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Cabo Verde e UE desencalham acordo de pescas
O novo acordo de pescas que a União Europeia propôs a Cabo
Verde está encalhado. Depois de duas rondas negociais, uma
na Praia em Abril, e outra em Bruxelas, em meados de Maio, os
negociadores reiniciaram ontem à tarde a discussão na capital
cabo-verdiana, para tentar superar as divergências que os
separam. Em causa estão várias questões, entre as quais a
relutância da UE em efectuar descargas de peixe em Cabo
Verde. A UE também não quer sujeitar as suas embarcações a
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Actualidade
inspecções técnicas das autoridades cabo-verdianas.
Com o actual acordo de pescas entre
Cabo Verde e a UE a expirar o seu prazo
já no final deste mês, as duas partes tentam agora compatibilizar os interesses antagónicos que ditaram o insucesso das
duas rondas anteriores. Embora a directora-geral de Pescas, Ermelinda Carvalho,
negue que esta terceira ronda tenha sido
“arrancada a ferros”, informações recolhidas por A Semana apontam para uma
indefinição do processo após as conversações que terminaram em Bruxelas no
passado dia 17 sem qualquer avanço. Um
alegado impasse que terminou no início
desta semana, quando a UE mostrou interesse em retomar as negociações, iniciadas entretanto.
Na base da discussão está a proposta
de um novo acordo de pescas e a consequente revisão dos pontos previstos no
protocolo e anexo rubricado na Praia em
2001, que a União Europeia apresentou a
Cabo Verde. Segundo A Semana apurou,
são pelo menos duas as questões que estão a dificultar o alcance de um consenso
entre Bruxelas e Praia - a descarga do peixe capturado pelos barcos europeus em
Cabo Verde e a realização de inspecções
técnicas.
Tendo em conta o acordo de pescas actualmente em vigor, os pesqueiros europeus são obrigados a descarregar em Cabo
Verde cinco por cento do pescado extraído das águas nacionais. No entanto, segundo o apurado por este semanário, a UE
quer eliminar, pura e simplesmente, esta
cláusula. A justificação é simples: com a
quantidade “irrisória” de peixe capturado em Cabo Verde pelos pesqueiros europeus, esta obrigação deixa de fazer sentido.
Segundo uma fonte, esta situação ape-
nas se verifica porque Cabo Verde não
controla a quantidade de pescado capturado pelas embarcações europeias, apesar
do actual acordo prever a presença de um
observador cabo-verdiano a bordo, para
efeitos de fiscalização. Assim, assegura a
fonte, é complicado confirmar se esta
quantidade de pescado é assim tão irrisória quanto isso, uma vez que os pescadores europeus podem declarar o que quiserem, a seu bel-prazer.
Talvez cientes desta questão, e decerto preocupados com a possível redução do
abastecimento de pescado às indústrias
nacionais de transformação de peixe,
quando confrontados com esta pretensão,
os responsáveis cabo-verdianos bateram
o pé ao gigante europeu.
Uma atitude que se repetiu face a uma
outra pretensão da UE a que as autoridades cabo-verdianas também se opõem, e
que a ser aprovada retiraria a Cabo Verde
a possibilidade de fazer inspecções técnicas aos barcos europeus. Embora neste
momento Cabo Verde não esteja a dar resposta à fiscalização das embarcações, a
sua contemplação no diploma atribui-lhe,
pelo menos, a possibilidade de exercê-la.
Com a anulação dessa possibilidade, Cabo
Verde ficaria, assim, de pés e mãos atados em matéria de fiscalização, ficando
literalmente a ver os navios passar.
A configuração da proposta europeia
aproxima-se, desta forma, de um acordo
de livre acesso e não de parceria, como a
UE lhe pretende chamar. Uma espécie de
camuflagem que encobriria a política que
Bruxelas tem estado a desenvolver em
matéria de pescas.
Com os stocks piscícolas dos países
membros em baixa, a UE tem-se virado
progressivamente para os países menos
desenvolvidos em busca de bancos de peixe que alimentem e suportem o mercado
europeu. Em geral, conhecedor das fragilidades e deficiências desses países do Sul,
Bruxelas procura, segundo um responsável cabo-verdiano, impor condições draconianas a troco de uma compensação mínima.
“Esta tem sido uma forma de retirar
dos países do Sul os seus recursos piscícolas sem muitas compensações. Ora,
desta vez, queremos negociar muito bem
o nosso acordo com a UE, e em condições mais vantajosas”, diz a fonte, para
quem, num processo como este, “é coisa
normal” as interrupções negociais.
MONTE VENTOSO
A falta de fiscalização das movimentações e actividades dos pesqueiros europeus em águas nacionais é real como, aliás, o admite a directora-geral de Pescas,
Ermelinda Carvalho. Embora estejam previstas no acordo de pescas entre Cabo
Verde e UE, medidas como a presença de
um observador cabo-verdiano a bordo das
embarcações, a comunicação da entrada
e saída dos navios da Zona Económica Exclusiva cabo-verdiana ou o envio à DGP
de diários com o tipo de pescado capturado e a indicação das zonas de faina “não
são cumpridas pela maioria dos pesqueiros europeus que operam nas nossas
águas ao abrigo do protocolo assinado
entre a UE e Cabo Verde”, reconhece Carvalho, embora saliente que “existe um
grande número que o cumpre”.
A directora-geral das Pescas admite,
entretanto, a necessidade de articular com
as capitanias e com a Guarda Costeira novas formas de actuação em matéria de fis-
calização, não adiantando, porém, qualquer tipo de calendarização com vista a
este reforço.
A inércia cabo-verdiana nesta matéria
é, inclusivamente, apontada como uma das
responsáveis pelo encalhe do pesqueiro
espanhol “Monte Ventoso” em Pedra do
Lume, no Sal, a 12 de Maio do ano passado. De acordo com o Protocolo e Anexo
ao Acordo de Pesca de 2001, este “palangreiro de superfície” deveria operar “a
partir das 12 milhas, a contar das linhas
de base”, o que obviamente não foi cumprido.
O redemoinho de reacções que se seguiu, com duas tentativas de desencalhe
frustradas pelo meio, e a notificação feita
pela autoridade marítima do Sal ao armador espanhol para que este retirasse o pesqueiro até ao dia 22 de Maio, em nada resultaram. Agora, mais de um ano depois,
o Monte Ventoso continua encalhado,
constituindo um risco para a saúde pública, para o ambiente e para a própria segurança das outras embarcações que circulam na zona. Isto quando há bem pouco
tempo a UE impôs a Cabo Verde, como
condição para importar o seu pescado,
limpar a baía do Porto Grande, em São
Vicente das sucatas que ali jaziam.
Confrontada com esta questão, a directora-geral de Pescas afirmou que a
DGP “está em conversações com o Governo espanhol para a retirada da embarcação”, e com a UE, “para fazer pressão
sobre o armador”. Segundo Ermelinda
Carvalho, esta questão será inclusivamente abordada na ronda negocial que agora
decorre e onde também serão postas encima da mesa as constantes violações do
acordo de pescas, por parte das embarcações europeias.
ADEUS MIMINA
Guilhermina Almeida Ribeiro (Mimina) partiu terçafeira deste mundo deixando para trás aquele que foi seu
companheiro de vida durante 50 anos, Carlos Ribeiro, Cai.
A Semana que na edição anterior rendia a sua homenagem ao casal que no sábado celebrou as suas bodas de
ouro curva-se agora perante a ditadura da morte, a única culpada desta separação forçada.
Miminha foi ontem a enterrar no cemitério da Várzea frente ao olhar inconsolável dos sete filhos, muitos
netos, alguns bisnetos e acompanhada por uma multidão de amigos.
Descanse em paz Mimina
À família enlutada toda a solidariedade da equipa de
A Semana.
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Daniel Benoni, antigo inspector dos
Negócios Estrangeiros, que viu a sua casa
vasculhada por polícias que procuravam
os documentos relativos ao célebre
escândalo do “enxoval” do embaixador
Eugénio Inocêncio, não mais irá responder
sobre este processo na justiça. Isto
porque a queixa contra ele formulada pelo
Ministério Público, desde 1996, por
alegada posse de documentos do Estado,
prescreveu. Mas Benoni não é o único
nesta situação. Vários outros casos, estes
existência de tais crimes, desta vez por
causa da entrada em vigor do Novo
Código do processo penal NCP, a culpa
voltou a morrer solteira.
Novo Código Penal prescreve escândalos dos anos 90
Volvidos nove anos, Daniel Benoni
ainda se lembra do dia em que sete agentes da Polícia Judiciária lhe bateram à
porta, de manhãzinha, com um mandato
da Procuradoria da República, para procederem à recolha de documentos relativos ao caso do enxoval do embaixador
Eugénio Inocêncio que alegadamente se
encontravam na sua posse.
Antes, em Agosto de 1993, tinha transpirado para A Semana o célebre relatório
feito pelo mesmo inspector à Embaixada
de Cabo Verde em Lisboa, e no qual se
dava conta dos gastos de Inocêncio, apodado na época de “embaixador estrela”,
pelo então titular do MNE, Manuel Chantre. A bronca foi tal, que uma das suas
consequências ditou a primeira cisão do
MpD, já que este partido, recém-chegado
ao poder e marcado por várias clivagens
internas, se dividiu em dois grandes blocos: um a favor da defesa de Inocêncio e
outro pela sua crucificação.
Mas, como nestas coisas a corda sempre arrebenta do lado mais fraco, Daniel
Benoni acabou demitido e afastado do
MNE. Com o tempo ao seu dispor, ele
acabou por verter para o papel toda esta
peripécia no seu livro “Escândalo e Bênção”. Os documentos procurados pelos
agentes da PJ eram, alegadamente, o suporte da referida obra, publicada em Janeiro de 1997 e logo transformado num
“best-seller”, ainda que nas dimensões
de Cabo Verde.
Daniel Benoni, que haveria de escrever um segundo livro (“Os clarins da
perseguição e corrupção”, onde retoma
o caso Inocêncio e outros mais), recorda
que no dia em que foi detido e conduzido ao Tribunal o procurador Manuel Filipe apareceu na televisão “a dizer que
eu ia apanhar o mínimo de dois anos de
cadeia, por ter em meu poder os originais de documentos oficiais da embaixada de Lisboa e do MNE”.
Detido, depois de ver durante quatro
horas os agentes da PJ a vasculharem a
sua casa, na presença do pai, um nonagenário aflito com a situação do filho,
Daniel Benoni recorda também que, diante de um outro procurador encarregue
de o ouvir, ficou provado que não havia
nenhum original de documento oficial na
sua posse. “Ficou provado que só tinha
fotocópias e um exemplar do meu relatório”. Ainda assim, foi processado por
posse ilegítima de documentos públicos.
Decorridos nove anos sobre esse episódio, eis que Daniel Benoni recebe a
comunicação de que o processo contra
si prescreveu com a entrada em vigor do
Novo Código Penal, e que, por isso, vai
ser arquivado. O curioso, no entanto,
como afirma, o antigo inspector do MNE,
“o procurador Manuel Filipe continua
na sua e insiste que desviei documentos
oficiais. Mas nunca diz que documentos
são. Se foram furtados, devem estar em
falta nalgum lado”, comenta Benoni.
No meio disto, Benoni não se esquece que por causa do escândalo Inocêncio viu a vida virada de cabeça para baixo, porque se recusou a reescrever o seu
relatório de inspecção à embaixada de
Lisboa, como lhe chegou a ser sugerido
por alguns poderosos da época. “O Inocêncio, o primeiro responsável por tudo
isto, que eu saiba, não teve processo nenhum de peculato, conforme o provado.
O inspector, eu Daniel Benoni, é que
pagou as favas. Depois de tudo o que
passei, chega-me agora às mãos um despacho do MP a dizer que o meu processo prescreveu. Eu podia pegar nisto e
pedir uma indemnização ao Estado. Mas
com este tribunal não vou perder o meu
rico tempo”.
OUTROS CASOS
Mas Daniel Benoni não é o único
caso de prescrição ditada pela entrada em
vigor do Novo Código Penal. A Semana
tem informações de que várias comunicações do género têm chegado à Inspecção-Geral das Finanças, para desalento
dos responsáveis e quadros desse serviço, para quem o MP tem funcionado
como um cemitério de processos que
sequer são despachados. Um desses processos que acaba de prescrever, e por isso
arquivado, é o respeitante à gestão do então cônsul-geral de Cabo Verde em Boston, Alírio Vicente Silva, caso este vindo a público em 1991, nos primeiros meses de vida da chamada II República. Disso resultou um processo-crime, em 1994,
pelo qual aquele diplomata, hoje embaixador na Áustria, era acusado do crime
de abuso de confiança.
Um outro processo, este de 1995, é o
relativo a uma inspecção à Oficina Mecânica das FARP, realizada em Outubro
de 1994, e da qual resultaram “indícios
de utilização indevida de dinheiro público”.
Em tudo isto vem mais uma vez ao
de cima a morosidade ou a forma como
funciona a justiça em Cabo Verde. Se por
um lado é verdade que a entrada em vigor do NCP impõe a prescrição de casos
há muito por julgar (em geral cinco anos),
por outro resulta também claro que os
mesmos processos apenas prescreveram,
agora, porque ninguém se deu ao trabalho de pegar neles. Por conseguinte, lá
onde poderia haver eventuais responsabilidades a assacar, a culpa simplesmente morreu solteira, uma vez mais. Para
descrédito de todo o sistema judicial, poJVL
lítico e social, cabo-verdiano.
