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DO GRUPO ESCOLAR DE FAXINA AO GRUPO ESCOLAR CORONEL ACCACIO
PIEDADE – 1900 A 1938
Léia de Cássia Langnor e Sousa
Universidade de Sorocaba
INTRODUÇÃO
O presente trabalho demonstra os primeiros apontamentos da elaboração de uma
dissertação de mestrado em educação do Programa de Pós-graduação da Universidade de
Sorocaba do Estado de São Paulo. A pesquisa tem por objetivo levantar a história do Grupo
Escolar Coronel Accácio Piedade, no período de 1900 a 1938, seu papel na formação cultural e
educacional da cidade de Itapeva, Estado de São Paulo, e as questões políticas e socioeconômicas
envolvidas no âmbito regional. Buscar conhecer a história da educação de um local faz-nos
compreender a cultura escolar de um povo no seu tempo presente, suas tradições, manifestações,
representações, e pode contribuir nas intervenções que se fazem necessária ao desenvolvimento
socioeconômico, cultural e político dessa comunidade. Conhecer a história da educação de uma
localidade e de uma particular instituição deve-se buscar, primeiramente, a compreensão geral da
história da educação em um contexto mais amplo. Como diz o historiador luso, Magalhães
(2004), é necessário compreender que uma instituição escolar faz parte de um todo:
A história do sistema educativo não é um somatório de instituições
escolares justapostas nem por outro lado, a história de uma dessas instituições se
torna possível fora de um todo coerente. É nos domínios da representação e da
apropriação que esta autonomização se revela mais conseqüente, porque mais
relacional e menos autocentrada. Constituindo um todo em si mesma, cada
instituição escolar ou educativa integra esse todo mais amplo que é o sistema
educativo. (MAGALHÃES, 2004, P. 114)
Segundo Neves, “o historiador dispende enorme esforço para “calcular” a força
especificadora das condições históricas sem, no entanto, cair no particularismo que compromete
o entendimento pertinente do objeto focalizado, já que este impede o retorno crítico aos
conceitos.” (1992, p.158)
O estudo específico de uma instituição nos leva a investigar a resposta a uma pergunta
que se faz pertinente: por que fazer a história de instituições escolares ou educativas?
Antes,
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porém, deve-se entender o significado do termo instituição que, segundo o Dicionário Houaiss da
Língua Portuguesa é: Ato ou efeito de instituir (dar começo à) estabelecimento, criação,
instauração... Organismo público ou privado, estabelecido por meio de leis ou estatutos...
Estabelecimento destinado ao ensino, à educação; escola, instituto... (HOUAISS, 2001, p.1627).
Entende-se que uma instituição é importante pela função a que é criada, designada, de direito e
necessária à população de uma sociedade.
O seu estabelecedor, quem institui, tem o
compromisso de dar formação, continuidade, muitas vezes de manter com o propósito pela qual
foi instituído, controlar as respectivas estruturas sociais e políticas das sociedades, dos estados e
das pessoas. Magalhães diz que:
A afirmação dos Estados Modernos, associada à evolução científica e à
revolução tecnológica, vem desafiando os indivíduos, os grupos e as sociedades
a novas oportunidades, pela sua integração e participação social, cultural e
política, através da escolarização. A escola apresenta-se como lugar e instância
legitimada para a instrução e a formação, definindo-se a cultura escolar como
representação e base de uma intelecção da realidade e de uma preparação e
mobilização nos planos produtivo, cognitivo, cívico e de humanidade
(MAGALHÃES, 2004, p. 122).
Estudar a história de instituições escolares do Brasil é importante, pois são significativas
ao entendimento da história da educação brasileira. Para Sanfelice (2001), “É preciso ter presente
que as possíveis Histórias de Instituições Escolares vão estar sempre no âmbito da História da
Educação”.
Historiar uma instituição escolar específica é compreender ao mesmo tempo o singular e
os processos da realidade sociocultural e material. Segundo Sanfelice (2005) “A singularidade
das instituições educativas mostra e esconde como ocorreu e/ou ocorre o fenômeno educativo
escolar de uma sociedade”.
