Marco Antonio Barbosa
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o Braço de Cyborg
Texto: Jésus Mosquéra
Fotos: Suelen Silva
O paulista já era um
lutador respeitado
quando conheceu o Jiu
Jitsu, mas ele queria
mais. O resultado foi a
transição perfeita para
o novo esporte, no qual
se tornou mestre e
colecionou títulos, um
deles após uma vitória
sobre o ícone Royler
Gracie
É
hora do almoço, em plena segunda-feira. Mas nenhum dos alunos está preocupado com isso. A fome
deles é de treinar, esgotar as energias e aproveitar
ao máximo os ensinamentos do professor Marco Antonio
Barbosa, dono do centro de treinamento localizado na
esquina das ruas Cubatão e Remanso, no bairro Paraíso,
em São Paulo.
O mestre não está em pé, parado, apenas comandando
seus pupilos. À primeira vista, é até difícil localizá-lo, senão em uma enorme pintura na parede, com um braço de
Cyborg, numa alusão à mistura homem-máquina que surgiu no seriado de TV e depois foi para as histórias em
quadrinhos. São necessários alguns segundos de procura até localizar esse tal
Cyborg, rolando com um dos
30 faixas-pretas competidores da equipe.
Barbosa é assim. Exige assiduidade e disciplina da melhor
maneira: dando o exemplo,
com suor no quimono junto
aos alunos. "Eu cobro presença mesmo. Tem que treinar
técnica, resistência e a parte
física. Atleta competidor tem
que ser assim. Pra vencer, não
tem outro jeito", diz ele, ainda ofegante, embora em plena forma aos 44 anos.
outros centros de treinamento. No primeiro dia na equipe
Barbosa, ela encontrou nos novos colegas uma
tranquilidade que ainda não tinha visto em outros tatames.
"O pessoal aqui é muito bom. Eles são muito calmos,
muito humildes. Ensinam muito bem. Em outras academias em que já fui, os alunos são muito afobados. Aqui,
eu percebo também que eles são muito técnicos", afirma
a estudante, que conheceu o centro de treinamento após
ser incentivada pelo pai, faixa-preta de judô e amigo de
longa data do mestre. “Além do meu pai, muita gente fala
do Barbosa. Ele é muito renomado".
Para o professor, o segredo dessa tranquilidade está na
disciplina. "Quando o treinamento é 'picado', esporádico,
a pessoa é ansiosa. Quando
é intenso, diário, isso gera
tranquilidade. A pessoa treina mais e fica mais calma.
Os mais novos percebem
isso e sentem essa segurança", avalia.
A atmosfera zen que toma
conta da academia é fruto de
uma característica marcante
de Barbosa: a fala calma, pausada e em tom baixo, talvez
reflexo do que aprendeu num
intercâmbio que envolvia religião e artes marciais no JaTécnica, calma e humildade impressionaram
pão entre 1989 e 1990. A
Bruna no primeiro treino
tranquilidade combina perfeiOs fundamentos são pastamente com a humildade
sados no início da aula. A partir de então, fica por
transmitida aos alunos e bem observada por Bruna. Moconta dos graduados pôr em prática as técnicas e
desto, o mestre revela sem alarde uma proeza. Logo que
transmitir a experiência aos mais novos, mas sempre
entrou no JiuJitsu, em 1995, aos 27 anos, foi direto para a
sob o olhar atento, porém sutil, do sensei-máquina.
faixa roxa.
Entre os atletas que querem apenas o benefício do
esporte, fora das competições, o mestre sabe dosar
IPPON
a cobrança. "Se tem só dois dias na semana, que
A graduação em tempo recorde é resultado de anos de
venha os dois dias. Se tem três, que venha os três.
treinamento em um "parente próximo" do Jiu Jitsu. Isso
Mas tem que vir".
mesmo! Barbosa começou no Judô, em Bastos, cidade
onde nasceu, no interior do estado de São Paulo, a 550
Esse ponto de equilíbrio foi o que chamou a atenção da
quilômetros da capital. O município de pouco mais de 20
estudante de direito Bruna Beneton Gil, de 20 anos. Ela
mil habitantes tem tradição. Revelou ninguém menos que
pratica Jiu Jitsu na faculdade desde agosto do ano paso judoca Tiago Camilo, medalha de prata na Olimpíada de
sado. De vez em quando, leva o quimono para conhecer
Sidney, em 2000.
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Havana, em Cuba, e no Campeonato Mundial.
Embora não tenha obtido medalhas, o paulista
do interior ganhou reconhecimento internacional e um convite para morar na capital como
atleta do Esporte Clube Pinheiros.
Eduardo Castilho: "Se não bater, arranca fora"
Barbosa vestiu o quimono pela primeira vez quando Tiago
Camilo ainda nem havia nascido, em 1981. Tinha 13 anos
de idade. "Eu morava no interior e lá não tinha quase nada
pra fazer. Entrei no Judô pra me distrair e tive um incentivo
muito forte do meu primeiro professor, Omar Miquinioty".
A busca pelo ippon, o golpe perfeito no Judô, levou o aluno
talentoso a se distanciar da família e dos amigos, numa
temporada de dois anos na Universidade de Tenri, no Japão, pouco depois de conquistar o primeiro título brasileiro. "Foi uma bolsa de estudos para aprender Judô e também uma doutrina religiosa chamda Tenri-Kyo. Era preciso ter paciência, porque é diferente de tudo. Eu vi muitos
europeus e americanos perderem a cabeça e desistir".