Actualidade
desvios de recursos públicos, acabam
também de prescrever. A ser verdade a
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
envolvendo inspecções a alegados
DN DO MPD APROVA ESTRATÉGIA PARA LEGISLATIVAS
Sexta-feira,
3 de
Junho
de de
2005
Sexta-feira,
3 de
Junho
2005
Actualidade
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A reunião da Direcção Nacional do
MpD, realizada no final da semana
passada na Praia, culminou com um
pedido de Jorge Santos para um
encontro com Agostinho Lopes, a
fim de tratarem eventuais
divergências entre a sua ala e o
presidente do partido. A reunião da
DN, que chegou a conhecer
momentos acalorados, serviu ainda
para aprovar as linhas gerais da
estratégia do partido, que estabelece
como meta ganhar as eleições
legislativas de 2006 com maioria
absoluta. Até lá, o MpD vai procurar
cicatrizar as feridas, ainda abertas,
deixadas pela sua última convenção.
Reunião agitada volta a divergir alas
Jorge baixa a bola diante de Agostinho
A Direcção Nacional do MpD esteve reunida no úl-
Para desfazer suspostos ous alegados mal-entendi-
inhas para a próxima temporada política. Segundo a
timo fim-de-semana, na Cidade da Praia, para analisar
dos, Jorge Santos solicitou, durante a reunião, um en-
vice-presidente, Filomena Delgado, declarou à impren-
a vida interna do partido, a estratégia para as eleições
contro com Agostinho Lopes, para discutirem os pro-
sa, a DN estabeleceu como objectivo prioritário o MpD
de 2006 e a situação política nacional. O encontro de-
blemas existentes e relacionados com a vida do parti-
ganhar as legislativas de 2006 “com maioria absolu-
correu num ambiente quente, como previu este jornal
do. Conforme as nossas fontes, ficou assente que esse
ta”, estando, conforme ela, todas as estruturas a traba-
na sua edição anterior. A reunião começou com Mário
encontro será realizado logo assim que as partes acer-
lharem para o efeito.
Silva (do grupo de Jorge Santos) e António Pascoal San-
tarem uma data para tal.
tos (da ala de Ulisses Silva) “ao ataque”, criticando a
A mesma reunião estabeleceu um prazo de quatro
“Neste aspecto a reunião da DN foi esclarecedo-
meses para a Comissão Política elaborar as listas para
ra”, diz um membro daquele órgão do partido, afecto
as legislavas de todos os concelhos, cujos cabeças se-
Mas o que dominou realmente as atenções foi a po-
ao grupo de Agostinho Lopes. “Demos alguns avisos
rão designados com base nos resultados de uma sonda-
lémica surgida, em Santo Antão, na sequência do posi-
ao Jorge Santos e ao seu grupo, em especial ao seu
gem, tal como aconteceu nas autárquicas de 2004. Isto
cionamento público assumido por responsáveis afec-
compadre Joel Barros. Foram também definidos os
sem contar com o perfil dos candidatáveis, que mere-
tos à tendência de Jorge Santos naquela ilha, com des-
critérios para a elaboração das listas, e dentro de três
ceu uma primeira abordagem na sessão da DN do pas-
taque para o coordenador do Porto Novo, Osvaldino
ou quatro meses a situação deverá estar harmoniza-
sado fim-da-semana.
Silva. Este, como A Semana deu conta no seu devido
da. O que não podíamos fazer era aceitar a situação
Mas as preocupações da cúpula do maior partido da
tempo, tem vindo a propor que pessoas e quadros não
em que estávamos, sob pena de prejudicarmos o pró-
oposição não ficaram por aí. Esta analisou a situação
residentes na ilha sejam excluídos da lista dos candida-
prio MpD”. Para a mesma fonte, que se mostrou um
política nacional que, segundo declarou Filomena Del-
tos do MpD para as legislativas de 2006. Uma posição
tanto ou quanto deconfiada quanto às reais intenções
gado, caracteriza-se por uma “acentuada estagnação
que é vista como uma tentativa de afastar certos ele-
de Jorge Santos, “a convenção terminou há muito tem-
económica”, com “indícios de corrupção” e “partida-
mentos afectos a Agostinho Lopes da corrida em favor
po e não podemos admitir lideranças paralelas de
rização da comunicação social e da administração
de outros próximos a Jorge Santos, de quem Osvaldino
quem quer que seja”.
pública”. A DN recomendou à CP criar um Grupo de
forma como o partido vem sendo dirigido.
Aliás, segundo essa e uma outra fonte por nós con-
Trabalho para acompanhar e accionar os mecanismos
Fontes deste jornal confidenciaram que, durante
tactada, esta última pertencente a uma outra ala, a tóni-
necessários de combate aos alegados “desmandos do
a reunião, vários responsáveis, inclusive os de Santo
ca da mensagem de Agostinho Lopes aos presentes na
actual poder” tambarina. Uma outra preocupação dos
Antão, dirigiram fortes críticas a Osvaldino Silva,
reunião, muito especialmente ao grupo de Jorge San-
ventoínhas prende-se com o recenseamento eleitoral,
Joel Barros e Jorge Santos, estes dois últimos vistos
tos, foi mostrar que é ele o líder do MpD, que também
daí o apelo para que todos os militantes façam o acom-
por alguns colegas como autores intelectuais da ideia
tem um secretário executivo e outros órgãos para gerir
panhamento desse dossier, de forma a garantir a trans-
de excluir os não residentes das próximas listas elei-
o seu dia-a-dia. É que alguns dos elementos de Jorge
parência dos próximos actos eleitorais.
torais do MpD. Diante do fogo cerrado, Barros e
Santos são acusados de estarem em campanha aberta,
Uma nota curiosa. Além da celeuma e das questões
Santos demarcaram-se da posição assumida pelo co-
especialmente em São Vicente e Santo Antão, contra a
analisadas pela DN da semana passada, esta registou a
ordenador do MpD no Porto Novo, deixando-o sozi-
actual direcção do partido, com alguns deles a aventa-
presença, pela primeira vez, de José Luís Livramento
nho frente aos seus críticos. Jorge Santos também
rem, inclusive, sobre a necessidade de uma convenção
na reunião. Neste particular uma das fontes de A Se-
negou que esteja a realizar uma liderança paralela a
extraordinária, porque “com Agostinho não vamos a
mana fala em “desconforto” dele, Livramento, e de
Agostinho Lopes, conforme foi também acusado du-
lugar nenhum”.
muitos dos participantes da reunião. “Ficou-se com a
é um fiel seguidor.
rante a DN, por alegadamente não ter aceite os resultados da última convenção.
O órgão máximo entre as convenções também apreciou e aprovou as linhas gerais da estratégia dos vento-
impressão que a presença dele ainda não é bem aceite
por todos”, conclui.
ADP/JVL
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DGCI muda de titular
A directora-geral das Contribuições e Impostos, Alcinda Duarte, vai ser substituída por
Emanuel Moreira (foto), quadro do Ministério das Finanças. Esta mudança de mãos na DGCI
acontece um ano depois da nomeação de Duarte, e também numa altura em que decorre
uma sindicância a todas as repartições de finanças.
Maio, quando o antigo responsável da Repartição das Finanças, Jorge Lopes da Graça, escafedeu-se para os EUA, deixando o
cofre fechado, depois de alienar mais de
uma dezena de viaturas do Estado, algumas das quais em forma de casco,
tal como o denunciado por A Semana, na sua edição de 15 de
Abril passado. Por estas e por
outras, há quem entenda que
o buraco na moralização da
DGCI é bem mais em baixo, cabendo agora a Emanuel Moreira ajudar a pôr
cobro a esse quadro.
JPAI-Ribeira Grande com nova equipa
O jurista Nelson Cruz foi eleito esta semana para comandar os destinos da Juventude do PAICV no concelho da Ribeira Grande, Santo Antão, nos próximos três anos. À
frente de uma equipa renovada, Cruz nomeia como prioridade trazer maior dinamismo àquele sector da JPAI, num momento
em que é preciso “trabalhar para ajudar o
PAICV a manter-se na governação do país
em 2006”.
Desde logo, Nelson Cruz e a sua equipa
querem organizar debates e conferências
“multifacetados” em todas as zonas da Ribeira Grande, para não só incentivar os jovens a participarem na vida sócio-política do
país, como também reflectir sobre os problemas que afectam aquele concelho. Por
um lado, “queremos combater o medo dos
jovens quadros em assumir posições políticas;” e por outro, “daremos grande atenção
à questão da saúde reprodutiva dos adolescentes, à gravidez precoce, cuja incidência
na Ribeira Grande, além de bastante elevada, causa diversos problemas sócio-económicos e sanitários”.
Considerando como objectivo estratégico apoiar o PAICV, para que o seu partido
possa ganhar as próximas legislativas, Cruz
pensa que é importante nesse contexto “desencadear acções que promovam um relacionamento saudável na sociedade, através
do diálogo, do respeito e da ética política”.
Um pensamento que ele e a sua equipa que-
rem materializar, estabelecendo “boas relações com a Câmara Municipal da Ribeira
Grande, que representa o poder local e é
uma instituição próxima da população”.
Assumir tal postura, reitera o jovem jurista, não significa que a JPAI estará sempre de acordo com as políticas camarárias
para a juventude, mas antes indica que se
vai colocar o interesse dos jovens em primeiro plano. É por isso que aquela organização partidária pretende trazer para o debate político temas como o alcoolismo, que
atinge proporções “alarmantes” no seio da
juventude ribeira-grandense, o consumo de
outras drogas e a assistência jurídica a jovens que respondem a processos criminais.
A eleição de Nelson Cruz acontece justamente na semana em que Felisberto Vieira e Josefá Barbosa, membros da comissão política nacional do PAICV, foram a
Santo Antão “espevitar” as estruturas locais
tambarinas, no sentido de trabalharem para
promover a imagem daquele partido. Durante dois dias de intensa actividade, aqueles dois políticos reuniram-se com os militantes dos três concelhos, lançaram a revista que promove Porto Novo enquanto futura cidade de Santo Antão, e discutiram
ideias com os quadros da ilha.
E Filú aproveitou a sua estada em Santo Antão para reiterar a sua disponibilidade
em candidatar-se à Presidência da RepúJAM
blica.
Actualidade
através da efectiva cobrança junto das pessoas singulares, empresas e professionais
liberais. Um desiderato que, a julgar pelos
números avultados de dívidas ao fisco que
transpiram para a opinião pública, está longe de ser atingido de forma célere e transparente. Isso, num país onde se diz que quem
paga imposto é o pobre, porque os poderosos sempre encontram uma forma de “dar
um feito” nas suas obrigações.
Neste sentido encontra-se também em
curso, há já algum tempo, uma sindicância
a todas as repartições de finanças, para apurar situações consideradas impróprias ou
pouco ortodoxas no funcionamento da própria instituição. Entre outras supostas anomalias, constam suspeitas de cumplicidade entre certos responsáveis ou funcionários com alguns operadores n a
fuga ao fisco.
Um outro facto,
recente, é o que
aconteceu na ilha do
Sexta-feira,
3 Junho
de Junho
de 2005
Sexta-feira,
3 de
de 2005
Alcinda Duarte, há um ano à frente da
Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, vai ser substituída pelo economista
Emanuel Moreira. A resolução nesse sentido deve sair a qualquer momento no Boletim Oficial, segundo o apurado por A
Semana.
Actualmente director dos Serviços de
Contas da Direcção-Geral do Tesouro,
Emanuel Moreira é licenciado em economia nos EUA e é quadro do Ministério das
Finanças e do Planeamento, tal como a sua
antecessora Alcinda Duarte.
A DGCI é considerada um departamento nevrálgico no sistema das finanças públicas de Cabo Verde, sector que vem passando por uma profunda reforma. Cabe-lhe
proceder à recolha das contribuições e impostos, estando em curso a sua modernização com vista a uma maior eficácia dos serviços que presta ao país, nomeadamente fazer com que os cofres do Estado entre para
as receitas que precisa para funcionar, isso
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JOSÉ PINTO ALMEIDA, presidente da Câmara da Boa Vista
O sentimento do presidente da Câmara Municipal da Boa
Vista não se ajusta com o retrato económico da ilha feito
há dias, na capital, pelo Instituto Nacional de Estatística
(INE), que acusa alguma quebra nos seus principais
indicadores. E fala de projectos em curso ou em vias de
arrancar, sobretudo no sector do turismo, para contrariar
a tendência do INE e mostrar que “Boa Vista está na moda”.
processo de constituição e implementação da Sociedade
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Entrevista
O autarca admite, entretanto, que é preciso agilizar o
de Desenvolvimento Turístico da Boa Vista e Maio, entidade
que vai gerir o processo nas duas ilhas porque, para não se,
correr o risco de perder investimentos. Neste exclusivo, Pinto
Almeida presta ainda esclarecimentos sobre os terrenos privados
de Espingueira, que a Câmara vendeu a um investidor que
quer construir aí um hotel para agriturismo, e
nega que o estádio de Sal-Rei esteja
vendido.
— Por: CONSTÂNÇA DE PINA —
“Boa Vista está na moda”
A Semana - Recentemente foi apresentado um estudo na Praia (INE) que
mostra que os principais indicadores
económicos da Boa Vista estão a baixar,
contrariando a lógica nacional. A que se
deve esse “abrandamento” da ilha?
José Pinto Almeida - Não conheço
esse estudo mas duvido que os indicadores da Boa Vista tenham baixado, pois regista-se um grande volume de investimentos — nomeadamente na infra-estruturação e no turismo — traduzido no afluxo
de pessoas e bens provenientes de outras
ilhas e da Costa Ocidental Africana à procura de emprego. Por outro lado, os in-
vestimentos e projectos que neste momento se encontram em fase de implementação são dos mais importantes do país, a
nível do sector do turismo. Só para lhe
dar um exemplo, Boa Vista é o terceiro
maior consumidor de cimento do país, o
que demonstra a grande dinâmica do mercado de construção civil.