Magalhães ressalta ainda que:
Conhecer o processo histórico de uma instituição educativa é analisar a
genealogia de sua materialidade, organização, funcionamento, quadros
imagético e projetivo, representações, tradição e memórias, práticas,
envolvimento, apropriação. A dimensão material alarga-se enquanto a dimensão
simbólica reporta à participação e à construção educacional. Trata-se, portanto,
de uma construção subjetiva que depende das circunstâncias históricas, das
imagens e representações dos sujeitos, e que é afetada por dados de natureza
biográfica e grupal. (MAGALHÃES, 2004, p. 58)
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Então a questão que se coloca é: o que significa historiar o Grupo Escolar Coronel
Accácio Piedade para a educação brasileira ou ainda: o que significa o singular no geral? Não se
trata do modismo da Nova História ou história cultural – uma das versões da nova história
(Neves, 1992) - a valorização individual, a verdade relativizada e a importância da subjetividade.
Para nós trata-se de fazer a investigação da instituição escolar o Grupo Escolar Coronel Accácio
Piedade, buscando compreender suas correlações com o sistema educacional global. Entender sua
realidade, identidade, temporalidade, condição material e sua cientificidade na prática social, sem
perder, contudo, sua perspectiva histórica.
Segundo Neves:
A nossa história da educação tem primado por focalizar a escola seja sob
a lente da legislação e organização escolar, seja sob a lente das demandas de
escolarização da sociedade brasileira, seja sob a perspectiva do pensamento
pedagógico ou do ideário. Muito pouco sabemos, no entanto, sobre as suas
práticas: como elas se materializavam? Quais os seus efeitos? Como traduziram
o movimento de modernização da sociedade, movimento este que também
ajudaram a construir? Estas questões crescem em importância se considerarmos
que elas operam um deslocamento de enfoque dos modelos dominantes de
escolarização (a Escola Tradicional, a Escola Nova, por exemplo) para múltiplas
e diferenciadas práticas de apropriação desses modelos nas quais a ênfase da
problematização recai sobre os usos diversos que os agentes escolares fazem da
própria instituição escolar, sobre a prática de apropriação de práticas não
escolares no espaço escolar e os múltiplos usos não escolares dos saberes
pedagógicos. (NEVES, 1992, p. 152)
O estudo histórico o qual se pretende aqui é significativo ao entendimento da História
global, da História da Educação, da Educação Brasileira, da Regional e da local. O historiador
Hobsbawm diz que “a postura que adotamos com respeito ao passado, quais as relações entre
passado, presente e futuro não são apenas questões de interesse vital para todos: são
indispensáveis”. (1998, p. 36). Então deve-se considerar que a instituição pesquisada está inserida
num contexto particular sem , contudo, isolada do geral. Para Sanfelice:
Mergulhar no interior de uma Instituição Escolar, com o olhar do historiador, é
ir em busca das suas origens, do seu desenvolvimento no tempo, das alterações
arquitetônicas pelas quais passou, e que não são gratuitas; é ir em busca da
identidade dos sujeitos ( professores, gestores, alunos, técnicos e outros) que a
habitaram, das práticas pedagógicas que ali se realizaram, do mobiliário escolar
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que se transformou e de muitas outras coisas. Mas o essencial é tentar responder
à questão de fundo: o que esta instituição singular institui? O que ela institui
para si, para seus sujeitos e para a sociedade na qual está inserida? Mais
radicalmente ainda: qual é o sentido do foi instituído? (SANFELICE, 2005, P.
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A presente pesquisa faz seu primeiro percurso metodológico na revisão bibliográfica,
primeiramente, para a base teórica apropria-se da concepção filosófica materialista histórica, e
das escrituras histórica regional e local. Buscar-se-á tecer seus nexos por meio de fontes
documentais – acervo da escola, orais, iconográficas, arquitetônica, articulando o diálogo com os
dados obtidos e elaborar conceitos para as categorias de análise. Os estudos de instituições
escolares apresentam aspectos significativos para história da educação, pois emerge de sua
materialidade, a cultura escolar – normas e práticas, que acabam por apresentar uma gama de
categorias gerais e particulares.
Para Nosella e Buffa,
Essas normas e práticas complexas que variam no espaço e no tempo e
que podem até coexistir mantendo suas diferenças, aninham-se na instituição
escolar e é possível evidenciá-las a partir dos seguintes tópicos que funcionam
como categorias de análise: o contexto histórico e as circunstâncias específicas
da criação e da instalação da escola; seu processo evolutivo: origens, apogeu e
situação atual; a vida da escola; o edifício escolar: organização do espaço, estilo,
acabamento, implantação, reformas e eventuais descaracterizações; os alunos:
origem social, destino profissional e suas organizações; os professores e
administradores: origem, formação, atuação e organização; os saberes: currículo,
disciplinas, livros didáticos, métodos e instrumentos de ensino; as normas
disciplinares: regimentos, organização do poder, burocracia, prêmios e castigos;
os eventos: festas, exposições, desfiles e outros. (NOSELLA, BUFFA, 2005, p.
