Rita de Cássia Martins Montezuma
Elisa Sesana
Henrique F. Togashi
Marcelo Campos
Jacqueline Carlile
Luiz Felipe Guanaes Rego
Conectando cidades e florestas:
o caso do município de Nova Iguaçu
Corredor Ecológico: o conceito
Tema recorrente nos debates ecológicos tem sido a questão da fragmentação dos ecossistemas e os mecanismos mitigadores dos efeitos resultantes do isolamento dos seus remanescentes. Como meio de conectar os espaços vegetados, sobretudo os de tipologia florestal, tem sido
proposto a criação ou a recuperação de áreas de tipologia similar. Tais
estruturas são denominadas Corredores Ecológicos.
Corredores, no seu sentido mais amplo, são reconhecidos a partir
de sua condição estrutural, ou seja, é uma faixa estreita que tem a
função de interligar espaços. É definido como uma faixa que difere do
seu entorno e permeia uma área1 (FORMAN, 1995), podendo ser isolado
ou ligado a algum fragmento ou algum tipo de vegetação similar (FORMAN & GODRON, 1986). Forman (1995), atribuindo aos corredores de
vegetação uma significativa importância para a sociedade, os distribui
em seis categorias funcionais, a saber:
1 Como provedores de proteção à biodiversidade, incluindo habitats
riparianos chave, espécies raras ou ameaçadas, espécies de ampla
distribuição e rotas de dispersão para recolonização após extinções
locais.
2Favorecem o manejo de recursos hídricos, como o controle de fluxos, de sedimentação, capacidade de armazenamento, limpeza da
água, sustentação de populações de peixes e pesca.
103
Produto do trabalho de
conclusão da disciplina
Ecologia de Paisagem em
conjunto com a disciplina Geoprocessamento
e Sensoriamento Remoto,
ambas do Programa de PósGraduação em Geografia da
PUC-Rio, com a colaboração do estudante de graduação em Geografia, Marcelo
Campos
1
”Corridors, as strips that
differ from their surroundings, permeate the land”,
Forman (2006).
3 Faixas lineares que aumentam a produção agroflorestal ao atuar
como quebra-vento para cultivos e criações de animais, controle de
erosão dos solos, provendo madeira e prevenindo a desertificação.
4 Como espaço recreacional, incluindo manejo de caça, conservação
da vida selvagem para usufruir da natureza, caminhadas, ciclismo,
canoagem e prática de esqui em cinturões verdes suburbanos.
5A coesão cultural e da comunidade pode ser estimulada a partir de
cinturões verdes, os quais criam identidade de vizinhança promove
corredores de vida selvagem cruzando estradas que concomitantemente inibem o desenvolvimento de faixas ao longo de estradas
e funcionam como barreiras topográficas regionais que promovem
a diversidade cultural.
6 Corredores fornecem rotas de dispersão para espécies isoladas em
reservas da natureza e faixas costeiras ameaçadas pelo aumento
do nível do mar em eventos de mudanças climáticas.
Em termos gerias um corredor tem por principal função a transmissão, embora possam desempenhar o papel de proteção, estética, defesa
ou de recurso. São exemplos de corredores estradas, cercas, linhas de
transmissão, canais, etc. Independentemente de sua categoria, a função desempenhada pelo corredor é muito dependente de sua forma. A
condição estrutural compreende, em princípio, uma tridimensionalidade que é identificada pelo conjunto altura, extensão e largura. Entretanto, a estrutura externa também é um fator determinante no funcionamento do ambiente interno do corredor, o qual pode apresentar uma
entidade interna, como rios, canais, paredes, fossos, estradas, caminhos, fragmentos, etc, ou um ambiente interior. Esse conjunto, por
sua vez, influencia e é influenciado pelas condições e características da
matriz circundante.
A condição estrutural dos corredores ecológicos tais como a relação à forma - razão perímetro área, extensão, curvilinearidade, rupturas
e intersecções – e origem – corredores resultantes de distúrbios (estradas, linhas de transmissão, trilhas), remanescentes (resultante de desmatamento), ambientais (matas riparianas), regenerados (cercas vivas)
e introduzidos (quebra-ventos) são determinantes para o desempenho
das cinco funções ecológicas-chave: habitat, condução, filtro, fonte e
depósito. (FORMAN & GODRON, 1986; FORMAN, 1995).
No Brasil, a regulamentação dessas áreas se deu através do Projeto Corredores Ecológicos do Ministério do Meio Ambiente, o qual foi
introduzido na legislação brasileira em 1997, no âmbito do Programa
Piloto para a Proteção das Florestas Tropicais no Brasil. A concepção
adota pelo Ministério do Meio ambiente (MMA) trata os corredores ecológicos como “cordões de vegetação nativa que conectam fragmentos definidos como corredores ecológicos no Sistema Nacional de Unidades de
104
C onectando cidades e florestas …
Conservação – SNUC”, nas Terras Indígenas (TI) e as áreas de interstícios entre estas e as Unidades de Conservação (UCs), podendo pertencer ao domínio público ou privado (MMA, 2009).
Quando da sua criação a prioridade focou nos biomas da Amazônia e da Mata Atlântica, representando cerca de 25% das florestas tropicais úmidas do Brasil, dos quais cinco localizam-se na Amazônia (Corredor Central da Amazônia, Corredor Norte da Amazônia, Corredor Oeste
da Amazônia, Corredor Sul da Amazônia, Corredor dos Ecótonos Sulamazônicos) e dois na Mata Atlântica (Corredor Central da Mata Atlântica e Corredor Sul da Mata Atlântica ou Corredor da Serra do Mar).
A condição urbana: o conflito
O Projeto Corredores Ecológicos do Ministério do Meio Ambiente teve
como um dos principais critérios a integridade da paisagem natural. E
aqui começa um conflito de gestão.
Um dos muitos desafios ambientais que este artigo se propõe a
analisar trata da questão da vulnerabilidade ambiental resultante de
uma ocupação que, mesmo quando resultante de um planejamento territorial, ignora ou negligencia a importância da presença de áreas verdes como estruturas fundamentais à sustentabilidade ecológica urbana.
No que tange à Mata Atlântica, cuja área original era de 1.315.460
2
km , 15% do território nacional, dados mais atuais do INPE e SOS MATA
ATLÂNTICA, a partir da base de dados de 10 estados, o que corresponde
a uma área avaliada de 122.475.103 km2 (93% do bioma), no período
de 2005 a 20081, indicam que o desmatamento foi de 102.938 ha, com
uma média de 34.121 ha.ano-1. Comparativamente à área original, a
redução foi de 7,91%, o que equivale a 102.012 ha desmatados.
Vale lembrar que na área territorial em foco concentram-se 61% do
total da população brasileira, ou 112 milhões de habitantes dos 3.222
municípios do Brasil (58%), dos quais 2.294 têm a totalidade do território no bioma (IBGE, 2007; INPE, 2009).
