UNIVERSIDADE ESTÁCIO DE SÁ IOLANDO LEÃO DA COSTA FILHO A IMPLEMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO IF SUDESTE MG – CAMPUS JUIZ DE FORA RIO DE JANEIRO 2011 IOLANDO LEÃO DA COSTA FILHO A IMPLEMENTAÇÃO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO IF SUDESTE MG – CAMPUS JUIZ DE FORA Dissertação de Mestrado apresentada à Universidade Estácio de Sá como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Educação. Orientadora: Profª Drª Wania Regina Coutinho Gonzalez RIO DE JANEIRO 2011 C837 Costa Filho, Iolando Leão da A implementação da educação profissional integrada ao ensino médio no IF SUDESTE MG – Campus Juiz de Fora./ Iolando Leão da Costa Filho. – Rio de Janeiro, 2011. 114 f. ; 30 cm. Dissertação (Mestrado em Educação)– Universidade Estácio de Sá, 2011. 1. Educação profissional. 2. Ensino Médio. 3. Política Pública. I. Título. CDD 373.011 DEDICATÓRIA A minha querida filha Carolina Villela de Andrade Leão, com nove anos me deu força e incentivos. À minha mãe, que sempre acreditou na educação como forma de libertação. Ao meu falecido pai, em sua lembrança. AGRADECIMENTOS Agradeço a toda minha família, especialmente a minha filha Carolina Villela de Andrade Leão. À Profa. Dra. Wania Regina Coutinho Gonzalez, orientadora desse trabalho, pelo apoio, incentivo e valiosos ensinamentos. Agradeço aos professores da banca: Profa. Dra. Inês Ferreira de Souza Bragança – UNESA. Prof. . Dr. Jorge Cardoso Messeder – IFRJ. A todos os professores do Programa de Pós-Graduação do Mestrado em Educação da UNESA. Aos meus colegas de curso: Haroldo, Sonia, Luciano, Eduardo, Paulo, Derli, Emília, Máximo, Romário, Teresa, Elpídio, Alberto e Solange. A todos os sujeitos dessa pesquisa: Diretores e Coordenadores do IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. A Rosa Maria Gouvêa Cunha, pela ajuda na coleta dos dados. Agradeço ao Mestre Prof. Haroldo Freitas Ritti, pelo apoio, colaboração, incentivo e pelas longas discussões das concepções e princípios da integração e da politecnia. Agradeço aos Gestores e Professores do IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. Agradeço ao Prof. Juarez de Andrade, pela colaboração e apoio. "Educar é crescer. E crescer é viver. Educação é, assim, vida no sentido mais autêntico da palavra “. (Anísio Teixeira) RESUMO A presente pesquisa teve como objetivo analisar a implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF/Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, nos cursos de Edificações, Eletromecânica, Eletrotécnica, Informática, Mecânica e Metalurgia, tendo como referência as concepções e princípios da integralidade contidos no Documento-Base do Ministério da Educação/Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (2007). Para isso, fez-se um estudo sobre as políticas voltadas para o ensino médio e a educação profissional, principalmente a LDB, Decreto no. 2.208/97 e Decreto no. 5.104/04 e o Documento – Base do MEC/SETEC (2007). O referencial teórico pesquisado, que constitui a base do trabalho, contribuiu para elucidar as concepções e princípios do ensino médio integrado, utilizando a produção bibliográfica dos autores Gaudêncio Frigotto, Marise Ramos, Maria Ciavatta e Acácia Kuenzer e outros. Estes fundamentos forneceram dados e informações para a compreensão da política norteadora do governo, que serviu de base para as análises. Justifica-se essa pesquisa, pois seus resultados podem subsidiar as análises e discussões das práticas pedagógicas das escolas que oferecem essa modalidade de ensino integrado. A metodologia da pesquisa envolveu a análise documental e entrevistas semiestruturadas com nove gestores responsáveis pelo processo de implementação dos cursos integrados. Os resultados obtidos apontam que a proposta da integração entre o ensino médio e a educação profissional não está sendo efetivada. Observou-se que os gestores responsáveis pela integração não se apropriaram da proposta norteadora e que na prática a formação técnico-profissional se mantém distante da integração e se aproxima mais do ensino profissionalizante, instituído pela Lei no. 5.692/71, tanto nos seus efeitos quanto pelo seu conteúdo. Palavras-chave: Educação profissional; Ensino médio integrado; Política pública. ABSTRACT The following research aimed to analyze the implementation of professional technical education at the High School level integrated with High School itself at the IF/Sudeste MG – Juiz de For a Campus, encompassing the courses of Construction, Electromechanics, Electrotechnics, Informatics, Mechanics and Metallurgy. As a reference, the conceptions and principles of integrality in the Ministry of Education/Technological and Professional Education Secretary’s base-Document were used. As means to investigate that, High School and professional education-directed policies were studied, mainly the “LDB”, Decree num. 2.208/97 and Decree num. 5.104/04 and the MEC/SETEC’s Base-Document (2007). The theoretical references contributed to elucidate the integrated High School’s conceptions and principles, using bibliographical production from Gaudêncio Frigotto, Marise Ramos, Maria Ciavatta, Acácia Kuenzer amongst others whose fundaments provided this study with data and pieces of information for the comprehension of the government’s conducting policy, on which the analysis were based. This research is justifiable, once its results can support analysis and discussions on the pedagogical practices of the schools who offer this integrated modality of education. The research’s methodology involved document analysis and semistructured interviews conceded by nine directors who are responsible for the process of implementation of the integrated courses. The results suggest that the integration proposal between High School and the professional education has not been concretized. It was observed that the leaders responsible for the integration have not effectively used the conducting proposal. Yet, in practical terms, the techno-professional formation is somehow distant from the integration and it is closer to the professionalizing education – either in its effects or for its content – instituted by law num. 5.692/71, Keywords: Professional education; Integrated High School; Public policy LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ANPED – Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação BID - Banco Interamericano de Desenvolvimento BIRD - Banco Internacional para a Reconstrução e Desenvolvimento CEB - Câmara de Educação Básica CEFET - Centro Federal de Educação Tecnológica CNE - Conselho Nacional de Educação CNI - Confederação Nacional das Indústrias CTU - Colégio Técnico Universitário DCN - Diretrizes Curriculares Nacionais EM - Ensino Médio EMI - Ensino Médio Integrado EMIEP - Ensino Médio Integrado à Educação Profissional ETP - Ensino Técnico Profissional FAPEMIG - Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais FIESP - Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FMI - Fundo Monetário Internacional FUNDEB - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação IF - Instituto Federal IFET – Instituto Federal de Educação, Ciências e Tecnológica INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas educacionais LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional MEC - Ministério da Educação MTE - Ministério do Trabalho e Emprego PDE - Plano de Desenvolvimento da Educação PEA - População Economicamente Ativa PISM - Programa de Ingresso Seletivo Misto da UFJF. PLANFOR - Plano Nacional de Formação PPP - Projeto Político-Pedagógico PROEP - Programa de Expansão da Educação Profissional OIT - Organização Internacional do Trabalho ONG - Organização Não Governamental UFJF - Universidade Federal de Juiz de Fora UNESCO - Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura SEMTEC - Secretaria de Educação Media e Tecnológica SENAC - Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial SENAI - Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial SENETE - Secretaria Nacional do Ensino Técnico SETEC - Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica SEMTEC - Secretaria de Educação Media e Tecnológica SUMÁRIO Introdução ............................................................................................................................... 10 1 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA PERSPECTIVA HISTÓRICA ......................... 17 1.1 A LDB: PANORAMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E DO ENSINO MÉDIO...................................... 17 1.2 O DECRETO NO. 2.208/97: A REFORMA DO ENSINO PROFISSIONAL .............................................. 22 1.3 O DECRETO NO. 5.154/04: NOVA POSSIBILIDADE DO ENSINO MÉDIO INTEGRADO....................... 29 1.4 DOCUMENTO – BASE MEC/SETEC (2007) .......................................................................................... 33 1.4.1 Políticas de integração do ensino médio com a educação profissional ......................................... 34 1.4.2 Concepções e princípios do ensino médio integrado..................................................................... 40 2 AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL ..................... 48 2.1 AS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO: VISÃO CIVIL DEMOCRÁTICA E A VISÃO PRODUTIVISTA................ 48 2.2 A INTEGRAÇÃO ENTRE O ENSINO MÉDIO E A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA VISÃO CIVIL DEMOCRÁTICA ................................................................................................................................ 49 2.3 A EDUCAÇÃO TÉCNICO-PROFISSIONAL NA VISÃO PRODUTIVISTA .................................................... 58 3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO IF SUDESTE MG – CAMPUS JUIZ DE FORA: A IMPLANTAÇÃO NA TEORIA E NA PRÁTICA ......................................................................................... 70 3.1 O trajeto histórico da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora................................................................................................. 73 3.2 A avaliação dos gestores e os princípios da integração .................................................................... 79 3.2.1 Formação humana integral: o direito a uma formação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão ................................................................................................................. 79 3.2.2 Trabalho. ciência, tecnologia e cultura como categorias indissociáveis da formação humana ..... 82 3.2.3 O trabalho como princípio educativo............................................................................................. 86 3.2.4 A pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção de conhecimento........................ 90 3.2.5 A relação parte – totalidade na proposta curricular ...................................................................... 