MOVIMENTO LITÚRGICO NO BRASIL Severino Germano da Silva Pe. José Humberto Motta / Pe. Antonio Élcio De Souza Faculdade Católica de Filosofia e Teologia de Ribeirão Preto. Até o Concílio Vaticano II, muitos homens se debruçaram sobre a questão litúrgica, documentos pontifícios foram elaborados e muitos estudos foram feitos para que a Igreja pudesse beber de tão sublime fonte. Dentre estes homens podemos citar o Papa Pio X, que com bastante zelo e coragem escreveu o Motu Próprio (1903) que modifica a música sacra tridentina e o canto gregoriano, promoveu a admissão de criança à comunhão, bem como a comunhão frequente e mais tarde promoveu reforma no breviário. Todas estas mudanças são frutos de um movimento criado na Igreja chamado “Movimento Litúrgico”, que foi iniciado pelo Bispo Dom Próspero Guéranger, Abade de Solesme. Dom Guéranger foi responsável pela reforma na ordem beneditina, tendo vivido no contexto do restauracionismo francês, foi responsável pela união dos católicos franceses em torno do Papa. De acordo com Boróbio, as ideias de Guéranger podem ser simplificadas nas seguintes teses: 1- A liturgia é por excelência a oração do Espírito na Igreja, é a voz do corpo de Cristo, da esposa orante do Espírito; 2- Há na liturgia uma presença privilegiada da Graça; 3- Nela se encontra a mais genuína expressão da Igreja e de sua 4- A chave da inteligência da liturgia é a leitura do antigo testamento, tradição; bem como do novo apoiado no antigo. Neste artigo queremos apresentar quais foram os desdobramentos do Movimento Litúrgico no Brasil, e o que ele significou para Igreja Brasileira, que deu seus primeiros passos com a criação da Pastoral Coletiva dos Bispos das Províncias Eclesiásticas de Mariana MG e do Rio de Janeiro no ano de 1907. Também o Bispo de Natal Dom José Pereira Alves e 1923, em nota sobre a paróquia diz da importância da vida litúrgica e sua promoção dentro do organismo e na vida paroquial, que se daria em três pontos: A vida litúrgica, que fala da ignorância dos fieis em termos de liturgia; participação da vida da liturgia, que visa aproximar a liturgia dos fieis por meio das instruções, meditações e práticas de piedade que vão se constituindo num plano de espiritualidade vindas das fontes da liturgia; restauração da vida litúrgica, que visa evitar todo ceticismo nas solenidades religiosas. Com Guéranger inicia-se um retorno à liturgia romana, ele também é responsável pela expansão desta ideia de retorno, pois descobriu que havia ali um grande conteúdo espiritual e teológico. Ele entendeu que com a liturgia e com os padres estavam às chaves de compreensão do culto da Igreja. Mas foi no Congresso de Obras Católicas na cidade de Malines em 1909, que o Movimento Litúrgico teve seu lançamento, seu promotor foi Dom Lamberto Beauduin, que foi sacerdote e depois monge beneditino de Monte Cesar. Dom Beauduin foi um continuador dos ideais de Guéranger, e mais do que isso ele as desenvolveu dando um novo direcionamento, fazendo com que elas se tornassem uma pastoral litúrgica nas paróquias. Para que esta nova forma obtivesse o sucesso desejado era preciso uma nova dinâmica, que se caracterizou pela: inspiração da piedade e a vida cristã na vida da Igreja, para que isso se tornasse possível precisava que se promovesse a participação dos batizados na liturgia. Mas o que foi o movimento litúrgico? Não se pode considerar que ele tenha sido uma etapa, pois começa com a reforma beneditina, ganha força em praticamente toda Europa e gera discussões em muitos meios da Igreja, a adesão dos papas Pio X, Pio XII e João XXIII e no século XIX, representou um novo recomeço e uma renovação na liturgia. No século XX, este movimento adotou uma postura eclesial e pastoral, que estava em sintonia com o movimento bíblico e a nova orientação eclesiológica. Paralelo a isto, se considerava a liturgia a didascália do povo cristão, ou seja, ela era a forma mais eficaz da catequese. O Movimento Litúrgico teve seu inicio no Brasil no ano de 1933, em toda Europa já se havia instaurado tal movimento com bastante desenvolvimento e já fazia um século que o pensamento de D. Guéranger se difundira. Por isso podemos inferir que foi um pouco tardia a sua implantação em terras brasileiras. Foi com D. Martinho Micchler OSB, que se criou o Movimento Litúrgico no Brasil, ele havia acabado de chegar ao Brasil e foi dar aulas de Liturgia no Instituto de Estudos Superiores do Rio de Janeiro, seu sucesso se deu não apenas pela novidade em si, mas simplesmente pelo fato de ser o primeiro curso de liturgia dado para leigos no Brasil e também porque ele mostrava que a liturgia era mais do que rubricas, explicação de objetos e gestos. O que D. Martinho