04)
Para a presente pesquisa, a específica instituição, o Grupo Escolar Coronel Accácio
Piedade, far-se-á um levantamento das fontes “(...) são pontos de origem, a base e o ponto de
apoio para a produção historiográfica” (SAVIANI, 2006, p. 31) com o recorte de 1900 a 1938 –
quando de sua instituição - Grupo Escolar de Faxina, ao Grupo Escolar Coronel Accácio Piedade
de Itapeva.
Itapeva da Faxina: breve histórico
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O breve levantamento histórico da cidade tomou como fontes os antigos livros de atas da
câmara municipal de Itapeva a partir de 1847, artigos de jornais, os estudos acadêmicos
realizados por historiadores, pesquisadores e professores memorialistas autodidatas do local, que
fazem parte do patrimônio cultural do Instituto Histórico e Geográfico de Itapeva, recém criado.
O município de Itapeva está situado no sudoeste do estado de São Paulo a 55 km da divisa do
Paraná. Para chegar ao município, saindo da cidade de São Paulo, é preciso acessar a rodovia
Raposo Tavares, SP – 270 até a cidade de Itapetininga para onde se toma à rodovia Antônio
Romano Shcincariol, SP – 127 rumo ao último trevo que antecede a cidade de Capão Bonito,
seguindo então pela rodovia Francisco Alves Negrão a SP – 258. Itapeva está a aproximadamente
300 km da cidade de São Paulo (ARAUJO, 2006, p. 3).
Historicamente a interiorização do branco no Brasil se deu através das trilhas dos índios
que aqui habitavam. A ocupação do interior de São Paulo aconteceu através da penetração das
Bandeiras, pelos caminhos e rotas demarcadas pelos indígenas. A entrada dos lusitanos no
sudoeste paulista se dava por uma antiga rede de caminhos indígenas, chamada de Peabiru,
utilizada pelos índios desde os primórdios da ocupação humana da América. O Peabiru era uma
trilha, bem demarcada:
“Partindo da Capitania de São Vicente, em São Paulo, essa vasta rede de
caminhos que possuía uma direção geral Leste-Oeste, atravessava todo o
território paranaense indo dar no rio Paraná na altura da foz do rio Piquiri.
Saindo do atual território brasileiro, ele cortava o Chaco paraguaio até chegar
aos planaltos peruanos e dali ao Oceano Pacífico” (COLODEL, 1988, p. 04).
As Bandeiras que usavam essa rede de estradas serviram como fator decisivo para
desarticular e romper com a expansão espanhola. Em 1653, por ordem de Tomé de Sousa, a rota
foi fechada com a intenção de segurar as invasões espanholas rumo ao Oceano Atlântico.
Afastado da economia açucareira do nordeste, além do descaso de Portugal, a população
paulista vivia numa economia de pobreza e miséria. Darcy Ribeiro (1995), diz que “durante um
século e meio, os paulistas se fizeram cativadores de índios, primeiro, para serem braços e as
pernas do trabalho de suas vilas e seus sítios; depois, como mercadoria para venda aos engenhos
de açúcar”. Com a descoberta do ouro na região das Minas Gerais, os paulistas impulsionam uma
atividade bastante significativa para dar sustentação à importação e exportação de mercadorias:
criação e comercialização do gado muar, cavalar e vacum nos campos de Curitiba. “Em 1712, o
comércio entre paulistas e curitibanos é intensificado e, nesse contexto, começam a surgir as
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paragens (locais onde os viajantes/comerciantes paravam para descansar e pernoitar) na região
recortada pelo antigo Peabiru”. (CAVANI, 2006, p. 71). Segundo Trindade:
A partir de 1725, começam a ser ocupados os campos situados na
planície litorânea que faziam limite a oeste com o escudo Rio Grandense,
recebendo o nome de Campo de Viamão, devido à visão do estuário do rio
Guaíba, que se podia ter de um promontório junto a atual cidade do Viamão. A
pedido do governador da Capitania de São Paulo, Francisco Souza Faria parte do
Viamão, em 1728, subindo a Serra Geral, chegando aos campos de Vacaria dos
pinhais, onde encontra grande quantidade de gado. Seguindo, chega a Curitiba
em 1730, fazendo nascer o longo Caminho de São Paulo ao Viamão –
simplificadamante, Caminho de Viamão – incorporado ao antigo trecho
Sorocaba – Curitiba (TRINDADE, apud STRAFORINI, 2001, p. 28).
