao combate
do fundamentalismo islâmico fez com que os europeus
tenham descuidado da extrema direita. Chamam, então,
242
verve dobras
Flecheira libertária, segunda seleta
a atenção para o fato de que o crescimento eleitoral dos
partidos xenófobos acompanha o ritmo ditado pela crise
econômica e pelo desemprego, e recomendam que se limite
os espaços legais para esses discursos e movimentos, como
se a repressão pudesse calar o ódio racista que reverbera
incessante – ainda que quase inaudível − para, quando as
correlações de força permitam, eclodir. E, também, como
se os democratas europeus nunca tivessem preferido e
permitido o fortalecimento de fascistas, nazistas, falangistas etc. à emergência de experiências de liberdade radicais.
Foi assim na Espanha, nos anos 1930; foi assim no e após
1968. Foi assim antes. Será agora e depois?
[n. 212, 2 de agosto de 2011]
uma bomba
Depois de seguidas greves de fome, realizadas no último
de seus vinte e quatro anos encarcerado numa prisão de
Barcelona, Amadeu, um anarquista, pôde novamente circular pelas ruas. Contudo, pouco tempo depois de sua saída,
uma jovem libertária foi detida pela Guarda Civil e os chamados Mossos d´Esquadra, polícias catalãs, por seu suposto
envolvimento no envio de pacote explosivo com destino à
direção da penitenciária em que o libertário estava encerrado. Presa há quase seis meses, a jovem terá de responder a
um tribunal catalão em menos de um mês. Os anarquistas
são alvos da ânsia da polícia e do governo, que pretende
exterminá-los. Entretanto, resistências ainda pulsam. E
diante do governo e da polícia, de cada prisão, tribunal,
uma bomba anônima afirma a vida.
[n. 213, 9 de agosto de 2011]
243
20
2011
abissal
Nos cadernos de jornais de domingo, uma socióloga catita argumenta que as ruas do planeta tornaram-se palco
para a política e compara a chamada Primavera Árabe, a
movimentação dos denominados Indignados na Espanha,
os protestos nos subúrbios de Londres e as reivindicações
por reformas advindas de jovens no Chile, com os acontecimentos de 1968. Porém, segundo a pop star do abre aspas
do momento, os reclames escutados atualmente pelas ruas
são mais amplos do que as afirmações do final da década
de 1960, pois agora visam educação e emprego de qualidade, uma sociedade mais razoável. Certas ruas de 1968
tornaram-se espaços de lutas contra ditaduras, guerras,
polícias, os governos e suas razões. Atualizar 1968 é retomar o ânimo desse fogo. Entre a chama nas ruas e o coro
das marchas atuais há uma diferença abissal.
[n. 215, 23 de agosto de 2011]
244
verve dobras
Na velocidade da web, o que é tragado e o que permanece
Na velocidade da web,
o que é tragado e o que permanece
acácio augusto
As imagens e vídeos que seguem em verve dobras desdobram o texto publicado em verve 20 sobre Redson e a
banda Cólera, como procedência do anarco-punk na cidade
de São Paulo. Fotos capturadas da internet mostram capas
de discos e de um EP (disco de vinil de sete polegadas com
uma música de cada lado) gravados pelo Cólera em seus 31
anos de estrada. Interessante reparar no uso de colagens e
nomes dados aos discos, que remetem às técnicas utilizadas
para produção de fanzines e à proximidade com o lixo, o
marginal, o desajustado. Ecoam revoltas. Também registram alguns nomes e músicas citados no artigo. Importante o apontamento de algumas entrevistas e shows em TVs
dos anos 1980, e de apresentações da banda pelo mundo.
Uma entrada que pode, ao gosto do leitor, ser continuada
e estendida nos fluxos da web.
O leitor que experimentar essa extensão para encontrar outros registros esbarrará em outros materiais, mais
Acácio Augusto é mestre e doutorando em Ciências Sociais na PUC-SP, pesquisador no Nu-Sol e professor no Curso de Relações Internacionais da FASM.
verve dobras, 20: 245-252, 2011
245
20
2011
ou menos interessantes que estes. Se for mais apurado,
topará com contradições e ajustes, tanto em relação à própria banda Cólera, quanto em relação a esta escrita (daqui
e da revista impressa); mas o que se ressalta é a atitude
e o ineditismo de uma banda interrompida, mesmo após
tantos anos de punk-rock.
Os punks costumam dizer que ser punk não é usar
visual ou escutar música: é uma atitude. Esta atitude é
o que se busca registrar em verve e em verve dobras. Na
velocidade da web, o que permanece como possibilidade e
capacidade de revolta.
Seguem fotos das coletâneas Grito suburbano (1982) e
Sub (1983); uma foto que reúne vários discos do Cólera;
e destaque para Pela paz em todo mundo, de 1986 – que
chegou a vender 85 mil cópias, um recorde para um disco independente –, Mundo mecânico, mundo eletrônico, de
1992, e Tente mudar o amanhã, primeiro álbum solo da
banda, de 1985. Nos vídeos, um show recente, gravado na
Finlândia – com as músicas “Quanto vale a liberdade?” e
“Dia e noite”, tocadas bem ao estilo punk, uma atrás da
outra –, além de trechos de dois documentários de 1983:
um com punks de São Paulo e outro gravado nas ruas Juiz
de Fora, Minas Gerais.
246
Links de vídeos:
Trechos de documentário sobre os punks da Vila
Carolina, em São Paulo, de 1983:
Parte 1: http://www.youtube.com/watch?v=TWxbxOtWa0&feature=related
Parte 2: http://www.youtube.com/watch?v=jytr8UBmrLE
Parte 3: http://www.youtube.com/watch?v=2vMnw2toIhs
Cólera tocando “Quanto vale a liberdade” e “Medo”, no
Teatro Lira Paulistana, em 1985:
http://www.youtube.com/watch?v=YLTjHymrrWc&fea
ture=related
Cólera na Finlândia, tocando “Quanto vale a liberdade”
e “Dia e Noite”, em 2008:
http://www.youtube.com/watch?v=pyIN0o9iv-4
Cólera no Programa Boca Livre, da TV Cultura, tocando
“Em você”:
http://www.youtube.com/watch?v=3XRzSP3ZDDw&fe
ature=related
Trecho de documentário gravado com punks nas ruas
de Juiz de Fora, em 1983:
http://www.youtube.com/watch?v=GdsH1bBeeY&feature=related
Roberto Freire
uma existência libertária
20
2011
Um tanto de loucura,
ou, como demos forma à exposição
roberto freire: uma existência libertária
gustavo simões e gustavo ramus
Em “O que devemos aprender com os artistas”, aforismo exposto em A gaia ciência, o filósofo Friedrich Nietzsche
afirma que podemos aprender muito com existências que
se dedicam a invenções. “Ver as coisas de soslaio e como
que em recorte – ou dispô-las de forma tal que elas encubram parcialmente umas as outras e permitam somente
vislumbres em perspectivas – ou contemplá-las por um vidro
colorido ou à luz do poente – ou dotá-las de pele e superfície
que não seja transparente: tudo isso devemos aprender com
os artistas”.1
Entretanto, ao contrário de uma exaltação destes inventores, o filósofo sugere: “tudo isso devemos aprender com
os artistas, e no restante ser mais sábios do que eles”. Pois
neles, conclui, “esta sutil capacidade termina, normalmente,
onde termina a arte e começa a vida; nós, no entanto, queGustavo Simões e Gustavo Ramus são mestres em Ciências Sociais pela PUC-SP
e pesquisadores do Nu-Sol.