- Já agora, podia-nos indicar as primeiras consumidoras de cimento e em
quê se baseou para fazer essa afirmação, tendo em conta que estamos a falar de uma ilha com pouco mais de quatro mil e 500 habitantes?
- Trabalhamos com dados recolhidos
de entre os maiores fornecedores de cimento do país, e o que afirmo também é
visível no número e envergadura dos investimentos em curso na ilha.
- Fala-se, há algum tempo, em bloqueios da CM ao investimento externo, inclusive há quem atribua alguma
responsabilidade à autarquia pelo fecho do maior hotel da ilha, o Marine
Clube. Será este um dos motivos para
o não surgimento de novos investidores interessados em fixar--se na Boa
Vista?
- Isso é falso. A nossa CM apadrinha
todos os investidores externos que preten-
dem desenvolver actividades nesta ilha.
Aliás, em tempos fui acusado por certas
pessoas de dar um tratamento preferencial aos investidores, em detrimento dos nacionais. E agora acusam-me de bloquear? Não compreendo. Em relação ao Marine Clube devo dizer que temos boas relações com os proprietários. Tanto quanto sei, o encerramento deve-se a sucessivas mudanças de sociedade e de gestão.
NOVOS
INVESTIMENTOS
- Apesar de discordar dos indicado-
investimentos se percam por falta de
condições mínimas para o seu funcionamento?
- Temos dialogado com o governo,
procurando parceiros externos, e posso
dizer que tem surtido algum efeito. Se-
… Boa Vista é o terceiro maior consumidor de
cimento do país, o que demonstra a grande
dinâmica do mercado de construção civil.
não vejamos: a estrada Vila/Rabil vai ser
construída com um novo traçado a partir
da ponte da Ribeira-de-Água, no âmbito
do projecto do novo aeroporto; a estrada
Vila/Bofareira vai ser retomada no quadro de um contrato-programa que vamos
assinar com o governo, segundo nos disse o primeiro-ministro aquando da recente visita que fez a esta ilha; vamos instalar um dessanalizador na Zona Norte, através da parceria com as Canárias e, também ainda no quadro da cooperação com
as Canárias, já estamos a trabalhar num
plano integrado de recolha e tratamento
de resíduos sólidos, um projecto estruturante para a ilha da Boa Vista, na óptica
do ambiente.
- Como perspectiva o turismo na
Boa Vista, numa altura em que o aeroporto internacional é visto por boa parte dos operadores como a “salvação da
lavoura”?
- Com tudo o que já se disse, não me
nessas duas ilhas porque, caso contrário,
corremos o risco de perder esses avultados investimentos.
- Relativamente à Electra, alguns
moradores e detentores de empreendimentos turísticos levantaram a questão
da sua localização, bem no coração da
Vila de Sal-Rei. Falam da poluição sonora e ambiental e do perigo para a segurança de toda a Vila. Há algum projecto a prever a sua deslocação para alguma zona mais afastada?
- Temos vindo a dialogar com a Electra sobre esse assunto em particular, mas
ainda não temos nada de concreto.
- Nas traseiras da Electra há um vazadouro “clandestino” que em nada
abona a favor da zona, que é uma das
mais nobres da Vila, pois o cheiro se
sente à distância. Que tipo de intervenção a Câmara pretende fazer para pôr
cobro a esta situação?
- Isso é um problema de educação cívi-
ca. As pessoas sabem que não podem fazer isso mas fazem. Mas temos dois projectos em concreto: um de educação ambiental e o outro que já referi, que é estruturante. Estou a falar da recolha e tratamento dos resíduos sólidos, mas neste
caso que fala, temos previsto uma intervenção rápida no local.
- Mas a CMBV tem algum projecto
para transferir o ‘Bairro Caserna’, subúrbio de lata que nasceu paredes-meias com as instalações da Electra, para
um outro lugar com melhores condições
de habitabilidade ou é para manter?
- Sim, um projecto que pensamos ser
de grande importância é o do realojamento
de todos os habitantes, já identificados,
dos bairros degradados que existem na
Vila de Sal-Rei, quer os que vieram de
outras ilhas, quer os da Costa Ocidental
Africana. Nós fizemos um plano urbanístico numa zona definida, distribuímos lotes e projectos a essas pessoas e vamos,
na medida do possível, apoiar quer tecnicamente quer com algum material a construção das suas habitações. Queremos que
elas vivam com dignidade, porque estão
aqui a apoiar o desenvolvimento da Boa
Vista. Por isso, não devem ser excluídos
e devem ter acesso aos bens e serviços
que a autarquia procura disponibilizar a
todos os munícipes. É esta a nossa filosofia. Claro que não temos meios para construir casas para toda a gente. Temos uma
política de habitação social voltada essencialmente para a terceira idade, mas também apoiamos a auto-construção de todos aqueles que pretendam construir uma
habitação, só que dentro do quadro definido pela autarquia, não de forma clandestina.
- O lixo é um problema em todas as
ilhas, sobretudo naquelas de vocação
turística. Este foi aliás, um dos grandes problemas colocados ao jornal pelos hotéis e residenciais. Para quando o
arranque do projecto de recolha e tratamento resíduos sólidos?
- Recentemente visitei as Canárias e
um dos dossiers que trabalhámos foi o de
desenvolver um projecto integrado de recolha e tratamento de resíduos. Na sequência dessa minha visita, estiveram na ilha,
provenientes das Canárias, dois técnicos
do sector que, conjuntamente com o nosso gabinete técnico, recolheram dados
para a elaboração desse projecto que será
incluído no Intereg III, programa da União
Europeia destinado à Macaronésia. Esse
projecto engloba a recolha e tratamento
dos resíduos em todos os povoados e permite acompanhar o desenvolvimento da
ilha, com a introdução paulatina de mais
viaturas de recolha, bem como a componente sensibilização, que para nós é fundamental para o sucesso deste projecto.
Como vê, ao mesmo tempo que damos
resposta imediata a essa problemática, estamos a trabalhar para o médio e o longo
prazo. Os fracos recursos levam-nos a procurar soluções integradas na concepção e
desenvolvimento destes projectos estruturantes para a ilha.
- Enquanto isso, o que a CMBV pretende fazer para atenuar o problema
do lixo? Existe algum projecto para se
construir uma lixeira municipal?
7
Entrevista
“
parece que a situação seja tão preocupante em termos de futuro. Agora, é necessário que se agilize o processo de constituição e implementação da Sociedade de Desenvolvimento Turístico da Boa Vista e
Maio, entidade que vai gerir o processo
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
res, o que é preciso fazer para travar essa
quebra e colocar Boa Vista de novo na
rota do desenvolvimento/crescimento?
- O que eu disse é que não tenho esse
sentimento. Aliás, muito pelo contrário,
Boa Vista está na moda. Tenho recebido
vários investidores que querem desenvolver projectos nesta ilha. Por exemplo, recebi um grupo britânico que pretende desenvolver um projecto numa área de 1.400
hectares com vários campos de golfe, três
hotéis cinco estrelas, uma marina, de entre outras coisas. Há ainda manifestações
de interesse de um grupo irlandês e de um
outro português, por isso não concordo
com essa tese de abrandamento.
- É no entanto visível que o sector
do turismo, que é tido como o motor de
desenvolvimento da ilha, está mais retraído. Os números mostram não só
uma redução acentuada do número de
camas e de unidades hoteleiras, como
também o não surgimento de novos investidores para essa área. Quer comentar?
- Claro que o sector se ressentiu com
o encerramento da maior unidade hoteleira e com os estrangulamentos de que a
ilha sofre em termos de ligação com as
outras, principalmente com o Sal e a Praia.
Mas se por um lado esse tipo de turismo
baixou um pouco, por outro, começa a ser
importante o sector imobiliário destinado
a estrangeiros que agora têm tempo de permanência maior na ilha. Hoje temos centenas de pessoas que passam boa parte do
ano na Boa Vista, e têm vindo a adquirir
casa própria.
- Uma queixa que pudemos constatar junto dos operadores desta ilha é a
falta de infra-estruturas básicas como
água, energia, esgoto e estradas. O que
é que a CM tem feito de concreto para
superar essas carências?
- O poder local tem as suas competências próprias no tocante a esses serviços. Nós não podemos substituir o Estado ou o sector privado. Nós garantimos o
fornecimento de água e energia às populações que não têm ligação ou aos povoados onde a Electra não opera, mas não
temos capacidade nem vocação para fornecer água e energia a esses empreendimentos. As nossas maiores dificuldades,
em termos de gestão desta autarquia, são
precisamente o fornecimento de água e
energia às populações.
No tocante a esgotos, isso tem que ser
um projecto estruturante, cujo orçamento
deve ser aí umas sete vezes superior ao
orçamento anual da Câmara. Não temos
esses recursos. Quanto às estradas, temos
vindo a fazer o que é da nossa competência. Nos povoados temos feito um esforço enorme de calcetamento de ruas e outras vias. Durante a nossa gestão aumentámos em cinco vezes o número de ruas
calcetadas em toda a ilha. Agora, as estradas nacionais, como por exemplo Bofareira/Vila ou Vila/Povoação Velha não
são da nossa competência e nem temos
meios para as remodelar. Temos vindo, entretanto, a fazer reparos e manutenção
pontuais mas mais não podemos fazer.
- É verdade que alguns desses serviços são fornecidos por privados. Mas
até que ponto a CMBV pode intervir/
pressionar de forma a evitar que alguns
TERRENOS DA
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Entrevista
8
- Como já disse, estamos a trabalhar
num plano integrado de recolha e tratamento de resíduos sólidos, um projecto
estruturante para a ilha, na óptica do saneamento, do ambiente e do equilíbrio do
nosso ecossistema, a aquisição de mais um
camião de recolha do lixo, para além do
já contemplado no projecto de água e saneamento em curso na ilha.
CRÍTICAS AO
“PARTENON”
- Os resultados do projecto Partenon - Valorização paisagística da ilha
da Boa Vista são perceptíveis em todas
as povoações da ilha, o que é de louvar.
Entretanto, em determinados bairros
existem críticas quanto aos critérios de
selecção das moradias que seriam beneficiadas, chegam até a apontar alguma politização do projecto. Quais os
critérios que, de facto, pesaram na hora
de escolher as casas que iriam sofrer
intervenção?
- Repare, esse projecto foi desenvolvido em parceria com o Cabildo do Tenerife. A primeira premissa é que não contempla todas as casas da ilha, por isso não se
pode agradar a todos. Desde 2001 que se
está a montar o projecto. Técnicos das Canárias e da CMBV fizeram visitas ao terreno, identificaram e fotografaram as casas. Posteriormente, foi feita uma selecção
das casas e das cores nas Canárias. Já na
fase de trabalho de terreno introduzimos o
conceito de justiça nesse projecto.
Vou-lhe dar um exemplo: havia casas
pertencentes a emigrantes que aparentemente têm condições para fazerem esses
trabalhos e que foram substituídas por casas de outras pessoas que não têm meios.
Mais, conseguimos que todas as escolas e
igrejas da ilha fossem contempladas pelo
projecto. Nós não tivemos intervenção directa na escolha das casas e dos beneficiários. Isso de politização é falso. Nós não
governamos com politiquices, e quem me
conhece sabe que não faço isso. Posso- lhe dizer que ainda estamos em negociações para a implementação da segunda
fase, agora em novos moldes, e com a participação mais forte da CMBV de forma a
corrigir alguns aspectos com os quais não
concordámos e que devem ser alterados.
- A questão dos terrenos está a ser
colocada um pouco por todo o Cabo Verde e Boa Vista não foge à regra. No caso
desta ilha, existe um problema pendente que se arrasta há vários anos com os
terrenos de Espingueira. Pode nos explicar esse dossier que, ao que parece,
poderá desembocar no Tribunal?
- O dossier Espingueira é claro como
água. Fomos contactados por um investidor que pretendia desenvolver um projecto de ecoturismo na ilha e tentámos identificar se esses terrenos estavam dentro do
perímetro das ZRPTS, e não estavam. A
CMBV vendeu esse lote de terreno ao investidor. E, já agora, para esclarecer quero dizer que os procedimentos administrativos da venda de terrenos são os normais e correntes em qualquer autarquia,
seja ela de que cor política for.
Ou seja, é a CM e não o presidente
que deliberou, em sessão, proceder à venda desse lote. Posteriormente, familiares
das pessoas que viviam nesse sítio vieram reclamar a posse desses terrenos. Mas
devo dizer que não estão inscritos na matriz, nem na Conservatória, em nome dos
familiares dos reclamantes. A CMBV praticou, por isso, um acto legal da sua competência, ao vender o referido lote de terreno.
Entretanto, tendo em conta que viveram nesse local, a CMBV fez uma nova
configuração dos lotes reclamados e, na
sessão do dia 16 de Setembro de 2003,
deliberou atribuir a essas mesmas pessoas lotes de terrenos a título gratuito de forma a resolver esse problema. Após uma
reunião efectuada em que concordaram
com a solução por nós apresentada, recusaram-se a vir legalizar os terrenos cedidos gratuitamente. Mas pensamos que por
detrás de tudo isso, há outros interesses…
- Mas a quem pertencem, de facto,
esses terrenos?
- Esses terrenos estão abandonados há
mais de 15 anos, porque as famílias foram viver essencialmente em João Galego. Se reclamam, como se diz, o direito
Usucapião, não deveriam ter abandonado os lotes, pois essa figura só se aplica
quando a ocupação é permanente, contínua e pública. E, porque estamos num Estado de direito democrático podem, se quiserem, recorrer aos Tribunais.
Devo dizer ainda que os reclamantes
nunca se dirigiram à CM para legalizar
os lotes que lhes foram atribuídos gratuitamente. Por isso, não colhe a afirmação
de que a CM já havia alienado os mesmos lotes a terceiros. Que fique claro que
esses lotes atribuídos valorizaram-se automaticamente em virtude da proximidade desse empreendimento hoteleiro.