De acordo com os últimos resultados da Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios (PNAD, 2009) há um déficit estimado de 8
milhões de moradias, provavelmente derivada do avanço do número de
famílias associado à demanda do número de habitantes por domicílio.
A isto se condiciona também, a infra-estrutura relacionada, correspondente ao saneamento básico, coleta de lixo, transporte e fornecimento
de água, energia e escolas.
Na deficiência de políticas públicas que visem a atender a essa
demanda, sobretudo das classes sociais menos favorecidas, a exemplo
do que a História tem demonstrado, a carência de moradia e da infraestrutura associada vem sendo parcialmente suprida a partir de diversos tipos de produção habitacional, desde autoconstruções em loteamentos regulares ou não, às produções públicas de habitação destinada
às classes de mais baixo poder aquisitivo.
105
rita de cássia mar tins montezuma et al .
3
Levantamento realizado
através de imagens dos
sensores CCD/CBERS – 2
e TM/LANDSAT 5, escala
1:50.000.
Em 1970 o Brasil possuía nove regiões metropolitanas. Em 2003
são registradas 26 unidades metropolitanas e a Região Integrada de
Desenvolvimento do Distrito Federal, cuja cidade principal tem um porte
metropolitano. O estado do Rio de Janeiro integra uma das 26 unidades composta desde 2002, segundo a Lei complementar no 105, por 17
municípios: Rio de Janeiro, Belford Roxo, Duque de Caxias, guapimirim, Itaboraí, Japeri, Magé, Nilópolis, Niterói, Nova Iguaçu, Paracambi,
Queimados, São Gonçalo, São João de Meriti, Seropédica, Mesquita e
Tanguá.
Na Região Metropolitana do Rio de Janeiro a maior parte do contingente populacional é composto por população de baixa renda, em sua
maioria vivendo em condições precárias. Segundo o Observatório das
Favelas (2007), na década de 1990 as favelas do município do Rio de
Janeiro apresentaram um crescimento populacional quatro vezes superior a média da cidade (2,65% e 0,67%, respectivamente), enquanto que
no ano de 2000 os moradores das favelas apresentaram uma taxa de
crescimento de 2,4% contra 0,74% da cidade, representando um total de
18,65% da população total do município, concentrados principalmente
nas zonas norte e oeste, sendo que nesta última o número dobrou de
72.182 residentes em 1991 para 144.394 em 2000.
Associe-se a isso a também crescente demanda de unidades habitacionais requerida por segmento social economicamente mais favorecido que tem resultado na expansão das cidades, em geral, por sobre
áreas valorizadas pela proximidade de áreas verdes livres e/ou Ucs.
O somatório desses processos resulta na franca expansão das
cidades e das metrópoles, constrangendo crescentemente as áreas verdes de paisagem natural. Paisagens essas focadas com exclusividade
no Projeto Corredores Ecológicos do MMA. Como pode ser observado
na tabela 1, só no estado do Rio de Janeiro foram perdidos em torno de
1000 ha de florestas, sendo este o 8º Estado mais desmatado dos 10
analisados (tabela 1).
Com a ampliação das cidades e metrópoles, via de regra de forma
desordenada, os espaços urbanos tornam-se precarizados. Na medida
em que sua condição geobiofísica não é avaliada, os processos ambientais inerentes às características próprias da morfologia espacial que
encerram são gradativamente alterados. Alteração na rede hidrográfica,
processos erosivos, respostas imediatas aos inputs pluviométricos extremos, ilhas de calor, poluição do ar e sonora, desconforto visual, dentre
outros, são parte das conseqüências observadas na substituição das
coberturas vegetais originais por novas estruturas, sem um planejamento territorial correto. E não é desnecessário lembrar que parte dessas condições são espacialmente associadas aos grupos sociais menos
favorecidos. Quanto menor a renda mais precária são as condições de
habitabilidade da população.
106
C onectando cidades e florestas …
Tabela 1: Remanescentes florestais da Mata Atlântica – ano base 2008.
Fonte: fundação SOS Mata Atlântica, adaptado.
UF
AL***
Área (ha)
Área bioma
Mata Atlântica (ha)
Bioma Mata
Atlântica (%)
Floresta (ha)
Floresta (%)
Mangue (ha)
Restinga (ha)
Remanescentes florestais totais (ha)
Remanescentes
florestais totais (%)
2.811.248
1.495.461
53
148.633
9,94
3.655
2.786
155.074
10,37
BA
56.557.948
18.875.009
33
1.581.985
8,38
56.903
22.285
1.661.173
8,80
CE**
14.637.598
910.698
6
60.616
6,66
17.180
74.953
152.750
16,77
4.616.591
4.614.841
100
475.600
10,31
7.048
25.677
508.325
11,01
ES
GO
34.127.08
1.051.422
3
37.649
3,58
37.649
3,58
MG
58.697.565
27.235.854
46
2.637.150
9,68
2.637.150
9,68
MS
36.193.583
6.366.586
18
360.215
5,66
360.215
5,66
PB*
5.691.967
667.185
12
68.763
10,31
68.763
10,31
PE**
9.929.608
1.808.779
18
222.162
12,28
12.920
PI
25.154.438
2.647.038
11
NM
NM
NM
PR
20.044.406
19.667.485
98
1.937.663
9,85
RJ
4.383.523
4.394.507
100
807.810
18,38
10.809
42.822
6.787
RN*
235.082
13,00
NM
NM
NM
33.507 100.514
2.071.685
10,53
861.441
19,60
11.992
51.038
18,84
2.519
1.008.144
7,33
5.364.113
343.867
6
32.259
9,38
RS
28.403.078
13.759.380
48
1.005.625
7,31
SC
9.565.484
9.591.012
100
2.151.732
22,43
11.931
79.695
2.243.358
23,39
SE***
2.214.690
1.197.878
54
90.069
7,52
22.254
1.807
114.129
9,53
24.873.203
16.918.918
68
2.305.583
13,63
23.992 206.279
2.535.854
14,99
SP
NM = Não Mapeado
Fonte SNE, ano base 2002
** Fonte SNE, ano base 2004
*** Fonte SNE, ano base 2005
A importância dos sistemas de espaços livres na matriz urbana e
na interface urbana-rural
Neste contexto, associando-se a condição social ao espaço físico, verifica-se que na área correspondente ao domínio do bioma Mata Atlântica, particularmente focando na região metropolitana do Rio de Janeiro,
observamos que a deficiência de áreas próprias à ocupação humana,
associada aos fatores sócio-econômicos específicos, tem resultado em
duas formas de concentração de áreas florestadas: a) Grandes áreas,
superiores a 1000 ha – situadas em áreas montanhosas, gradativamente
isoladas por áreas rurais e urbanas (Serra dos órgãos, Serra do Mar, p.
ex., figura 1), ou totalmente imersas em matrizes urbanas (Maciços da
Tijuca, Pedra Branca e Gericinó-Mendanha) e b) fragmentos de áreas
reduzidas, inferiores a 1000 ha, localizados em topos de morros bem
alterados ou em áreas planas, algumas periodicamente ou permanentemente alagáveis (figura 2).