92 3.2.6 Os obstáculos e as conquistas da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora......................................... 97 CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 102 REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 106 10 INTRODUÇÃO Essa pesquisa teve com inspiração o filme “Tempos modernos” (1936) do cineasta britânico Charles Chaplin e o artigo “Estado e reforma educacional no Brasil: Um estudo de caso” (2006), dos autores Wilson Carlos Rangel Coutinho e Lílian Maria Paes de Carvalho Ramos. No filme, o personagem central Carlitos, vive um operário desempregado tentando sobreviver à fome e a crise de 1929 nos Estados Unidos. Chaplin faz uma crítica à sociedade industrial americana, baseada no sistema de linha de montagem e no trabalho especializado. No artigo, os autores discutem as principais reformas sofridas pela educação profissional de nível médio e abordam as mudanças do perfil profissional na nova forma de organização da produção e do trabalho: Durante boa parte do século passado, as concepções tayloristas/fordistas para a produção industrial determinaram certo perfil profissional que, por suas características, implicava uma formação perfeitamente adequada aos sistemas econômicos e sociopolíticos vigentes. A mais fiel imagem desse apertador de parafusos, construída por Chaplin em “Tempos Modernos”, mostra exatamente aquilo que ele era: mais uma peça na engrenagem industrial. Um trabalhador com visão tão acanhada do processo produtivo e tão habituado a agir assim, teria dificuldades para compreender as relações sociais em suas múltiplas complexidades. (COUTINHO E RAMOS, 2006, p.1). Para Coutinho e Ramos (2006), as novas exigências do capital, sempre em busca de ganhos produtivos, buscam agora um trabalhador com características mais abrangentes como: maior capacidade intelectual, (polivalente), sensível à aprendizagem permanente e uma compreensão mais sistêmica do processo produtivo. Esse descompasso entre as demandas produtivas e sociais mais amplas e os limites da educação, aponta para a configuração de novas políticas públicas educacionais capazes de contrapor esta nova disputa. Para Frigotto (1998), trata-se de uma educação e formação que atendam as atividades do mercado, muito valorizada em nossa sociedade. Com o intuído de desenvolver habilidades básicas no plano de conhecimento, das atitudes e dos valores, produzindo competências para a gestão da qualidade, para a produtividade e competitividade na busca da sonhada empregabilidade. O perfil do “apertador de parafusos”, representado por Carlitos, do filme Tempos modernos (1936), de trabalhos repetitivos e explicitamente ordenado não serve mais. Para Deluiz (1996), o avanço tecnológico estabelece tarefas indeterminadas pelas possibilidades de usos múltiplos dos próprios sistemas (novos conceitos de produção) e as decisões dependem 11 como as informações são obtidas por redes informatizadas. O trabalho agora é arbitrado, onde o profissional deve: diagnosticar, prevenir, antecipar, decidir e interferir dentro do sistema de produção. O modelo em questão exige novas qualificações do trabalhador e a elevação dos níveis de escolaridade. Essa pesquisa nasceu da preocupação com a formação do profissional técnica de nível médio, no diz respeito à forma integrada, proposta pelo Decreto no. 5154 (BRASIL, 2004a), que possibilitou a integração do ensino médio ao ensino técnico, sob uma base unitária de formação geral, voltada para a formação de cidadãos aptos no entendimento da realidade científica, tecnológica, cultural, econômica e social, capazes de inserir-se no mundo do trabalho, atuando de forma ética e competente. O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais – IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora (antigo Colégio Técnico Universitário – CTU, da UFJF), oferecia até ano de 1997, seis cursos técnicos industriais na modalidade integrada, conforme previa a LDB – Lei no. 5692/71, porém, diferente da concepção do atual Decreto no. 5154/04 (BRASIL, 2004a), mantendo uma grade curricular em que o conteúdo especifico se sobrepunha ao conteúdo propedêutico. Em 1997, o Governo Federal implantava uma nova reforma no ensino técnico com a aprovação do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a). Observa-se que nessa reforma, o governo põe fim à modalidade integrada e determinando para a educação profissional de nível técnico uma organização curricular própria e independente do ensino médio. Em 2004, o governo Lula, atendendo ao compromisso de sua campanha, revoca o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) e aprova o Decreto no. 5154/04 (BRASIL, 2004a), restabelecendo a possibilidade da reintegração curricular dos ensinos médio e técnico. Este decreto levou ao IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora a iniciar um processo de discussão e análise objetivando as possibilidades de oferecer uma educação técnica profissional na forma integrada entre o ensino médio e técnico. Após vários debates e discussões, com argumentações favoráveis e contrárias, praticamente em todas as esferas da comunidade da instituição, foi aprovado pela Congregação a implantação dos cursos técnicos integrados. Como professor do IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora há 25 anos vivenciei todas essas transformações e participei das discussões sobre o tema no âmbito dos órgãos colegiados. Nessa atmosfera e contexto pude observar, ao termino de todo o processo, que a idéia geral que levou a implantação dos cursos técnicos integrados ou ensino médio integrado se resumiu na busca da formação integral do jovem, compreendendo a educação geral e 12 educação profissional como parte constitutiva do mesmo processo formativo, visando romper com a dicotomia entre o trabalho manual e o trabalho intelectual. Após dois anos de implantação do ensino médio integrado, podemos observar a heterogeneidade de entendimento de professores com relação a formação curricular integrada. Surge uma inquietação sobre o perfil do aluno que vamos formar. Esse egresso apresentará ou não uma formação integral prevista na essência do novo decreto. Os conhecimentos propedêuticos e profissionalizantes estão sendo integrados ou não. E por fim como o corpo docente entende e como tem se mobilizado para o entendimento dessa nova modalidade de ensino. Nos anos de 1990, foram implantadas políticas públicas na área da educação profissional, como a Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional (LDB no. 9.394/96) (BRASIL, 1996) e Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) que representaram uma transformação na educação profissional de nível médio com o objetivo de atender as novas modificações do processo de produção. Os projetos educacionais são subsidiados pelos modelos econômicos de visão neoliberal que se caracterizaram em fragmentar a educação profissional, tornando-a como um processo formativo independente do ensino médio. Criando e materializando um sistema dual: o propedêutico e o técnico-profissional. O ensino técnicoprofissional foi direcionado para o mercado de trabalho (RAMOS, 2007). A partir de 2004, na tentativa de superar esse modelo implantado pelo Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) surge uma proposta política de ensino médio, orientada pela construção de um projeto que supere a dualidade entre formação específica e formação geral e que desloque o foco dos seus objetivos do mercado de trabalho para a pessoa humana, tendo como dimensões indissociáveis o trabalho, a ciência, a cultura e a tecnologia. Expressa no Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a), a oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, cria novas expectativas para que os elementos curriculares mantenham uma relação entre a teoria e prática, propiciando ao sujeito mais condições frente às mudanças e as transformações do mundo tecnológico (BRASIL, 2007). Em 2008 o IF Sudeste MG - Campus Juiz de Fora implementou o ensino médio integrado em seis cursos técnicos, não havendo, no espaço de três anos, nenhum tipo de avaliação desse processo. Empiricamente, observaram-se dúvidas sobre a realidade da integração partindo tanto dos docentes como dos alunos. Surge então o problema que motivou a presente pesquisa: tomando por base as leituras sobre a temática do ensino médio integrado, seus princípios e fundamentos, buscou-se investigar a realidade da integração na instituição. 13 Para tanto, tem-se como objetivo dessa pesquisa a análise da implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF/Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, na percepção dos gestores responsáveis pelo processo de implementação dos cursos integrados de Edificações, Eletromecânica, Eletrotécnica, Informática, Mecânica e Metalurgia, tomando por base as concepções e princípios da integralidade contidos no Documento-Base do Ministério da Educação/Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2007). Essa pesquisa justifica-se pela necessidade de experimentar os conhecimentos e os destinos seguidos pelas instituições e de subsidiar gestores públicos na implementação de políticas de integração do ensino médio com a educação profissional técnica. Deste modo os dados dessa pesquisa podem revelar: os pontos frágeis, as convergências e divergências entre a concepção de formação integral e os seus pressupostos norteadores com a prática efetiva no cotidiano da escola e as dificuldades encontradas para a efetivação da integração. No IF Sudeste – MG, seus resultados poderão subsidiar as discussões e reflexões sobre a implementação da referida modalidade de ensino, levando a um processo de (re)avaliação e reflexão sobre suas práticas pedagógicas e reabrindo as discussões sobre as concepções e objetivos do ensino integrado, tão questionado pela comunidade escolar. Para atingir o objetivo proposto nessa pesquisa, utilizou-se como paradigma a teoria crítica, com uma abordagem qualitativa, pois se tem como finalidade, conhecer a visão dos sujeitos da pesquisa, por se entender que essa perspectiva de estudo pode nos fornecer uma visão mais detalhada e planejada do problema investigado por meio da interação com os sujeitos e a análise de todo o contexto proposto. Para Lüdke e André (1986), as características básicas desse tipo de investigação são o ambiente natural, como sua fonte direta de dados, sendo o pesquisador como seu principal instrumento; os dados coletados são predominantemente descritivos, a preocupação com o processo é maior do que o produto; o significado que as pessoas dão às coisas e à sua vida são focos de atenção especial pelo pesquisador e as análises dos dados tende a seguir um processo indutivo. A abordagem crítica é essencialmente relacional, procura investigar o que ocorre nos grupos e instituições relacionando as ações humanas com a cultura e as estruturas sociais e políticas, tentando compreender como as redes de poder são produzidas, mediadas e transformadas. Parte do pressuposto de que nenhum processo social pode ser compreendido de forma isolada, como uma instância neutra acima dos conflitos ideológicos da sociedade. Ao contrário, esses processos estão sempre profundamente vinculados às