MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ EXCELENTÍSSIMA SENHORA DOUTORA JUIZA DE DIREITO DA VARA ÚNICA DA COMARCA DE AMPÉRE, PR. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu Promotor de Justiça infra-assinado, titular da Promotoria de Justiça da Comarca de Ampére/PR, com fulcro no Inquérito Civil MPPR-0186.12.000010-1, vem respeitosamente à presença de Vossa Excelência, com fundamento nos art. 127, caput c/c art. 129, incisos II e III; art. 6° c/c art. 144, todos da Constituição Federal e art. 46 e seguintes da Constituição Estadual, bem como, nas disposições da Lei Federal n. 7.345/85 (Lei da Ação Civil Pública) propor AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA GARANTIA DA SEGURANÇA PÚBLICA COM PEDIDO LIMINAR objetivando adoção de todas as providências legais, na esfera administrativa e orçamentária, para designação e manutenção de profissionais de carreira, concursados junto à Administração Pública do Estado do Paraná, para exercício dos cargos de Delegado de Polícia, Escrivão de Polícia, Investigador de Polícia e Policial Militar, em número suficiente para atender aos Municípios que compõem a Comarca de Ampére/PR, bem como, implementação de prédio adequado ao funcionamento da Delegacia de Polícia, observadas as normas legais de segurança, habitabilidade e sanitária, em face ao ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de direito público interno, com endereço na Rua Cons. Laurindo, 561, 13º andar, Curitiba, PR, pelas razões de fato e de direito que passa a expor. 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ I - DA LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO A legitimidade para agir do Ministério Público do Estado do Paraná encontra fundamento de validade precipuamente nos art. 127, caput c/c art. 129, incisos II e III e art. 6° c/c art. 144, todos da Constituição Federal, bem como, no art. 5º da Lei Federal nº 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública). Essa legitimidade se dá diante do exercício da função institucional em defesa do cumprimento da Constituição Federal. Neste tópico importa anotar que a Segurança Pública, sob a ótica do direito administrativo, devido à sua essencialidade e necessidade para sobrevivência do grupo social, possui natureza jurídica de serviço público, exclusivo do Estado, sendo classificado por Hely Lopes Meirelles entre os serviços uti universi ou gerais, isto é "aqueles que a Administração presta sem ter usuários determinados, para atender a coletividade no seu todo (...). Estes serviços satisfazem indiscriminadamente a população..." (In Direito Administrativo Brasileiro, Ed. Malheiros, 35ª Edição, pág. 335, 2009). A não prestação ou prestação precária de Segurança Pública atinge a grupo indeterminado de pessoas (interesses difusos), unidas pela circunstância fática de se encontrarem residindo ou em permanência transitória nos Municípios que integram a Comarca de Ampére/PR, figurando como vítimas ou potenciais vítimas de ilícitos penais. A flagrante, pública e notória falta de funcionários concursados para integrar os quadros da Polícia Civil e da Polícia Militar nos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, todas do Estado do Paraná, acarreta prejuízos à população, pois não se pode dizer que estejam em segurança aqueles que se encontram sob o manto de tais "autoridades", emergindo, daí, o interesse de agir do Ministério Público, visando garantir a preservação da ordem (segurança) pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, zelando, enfim, pela efetividade dos serviços de relevância pública, assegurados constitucionalmente (arts. 6° e 144, da Constituição Federal). 