Graças a essa força de vontade, Barbosa teve lições valiosas na universidade, que já teve como técnico um dos
maiores nomes de todos os tempos, o gigante japonês
Masahiko Kimura (1917-1993). Foi ele que derrotou a lenda Hélio Gracie, em 1951, diante de torcedores brasileiros
perplexos, no estádio do Maracanã. Gracie vinha de uma
série de vitórias em que tentava provar a superioridade do
Jiu-Jitsu sobre outras artes marciais, mas tropeçou na força brutal e na técnica impecável do japonês, tanto em pé
quanto no solo. A vitória veio por uma chave-de-braço conhecida no Judô por ude-garami, batizada pelos próprios
Gracies de kimura, em homenagem ao judoca campeão vale a pena assistir à luta, disponível na internet.
Em 1991, o até então judoca Marco Antonio Barbosa se
classificou e fez bonito nos Jogos Panamericanos de
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Segundo Barbosa, foram essas experiências
no judô que o ajudaram a entrar com o pé direito no Jiu Jitsu. "A capacidade física é exigida
ao extremo na seleção brasileira porque nos
campeonatos chegávamos a lutar sete vezes
no mesmo dia". Os treinamentos intensos incluíam sessões intermináveis de uchi-komi entrada de golpes sem jogar o oponente, que
está entre os fundamentos do Judô - e, claro,
muito ne waza - técnicas de solo. E foi assim,
vencendo "um torneio aqui, outro ali", que se
tornou também um campeão de Jiu Jitsu.
JIU JITSU
Apenas quatro anos depois de ser iniciado por amigos na
Arte Suave, Barbosa decolou. Em uma mesma temporada, foi campeão paulista - por peso e absoluto – campeão
brasileiro, terceiro colocado no Mundial e medalha de ouro
do primeiro Campeonato Internacional de Master e Sênior,
em que derrotou na final o respeitadíssimo Royler Gracie,
filho de Hélio. Desde então, todos passaram a conhecê-lo
– e respeitá-lo – também no Jiu Jitsu. Embora totalmente
ambientado no novo esporte, ainda faturou no mesmo ano
o título dos Jogos Abertos do Interior de Judô, segundo
ele, “a competição mais importante das Américas”.
PARALIMPÍADA
Apesar da mudança, Marco Antonio Barbosa nunca abandonou o Judô. Prova disso é um convite recém-recebido
do COB (Comitê Olímpico Brasileiro) para ser um dos técnicos da seleção paralímpica. "Se tudo der certo, na próxima Paralimpíada, tô lá!" comemora, referindo-se ao primeiro evento depois da alteração que tirou a letra “O” do
nome usado pelos brasileiros – a pedido do Comitê
Paralímpico Internacional, para igualar a pronúncia a dos
demais países de língua portuguesa. O mestre vai cuidar
justamente da parte de chão. Os treinamentos já começaram, mas ele só vai poder se juntar à equipe que vai aos
Jogos do Rio quando retornar da sétima visita ao Japão
desde o intercâmbio. “Sempre vou até lá para dar aulas em
academias e participar de eventos”, conta. “Viajo bastante
com esse propósito. Voltei recentemente dos Estados Unidos e ainda nesse ano vou à Roma, na Itália”. Desta vez, a
viagem é para prestigiar a primeira Copa Barbosa de Jiu
Jitsu, em Nagoya, uma homenagem feita por alunos brasileiros residentes no Japão e por japoneses que já vieram
aprender com o mestre aqui no Brasil.
VERSATILIDADE
A vida de Barbosa não se divide apenas entre o Judô e o
Jiu Jitsu. Aposentado das competições, ele põe em prática também o lado empresarial, na academia construída
há um ano e meio em São Paulo. O sucesso do negócio é
visível no generoso volume de treino, à noite e na hora do
almoço. Nada mais justo para quem começou como treinador e conquistou uma legião de seguidores. Além do Jiu
Jitsu, a academia oferece aulas de Submission, Wrestling,
MMA, Boxe e Muay Thai. Os alunos ainda têm à disposição preparação física e um ringue montado ao lado do
cage que abriga o tatame.
CARRO-CHEFE
Apesar do alto nível dos treinos nas outras modalidades,
a maioria dos que chegam à academia procura o Jiu Jitsu,
em especial o de quimono. “O carro-chefe é o ‘pano’. Tem
algumas academias que insistem em ter aula só de
Submission. Eu não abro mão do Jiu Jitsu clássico. Até
com alunos de MMA, eu priorizo o ‘pano’. Todos têm que
treinar o tradicional”, sentencia Barbosa. Cinco anos atrás,
foi a vez de Eduardo Castilho – hoje faixa-preta da equipe
– se interessar por esse estilo clássico. Ele foi a cobaia
numa demonstração feita a pedido da reportagem. A ideia
era mostrar a técnica preferida do sensei. A resposta esperada era algo mais mirabolante, como um armlock voador ou um triângulo invertido. Mas Barbosa, bem ao seu
estilo simples, escolheu “a passagem de guarda”, um
movimento básico, ensinado nos primeiros treinos aos faixas-brancas. Alguns segundos de reflexão permitiram entender o porquê. Ora, no Jiu Jitsu qualquer finalização fica
mais fácil após a passagem de guarda. Tudo bem. Que tal
então uma kimura, a pedido do repórter? A solicitação é
atendida. Agora é possível entender com clareza, nas palavras de Castilho, a comparação com o homem-máquina
e a pintura na parede: “Se não bater, arranca o braço fora.
É braço de Cyborg mesmo!” Osss!
contato: [email protected]
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JIU JITSU Marco Antonio Barbosa - o Braço de Cyborg