254
verve dobras, 20: 254-262, 2011
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
remos ser os poetas-autores de nossas vidas, principiando
pelas coisas mínimas e cotidianas”. Na exposição roberto
freire: uma existência libertária, ocorrida de 1º a 31 de junho
de 2011, desde a montagem, passando pela abertura até as
conversas ocorridas nas mesas pelo espaço ao ar livre do
pátio do Museu da Cultura (MC) da PUC-SP, a vida e as
invenções de Roberto Freire foram tomadas em sua imbricação, no ponto em que elas se encontram e se fortalecem.
roberto freire: uma existência libertária irrompeu a partir
da sugestão de Edson Passetti para apresentar, de outro
modo, o resultado da dissertação de mestrado Roberto
Freire: Tesão e Anarquia.2 O convite à experimentação foi
aceito e o primeiro porto em que desembarcamos para
iniciar a pesquisa de imagens para a exposição foi no interior mesmo da PUC-SP, no arquivo do TUCA – teatro
que Roberto Freire ajudou a inventar na década de 1960.
Na pequena sala repleta de pastas, nos deparamos com
papéis desgastados que descreviam a formação do elenco
de “Morte e vida Severina” − montagem que inaugurou
o teatro em 11/9/1965 − reportagens jornalísticas sobre
a viagem dos jovens atores para o festival de Nancy, na
França, a escolha de “O & A” como segunda apresentação
do grupo, a censura do capelão da PUC-SP, o comunicado
oficial de proibição da peça em 1967, entre outros documentos preciosos deste período em que Freire resistiu e
combateu a ditadura militar com arte, ao lado dos estudantes dessa universidade.
Em seguida a essa primeira seleta de documentos,
mergulhamos na produção relativa às décadas de 1970,
1980 e 1990. Das imagens em preto e branco encontradas
no TUCA, passamos para o manuseio de cartazes coloridos e sensuais do Arquivo da Soma − cedidos por João
255
20
2011
Da Mata − e por fotos do arquivo pessoal de seu filho,
Tuco. Algumas mostram Freire no período em que conviveu com Miriam Muniz, Flávio Império e certos jovens
no Centro de Estudos Macunaíma, espaço em que deu
forma à Soma no início dos anos 1970. Outras o retratam
nas primeiras incursões à região serrana de Visconde de
Mauá, Rio de Janeiro, onde escreveria parte de seus romances e ensaios a partir desta mesma década.
Para além da reunião desse material, exposto com delicadeza e rigor artista por Dorothea Voegeli Passetti em painéis
fixados nas paredes do espaço interno do MC, selecionamos no Arquivo do Núcleo de Sociabilidade Libertária
(Nu-Sol) os dvd´s de os insurgentes, contendo entrevista com
Roberto Freire gravada em 2007, e bigode, vídeo realizado
em 2008. Exibimos tais vídeos diariamente durante todo
o período da exposição. A antologia de romances, contos,
textos para teatro, ensaios e reportagens de Freire foi disposta em duas vitrines situadas entre os painéis, e serviu na
abertura de roberto freire: uma existência libertária para um
breve sarau de leituras acompanhados de música e canto.
Somado à exposição, o filme de Freire Cléo & Daniel foi
exibido no auditório Paulo VI no dia 16, mesma data em
que realizamos a primeira conversação no Pátio do Museu
e que contou com a presença de Edson Passetti e João Da
Mata. Por fim, a segunda conversação, realizada no dia
20, contou com Margareth Rago, Stéfanis Caiaffo e Vera
Schroeder.
Nas conversas, a primeira em plena lua cheia, Roberto
foi lembrado como militante subversivo, romancista, inventor do TUCA, teatrólogo, cineasta, ímã para alguns jovens
inquietos, médico anarquista, somaterapeuta em deslocamento pelo Brasil, amigo sempre presente, apreciador
256
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
de uísque, instigador do que chamava “sensualização da
vida”,3 corajoso libertário que bateu de frente até mesmo
com certos anarquistas, pensador irreverente e bem-humorado. Nas entrevistas expostas nas paredes do MC,
Freire explicita esse humor. “Às vezes fico mal-humorado,
bravo, xingo as pessoas. Ultimamente, porém, tenho mostrado senso de humor. Quando me perguntam se a Soma
é uma suruba, respondo que, infelizmente, não é”.4
Diante do percurso da existência de Bigode – apelido
carinhoso pelo qual era chamado pelos amigos – e das reflexões sobre seu pensamento no presente, dois dos textos
apresentados durante essas conversações foram escolhidos
para publicação nessa edição de verve dobras: os de João Da
Mata e Vera Schroeder, pelo calor da proximidade que ambos estabeleceram com ele como componentes do Coletivo
Brancaleone, grupo inventado por Bigode em parceria com
alguns jovens somaterapeutas, no início da década de
1990. A escrita de Schroeder valoriza as transformações
em Freire decorrentes das suas experiências no teatro, na
convivência no Macunaíma. João Da Mata versa sobre a
importância da Soma como invenção vital de Freire.