2 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Nesse sentido o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná já teve oportunidade de se manifestar recentemente: APELAÇÃO CÍVEL E REEXAME NECESSÁRIO AÇÃO CIVIL PÚBLICA OMISSÃO DO ESTADO NO CUMPRIMENTO DO DEVER DE PRESTAR SEGURANÇA PÚBLICA AUSÊNCIA DE DELEGADO DE POLÍCIA, NÚMERO INSUFICIENTE DE ESCRIVÃES E INVESTIGADORES DE POLÍCIA, BEM COMO DEFICIÊNCIA DE EQUIPAMENTOS NAS DELEGACIAS DE POLÍCIA DOS MUNICÍPIOS DE ALTO PIQUIRI E BRASILÂNDIA DO SUL EFETIVO POLICIAL INSUFICIENTE PARA A SEGURANÇA DOS REFERIDOS MUNICÍPIOS SENTENÇA PARCIALMENTE PROCEDENTE COM COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA DIREITO DE SEGURANÇA PREVISTO CONSTITUCIONALMENTE COMO GARANTIA FUNDAMENTAL SOCIAL - LEGITIMIDADE DO MINISTÉRIO PÚBLICO PARA INGRESSAR COM AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA A DEFESA DE DIREITOS DIFUSOS NÃO CABIMENTO DE ADIN POR OMISSÃO PARA A DEFESA DE NORMAS DE EFICÁCIA LIMITADA E IMEDIATA DANO EVIDENCIADO NOS AUTOS RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DO ESTADO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE SEGURANÇA PÚBLICA AUSÊNCIA DE COMPROVAÇÃO DE RAZOABILIDADE DA PRETENSÃO IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DA TEORIA DA RESERVA DO POSSÍVEL DIREITO À SEGURANÇA QUE COMPÕE O ROL DAS GARANTIAS AO MÍNIMO EXISTENCIAL O DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL LEGITIMA A INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO AUSÊNCIA DE DISCRICIONARIEDADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NO CUMPRIMENTO DE PRECEITOS FUNDAMENTAIS PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES NÃO PODE SER USADO COMO ESCUDO PARA JUSTIFICAR OMISSÃO DO ESTADO FRENTE AOS DEVERES CONSTITUCIONAIS POSSIBILIDADE DE COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA - SENTENÇA MANTIDA EM SEDE DE REEXAME NECESSÁRIO RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO. (TJPR - 13ª C.Cível - ACR 111401-6 - Alto Piquiri - Rel.: Fernando Antonio Prazeres - Unânime - J. 08.02.2012) 3 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Assim, objetivando a defesa de direito difuso, de natureza constitucional (segurança pública) com idônea alegação de que esse direito se encontra lesado, o Ministério Público tem interesse de agir e, em consequência, legitimação para propositura da presente Ação Civil Pública. II - DOS FATOS Caótica!!! É esse o atual quadro da segurança pública na Comarca de Ampére. Diria Santo Agostinho que “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem; a indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las”, e a população tem esperança de ver esta situação transtornadora alterada, depositando sua confiança no Ministério Público e no Poder Judiciário. No vaso, veja que os Municípios que integram a Comarca de Ampére (Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento) estão situados na região Sudoeste do Paraná e abrigam uma população atual de aproximadamente 24.000 habitantes. Veja que o IBGE aponta no site www.ibge.gov.br que Ampére em 2010 tinha população de 17.308 habitantes, Bela Vista da Caroba tinha população de 3.945 habitantes e Pinhal de São Bento tinha população de 2.625 habitantes. Sendo que em tais Municípios, são praticados todos os atos de uma vida em sociedade, vez que há comércio, estabelecimentos de ensino, instituições financeiras, locais de lazer e recreação, indústrias, trabalho na agricultura, além de vida forense própria. No entanto, os Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento não é dotado de pessoal e infraestrutura mínima para a necessária Segurança Pública da comunidade. E o crescimento do índice de violência nesses Municípios é público, notório e assustador. Não é por mero acaso que recentemente a cidade de Ampére foi objeto de “reconhecimento” nacional devida a uma “série de incêndios em ônibus em 4 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ quatro dias” (notícia extraída do site G1 da Rede Globo – http://g1.globo.com/bom-diabrasil/noticia/2013/01/policia-do-parana-investiga-serie-de-incendios-em-onibus-emquatro-dias.html). Esse crime está sendo investigado nos autos do Inquérito Policial n. 2013.92-9, que se diga por oportuno foi ontem remitido a essa Promotoria de Justiça sem relatório, indiciamento, pedido de arquivamento ou dilação de prazo. Ou seja, se persistir o abandono do poder público na estruturação da polícia civil local esse crime, e outros tantos que abalam a comunidade, permanecerão impunes. É fato Excelência! Tais Municípios não estão dotados de infraestrutura mínima e de pessoal para garantir a necessária segurança da comunidade conforme se apurou nos autos do Inquérito Civil n. MPPR-0186.12.000010-1 em