No Caminho de Viamão, tornaram-se obrigatórias as passagens dos tropeiros,
comerciantes de gado, tropas de cavalos e burros. Vindos de
Viamão - Rio Grande do Sul, passavam por Lages– Santa
Catarina; Curitiba, Ponta Grossa, Jaguariaiva– Paraná; Itararé,
Itapeva, chegando a Sorocaba em São Paulo. O Caminho era
pouco povoado. D. Maria I, de Portugal, ordena ao Morgado de
Mateus, interventor da coroa na província de São Paulo,
providências no sentido de serem criadas as freguesias de
Itapetininga e de Faxina com o intuito de aumentar as
povoações nessas regiões.
Ilustração 1
Fonte: Straforini, 2001
Vila de Faxina
Faxina nasceu de uma sesmaria em território então pertencente ao município de Sorocaba.
A começar do Rio Paranapitanga, até o rio Itararé, divisa com o município da Vila de Curitiba,
nas rotas do Sul. Aos dez de junho de 1766 é divulgado em altas vozes pelas ruas da Vila de
Sorocaba, acompanhada do rufar de tambores, da notícia de fundação de Faxina. O pregão foi
feito pela câmara de Sorocaba, com ata lavrada, assinada pelo colonizador Antonio Furquim
Xavier Pedroso e mais três dezenas de povoadores da vila. Um ano depois o governador da
província autoriza a construção da igreja. Na mesma ocasião, o Morgado de Mateus, Dom Luís
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Antônio, a mando do rei Dom José I, ordena a fundação de dezesseis núcleos nas partes desertas
da capitania e, que congregassem todos os vadios e dispersos, ou os que vivem em sítios volantes,
para morarem em povoações civis, em que se lhes pudessem administrar os sacramentos. E
ordena, ainda que se dê o nome de Vila à povoação, se ela já contiver número suficiente de
moradores e de casas. (BARBOSA, 1988, p. 17).
Em 27 de junho de
1769,
o
governador
da
Província de São Paulo, ordena
providências para a ereção da
Vila de Faxina. Conforme o
documento
original
da
correspondência de Dom Luís
Antônio:
Ilustração 2:
Cidades fundadas a partir do pouso de tropas no Estado de São
Paulo (Cavani, 2006)
Porquanto S. Majestade, que Deus guarde, foi servido ordenar-me nas
Instruções de 26 de janeiro de 1765, e em outras ordens que depois fui
recebendo, que era muito conveniente ao seu real serviço que nesta capitania se
erigissem vilas naquelas partes que fossem mais convenientes, e que a elas se
congregassem todos os vadios e dispersos, ou que vivem em sítios volantes, para
morarem em povoações civis em que se pudessem administrar os Sacramentos,
estivessem prontos para as ocasiões do seu real serviço: Ordeno ao Dr. Ouvidor
e corregedor desta comarca que achando que a nova povoação da Faxina que
mandei fundar de novo no caminho que vai de Sorocaba para Curitiba se ache já
com bastante número de moradores, e suficientes casas armadas para se lhe
poder dar o nome de vila, lhe faça levantar pelourinho e assinalar-lhe termo, de
que se fará auto assinado pelas câmaras circunvizinhas para que em nenhum
tempo possa vir em dúvida, e lhe demarque lugar para edificarem os passos do
conselho e cadeia; como também me proporá as pessoas mais capazes para
juízes e vereadores, para eu nomear os que hão de servir este primeiro ano na
forma das ordens que tenho – o que tudo obrará conforme dispõem as leis que se
acham promulgadas a respeito desta matéria. (BARBOSA. V. I, 1988)
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A vila foi fundada em 20 de setembro de 1769, conforme as atas lavradas de fundação e
apregoada em altas vozes pela câmara Municipal de Sorocaba. Assim, Faxina tem sua origem
como ponto de parada da rota dos tropeiros. O Caminho das Tropas foi a principal via de ligação
comercial de São Paulo com os estados do sul, nos séculos XVII e XVIII. Segundo Straforini:
“Toda a comercialização do muar encontrado no Sul (tropas xucras) era
destinada para o Brasil Central, ou seja, região de Minas Gerais, Mato Grosso,
além de São Paulo, Rio de Janeiro, Espírito Santo e outras Capitanias onde era
utilizado como meio de Transporte (tropa arriada ou tropa de carga)”.