107
rita de cássia mar tins montezuma et al .
Figura 1: corredor de biodiversidade da Mata Atlântica. Fonte: SOS Mata Atlântica (2009), adaptado.
Mata
Restinga
Mangua
Áreas Urbanas
Lei 11.428/00 da Mata Atlântica
Desmatamentos 2005-2006
108
C onectando cidades e florestas …
Figura 2: Cobertura vegetal na região metropolitana do Rio de Janeiro. Fonte: Fundação CIDE (2003).
109
rita de cássia mar tins montezuma et al .
Entretanto, o estado de preservação dessas áreas florestadas nem sempre correspondem àquelas recomendadas à preservação da biodiversidade. Mesmo as áreas de maior tamanho muitas vezes são grandes
mosaicos sucessionais, que espelham as marcas das múltiplas territorialidades que vêm se sobrepondo em face de sua condição de bem
comum: trilhas, santuários, estradas, sítios, áreas de lazer, de extrativismo de espécies medicinais, ritualísticas, ornamentais, caça, estudos
científicos, espaços religiosos, etc.
Como demonstram os dados da Fundação SOS Mata Atlântica
(2009), cerca de 76% dos fragmentos presentes no domínio do bioma
Mata Atlântica são inferiores a 10 ha. Em termos de preservação da
biodiversidade, constituem áreas de formação secundária com predomínio de espécies de borda, por conta da razão perímetro-área e exóticas, devido à condição de vizinhança e/ou a introdução a partir dos
múltiplos usos.
Some a isto os espaços urbanos da região metropolitana, os quais
contribuem de forma significativa com áreas verdes constituídas majoritariamente por espécies exóticas introduzidas para fins agrícolas, como
no caso das hortas urbanas e peri-urbanas (ARJONA et al., 2007). Atualmente estima-se que a agricultura urbana é praticada por cerca de
800 milhões de pessoas no mundo todo (FERREIRA & CASTILHO, 2007).
Além destas, a arborização de parques e ruas, jardins e quintais
contribuem para a composição verde urbana (SANTOS, 2006; LINDENMAIER & SANTOS, 2008; SIQUEIRA, 2008), refletindo os modelos paisagísticos que vigoraram desde o período colonial ou, simplesmente, as
múltiplas territorialidades urbanas derivadas de uma sociodiversidade
ampla. Na arborização da cidade do Rio de Janeiro, por exemplo, Santos (2006) registrou um total de 20 espécies nativas e quarenta exóticas em um levantamento realizado em 1.701 ruas da cidade do Rio de
Janeiro. As espécies mais comuns encontradas na maior parte da cidade
são as espécies exóticas Terminalia cattapa (amendoeira), Delonix regia
(flamboyant), Licania tomentosa (oiti), Pachira aquatica (munguba), Ficus
microcarpa (figueira), dentre outras, como já registrado por outros estudos em diversos bairros da cidade (SIQUEIRA, 2008).
Do ponto de vista ecológico há que se ressaltar que tais espécies além de representar um importante papel na regulação de fatores físico-químicos importantes no ambiente como maior infiltração da
chuva, amenização climática e redução de poluentes, em muitos casos
servem como habitat e de alimento tanto para parte da fauna urbana
como também para uma fauna transiente das áreas florestadas adjacentes (CIELO-FILHO & SANTIN, 2002). Nesse aspecto vale ressaltar que
a vegetação dos banhados muito comum nas áreas de baixada abriga
sazonalmente uma fauna migratória proveniente de áreas temperadas.
Estes fluxos bióticos entre diversas áreas desempenham um
importante papel na dispersão e polinização de espécies. Cielo Filho e
110
C onectando cidades e florestas …
Santin (2002) chamam a atenção para o fato de que a maioria das espécies arbóreas tropicais são alógamas obrigatórias e, se não apresentarem vetores de polinização e/ou dispersão de longo alcance espacial,
certamente serão extintas localmente. Em um levantamento realizado
por Ribas et al. (2005) em 15 ha na Floresta da Tijuca/RJ, foi observado
que 72% das espécies eram consideradas raras (com até 2 indivíduos) e
71% eram zoocóricas. A depleção da fauna nas florestas urbanas associada à ausência de áreas contendo essas espécies em um curto alcance
espacial as submetem a um alto risco de extinção.
A paisagem de Nova Iguaçu: entre maciços e quintais
Com uma altitude média de Nova Iguaçu é de 25 metros acima do nível
do mar e está nas coordenadas centrais 22°45’33’’Sul e 43°27’04’’Oeste
e clima tropical úmido com temperatura média anual de 21,8°C e precipitação média anual de 2.105,1 mm, as áreas verdes de Nova Iguaçu
estão distribuídas, basicamente, em três unidades de relevo: ao norte,
está a serra do Tinguá e a sudeste a serra de Madureira. Entre estas
serras encontra-se uma planície em que a paisagem pré-urbanização
era composta basicamente por brejos (BONDUKI, 2006; PINTO SOBRINHO, 2007).
Está situada em uma área constituída por duas principais bacias
hidrográficas: a do Rio Iguaçu e a do Rio Sarapuí que tem sua drenagem na Baía de Guanabara. Um dos grandes problemas de Nova Iguaçu
é a ocupação em áreas de preservação permanente (APPs) das margens
dos rios, córregos e canais; além de encostas de morros. Em relação
às unidades de conservação (UCs), a REBIO Tinguá, situada ao norte,
apresenta um razoável estado de conservação próximo as áreas rural/
urbana. Ao sul está o maciço do Mendanha/Gericinó. A menor distância em linha reta entre a REBIO e o Mendanha/ Gericinó é de cerca de
5 km. O Tinguá ocupa uma grande parte do município e o Mendanha/
Gericinó tem sua maior e mais preservada parte no Rio de Janeiro.
Atualmente, segundo a prefeitura, mais de um terço do município é
coberto por floresta atlântica e 67% são áreas de proteção ambiental.
No entanto, o estado de conservação destes remanescentes deve ser
considerado.
Como toda região metropolitana grande parte do município de Nova
Iguaçu possui uma ocupação concentrada nas partes mais baixas do
relevo. Dado seu processo histórico de formação, a paisagem do município guarda os relictos dos seus ciclos econômicos e suas resultantes ambientais expressos na composição de suas florestas e das áreas
que hoje constituem o sistema de espaços livres de ocupação: pastagens, campos antrópicos, matas degradadas e margens de rios ocupadas.