anexo. Então vejamos. POLÍCIA CIVIL Naquele Inquérito Civil (em anexo) se verificou que o Município de Ampére conta com apenas 01 (um) Investigador de Polícia e 01 (um) Delegado de Polícia. Este último na verdade é titular da 59ª Delegacia Regional de Polícia de Capanema/PR (Comarca Intermediária) e vem acumulando atribuições junto a esta Comarca de Ampére. O fato é que em Ampére seria necessário, no mínimo, 03 (três) Investigadores de Polícia, 02 (dois) Escrivães de Polícia e 01 (um) Delegado de Polícia Titular (conforme fls. 42 do procedimento em anexo). Ora, diante desse quadro (delegado com acúmulo de serviço, escassez de investigadores e sem nenhum escrivão), não é preciso grande esforço para perceber que é impossível, sequer, o adequado atendimento àquelas pessoas vitimadas por uma infração penal. Ainda, o que não dizer acerca da necessária investigação do delito ou contravenção praticada. 5 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Também, o que se nota na vida forense devida a deficiência de pessoal são inúmeros os pedidos de dilação de prazo para conclusão dos inquéritos, que se arrastam ano após ano até a prescrição, garantindo o Estado (que tem o monopólio da persecução criminal) a impunidade do criminoso. E a situação em 22 de fevereiro de 2013 foi retratada pelo Jornal de Beltrão na reportagem intitulada “Quatro comarcas da região de Francisco Beltrão estão sem delegados de polícia”. Nela o jornal destaca (http://www.jornaldebeltrao.com.br/beltrao/quatro-comarcas-da-regiao-de-franciscobeltrao-estao-sem-delegados-de-policia-83074/): As comarcas de Salto do Lontra, Realeza, Ampére e Santo Antônio do Sudoeste não contam com delegados titulares. Para dar conta dos atendimentos, alguns delegados estão acumulando duas comarcas: Valderes Luiz Scalco responde por Marmeleiro e Realeza; Douglas Possebon e Freitas, Capanema e Ampere; Francisco Robson Vidal Fonseca, Dois Vizinhos e Salto do Lontra; Sandro Spadotto Barros, Barracão e Santo Antônio do Sudoeste. A região de abrangência da 19ª Subdivisão Policial é composta por 27 municípios - com uma população de 337.703 habitantes - conta com nove comarcas e tem apenas seis delegados. Mas o problema não aflige apenas a região Sudoeste, em todo o Paraná mais de 30 comarcas não contam com delegados. Com média 0,9, o Paraná tem uma das piores relações delegado/município do país. São 361 profissionais para 399 cidades. A previsão é de que na próxima terça-feira, dia 26, o Governo do Estado abra o edital para concurso de novos delegados, com objetivo de suprir a carência em todas as regiões. (...) Lembrando que as outras Comarcas noticiadas contam, ao menos, com investigadores e escrivães, enquanto Ampére tem unicamente um investigador de polícia lotado. 6 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ E diante dessa óbvia deficiência de pessoal a Delegacia de Ampére não abriga seus presos provisórios, sobrecarregando a carceragem da Delegacia de Polícia da Comarca de Realeza. Foi por tudo isso que o Delegado de Polícia que atualmente acumula funções na Delegacia de Polícia de Ampére, em conversa informal com o Promotor de Justiça que essa subscreve e Vossa Excelência, externou preocupação, desânimo e irresignação com tamanho descaso do Poder Público. POLÍCIA MILITAR Como é sabido, a esta Polícia cabe, essencialmente, o policiamento ostensivo e preventivo, buscando a manutenção da ordem pública. Assim, devem ser realizadas rondas nos colégios, instituições financeiras, bairros, etc. e, evidentemente, para tal tarefa, é necessário a existência de condições mínimas quanto à pessoal e material. Atualmente o município de Ampére conta apenas com 6 (seis) policiais militares, sendo que um deles foi cedido a outro Município. Eles trabalham em turnos de 2 (dois) por dia. Ou seja, Ampére que conta com uma população de aproximadamente 20.000 tem apenas dois policiais militares por dia para fazer o trabalho de segurança ostensiva. O perigo para paz social dessa situação se torna ainda mais evidente se lembrarmos que Ampére têm 4 (quatro) grandes Bancos (BANCO DO BRASIL S/A, CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, ITAÚ UNIBANCO S/A e BANCO BRADESCO S/A) e 5 (cinco) outros