(STRAFORINI, 2001, p. 24)
Após dezesseis anos da fundação de Faxina, o presidente da província de São Paulo,
ordena e aprova, por meios de ofícios, um novo local para a transferência da vila, do lugar em
que estava assentada, atual bairro de Vila Velha, para um sítio denominado Itapeva. No final de
1785 a mudança estava concretizada e chamou-se Vila de Itapeva da Faxina (Ita – pedra; peva –
chata – pedra chata em Tupi guarani).
Na época de sua passagem por Faxina, no ano de 1820, o naturalista Saint-Hilaire
descreveu a vila de Faxina como pobre e decadente:
O distrito de Itapeva estende-se desde o rio Paranapitanga até o rio Itararé,
onde começa o distrito de Castro. Em 1820 não contava ele mais de 2000
habitantes, e era administrado por juízes ordinários. O número de escravos nele
existente era pouco considerável, não só porque os seus habitantes eram muito
pobres, mas também porque a criação de gado, de que se ocupam habitualmente,
pouco trabalho exige. Itapeva fornece grande quantidade de gado bovino à
cidade do Rio de Janeiro; mas parece que a maior parte das fazendas da região,
as quais, de resto, são em pequeno número, pertencem a homens ricos, que nas
mesmas não residem, e que contrariamente aos fazendeiros de Minas Gerais
despendem suas rendas alhures. Resulta disso que a região é, como se viu muito
pobre; e, se na mesma circula algum dinheiro, deve-se, principalmente, às
caravanas vindas do Sul. Nas terras boas, o milho rende de 150 a 200 por 1; a
cana de açúcar não pode ser cultivada, por causa das geadas que caem nos meses
de junho e julho, época do inverno no hemisfério austral.” ( SAINT-HILAIRE
apud BARBOSA, 1988, p. 07).
Os escritos deixados pelo naturalista francês comprovam por um lado a dureza de vida
dos paulistas naturais desta região, e a dificuldade de sobrevivência do natural destas terras, o
indígena, pois eram aprisionados e trabalhavam como escravos. A pobreza da época pode vir a
ser a causa de problemas econômicos e de infra-estrutura que resistem ao tempo. Como diz
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Basbaum “... Há na realidade, um permanente fluxo entre várias causas simultâneas, entre os
efeitos e as causas, entre o passado e o presente” (1967, p. 12). Diferente de outras regiões mais
ricas da Província de São Paulo, a região de Itapeva da Faxina contava com tipos humanos, o
índio (bugre), o tropeiro que não tinha paragem fixa e alguns africanos escravizados. A Vila de
Itapeva da Faxina, nos períodos, colonial e imperial, fazia parte do conjunto de vilas que serviam
como entreposto de circulação de mercadorias, e da prática do aluguel de pastagens nas fazendas
de invernagens, áreas de descanso e engorda das tropas de muares até atingir o mercado de
Sorocaba. Essas características marcaram Itapeva e cidades vizinhas, dando-lhe aspectos
econômicos, sociais e culturais no passado e no presente diferentes das regiões exportadoras do
estado de São Paulo. (MARQUES, 2001)
Em 20 de julho de 1861, pela Lei Provincial nº 13, a Vila de Itapeva da Faxina é elevada à
categoria de cidade. Itapeva pertenceu a várias Comarcas: Itu, Itapetininga, Botucatu, voltou,
novamente, para Itapetininga e, quando de acordo com a Lei nº 46 de 06 de abril de 1872, passa a
constituir a comarca de Faxina. “Em 1874, pelo recenseamento local, Itapeva possuía uma
população de 10.094 habitantes” (MARQUES, 2001). Pelo Decreto nº 9775, de 30 de novembro
de 1938, a Comarca de Faxina passou a ser a Comarca de Itapeva, nome que perdura até hoje.
A História da Educação Escolar em Itapeva: do Grupo Escolar de Faxina ao Grupo Escolar
Coronel Accácio Piedade
Com o objetivo de encontrar os primeiros vestígios sobre o princípio da história da
educação escolar de Itapeva, buscou-se, primeiro, pesquisar os livros de atas de reuniões do
acervo da Câmara Municipal, sendo que o mais antigo data de 1847 e foi quase impossível
decifrá-los devido à ação do tempo passado. Dentre os documentos pesquisados no Instituto
Histórico, Geográfico e Genealógico de Itapeva, revelaram-se alguns de especial interesse, os
manuscritos produzidos pelo historiador local, professor Euflávio Barbosa, que historiou e
reproduziram parte dos ofícios, comunicados, despachos e atas da Câmara Municipal de 1769 a
1889. O primeiro registro de manifestação a favor da fundação de uma escola de primeiras letras
em Faxina aparece em ata de uma reunião da Câmara em 15 de fevereiro de 1829, onde consta
uma troca de correspondência entre as lideranças locais e o governo da Província abordando essa
necessidade:
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Ilmo. E Exmo. Sr
Em observância do ofício de V.Exa., de cinco de novembro do ano
próximo passado, em que exige informação sobre as aulas de gramática latina e
escolas de primeiras letras de nosso distrito, e que respondemos a V.Exa. que
nesta vila não há aulas de gramática latina nem de primeiras letras.