desigualdades 14 culturais, econômicas e políticas que dominam nossa sociedade (ALVES – MAZZOTTI, 1999). Nossa investigação se estruturou primeiramente com uma pesquisa bibliográfica, retomando historicamente a questão da educação profissional de nível médio no Brasil. Esse estudo objetivou conhecer as relações entre o ensino médio e a educação profissional. A pesquisa procura dar mais prioridade ao período que se inicia com a promulgação da LDB no. 9.394/96 (BRASIL, 1996), o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) o qual desarticula e impossibilita a educação geral e a formação profissional de nível médio, até a sua revogação com o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) que retoma essa possibilidade de formação integrada e sua implantação no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. Nessa pesquisa bibliográfica realizou-se uma análise dos principais documentos relacionados ao ensino médio e a educação profissional, como a Lei no. 9.394/96 (BRASIL, 1996), o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), com o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) e o Documento – Base Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio – MEC/SETEC (BRASIL, 2007). Além das análises dos documentos oficiais, também foi realizada uma pesquisa de campo, que constou da coleta de dados através de entrevistas semi-estruturadas1 dirigidas a nove gestores, responsáveis pela implementação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. A escolha da instituição ocorreu pelos seguintes critérios: primeiramente por ser a principal instituição da rede pública federal de educação técnica da Zona da Mata e Campos das Vertentes de Minas Gerais, em seguida, procuramos eleger uma instituição que já havia ofertado cursos técnicos de nível médio juntamente com a educação geral e por fim contemplamos uma instituição que ofertasse além do ensino médio integrado o curso técnico subsequente. Para Lüdke e André (1986), é grande vantagem da entrevista sobre outras técnicas. Na entrevista a captação, da informação desejada, é imediata e corrente com qualquer tipo de informante e sobre os mais variados tópicos. A entrevista permite correções, esclarecimentos e adaptações das informações desejadas. A entrevista semi-estruturada é a mais adequada para trabalho de pesquisa que se faz em educação por se aproximar mais dos esquemas mais livres e menos estruturados. No processo de trabalho de campo foi aplicado um roteiro de entrevista para os gestores dos cursos envolvidos na integração. Cada entrevista durou em média de 1h e 20 1 Roteiro da entrevista semi-estruturada constante do APÊNDICE A – p. 98. 15 min. às 2h e 15 min., totalizando em média 14 horas de gravação. As gravações foram transcritas integralmente e os recortes necessários procurando-se categorizar os temas e suas relações de acordo com o objetivo da pesquisa. O anonimato dos entrevistados foi negociado e mantido para que os gestores se sentissem mais seguros e motivados para responder ao roteiro de entrevista. Os dados coletados no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, através das entrevistas, foram confrontados com as concepções e princípios do documento base do MEC/SETEC (BRASIL, 2007): “Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrado ao Ensino Médio”. Este documento oficial orienta, apóia e estimula o ensino médio integrado à educação profissional por considerar a oferta que apresenta os melhores resultados pedagógicos, considerando a realidade concreta no contexto dos arranjos produtivos e das vocações sociais, culturais e econômicas locais e regionais. As categorias analisadas foram apropriadas do Documento Base (BRASIL, 2007), constante do item intitulado “Concepções e Princípios2”: - Formação humana integral, Trabalho, ciência, tecnologia e cultura como categorias indissociáveis da formação humana, O trabalho como princípio educativo, - A pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção do conhecimento e - A relação parte-totalidade na proposta curricular. Essa dissertação foi estruturada em três capítulos, sendo que o primeiro compreendeu a retomada histórica e documental da educação profissional, enfatizando os períodos da LDB no. 9.394/96 (BRASIL, 1996), o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) e o documento base do MEC/SETEC (BRASIL, 2007), que orienta a oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. Estes documentos representaram as bases da atual reforma do ensino profissionalizante técnico no Brasil. No segundo capítulo discutiram-se as principais concepções e projetos de educação profissional técnica de nível médio integrado ou não ao ensino médio. São debatidas a relação trabalho e educação e os elementos conceituais fundamentais para compreensão da proposta norteadora do ensino médio integrado. Analisaram-se duas visões: a civil democrática que idealiza um projeto que supere a dualidade entre a formação geral e a formação especifica, portanto defende uma escola unitária, centralizando na pessoa humana os sujeitos dos conhecimentos e a visão produtivista, que entende que a educação profissional 2 As reflexões constantes desse item se baseiam nos artigos publicados no livro “Ensino Médio Integrado: concepção e contradições”; organizado por Frigotto, Ciavatta, Ramos (2005) e em texto de Ramos (2007), intitulado “Concepção do Ensino Médio Integrado à Educação Profissional”. 16 deve ser separada da educação geral e foca a aprendizagem dos sujeitos no mercado de trabalho. Estas concepções e projetos servirão de base para as análises das entrevistas do terceiro capítulo. O terceiro capítulo compreende uma síntese dos resultados da investigação, analisando-os à luz do objetivo da pesquisa e do referencial teórico utilizado. É composto pela análise dos documentos produzidos pelo ex-CTU/UFJF e atual IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, constituídos por atas do Conselho de Unidade, Relatório de Gestão ano 2009, Seminário “desafios da Integração”, Resolução no. 004/2007 e o anteprojeto “Implantação dos Cursos de Educação Profissional de Nível Médio Integrado no CTU/UFJF”, no intuito de conhecermos os conceitos e os planejamentos para a educação profissional no interior da instituição. Essa análise resultou nos primeiros dados da implementação do ensino médio integrado na instituição estudada e juntamente com os estudos da proposta do documento base do MEC/SETEC (BRASIL, 2007), subsidiaram as análises das entrevistas colhidas com os gestores. Dessa forma abordou-se como a instituição implantou e como a comunidade escolar tem praticado o ensino médio integrado no seu dia a dia. Analisou-se e compararam-se através das entrevistas, as concepções e princípios da proposta do MEC/SETEC (BRASIL, 2007) para o ensino médio integrado com o conhecimento dos gestores, as contradições existentes entre a proposta norteadora e a sua efetivação na prática. Finalizando pontuaram-se, segundo a fala dos gestores, os fatores que dificultam e/ou facilitam a integração no dia a dia da instituição. Finalizou-se com as considerações finais, onde se procurou sintetizar o trabalho realizado, respondendo o objetivo da pesquisa, apontando sugestões, fornecendo elementos para outras investigações e deixando espaço para novas contribuições. 17 1 A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA PERSPECTIVA HISTÓRICA Neste capítulo, apresenta-se um conciso histórico da educação básica e profissional no Brasil, marcada pela dualidade entre uma educação propedêutica para as elites e outra para as classes mais desfavorecidas. Com o objetivo de configurar o plano legal que constitui a base da formulação e implementação das políticas que relacionam o ensino médio e a educação profissional, realizou-se um levantamento seletivo da legislação nacional em vigor e das normas, editadas nas últimas décadas, com a intenção de uma análise mais significativa de acordo com o objetivo da pesquisa. Sob esse foco foram selecionadas e analisadas leis, decretos federais e disposições constitucionais, identificando o caminho histórico da educação básica e profissional no Brasil. Para a análise da documentação legal e normativa e a sua oportuna contextualização, escolheu-se o seguinte conjunto de documentos principais: a Lei no. 9.394/96 (BRASIL, 1996), o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) e o documento – base do MEC/SETEC (BRASIL, 2007). 1.1 A LDB: PANORAMA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL E DO ENSINO MÉDIO As primeiras ações de criação de ensino profissionalizante no Brasil permaneceram restritas a decisões de caráter assistencialista, ou circunstanciais, não havia uma política educacional definida. A intenção assistencial ficava explicitada nos textos de leis de sua criação, marcada com a intenção de “amparar os órfãos e abandonadas” ou a “diminuição da criminalidade e da vagabundagem”. O país tinha uma economia baseada na monocultura, sustentada pela exportação de produtos agrícolas para as metrópoles. Inicialmente o nosso sistema de produção era dependente de mão de obra escrava e depois de colonos imigrantes, situações que dispensavam a qualificação profissional. Para Manfredi (2002), As leis orgânicas da educação nacional, publicadas na década de 40, definiram o objetivo do ensino secundário e normal “formar as elites condutoras do país”, ficando para o ensino profissional o objetivo de oferecer “formação adequada aos filhos dos operários, aos desvalidos da sorte e aos menos afortunados, aqueles que necessitam ingressar precocemente na força de trabalho”. A dualidade estrutural é uma característica histórica do sistema educacional brasileiro: formar para a cidadania ou para o trabalho produtivo. 