instituições que fazem as vezes de bancos, e por isso lidam diariamente com grande quantidade de dinheiro (CASA LOTÉRICA Murari e Borges Ltda., CRESOL - Cooperativa de Crédito Rural Com Interação Solidária, SICOOB – Coop. de Crédito de Livre Admissão de Francisco Beltrão, SICREDI – 7 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Coop. de Crédito de Livre Admissão Fronteira do Iguaçu e BANCO POSTAL DOS CORREIOS). A situação também representa evidente perigo a Casa da Justiça dessa Comarca. Sabe-se que neste prédio são armazenadas armas apreendidas, situação que aliada à ausência de segurança própria (não há funcionário para esse fim, policial militar destacado para tanto ou sequer cofre para guardá-las) se traduz em evidente atrativo para ação de grupos criminosos que buscam incrementar seu arsenal bélico. Por outro lado, o resultado da falta de um policiamento ostensivo e de uma investigação policial adequada tem sido a não instauração de inquéritos policiais, na maioria dos crimes notificados, ou a deficiência da investigação criminal, que naturalmente implica o não esclarecimento da materialidade e da autoria das infrações penais e, consequentemente, a impunidade, que, por conseguinte, em um ciclo vicioso que se perde ao infinito horizonte, estimula a violência e a criminalidade. Ressalta-se que o Poder Judiciário e o Ministério Público da Comarca de Ampére, tentaram por meio de ofício conjunto enviado em 22 de outubro de 2012 ao Secretário de Segurança Pública do Paraná (fls. 43/45 do Inquérito Civil), solucionar parcialmente o problema em pauta, requerendo o aumento do efetivo da Polícia Militar para um número mínimo de 12 (doze) policiais, bem como o da Polícia Civil, para o mínimo de 02 (dois) investigadores e 01 (um) escrivão, além de um Delegado Titular. Porém, até o momento, não obtivemos resposta alguma. III - DO DIREITO APLICADO Á ESPÉCIE Segundo o art. 144 da Constituição Federal e art. 46 da Constituição do Estado do Paraná: 8 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Art. 46 - A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, pelos seguintes órgãos: I - Polícia Civil; II - Polícia Militar (...) Assim, ao Estado do Paraná, não se reserva, pois, a mera conveniência e oportunidade em prestar ou não, devida e satisfatoriamente, a Segurança Pública. Antes, constitui um dever de natureza Constitucional. Dever este, cujo cumprimento exige atenção aos requisitos mínimos estatuídos em Lei. Assim, embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, a possibilidade de proteção judicial dos direitos fundamentais sociais quando o Estado se abstém reiteradamente em cumprir com seus deveres constitucionais é plenamente aceita pela jurisprudência pátria: DIREITO CONSTITUCIONAL. SEGURANÇA PÚBLICA AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. PROSSEGUIMENTO DE JULGAMENTO. AUSÊNCIA DE INGERÊNCIA NO PODER DISCRICIONÁRIO DO PODER EXECUTIVO. ARTIGOS 2º, 6º E 144 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. O direito a segurança é prerrogativa constitucional indisponível, garantido mediante a implementação de políticas públicas, impondo ao Estado a obrigação de criar condições objetivas que possibilitem o efetivo acesso a tal serviço. 2. É possível ao Poder Judiciário determinar a implementação pelo Estado, quando inadimplente, de políticas públicas constitucionalmente previstas, do Poder Executivo. Precedentes. 3. Agravo regimental improvido." (STF - RE 559646 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 07/06/2011, DJe-120 DIVULG 22-06-2011 PUBLIC 24-06-2011 EMENT VOL-02550-01 PP-00144) ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LOTAÇÃO DE SERVIDORES JUNTO À DELEGACIA DA POLÍCIA FEDERAL DE PASSO FUNDO. POSSIBILIDADE DE INTERFERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO. INEXISTÊNCIA DE AFRONTA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS 9 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ PODERES. PERDA DE OBJETO. Apelação improvida. (TRF4, AC 2007.71.04.001366-1, Terceira Turma, Relator Carlos Eduardo Thompson Flores Lenz, D.E. 04/02/2009) E consoante art. 47, caput, da Constituição do Estado do Paraná, a Polícia Civil “(...) é instituição permanente e essencial à função de Segurança Pública, com incumbência de exercer as funções de polícia judiciária e as apurações das infrações penais (...)”