Sem polêmica – modo de debate estéril que incita, segundo Michel Foucault, “não a avançar, não a se arriscar
mais no que dizem, mas a se fechar incessantemente no
justo direito que eles reivindicam”5 –,os dois textos nos
instigam a problematizar 6 as contribuições de Freire no
presente. Ao invés de encerrar uma conversa, a diferença
entre o olhar de Schroeder e Da Mata sobre o pensamento de Freire indica uma abertura que reitera a vital multiplicidade deste homem singular. Quando questionado
sobre sua atividade profissional, se ele se considerava um
terapeuta ou escritor, respondia: “posso dizer que não sei
257
20
2011
se sou um artista ou um cientista; não sei se sou um político ou um pesquisador. Eu faço tudo o que quero, tudo o
que me dá vontade”.7
A montagem da exposição, aliada às conversas e aos
textos, explicitam que Roberto Freire pouco se interessou pelo ou, conjunção enredada na busca por algo que é,
uma essência. Sua vida, em constante movimento, afirmou
a conjunção e...e...e. Tal conjunção, segundo Deleuze &
Guattari, possui “força suficiente para desenraizar o verbo
ser”.8 Em “Nise da Silveira: uma vida como obra de arte”,
Edson Passetti recordou que a destemida antipsiquiatra,
ao ouvir a imobilizadora expressão “a vida é isso ou aquilo”,
afirmava a vida como relação de forças. Segundo Passetti,
Nise costumava dizer: “a vida é isso e aquilo”.9 Feito essa
mulher corajosa, Freire valorizou a existência como combate em constante movimento. Portanto, diante dos textos e pensando em como seguir adiante, precisamos ficar
atentos para não reduzir a uma única senda os caminhos
por ele percorridos.
roberto freire: uma existência libertária começou com
o convite de um pesquisador experimentado e generoso. Demos forma a essa exposição com a incomensurável força de amigos cúmplices do Nu-Sol. Não sabíamos,
na partida para essa experimentação, aonde chegaríamos.
Mas o destino pouco importa diante das transformações
ocorridas no meio do percurso. “O que constitui o interesse principal da vida e do trabalho é que eles lhe permitem
tornar-se diferente do que você era no início. Se, ao começar a escrever um livro, você soubesse o que irá dizer
no final, acredita que teria coragem de escrevê-lo? O que
vale para a escrita e a relação amorosa vale também para
a vida. Só vale a pena na medida em que se ignora como
258
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
terminará”.10 Beatriz Carneiro, na edição passada de verve
dobras, ao analisar as vidas artistas de Lygia Clark e Hélio
Oiticica, reproduziu um breve comentário do segundo:“‘A
sucessão de obras é para fazer inteligível o que eu sou, eu
passo a me conhecer através do que eu faço, na realidade eu
não sei o que eu sou, porque se é invenção eu não posso saber’”. Para Carneiro, “não saber quem se é, assim como não
saber o que são as coisas, demandam a invenção — não há
pressuposto de uma verdade intrínseca de si ou de um princípio essencial das coisas que será desvelado pela arte”.11
Na realização de roberto freire: uma existência libertária,
acompanhamos de perto um anarquista, escritor, terapeuta
libertário, que transformou-se constantemente por seu trabalho, ao mesmo tempo em que injetava suas experiências
de vida nas pesquisas em que se envolvia. Bigode viveu com
poesia. Um poeta escreveu certa vez que a poesia “não se faz
com versos. É o risco, é estar sempre a perigo sem medo”.12
Nietzsche refere-se a certos pensadores como inventores de possibilidades de vida. “Há aí tanta invenção, reflexão, audácia, desespero e esperança como nas viagens dos
grandes navegadores; e para falar verdade, são também
viagens de exploração nos domínios mais recuados e mais
perigosos da vida”.13 Bigode afirmou o risco de uma viagem, o traçado de um percurso. Invenção é o engenho de
explorar a vida artisticamente. Tal tarefa não é exclusividade dos artistas, ao contrário. Certos artistas, como apontou Nietzsche no aforisma de A gaia ciência, dedicam-se à
arte como obra e não para além desta como intensidade da
existência. Edson Passetti, prosseguindo com as reflexões
realizadas por Nietzsche e Michel Foucault, afirmou que
é preciso estudar experimentações de vida voltadas para
uma ética capaz de desestabilizar e de levar a viver de uma
259
20
2011
“maneira prazerosa”.15 Ao analisar as experimentações libertárias nas “relações amorosas, produtivas, educação de
crianças alheias à escolarização”, na abolição do castigo,
Passetti conclui que “a vida como obra de arte também é
uma preocupação anarquista”16.
Exploramos a nós mesmos, nossa pele, nossa carne, ao
dar forma a essa exposição. Apresentar, de outro modo,
uma pesquisa sobre esse anarquista tesudo, Roberto Freire,
foi surpreendente como o curso de um rio. E nos lançamos à surpresa. Deste mergulho, saímos diferentes, prontos para outros espaços, outras viagens. A vida é uma lida
que não cessa.
Notas
Friedrich Nietzsche. A gaia ciência. Tradução de Paulo César de Souza. São
Paulo, Companhia das Letras, 2001, p. 202.
1
2
A dissertação de mestrado Roberto Freire: Tesão & Anarquia foi defendida por Gustavo Simões no próprio espaço do Museu da Cultura
no dia 8 de junho de 2011. A dissertação pode ser acessada em: http://www.
sapientia.pucsp.br/tde_busca/arquivo.php?codArquivo=12994.
Freire passa a afirmar o que chamou de “sensualização da existência” após
a publicação de seu livro de contos Histórias Curtas e Grossas (1991). Na
época, decidiu viver em Canoa Quebrada, litoral do Ceará, onde comprara
um buggie e uma casa simples. Em seguida à temporada perto do mar, decidiu viajar para diferentes regiões do Brasil, realizando palestras intituladas
“erotização do cotidiano”. Nas palestras, atualizava a reflexão realizada pelo
escritor e pintor inglês D.H. Lawrence nas primeiras décadas do século XX.
Em 1929, no ensaio “Pornografia e Obscenidade” (Ver D.H. Lawrence. O
livro luminoso da vida: escritos sobre literatura e arte. Tradução de Mário Alves
Coutinho. Belo Horizonte, Crisálida, 2010.), Lawrence definiu a pornografia como um insulto ao sexo. Para ele, a pornografia é dissimulada e explicita
a ausência de franqueza de uma civilização que “forçou o sexo em direção ao
submundo e a nudez para o banheiro”. Em “Indecência pode ser saudável”
3
260
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
(Ver: William Blake & D. H. Lawrence. Tudo que vive é sagrado. Tradução
de Mário Alves Coutinho. Belo Horizonte, Crisálida, 2010), o escritor inglês afirmou que a “indecência pode ser saudável e benfazeja”, porém, quando ocupa a mente, transforma-se em obscenidade. Leitor contumaz de D.H.
Lawrence, Roberto Freire afirmou, nas palestras que realizou no início dos
anos 1990, que se tratava de pornografia quando o sexo ia para o pensamento, para o cérebro, enquanto o erotismo permanecia no corpo inteiro, era
vida num aspecto mais sensorial e sensitivo.
