Pague um “dízimo” a si mesmo! Nossas primeiras dicas tentaram “remediar” os casos extremos, já orientamos aqueles que têm uma poupança sobre como podem proteger suas economias e já demos algumas sugestões para que os endividados coloquem suas finanças em ordem. Hoje, queremos dirigir uma palavra a quem está “no meio do caminho”, não tem economias, mas também não tem dívidas; o salário não falta, mas também não sobra. Essa situação de “orçamento empatado”, na qual o salário dá para viver, mas não sobra para guardar, é a característica da grande maioria dos brasileiros. Mas, afinal, qual é o problema? Existe equilíbrio, certo? Errado! Andar com as contas “no empate” é uma situação inadequada, pois deixa a pessoa muito exposta. Qualquer imprevisto já é suficiente para tirar as finanças dos eixos. Esse é, juntamente com a falta de planejamento financeiro, o principal motivo do endividamento das famílias brasileiras. Parece estar tudo certo e equilibrado, mas eis que o carro quebra, algum membro da família adoece, surge um convite para ser padrinho de casamento (sim, às vezes coisas boas causam desequilíbrios financeiros) e pronto, o caos está instalado. Os imprevistos simplesmente não cabem no orçamento do mês, geram parcelas e prestações que vão ficando atrasadas, as multas e juros por atraso começam a aparecer e quando se vê a “bola de neve” já está rolando. Um orçamento “empatado” já seria arriscado mesmo num momento de estabilidade econômica, sem disparada inflacionária e com desemprego controlado. Em momentos de crise da economia então, pode ser fatal! Sem “margem de manobra”, como você “se viraria” caso viesse a perder o emprego? Este é um risco real no qual a grande maioria da população não para sequer para pensar. É por isso que políticas públicas como o seguro desemprego e o FGTS são necessárias. Caso não existissem, momentos de baixa do ciclo econômico se converteriam em caos social quase instantaneamente, pelo simples fato de que as pessoas não se preparam para os “tempos de vacas magras”. Mas ainda assim, os benefícios sociais têm prazo para acabar e, quando isso acontecer, o que fazer? A boa notícia, caros amigos, é que existe uma “vacina” simples e antiga para o problema, chama-se poupança. Não me refiro, evidentemente, à “caderneta de poupança”, mas ao próprio ato de poupar, ou seja, deixar de gastar um pedacinho dos rendimentos de cada mês para formar um “fundo pessoal” que lhe permita passar pelos tempos difíceis. Isso, minha gente, é tão antigo como negligenciado, e é básico para sobreviver em tempos de crise econômica. A Previdência Social e as políticas sociais, que são coisas boas, são invenções muito recentes. No passado, a estratégia das pessoas “previdentes” - que pensam no futuro -, para suportar tempos difíceis ou enfrentar a velhice, era a boa e velha poupança e é isso que aconselho você a fazer: separe, todo mês, um pedacinho do seu salário para os tempos difíceis! É neste ponto que surgem as objeções: “Eu até gostaria de poupar, mas não sobra dinheiro”. Ou então, “Mas eu ganho tão pouco, como é que vou conseguir economizar?”, etc. Tais objeções podem até ter um fundo de verdade, mas aqui é preciso um ato de vontade! Se você esperar sobrar para guardar, nunca guardará! Você precisa se decidir a poupar dinheiro e, espero que os argumentos apresentados o tenham convencido disso. É impressionante, mas o brasileiro médio é um “bom pagador”, raramente atrasa o pagamento de um boleto, por exemplo, a não ser por razões muito sérias. Entretanto, quando se trata de “pagar a si mesmos”, de se comprometerem consigo mesmos, os brasileiros não são tão diligentes assim. Portanto, é preciso que você se comprometa. E aqui é que entra a dica de hoje: pague um dizimo a si mesmo! É isso mesmo, para construir