18 O dilema histórico da idéia de que o ensino secundário, ao lado do ensino normal e do ensino superior, era destinado aos que detinham o saber, enquanto o ensino profissional estava voltado apenas àqueles que executavam as tarefas manuais. Assim, a partir do próprio texto legal, promovia-se a separação entre os que “pensam” e os que “fazem”, e a educação profissional, preconceituosamente, era considerada como uma educação de segunda categoria. O dilema de um currículo voltado para as humanidades ou para a ciência e tecnologia. Na década de 70, formação profissional se traduzia no treinamento para a produção em série e padronizada. O resultado desse tipo de formação era a incorporação ao mercado de trabalho de operadores semi-qualificados, desempenhando tarefas simples, rotineiras e previamente delimitadas. Havia pouca margem de autonomia para o trabalhador, pois o conhecimento técnico e organizacional cabia quase sempre apenas aos níveis gerenciais. A baixa escolaridade dos trabalhadores não era considerada entrave significativo à expansão econômica. De acordo com Manfredi (2002), na década de 80, novas formas de organização e de gestão modificaram estruturalmente o mundo do trabalho e as empresas passaram a exigir empregados mais qualificados. Além da destreza manual, novas competências passaram a serem exigidas como inovação, criatividade, capacidade para o trabalho em equipe e autonomia na tomada de decisões. Tudo isso, mediado pela utilização de novas tecnologias da informação. No âmbito escolar o movimento democrático da abertura política se reflete em torno da defesa do ensino público de boa qualidade e da democratização da educação, essa experiência voltava-se para a educação de crianças e jovens das camadas populares, com ênfase na participação dos próprios interessados e das direções das escolas. A reorganização econômico-política internacional associada ao uso intensivo de alta tecnologia nas empresas começa a demandar uma elevada qualificação dos trabalhadores, de quem se passa a exigir alto grau de abstração, a capacidade de resolver problemas e de trabalhar em equipe. Para Deluiz (2004), é neste contexto que retorna à agenda de discussões o papel da educação. O trabalhador polivalente deve ser muito mais "generalista" do que especialista. Para desenvolver as novas funções, há exigências de competências de longo prazo que somente podem ser construídas sobre uma ampla base de educação geral. O projeto inicial da LDB surgiu de amplo processo de discussão e mobilização através do Fórum Nacional em Defesa da Escola Pública. Organizada pelos diferentes segmentos representativos da sociedade civil, envolvidos na elaboração coletiva de um projeto educacional. Singer (1996) caracterizou este segmento como defensores de um projeto 19 que tem como concepção educacional, o pensamento crítico, inovador, trabalho integrado e a ética. Essa visão educacional não vê contradição entre formação do cidadão e a formação profissional. Para Saviani (1997), a proposta preliminar da LDB contrariava a concepção liberal de educação, ao propor uma educação de nível médio centrada na idéia da politécnia3, que superava a contradição entre o homem e o trabalho, através da conscientização teórica e prática do trabalho como constituinte da essência humana. Propunha uma cisão com a visão produtivista e mercadológica da educação e adotava como parâmetro de qualificação humana, a concepção unitária e tecnológica que superava a dicotomia entre a educação geral e a formação profissional. A idéia era superar a dualidade existente no nível médio, que mantinha o ensino técnico num sistema à parte da educação. Esta é uma concepção radicalmente diferente da que propõe um ensino médio profissionalizante, caso em que a profissionalização é entendida como um adestramento em uma determinada habilidade sem o conhecimento dos fundamentos dessas habilidades, menos ainda, da articulação dessa habilidade com o conjunto do processo produtivo (SAVIANI, 2003, p.15). A proposta de LDB dos educadores, de organizações populares e sindicais tinha como base uma concepção de educação fundamentada no conceito de escola politécnica de Gramsci, que propõe a criação da uma escola básica unitária, uma formação omnilateral comprometida com a superação da contradição capital versus trabalho. Sustentada pela justificativa de construção de um sistema de educação nacional integrado que propiciasse a unificação entre trabalho, ciência, tecnologia e cultura. Para Kuenzer (1997) esta nova escola deveria estar articulada e integrada com o Sistema Nacional de Educação e será inicialmente de cultura geral única para todos, com uma base consistente comum de conhecimentos básicos, nos níveis: elementar e médio. O conteúdo deve ser formativo e não terá objetivos práticos imediatos. O ponto de partida desses conteúdos é a realidade social. O aluno do nível elementar deve adquirir instrumentos básicos necessários à compreensão e a participação da vida social e produtiva. O aluno do nível secundário deverá ter condições para a elaboração da autodisciplina intelectual e da 3 Politécnia possui o significado de especialização como domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas utilizadas na produção moderna. A educação de nível médio tratará de se concentrar nas modalidades fundamentais que dão base aos diferentes processos e técnica de produção (Saviani,2006). 20 autonomia moral numa perspectiva omnilateral e formação teórico - cientifica e tecnológica necessária à especialização. Esta forma de organizar a escola e o sistema de ensino tem por finalidade, pela unificação entre cultura e trabalho, formação de homens desenvolvidos multilateralmente, que somem à sua capacidade instrumental as capacidades de pensar, de estudar, de criar, de dirigir ou de estabelecer controles sociais sobre os dirigentes (KUENZER, 1997, p. 39). Os organismos internacionais orientavam e priorizavam investimentos no ensino fundamental. Os cursos de qualificação profissional poderiam receber financiamento, se forem cursos aligeirados e de baixo custo. A educação profissional é vista como cursos demorados e caros e recomenda que seja repassada para a esfera privada. Frigotto (2006) analisa que a formação técnico-profissional resulta de um embate que confronta um projeto societário assentado no ajuste da nova ordem mundial e outro que busca viabilizar uma alternativa autônoma e sustentável de desenvolvimento e alerta: [...] ensino técnico-profissional está hoje, no Brasil, imersa num intenso embate no plano ético-político, epistemológico e teórico-prático. Nos anos 90 esta temática tem-se constituído num dos eixos prediletos das políticas do Banco Mundial na sua estratégia de adequar os processos educativos dentro de uma perspectiva produtivista, mormente da educação básica e da formação técnico-profissional, ao ideário da globalização e da reestruturação produtiva. As reformas curriculares da Espanha, Chile, Argentina e a que está em processo hoje no Brasil sobre Parâmetros Curriculares Nacionais traduzem, contraditoriamente e por vezes de forma dissimulada no invólucro de teorias psicológicas, sociológicas, etc., o receituário do Banco Mundial no campo educativo (FRIGOTTO, 2006, p.1). Ciavatta (2005) assevera que as tentativas de mudanças da legislação do ensino médio e profissional é o resultado de um processo histórico de disputas políticas e ideológicas de vários grupos empreendidas no âmbito da sociedade brasileira. Essa disputa coloca em jogo o histórico conflito existente em torno do papel da escola, de formar para a cidadania, tendo em vista o exercício do direito e obrigações típicas da democracia ou preparar o individuo para o ingresso no mercado de trabalho, aproximando-se mais dos interesses imediatistas dos empresários e dos órgãos internacionais. A Lei no. 9.394, aprovada em de 20 de dezembro de 1996, a LDB (BRASIL, 1996), estabelece as novas diretrizes e bases da educação brasileira. Da autoria do senador Darci Ribeiro, a nova Lei, retira a concepção de politecnia dada à educação e passa a referenciar a relação trabalho/educação num sentido de preparação básica para o trabalho. A 21 formação integral entre o ensino médio e a educação profissional defendida pelas forças progressistas foram derrotados, culminando com a manutenção da dualidade na educação brasileira. As alterações e modificações efetuadas no projeto original oportunizaram a ambiguidade de interpretações, o que facilitou, por meio de legislação específica, alterações e desconstrução de um projeto idealizado coletivamente e democrático. O decreto No. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) é um dispositivo legal específico complementar para o ensino médio e profissional de nível médio que viria para regular a forma e o conteúdo da referida modalidade de ensino, uma forma de impor uma política educacional sem pressões e resistências. O texto da lei objetivava consolidar a separação do ensino médio da educação profissional. Com a nova LDB, a educação brasileira ficava organizada e estruturada dois níveis: a básica e superior, a educação profissional não faz parte nem de um nem de outra, ou seja, não faz parte da estrutura da educação regular do país. A educação profissional é considerada como um apêndice ou uma modalidade complementar. A educação profissional faz parte do Capitulo III do Título V da Lei, distribuída nos Artigos 39, 40, 41 e 42. O Art. 39 integra a educação profissional às diferentes formas de educação, ao trabalho, à ciência e à tecnologia e enfatiza suas aptidões para a vida produtiva. Para Saviani (2003) é um retrocesso, pois não define como a integração se concretizaria na prática e não definindo as competências e responsabilidades da educação profissional. No Parágrafo único do artigo comenta sobre a possibilidade que todos os jovens e adultos, escolarizados ou não podem ter acesso à educação profissional. O Art. 40 reza que a educação profissional será desenvolvida em articulação com ensino regular ou por estratégias de educação continuada no local de trabalho ou em instituições especializadas. A Lei não define que tipos e formas de articulação seriam possíveis, o que só aconteceu após a promulgação do Decreto No. 2.208/97 (BRASIL, 1997a). No § 2o do Art. 36 do Capítulo II, seção IV, que se refere ao ensino médio a Lei estabelece que “O ensino médio, atendida à formação geral do educando, poderá prepará-lo para o exercício de profissões técnicas” (BRASIL, 2007, p.18). A Lei é ambígua e minimalista, pois reconhecem “quaisquer possibilidades de articulação entre o ensino médio e a educação profissional podem ser realizadas, assim como a completa desarticulação entre eles.” (BRASIL, 2007, p.18). O Art. 41 trata da avaliação, reconhecimento e a certificação para prosseguimento ou conclusão de estudos da educação profissional. Os diplomas registrados dos cursos de 22 educação profissional terão validade nacional. O art. 42 determina que as escolas técnicas e profissionais, além dos seus cursos regulares, promoverão cursos especiais abertos a todos, independente da escolaridade. Observa-se que na LDB, que a concepção da relação trabalho e educação apenas pontuam no sentido de preparação básica para o trabalho, sem aprofundar em maiores sentidos e detalhes de como essa preparação seria concretizada. O Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) definiu a forma e o conteúdo da educação profissional no Brasil. 