Ver “O divã anarquista”, entrevista de Roberto Freire publicada em
13/12/1995 pela revista Isto é. Disponível em http://www.somaterapia.com.
br/wp/wp-content/uploads/2011/08/diva-anarquista-small.pdf (acesso em
23/5/2011).
4
Michel Foucault. “Polêmica, Política e Problematizações” in Ditos & Escritos V: Ética, sexualidade, política. Organização de Manoel Barros da Motta.
Tradução de Elisa Monteiro e Inês Autran Dourado Barbosa. Rio de Janeiro, Forense, 2004, p. 227.
5
No mesmo texto citado acima, Foucault distancia-se da polêmica: “minha
atitude não decorre dessa forma de crítica que, a pretexto de um exame
metódico, recusaria todas as soluções possíveis, exceto uma, que seria a boa”.
Foucault afirma que sua atitude é “de preferência da ordem da ‘problematização’” Isto é, segundo ele, “a elaboração de um domínio de fatos, práticas
e pensamentos que me parecem colocar problemas para a política” (Idem).
6
Roberto Freire. Sem tesão não há solução. Guanabara, Rio de Janeiro, 1987,
p. 143.
7
Gilles Deleuze & Felix Guattari. “Introdução: Rizoma” in Mil Platôs vol.
1. Tradução de Aurélio Guerra Neto e Celia Pinto Costa. Rio de Janeiro,
Editora 34, 2004, p. 37.
8
9
Edson Passetti. anarquismo urgente. Rio de Janeiro, Achiamé, 2007, p. 42.
10
Michel Foucault. “Verdade, Poder e Si Mesmo” in Ditos & Escritos V:
Ética, sexualidade, política. Op. Cit., p. 294.
Ver: Beatriz Scigliano Carneiro. “Lygia Clark e Hélio Oiticica: experiências
de vida-artista” in Verve dobras, vol. 19. Disponível em http://www.nu-sol.org/
verve/pdf/verve19-dobras.pdf
11
Torquato Neto. Os últimos dias de paupéria. Rio de Janeiro, Eldorado, 1973,
p.19.
12
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20
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13
Gilles Deleuze. Nietzsche. Tradução de Alberto Campos. Lisboa, edições
70, s/d, p. 48.
Edson Passetti. Éticas dos Amigos: invenções libertárias da vida. São Paulo,
Imaginário, 2003, p. 202.
14
15
Edson Passetti. anarquismo urgente. Rio de Janeiro, Achiamé, 2007, p. 62.
262
20
2011
Roberto Freire, a Soma
e a vida artista
joão da mata
Roberto Freire tornou-se um importante instaurador
libertário com presença marcante em diversas áreas de
cultura brasileira, especialmente nas últimas décadas do
século XX. Além de escrever mais de 30 livros, entre romances e ensaios, Freire envolveu-se com teatro, jornalismo, medicina, cinema e música. Sua participação na luta
contra a ditadura militar no Brasil e seu envolvimento
nestas distintas áreas serviu de fermento para a criação da
Soma – uma terapia anarquista.
Talvez não seja exagero afirmar que sua vida seja o reflexo de suas criações e vice-versa. Roberto, de fato, procurou ser um artista em sua própria existência, um artífice
na criação de um modo de vida libertário. Não cansava,
mesmo com o avanço da idade, de (re) inventar a próJoão da Mata é somaterapeuta há mais de 20 anos. Atualmente, investiga a Somaterapia e alguns de seus desdobramentos em dois doutoramentos: em Sociologia
Econômica e das Organizações na Universidade Técnica de Lisboa (UTL), de
Portugal, e em Psicologia na Universidade Federal Fluminense (UFF), do Rio
de Janeiro. É autor de Introdução à Soma – uma terapia anarquista (Rio de
Janeiro, Achiamé, 2009).
264
verve dobras, 20: 264-270, 2011
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
pria existência. A certa altura, já quando não conseguia
mais andar, costumava dizer: “agora, o que me interessa
é o espaço sideral... vou ser um astronauta”. Dizia-o de
maneira bem humorada, sabendo de suas limitações físicas, mas não cansando de buscar o que havia de juventude
em um corpo que não mais acompanhava sua permanente
inquietude. Muitas vezes, ao seu lado, sentia os saldos de
minha “velhice”, apesar de ter cerca de 40 anos a menos. A
convivência com o Roberto era assim, algo rejuvenescedor,
como uma carga de energia, incentivo e disposição para a
luta libertária.
Freire procurou viver suas relações de amizade em liberdade, lutou pela construção permanente de sua autonomia,
participou intensamente na produção e desenvolvimento da
Soma, vivida de forma autogestiva entre os somaterapeutas
que compartilharam do Coletivo Anarquista Brancaleone.
Trazer a anarquia para seu cotidiano e para perto de si era
algo fundamental em sua vida. Para Carvalho Ferreira, ao referir-se a Roberto Freire (com quem estabeleceu uma estreita
amizade), em sua vida “(...) existe sempre um pressuposto
inquestionável: a anarquia aqui-e-agora. Esta dimensão da
sua vida e obra leva-nos para os campos do amor, da amizade, da solidariedade e da liberdade. É uma diferença que
nos separa de todos os anarquismos ortodoxos, quer eles
se denominem anarco-sindicalismo, comunismo-libertário,
ou anarco-comunismo. Antes de qualquer revolução social
ou classe social predestinada a transformarem-se em coveiros do capitalismo, do Estado e da religião, para Roberto
Freire, cada indivíduo per se deve ser único como ator de sua
própria libertação”.1
Michel Foucault formulou um importante conceito
em sua obra que me parece funcionar bem quando nos
265
20
2011
referimos a pessoas como Roberto Freire. O filósofo francês, ao lançar a noção de “vida artista”,2 está interessado
em formular uma proposta ético-política que se coloque
em oposição ao modo de vida burguês, caracterizado por
ele como um modo de vida acomodado e acovardado. Para
Foucault, a “vida artista” é um modo de vida libertário, inventivo e não acomodado. É a forma pela qual escolhemos
caminhos, rotas e percursos em nossas existências, capazes
de torná-la belas, radiosas e potentes. Este processo, obviamente, não pode ser dado ou designado por outrem,
mas cabe a cada um aventurar-se nas entranhas da vida e
nas descobertas de seus próprios caminhos.