. Mas o exercício de referidas funções, por localizarem-se no âmbito da Administração Pública Estadual, determina-se pela observância genérica do disposto no art. 37, inciso II, da Constituição Federal e atendimento específico ao previsto no § 3°, do art. 47 da Constituição do Estado do Paraná, que assim disciplina: Os cargos de policiais civis serão providos mediante concurso público de provas e títulos, observado o disposto na Legislação específica. Portanto, os cargos de policiais civis de Delegado, Escrivão, Investigador, etc., somente podem ser exercidos por pessoas legalmente investidas nestes junto à Administração Pública Estadual e, da mesma forma, todos os policiais do Estado. A nomeação política de determinadas pessoas, sem observância dos requisitos legais exigidos pelo art. 37, inciso II, da Constituição Federal e art. 47, § 3º, da Constituição Estadual - para exercício de cargos de Delegado de Polícia, Escrivães e Investigadores, cuja investidura depende de concurso público - além de flagrante desrespeito às normas constitucionais e prejuízo à Segurança Pública, implica em violação às normas contidas na Lei Federal n. 1.079, de 10/04/1950, que dispõe sobre crimes de responsabilidade, dentre outros, dos Governadores de Estado e seus Secretários, havendo previsão expressa para punição de tal ilegalidade: 10 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Art. 9º. São crimes de responsabilidade contra a probidade na administração: (...) 5 - infringir, no provimento dos cargos públicos, as normas legais. Ainda, nos termos do art. 144, § 5°, da Constituição Federal e art. 48 da Constituição Estadual, cabe à Polícia Militar o policiamento ostensivo preventivo de segurança. No entanto, apesar desse preceito Constitucional, o Estado do Paraná, considerando a falta de efetivo, bem como as precárias condições materiais anteriormente apontadas, não cumpre, também sob este aspecto, com a Segurança Pública necessária às pessoas residentes ou em permanência transitória no Município de Ampére. Enfim, tendo em vista que nosso ordenamento jurídico atribui ao Estado o dever de prestar Segurança Pública aos cidadãos que, por sinal, regularmente pagam impostos para tal finalidade, e, considerando a situação fática, descritas nestes autos e nos autos do Inquérito Civil em anexo, imposta à comunidade dos Municípios que compõem a Comarca de Ampére, concluímos que o Estado do Paraná não fornece os recursos pessoais e materiais necessários e indispensáveis à atividade de Segurança Pública. E como visto pleitos similares ao presente vem sendo acolhidos pelo Poder Judiciário. A propósito: REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER EM DEFESA DA SEGURANÇA PÚBLICA. INSUFICIÊNCIA DE EFETIVO HUMANO NA POLÍCIA CIVIL NO ÂMBITO DOS MUNICÍPIOS DE MANGUEIRINHA E HONÓRIO SERPA, QUE CONTA APENAS COM UM ESCRIVÃO DE POLÍCIA. PRETENSÃO DE CONDENAÇÃO DO ESTADO NA OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE EM ASSEGURAR A ADOÇÃO DAS PROVIDÊNCIAS LEGAIS E ADMINISTRATIVAS NECESSÁRIAS PARA PREENCHIMENTO DE UM QUADRO MÍNIMO DE 11 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ SERVIDORES DA POLÍCIA CIVIL EM TAIS MUNICÍPIOS. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA. RECURSO DO ESTADO DO PARANÁ. SENTENÇA DE PARCIAL PROCEDÊNCIA, QUE DETERMINA AO ESTADO DO PARANÁ QUE, NO PRAZO DE SEIS MESES, DESIGNE PARA A DELEGACIA DE MANGUEIRINHA NÚMERO SUFICIENTE DE DELEGADOS, ESCRIVÃES E INVESTIGADORES DE POLÍCIA PARA O CUMPRIMENTO DA ESCALA DE PLANTÃO E DEMAIS ATIVIDADES, SOB PENA DE MULTA PESSOAL AO SECRETÁRIO DE SEGURANÇA. RECURSO DO ESTADO DO PARANÁ. REEXAME NECESSÁRIO CONHECIDO DE OFÍCIO. APLICAÇÃO ANALÓGICA AO CASO DO ARTIGO 19 DA LEI DA AÇÃO POPULAR. ENTENDIMENTO DO STJ. ALEGAÇÃO DE VIOLAÇÃO DA INDEPENDÊNCIA DE PODERES E IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO NÃO CONFIGURADA E CUJA ALEGAÇÃO SE CONFUNDE COM O MÉRITO DA LIDE. SITUAÇÃO OBJETO DA LIDE QUE REVELA DESCUMPRIMENTO A PRECEITO CONSTITUCIONAL RELATIVO À SEGURANÇA PÚBLICA. PRESENÇA DE APENAS UM SERVIDOR (ESCRIVÃO) NO