1.2 O DECRETO NO. 2.208/97: A REFORMA DO ENSINO PROFISSIONAL A LDB Lei no. 9.394/96 (BRASIL, 1996) e o Decreto Federal no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) disciplinaram as bases para a reforma do ensino profissional brasileiro. As instituições públicas e privadas que ofertam este tipo de ensino passam a se ajustar às novas diretrizes estabelecidas pela legislação. Para Deluiz (2004), a reforma implementada assume como concepção orientadora o modelo das competências. A formulação deste modelo e sua implementação nos planos e programas de educação profissional têm, entretanto, ocorrido de forma diferenciada em função de vários fatores: da ênfase atribuída ao foco no mercado de trabalho ou no indivíduo; da articulação ou desarticulação entre formação geral e formação profissional; dos distintos modelos epistemológicos que orientam a identificação, definição e construção de competências – condutivista, funcionalista, construtivista ou crítico - e dos diferentes enfoques conceituais de competências adotados: centrados no indivíduo e na subjetividade do trabalhador ou no coletivo de trabalhadores e no contexto em que se insere o trabalho e o trabalhador (DELUIZ, 2004, p.4). Para a autora as noções estruturantes do modelo de competências no mundo do trabalho são: a flexibilidade, a transferibilidade, a polivalência e a empregabilidade. A gestão de competências consiste em ter trabalhadores flexíveis para lidar com mudanças no processo produtivo, enfrentar imprevistos e estar sempre disponíveis para serem transferidos de uma função para outra, daí a importância da polivalência e a constante atualização de suas competências, isto tudo lhes confere a chamada empregabilidade. Neste modelo, conforme Deluiz (2004) importa a posse dos saberes disciplinares escolares e a capacidade de mobilizar esses conhecimentos para solucionar problemas e enfrentar imprevistos de acontecimentos e situações no interior da fábrica. O debate sobre competências no setor produtivo invade o mundo escolar, diante das exigências do setor, na procura de competitividade, produtividade e de inovação da área produtiva. 23 O Decreto n.º 2.208/97 (BRASIL, 1997ª), aprovado em 17 de abril de 1997, regulamenta o § 2º do Art.36 e os Arts. 39 a 42 da Lei n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. O decreto especifica os objetivos da educação profissional, prescrevendo que esta modalidade é um ponto de articulação entre a escola e o mundo do trabalho, qualificando, requalificando e reprofissionalizando o trabalhador independente do nível de escolaridade, deve habilitar para o exercício das profissões no nível médio e superior e atualizar e aprofundar conhecimentos na área de tecnologia voltadas para o mercado de trabalho. O decreto assinala em seu Art. 3o, que a educação profissional será organizada em três níveis: o básico, destinado à qualificação, requalificação e reprofissionalização de trabalhos, independentes de escolaridade prévia, o técnico, destinado a proporcionar habilitação profissional a alunos matriculados ou egressos de ensino médio e o tecnológico que corresponde a cursos de nível superior na área tecnológica, destinados a egressos do ensino médio e técnico. O currículo do ensino médio será organizado por disciplinas, agrupadas por áreas e setores da economia e sob a forma de módulos. Os módulos podem ser cursados em instituições diferentes e ter caráter conclusivo para efeito de qualificação profissional, dando direito à certificação de competência. Determina aos sistemas federal e estadual de ensino, mediante exames a certificação de competências. As necessidades do setor produtivo invadem a educação, principalmente a educação profissional na busca de competitividade e produtividade: O problema não reside apenas em ser cursos de curta duração. O mais grave é a ausência de um plano de formação continuada que organize estes cursos de curta, média e longa duração em módulos seqüenciais e flexíveis, que constituam itinerários formativos correspondentes às diferentes especialidades ou ocupações pertencentes aos diferentes setores da economia. De qualquer forma, é preciso prevenir o aligeiramento da formação oferecida por meio de cursos segmentados e de cargas horárias mínimas e insuficientes, de modo a superar o aprendizado restrito a uma tarefa específica amparada no mito da empregabilidade (BRASIL, 2004c, p.33). Para o MEC (BRASIL, 2004c), é importante assinalar que o modelo de competência proposto pela reforma surge na mesma conjuntura da reestruturação produtiva e das formas de organização do trabalho, carregado de forte ideologização onde os interesses da empresa são mostrados como interesse dos trabalhadores, inclusive com benefícios 24 assistenciais. Esses objetivos contrariam intrinsecamente os processos formativos a ser desenvolvidos nos sistemas educacionais, pois a urgência e a funcionalidade do setor produtivo contrastam com o tempo necessário para a formação humana, que é um tempo de reflexão sobre os problemas e de amadurecimento sobre seus aprendizados. A educação profissional de nível técnico foi a mais afetada e torno-se independente do ensino médio e uma organização curricular própria, podendo ser oferecida de forma concomitante ou sequencial. O decreto interrompeu a oferta da educação profissional e a educação geral na mesma grade curricular, retomando e reforçando a dualidade histórica da educação brasileira. Para Garcia e Lima Filho (2004), a consequência mais negativa para as escolas técnicas e os CEFETs, do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), foi à extinção dos cursos técnicos integrados que funcionava com bastante sucesso desde 1942. Berger Filho (1999), na época secretário de Educação Média e Tecnológica, descreve sobre a organização curricular e suas relações com setor produtivo: A União, através do Conselho Nacional de Educação, por proposta do Ministério da Educação, estabelece diretrizes curriculares nacionais que devem descrever competências e habilidades básicas, por áreas do setor produtivo, e indicar a carga horária mínima necessária para a obtenção de uma habilitação profissional em cada uma dessas áreas. Aos sistemas de ensino federal e estaduais cabe estabelecer o currículo básico, deixando, no caso da educação profissional, 30% da carga horária mínima para que as escolas possam renovar permanentemente seus currículos, independente de prévia autorização de qualquer órgão normativo - o que deverá agilizar as adequações da escola às demandas colocadas pelo avanço do conhecimento e pelas transformações do setor produtivo (BERGER FILHO, 1999, p.5). Com relação dos impactos produzidos pelo Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) sobre a educação profissional, nas escolas da Rede Federal, vários são os trabalhos que têm sido realizados por pesquisadores da área. Podemos citar os trabalhos: “A implantação do ensino médio integrado no estado do Paraná: A difícil superação da cultura da dualidade”, de Davanço (2008), “A experiência da forma integrada de ensino profissional do CEFET – PA”, de Santos (2008), “A educação profissional integrada ao ensino médio no Paraná: avanços e desafios”, de Garcia (2009) e “A implementação do currículo integrado no curso técnico em agropecuária: o caso de Guanambi”, de Silva (2009). A grande maioria dessas pesquisas conclui que a reforma da educação profissional afetou, substancialmente, a qualidade do ensino dentro dessas instituições, principalmente por inviabilizar a prática da educação tecnológica, que integrava a educação geral e profissional, historicamente 25 valorizada e reconhecida pela sociedade e o mundo do trabalho, direcionamento ostensivo para o mercado de trabalho e processo de gradual privatização das instituições. Os “achados” de Oliveira (2003) em sua pesquisa no Centro Federal de Educação Tecnológica, em plena vigência do decreto, podem ser sintetizados em: aumento dos índices de evasão, repetências e trancamentos de matrículas, por um lado, e diminuição de demanda, por outro, pois a adoção do sistema modular possibilitava conferir competências parciais que viabilizaram a ida precoce para o mercado de trabalho, a utilização da organização curricular baseada na “lógica das competências”, que valoriza “o saber-ser e o saber-fazer”, em detrimento de uma solida qualificação e capacitação do trabalhador. Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) assinalam que o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) e outros instrumentos legais vêm não somente proibir a formação integrada, mas regulamentar as formas de educação profissionais aligeiradas e fragmentadas em função das necessidades do mercado. Consideravam o Decreto ilegal ao determinar a separação entre o ensino médio e a educação profissional, pois contrariava a lei maior, a LDB (BRASIL, 1996), que em seu Art. 40 dispõe que a educação profissional será praticada articulando com o ensino regular. Com base nesse Decreto foi promovida: [...] uma radical separação entre a educação profissional de nível técnico e o ensino médio, entendendo que o ensino técnico pudesse ser desenvolvido subsequentemente ao ensino médio, ou de forma concomitante, porém não integrado em um único curso, uma vez que a educação profissional não era mais a parte diversificada do ensino médio. Este posicionamento intransigente do Decreto Federal nº. 2.208/1997 valeu-lhe profunda oposição, de modo especial em alguns meios dominantes da rede pública federal de educação técnica e tecnológica (UNESCO, 2009, p.26). O documento da Unesco (2009) menciona que o decreto trouxe efeitos benéficos, pois determinou o aumento da educação profissional técnica (14,5% entre 2003 e 2004, segundo dados preliminares do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira – INEP, do Ministério da Educação), acelerando o ritmo de expansão da educação profissional no País, que já tinha avançado 12,9% entre 2001 e 2003. No setor privado, cresceu 20,8%; no municipal, 11,9%; no estadual, 8,6%; e no federal, 1,4%. A organização também considera como positivo o perfil do aluno, de mais idade e de baixa renda, o que passou a ser mais vocacionado e diretamente interessado na profissionalização, objetivando um foco mais social, voltado para os que necessitam trabalhar em atividades qualificadas, antes da educação superior. 26 Outro aspecto que merece destaque para a Unesco (2009), refere-se à obrigatoriedade das instituições federais e as instituições públicas e privadas sem fins lucrativos, apoiadas financeiramente pelo poder público, a ministrarem cursos de nível básico de educação profissional, abertos a alunos das redes públicas e privadas de educação básica, assim como a todos os trabalhadores com qualquer nível de escolaridade. A presença de organismos internacionais com orientação e apoio financeiro se faz presente. O Banco Mundial prioriza [...] financiamento apenas da educação básica, entendida como oito anos de escolarização, retira da alçada do Estado à obrigação de atuar em outros níveis de ensino. Conseqüentemente, a desarticulação da educação profissional e da educação secundária não objetiva alcançar a maior eficiência da primeira, mas sim, retirar do raio de cobrança da população sua manutenção pelo poder público. Outro fator que justifica, para o Banco Mundial, a reformulação da educação profissional é a sua longa duração. Devendo estar voltada para atender aos interesses imediatos do mercado, recomenda que a mesma tenha uma estrutura modular, permitindo aos estudantes uma inserção imediata no mercado de trabalho e que estes possam, aos poucos, aprimorar este processo formativo (OLIVEIRA, 2002, p.9). Segundo o Banco Mundial, embora tenha ampla importância à educação primária e secundária, bem como a educação profissionalizante, estas não devem estar articulada. Os resultados da educação profissionalizante são mais otimizados se forem ministrados fora dos espaços de educação formal. A educação profissionalizante necessita de um modelo flexível e, em sendo ministrada em instituições que detenham certa autonomia, poderá direcionar suas atividades para a área produtiva. Neste sentido, recomenda que as escolas técnicas estejam fora do raio de ação do Ministério da Educação, criando, assim, uma maior flexibilidade no sistema. Oliveira (2002) recomenda que a educação profissional seja ministrada após o término do ensino secundário, pois permitirá que os estudantes possam escolher uma profissão no momento em que estejam próximos de entrar no mercado de trabalho, por estarem mais maduros para fazê-lo e serem mais capazes de avaliar esta escolha em função do movimento do mercado de trabalho. Com o Decreto nº. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), o ensino médio retoma legalmente um sentido puramente propedêutico, enquanto os cursos técnicos, agora obrigatoriamente separados do ensino médio, passam a ser oferecidos de duas formas. Uma delas é a concomitante ao ensino médio, em que o aluno pode fazer ao mesmo tempo o ensino médio e um curso técnico, mas com matrículas e currículos distintos, podendo os dois cursos serem 27 realizados na mesma instituição (concomitância interna) ou em diferentes instituições (concomitância externa). A outra forma é a Seqüencial, destinada a quem já concluiu o ensino médio e, portanto, após a educação básica. Para Kuenzer (1997), a reforma da educação profissional tinha como pressupostos: a) a racionalidade financeira, pela qual se prioriza o princípio de equidade, pressupondo um tratamento diferenciado tanto para os indivíduos quanto para as demandas do mercado; b) ruptura com o princípio da equivalência entre a educação geral e a profissional, pois apenas o ensino médio daria acesso ao ensino superior, resgatando a dualidade estrutural; c) a educação profissional em substituição à educação geral disponibiliza-se aos não possuem escolaridade o acesso ao nível básico, o mais elementar, do ensino profissional. Conforme apresentado no documento do MEC (BRASIL, 2004c), os dois tipos de ensino funcionarão com base em premissas distintas: o sistema regular com uma perspectiva de preparação e continuidade dos estudos em nível universitário e o sistema profissional ancorado à lógica do mercado. A ampliação da formação mais generalista funcionaria, também, como um freio para o ingresso no mercado formal de trabalho, atuando como um mecanismo compensatório e regulador de tensões sociais, já que os empregos que exigem maior qualificação técnica tendem a ficar restritos, em face dos processos de reorganização em curso, reduzida parcela da população. O decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) institucionaliza o Estado brasileiro, o agente legal condutor da política educacional pública, a dividir o protagonismo com outros sujeitos políticos do setor privado: Na prática, o decreto serviu como mais um instrumento da política educacional do período que contribuiu para a institucionalização de um sistema paralelo de formação profissional [...]. Tal desarticulação, presente na história da educação há tempos, vinha ocorrendo de forma paralela e, até certo ponto, marginal ao sistema educacional público. A partir de 1997, essa dualidade passa a ser uma orientação legal e uma prescrição oficial, a ponto da “educação profissional” configurar-se, predominantemente, como um subsistema no interior do próprio sistema público de educação, voltado para a formação do trabalhador, sem a promoção da elevação dos níveis de escolaridade (CEA, 2006, p.3). A implementação e materialização do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) sobre a educação media e profissional foram asseguradas pelos recursos financeiros e gestão privada do sistema federal, através da parceria do Governo Federal, representados MEC/MTE 28 com os Bancos Interamericano de desenvolvimento (BID) e Mundial, mediantes dos programas especiais Planfor e Proep. Conforme Amaral e Oliveira (2007) o Proep – Programa de Expansão da Educação profissional foi estruturado pelo MEC em novembro de 1997, sob a gestão de sua Secretaria de educação Média e Tecnológica – Semtec, que tinha os seguintes objetivos: o aumento de vagas no ensino profissional; a diversificação de oferta no ensino profissional e a demarcação de cursos para atender às demandas do setor produtivo e as exigências da tecnologia moderna. Construindo e fortalecendo parcerias entre sociedade e Estado, entre escola e setor produtivo. A função do Proep foi reorganizar a rede no sentido de melhorar suas ofertas educacionais, de gestão e relações com empresários e comunidade a fim de torná-la competitiva no mercado de prestação de serviços. Com o aporte financeiro do Proep, os orçamentos das instituições foram sendo reduzido, obedecendo à lógica da reforma, que era o autofinanciamento dessas instituições. Mas no dia a dia das escolas a sua praticidade era questionada, pois o foco era desvinculado da operacionalidade da educação regular: O Proep apresentou uma série de dificuldades: o apoio financeiro não contemplava os interesses da escola, mas as exigências do programa e falta de gestão democrática em todas as instâncias. Constatou-se uma gestão privada do sistema que priorizou uma visão economicista, com loteamento dos recursos a partir de uma relação tempo/custo, substituindo o tempo de aprender, gerando um processo de mercantilização do ensino. Ademais, houve a privatização do ensino público federal por meio das fundações de apoio (BRASIL, 2004c, p.35). Podemos considerar que o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) o Proep e o Planfor são iniciativas de uma política educacional imposta por organismos internacionais que fragmentou o sistema nacional de educação, privatizou as instituições educacionais públicas e submeteu a educação profissional á lógica e às práticas do mundo produtivo e dos negócios. Em 14 de maio de 1997 é promulgada a Portaria MEC no. 646/97(BRASIL, 1997b) que regulamentava a implantação do disposto nos artigos 39 a 42 da Lei Federal no. 9.394/96 (BRASIL, 1996) e no Decreto Federal no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) que determinou a redução da oferta de ensino médio no país. A Portaria determinava que a partir do ano de 1998, a oferta de cada instituição federal de educação tecnológica no ensino médio seria, no máximo de 50% das vagas oferecidas nos cursos técnicos de nível médio no ano de 1997, os quais conjugavam ensino médio e educação profissional. A manutenção dos 50% foi 29 processo de mobilização ocorrida em toda Rede Federal “[...] a idéia era extinguir definitivamente a vinculação das instituições federais de educação tecnológica com a educação básica” (BRASIL, 2004c, p.21). O Parecer CNE/CEB no. 16/99 (BRASIL, 1999a), aprovado em 5 de outubro de 1999, e a Resolução CNE/CEB no. 04/99 (BRASIL, 1999b) trataram das Diretrizes Curriculares Nacionais para a educação profissional de nível técnico. A organização curricular da educação profissional teve como princípio orientador a formação baseada em competência. O Parecer entendia competência, como capacidade de articular, mobilizar e colocar em ação valores, conhecimentos e habilidades necessários para o desempenho eficiente e eficaz de atividades requeridas pela natureza do trabalho. A reforma do ensino médio e profissional que foi implementado determinou a separação da formação acadêmica da educação profissional e atendeu os interesses imediatos dos empresários e das orientações dos órgãos internacionais. Subordinou a produção educacional às necessidades estabelecidas pelo mercado de trabalho e afastou as perspectivas democráticas defendidas pelas entidades da sociedade civil. A revogação do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) e a sua substituição pelo Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a), criou a possibilidade da articulação do ensino médio com a educação profissional de nível técnico, com a criação de um currículo que promova a integração, tendo o ensino regular e a educação profissional uma única matricula, conformando uma totalidade. 1.3 O DECRETO NO. 5.154/04: NOVA POSSIBILIDADE DO ENSINO MÉDIO INTEGRADO. De acordo com Frigotto, Ciavatta, Ramos (2005) as experiências de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio começaram a partir de 2003, quando as diretorias da educação profissional e do ensino médio do MEC foram coordenadas por técnicos e assessoradas por pesquisadores que acreditavam que a eleição de Luís Inácio Lula da Silva, para a Presidência da República, poderia representar um governo democrático e popular. Em dezembro de 2003 através da Portaria no. 3.621/03 do MEC (BRASIL, 2003) foi criado Fórum Nacional de Educação Profissional e Tecnológica, de caráter consultivo e articulador da relação Estado e Sociedade, vinculado ao Ministério da Educação, com o compromisso de estabelecer uma articulação entre a sociedade civil e o Estado, através do 30 acompanhamento das propostas, posições e proposições referentes área da educação profissional. Em abril de 2004, a Secretaria de Educação Media e Tecnológica – Semtec publicou o documento “Políticas Públicas para a Educação Profissional e Tecnológica4" para orientar e coordenar as ações promovidas pela Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do Ministério da Educação. O objetivo deste documento era contextualizar e adequar à educação profissional ao desenvolvimento econômico do Brasil, além de organizá-la para promover a diminuição das desigualdades sociais e articular essa modalidade de educação a um ensino médio de qualidade. Os pressupostos da proposta estão ancorados na integração ao mundo do trabalho, interação com outras modalidades públicas (principalmente com a EJA – educação de jovens e adultos) no intuito de promover a inclusão social, recuperar o poder normativo da LDB, reestruturar o ensino médio técnico e valorizar os profissionais da educação profissional e técnica. Em 27 de junho de 2004 foi revogado o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) e promulgado o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) que regulamentou o § 2º do art. 36 e os arts. 39 a 41 da Lei nº 9.394 (BRASIL, 1996), definindo novas orientações para a educação profissional. O documento organizou novas modalidades de educação profissional: I formação inicial e continuada de trabalhadores; II - educação profissional técnica de nível médio; e III - educação profissional tecnológica de graduação e de pós-graduação. Configurou novas formas de educação profissional técnica de nível médio e o ensino médio: Integrada – o aluno deve cursar o ensino médio e o profissional numa mesma instituição, com integração entre ambos, através de uma matricula única; Concomitante – oferecida somente ao aluno que já tenha concluído o ensino fundamental e esteja cursando o ensino médio, na qual a complementaridade entre os ensino profissional e o médio pressupõe a existência de matriculas distintas para cada curso, podendo ser cursada na mesma instituição (concomitância interna) ou em instituições distintas (concomitância externa) e a Subsequente oferecida para alunos que já tenha concluído o ensino médio. Para Ramos (2007), a indissociabilidade entre a educação profissional e a educação básica garante aos sujeitos jovens e adultos se apropriarem de conhecimentos que estruture sua inserção na vida produtiva dignamente. Os cursos somente de educação profissional não se sustentam se não se integrarem os conhecimentos com os fundamentos da 4 Essa proposta contemplou os dispositivos do documento-base e do relatório final do Seminário de Educação Profissional: Concepções, experiências, problemas e propostas, promovido pela Semtec/MEC em julho de 2003 em Brasília. 