Associa-se a isso uma população de 755 mil habitantes, caracterizada
majoritariamente por ser jovem (53,65% entre 20 e 59 anos), com renda
média de até 3 salários mínimos (73%), segundo censo do IBGE de 2000.
111
rita de cássia mar tins montezuma et al .
A conjugação desses dados se revela em uma paisagem pouco verticalizada estruturalmente e com grande parte dos domicílios com 1 a 2
pavimentos, muitos dos quais sendo autoconstrução (figura 1). Entretanto, de um modo geral, pode-se considerar que a paisagem de Nova
Iguaçu é predominantemente verde: verde de quintais, dos maciços e das
inúmeras áreas onde o uso agrícola foi abandonado ou reduzido, com
muito pouco representado pela arborização dos seus parques e ruas.
A seguir, o quadro 1 e a figura 2 mostram as UCs de Nova Iguaçu
onde podem ser observados os principais conflitos sobre uso do solo em
Nova Iguaçu.
Como pode ser observado na figura 2, a área urbana do município ocupa preferencialmente a planície sedimentar, que se caracteriza
por ser a região de maior densidade ocupacional e maior verticalização.
Portanto, a ocupação urbana encontra-se no centro, interferindo diretamente no maciço do Mendanha/Gericinó. Os bairros com a população
de maior poder aquisitivo estão concentrados exatamente entre o começo
das encostas e a planície, na interseção do maciço com a área urbana.
Figura 1: a espacialização da ocupação humana no município de Nova Iguaçu, observados a partir das edificações e da densidade de ocupação. Fonte: Plano Diretor Participativo do município de Nova Iguaçu.
112
C onectando cidades e florestas …
Quadro 1: Áreas de proteção ambiental de Nova Iguaçu. Fonte: (BONDUKI, 2006. p.9)
Unidade
Legislação
Vegetação
Principais Problemas
Reserva Biológica
de Tinguá
Decreto no 97.780 de
23/05/1989
Federal Floresta de
Mata Atlântica
Desmatamento, Ocupações
Irregulares, Caça Ilegal,
Pressão urbana
Mendanha/
Serra de Madureira
Lei no 1.331 de
12/07/1988 Estadual
Floresta de Mata
Atlântica
Desmatamento, Ocupações
Irregulares, Caça Ilegal, Pressão
Urbana, Poluição por Esgotos.
Parque Municipal
de Nova Iguaçu
Lei no 6.001 de
05/06/1998 Municipal
Floresta de Mata
Atlântica
Ocupações Irregulares, Pressão
urbana, Desmatamento.
Área de Especial Interesse
Decreto no 6.383 de
Ambiental do Morro Agudo,
08/08/2001 Municipal
271,34ha
Resquícios de Mata
Atlântica secundária
Ocupações Irregulares,
Pressão Urbana, Desmatamento,
Queimada
APA Ilha do Tarzan,
870,12ha
Decreto no 6.383 de
08/08/2001 Municipal
Vegetação de Taboa
e Iguapé e alguns
resquícios de Mata
Atlântica secundária
Poluição por esgoto, Areal,
Desmatamento, Queimada
APA Morro de São José,
1102,76ha
Decreto no 6.489 de
06/06/2002 Municipal
Resquícios de Mata
Atlântica secundária
Desmatamento, Queimada,
Pressão Urbana, Ocupações
Irregulares
APA Rio D’Ouro,
3.112.466 ha
Decreto no 6.490 de
06/06/2002 Municipal
Resquícios de Mata
Atlântica secundária
Desmatamento, Queimada,
Ocupação Irregulares
APA Iguaçu-Tinguá,
3.5.331,975 ha
Decreto no 6.491 de
06/06/2002 Municipal
Resquícios de Mata
Atlântica secundária
Desmatamento, Queimada,
Ocupações Irregulares
APA do Rio São Pedro de
Jaceruba, 2.474.480 ha
Decreto no 6.492 de
06/06/2002 Municipal
Resquícios de Mata
Atlântica Municipal,
Desmatamento, Queimadas,
Ocupação irregular
APA Geneciano,
1.026,86 ha
Decreto no 6.493 de
06/06/2002 Municipal
Resquícios de Mata
Atlântica secundária
Desmatamento, Queimadas,
Ocupações irregulares
No caso do Tinguá, entre a REBIO e a área urbana, há uma ocupação
rural que ameniza um pouco os efeitos do impacto urbano mais drástico.
O que não quer dizer que uma ocupação menos densa não traga transformações. A parte sudoeste de Nova Iguaçu também pode ser considerada
rural. De todo modo, como podemos observar a seguir, as principais unidades vegetacionais de Nova Iguaçu são um mosaico de diferentes tipologias
sucessionais e que contém um conjunto de espécies que podem ser categorizadas como nativas, nativas manejadas, exóticas introduzidas e invasoras.
Mesmo em áreas com excelente desenvolvimento vegetacional há espécies
que demonstram a ação direta ou indireta do homem.
113
rita de cássia mar tins montezuma et al .
1) REBIO Tinguá
A Reserva Biológica (REBIO) Tinguá possui cerca de 26.000 ha com
cobertura vegetal predominantemente de floresta ombrófila densa. A
média de altura do extrato arbóreo é de 30 metros, principalmente
no fundo de vale em que lianas e epífitas estão presentes em quantidade significativa. Nas porções superiores das encostas, as áreas de
floresta secundária tardia são menos densas, atingindo de 20 a 25
metros (SOUZA, 2003). Uma proporção de 58,6% de nativas, 20,7% de
espontâneas (ruderais) e 20,7% de cultivadas foi apontada por Pinto
Sobrinho (2007). O estudo realizado por Jesus (2009), nos fragmentos
próximos às aberturas de dossel mantidas pela presença de dutos da
Petrobrás, confirmou a efetiva influência do efeito de borda nos remanescentes principalmente relacionadas ao tempo do distúrbio e distância da matriz. O que permite a hipótese de que o mesmo processo possa
ocorrer em outra área do mesmo maciço.
As espécies mais encontradas na área são: vinhático (Plathymenia
sp), o angico (Piptadenia macrocarpa), o jacaratirão (Miconia sp) e algumas espécies de canelas (Nectranda sp e Ocotea sp), os jequitibás (Cariniana legalis), os jatobás (Hymenaea altíssima), as sapucaias (Lecythis
pisonis), o pau-pereira (Geissospernium leave), a maminha de porca
(Zanthoxylum rhoifolium) e densas moitas de bambu (Bambusa sp) e o
bambu gigante (Dendrocalamus giganteus). Entre os cipós estão: o cipócruz (Arrabidea sp), cipó-cabloco (Davilla rugosa), cipó-cabeludo (Mikania setigera), cipó-imbé (Philodendron sp) e cipó-cravo (Thynanthus fasciculatus) (SOUZA, 2003). Jesus (2009) encontrou abundância de Euterpe
edulis, Guapira opposita, Gomidesia spectabilis, Myrceugenia myrcioides,
Psychotria Glaziovii, Miconia cubatanensis, Cupania oblongifolia, Bathysa
gymnocarpa, Duguetia microphylla e Licania sp1.