MUNICÍPIO (E DE UM DELEGADO DESIGNADO, QUE ATENDE OUTRAS CINCO DELEGACIAS) QUE INFRINGE A PREVISÃO CONSTITUCIONAL, POIS IMPOSSIBILITA A CONSECUÇÃO DE TODOS OS ATOS E MEDIDAS NECESSÁRIAS NA ÁREA DE SEGURANÇA PÚBLICA PREVISTAS EM LEI, DEIXANDO A POPULAÇÃO EM EVIDENTE CARÊNCIA. A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICA PÚBLICA EXISTENTE NÃO TRATA DE ATO DISCRICIONÁRIO, MAS VINCULATIVO, PELO QUE, HAVENDO OMISSÃO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA NESTE SENTIDO, É POSSÍVEL A INTERVENÇÃO DO JUDICIÁRIO, PARA FAZER VALER A LETRA CONSTITUCIONAL. INOCORRÊNCIA DE OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DE PODERES IN CASU. CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE FAZER DETERMINADA PELA SENTENÇA QUE DEVE SER MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO NESTA PARTE. (...) RECURSO DE APELAÇÃO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. PARCIAL REFORMA DA SENTENÇA. (TJPR 4ª Câmara Cível AP 730910-4 - Rel. Des. Maria Aparecido Blanco de Lima, unânime, julgado em 23/08/2011) 12 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ IV - DO PEDIDO Diante do exposto, o Ministério Público do Estado do Paraná requer: 1. Preliminarmente: a) seja requisitado ao Delegado de Polícia do Município e Comarca de Ampére, no prazo de 05 (cinco) dias, remeta ao Juízo a relação dos recursos materiais disponíveis (viaturas, móveis, armamentos, instalações físicas das Delegacias) pelas Polícias Civis dos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, informando quais os recursos materiais necessários para o desempenho, em grau mínimo, das atividades da Polícia Civil nestes Municípios, bem como, o número de Investigadores e Escrivães de Polícia atualmente lotados em tais Municípios e qual seria o quadro mínimo de pessoal exigido; b) seja requisitado ao Capitão Luiz Fernando Zorzi, junto à 4ª Companhia de Polícia Militar de Capanema, no prazo de 05 (cinco) dias, remeta a esse juízo a relação dos Polícias Militares que estão lotados nos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, bem como, qual seria o número adequado de Polícias Militares para atender tais Municípios; c) seja requisitado ao Chefe do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para que informe esse juízo sobre o número de habitantes, extensão territorial, população em área urbana e rural, dos Municípios Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, todas do Estado do Paraná. Tais solicitações objetivam comprovar, ainda mais, as informações trazidas aos autos por este agente do Ministério Público, facilitando o comando da Sentença na prestação jurisdicional ao caso em tela. 13 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ 2. Cautelarmente: a) a intimação do Estado do Paraná para que este, querendo, se manifeste em contraditório no prazo de 72 (setenta e duas horas), conforme previsão do art. 2º da Lei n. 8.437/92; b) após, seja concedida liminar, antecipando-se a tutela, determinando ao Estado do Paraná imediatamente (cominando multa diária no importe de R$ 10.000,00): I- designe para o exercício de suas funções na Comarca de Ampére, Delegado de Polícia Titular, Escrivães e Investigadores, devidamente concursados junto à Administração Pública Estadual, necessários para o desempenho das atribuições da Polícia Civil nos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento; II- designe para o exercício de suas funções na Comarca de Ampére, Policiais Militares em número necessário para ao desempenho de suas atribuições nos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento. Justifica-se a concessão da medida liminar uma vez que ao longo desta exordial foram demonstrados seus pressupostos: fumus boni iuris e periculum in mora. De fato, além de não ser possível a contestação acerca do dever Constitucional do Estado em prestar o serviço de Segurança Pública à coletividade, restou absolutamente comprovado, sendo até de conhecimento público, a completa omissão do Estado do Paraná, quanto ao dever aludido, no Município e Comarca de Ampére. Também, não restam dúvidas quanto ao perigo na demora da prestação do adequado serviço de Segurança Pública. Ora, como os delinquentes estão prontos, à