31 educação básica. Para a autora os cursos não integrados representam cursos de treinamentos, de desenvolvimento de habilidades procedimentais ou aligeirados, tendo como foco apenas o mercado de trabalho. A construção de conhecimentos deve ser mediada pelo trabalho, pela ciência, pela tecnologia e pela cultura e o ensino médio é a etapa da educação básica em que a relação entre ciência e praticas produtivas se concretiza: “[...] é a etapa biopsicológica e social de seus estudantes em que ocorre o planejamento e a necessidade de inserção no mundo do trabalho, no mundo adulto” (RAMOS, 2007, p.14). A seguir mostramos uma tabela contendo alguns aspectos divergentes sobre a educação profissional, focando as principais diferenças do nível técnico entre o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) e o decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a), na visão de Amaral e Oliveira (2007): Tabela 1 - Comparativo entre os Decretos nº. 2.208/1997 e nº. 5.154/2004 Decreto no. 2.208/97 Decreto no. 5.154/04 A educação profissional é desenvolvida em A educação profissional é desenvolvida por três níveis: básico, técnico e tecnológico meio de cursos e programas de: formação (Art. 3o). inicial e continuada de trabalhadores; educação profissional técnica de nível médio; e educação profissional tecnológica, de graduação e de pós-graduação (Art. 1o). A educação de profissional de nível técnico A educação profissional técnica de nível deve ter organização curricular própria e médio [...] será desenvolvida de forma independente do ensino médio, podendo ser articulada com o ensino médio, através da oferecido de forma concomitante ou forma integrada, concomitante e subsequente sequencial a este (Art. 5o). ao ensino médio (Art. 4o). Limite de 25% do total da carga horária Não prevê limite para aproveitamento da mínima, conferida ao ensino médio, para carga horária do ensino médio para a aproveitamento no currículo da habilitação educação profissional. profissional (Art. 5o). Fonte: Amaral e Oliveira, 2007, p. 177. Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) defendem que o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) foi importante por iniciar uma possibilidade de estabelecer a integração do ensino médio e a educação profissional, promover a retirada do nível básico para educação 32 profissional, muito criticado por aceitar alunos sem qualquer escolaridade e determinar a eliminação do ensino modular que fragmentava e aligeirava o ensino profissional. A gênese do decreto foi um processo polêmico que envolveu uma complexa acumulação de forças como educadores, dirigentes e consultores de sindicatos, de ONGs e de instituições empresariais. Na área da educação profissional, a revogação do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) configurou a face emblemática e pontual da disputa da pertinência politico e pedagógico do ensino médio integrado com a educação profissional. Representou um avanço no sentido de mudanças estruturais para a sociedade civil e educadores. O documento final que culminou com o Decreto no. 5154/04 (BRASIL, 2004a), representa a luta de setores progressistas que lutam por uma educação mais completa e de formação humana para jovens e trabalhadores. O documento é fruto de um conjunto de disputas e, por isso, mesmo, é um documento híbrido, com contradições que, para expressar a luta dos setores progressistas envolvidos, precisa ser compreendido nas disputas internas na sociedade, nos estados, nas escolas. Sabemos que a lei não é a realidade, mas a expressão de uma correlação de forças no plano estrutural e conjuntural da sociedade. Ou interpretamos o Decreto como um ganho político e, também, como sinalização de mudanças pelos que não querem se identificar com o status quo, ou será apropriado pelo conservadorismo, pelos interesses definidos pelo mercado (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005, p. 26 – 27). Segundo Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) a expectativa era de que o novo decreto fosse apenas um dispositivo transitório, num sentido de garantir a pluralidade de ações nos sistemas e instituições de ensino e um esclarecimento para a sociedade civil do assunto. Para os autores isso se deu de forma tímida e proposta da integração não foi prioritária e se fragmentou. O Parecer CNE/CEB no. 39/2004 (BRASIL, 2004b) confirmou a fragmentação da integração. O Parecer homologou as Diretrizes Curriculares Nacionais aprovados em 1989 e 1999, em conformidades com as disposições do decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a), ou seja, o MEC manteve as mesmas diretrizes, alvo de questionamentos e críticas. Para Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005), o ensino médio integrado concebido como educação básica e articulado ao mundo do trabalho, da cultura e da ciência, constitui um direito social e condição prévia para construir jovens emancipados, criativos e leitores críticos da realidade nacional. Nesse sentido o MEC, através da SETEC, elaborou o documento base “Educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio” (BRASIL, 2007), 33 que norteia o ensino médio integrado para as instituições e sistemas de ensino em todo o Brasil, que será objeto de discussão do próximo item. 1.4 DOCUMENTO – BASE MEC/SETEC (2007) O documento estimula, subsidia e propõe a opção pelo apoio à forma de oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. Produz reflexões importantes quanto à possibilidade material da implementação da politecnia na educação básica brasileira. O documento analisa as características atuais da sociedade brasileira e conclui que são grandes as dificuldades da implementação da politecnia ou educação tecnológica em seu sentido pleno, devido à extrema desigualdade socioeconômica, que “obriga grande parte dos filhos da classe trabalhadora a buscar a inserção no mundo do trabalho, visando complementar o rendimento familiar ou mesmo a auto-sustentação muito antes dos 18 anos de idade” (BRASIL, 2007, p.23). Considera o EMI uma solução transitória de média ou longa duração até que se chegue a uma conjuntura social “em que deixe de ser luxo o fatos dos jovens das classes populares poderem optar por uma profissão após os 18 anos de idade” (BRASIL, 2007, p.24). Foi a partir desse consenso mínimo que se edificaram as bases que deram origem ao Decreto no. 5154/04 (BRASIL, 2004a). O referido decreto, além de manter as ofertas dos cursos técnicos concomitantes e subsequentes, permitiu a possibilidade de integrar o ensino médio à educação profissional técnica, não no sentido totalmente tecnológico ou politécnico, mas que aponta na direção, porque contém os princípios de sua construção (BRASIL, 2007). Os dados coletados no IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora, através das entrevistas semi-estruturadas foram confrontados com os dados e informações contidas no Documento Base Educação Profissional técnica de Nível Médio, produzidas pelo MEC/SETEC (BRASIL, 2007), procurando responder o objetivo de nossa pesquisa. As análises foram feitas dando ênfases e direcionamento com o objetivo da pesquisa e as categorizações de acordo aspectos, temas recorrentes e temas ausentes. O documento representa a tentativa da construção de uma política pública educacional de integração entre o ensino médio e a educação profissional técnica com ações que assuma uma amplitude nacional, orientadas por um regime de coordenação e cooperação entre as esferas públicas em seus vários níveis: MEC e outros ministérios, secretarias do próprio MEC, instituições públicas de educação superior, principalmente as que integram a Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica e os sistemas estaduais e municipais de 34 ensino. Esse regime de colaboração mutua devera atuar em questões centrais como: financiamento; existência de quadro específico de professores efetivos para atuar nos diversos cursos; formação inicial e continuada de docentes, técnico-administrativos e equipes dirigentes; infra-estrutura física necessária a cada tipo de instituição, entre outros aspectos relevantes (BRASIL, 2007). 1.4.1 Políticas de integração do ensino médio com a educação profissional O MEC através da SETEC publicou em dezembro de 2007, o documento base intitulado Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio que explicita os princípios e diretrizes do EMI às instituições e sistemas de ensino. A intenção do documento é de que a sociedade civil brasileira se comprometa com essa modalidade de ensino, pois, para o MEC é a que apresenta os melhores resultados pedagógicos. A proposta enfatiza a educação científica e humanística através da articulação da formação geral e a educação profissional, priorizando a realidade dos arranjos produtivos e das escolhas sociais, econômicas e culturais locais e regionais. A SETEC através do Programa Brasil Profissionalizante5 oferece assistência financeira para a modalidade de ensino médio integrado na construção, ampliação, modernização e adequação de espaço físico, construção de laboratórios, aquisição de acervo bibliográfico, material de consumo e formação de docentes, gestores e pessoal técnicoadministrativo. O referido documento reconhece a necessidade de uma ação política consistente e clara para as instituições e sistemas de ensino, dos princípios e diretrizes do ensino médio integrado à educação profissional, servindo como um documento base de encadeamento das idéias, dos debates e embates da formação integral do cidadão brasileiro, anunciada no Decreto no 5.154/2004 (BRASIL, 2004a). Além de apresentar os pressupostos, concepções e princípios para a consolidação dessa modalidade de ensino, o documento base apresenta alguns embasamentos para a elaboração de um projeto político pedagógico integrado para as instituições que ofertarem o EMI e, alerta que a referida proposta só será vitoriosa dentro da comunidade escolar se a 5 O programa visa fortalecer as redes estaduais de educação profissional e tecnológica. A iniciativa repassa recursos do governo federal para que os estados invistam em suas escolas técnicas. Criado em 2007, o programa possibilita a modernização e a expansão das redes públicas de ensino médio integradas à educação profissional, uma das metas do Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). O objetivo é integrar o conhecimento do ensino médio à prática (BRASIL, 2007). 