Quanto às receitas provenientes da transacção atrás referida, foram aplicadas na
execução de vários projectos de infra-estruturação do município, visando a melhoria das condições de vida da população de forma que, se por um lado directamente compensamos essas pessoas com
outros lotes no mesmo local, por outro
lado, também indirectamente foram beneficiados com a aplicação dessas verbas
na melhoria das condições de vida da população.
- Esses terrenos foram comprados
por 4.500 contos - foi o comprador que
forneceu ao jornal o valor da transacção - e o hotel construído sobre as bases das antigas casas será inaugurado
em Agosto. Será que o dinheiro da venda não deveria ser distribuído pelos antigos moradores, já que não dá para voltar atrás?
- Não, porque essas pessoas foram
contempladas desde 2003 com lotes de
terreno no mesmo local. Aqui nem se trata de expropriação, nem coisa parecida.
Como disse, os terrenos estavam abandonados havia mais de 15 anos e não estavam inscritos na matriz nem na Conservatória. Foi por isso que agimos como
agimos e pensamos ter agido correctamente. Mas estão no direito de pensar doutra
forma e agir em conformidade.
- Existe uma especulação imobiliária sem precedentes na Boa Vista, com
terrenos a serem vendidos, sobretudo
por privados, a preços altíssimos. Até
que ponto a CM pode intervir para travar essa especulação?
- Numa ilha que está despertando para
o turismo, com pessoas proprietárias de
9
A DISCÓRDIA
…os procedimentos administrativos
da venda de terrenos são os normais
e correntes em qualquer autarquia,
seja ela de que cor política for.
Ou seja, é a CM e não o presidente
que deliberou, em sessão, proceder
à venda desse lote…
para serviços numa perspectiva de gerar
receitas para a gestão e conservação dessa infra-estrutura. O remanescente será
aplicado na construção de habitação social para os nossos idosos que vivem em
condições precárias. Como vê, é gestão
moderna e a rentabilização de um espaço
sem se perder os princípios que norteiam
a nossa gestão direccionada para a satisfação das necessidades dos nossos munícipes.
- Voltando aos terrenos, dentro da
Vila há várias pessoas que nos disseram
terem feito pedidos de terreno que nunca são despachados, enquanto outros
mais próximos da CM e do seu presidente têm sempre terreno?
- Temos falta de terreno. A Vila está
encurralada pelas ZDTIs e ZRPTS e ainda
por terrenos privados. Por isso, não conseguimos dar vazão à demanda. Vai ser possível agora que assinámos com o governo
a transferência dos terrenos da Zona de Fátima para a gestão municipal, onde iremos
lotear e infra-estruturar, ceder aos interessados. Nesse espaço irão ser lançadas, as
bases da futura cidade de Sal-Rei, numa
integração plena da zona histórica onde estamos agora, com a modernidade.
- Fiscalização inexistente, pouca e
discriminatória. Esse é o retrato traçado por alguns investidores, pequenos
operadores turísticos - agências de turismo, táxis, rent-a-car e motos -, comerciantes, para classificar esse serviço municipal, com claros prejuízos para a Câmara. Concorda com esta afirmação?
- Nunca houve fiscalização nos executivos anteriores. Nós implementámos
uma divisão de fiscalização com cinco
fiscais. Tudo feito de raiz, com formação
e estágio numa autarquia amiga. A implementação desse serviço, para além do trabalho pedagógico que acarreta no seio da
população como no da equipa de fiscais,
leva o seu tempo. Estamos a trabalhar no
sentido de melhorar o seu desempenho e
acreditamos que isso vai acontecer. A ac-
tuação desse serviço não tem sido discriminatória. Como já disse, não é do nosso
timbre essa forma de trabalhar.
- Dentro de dias a Boa Vista vai acolher um fórum. Fala-nos um pouco desse certame?
- Boa Vista foi durante muito tempo
uma ilha fechada e abandonada por vários motivos: o isolamento a que foi sujeita, emigração em massa da população, etc.
Hoje ela é a principal alavanca do sector
do turismo. Neste contexto temos vindo a
dar uma atenção especial à problemática
do desenvolvimento do turismo e da gestão ambiental da Boa Vista. Com isso, pretendemos evitar erros de concepção, planeamento e gestão que foram cometidos
noutras latitudes, por um lado, e, por outro, garantir um desenvolvimento equilibrado e sustentado, assente na justiça social e na promoção do homem boavistense, em particular. Sendo algo novo, pretendemos igualmente recolher subsídios
de forma a desenvolvermos políticas municipais de promoção do turismo e de preservação do ambiente.
O fórum “Turismo/Gestão Estratégica dos Recursos Naturais”, que decorrerá nos próximos dias 8 e 9 de Junho, contará com a presença de importantes personalidades nacionais e estrangeiras, e
será um espaço onde o Governo, a sociedade civil, o poder local, técnicos dos mais
diversos departamentos e serviços irão
dissertar sobre temas importantes destes
sectores, nomeadamente - “ZDTI/ZRPT Gestão estratégica na óptica do turismo”;
“Que políticas de ambiente para um desenvolvimento sustentável”; “Turismo e as
suas implicações no desenvolvimento social” e “Poder local - Que papel na promoção do turismo”.
Para nós é um momento importante e
por isso queremos que seja o mais participado possível, pois já convidámos várias personalidades, de entre elas o primeiro-ministro, os membros do governo dessa área, deputados, autarcas, etc.
Entrevista
ilha é a venda de apartamentos como segunda casa. Essa operação é vista como
um investimento. Nós temos na ilha algumas empresas e investidores que têm
um bom mercado internacional e convém
salientar, por isso compram terrenos a privados naturais da ilha por um preço razoável e depois multiplicam o investimento
na construção e venda desses apartamentos, uma solução normal, em que empresas nacionais com o IFH, Tecnicil ou Imotur estão a apostar. Ou vão-me dizer que
fizemos especulação com o IFH ou que
este esteja a fazer especulação? Não tem
lógica.
- O actual estádio de futebol estava
à venda e foi comprado por um investidor. Pode-nos explicar os meandros desse processo?
- É falso. O estádio está à venda em
regime de short list, um método aplicado
na gestão moderna. Entretanto, ainda não
foi vendido porque o prazo terminou nesta semana, 31 Maio, por isso não corresponde à verdade a informação de que já
vendemos o estádio.
- Mas se é o próprio comprador que
diz ter arrematado o estádio em hasta
pública... Só que, pelas conversas que
tivemos com algumas imobiliárias e
pessoas, havia mais interessados e ninguém se apercebeu da realização de tal
hasta pública…
- Enviámos as propostas aos investidores que estão presentes na ilha e também a outros que estão a operar no país,
porque, se por um lado achamos que os
que cá estão devem ser incentivados a investirem mais, por outro, queremos que
os grandes grupos do sector possam vir
também desenvolver bons projectos nesta ilha.
- Que destino terá o dinheiro da
venda do estádio da Vila de Sal-Rei, os
70 mil contos conforme a base da licitação proposta pela própria Câmara?
- Será investido na construção de um
estádio moderno e relvado, com espaços
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
terrenos com baixo rendimento, e com
uma grande procura de terrenos é normal
que haja especulação. A CM vende os terrenos segundo a tabela aprovada pela Assembleia Municipal, tabela essa recentemente actualizada. Se o mercado imobiliário está em alta e a procura é grande, é
natural que haja uma certa tendência para
a especulação na venda dos terrenos, agravada ainda pela pouca disponibilidade de
terrenos motivada pelas delimitações das
ZDTIs e ZRPTs.
- Quem está por detrás ou alimenta
essa especulação imobiliária?
- Não é a CM de certeza…
- Mas a CM vende terrenos para estrangeiros por tabela, que são revendidos por preços exorbitantes lá fora, com
ganhos apenas para as imobiliárias?
- Se me disse há bocado que bloqueava o investimento externo, não entendo
que me venha agora dizer que vendemos
terrenos a estrangeiros…
- Estou a falar concretamente das
imobiliárias que compram terrenos na
CM por tabela e vendem lá fora por até
sete vezes o seu valor, segundo denúncia de algumas pessoas que estão no
ramo da imobiliária…
- A CMBV vende os terrenos seguindo uma tabela aprovada pela AM e publicada no BO. Nós não podemos controlar
o que é feito depois. As leis do mercado
ditam, depois, a procura e a oferta. Se hoje
a procura é maior que a oferta é natural
que vendam a quem pagar mais, da mesma maneira que há uns anos atrás terreno
na Boa Vista era visto como um mau investimento. Hoje existe um mercado imobiliário forte, é natural que quem tenha
comprado um terreno e não pode construir, venha a fazer negócio de modo a que
fique com uma moradia e venda o direito
de construção a alguém pelo preço dessa
moradia. Temos conhecimento de várias
situações e a Câmara não vê nenhum inconveniente.
Por outro lado, o que está na moda na
TACV
premeia
Agências
de Viagens
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Correio das ilhas
10
Orbitur, Agência Nacional de Viagens, e Viagens de Cabo Verde, na
Praia, e Verdemundo, Fly e ANV, em
São Vicente, são as agências de viagens
premiadas pela TACV, no início desta
semana, pelo “desempenho e performance demonstrados” durante o ano
2004. E para premiar os melhores, a
TACV elegeu como critério principal
o factor crescimento no mercado.
A direcção comercial da TACV Cabo Verde Airlines realizou nos dias
28, na Praia, e no dia 30, em São Vicente, duas galas destinadas a premiar as agências de viagens mais performantes. Ou seja, aqueles que mais
cumpriram e contribuíram tanto para
a carteira de negócios da transportadora aérea nacional como para o desenvolvimento da parceria estratégi-
ca e privilegiada que deve existir entre as agências e as companhias aéreas. Assim, o crescimento em relação
a 2003, o volume da vendas e o cumprimento do prazo na entrega do produto de venda foram os critérios escolhidos pela TACV para classificar
as agências.
De acordo com estes três critérios,
na Praia venceram a agência Orbitur, a
Agência Nacional de Viagens e a VCV
- Viagens de Cabo Verde. A Orbitur encabeça a lista por ser aquela que mais
passagens vendeu no ano transacto. Já
em São Vicente a Verdemundo ficou
em primeiro lugar, enquanto a Fly e a
ANV ficaram em segundo e terceiro
lugar, respectivamente. A Verdemundo
apresentou o maior nível de crescimento no mercado da zona norte.
ELECTRA E SINDICATOS REÚNEM-SE SOB MEDIAÇÃO DA DGT
Aumento salarial e Acordo
colectivo empurrados para Julho
Os sindicatos e a Electra encontraram-se, sob a arbritagem da Direcção-Geral do Trabalho (DGT), para acertar algumas questões pendentes,
entre as quais o reajuste salarial de 2,5% decidido unilateralmente por essa
empresa e que já motivou posicionamentos dos trabalhadores de Santiago
e Sal que ameaçam partir para a greve. Mas, uma vez mais, da agenda de
trabalhos dessa reunião discutiu-se apenas o problema dos horários de turno. Isso porque, segundo Julião Varela, a Electra alegou não estar preparada para debater o aumento salarial e o Acordo Colectivo de Trabalho. Um
novo encontro foi marcado para Julho próximo.
Sobre o horário de turno, Julião Varela, do Siscap, explica que os sindicatos apresentaram uma contra-proposta que mereceu uma apreciação positiva da Electra, tendo em conta que se encaixa perfeitamente no sistema
de trabalho da empresa. A implementação desse novo horário de turno depende agora da sua aprovação pela DGT, devendo começar a vigorar nos
próximos dois meses. “O horário de turno em vigor agrava a situação dos
trabalhadores. Apresentámos uma proposta que contém mais folgas, é
menos penosa para o trabalhador e as duas partes, e encaixa-se perfeitamente no sistema de trabalho desta empresa. Inclusive a Electra já diz que
aceitará a nova proposta, desde que aprovada pela DGT”, afirma o dirigente do SISCAP.
Relativamente à questão do reajuste salarial de 2,5% atribuído unilateralmente pela Electra no mês passado e ao acordo colectivo de trabalho,
Varela explica que as duas partes agendaram um novo encontro para Julho
próximo, dado que o presidente da Comissão Executiva da Electra alegou
não estar preparado para, nesse encontro, discutir os outros assuntos em
agenda. Assim, e a um ponto de cada vez, o novo horário de turno já reúne
consenso, está quase a ser aprovado pela DGT, e deve começar a vigorar
ainda este Verão.
Constânça de Pina
TENSÃO EM TORNO DO ENSINO PÚBLICO E PRIVADO
Ameaças de manifestação e greve
Com os exames à porta, o clima em torno do ensino público e privado é de extrema expectativa, devido a ameaças
de greve lançadas pelos professores e que poderão coincidir
com o período da realização das provas nacionais. Apanhados no meio deste fogo cruzado, os estudantes correm o risco
de pagar um preço super elevado: o cancelamento dos testes
por falta de condições básicas - como a fiscalização das salas
- caso as intenções dos docentes vierem a prevalecer.
O imbróglio envolve os professores da escola privada
Willy, em S. Vicente, e os docentes do Instituto Pedagógico e
do Ensino Básico Integrado, estes enquadrados no sistema de
ensino público. As duas lutas são separadas, mas os docentes
estão a utilizar basicamente as mesmas armas de pressão: a
greve e o congelamento dos exames.
“Toda a greve é para doer e tem de acontecer nos momentos cruciais. Contudo, neste caso, o Sindep sempre deixou claro que não assume a luta pela luta, nem cria situações artificiais para promover a greve”, diz o sindicalista
Nicolau Furtado.