todo momento, para agir, e agem, há justo receio de lesão grave e irreparável ao direito dos membros desta Comunidade que não conta, por exemplo, com uma Polícia Militar 14 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ aparelhada para atuar pronta e de maneira eficaz. Ainda, no tocante à Polícia Judiciária, diligências negligenciadas e provas periciais não colhidas oportunamente, incidentes tão comuns no desenrolar dos Inquéritos Policiais, constituem verdadeiros atentados ao direito dos cidadãos. Certo é que o serviço de Segurança Pública manifesta caráter de essencialidade e de não rara emergência, sendo inadmissível exigir-se, de qualquer pessoa, que aguarde para obter tal prestação por parte do Estado. 3. Finalmente, (confirmando a tutela antecipada, se for ocaso): a) a condenação do Estado do Paraná, consistente na obrigação de fazer, para designar e manter, no exercício de suas funções, nos Município de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, Delegado de Polícia Titular, Escrivães e Investigadores, devidamente concursados junto à Administração Pública do Estado e em número suficiente; b) a condenação do Estado do Paraná, consistente na obrigação de fazer, para designar e manter, no exercício de suas funções, nos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, número suficiente de Policiais Militares, que deverá ser apurado, oportuna e definitivamente, segundo critérios técnicos e perícias a serem realizadas durante a tramitação dessa demanda, para garantia do cumprimento das atribuições constitucionalmente afetas a esta instituição; c) a condenação do Estado do Paraná, consistente na obrigação de fazer, para que destine, às Polícias Civis dos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, viaturas, móveis, máquinas, armamentos, rádios, bem como recursos para as atividades rotineiras (limpeza do prédio, alimentação dos presos, combustível para viaturas, etc.) e para obras de restauração das Delegacias locais, tudo conforme critérios técnicos e perícias a serem realizadas durante a tramitação dessa demanda, para garantia do cumprimento das atribuições afetas à esta instituição; 15 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ d) a condenação do Estado do Paraná, consistente na obrigação de fazer, para que destine, às Polícias Militares dos Municípios de Ampére, Bela Vista da Caroba e Pinhal de São Bento, viaturas, armamentos e rádios, conforme critérios técnicos e perícias a serem realizadas durante a tramitação dessa demanda, para garantia do cumprimento das atribuições constitucionalmente afetas à esta instituição; e) a condenação do Estado do Paraná, consistente na obrigação de fazer, para que tome as providências legais, em matéria administrativa e orçamentária, par efetivo cumprimento desta pretendida decisão judicial; f) a condenação do Estado do Paraná, quanto ao ônus da sucumbência e demais cominações legais. Requer, ainda, a citação do Estado do Paraná, na pessoa do Chefe do Órgão de representação judicial do Estado (art. 124, inciso I, c/c art. 126, ambos da Constituição deste Estado), o Excelentíssimo Senhor Procurador Geral do Estado, com endereço à Rua Cons. Laurindo 561, 13º andar, Curitiba/PR, para, querendo, responder a presente ação, sob pena de revelia. Também deve ser consignado que o Ministério Público pretende prover o alegado através de todos os meios de provas admitidos em direito, especialmente a testemunhal, documental, pericial, juntada de documentos supervenientes e depoimento pessoal dos representantes do Estado, sob pena de confissão. Por fim, requer seja emprestada e reconhecida PRIORIDADE DE TRAMITAÇÃO a presente Ação Civil Pública, tendo em vista que a pretensão tutela interesse coletivo fundamental, determinado assim que a serventia promova a anotação de tal privilégio na capa dos autos, até mesmo em respeito à previsão legal do art. 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal, garantia de primazia e celeridade na tutela dos direitos fundamentais. 16 MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ Dá-se à ação o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Ampére, 27 de fevereiro de 2013. David Kerber de Aguiar Promotor de Justiça 17