É o que podemos informar a V.Exa.
Itapeva, em Câmara de 15 de fevereiro de 1829.
(BARBOSA, p.44, v. I 1988)
Neste período, no Brasil Imperial, recém conquistada a emancipação política em 1822,
com a crise econômica – insuficiência de recursos e a instabilidade política, “consequentemente,
os recursos exigidos para a reorganização da estrutura escolar não estarão disponíveis, além do
que, diante de tão grave situação, a educação escolarizada não será vista como setor prioritário”
(RIBEIRO, 2001, p. 48). A Constituição de 11 de outubro de 1823, art. 179, estabelecia que a
instrução primária fosse gratuita para todos os cidadãos. Com a lei de 15 de outubro de 1827, o
ensino primário transforma-se em escolas de primeiras letras.
Nas províncias, em suas cidades e nas vilas, a vida política e os recursos materiais
apresentavam as mesmas dificuldades. Em Itapeva da Faxina, a vila se achava em circunstância
miserável: sofria frequentemente, ataque dos índios, pois os faxinenses praticavam em muito a
caça aos bugres para escravizá-los; os condutores das tropas, os tropeiros, que de passagem em
suas invernadas, assaltavam as fazendas e invadiam com as tropas as áreas de cultivos. Mesmo
diante de tais problemas, de real sobrevivência, a instrução, a escola de primeiras letras, parecia
estar presente no ideário dos cidadãos que, em alguns momentos voltava às pautas da Câmara,
como consta em ofício de 1832:
Sendo-nos presente o ofício de V. Exa. Datado de 30 de abril do corrente
ano, acompanhado do edital incluso sobre o concurso da escola de primeiras
letras desta vila, exigindo-nos o dia que se verificasse a publicação de dito
edital, e que participamos a V. Exa. Que foi publicado aos 3 de junho p.p.,
Deus guarde a V. Exa.
Vila de Itapeva, em sessão ordinária de 14 de julho de 1832.
Floriano José de Carvalho
(BARBOSA, 1988, p. 60)
Um outro ofício que aparece na ata de reunião da Câmara é a solicitação de um mestre
com urgência. Um dos problemas que a vila apresentava era a dificuldade de se encontrar um
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professor apto para ministrar as aulas e, se por um golpe da sorte, aparecesse alguém, pronto para
tal, tinha que aproveitar a presença e contratá-lo, assim como dizia um ofício, Barbosa (1988, p.
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A necessidade nos obriga a levar ao conhecimento de V. Exa. Que
se acha esta vila sem mestre que se incumba da educação da mocidade,
fazendo-se, portanto, necessário um professor de primeiras letras, e como
se acha estabelecido nesta Elias de oliveira Lima, sujeito probo capaz de
incubir-se desta tarefa, motivo este por que rogamos a V. Exa. Haja de
providenciar sobre este objeto, nomeando um examinador nesta vila para
examinar o dito, e a vista de seu exame que seja promovido, tudo a bem
do interesse público.
Deus guarde a V. Exa.
Paço do Conselho, em sessão extraordinária de 17 de setembro de 1833.
A dificuldade de se encontrar professores preparados era sentida no âmbito nacional, as
escolas normais para a formação de pessoal pouco existiam e as criadas eram precárias, com
duração de, no máximo, dois anos e em nível secundário.
Em ofício de janeiro de 1839, há uma petição do professor de primeiras letras, Manuel
Mendes Ferraz, nomeado em despacho de 25 de novembro de 1838, que nos mostra o descaso
dos governos central, provincial e a inoperância do governo local em oferecer, tanto quantitativa
e qualitativa a instrução escolar ao município, pois o professor faz uma solicitação elementar:
uma casa para as aulas, bem como os utensílios necessários. Logo em seguida aparece um outro
registro de ata no qual o professor reclama à Câmara Municipal sobre seu reduzido salário como
mostra Barbosa:
“... que talvez por inadvertência acaba de praticar para comigo o Sr.