Em termos sucintos, o Sindep está a exigir do MEVRH
da a assinatura de um compromisso, a acontecer até hoje, sexta-feira, sobre a data da reclassificação dos docentes do EBI
formados em Julho de 2004. Paralelamente, quer ver aprovado e implementado o Estatuto dos profissionais do IP e que
os encargos deste instrumento sejam absorvidos pelo Orçamento Geral do Estado. Caso as reivindicações do professorado não sejam satisfeitas, a classe está na disposição de primeiro fazer barulho na rua e partir, depois, para uma greve,
que poderá culminar com o congelamento dos próprios exames. Em princípio, a manifestação será realizada apenas na
cidade da Praia, mas terá o apoio de vários pólos de ensino
espalhados pelo país, como Nicolau Furtado deixa perceber.
Como reacção à postura do Sindep, o MEVRH esclarece
que tem vindo a trabalhar, desde 2001, na resolução dos assuntos pendentes relativos à carreira dos docentes. Deste pacote, o Ministério da Educação destaca itens como a progressão, a reclassificação, o pagamento de subsídios de carga
horária, de isolamento e de horas extraordinárias… “Todos
estamos recordados que o Estatuto do pessoal docente aprovado em 2004 veio permitir uma aceleração na tramitação
dos processos de transição de professores e a resolução de
outras situações como as férias, o regresso de licença de longa duração, a aposentação…”, sublinha o secretário-geral
do MEVRH, para quem a situação do professorado mudou
significativamente graças ao novo Estatuto.
Aliás, o próprio Sindep reconhece “avanços alcançados
na tramitação de vários processos dos professores” mas sublinha, por outro lado, que a classe só se sentirá satisfeita
quando houver um compromisso sério e que satisfaça as suas
reivindicações. Porém, por aquilo que uma fonte do Ministério da Educação afiança, a resolução das exigências dos docentes envolve também a esfera das Finanças. Face a isso, a
mesma fonte defende que a postura do professorado devia
ser de maior flexibilidade e compreensão, pois, na sua perspectiva, a tutela da Educação não está a negar nenhum direito
a ninguém.
Recorde-se, também, que os professores do Instituto Pedagógico estão a exigir que o impacto do Estatuto seja suportado
pelo OGE de 2006, mas com retroactividade a este ano lectivo.
E, segundo Nicolau Furtado, este ponto é inegociável. KzB
REFORÇO DOS SERVIÇOS DE SAÚDE
reflexão para dotar os hospitais centrais
Agostinho Neto e Baptista de Sousa de
um quadro legal que lhes garanta uma
maior autonomia administrativa e financeira. “É um processo que se arrasta desde 1980. E há a necessidade de melhorar
e optimizar os recursos e dar maior autonomia financeira e administrativa aos
Hospitais Centrais”.
Enquanto isso, um conjunto de infraestruturas de saúde estão sendo construídos em vários pontos do território nacional. Neste particular, Carlos Brito destaca
o caso dos três centros de Saúde da Praia,
abandonados desde o ano passado pela
empresa construtura. E a esse propósito diz:
“A Direcção-Geral da Cooperação Internacional e a UE, que financiou tais projectos, estão a desenvolver esforços para
que as obras sejam retomadas no decorrer deste ano”.
Brito salienta ainda os projectos das
infra-estruturas hospitalares da Região de
Santiago Norte, com sede em Santa Catarina, que se encontram na fase de arranque. Isso sem contar com o começo, antes do fim deste ano, das obras do novo
Hospital do Sal e das unidades da Oncologia e de Hemodiálise, na Praia.
Alírio Dias de Pina
Jorge Tienne é o novo director do HBS
O ministro do Estado e da Saúde, Basílio
Mosso Ramos, convidou, Jorge Tienne aceitou
e o primeiro-ministro José Maria Neves despachou já o documento que credencia este psicólogo como director-geral do Hospital Baptista de
Sousa. Tienne irá exercer o seu mandato em comissão ordinária de serviço durante um ano.
A posse ainda não está marcada mas o despacho 17/2005 de José Maria Neves entrou em
vigor no dia 1 de Junho e alega “motivos de interesse público” para a nomeação de Jorge Tienne no cargo de DG do Hospital Baptista de
Sousa. Contactado por A Semana, Tienne confirma que recebeu há algum tempo um convite
do MS para dirigir o HBS e que aceitou o desafio, mas ainda não decidiu em que moldes. “Tan-
to quanto sei o ministro de Estado e da Saúde
ficou de resolver a questão do assessor clínico”,
afirma.
Jorge Tienne é licenciado em Psicologia pela
Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação de Coimbra, Portugal, e ocupa, neste momento, o cargo de director do gabinete de desenvolvimento dos Recursos Humanos da Enapor. Foi vereador pelos pelouros de Administração, Finanças e Cultura na gestão de Onésimo
Silveira, consultor do Instituto de Emprego e Formação Profissional e lecciona no Instituto de Estudos Superiores Isidoro Graça (IESIG). Nas últimas eleições autárquicas, em 2004, alinhou
com o grupo independente liderado por AlbertiConstânça de Pina
no Graça, Titota.
A SIDA É UMA REALIDADE EM CABO VERDE - JUNTEMO-NOS TODOS PARA VENCÊ-LA
Correio das ilhas
delegacias de saúde de todos os concelhos
do país de pelo menos dois médicos e pôs
termo ao isolamento técnico que se registava ao nível dessas estruturas, antes chefiadas sobretudo por cooperantes estrangeiros. “Com a chegada dos 80 novos médicos no ano passado, temos agora a possibilidade de libertar os colegas mais antigos para cursos de especialidade”, analisa o DGS, para quem uma média de 15
médicos encontra-se, neste momento, no
estrangeiro a fazer especialidade nos domínios da infecciologia, medicina interna,
epidemiologia, cirurgia, pediatria, oftalmologia, entre outras áreas.
Cabo Verde conta, neste momento, com
um média de um enfermeiro por cada 938
habitantes. Mas esse indicador sofrerá melhorias quando os 94 enfermeiros que acabaram de terminar a sua formação começarem a trabalhar. Carlos Brito acrescenta que
neste mês de Junho será também lançado
um novo concurso para enfermagem geral
e de especialidade, para os hospitais Agostinho Neto e Baptista de Sousa. Estas acções todas obedeceram, explica o DGS, a
um plano de formação previamente concebido, para responder às necessidades do MS.
Aquele responsável avança, por outro
lado, que o seu ministério vai iniciar uma
O Ministério da Saúde, através do Centro Nacional de Desenvolvimento Sanitário
e das Delegacias de Saúde, vai implementar, durante este ano, um leque de actividades para sensibilizar a sociedade civil e
combater a epidemia do tabaco. Esta campanha surge num momento em que em
Cabo Verde, apesar da falta de dados sistematizados sobre o consumo do tabaco,
há indícios de estar a aumentar o número
de fumadores. Aumento esse que vem
acontecendo tipicamente nos países menos desenvolvidos.
Está dado o primeiro passo na luta contra o tabagismo: trata-se da ConvençãoQuadro para a Luta Antitabágica, implementada pela Assembleia Mundial de Saúde em 2003. Esta convenção foi assinada
por Cabo Verde encontrando-se, neste momento, na Assembleia Nacional para ser ratificada. A CQLA é o primeiro tratado da
OMS que, além de impor restrições à publicidade, promoção e patrocínio do tabaco, apela a novos controlos nas embalagens dos produtos tabágicos, e pede uma
legislação mais rigorosa no combate ao tabaco.
Aliás, o próprio director regional da
OMS para a África, Luís Sambo, apelou aos
governos do continente africano no sentido de ratificarem a convenção, já que este
dará um contributo significativo à luta contra a epidemia do tabaco e a seus efeitos
nocivos.
E se em Cabo Verde são desconhecidas as estatísticas sobre o consumo desta
“droga lícita” — restando ao MS sensibilizar os potenciais fumadores e actuar sobre um público-alvo de que não sabe o número, a classe social, nem a faixa etária,
ficando tudo a nível das hipóteses e ao sabor dos movimentos que chegam de fora
— a situação a nível mundial é alarmante.
É que existem, actualmente 1,3 bilhões
de fumadores, sendo que o número de mortes causadas pelo uso do tabaco atinge os
4,9 milhões de pessoas. E se os padrões
anuais persistirem, essa cifra aumentará
para 10 milhões em 2020, com 70% dessas mortes a ocorrerem nos países em desenvolvimento, segundo dados da Organização Mundial de Saúde.
No nosso continente, a prevalência do
consumo do tabaco é de 29% nos homens
e 7% nas mulheres. O inquérito mundial
sobre o tabagismo entre os jovens dos 13
aos 15 anos mostra, para a região africana, uma prevalência entre 10 e 33%. Entretanto, este cenário deverá agravar-se
ainda mais, já que as indústrias tabaqueiras
estão a deslocar-se rumo ao Sul devido aos
obstáculos impostos pelos países desenvolvidos.
Este ano, para comemorar o 31 de
Maio, Dia Mundial sem Tabaco, a OMS escolheu o lema “os profissionais de saúde
contra o tabaco”. O objectivo desta insígnia é lembrar aos profissionais de saúde,
de todas as categorias, a importância deste problema. Pretende-se que esses profissionais usem os seus conhecimentos
sobre os males do tabagismo, bem como a
relação privilegiada com os utentes da saúde, para diminuir os riscos do consumo do
tabaco, que continua a ser a primeira causa de morte prematura evitável no mundo.
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Mais médicos e autonomia aos hospitais centrais
Cabo Verde está a conhecer uma melhoria considerável na prestação dos cuidados de saúde. A constatação é do Director-Geral de Saúde, Carlos Brito, para
quem tudo se deve à chegada ao país de
80 novos médicos, prevendo-se a vinda
de outros 40 até Setembro deste ano. O
Ministério da Saúde está ainda a trabalhar
para, conforme aquele responsável, dotar
os Hospitais Centrais da Praia e do Mindelo de maior autonomia administrativa e
financeira, ao mesmo tempo que está empenhado na construção de infra-estruturas importantes, com destaque para as da
Região Santiago Norte, o Hospital do Sal
e as unidades da oncologia e hemodiálise, na Capital.
Carlos Brito precisa que além dos 80
novos médicos que já estão colocados nas
diferentes estruturas nacionais de saúde,
outros 40 deverão chegar de Cuba até Setembro deste ano. Como consequência,
Brito realça existir uma maior disponibilidade em termos de recursos humanos, cujo
rácio médio oscila, neste momento, à volta de um médico por cada 2014 habitantes,
que é considerado um bom nível, segundo
os padrões universais.
O regresso dos recém-formados permitiu, de acordo com a mesma fonte, dotar as
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Profissionais
da saúde contra
o tabaco
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RIBEIRA GRANDE
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Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Correio das ilhas
Trabalhadores pedem
indemnização ao Inerf
Brava sem energia e água
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pagão nas ruas, corte de energia nas residências e falta de água. Esta é a realidade com que a Brava tem convivido nos
últimos tempos. Um cenário que o autarca
Camilo Gonçalves não consegue entender, já
que a Electra adquiriu um gerador novo há
menos de dois anos. A empresa de electricidade e água, por seu lado, defende-se “com
motivos de força maior” ao mesmo tempo que
avança que nos próximos dias a situação estará normalizada.
A Brava está a braços com a falta de energia e de água. Uma situação que além de condenar à escuridão leva os moradores a deitar
fora a carne e o peixe que têm armazenado
nos frigoríficos, penaliza duplamente as gentes da ilha que se vê assim privada de dois
bens essenciais para viver no séc. XXI porque sem energia, a Aguabrava também não
consegue fazer a distribuição da água.
O clima de insegurança que também tem
aumentado na pacata Brava, bem como a perda
de electrodomésticos - originado pelos cortes
bruscos durante o dia nas residências, e cujo
prejuízo a Electra não se responsabiliza - são
outros transtornos que a ilha vem amealhando.
O presidente da CMB, não consegue explicar o porquê “destes problemas permanentes na Electra”. Camilo Gonçalves não compreende “como é que depois de um investimento tão significativo como a central Eléctrica, tenhamos situações permanentes de
cortes de energia, de oscilação de energia e
tantos outros problemas que têm surgido”.
Segundo o edil bravense, “estamos há um
mês sem luz, com apagão nas ruas, com cortes de energia nas residências, e levando a
que a população perca os seus electrodomésticos. O mais grave é que a Electra não nos
informa nem quando nem onde irão acontecer estes cortes”.
Entretanto, esta situação deverá estar resolvida dentro de pouco tempo com a chegada de peças da Europa, isso a acreditar nas
palavras de um responsável da Electra. Para
o engenheiro Manuel Silva, neste momento
a Brava só está a trabalhar com um gerador,
o que “aguenta” a ilha. O problema verificase é à noite “quando paramos para fazer a
manutenção da máquina, trabalhando assim
com 50 kilowats”.
Estrada São Domingos/Assomada em mau caminho
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nquanto o governo gasta grandes somas
para melhorar as infraestruturas rodoviárias do país, há pessoas que estão a vandalizar as estradas que já foram asfaltadas, especificamente a que liga São Domingos à Assomada. Este troço inaugurado ainda há pouco tempo para orgulho do país, já se encontra
num “estado vergonhoso” conforme diz João
Barros, um passageiro que faz diariamente
este percurso.
Asfaltada a estrada que liga São Domingos à Assomada, a viagem nesse percurso
tem todas as condições para fazer-se numa
verdadeira descontracção. Isso porque nessa
rodovia acabaram-se os dribles para evitar os
buracos, os condutores passaram a gastar
menos molas, pneus e outros acessórios, poupa-se o tempo, enfim... Mas há quem esqueça ou simplesmente ignore esses “ganhos”
que a boa estrada traz e por isso não preserva esse bem que é público.