A noção de “vida artista” não está localizada necessariamente na vida de um artista, mas ligada à vida daqueles
que procuram viver suas existências como obra de arte. É
possível encontrar artistas que tenha uma vida nada artista,
assim como existências muito simples, mas que revelam
grande beleza e singularidade. Não se trata, portanto,
de uma vida artística, geralmente relacionada ao percurso criativo de um determinado autor. Segundo Castelo
Branco, “Michel Foucault (...) entende que [a vida artista]
é um modo de resistência ao poder, especial e digno de
nota, que faz da luta pela autonomia, com o objetivo de
livrar o sujeito dos controles e técnicas de normalização
postas em jogo pelo conjunto multiforme das instituições
contemporâneas”.3
Outro pensador francês, o também filósofo Michel
Onfray, apoiando-se nesta noção de estética da existência,
sugere a imagem de uma escultura de si como forma de elaboração artística de vida.4 Seguindo a tradição pós-metafísica na qual se situa Foucault, Onfray coloca lado-a-lado o
modo de vida estético de uma forma de viver não acomo266
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
dada e libertária. Defende uma postura rebelde no cotidiano contra os mecanismos de disciplina e controle. E,
assim, põe uma luz sobre o anarquismo contemporâneo,
ao trazer para perto de nossas vidas a principal forma de
atitude libertária na atualidade. O que encontramos na
vida de Freire é justamente essa capacidade em buscar
aventurar-se na elaboração de sua estátua, de forma rebelde e libertária, fazendo uso dos materiais e instrumentos
necessários em sua criação.
A Soma como instrumento libertário
Roberto Freire costumava afirmar ser a Soma sua principal obra e seu maior legado. Afirmava isto ao referir-se à
contribuição que a Soma forneceu ao estudo do comportamento humano e social na atualidade. Mas também como
contribuição ao pensamento libertário, especialmente na
elaboração de um “anarquismo somático”, expressão que
ganhou contorno, sobretudo, a partir de seu contato com
Jaime Cubero, ainda na década de 1970. Freire acreditava
ser a Soma um instrumento instaurador de possibilidades
libertárias no amor, na convivência social, na amizade e
na produção. Sem anunciar diretamente este propósito,
defendia a Soma como um conjunto de técnicas de luta e
conscientizações políticas capazes de auxiliar na construção de nossa autonomia, de nossa “vida artista”, portanto.
A Somaterapia, ou apenas Soma, é uma técnica terapêutica em grupo, corporal e baseada em princípios anarquistas.
Utiliza os fundamentos da educação libertária como forma
de conduzir um processo coletivo que dura em torno de um
ano. Está fortemente associada às pesquisas do mais radical dissidente da Psicanálise, o austríaco Wilhelm Reich, e
267
20
2011
sua formulação sobre a neurose como produto dos jogos de
poder na sociedade. Reich apontou a forma como vivemos
em sociedade como a principal responsável pelos conflitos
emocionais e mostrou como o corpo é diretamente atingido por esse processo de ajustamento pelo qual passamos,
desde a infância até a vida adulta.
Entre as bases teóricas da Soma, o anarquismo e o pensamento reichiano são provavelmente as mais importantes
contribuições que Roberto Freire adotou na elaboração de
sua terapia anarquista. Unir a anarquia a Reich é corroborar tanto com a psicologia quanto com uma forma nova
de fazer política. O olhar sobre o cotidiano no que Freire
chama de política do cotidiano,5 a valorização do prazer
como ética e como indicador da singularidade,6 e o corpo
enquanto unidade indivisível7 são algumas das especificidades que fazem desta união uma ferramenta psicossocial de
singular valor.
Ao valer-se de uma dinâmica de grupo numa perspectiva autogestionária, os grupos de Soma funcionam como
um laboratório social, favorecendo o entendimento de
como cada um atua nas interrelações pessoais. Assim, na
prática autogestiva, o grupo é levado a experimentar um
relacionamento social novo e não hierarquizado, sem a presença de autoritarismo e de centralismo. Isto funciona por
meio das lideranças emergentes entre os participantes, que
exercem papéis de coordenação do grupo de forma rotativa
e descartável, impedindo a formação de liderança fixa.
Os objetivos da Soma estão ligados a questões sobre
como se construir uma subjetividade libertária; que ética
é possível para pensar a autonomia; como estabelecer as
bases de uma sociabilidade apoiada na defesa das dife268
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
renças individuais; e como situar o corpo no centro da
intersubjetividade.
Se a Soma representou a maior obra de Roberto Freire,
ela deve ser pensada como um conjunto de instrumentos
que, manejados de forma singular e própria por cada um,
deve servir de auxílio na construção de existências libertárias. Como qualquer instrumento, sua melhor utilidade
dependerá da apropriação por quem a vivencia e a desfruta; de quem a manuseia, quais seus intuitos e como sua
prática e ética envolvidas poderão fornecer a direção e a
intensidade que este instrumento traz.
Em tempos de conservadorismos, conformismos e caretices, como o que vivemos, mais do que nunca, existências como a de Roberto Freire servem para nos mostrar
como que é possível lutar e construir vidas livres, vidas
artistas. Não para indicar caminhos, servir de modelos.
Muito pelo contrário. Para despertar, em cada um, as próprias possibilidades de vidas artistas. Como disse Loyola
Brandão, na apresentação do livro Eu é um outro, autobiografia de Freire: sua existência serviu “para ensinar os que
sonham e têm medo”.8
Notas
José Maria Carvalho Ferreira. “Roberto Freie: anarquia aqui-e-agora” in
Verve, vol. 11. São Paulo, Nu-Sol, 2007, p. 296.
1
2
Ver: Michel Foucault. Ditos e Escritos V: Ética, Sexualidade, Política. Organização de Manoel Barros da Motta. Tradução de Elisa Monteiro e Inês
Autran Dourado Barbosa. Rio de Janeiro, Forense Universitária, 2004; História da sexualidade 2 – O uso dos Prazeres. Tradução de Maria Thereza da
Costa Albuquerque e José Augusto Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro,
Graal, 1984; História da sexualidade 3 - O cuidado de si. Tradução de Maria
269
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2011
Thereza da Costa Albuquerque e José Augusto Guilhon Albuquerque. Rio
de Janeiro, Graal, 1985.
Guilherme Castelo Branco e Jorge Vasconcellos. “A acomodação e a vida
artista” in Arte, Vida e Política: ensaios sobre Foucault e Deleuze. Rio de Janeiro,
Edições LCV/SR3/UERJ, 2010, p. 128. [Este artigo, com algumas alterações, foi originalmente publicado sob o título “Um incômodo: a acomodação” in Verve, vol. 6. São Paulo, Nu-Sol, 2004. O livro citado pelo autor
encontra-se resenhado no presente volume da revista Verve, em sua versão
impressa (N. E.)]
3
Michel Onfray. A Escultura de Si: a moral estética. Tradução de Mauro
Pinheiro. Rio de Janeiro, Rocco, 1995.
