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Constitucionalização do Direito Civil e a influência sobre a
responsabilidade civil
Ludmila Silva de Brito*
O Direito Civil brasileiro, ramo que vai cuidar do cotidiano da pessoa humana, teve suas
bases influenciadas pela visão patrimonialista e individualista advindas dos ideários da
Revolução Francesa. O Código Civil de 1916 “tratava de cuidar das relações privadas
servindo como uma Constituição do Direito Privado” (TEPEDINO, Gustavo. Temas de
Direito Civil, Rio: Renovar, 1999). Posteriormente, com as mudanças nas relações sociais
houve a necessidade de serem criadas leis especiais para regulamentar questões específicas.
Sem o acompanhamento do Código Civil nas transformações sociais, as leis extravagantes
começaram a tomar uma maior abrangência, como constata Tepedino:
O Código Civil perde, assim, definitivamente, o seu papel de Constituição do Direito
Privado. Os textos constitucionais, paulatinamente, definem princípios relacionados a temas
antes reservados exclusivamente ao Código Civil e ao império da vontade: a função social
da propriedade, os limites da atividade econômica a organização da família, matéria típica
do direito privado, passam a integrar uma nova ordem publica constitucional. (TEPEDINO,
Gustavo. Temas de Direito Civil, Rio: Renovar, 1999).
Nota-se então, que a dicotomia direito público e direito privado começa a ser quebrada.
Com a Constituição de 1988 houve, como afirma Cristiano Chaves de Farias, uma
“verdadeira reconstrução da dogmática jurídica, a partir da afirmação da cidadania como
elemento propulsor” (FARIAS, Cristiano Chaves; Direito Civil-Teoria Geral, p. 24). O
Direito Constitucional, com os seus princípios da dignidade da pessoa humana e da
isonomia, começa então a influenciar o Direito Civil e conseqüentemente a
Responsabilidade Civil. Percebe-se, agora, a importância de se ter presente a função social
e a igualdade substancial trazida pela Constituição.
O nosso novo Código Civil, apesar de ter entrado em vigor apenas em 2002, foi elaborado
em 1975, portanto, antes da Constituição o que significa dizer que ele já nasceu em
descompasso com a realidade social do país e com a nossa Carta Magna. Temas atuais não
são tratados pelo nosso código e até a responsabilidade civil, tema de grande importância e
utilidade atual, teve poucas inovações e alguns artigos a respeito do tema são meras
reproduções dos já previstos no código de 1916, como bem observa Carlos Roberto
Gonçalves:
Perdeu-se a oportunidade, por exemplo, de se estabelecer a extensão e os contornos do dano
moral, bem como de se disciplinar a sua liquidação, prevendo alguns parâmetros básicos
destinados a evitar decisões díspares, relegando novamente à jurisprudência essa tarefa
(GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade Civil, São Paulo, Saraiva)
E foi justamente isso que aconteceu. Para acompanhar as mudanças sociais e a influência
dos princípios constitucionais foi necessário fazer uma releitura do Código Civil à luz da
Constituição Federal. No entanto, como afirma Cristiano Chaves de Farias, “Apenas foram
realizadas adaptações para que o texto pudesse ser compatibilizado como o Texto
Constitucional, sem, contudo, alterar a substancia normativa de antes”. (FARIAS, Cristiano
Chaves).
As mudanças nas relações sociais também acarretaram mudanças na forma de ser
concebida a reparação ao dano. A responsabilidade civil passou por diversas fases.
Inicialmente, era baseada na responsabilidade subjetiva com culpa provada, sendo que o
ônus da prova pertencia à vítima. Percebe-se que em muitos casos seria quase impossível a
prova, desfavorecendo assim a pessoa lesada. Posteriormente, passa para a responsabilidade
de culpa presumida com a inversão do ônus da prova, ficando a vítima então em situação
bem mais favorável.
Hoje se chegou à responsabilidade objetiva, em que se responsabiliza mesmo sem culpa.
Vem ganhando importância a teoria do risco, pela qual toda atividade apresenta um risco e,
se algum dano for causado assume-se a obrigação de ressarcir a vítima. A responsabilidade
civil subjetiva tornou-se, assim, residual. Toda essa evolução aconteceu para que se fossem
acompanhadas as mudanças sociais e a Constituição Federal, para que estivesse a
responsabilidade civil de acordo com o princípio da dignidade humana. O que se busca
agora é não deixar a vítima desamparada, é proteger a pessoa lesada. Importante salientar,
como afirma Cavalieri Filho, que “não foi rápida nem fácil, entretanto, essa passagem da
responsabilidade subjetiva para objetiva” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de
Responsabilidade Civil, São Paulo: Malheiros). Observa-se, assim, que os princípios
constitucionais foram importantes para a modificação do panorama da responsabilidade
civil.
A responsabilidade civil, assim como o direito civil, precisa acompanhar as mudanças
sociais. A cada dia fatos novos e não previstos em lei aparecem nas relações jurídicas, o
que implica em uma mudança de interpretação do modo de ser visto o direito. Dessa forma
afirma o mestre Orlando Gomes que:
O Código Civil foi o estatuto orgânico da vida privada, elaborado para dar solução a todos
os problemas da vida em relação aos particulares. Não é mais, a olhos vistos. Perdeu, com
efeito, a generalidade e completude.
Cabe, então, ao aplicador do direito e aos seus intérpretes adaptar as leis aos novos fatos e à
Constituição, a fim de que o direito acompanhe as relações sociais e suas constantes
mutações. Dessa forma o direito sempre estará conforme as mudanças futuras tornando-se
atuais e justas ao seu tempo. Isso pode ser observado no que tange a responsabilidade civil
que influenciada pela Carta Magna e por seus princípios constitucionais mudou o panorama
da responsabilidade civil
Referências bibliográficas
TEPEDINO, Gustavo. Temas de Direito Civil, Rio: Renovar, 1999.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil, São Paulo: Malheiros.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil, São Paulo, Saraiva.
FARIAS, Cristiano Chaves De.Redescobrindo as fronteiras do Direito Civil: uma viagem
na proteção da dignidade humana.
FARIAS, Cristiano Chaves De. Achegas para (além da) reforma do Código Civil: o direito
ao não retrocesso.
FARIAS, Cristiano Chaves De. Direito Civil-Teoria Geral.
* Estudante de Direito
Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/x/35/22/3522/
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