A Semana fez a trajectória São Domingos/Assomada e deparou com pedaços de blocos espalhados pela estrada, terra, pedra e
cascalho deixados por uma derrocada descuidada que inutilizou quase toda uma via da
estrada, pessoas que colocam os seus materiais de construção civil quase para dentro da
via, sinalizações arrancadas e jogadas para o
chão, etc, etc… “Tudo isto contribui para os acidentes de viação ocorridos naquele troço”, comenta um agente policial de São Domingos.
A esse cenário de insegurança da via, para
os condutores e passageiros, junta-se ainda a
actuação de outros vândalos que por ali circulam e deixam outras marcas - protecção das estradas partidas e alguns postes de iluminação
quebrados.
Como se isso não bastasse, os lixos estão
a invadir a estrada entupindo as lavadas. Na
zona de Órgãos, frente ao mercado, a estrada
está entulhada de lixo e restos de animais. É
que ali há açougue, restaurante, cozinha, tudo
numa sujidade só à berma da estrada, e perante os olhos de todos.
Mas o cúmulo do “descaramento” e da grande “vendetta” em que se tornou a coisa pública
acontece no troço São Domingos/Assomada.
São sacos e mais sacos de cascalho à berma
da estrada. E ao que este jornal conseguiu apurar, há pessoas a apanhar as britas que fazem
parte da estrutura das estradas para as utilizar
nas suas construções ou para vender aos interessados.
Toda essa situação já é do conhecimento
do Instituto de Estradas (IE), segundo o seu Administrador, Arlindo do Rosário. Para este responsável, é “lamentável” o que está a contecer,
com pessoas a roubar britas e, desse modo, a
danificar as estradas recém-construídas.
Quanto à apanha de cascalho à berma
das estradas, Arlindo do Rosário diz tratarse de “um problema sério” que já existia desde a fase da construção do troço. O próprio
diz ter alertado várias vezes as autoridades
policiais para o facto, mas os prevaricadores
continuam a actuar na impunidade. Inclusive, diz possuir fotografias que testemunham
pessoas apanhadas, em flagrante, com o carro cheio e pronto a arrancar e transportar materiais roubados nas estradas, cascalho e
brita por exemplo.
Foi para dar resposta a situações de actuação ilegal como as descritas – que os
Serviços Rodoviários não conseguiam resolver — que foi criado em 2004, e instalado nos finais de 2005, o Instituto de estradas.
Segundo o seu administrador, ao Instituto de Estradas compete fazer a manutenção e gestão das rodovias, mas explica que
“a obra São Domingos -Assomada está na
fase de entrega provisória, por isso ainda não
temos todos os instrumentos jurídicos que
nos permitem actuar, fazer a sua gestão”.
O mesmo administrador salvaguarda
que estão a ser preparados os contratos para a
manutenção dessa estrada. E “com o instituto a
funcionar em pleno vamos tentar melhorar esta
situação”, assegura. Mas até lá e no ritmo que a
desprodução continua, será que vai haver estrada para fiscalizar.
A instalação do serviço de estatística é outro grande objectivo do Instituto visando produzir, sistematizar e disponibilizar informações pormenorizadas sobre o funcionamento das estradas. Para isso está a decorrer um estudo que,
segundo Arlindo do Rosário, permitirá tanto caracterizar o estado e as necessidades de manutenção das estradas quanto medir a quantidade
do tráfego em qualquer troço rodoviário do país.
Aidê Carvalho
mbrósio Santos e mais dois colegas
reclamam uma indemnização por vinte e cinco anos de serviços prestados à antiga direcção regional do Ministério de
Desenvolvimento Rural e, posteriormente, ao Inerf. Foram dispensados do trabalho em 2001 e, apesar de algumas tentativas para reivindicar os seus direitos, até
hoje aguardam uma resposta dos responsáveis do Instituto Nacional de Engenharia Rural e Florestas.
Ambrósio Santos conta que trabalhou
como “ajudante de camião” na antiga direcção regional do MDRP, desde Maio de
1976 a Janeiro de 1994. Após aquela data,
ele e mais quatro colegas foram transferidos para os serviços do então recém-criado
Instituto Nacional de Engenharia Rural e
Florestas (Inerf), onde permaneceram até
meados de 2001.
“Naquela altura tomos transferidos
para as frentes de trabalho, como pedreiros de segunda classe, e depois que as obras
terminaram deixámos de receber o nosso
salário. Não tivemos nenhuma explicação
de ninguém, embora tenhamos prestado cerca de vinte e cinco anos de serviço ao Ministério, com direito a férias e tudo mais”,
realça aquele santantonense, de 50 anos.
Tal como Santos, Silvestre Rodrigues
diz não entender por que há mais de ano
fizeram um pedido de indemnização juntamente com outros três colegas, dois deles
foram atendidos e os restantes nem resposta obtiveram do Inerf. “Penso que mereceremos outro tipo de tratamento. E para os
nossos direitos vamos lutar com as poucas
armas que temos”, disse, ofegante, o ex-trabalhador do MDRP que hoje sofre de asma.
Para já, A Semana sabe que esses extrabalhadores do INERF possuem uma declaração, assinada pela actual delegada do
Ministério da Agricultura em Santo Antão,
a comprovar que trabalharam cerca de 18
anos para o MDRP. Por outro lado, um advogado daquela ilha já se disponibilizou
para negociar com o Inerf ou mesmo com o
Ministério de Agricultura, uma recompensa para os citados cidadãos.
Não se sabe, todavia, se irão conseguir
provar que eram funcionários do Inerf, na
medida em que não têm qualquer contrato
assinado. De todo o modo, garantem que durante vários anos assinaram o “livro de ponto” na representação daquele instituto na Ribeira Grande, tiveram direito a férias pagas
e gozaram de outras regalias destinadas aos
servidores de administração pública.
Sobre esse assunto, tentamos ouvir a actual presidente do Inerf na terça-feira passada, mas todas as nossas tentativas mostraram-se infrutíferas.
JAM
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OPERAÇÃO ESPERANÇA ARRANCA
O lançamento da primeira pedra para reabilitar uma
residência em Lém-Cachorro e a assinatura, no Palácio
do Governo, de contratos-programa com associações
de todos os concelhos de Santiago marcam, hoje, 3,
na Praia, o arranque da Operação Esperança. O programa dispõe já de um fundo no valor de 137 mil contos e visa recuperar milhares de moradias degradadas
proporcionando melhores condições de habitabilidade
às famílias carenciadas dos que vivam tanto nos 22
municípios cabo-verdianos como nas comunidades
BCDE
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Milhares
de casas de famílias pobres serão reabilitadas
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emigradas de São Tomé e Príncipe e Moçambique.
cerca de 117 pessoas estão sem abrigo e mais
de 1.500 agregados familiares vivem em barracas. “Há situações em que as barracas ou
alojamentos construídos de pedra solta, com
pavimento em terra batida e sem condições
higiénicas, não apresentam a mínima segurança para os seus ocupantes: tectos e paredes em risco de desmoronamento, janelas e
portas em pedaços e moradores, muitas vezes idosos e crianças, expostos à acção agressiva da natureza”.
Para a presidente do ICS, escusado será
dizer o impacto que o referido programa terá
na vida dos beneficiários e nas suas respectivas comunidades. “O impacto do programa
supracitado será bem visível, na medida em
que haverá uma diminuição da pobreza e da
pressão sobre os recursos naturais”. Assim,
melhorando a “qualidade de vida das famílias contempladas se irá às condições subjectivas para uma maior participação nas actividades produtivas”. A diminuição da pressão e a melhoria do grau de desempenho das
infra-estruturas e equipamentos; contribuição
para a criação de emprego e melhoria da eficiência no funcionamento dos núcleos de povoamento rural são outros desideratos prosseguidos pela Operação Esperança.
A Operação Esperança será supervisionada por um comissão nacional, dirigida pela
presidente do ICS. Dada a sua natureza e as
características da população alvo, a execução deste programa contará com o suporte
técnico especializado dos Municípios, do
Ministério das Infra-estruturas, da IFH, de
instituições públicas e privadas, ONGs e outros organismos da sociedade civil.
Estes podem, na perspectiva dos promotores da iniciativa, desempenhar um papel
importante para mobilizar e organizar estratos populacionais desfavorecidos e levá-los
a obter a ajuda das diversas associações comunitárias. A OE funcionará com base no
princípio de “Djunta Mon”, em que o apoio
financeiro e material dos cidadãos, entidades
públicas e privadas são, conforme o governo, a chave do seu sucesso.
Alírio Dias de Pina
SANTO ANTÃO
Direcção CRP e GTI sdesafinados
ABCDE
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s relações entre o Conselho Regional de Parceiros em
Santo Antão e o Gabinete Técnico Intermunicipal parecem azedas desde que a equipa do CRP passou a ter apenas uma sala para trabalhar no edifício do GTI. E por causa
disso a direcção do CRP chega inclusive a afirmar que o coordenador daquele gabinete quer dificultar a actividade desse organismo que gere verbas do Programa Nacional da Luta
contra a Pobreza. Mas Joel Barros defende dizendo que não
há motivos para alaridos porque “procurou-se apenas fazer
melhorias na gestão do GTI”.
Humberto Freitas, da direcção do Conselho Regional de
Parceiros em Santo Antão, mostra-se agastado com o facto de
o coordenador do GTI ter disponibilizado apenas uma sala
para os técnicos e o conselho directivo do CRP trabalharem.
“É uma forma de dificultar o funcionamento do CRP que gere
um importante programa de habitação social numa ilha carente como Santo Antão. Todos sabem que o manual do PNLP
diz que as entidades locais devem ceder espaços para o CRP
funcionar porque não há verba para pagar a renda de instalações, só que disponibilizar apenas uma sala é uma falta de
respeito para com este órgão”, expressa aquele responsável.
Por ora, os serviços do CRP vão funcionando naquela
sala no GTI, mas Freitas diz que já pôs o Ministério do Trabalho e Solidariedade e o coordenador nacional do Progra-
ma da Luta contra a Pobreza a par dessa situação, para que
procurem uma alternativa. É que, no entender da direcção
do CRP, da maneira como as coisas estão as actividades do
programa serão prejudicadas, pois “num espaço tão exíguo”
é quase impossível o conselho directivo e a equipa técnica
funcionarem com a normalidade necessária.
Contactado por A Semana, o coordenador do GTI afirmou que não vê motivos para que a direcção do CRP esteja
tão descontente com o facto de “por conveniência de serviço” lhe terem retirado uma das salas onde funcionava. “Estamos a preparar o terceiro plano de desenvolvimento de
Santo Antão e, como precisávamos de uma sala para fazer
as reuniões pedimos ao CRP que nos cedesse aquele espaço.
Nunca demonstraram nenhum inconveniente nisso; apenas
sugeriram que ficasse com a sala maior e aceitámos. Nada
mais do que isso”, explica Joel Barros.
Aquele gestor refuta a ideia de que a GTI estaria a quer
dificultar a vida aos membros do CRP mesmo porque, reitera, “há todo o interesse em que o conselho funcione, para o
bem de Santo Antão”. Barros deixa a entender, no entanto,
que o CRP deveria contribuir para os custos de energia e
água, pois tais despesas “praticamente triplicaram desde que
começaram a funcionar no GTI”.
Na verdade, quando o GTI era o gestor local do Progra-
ma Nacional da Luta contra a Pobreza havia uma verba de
20 mil escudos mensais para o uso das instalações do gabinete e mais dois mil escudos para as despesas com energia e
água. Hoje não existe mais esta verba, mas Barros nega que
esse seja o motivo para a suposta tentativa de expulsar o Conselho Regional de Parceiros. “Foi só uma necessidade temporária, enquanto durar a fase de preparação do plano de
desenvolvimento; não queremos expulsar ninguém”, sublinha o coordenador do GTI.
Entretanto, A Semana sabe que por trás dessa questão
do espaço poderá existir uma antiga “pendência política”. É
que aquando da formação do CRP para gerir as verbas do
PNLP, as câmaras municipais de Santo Antão negaram pertencer aos órgãos directivos daquela entidade, alegando que
haviam sido “relegadas para um segundo plano”. Sendo assim, as associações comunitárias assumiram maior protagonismo na política de habitação social naquela ilha.
E, sabendo que o GTI é um órgão dos três municípios
santantonenses, algumas pessoas entendem que o alegado “ensaio de expulsão dos serviços CRP” não passará de uma tentativa de um “devido ajuste de conta” com os dirigentes do conselho. Uma leitura possível, ainda mais quando se sabe que o
actual coordenador do GTI e o presidente da direcção do CRP
João Almeida Medina
são conhecidos adversários políticos.
Correio das ilhas
reabilitadas.
O programa visa, conforme a presidente
do ICS, recuperar casas degradadas e diminuir o número de alojamentos sem as mínimas condições de habitabilidade. Uma situação que, na perspectiva de Nilda Fernandes, afecta principalmente as famílias sem
nenhuns ou baixos recursos económicos.
“Ou seja, é uma contribuição na luta contra a pobreza”. Assim se abrem novas perspectivas para “melhorar as condições e a
qualidade de vida dos beneficiários”, para
“uma maior justiça e equidade sociais, em
nome do combate a situações extremas de
exclusão e marginalização social e a bem
do aprofundamento dos valores da democracia e da cidadania”.