4
5
Roberto Freire. Utopia e paixão. São Paulo, Sol e Chuva, 1996.
Roberto Freire. Ame e dê vexame. São Paulo, Trigrama, 2000 e Sem tesão não
há solução. São Paulo, Trigrama, 2000.
6
7
Roberto Freire. Tesão pela vida. Editora Francis, São Paulo, 2006.
8
Roberto Freire. Eu é um outro. Salvador, Maianga, 2002.
270
20
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Roberto Freire: Soma, utopia
e experimentações
vera schroeder
Foi uma alegria enorme ver, ler e sentir essa exposição
feita com matérias de jornais, cartazes e fotos que falam de
“O&A”, do “Morte e Vida Severina”, do Tuca, das reportagens da revista Realidade. Assim como foi muito bom
rever, no dia 16 de junho de 2011, o filme “Cléo & Daniel”
e a belíssima interpretação de Myrian Muniz. Esta exposição, realizada pelo Nu-Sol, conseguiu aproximar nossos
olhares da intensidade estética que marcou a vida de Roberto Freire. E para falar sobre sua existência – rebelde e
intensa – três questões são, a meu ver, fundamentais.
A primeira questão está relacionada justamente a esta
mulher, a Myrian Muniz. Mas também a Silvio Zilber
e Flávio Império. Como também se relaciona à estética
inovadora proposta pelo Living Theater: teatro e política,
paraíso agora. Pensamento libertário e o palco, as luzes e os
corpos em movimento, sendo experimentados e co-afetados em gestos e em falas. Ou apenas em “os” e “as”.
Vera Schroeder é doutora em Psicologia Social pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro com bolsa sanduíche no departamento de filosofia da
Universidade de Liège, Bélgica. Coordenadora do Instituto de Estudos de
Soma (www.estudosdesoma.org).
272
verve dobras, 20: 272-279, 2011
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
Esta primeira questão – o teatro e a dramaturgia – marca sensivelmente e sensualmente a vida e a obra de Freire.
É do “Roberto-teatro” que surgem tantas e tantas coisas.
Difícil é contar isso, já que as histórias, principalmente
naquele momento histórico, se confundem. E porque as
criações do Roberto são assim, sempre foram assim: entrecortadas, não-lineares, recalcitrantes, somem e surgem
novamente num outro ponto, depois se apagam, depois se
cruzam e geram novas formas.
Cruzamentos como esses: o “Morte e Vida” e o Tuca,
em 1965; sucesso de “Cléo & Daniel”, em 1966; “O&A”,
em 1967; a filmagem do “Cléo & Daniel”, em 1969; o fracasso retumbante e a viagem (meio fuga) para Europa logo
após. É nessa viagem que Roberto assiste à peça “Paradise
Now” e conversa com Julian Beck e Judith Malina. Tudo
isso junto, quase ao mesmo tempo – ou definitivamente
ao mesmo tempo – se transforma em impulsos criativos e
transgressores para se viver e para se criar outras artes, outras vidas. O eu a todo instante passa a ser outro. Outros.
E aqui surge aquilo que Roberto sempre definiu como
o início da Soma. A partir de todas essas experiências descritas anteriormente, surge seu trabalho no Macunaíma.
Foi nesse espaço que Roberto experimentou uma nova
maneira de ser e de fazer terapia. Depois de tantos anos
trabalhando como endocrinologista, depois de ter tentado
(e odiado) a psicanálise, Roberto desiste do campo psi e se
volta às artes e à militância política.
O Macunaíma foi criado em 1974 por Myrian Muniz,
Silvio Zilber e pelo cenógrafo Flávio Império. Foi lá, no
“Macu”, nas peças e na preparação de atores que Roberto
se juntou a essa trupe. Muito mais como dramaturgo do
273
20
2011
que como terapeuta. Se, por um lado, é evidente que o terapeuta também estava lá, por outro lado ele estava ausente, estava destruído pelas frustrações vividas. Para Roberto,
as possibilidades das psicoterapias tinham se esgotado. É
por isso que surge esse modo completamente diferente.
Completamente radical. Um jeito de ser terapeuta que não
se situava nem poderia ser classificado entre as diversas
vertentes da psicologia.
E nem hoje isso seria possível. Não seria possível por
um único e claro motivo: aquilo, inicialmente, não era uma
terapia. Era uma experimentação que depois, aos poucos,
ganha uma forma terapêutica. E foi dessa maneira que
Roberto sempre definiu seu trabalho no Macunaíma: um
trabalho de preparação corporal de atores. Nessa época,
ele estava claramente fora do ambiente psi.
Nesse caldeirão onde se misturam gente como a gente, literatura, uma parte que te cabe desse latifúndio, “os”
e “as”, Macunaíma, fica faltando um pedaço: a anarquia.
Esse é o segundo ponto que eu gostaria de analisar aqui
com vocês. Porque fica faltando compreender visceralmente – como numa “Navalha na Carne” de Plínio Marcos,
seu amigo-cúmplice – toda essa movimentação que existia
na Ação Popular (AP), que corria e que se escondia para
não ser trancafiada e espancada. Porque é justamente a
partir dessa militância na AP, ainda que fortemente leninista, que surge a literatura na sua vida pelas linhas de
“Cléo & Daniel”. Livro escrito no olho do furacão da ditadura, das prisões e dos porões. Aos poucos, Roberto vai
se aproximando do anarquismo. Aos poucos e pela arte. É
a arte que lhe abre para as teorias. É o teatro que o guia até
Reich, até o anarquismo. E é através da arte e da política
que Roberto conhece a antipsiquiatria.
274
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
Arte e política juntas num mesmo caldeirão. Essas são
as duas caixas de ferramentas que forneceram a possibilidade de se criar um método terapêutico chamado Soma.
É ali que devemos sempre nos voltar, para não sermos
capturados. Até porque sabemos, todos, que inevitavelmente somos cercados. O desafio é saber se reinventar.
Ser sempre um outro. Não ser identificado. Pelo menos
não tão facilmente.
E é aqui que eu gostaria de trazer um terceiro e último
ponto que, de certo modo, se articula com a influência da
antipsiquiatria na Soma e na vida de Roberto, como na experiência da comunidade Viva Eu. O movimento antipsiquiátrico surge na década de 1950, e temos Ronald Laing,
David Cooper e Franco Basaglia como ícones deste processo. A antipsiquiatria foi fortemente marcada pelas pesquisas
do antropólogo britânico Gregory Bateson1, que é um dos
autores mais citados e menos lidos, inclusive na academia.