As espécies mais comuns nas áreas caracterizadas pela ação
antrópica são: garapas (Apuleia leiocarpa), embaúbas (Cecropia hololeica), jabuticabeiras (Myrciaria cauliflora), jameleiros (Syzingium jambolana), cambucazeiros (Marlierea edullis), fruta-pão (Artocarpus altilis)
e jaqueiras (Artocarpus heterphyllus). Nos morros baixos, predominam
esparsos arbustos de guaximba (Sida sp), alecrim (Heterothalamus sp),
araçá (Psidum sp) e aroeiras (Scinus terebenthifolius). Pequenos plantios
de banana (Musa paradisíaca) estão presentes no entorno das represas de captação de água do subsistema Serra Velha (SOUZA, 2003).
Pinto Sobrinho (2007) adiciona a estes, os cultivos para abastecimento
local de mandioca (Manihot sculenta), goiaba (Psidium guajava) e mamão
(Carica papaya), além de oleaginosas, em geral.
Entre espécies raras, Souza (2003) destaca 06 indivíduos de tapinhoã (Mezilaurus navalium), um tipo raro de canela. Presença confirmada por Lima (2002, apud PINTO SOBRINHO, 2007) que aponta ainda
outras espécies raras: Manilkara salzmannii (maçaranduba), Myrocarpus frondosus (óleo-pardo ou cabreuva), Aspidosperma ramiflorum
114
C onectando cidades e florestas …
(guatambu), Peltogyne angustiflora (pau-roxo), Teminalia januarensis
(mirindiba), Ocotea odorífera (canela-sassafrás), Copaifera lucens (óleocopaíba) e Pradosia kuhlmannii (casca-doce). Pinto Sobrinho (2007) e
Lima (2002) observaram ainda: Cedrella odorata (cedro), Copaífera langsdorffii (copaíba), Copaifera trapezifolia (copaíba-verdadeira), Cybistax
antisyphilitica (ipê-cinco-folhas), Malouetia arborea (esperta-roxa) e Stifftia chrysantha (candeia, rabo-de cutia). Virola gardineri (bicuiba verdadeira), Virola oleifera (bicuiba).
2) Floresta de Nova Iguaçu
Localizada na área da bacia do rio Guandu foi intensamente desmatada para a expansão agropecuária e urbana. Restaram apenas poucos
remanescentes da cobertura vegetal anterior, que era constituída por
floresta ombrófila densa e floresta estacional decídua, do domínio mata
atlântica. Estes remanescentes, cerca de 13.500 ha em 1998, estão atualmente restritos à área da Reserva Biológica do Tinguá (SALAMENE,
2007).
Salamene (2007) verificou no entorno do rio Guandu, secção Nova
Iguaçu, uma ocupação prioritariamente de várzeas e agricultura. Nesta
área, o rio corre em uma planície aluvionar tornando-se mais adiante
em uma várzea fluvial (Figura 2). A altitude varia entre 5 e 20 m. De
acordo com a lei n° 4.771, mata ciliar e as margens de rio,são áreas de
proteção permanente (APPs) destinadas à proteção integral, ou seja, é
proibida a sua alteração. Dependendo da largura do curso d’água, esta
faixa de proteção varia entre 30m até 500m. No entanto, é observável que no entorno do rio Guandu fragmentos remanescentes de mata
ciliar com menos de 1 ha são a maioria quase absoluta. Fragmentos
com mais de 3 ha são encontrados em número bem reduzido. Ecossistemas degradados como este formam um verdadeiro mosaico de ilhas
sendo altamente suscetíveis a distúrbios, sofrendo ainda os efeitos da
ação de efeito de borda e redução de conectividade na matriz em que
estão inseridos.
Na várzea fluvial, a vegetação bem característica de herbáceas
higrófilas, resistentes às inundações, apresenta grandes quantidades
de Typha sp (taboa), Costus spicatus (Jacq) Sw. (canaviera-do-brejo),
Panicum sp (capim-de-planta) e Eichhornia crassipes (Mart.) Solms
(gigoga). Nesta área, várzeas e pastagens predominam enquanto que o
uso urbano-industrial e agricultura têm baixa potencialidade por alagamento. Outro fator determinante é a presença de duas barragens da
CEDAE, uma em cada lado da ilha da CEDAE. Além das espécies herbáceas, foram encontradas as espécies arbóreas Cecropia hololeuca Miq.
(embaúba), Croton sp, Trema micrantha (L.) Blume (grandiuva), Colanum
Argenteum Dunak (joá-manso), Inga edulis (ingá), Guarea guidonia (carrapeta), Psidium grajava (goiabeira), as exóticas Mangifera indica (mangueira) e Artocarpus heterophyllus (jaqueira). A presença de pioneiras
115
rita de cássia mar tins montezuma et al .
e invasoras abre espaço para a hipótese de que os remanescentes vêm
sofrendo muitas pertubações (SALAMENE, 2007).
Na área de planície aluvionar, a agricultura é o uso predominante,
seguido das pastagens. Há na região grandes propriedades rurais produtoras de coco e banana. Um bom estado de preservação se relacionado ao entorno foi encontrado aqui. Próximo à ilha da CEDAE a espécie
mais encontrada foi a Guarea guidonea (carrapeta). A espécie Peltophorum dubium (canafístula) também é representativa. As demais espécies
apresentaram baixa representatividade.
3) Gericinó-Mendanha
Na serra do Gericinó-Mendanha há uma UC, com 1.100 ha, o Parque
Municipal de Nova Iguaçu, localizado em uma área conhecida como
Gleba Modesto Leal, na parte ocidental do maçico. A mata presente pode
ser classificada como floresta ombrófila densa, pertencente ao domínio
mata atlântica. Cerca de 60% do maciço ainda apresenta bom estado de
conservação, com os outros 40% altamente antropizados. As fazendas
que integravam a Gleba Modesto (D. Eugênia, São Felipe e Mata Fome)
no final do século passado, constituem na atualidade algumas das áreas
mais afetadas pela ação humana, além do entorno da estrada da Cachoeira. As áreas florestais mais preservadas encontram-se nos vales das
cabeceiras do rio D. Eugênia e em outros lugares com cotas altimétricas
mais elevadas e difícil acesso (NOVA IGUAÇU, 2001).