Esta iniciativa solidária é tanto mais necessária quanto se constata que o crescimento económico de Cabo Verde não conseguiu
ainda proporcionar o acesso generalizado à
casa própria. O censo de 2000 mostra que um
em cada sete caboverdianos cerca de 14% da
população, é considerado muito pobre, que
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Primeiro-Ministro, José Maria Neves,
preside hoje, na Praia, ao arranque da
Operação Esperança (OE). A cerimónia será
marcada por dois actos distintos: o do lançamento da primeira pedra para reabilitar uma
habitação em Lém-Cachorro e a assinatura, no
Palácio do Governo, dos contratos-programa
com associações de todos os municípios de
Santiago e o Instituto das Comunidades. A esta
instituição compete executar o referido programa junto das comunidades cabo-verdianas
de Moçambique e São Tomé e Príncipe, vivendo em condições sub-humanas. A operação, esperança projecto de melhorias habitacionais, deverá percorrer o país de lés a lés.
A execução da OE será por fases e está a
cargo do Instituto Cabo-verdiano da Solidariedade que conta, neste momento, com um
fundo de arranque no valor de 137 mil contos, 120 mil dos quais constantes do OGE
deste ano. De acordo com o projecto, milhares de casas de famílias pobres em todo
o Cabo Verde e junto das comunidades de
São Tomé e Príncipe e Moçambique serão
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ASSALTANTES “dominam” Achada Grande
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Social
Zona de alto risco
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ustigados por assaltos sistemáticos
contra turistas, camionistas e transeuntes,
os arredores do Porto da Praia e da Achada Grande são tidos como zona de alto
risco. Delinquentes especialistas nesse
tipo de crime, muitos deles ex-presidiários, criaram bandos que, segundo fontes
abordadas por A Semana, estão a dominar a zona. “Chegam ao ponto de atacar
viaturas em movimento. Saltam para dentro das caixas e atiram os produtos para
o chão. Depois desaparecem como fumaça”, descreve um cidadão frequentador do
Porto da Praia, para quem o problema
atinge basicamente os arredores do cais e
a zona da Achada Grande. Neste bairro
da periferia da Praia, acrescenta a mesma fonte, os armazéns são também alvos
de ataques constantes. “Eles sabem como
e quando fazer um assalto e têm muito
por onde escolher”.
Nalguns casos, os assaltantes agem
em grupo, armados com facas e outros
instrumentos perigosos. As suas vítimas
tanto podem ser turistas como camionistas, transeuntes desatentos ou então pessoas que vão fazer o seu exercício físico.
“Nem sempre levam a melhor. Temos relatos de confrontos entre assaltantes e
vítimas que, quase sempre, acabam em
agressões com pedras ou garrafas”, conta uma fonte policial.
Na perspectiva dessa fonte, as autoridades policiais têm dado atenção a esse
foco de criminalidade, com resultados que
poderiam ser mais palpáveis se não fosse
a dificuldade que enfrentam em manter
os suspeitos presos nas cadeias. Como explica, muitos dos delinquentes ficam a
aguardar julgamento em liberdade, quando presentes a Tribunal, provocando um
claro desconforto no seio dos agentes
policiais.
“Muitos deles já foram presos, mas
regressaram à onda do crime. Alguns dos
delinquentes residem na Achada Grande
enquanto que outros frequentam essa
zona porque conhecem bem esse terreno
e têm várias vítimas à disposição. Basta
ver o número de carros e de pessoas que
frequentam o Porto da Praia”, elucida o
polícia, assegurando ainda que os passadores e consumidores de droga montaram
também a sua base nesse perímetro.
Cerca de vinte delinquentes que costumavam actuar nessa zona foram presos
pela Judiciária em 1997. Dezassete foram
condenados, mas consta que mal cumpriram as penas regressaram às ruas e à delinquência. As nossas fontes desconfiam
que parte significativa desse grupo voltou ao mundo da criminalidade. O índice
de assaltos disparou nos últimos tempos,
com graves prejuízos para os camionistas e transeuntes, como realçam as mesmas fontes de informação.
Porém, os assaltos rondam também
outros centros urbanos, caso da cidade do
Mindelo, suscitando a intervenção das autoridades. Em São Vicente, a Judiciária
montou operações direccionadas para o
combate aos roubos e assaltos com recurso a armas brancas. Dois indivíduos, de
20 e 26 anos, foram detidos esta semana
por suspeita de praticarem ataques em coautoria. As suas vítimas preferidas eram
mulheres, que surpreendiam em lugares
escuros da cidade. Os dois tinham também por hábito invadir residências e automóveis.
Os mesmos são ainda suspeitos de terem cometido uma série de assaltos, razão
porque ficaram retidos na cadeia de Ribeirinha. A Judiciária recuperou vários objectos subtraídos às vítimas, que estão disponíveis na inspecção de São Vicente.
KzB
Luta contra violência e criminalidade
A B C D E Sociedade civil propõe a criação
F J H I G Kde Observatório Independente
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rganizações da sociedade civil propõem a criação de
um Observatório Independente da Violência e da Exclusão Social (OIVES) em Cabo Verde. Esta proposta foi já
remetida, através da Associação Zé Moniz, aos principais órgãos da soberania, bem como às instituições nacionais com
responsabilidade em matéria de combate à criminalidade e
insegurança internas.
Para o presidente da AZM, a proposta para a criação de um
observatório independente da violência e da exclusão social
segue as linhas básicas de intervenção delineadas pelas organizações da sociedade civil cabo-verdiana envolvidas na luta
contra a violência no país. O OIVES deverá, segundo Manuel
Faustino, integrar quase todas as organizações que promoveram, recentemente, a manifestação contra a violência, depois
de vários casos de homicídio registados na Praia. Entre essas
organizações estão a AZM, as igrejas Católicas, Nazarena e
Adventista, a Morabi, OMCV e Associação das Mulheres Juristas. O Observatório deverá ainda incluir instituições como o
ICM, o CCCD, a UNTC-CS, CCSL, a Comunidade Santo Egídio e a Organização de Apoio a Estrangeiros em Cabo Verde.
Além de instituir o referido órgão, o documento já remetido aos principais órgãos de soberania e às entidades
com responsabilidade no combate à criminalidade e insegurança internas, contempla sugestões várias para travar a
onde da violência que ameaça tomar conta de Cabo Verde e
que está, segundo Manuel Faustino, direccionada sobretudo contra crianças e mulheres e relacionada com fenómenos relativamente novos, como sejam a distribuição e o consumo de substâncias psicoativas. O mesmo documento apresenta as desigualdades sociais e as disfunções como sendo
factores geradores da violência entre nós e salienta constatar alguma degradação de valores que sempre integraram o
modo de ser do cabo-verdiano.
Os mentores da dita proposta acreditam que as organizações da sociedade civil podem assumir um papel activo para
reverter o actual estado de coisas devendo, entre outras, apoiar de forma activa todas as iniciativas tendentes a prevenir a
violência, denunciar as medidas e práticas que tendam para a
exclusão das camadas mais vulneráveis, com destaque para
as crianças, mulheres, presos e estrangeiros. Isto sem contar
com o apoio a famílias na sua tarefa de educar e preservar a
segurança e bem- estar dos seus membros.
Mas as recomendações remetidas aos órgãos da soberania não ficam por aí. O documento, que vimos citando, acha
que o Estado deve, a diversos níveis, implementar políticas
que previnam as distorções sociais e combatam a pobreza.
Sobre este particular, os autores da referida proposta sugerem uma melhor distribuição das riquezas, o reforço do papel
da educação enquanto factor que promove a tolerância, bem
como a protecção das famílias mais pobres. Promover políticas efectivas de prevenção do uso e tráfego ilegal de substancias psicoativas, combater o tráfego de armas, tornar a justiça
mais célere e adoptar medidas que permitam intervenções mais
eficazes das polícias no quadro do respeito pelos direitos humanos são outras sugestões avançadas pelos subscritores do
mencionado documento.
O presidente da AZM diz, no entanto, regozijar-se com a
detenção de alguns dos alegados suspeitos dos 16 crimes de
homicídio registados de Janeiro a Maio deste ano, na Praia.
“Isto mostra alguma eficácia da Polícia. Mas não devemos
ter grandes ilusões, porque não sabemos se os detidos não
serão meros executantes”, adverte Manuel Faustino, para
quem ainda resta apurar sobre a exisetência de autores inteADP
lectuais de tais crimes.
15
Cara Filó,
Há alguns meses atrás, trouxe aqui para esta coluna o
olhar de Patrícia lá das ladeiras de Atalaia, fixo num ponto
qualquer da calçada a dizerme tristemente que não sabe
assinar o seu nome. Patrícia
tinha catorze anos na altura,
Filó, e rabiscava traços sedentos de significado sobre
uma velha calça jeans que
trazia vestida enquanto vendia mangas à beira da estrada
com mais dois irmãos (o
Orlando e a Edelmira).
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Por:
PAULINO DIAS
PATRÍCIA (NOVAMENTE!!)
Nada mudou, Filó. Para além dos e-mails
que me chegaram à caixa de correio, os rostos Guernica contorcidos de revolta, sensibilidade,
pena, tristeza - e sei lá que mais! -, que pressentia por detrás de cada palavra. Palavras apenas,
Filó. Palavras esgrimidas como sabão omo ou
detergente cintila, para lavar nossa consciência
e podermos assim nos esparramar cada vez mais
nos sofás de pele de porco, com a confortável
sensação de dever cumprido. Palavras, Filó.
Palavras vazias a estrangular-me de revolta com
suas tenazes de reluzente hipocrisia. Palaaaaaaaaaaaavras!!!!!. E continuamos depois tranquilamente a olhar para o lado e a assobiar com as
mãos nos bolsos, as Patrícias deste torrão acomodando-se de volta às tabelas excell, em meras estatísticas que servirão depois para se promover mais um fórum e mais uma dúzia de estudos - que ironicamente a Patrícia não poderá
ler, Filó! Nada mudou, afinal...
Não quero pensar que estamos a perder a
nossa capacidade de “ver o outro”, Filó. De nos
indignarmos, de não aceitarmos passiva e tacitamente que não podemos mudar as coisas. Não
quero pensar que por detrás deste verniz de
morabeza que vendemos aos gringos nos livrinhos de promoção dessas ilhas, esconde-se uma
sociedade de cada um por si Deus por todos,
uma sociedade que - como desabafa o meu amigo Olavo com um rasgo de tristeza a atravessar
os olhos enormes atrás dos óculos, ali na sala da
sua casa em Mosteiros - pode manifestar-se de
uma violência subtilmente destruidora, mas que
não é notícia, porque profundamente enraizada
nas nossas ATITUDES. Uma sociedade onde um
puto a vasculhar um contentor nas esquinas de
Palmarejo em busca de restos de comida não é
mais do que estatística e justificação científica
do lixo que se espalha pelo chão, ou uma velha
demente semi-nua estendida no passeio na sombra de um prédio qualquer no Plateau não passa
de uma... velha demente!, a perturbar a nossa
circulação quotidiana de que precisamos para
realizar o sonho do bom emprego, do carro zero
no próximo ano, a casa própria num bairro chique da capital e viagens a Fortaleza em Agosto
com a mulher e os filhos...
O sonho da Patrícia é outro, Filó... O so-
nho da Patrícia tem uma simplicidade desconcertante que nos deixa com um nó na garganta
e mil perguntas em revolta na ponta da língua.
O sonho da Patrícia ergue-se dia após dia num
mundo incompreensível de rabiscos que se
entrelaçam alegremente na fazenda da calça
jeans a cair de roto, enquanto o olhar - aquele
olhar perturbador da nossa comodidade, Filó!
- queda-se em silêncio no mesmo ponto da calçada enegrecida pelas rodas dos carros, que ela
fitava da primeira vez que a vi. Patrícia sonha
apenas em poder escrever seu nome, dar um
sentido aos rabiscos que continua a desenhar
sobre suas calças com um velho toco de lápis
preto, construir para si UR-GEN-TE-MEN-TE
um outro mundo que não um filho nos braços
a substituir o soletrar do abecedário e a tranquila sinfonia dos quocientes e pretéritos imperfeitos no quadro preto de uma sala de aula.
O sonho de Patrícia não devia ser sonho, Filó!!!
Patrícia sonha apenas em poder escrever
seu nome, Filó...
Praia, Maio de 2005
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Bebé órfão é disputado por pai e familiares
D. é um lindo bebé de 18 meses, mas a tragédia atingiu-o já:
acaba de perder a mãe, vitima, aos 42 anos, de cancro uterino. A
orfandade vai certamente deixar nele marcas para toda a vida,
sobretudo porque D. é alvo de uma desputa familiar, para ver
quem o vai criar. O pai reclama o seu direito, enquanto a família
do lado materno - a irmã de D, de 18 anos, apoiada pela tia, a
irmã de sua falecida mãe - quer ver D. crescer junto dos seus seis
irmãos. Uma questão que caberá à justiça decidir.
A Semana não conseguiu localizar o pai biológico de D., mas
pelo que pudemos apurar trata-se de um indivíduo chamado Miguel Livramento, natural de São Nicolau. De acordo com o que
ouvimos de Lídia Ramalho, 45 anos, irmã da falecida mãe de D. o
pai esteve todo este tempo ausente da vida de D. e embora mandasse à ex-companheira, todos os meses, dois contos para ajudar com as despesas do filho, nunca arcou com as suas responsabilidades afectivas para com a criança.
“Quando a mãe do D. adoeceu, eu tive de falar com Miguel,
sobre essa questão. Ele disse na altura que a mãe dele vive em
Portugal e só tem um irmão em São Nicolau, de modo que teria
que decidir depois...”, conta Lídia Ramalho.
Só que após algum tempo, Miguel aparece a reclamar o filho,
mas, segundo Lídia, para o entregar a uma família conhecida
dele. Ora, visto que o pai não vai ficar com ele, “E a irmã do D.
quer ficar com ele para estarem todos os irmãos juntos, nós que
somos família achamos que ele poderia ficar connosco. Não queremos que ele cresça fora do seio familiar. E agora estamos à
espera de uma decisão nesse sentido”, acrescenta Lídia.