Presidente da província e é que sem dúvida mal informado das atuais
circunstâncias deste município, dando-se na lei Provincial nº 12, passou a
diminuir-me o mesquinho ordenado de 360$000 que tinha sido marcado para
esta cadeira taxando-o em 240$000, salário este que nem pela mais estreita
economia pode ser...” (Idem, 1988, p. 143)
Isso comprova o desrespeito à educação escolar, aos professores desmoralizados,
desvalorizados tanto monetariamente, como no preparo acadêmico; ao mau preparo dos alunos e
aos insignificantes investimentos necessários ao avanço educacional da nação. Com referência à
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redução do ordenado do professor, e a presença de “barbados” nas aulas, a Câmara Municipal
justifica a petição do mestre no seguinte ofício:
A Câmara Municipal, recebendo a representação do professor de
primeiras letras desta vila, e tomando na devida consideração, resolve levar ao
conhecimento de V.Exa., restando da parte desta Câmara a confirmar tudo
quanto o mesmo alega, e acrescentando mais: que a falta de professor nesta vila
tem dado lugar a se achar moços de barba na aula, e mesmo cinqüenta alunos,
com quantos se acha, devendo o mesmo esperar muito mais. Além disto, ser esta
vila donde se municiam todos os passageiros, sendo isto apresentado até a vila
de Castro, por onde encarecem muito os víveres e o mesmo ser bastante distante
do ponto de mar, por isso tudo com preço duplicado, mas como não nos pertence
deferir ao representante, levamos ao conhecimento de V.Exa., que mandará o
que for servido.
Deus guarde a V.Exa. Vila de Itapeva, em sessão extraordinária, 16 de
março de 1839. (BARBOSA, 1988, p.143).
Neste mesmo ano em agosto, vem a falecer o professor Mendes Ferraz, ficando vaga sua
cadeira que possuía, nessa ocasião, 60 alunos. A Câmara encaminha a petição do pretendente,
Francisco Borges do Canto, à cadeira vaga, ao Presidente da Província, que é aceito. Outras
notícias sobre o ensino de primeiras letras da então vila de Faxina, datam de 1840, onde o
professor Borges do Canto declara a necessidade de recursos elementares para os meninos:
utensílios de papel, pena, pedra e lápis (Idem, 1988, p. 154). Desta maneira vai se compondo o
quadro inicial da instrução pública escolar da vila de Itapeva da Faxina e, aparece como de
responsabilidade do poder político a Câmara de vereadores, as comunicações, indicações, as
cadeiras vagas a serem ocupadas pelos professores, bem como os pedidos de recursos materiais
aos presidentes da Província para o simples funcionamento da escola de primeiras letras. Sabe-se
que estas funcionavam em casas particulares. Ribeiro ressalta “que numa organização
econômico-político-social como a do Brasil – Império, as medidas especialmente relacionadas à
escola acabavam por depender marcadamente da boa vontade das pessoas” (2001, p. 55). Em
1886, em Itapeva, existia uma escola pública primária para o sexo masculino e outra para o sexo
feminino. A escola funcionava num casarão de um professor na praça central da cidade. Em
agosto de 1889, surge o Colégio Faxinense, onde eram ministrados os ensinos primários,
secundário e comercial. Em 28 de novembro o jornal local, O Sul de São Paulo, publica que no
dia 24 às 4 horas da tarde,
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“encorporados, os vereadores e o povo se dirigiram à sala da Câmara
Municipal, onde achava-se hasteada a bandeira republicana. Ahi, aberta a
sessão e lido o offício circular do governo do Estado em que comunicava
a posse e exercício, declararam os vereadores por unanimidade que
adheriam franca e lealmente a nova forma de governo do paíz e
promettiam à ella prestar completa adhesão...Lavrada e assignada a acta
circunstanciada da sessão, a banda musical presente executou a
Marcelhesa depois de novos e calorosos vivas.” ( O SUL DE SÃO
PAULO, 1889, n.33 Anno I).
Em 1897, a Câmara Municipal republicana oferece ao Estado um prédio para o Grupo Escolar.
Em 1899, a Câmara faz a aquisição de uma casa particular e o Grupo Escolar e ali funciona até o
prédio oficial ficar pronto. Em 14 de janeiro de 1900, o Coronel Fernando Prestes de
Albuquerque cria o Grupo Escolar de Faxina e é nomeado o professor Emílio Mário Arantes, exInspetor Geral do Ensino Primário do Estado, para organizar e dirigir o recém criado
estabelecimento de ensino, com 156 alunos de ambos os sexos. Para o segundo semestre são
matriculados 288 alunos, sendo 144 de cada sexo. Fica pronto o primeiro prédio do Grupo
Escolar da Faxina com programação de festejos nos dias 5 e 6 de setembro, publicados no jornal
O Sul de São Paulo:
“A Faxina é grata ao coronel Fernando Prestes. Foi elle que, elevado pelo
voto dos seus co-estadanos, a cadeira presidencial do nosso Estado, referendou o
decreto creando o grupo escolar, cujos festejos inauguraes, nos dias 5 e 6 do
corrente, tiveram lugar nesta cidade”. (O SUL DE SÃO PAULO, 9 de setembro
1900, n.215 Anno V).