Na encosta norte do maciço, a ocupação seguiu o ritmo ditado
pelos grandes ciclos econômicos da área. A lavoura de cana de açúcar
no século XVI foi substituída pela cafeicultura, seguida então da citricultura até a exaustão dos recursos no século XX. Atualmente a paisagem
é constituída de pastagens e algumas pedreiras na base da serra (CORTINES et al. 2004.). Spolidoro (1998) confirma a presença de capinzais
relacionados à ação humana. A presença diferenciada de espécies na
composição florística foi verificada tanto em Nova Iguaçu (2001) quanto
por Cortines e colaboradores (2004), com uma maior diversidade nas
áreas menos antropizadas.
Nas pastagens e campos antropizados há uma dominância do
capim gordura (Melinis minutiflora) e do capim colonião (Panicum maximum). Nas formações pioneiras ou iniciais, encontram-se espécies ruderais e invasoras como (Lantana camara), mamona (Ricinus comunis),
picão (Bidens pilosa), oficial-de-sala (Asclepias curassavica), bunda de
nego (Thunbergia alata), o alecrim (Baccahris dracunculifolia), os assapeixes e os cambarás (Vernonia spp e Eupatorium spp). Em altitudes
mais altas: a candeia (Gochnatia polymorpha), as pixiricas (Miconia albicans e Leandra sp), além de Aegyphila sellowiana, Croton floribundus,
Croton urucurana, Schinus terebinthifolius, Trema micrantha e Cecropia
lyratiloba (NOVA IGUAÇU, 2001).
116
C onectando cidades e florestas …
Há ainda espécies introduzidas durante os grandes ciclos econômicos como o café (Coffea arabica), bananeira (Musa paradisiaca), limoeiros e laranjas (Citrus spp); árvores utilizadas na arborização urbana
e em reflorestamentos como o pau-rei (Pterigota brasiliensis), fedegoso
(Cassia grandis), sombreiro (Clitoria fairchildiana), flamboyant (Delorix regia), samã (Pithecellobium samam), eucaliptos (Eucalyptus spp) e
ciprestes. Algumas frutíferas: jambo-rosa (Syzygium jambos), goiabeira
(Psidium guajava), jaqueiras (Artocarpus integrifolia), abacateiro (Persea
gratissima), mangueiras (Mangifera indica); plantas ornamentais, principalmente nas proximidades do Casarão e ao redor das ruínas do clube
D. Felipe e há ainda trechos de antigas cercas vivas (Hibiscus sp, Malvaviscus sp, etc.), bem como dracenas (Dracena rubra, D. fragans, etc.)
e algumas palmeiras exóticas (NOVA IGUAÇU, 2001).
Nas formações secundárias iniciais e tardias, o jacatirão (Miconia
cinnamomifolia) e o angico (Pseudopiptadenia contorta) são dominantes.
Nos trechos de floresta secundária inicial, as árvores não ultrapassam
os 14 m, com dossel em torno dos 10m. Há pouca presença de bromélias e orquídeas. Estão presentes trepadeiras agressivas como o arranha-gato (Acacia lacerans). As árvores do estrato superior são: Sapium
glandulatum, Croton floribundus, Croton urucurana, Cybistax antisyphilitica, Erytroxylum pulchurum, Alseis floribunda, Pyschotria sellowiana,
Albizia polycephala e Siparuna arianae. Acima deste estrato encontrase: Alchornea triplinervia, Sparattosperma eucanthum, Senna multijuga,
Miconia cinnamomifolia, Tibouchina mutabilis, Pseudopiptadenia contorta
e Piptadenia gonoacantha, entre outras (NOVA IGUAÇU, 2001).
Além do jacatirão e angico, entre as espécies consideradas secundárias tardias estão presentes em estrato de 10 a 25 m: grande número
de palmeiras (Astrocaryum aculeatissimum, Geonoma sp e Euterpe edulis), além de Psychotria nuda, Posoqueria acutifolia, Rheedia gardneriana,
Piper rivinoides, Rollinia laurifolia, Annona cacans, Erytroxylum pulchurum, Sorocea guilleminiana, Dahlstedtia pinnata. Em um estrato arbóreo
intermediário: Apuleia leiocarpa, Astronium graveolens, Spondias lutea,
Alchornea triplinervia, Senna multijuga, Cassia ferruginea, Cordia trichotoma, Pterocarpus rohrii, Schizolobium parhayba, Andira fraxinifolia, Platycyamus regnellii, Myrocarpus frondosus, Cecropia hololeuca, Chorisia
speciosa, Gallesia integrifolia, Marlierea edulis, Inga edulis, Piptadenia
gonoacantha, Pouroma guianensis, Abarema brachystachya, Jacaratia spinosa, Euterpe edulis. Com as copas mais elevadas: Miconia cinnamomifolia, Pseudopiptadenia contorta, Pseudopiptadenia inaequalis, Pterocarpus
rohrii, Chorisia speciosa, Cabralea canjerana, Cedrela fissilis, Centrolobium robustum, Tachigali paratyensis , Astronium graveolens, Moldenhawera polysperma, Lecythis lanceolata, Geissospermum vellosii, Jacaratia
spinosa, Virola oleifera, Cabralea canjerana, Centrolobium robustum, Cariniana estrellensis, e plântulas do gênero Dicksonia (samambaiaçu). Aqui
as epífitas se mostram presentes (NOVA IGUAÇU, 2001).
117
rita de cássia mar tins montezuma et al .
Nas formações maduras, encontramos alturas entre 20 e 30 m. A
espécie com maior ocorrência de densidade é o palmito jussara (Euterpe
edulis). As espécies são praticamente as mesmas encontradas nas formações secundárias tardias, mas há uma redução no número de indivíduos de jacatirão, angico e pau-jacaré (Piptadenia gonoacantha). Nestas
matas mais preservadas, há maior ocorrência de espécies raras. Podese ainda, somar as seguintes espécies às já citadas: Dalbergia nigra,
Mezilaurus navalium, Hymenaea courbaril var. altssima, Virola gardneri,
Virola oleifera , Copaifera trapezifolia, Copaifera lucens, Cariniana legalis
e Cariniana estrellensis, Geissospermum vellosii, Enterollobium glaziovii,
Cedrela fissilis, Peltogyne angustiflora, Pradosia kullmanii, Pouteria cf.
torta (NOVA IGUAÇU, 2001).
Conectando a cidade aos maciços: uma proposta para a paisagem
Diante do exposto, verifica-se que as unidades vegetadas que identificamos na paisagem atual são resultantes de uma transformação do sistema natural pré-antrópico como também são produtos da percepção,
escolha e ação humana, as quais determinam as decisões políticas, econômicas e culturais que afetam as mudanças nos sistemas ecológicos.
Em assim sendo, cabem as seguintes questões:
Qual é o efeito da urbanização (e das cidades) na ecologia dos
organismos presentes nas UC e nas áreas vegetadas da cidade e no seu
entorno (área de influência)? Como se caracteriza o gradiente urbanorural-UCs em termos dos efeitos sobre os processos ecológicos?