uma vida financeira saudável, que lhe proporcione o mínimo de tranquilidade, você deve todo mês economizar “religiosamente” 10% do seu salário. Se você ganha pouco, acredite, esses 10% não farão tanta diferença assim no seu orçamento. Se você, por outro lado, têm dificuldade para “fazer sobrar” dinheiro, pode utilizar algumas das ideias da dica nº 2 para “espremer” um pouco mais o orçamento. Na verdade, a ideia é que você mude de paradigma: de agora em diante, você não esperará sobrar dinheiro, quando receber seu salário, você separará o seu “dizimo pessoal” primeiro e depois viverá com o que sobrar. Se, por exemplo, o seu salário for de R$ 1.000,00, a partir de hoje você deve considerar que seu salário é de apenas R$ 900,00 e é com base nesta quantia que você deve organizar o seu orçamento mensal. Os outros R$ 100,00 serão “sagrados” e servirão para formar o seu “fundo pessoal”. Pode parecer difícil, mas com empenho e após algum sacrifício inicial a coisa se tornará natural. E onde aplicar este dízimo mensal? Como afirmamos na dica nº1, a caderneta de poupança não é atualmente uma boa aplicação financeira, entretanto, devido à facilidade de acesso, para começar o seu projeto de dizimo pessoal, você deve utilizar a caderneta mesmo. Futuramente, quando as reservas já tiverem alguma expressão você poderá transferi-las, seguindo, se quiser, as orientações da dica nº1. Mas para que servirá este fundo pessoal? Bem, o seu fundo pessoal funcionará como um “amortecedor”. Quando surgirem imprevistos, como por exemplo, gastos inesperados com a manutenção do carro, você poderá utilizar os recursos do fundo, sem comprometer o equilíbrio do seu orçamento mensal. Como você já pode imaginar, o ideal é que passado o “susto” você procure recompor, na medida do possível, os recursos do seu fundo, de modo que ele esteja sempre disponível quando você precisar. O fundo pessoal funcionará como uma espécie de “sistema imunológico” da sua vida financeira e lhe ajudará a lidar com os imprevistos de uma maneira saudável. E qual é o valor adequado para este fundo? Este é um ponto controverso, mas de modo geral, para que um trabalhador possa ter o mínimo de segurança e tranquilidade, seu fundo pessoal deverá corresponder a, pelo menos, o valor de seis salários. Portanto, se seu salário for de R$ 1.000,00, seu fundo precisará ter pelo menos R$ 6.000,00. Este valor não é “cabalístico”, a lógica que o fundamenta é que, no caso de um imprevisto grave, como a perda do emprego, o trabalhador tenha condições de se sustentar, com relativa tranquilidade, pelo prazo de um ano. Um fundo pessoal de seis salários combinado com uma readequação do orçamento pessoal, com os direitos trabalhistas e com as parcelas do seguro desemprego é plenamente capaz de cumprir esse objetivo. Como certamente você já percebeu, trata-se de um projeto de longo prazo. Economizando 10% do salário por mês, e desprezando eventuais ganhos financeiros e perdas inflacionárias, serão necessários cinco anos de economia para formar o fundo. Isso, contudo, não deve ser razão para desanimo. Se houver disciplina, com poucos meses de “fidelidade” ao “dizimo pessoal” já será possível usufruir dos primeiros benefícios. Em cinco meses você já terá a “margem de manobra” de meio salário e essa reserva já poderá ser utilizada para lidar com pequenos imprevistos. O “dizimo pessoal” possui ainda outros benefícios, entre os quais a viabilização de alguns sonhos e a construção de uma aposentadoria complementar, mas isso já é assunto para outro artigo. Por hoje é só. Não perca nossas próximas dicas. Um abraço e boa sorte! *Por Luiz Fernando Alves Rosa – economista do Dieese, da subseção da Federação dos Trabalhadores da Saúde do Estado de São Paulo. Envie suas dúvidas e sugestões para [email protected].