Diante da complexidade da questão, o ICM preferiu deixar a
decisão para as instâncias judiciais. Ana Paula Brito, delegada
regional do instituto, entregou o caso ao Ministério Público para
que este encontre a melhor solução. É que há o pai biológico,
que apesar de não ter estado de corpo presente até essa fase
da vida do filho, tem o direito legal sobre o fim que está registado com o seu nome de família. E há a irmã mais velha de D.,
que sempre ajudou a mãe a tomar conta do “codê” e conta com
o apoio da tia, que também está disposta a ficar com o sobrinho. Mas a jovem parece ter um forte obstáculo, que é a manifesta má vontade do pai dela em permitir que D. fique com eles.
Aliás, rudemente, Adelino Soares impediu que falássemos com
a filha e só a muita arte do repórter impediu que ele chegasse
às vias de facto.
De acordo com a delegada do ICM, Ana Paula Brito, Miguel Livramento foi no dia 16 de Maio ter com ela a reivindicar
o seu direito à criança, “mas ele nos adiantou que queria entregar a criança a uma outra família que não a família biológica
de D. Nós então quisemos um tempo para ver o que deveria
ser feito, pois a criança já estava inserida na sua família biológica...”, adianta.
Foi então que o ICM resolveu levar o caso ao Tribunal, que
tem a competência de tomar decisões neste tipo de conflito. Entretanto, até ordem do Tribunal, D. permanece com a tia e os
irmãos. D. parece feliz em casa da tia, brincalhão, agitado e inocente, num lar onde ele parece ser o centro das atenções.
O pai de D., Miguel Livramento, alega que a irmã do filho,
ainda estudante, tem mais cinco irmãos, fruto de uma relação
anterior da falecida mãe e não tem condições económicas para
arcar com a responsabilidade de criar o seu filho, que ele pode
sustentar.
“Foi o caso mais difícil que recebemos até hoje. Só o Procurador, ao ouvir, todos os intervenientes, pode decidir, diz a responsável local do ICM, que não descarta a possibilidade de a
justiça lhe pedir a opinião”. E enquanto a sentença não sai, “D.
fica sob a guarda da irmã maior, mediante a vigilância da tia”.
Entretanto, A Semana não conseguiu localizar Miguel Livramento para saber da sua posição. A Procuradoria Regional ainda
não ouviu as partes, daí não ter ainda opinião formada, mas dá a
garantia de que em quaisquer circunstâncias vai levar sempre
em conta os interesses da criança.
Enquanto isso, esta corajosa menina e os outros cinco irmãos, segundo os vizinhos e familiares, vivem o inferno com o
pai Adelino Soares, que obriga quatro de seus filhos a dormirem
num quarto. Esta reportagem pôde conferir, antes de ser expulsa
da casa, que o quarto não deve medir mais do que uns quatro
metros de comprimento e um metro e meio de largura.
Isto numa casa que tem mais dois quartos. No entanto,
segundo consta, Adelino, que vive com outra mulher e tem pelo
menos mais um filho dessa relação, resolveu alugar os quartos, sujeitando os filhos a uma condição sub-humana. Aliás,
este também é um caso do conhecimento das instâncias judiciais e do próprio ICM, e que a mãe das crianças morreu esperando que se resolvesse. Pelo menos dois dos rapazes vivem
hoje em “situação de rua”, passando mais de metade do seu
tempo a vadiar.
Kaunda Simas
Social
IRMÃOS ORLANDO, EDELMIRA E PATRÍCIA
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
oltei à ilha semana passada, Filó. E enquanto dirigíamo-nos pela estrada em direção a Mosteiros via Atalaia (propositadamente, para ver
se tinha a sorte de reencontrar os três irmãos e
saber como estavam), confesso que uma onda
ingénua de esperança atravessava-me de ponta
a ponta, ciente de que as dezenas de mensagens
que me chegaram ao computador, de leitores que
se diziam profundamente sensibilizados com a
situação da Patrícia, do Orlando e da Edelmira,
poderiam ter melhorado um tintinho assim a vida
daqueles miúdos. Ainda mais porque várias das
mensagens vieram de pessoas que têm o poder
e a responsabilidade social de evitar que crianças de catorze anos, em pleno Século XXI nessas ilhas, ainda não saibam ao menos soletrar o
seu nome!
Mas nada mudou, Filó... Depois da “onda”
de solidariedade, Patrícia continua com o mesmo olhar pousado timidamente num ponto
qualquer da calçada, enquanto diz-me que não,
desde a última vez que lá estive ninguém os
contactou, a Edelmira - com dezassete anos,
Filó!!! - já tem um filho de dois meses nos braços, substituindo o livro de matemática que
abandonou numa sala qualquer porque sés pai
cá tene ricurso, continuam doze pessoas a morar numa mesma casa em que apenas o irmão
mais velho está empregado (à Edelmira não lhe
deram trabalho porque disseram que tem paide-filho mercóne, por isso não precisa...), o
Orlando continua na escola, teve o azar de dar
uma queda que lhe provocou fractura num dos
braços, esteve algum tempo na Praia por causa
disso, mas já está de volta às aulas.
16
A paisagem de Flamengos,
localidade rural de S. Miguel,
apresenta-se como um retrato
fiel do mal que faz a
desenfreada extracção de areia
e brita. São buracos escavados
que já atingiram os quatro
metros de profundidade e se
perfilam desde a ponte de
Calhetona até a Furna (são
cerca de 10 quilómetros que
abrangem toda a ribeira dos
Flamengos). Estima-se em mais
de cem as pessoas, incluindo
grávidas e crianças que
diariamente ali labutam em
busca do “ganha-pão”. Uma
dura realidade onde o perigo
espreita a qualquer momento, a
agricultura é ameaçada e é
implacável a luta pela
sobrevivência.
Sexta-feira, 3 de Junho de 2005
Geral
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reforço da fiscalização ao litoral da ilha impedindo a extracção de areia e brita das praias, levou os “garimpeiros” a
refugiarem-se nas ribeiras.
Alegando mau resultado
agrícola e natural repercussão
sobre o sustento para as suas
famílias, pessoas há que arrancam das ribeiras tudo o que encontram pela
frente, especialmente areia e brita. A sua única certeza é que o serviço de fiscalização ainda não chegou às ribeiras.
Debaixo do sol inclemente, e sem segurança, esses homens, mulheres e crianças enfrentam diariamente as piores condições de
trabalho. Em Flamengos, esta prática já existe há oito anos atrás, ultimamente tem-se
intensificado bastante, por “falta de emprego e mau ano agrícola”, como justificam os
apanhadores de areia e brita.
Aos Flamengos afluem todos os dias tanto pessoas da freguesia quanto de vários
outros pontos do concelho de S. Miguel, que
chegam para extrair da terra dura os inertes
que trocarão por pão. Trabalham ali mais de
cem pessoas. São na sua maioria mulheres e
crianças que se espalham pela ribeira. Segundo um curioso, que se posicionou perto
da nossa reportagem, “qualquer dia destes
a Ribeira dos Flamengos não terá lugar nem
para um cristão pôr os pés”.
Entretanto, o presidente da Câmara de
São Miguel, João Duarte, mostra-se solidário para com as pessoas que labutam naquelas “péssimas condições para sobreviverem”
e remete a culpa para o governo que “não
cria opções de emprego no concelho”.
“Este problema poderia ser resolvido
com um programa que enviámos ao governo, solicitando mais postos de trabalho orçado em 118 mil contos”, acrescenta João
Duarte, para quem o referido projecto enviado em Novembro de 2004 visa, entre outros
objectivos, contribuir para a infra-estruturação do concelho, reabilitar os caminhos vicinais e outras infra-estruturas danificadas pelas chuvas e permitir às famílias ter uma actividade geradora de rendimentos.
O autarca de São Miguel não poupa crí-
SOBREVIVER
na Ribeira dos Flamengos
ticas ao executivo que nem deu resposta nem
apresentou qualquer alternativa para resolver a situação desesperadas das famílias, em
busca do seu sustento - num ano de solução,
quando fome espreita?
Ao mesmo tempo que critica o executivo, o edil João Duarte salvaguarda, contudo, que a sua autarquia “infelizmente, nada
mais poderá fazer para impedir as pessoas
de apanhar areia e brita nas ribeiras de Flamengos”, apesar de ter a consciência dos
efeitos ambientais e dos riscos que as pessoas correm.
VIDA ARRISCADA
Enquanto não têm outros meios de sobrevivência, muitos dos são-micaelenses vão
buscar à Ribeira dos Flamengos o seu sustento arriscando a vida para retirarem algum
proveito dos poucos recursos que a natureza ainda lhes oferece nesta parcela da ilha
de Santiago. Uma actividade árdua e arriscada porque, segundo alguns dos trabalhadores ouvidos por este jornal, quando a escavação chega a uma determinada profundidade costuma dar-se o desabamento de
pedras e terras. Revelam ainda que “há pessoas que já tiveram desmaios por trabalharem debaixo do sol escaldante horas a fio.
Outras desfalecem por não estarem bem alimentadas”.
A escavação na ribeira dos Flamengos já
atingiu os quatro metros de profundidade. Por
isso, fundo é o perigo que, todos os dias espreita os trabalhadores. Como conta uma grávida, “noutro dia estava eu curvada a apanhar areia e de repente senti uma pedrada
na cabeça. Quando acordei estava no hospital”. E era a própria quem, no meio deste relato deixava escapar umas gargalhadas.
Uma outra extractora de inertes, Maria
Socorro Mendes, conta-nos que é frequente
haver gente a ser transportada para o centro
de saúde por causa da derrocada de pedras.
Ela própria viu Domingas Mendes a ser atingida e perder a consciência. Lembra que
muita gente pensou que a vítima não ia escapar. Mas Domingas recuperou, saiu do
centro de saúde e regressou a ribeira.
É Socorro Mendes quem nos conta o episódio vivido por Domingas, uma vez que ela
preferiu não falar para a nossa reportagem.
O que vai no interior da alma dessa cidadã só
ela o sabe, mas pelo o seu exterior não podia
esconder certa dureza e frieza, manifestantes
no rosto enraivecido, nos braços robustos e
mãos ásperas. Além disso, a fúria com que
batia a picareta no chão era de alguém a quem
vida não tem poupado horas duras.
A Semana deparou-se com casos de mulheres que levam crianças para o trabalho,
inclusive as que ainda amamentam. A maior parte dessas mães explica que não têm
com quem deixar os filhos enquanto outras
justificam que têm que amamentar o bebé.
TRABALHO INFANTIL
A pobreza nos Flamengos é tanta que
atinge todos, desde crianças e adolescentes
que, ao invés de estarem na escola, enfrentam diariamente jornadas de trabalho muitas vezes mais duras do que as realizadas
pelos adultos.
A Semana encontrou nessa ribeira duas
jovens - Kátia Sofia Lopes, de 17 anos, e
Lúcia Cabral, de 16, que deixaram transparecer nas palavras e no olhar a mágoa de não
poderem continuar a estudar como as suas
colegas. Ambas deixaram a escola na 6ª classe para poderem ajudar os pais e os irmãos
mais novos.
Seila Soares teve ainda menos sorte que
Kátia e Lúcia, nunca aprendeu o A, B, C…
Não chegou a ir à escola, por isso não sabe
sequer escrever o próprio nome. Cresceu a
ver a mãe a trabalhar na lavoura e agora,
com a “falta de chuva”, estão ambas na apanha de areia e brita.
Esta pequena de apenas nove anos, mas
que trabalha e se comporta em geral como
adulta, explicou a este jornal como se processa a extracção da areia e brita: “Temos
que tirar a terra, muita terra, até encontrarmos a areia. Depois, separa-se a areia da
brita com ajuda de uma peneira”. Um trabalho árduo para uma criança que além de
desconhecer o alfabeto, nunca ouviu a história do Lobo e do Chibinho.
DANOS AMBIENTAIS
Segundo os entendidos, o impacto que
tem no ambiente, extracção de areia e brita
nas ribeiras, é de longo alcance. Começa pela
retirada de cobertura vegetal, prossegue com
a erosão e o assoreamento e conduz a alteração paisagística. Ora, como a camada de
areia funciona como filtro físico e biológico para as águas subterrâneas, a retirada
desse material representa a diminuição destas importantes funções no ecossistema local. Outra perda importante ao se extrair
grandes quantidades de areia e brita é a diminuição da pressão sobre os lençóis de água
subterrâneos.
No caso específico da Ribeira dos Flamengos, uma zona essencialmente agrícola, resulta desta desenfreada corrida aos inertes, a salinização do solo, como explica a
assessora de imprensa do Ministério do Ambiente, Agricultura e Pesca, Vera Figueiredo: “Ao tirarem esses materiais no fundo das
ribeiras, causam um desequilíbrio no terreno que vai aumentar o grau de salinização
do solo, ou seja, leva à intrusão da água do
mar no terreno prejudicando a agricultura”.
Além da salobridade prejudicar o cultivo de qualquer planta, ela “provoca a morte
da biodiversidade”, alerta aquela fonte, que
aponta outros efeitos da escavação da terra,
como a alteração no clima local e o aumento da erosão do solo.
E, por isso, os agricultores temem o futuro. Tanto mais que já verificaram a diminuição da água nos poços directamente relacionada com a escavação e extracção de
areia e brita. Ainda assim, acreditam que a
chuva poderá ajudar a reverter a situação. A
sua esperança é de poder armazenar mais
água este ano.
Uma esperança a que ecoa a do presidente do Instituto Nacional de Gestão dos
Recursos Hídricos (INRH), António Pedro
Borges, que declara que a água da chuva vai
empurrar a água do mar evitando a salobridade, e com maior intrusão de água facilitase a bombagem deste precioso líquido nos
trabalhos agrícolas.
Aidê Carvalho