Segundo a pesquisa e compilação da escritora, memorialista Itapevense a professora
Leonor Ribeiro de Oliveira (1985):
Em nove de setembro de 1905, assume a direção do
estabelecimento o professor João Portela, que permaneceu na mesma até
cinco de março de 1907. Nessa ocasião, o Grupo Escolar de Faxina
contava com dez classes. Em onze de maio de 1907, assume a direção o
professor Tomé Teixeira e em dezembro, como de costume na época, o
professor publica edital nos jornais locais, convidando as autoridades,
pais de alunos e pessoas interessadas, para assistirem à realização dos
exames finais. As provas dos alunos eram corrigidas imediatamente, em
frente de todos, sendo o resultado anunciado aos presentes. Realizava-se,
então sessão solene, com discursos, poesias, e entrega de prêmios aos
primeiros colocados. Uniam-se assim, o exame e a festa de encerramento,
numa só solenidade (OLIVEIRA, 1985, p.25).
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Passados dez anos da inauguração do primeiro prédio do Grupo Escolar, aparecem nos
jornais as primeiras notícias sobre a construção de um novo edifício para o Grupo Escolar de
Faxina. A Câmara trata de desapropriar o terreno situado na Rua das Tropas (atual Avenida
Accácio Piedade), para ali ser construído o novo prédio do Grupo Escolar. Em janeiro de 1911,
foram iniciadas as obras e a Câmara assinava a adoção do terreno para o Estado. A escritura foi
assinada pelo Coronel Accácio Piedade, advogado, tabelião, vereador por treze anos e deputado
por oito anos. Em 21 de dezembro de 1913, o jornal O Tempo, estampa na primeira página as
festas da entrega do novo prédio do Grupo Escolar:
“Imponentes festas realizadas no dia 15 do corrente de uma das janellas do
elegante edifício usou da palavra o Exmo Sr. Coronel Accácio Piedade,
congratulando-se o povo da Faxina... Terminando a sua oração, levantou viva a
Faxina, ao governo do Estado e a República... Hastendo o Pavilhão Nacional” (
O TEMPO, 1913, Num 624, Anno XIII).
Na ocasião, o número de alunos matriculados atingia a soma de quatrocentos, tornando
assim o antigo prédio pequeno. Passados cinco anos de sua inauguração o Grupo Escolar,
atendendo a um pedido da Câmara Municipal de Faxina, o Governo do Estado, resolveu dar
denominação de “Cel. Acácio Piedade” ao Grupo Escolar de Faxina. Assim, teve início a mais
antiga e primeira instituição escolar da cidade de Itapeva. Este artigo representa uma pequena
parte do que se pretende investigar, a instituição escolar Coronel Accácio Piedade, pois faz parte
do início da história cultural de Itapeva, sem perder de vista os fatos, as suas relações, causas,
conseqüências.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao iniciar a presente pesquisa percebe-se que o objeto de estudo, a Escola Coronel
Accácio Piedade, mostra-nos uma riqueza de material ainda muito pouco explorada, não pela
ausência de fontes e, sim, pelo pouco interesse de se resgatar a sua memória histórica. Percebe-se
que a preocupação e a construção da escola obedecem à perspectiva republicana na tentativa de
modernizar a sociedade. Apresenta-nos, quando da sua fundação, um importante marco histórico
- patrimonial para a população da cidade, pois, a partir da escola instituída, sente-se que a cultura
começa a toma corpo. Isso evidencia pelo fato que a cidade surgiu das atividades primárias, como
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o desbravamento das terras do interior do país, que acaba por caracterizar a cidade e região de
pobre e atrasada, diferente das regiões exportadoras do Brasil e da Provícincia de São Paulo.
Assim, ao fechar este início da investigação sobre a Escola Coronel Accácio Piedade, percebe-se
que a mesma nos apresenta uma gama de especificidades que devem ser estudadas e detalhadas
com mais aprofundamento quando na produção da dissertação de conclusão do mestrado em
educação.
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