Bateson forneceu toda a base teórica para a formulação
de uma prática antipsiquiátrica quando, em 1956, escreve um artigo chamado “Toward a Theory of Schizofrenia”.
Ali, estavam descritas as linhas teóricas que ampliavam
o enfoque sobre a saúde mental. A loucura não poderia
mais estar encerrada no indivíduo. A partir dos estudos
na Nova Guiné e em Bali, Bateson analisa e descreve de
maneira brilhante os vínculos que nos conectam. Com
este artigo, cria-se a famosa teoria da dupla vinculação ou
do duplo vínculo. Estaria finalmente descrita, segundo os
antipsiquiatras, a origem e a causa da esquizofrenia.
O que muitos até hoje se esquecem (ou querem esconder) – inclusive as terapias sistêmicas, de família e outras
vertentes que foram influenciadas pela antipsiquiatria – ,
275
20
2011
é que Bateson escreve um outro artigo, chamado “Double
Bind, 1969”. Neste artigo, Bateson diz simplesmente o seguinte: vocês não entenderam nada do que eu disse. Não
adianta nada deixar de culpabilizar o louco e passar a culpabilizar a família ou a sociedade. Isto é uma simples e
perigosa inversão. O que eu propus foi entender como todas as coisas estão vinculadas (cito de maneira livre frases
deste artigo de 1969).2
Este alerta feito por Bateson é ainda extremamente
atual e está relacionado aos desafios no campo da psicologia e da saúde mental. Eles caem e recaem nestas mesmas
armadilhas de ontem. A Loucura continua ainda sustentando a suprema Razão que, para existir, julga e decreta o
banimento das estranhezas, assim como das ilusões, das
ficções e da poesia. É por isso que Bateson dizia: a psicologia não compreende por preguiça epistemológica. Se
considerarmos que uma comunicação paradoxal produz a
loucura, devemos exterminar definitivamente outros paradoxos: o humor, a fantasia, a arte e todas as demais formas
contraditórias e incoerentes de se dizer algo.
Esse é o grande perigo. Esse é o grande dilema das psicologias, como alertou Foucault. Prima-irmã das confissões,
a psicologia é uma ciência marcada por dois grandes
pontos: a incapacidade de se definir o que é verdadeiro
e, como consequência, a obsessão em se identificar e classificar todos os erros. É através dos erros e das faltas que
se chega à Verdade. Faltas ou recalques, se preferirem. Ela,
a verdade, é pelo seu avesso (negativada pelo erro), confessada. Arranca-se da alma ou do corpo. Será na alma ou
na mente que algumas psicologias identificam a verdade
do Sujeito. Outras psicologias preferem o corpo. O corpo,
276
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
que nada esconde e não consegue mentir, confessa à revelia a verdade ao cientista-juiz.
Na década de 1960 e 1970 tivemos no Brasil um verdadeiro acontecimento das terapias corporais. Naquele momento, as terapias corporais pareciam apresentar uma saída
frente aos conservadorismos da psicanálise e das demais
formas “racionais” de se ver, pensar ou agir. Hoje, porém, falar de psicologia corporal não é nenhuma novidade. E associar a palavra “política” à palavra “terapia”, idem. Isso não
traz necessariamente nada de novo, muito pelo contrário.
A captura já foi feita e há muitos anos. Hoje, as terapias
reichianas estão nas empresas e nas fábricas. A energia
vital serve muitas vezes para deixar os corpos mais soltos
no perambular dos corredores dos shoppings.
Traçando um paralelo com o momento vivido no
Macunaíma, a pergunta é: quem hoje precisa de terapia?
E quais são as lutas que assumimos hoje como nossas?
Com certeza, essas respostas não são as mesmas de 30 ou
40 anos atrás. Mas elas continuam necessárias e urgentes.
E a segunda pergunta é: nós, hoje, precisamos de terapia
ou precisamos urgentemente de espaços de produção para
criarmos, inventarmos, nos tesarmos? Não era esse um
dos aspectos que singularizavam as experiências vividas
no Macunaíma e propostas pelo Living Theater?
Acredito que precisamos hoje, acima de tudo, de espaços
que valorizem uma estética sensual e rebelde, e que estejam
articulados com as questões teóricas e políticas atuais. Nesse
sentido, deveríamos enfrentar algumas questões teóricas
como, por exemplo, a hipótese repressiva desenvolvida por
Foucault e seus aspectos históricos, teóricos e políticos.3
Penso que a “timidez por trás dos arrebatamentos de Reich”4
não pode ser colocada de lado.
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2011
Jorge Goia e eu estamos hoje atuando através do Instituto de Estudos de Soma (www.estudosdesoma.org),
procurando resgatar as contribuições da Soma para além
de uma prática terapêutica. Este Instituto foi criado pelo
Roberto e outros companheiros da Soma em 1992, e hoje
serve de instrumento para a experimentação de novas práticas que possam contribuir na construção de novas ideias
e de ações inquietantes.
Este trabalho conjunto não se iniciou agora. Há anos,
Goia tem trabalhado com a Soma (como disse, sem uma
proposta meramente psicológica) de diversas maneiras. Entre elas: Workshops em Montreal, Canadá, com Engrenage
Noir, uma organização que trabalha com artistas comunitários, em 2007 e 2009; Workshop no seminário “Aesthetics
and radical politics”, na Universidade de Manchester,
com publicação de artigo no livro com mesmo nome;
Cursos “Body Collaboration”, em 2006 e 2007, e “Soma
– an anarchist experiment”, em 2008 e 2009. Jorge
Goia, atualmente, realiza workshops com o “Nanopolitics”,
grupo de afinidades que pesquisa relação corpo-política
e está associado ao departamento de “performing arts” da
Queen Mary University, de Londres. Além disso, realiza
cursos e oficinas de capoeira para jovens e adultos.
No Rio de Janeiro, desde 2009, temos realizado algumas experimentações por meio do Coletivo Sabô, um
grupo de estudos e de intervenções anarquistas, que reúne
pessoas que fizeram grupos de Somaterapia ou não. Desde
o dia 4 de junho de 2011, este coletivo vem coordenando
as oficinas “Verdades e Existências”, com encontros quinzenais. Os primeiros módulos debateram a relação que
se estabelece entre a psicologia e a criminologia, quando
abordamos também alguns princípios gerais do abolicio278
verve dobras
Roberto Freire, uma existência libertária
nismo penal. No mês de agosto, as oficinas se voltaram
para a cartografia, contando com abordagens feitas por
geógrafos, arquitetos e psicólogos. Novos encontros virão.