apresentava era algo extraordinário para aquele momento. Ele mostrava que a liturgia era vida, vitalidade, é a vida na SS Trindade, ou seja, a grande novidade era a Teologia da Liturgia. Cresce de maneira grandiosa o gosto pela liturgia é criado no seio da Ação Universitária Católica (AUC), um centro de piedade que logo passaria a se chamar Centro de Liturgia. O sucesso é impressionante e o curso sai do ambiente universitário e vai para associações universitárias. Em virtude da explosão acontecida, D. Martinho realiza um retiro que se chamou de Seis Dias em Comunidade, neste retiro se celebrou pela primeira vez no Brasil uma Missa versus populum e mais ainda foi realizada de forma dialogada, que era uma novidade, pois isto só acontecia nas clausuras e conventos, e mais ainda recitaram o oficio em comunidade coisa que era feita apenas por padres, no entendimento dos presentes naquele retiro. Depois daquele retiro D. Martinho começou a dialogar nas celebrações semanais no Mosteiro São Bento. Com essas iniciativas estava lançado o Movimento Litúrgico no Brasil. Com a fundação da Ação Católica Brasileira, que teve como presidente Amoroso Lima, o movimento se ampliava cada dia mais e a Ação Católica foi o grande protagonista do movimento que rapidamente se espalhou para outros estados, mas foi em Minas Gerais que teve maior sucesso e as cidades de Belo Horizonte, Uberaba e Juiz de Fora que os fieis abraçaram com mais intensidade a novidade. Dom Martinho esteve presente em vários momentos para divulgar a novidade por ele trazida, tanto em revistas como a Ordem de Minas gerais, bem como em palestras e encontros como o caso de Uberaba, que tinha como tema: Missa, centro do culto litúrgico. As deias de D. Martinho ganharam espaço em virtude da forma e da novidade que elas traziam, mas quais eram os conteúdos dessa transmissão? O seu conteúdo era na verdade a liturgia no seu desenvolvimento histórico com a teologia que os próprios textos ofereciam, era o ensinamento da vivencia prática da teologia litúrgica, ou seja, é a vida Igreja, presença da vida de Cristo que perfaz o seu Corpo Místico. No seu ensinamento afirma José Ariovaldo OFM (1983), que a liturgia constitui o prolongar-se do divinamente humano, que é Cristo vitorioso no seu Corpo glorioso que é Igreja, nós que celebramos seus mistérios, que oramos a sua oração, na força do Espírito Santo. A redenção se faz presente, todo o cosmo é presente participando da vitória desta vida e pela liturgia, tendo como seu centro a Santa Missa. A difusão do Movimento e as propostas foram pressupostos para outros grandes homens realizarem grandes trabalhos dentro desse vasto campo, foi o caso de D. Beda Keckeisen, primeiro tradutor do Missal para língua portuguesa no Brasil. Começando de forma lenta, a partir de Missais franceses e latim da Europa, em pequenos fascículos traduz em latim e português as missas dominicais e festas maiores e com breves comentários e os distribui nas missas e ensina aos fieis como usá-lo para participarem bem dos santos mistérios. Com muito trabalho e paciência em 1936 D. Beda apresenta a primeira tradução do Missal Cotidiano para o Brasil, fruto dos primeiros fascículos que foram se aperfeiçoando e tendo muita aceitação. Podemos citar além D. Martinho que iniciou o Movimento no Rio de Janeiro, D. Beda na Bahia, que traduziu o Missal e em São Paulo D. Poycarpo, que idealizou o folheto dominical com as leituras e textos da Missa. O folheto se tornou um grande instrumento de divulgação da Missa dialogada, coisa ainda incipiente em grande parte do Brasil. Outro nome importante no Movimento litúrgico é D. Hildebrando Martins, que na tipografia do Mosteiro de São Bento no Rio de Janeiro, foi responsável por muitas publicações do referido Movimento, um dos mais importantes é o conhecido livrinho do ordinário da Missa, que foi publicado em 1935. Foram muitos os serviços prestados por homens que empreenderam com muita vontade e com a ajuda do Espírito Santo, e fizeram com que a liturgia do Brasil se tornar acessível a todos os fieis. Ter um encontro pessoal com Jesus, como propõe o Documento de Aparecida, com certeza tem sua raiz nesses homens que não pararam nos obstáculos, mas o venceram para que pudéssemos ter hoje na Santa Missa um encontro com Jesus por meio da Santa Liturgia. Referências Bibliográficas. BORÓBIO, Dionísio. A Celebração na Igreja I. Trad. Adail U. Sobral. São Paulo. Loyola, 1990. MARTÍN, Julían López. A Liturgia da Igreja: Teologia, História, Espiritualidade e Pastoral. Trad. Antônio E. Feitrin. São Paulo. Paulinas, 2006. (col. Liturgia Fundamental.). SILVA, Ariovaldo José. O Movimento Litúrgico no Brasil: estudo histórico. Petrópolis: RJ. Vozes, 1983.