Que mudanças podem ser detectadas na substituição espaço-temporal do uso do solo sobre as populações residentes na cidade e no seu
entorno? Que ações e processos humanos favoreceram o padrão atual
da paisagem?
A questão principal que colocamos a partir dessa reflexão é: que
paisagem queremos ter? Se há benefícios à ocupação humana, como
podemos sugerir ações que garantam a qualidade de vida urbana e ao
mesmo tempo minimizem o impacto dessa mesma ocupação sobre as
UC? A gestão do espaço geográfico do município não pode ignorar as
necessidades imediatas da sociedade que nele reside, mas, tampouco
pode omitir a importância da preservação dos sistemas de áreas verdes que compõe tais espaços e com os quais em diferentes graus esta
mesma sociedade se relaciona.
De acordo com o Plano Diretor Participativo da cidade de Nova
Iguaçu (2008), capítulo IV, artigo 11, a política territorial municipal terá
como objetivo “criar e resgatar a identidade do cidadão em sua relação
com a cidade, ampliando a auto-estima dos iguaçuanos” e estabelece
como um dos objetivos
(IV) identificar, qualificar e valorizar os marcos históricos e ambientais do município, estimulando sua visitação pelos cidadãos e por
turistas e
118
C onectando cidades e florestas …
(VII) reforçar a vocação ambiental como elemento de identidade do
município valorizando locais que são referência positiva para os
moradores da Cidade de Nova Iguaçu.
Portanto, consideramos como uma das ações possível é repensar o
modelo de intervenção urbana de modo a reduzir o fluxo de espécies
que comprometem a médio prazo o equilíbrio ecossistêmico das principais unidades vegetacionais do município, sobretudo aquelas que fazem
parte do Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
Na figura 4 podemos observar que a distância menor entre as duas
principais UCs do município, REBIO Tinguá e Parque Municipal de Nova
Iguaçu, compreende uma área de, aproximadamente, 298 km2 dos cerca
de 520 km2 da área total do município, envolvendo 27 dos 70 bairros (Tabela 1). Dois desses bairros constituem áreas não abairráveis,
segundo legislação municipal e correspondem a pouco mais de 192 km2.
Embora esteja inserida no segmento de maior densidade urbana
do município (figura 5), uma intervenção urbana que considerasse um
modelo de arborização de ruas, parques e jardins públicos, e o fomento
à população para a utilização de espécies nativas nos espaços privados,
tais como jardins, escolas e quintais, poderia constituir um corredor
arbóreo-arbustivo de forma a melhor conectar tais áreas à cidade, na
escala espacial do município, e, ao mesmo tempo, conectar ambientalmente o município ao seu contexto paisagístico, o qual está inserido na
área correspondente ao Corredor de Biodiversidade da Mata Atlântica.
Este corredor urbano poderia constituir um Sistema de Áreas Verdes de Nova Iguaçu, nos termos previstos nos artigos 126 e seguintes,
do Projeto de Lei s/n de 2008, que consiste na proposta para o novo
Plano Diretor do Município de Nova Iguaçu, que propõe a criação de corredores ecológicos que liguem as Unidades de Conservação existentes
no município. Sistema semelhante encontra-se previsto pelos artigos 22
e seguintes da Lei n. 2.668, de 03 de dezembro de 1997, que estabelece
as diretrizes de política municipal de meio ambiente.
Tendo em vista que não há nos Planos de Manejo das referidas
Unidades de Conservação nem na legislação ou planos urbanísticos
municipais uma definição acerca de quais Unidades de Conservação
existentes no município devem ser ligadas pelo corredor ecológico em
questão, os autores associaram as disposições legais existentes na
esfera federal (BRASIL, 2000)i e (BRASIL, 1996)ii, à estrutura e função da
paisagem para traçar a faixa de distância mais curta (FORMAN, 1995;
GRIMM, 2000; COLDING, et al., 2006) entre as fronteiras das Unidades de Proteção Integral (BRASIL, 2000) existentes no município, quais
sejam, ao norte, a Reserva Biológica do Tinguá (BRASIL, 1989)iii, e, ao
sul, o Parque Municipal de Nova Iguaçu (NOVA IGUAÇU, 1998)iv, em
largura de aproximadamente 5 km, com 76,487m2 de área.
119
rita de cássia mar tins montezuma et al .
i
BRASIL. Lei n. 9.985, de
18 de setembro de 2000.
“Regulamenta o art. 225, §
1o, incisos I, II, III e VII da
Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de
Unidades de Conservação
da Natureza e dá outras
providências”. DOU de
23/08/2002. Disponível em
<http://www.planalto.gov.
br/ccivil_03/Leis/L9985.
htm>. Acesso em 12 de abr.
de 2009. artigos 2º, inciso
XIX e 25. Artigo 25 “Art.
25. As unidades de conservação, exceto Área de
Proteção Ambiental e Reserva
Particular do Patrimônio
Natural, devem possuir uma
zona de amortecimento e,
quando conveniente, corredores ecológicos
§ 1o O órgão responsável pela
administração da unidade
estabelecerá normas específicas regulamentando a ocupação e o uso dos recursos da
zona de amortecimento e dos
corredores ecológicos de uma
unidade de conservação.
§ 2o Os limites da zona de
amortecimento e dos corredores ecológicos e as respectivas normas de que trata o §
1o poderão ser definidas no
ato de criação da unidade ou
posteriormente.”
ii
BRASIL. Resolução do
Conselho Nacional de Meio
Ambiente (CONAMA) n. 09,
de 24 de outubro de 1996.
Disponível em < http://www.
mma.gov.br/port/conama/
res/res96/res0996.html>.
Acesso em 21 de abr. de
2009.
iii
BRASIL, Decreto Federal
no 97.780 de 23/05/1989.
Cria a Reserva Biológica do
Tinguá.
iv
NOVA IGUAÇU, Lei Municipal
no. 6.001 de 05/06/1998.
Cria o Parque Municipal de
Nova Iguaçu.
Figura 4: Mapa das unidades de Conservação do município de Nova Iguaçu.
Em destaque a área proposto para o corredor arbóreo.
120
C onectando cidades e florestas …
Figura 5: Proporção das áreas vegetadas e não vegetadas do Município de Nova Iguaçu.
Em detalhe a mesma proporção de cobertura vegetal em dois bairros mais próximos a cada
um dos principais compartimentos geomorfológicos.
121
rita de cássia mar tins montezuma et al .
Tabela 1: Bairros abrangidos pelo corredor arbóreo entre a
REBIO Tinguá e o Parque Municipal de Nova Iguaçu.