Terminarei dizendo que toda essa análise crítica acerca
do papel das psicologias faz parte deste gesto parresiástico
necessário. Nossas pesquisas apontam para esta coragem
da verdade, pois acreditamos que estes desafios dizem, sim,
respeito inclusive à Soma. Que ela, por ser uma terapia
anarquista, não está imune aos alertas feitos por Bateson,
Foucault e tantos outros. A Soma e o Roberto merecem
esta análise crítica. Goia e eu acreditamos que, naquele
caldeirão da arte e da política, naquele que Roberto fuçou
e encontrou elementos interessantíssimos, encontraremos
a resistência necessária, não apenas para continuar, mas
para seguir sempre reinventando a Soma.
Notas
Gregory Bateson. “Toward a theory of schizofrenia” in Steps to an Ecology of
Mind. Nova Iorque, Ballantine Books, 1972, pp. 201-227.
1
Gergory Bateson. Steps to an ecology of mind. Chicago, The Univesity of
Chicago Press, 2000, pp.271-278.
2
Michel Foucault. História da Sexualidade 1 – a vontade de saber. Tradução
de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. São
Paulo, Graal, 2003.
3
4
Idem, p.11.
279
Na matéria “vida e glória Severina”, dois jovens integrantes
do TUCA posam para foto em frente ao Teatro Odeon de
Paris. Depois de ser anunciado como o grande vencedor da
quarta edição do Festival de Nancy, com a apresentação de
“Morte e vida Severina”, o grupo estendeu a viagem para se
apresentar no tradicional teatro da capital francesa.
Cartaz de “O&A”, segunda montagem realizada pelos jovens do TUCA. Concebida por Roberto Freire,
“O&A” não utilizava palavras. Entretanto, mesmo sem
texto, o incômodo gerado por sua estreia, em 1967, fez
com que agentes do DOPS prendessem diariamente alguns atores, impedindo a realização da montagem.
Em 1969, Freire adapta Cléo & Daniel para o cinema.
Na foto, Freire dirige Irene Stefânia e Chico Aragão,
Cléo e Daniel, respectivamente, na Praça da República
em São Paulo.
verve
NU-SOL
Publicações do Núcleo de Sociabilidade Libertária, do Programa de Estudos
Pós-Graduados em Ciências Sociais da PUC-SP.
hypomnemata, boletim eletrônico mensal, desde 1999;
flecheira libertária, semanal, desde 2007;
os insurgentes, apresentação de abril a junho de 2008; reapresentação de
junho a agosto de 2008, de dezembro de 2008 a fevereiro de 2009;
ágora, agora, apresentação da série ao vivo de setembro a outubro de 2007;
reapresentação de janeiro a março de 2008 e de fevereiro a abril de 2009;
ágora, agora 2, apresentação da série de setembro a dezembro de 2008;
reapresentação de abril a julho de 2009 e de julho a outubro de 2009;
ágora, agora 3, apresentação da série de outubro a novembro de 2010;
carmem junqueira-kamaiurá — a antropologia MENOR, apresentação
em outubro/novembro de 2010.
Canal universitário/TVPUC e transmissão simultânea em http://tv.nu-sol.org.
Aulas-teatro
Emma Goldman na Revolução Russa, maio e junho de 2007;
Eu, Émile Henry, outubro de 2007;
FOUCAULT, maio de 2008;
estamos todos presos, novembro de 2008 e fevereiro de 2009;
limiares da liberdade, junho de 2009;
FOUCAULT: intempéries, outubro de 2009 e fevereiro de 2010;
drogas-nocaute, maio de 2010;
terr@, outubro de 2010 e fevereiro de 2011;
eu, émile henry. resistências., maio de 2011;
loucura, outubro de 2011.
DVD
ágora, agora, edição de 8 programas da série PUC ao vivo;
os insurgentes, edição de 9 programas;
ágora, agora 2, edição de 12 programas;
carmem junqueira-kamaiurá — a antropologia MENOR;
ágora, agora 3, edição de 7 programas.
Vídeos
Libertárias (1999); Foucault-Ficô (2000); Um incômodo (2003); Foucault,
último (2004); Manu-Lorca (2005); A guerra devorou a revolução. A guerra civil
espanhola (2006); Cage, poesia, anarquistas (2006); Bigode (2008); Vídeo-Fogo
(2009). Assista em: www.nu-sol.org/tv, em “on-demand”.
CD-ROM
Um incômodo, 2003 (artigos e intervenções artísticas do Simpósio Um
incômodo).
Coleção Escritos Anarquistas, 1999-2004
29 títulos.
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r
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Verve aceita artigos e resenhas que serão analisados pelo
Conselho Editorial para possível publicação. Os textos enviados
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Citações:
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observando o padrão a seguir:
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I) Para livros:
Nome do autor. Título do livro. Cidade, Editora, Ano, página.
Ex: Rogério Nascimento. Florentino de Carvalho: pensamento
social de um anarquista. Rio de Janeiro, Achiamé, 2000, p. 69.
II) Para artigos ou capítulos de livros:
Nome do autor. “Título” in Título da obra. Cidade, Editora, ano,
página.
Michel de Montaigne. “Da educação das crianças” in Ensaios,
vol. I. Tradução de Sérgio Milliet. São Paulo, Nova Cultural, Coleção
Os pensadores, 1987, p. 76.
III) Para citações posteriores:
a) primeira repetição: Idem, p. número da página.
b) segunda e demais repetições: Ibidem, p. número da página.
c) para citação recorrente e não sequencial: Nome do autor, ano,
op. cit., p. número da página.
IV) Para obras traduzidas:
Nome do autor. Título da Obra. Tradução de [nome do tradutor].
Cidade, Editora, ano, número da página.
Ex: Michel Foucault. As palavras e as coisas. Tradução de Salma
T. Muchail. São Paulo, Martins Fontes, 2000. p.42.
V) Para textos publicados na internet:
Nome do autor ou fonte. Título. Disponível em: http://[endereço
da web] (acesso em: data da consulta).
Ex: Claude Lévi-Strauss. Pelo 60º aniversário da Unesco. Disponível em: http://www.pucsp.br/ponto-e-virgula/n1/indexn1.htm
(acesso em: 24/09/2007).
VI) Para resenhas:
As resenhas devem identificar o livro resenhado, logo após o
título, da seguinte maneira:
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Nome do autor. Título da Obra. Tradutor (quando houver). Cidade,
Editora, ano, número de páginas.
Ex: Roberto Freire. Sem tesão não há solução. Rio de Janeiro,
Ed. Guanabara, 1987, 193 pp.
As colaborações devem ser encaminhadas por meio eletrônico
para o endereço [email protected] salvos em extensão “.rtf”. Na
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