Bairro
Danon
Palmares
Nova Era
Riachão
Rosa dos Ventos
Rodilândia
Jardim Pernambuco
Comendador Soares
Ouro Verde
Santa Eugênia
Moquetá
Austin
Vila Guimarães
Cacuia
Tinguazinho
Jardim Iguaçu
Cerâmica
Ponto Chic
Corumbá
Santa Rita
Rio Douro
Carlos Sampaio
Bairro da Luz
Jardim Alvorada
Área Não Abairrável
Área Não Abairrável
Adrianópolis
URG
Area km2
URG Comendador Soares
1,67
URG Comendador Soares
2,43
URG Comendador Soares
1,59
URG Austin
3,96
URG Comendador Soares
1,56
URG Austin
2,20
URG Comendador Soares
1,09
URG Comendador Soares
2,38
URG Comendador Soares
1,23
URG Centro
1,09
URG Centro
1,84
URG Austin
4,28
URG Austin
2,02
URG Austin
2,00
URG Austin
15,07
URG Centro
1,03
URG Posse
2,28
URG Posse
3,05
URG Vila de Cava
2,81
URG Vila de Cava
4,45
URG Tinguá, Adrianópolis, Rio D’Ouro e Jaceruba
8,43
URG Austin
2,14
URG Centro
2,73
URG Comendador Soares
1,68
URG Tinguá, Adrianópolis, Rio D’Ouro e Jaceruba 153,01
Gericinó-Mendanha
39,59
URG Tinguá, Adrianópolis, Rio D’Ouro e Jaceruba
32,28
Sobre o desafio…
A paisagem atual constitui-se em um mosaico de ações humanas pretéritas e presentes, em constante interlocução com todas as estruturas nela presente, e nem todas desejáveis. A gestão dessas áreas sob o
desafio da conservação da biodiversidade, na qual se incluem as dimensões tanto biológicas quanto humanas, requer da sociedade a ousadia de novas olhares sobre o espaço, de modo a propor ações que rompam o modelo vigente a fim de produzir paisagens que sejam saudáveis
tanto do ponto de vista social quanto ecológico, a exemplo do que já vem
sendo realizado pontualmente em várias localidades no mundo.
“Os fatores tecnológicos, culturais demográficos e sociais que determinaram os impactos de cada lacuna e superposição ao longo do tempo,
122
C onectando cidades e florestas …
podem nos ajudar a discernir as chaves das paisagens que temos hoje.
Ou seja, as razões pelas quais umas determinadas condições naturais
(clima, solo, relevo, … e vegetação potencial, tem acabando gerando umas
combinações de espécies e não outras” (TELLO,1999 apud BUXÓ, 2006)
Referências bibliogáficas
BUXÓ, R. Paisajes culturales y reconstrucción histórica de la vegetación.
Ecosistemas.2006/1. URL:http//www.revistaecosistemas.net/articuloasp?/
d=408&ld_Categoria=2&tipo=portada
COLDING, J, et. All. Incorporating Green-Area User Groups in Urban Ecosysten
Management. In: Ambio, Vol. 35, No. 5, August, 2006. Royal Swedish
Academi of Sciences, 2006 , p. 240-242.
FERREIRA, R.J. & CASTILHO, C.J.M. Agricultura urbana: discutindo algumas
das suas engrenagens para debater o tema sob a ótica da análise espacial.
Revista de Geografia. UFPE-DCG/NAPA, v. 24, n. 2, mai/ago. P. 6 – 23. 2007.
FORMAN, R.T.T. GODRON, R. Landscape Ecology. John Wiley & Sons, Inc. New
York. 1986.
FORMAN, R.T.T. Land Mosaics. Cambridge University Press, Great Britain1995.
GRIMM, N. et. Al.. Integrated Approaches to Long-Term Studies of Urban Ecological
Systems. In: BioScience, Vol. 50, No. 7, Julho, 2000. American Institute of
Biological Sciences, 2000.
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. 2007. Censo
Populacional 2005. IBGE. Rio de Janeiro.
SOSMATA ATLÂNTICA. Atlas dos remanescentes florestais da mata atlântica –
período 2005 – 2008. http://mapas.sosma.org.br/site_media/download/
atlas%20mata%20atlantica-relatorio2005-2008.pdf, consultado em
12/10/2009.
OBSERVATÓRIO DAS FAVELAS. Legado social do XV jogos pan-americanos Rio
2007- diagnóstico social e esportivo de 53 favelas cariocas. In: http://www.
observatoriodefavelas.org.br/observatoriodefavelas/includes/publicacoes/04
e3877d1c06cddaf96d26d9d7b67ebf.pdf, consultado em 12/10/2009
LINDENMAIER, D.S. & SANTOS, N.O. Arborização urbana das praças de
Cachoeira do Sul – RS – Brasil: fitogeografia, diversidade e índices de áreas
verdes. Pesquisas, Botânica, n. 59. p. 307-320. São Leopoldo. 2008.
MURCIA, C. Edge effects in fragmented forests: implications for conservation. In:
Tree. Vol 10, n. 2, february, 1995. P. 58
RIBAS L.A.; MONTEZUMA, R.C.M; OLIVEIRA, C.M.R.; IMBROISI, E.; BARROS,
F.A., GALVÃO, M.N. & SCHNEIDER, S.M. Urban Forest remnants diagnosis
for implantation of the frei vellozo corridor – FEEMA/PDBG. Anais do ATBC,
2005.
SANTOS, A.R. Ecologia urbana de plantas nativas e exóticas no Município do Rio
de Janeiro. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Tese de Doutorado,
186 p.
SIQUEIRA, J.C. Fundamentos de uma biogeografia para o espaço urbano.
Pesquisas, Botânica, n. 59. p. 191-210. São Leopoldo. 2008.
123
rita de cássia mar tins montezuma et al .
Rita de Cassia Martins Montezuma
Graduada em Ciências Biológicas pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(uerj ) em 1985. Mestre em Ecologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro
(ufrj ), curso concluído em 1997, e doutora em Geografia pela mesma instituição
(2005). É professora assistente da puc -Rio, com atuação em ensino e pesquisa em
cursos de graduação e pós-graduação. Escreveu artigos em dois livros: Aspectos
estruturais da paisagem da Mata Atlântica em áreas alteradas por incêndios florestais e As comunidades vegetais das restingas de Macaé.
[email protected]
Elisa Sesana
Mestranda do programa pós-graduação em Geografia PUC-Rio
Henrique Togashi
Mestranda do programa pós-graduação em Geografia PUC-Rio
Jacqueline Carlile
Mestranda do programa pós-graduação em Geografia PUC-Rio
Marcelo Campos
Aluno de graduação dept.Geografia PUC-Rio
Paula Alves Duarte
Mestranda Pós-graduação UERJ
Ines Aguiar de Freitas
Professora dept. Geografia da UERJ
Luiz Felipe Guanaes Rego
Dr. Em Recursos Naturais – Universidade Albert Ludwigs Freiburg -Alemanha
124
C onectando cidades e florestas …
Download

Conectando cidades e florestas: o caso do