35 sociedade civil se conscientizar, comprometer-se e lutar pela consolidação do referido projeto, tendo como meta o aumento da escolarização e a melhoria da qualidade da formação do jovem e adulto trabalhador brasileiro. No documento base (BRASIL, 2007) temos bem evidenciadas duas percepções de educação profissional de nível médio, uma ancorada nos preceitos e regulamentos do Decreto no 2.208/1997 (BRASIL, 1997a), que fundamentava a separação da educação profissional da educação básica assumindo o ideário da pedagogia do capital ou do mercado e outra que propõe a formação integral, Decreto no 5.154/2004 (BRASIL, 2004a), que busca superar a determinação histórica do mercado de trabalho sobre essa etapa de ensino e desloca o foco para a formação da pessoa humana, tendo como aspectos indissociáveis o trabalho, a ciência, a cultura e a tecnologia. A proposta do MEC/SETEC (BRASIL, 2007) para o EMI é um projeto de integração entre a educação profissional à educação geral que tem como base a Escola Unitária de Gramsci. Este autor propõe para os sistemas de educação básica (nos níveis fundamental e médio) o trabalho como princípio educativo. Educação e trabalho são o binômio da pedagogia gramsciana: o trabalho é a essência fundamental da educação. A integração da ETP com o EM representaria a unificação do trabalho como momento educativo. O trabalho guia, decide e marca o currículo escolar. A escola unitária não admite subordinar a política educacional ao economicismo e às determinações do mercado. O documento adverte que uma escola profissional regulamentada pelo mercado produz trabalhadores com treinamentos aligeirados para preenchimento de postos de trabalho transitórios. Para Gonzalez (1996), Gramsci ao analisar o sistema de ensino italiano, criticava a existência de dois tipos de ensino (dualidade): a escola humanística, destinada a desenvolver a cultura geral dos indivíduos da classe dominante e as escolas particulares, que preparava os alunos oriundos das classes dominadas para o exercício de profissões. A solução para essa dicotomia seria a partir da implantação da escola única de cultura geral, formativa, que equilibrasse o desenvolvimento das capacidades intelectuais e manuais. A escola pública unitária deve atingir todos os indivíduos sem distinção de classe. Para a sua operacionalização, a escola unitária, requer mudanças na organização da escolar, com respeito aos prédios, material didático e corpo docente. Enfatiza a necessidade de um maior número de docentes, orientando que a eficiência da escola é mais intensa, quando a relação entre professor e aluno é menor. Orienta que as instalações devem ter dormitórios, refeitórios, bibliotecas especializadas, salas para trabalhos de seminários, etc. 36 Defende que na etapa inicial de implantação da escola unitária, apenas um grupo reduzido de alunos devem ser selecionados para o seu ingresso (GONZALEZ, 1996). Saviani (2006), inspirado nas reflexões de Gramsci sobre o trabalho como princípio educativo da escola unitária, delimita no interior do sistema ensino brasileiro, a escola unitária como sendo a educação básica nos níveis fundamental e médio. Alerta que o nível de desenvolvimento atingido pela sociedade contemporânea exige um acervo mínimo de conhecimentos para que os indivíduos atuem como cidadãos e participem ativamente da vida da sociedade. O referido acervo de conhecimento inclui a linguagem escrita e a matemática (incorporadas na vida da sociedade atual), as ciências naturais (leis que regem a natureza) e as ciências sociais (compreensão das relações entre homens, instituições e definições de direitos e deveres). Para Gramsci, este deve ser a configuração do currículo da escola fundamental. No ensino fundamental a relação entre trabalho e educação é implícita e indireta,mas no ensino médio a relação entre educação e trabalho, entre o conhecimento e a atividade prática deverá ser explicita e direta. O papel fundamental do ensino médio será, de recuperar a relação entre o conhecimento e a prática do trabalho (SAVIANI, 2006). Gonzalez (1996), focalizando a escola unitária de Gramsci, discute que nesse tipo de escola é privilegiado o incentivo de métodos de estudo e aprendizagem que estimulem a criatividade (não devendo estes ser monopólios das universidades) e mostra que na fase final, tal modelo, deve ser decisivo na criação de valores fundamentais na formação do ser cidadão: “humanismo, a autodisciplina intelectual e a autonomia moral necessárias a uma posterior especialização, seja de caráter cientifico (estudos universitários), seja de caráter imediatamente prático (indústria, burocracia, organizações de troca)” (GONZALEZ, 1996, p.2). A referida autora orienta que nesse tipo de escola, o professor desempenha um papel decisivo e fundamental: sendo um guia amigável tal como acontece de uma maneira geral na universidade e devem ter consciência de seu dever e do conteúdo filosófico desse dever, engajado e ativo na proposta da escola unitária (GONZALEZ, 1996). Para Saviani (2006), na escola unitária, o conhecimento se converte em potencia material no processo de produção e deve envolver o domínio teórico e prático. A atividade prática, manual, pode contribuir para explicitar a relação entre ciência e produção. Através do trabalho, pode-se compreender como a ciência e seus princípios são aplicados ao processo produtivo: 37 O ensino médio envolverá, pois, o recurso às oficinas nas quais os alunos manipulam os processos práticos básicos da produção; mas não se trata de reproduzir na escola a especialização que ocorre no processo produtivo. O horizonte que deve nortear a organização do ensino médio é o de propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das técnicas diversificadas utilizadas na produção, e não o mero adestramento em técnicas produtivas. Não a formação de técnicos especializados, mas de politécnicos (SAVIANI, 2006, p.161). Para o autor esta é uma concepção radicalmente diferente do ensino médio profissionalizante, pois nesse, a profissionalização é vista como adestramento para uma determinada habilidade e visa à inserção do individuo exclusivamente para o mercado de trabalho. O documento base (BRASIL, 2007) alerta que esta escola deve contribuir para a superação da estrutura social desigual da atual sociedade brasileira mediante um sistema educacional não dicotômico, que supere a divisão em educação geral, propedêutica, da educação específica e profissionalizante. A propedêutica destinada aos ricos e a profissionalizante aos pobres. Não subordinar a política educacional ao economicismo e às determinações do mercado, mas não ignorar as exigências da produção econômica, como espaço de onde os sujeitos sociais retiram os meios de vida e o seu sustento. Para a proposta é importante considerar os estudos locais, a identificação das oportunidades ocupacionais, as tendências da dinâmica sócio produtiva local, regional, nacional e global. Para Saviani (2006) no ensino fundamental a relação entre educação e trabalho é implícita e indireta, no ensino médio a relação conhecimento e a atividade praticam deve ser implícita e direta, isto é, o saber deve ter uma autonomia em relação ao trabalho. O nível médio devera focar a relação entre conhecimento e prática do trabalho. Os conhecimentos são incorporados em dimensões indissociáveis entre trabalho, ciência, tecnologia e cultura, através de uma formação omnilateral6. Aqui não cabe o mero adestramento de técnicas ou preparação mercadológica, mas a formação para a politécnia7. Esta concepção deve generalizada para todos, independente do tipo de ocupação cada um na sociedade. Terminada 6 Omnilateral: implica na integração das dimensões fundamentais da vida dos sujeitos que estruturam a prática social. As dimensões são: o trabalho, compreendido como realização humana inerente ao ser (sentido ontológico) e como prática econômica (sentido histórico associado ao respeito ao modo de produção), a ciência (compreendida como os conhecimentos produzidos pela humanidade que possibilita o contraditório avanço produtivo) e a cultura, que corresponde aos valores éticos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade (RAMOS, 2007, p. 3). 7 Especialização como domínio dos fundamentos científicos das diferentes técnicas utilizadas na produção moderna. Está concepção é radicalmente diferente do ensino médio profissionalizante, onde a profissionalização é entendida como um adestramento em uma determinada habilidade sem o conhecimento dos fundamentos dessa habilidade e sua articulação com o conjunto do processo produtivo. (SAVIANI, 2006) 38 esta formação os jovens teriam dois caminhos a seguir, sua vinculação ao processo produtivo ou a formação universitária. De acordo com o documento (BRASIL, 2007), o EM seria o EMI, com sentido e identidade e sem abandonar o desenvolvimento cultural dos jovens e adultos a um processo enfadonho e redundante. O EMI deve ser orientado para a formação de cidadãos críticos e participativos em todas as esferas da sociedade e “atuar de forma ética e competente, técnica e politicamente, visando contribuir para a transformação da sociedade em função dos interesses sociais e coletivos” (BRASIL, 2007, p.25). Para Saviani (2006), o EMI pode participar em “igualdade de condições com os estudantes universitários, da discussão, em nível superior, dos problemas que afetam toda a sociedade e, portanto, dizem respeito aos interesses de cada cidadão” (p. 15). Criando um clima que pode oferecer uma continuidade de atividades e desenvolvimento cultural dos jovens e adultos que pode ajudar a vincular o trabalho intelectual e manual sem preconceitos. Evita-se que os trabalhadores caiam na passividade intelectual e os universitários no academicismo. A escola unitária de Gramsci (2004) ao valorizar o trabalho como princípio educativo coloca o jovem estudante em contato com a história dos homens e com a realidade das coisas, fundamentando a compreensão da construção da vida em sociedade, livre de qualquer magia e feitiçaria e com uma concepção histórica, dialética do mundo: A marca social é dada pelo fato de que cada grupo social tem um tipo de escola próprio, destinado a perpetuar nestes grupos uma determinada função tradicional, diretiva ou instrumental. Se se quer destruir esta trama, portanto, deve-se evitar a multiplicação e graduação dos tipos de escola profissional, criando-se, ao contrário, um tipo único de escola preparatória (elementar – media) que conduza o jovem até os umbrais da escolha profissional, formando-o entrementes como pessoa capaz de pensar, de estudar, de dirigir ou de controlar quem dirige (GRAMSCI, 2004, p.136). Sua concepção pedagógica pela ação do trabalho é vinculada com a educação política que forma o cidadão para contribuir na humanização das estruturas econômicas, políticas e sociais. Para Gramsci, educar é libertar a classe trabalhadora da dominação mecânica, é reconstruir a historia do trabalho e suas manifestações culturais e construir as condições educacionais para as pessoas se tornarem dirigentes. Esta escola se organiza equilibrando de forma equânime a capacidade de trabalhar manualmente e o desenvolvimento do trabalho intelectual. Confirmando que “O advento da escola unitária significa o início de novas relações entre o trabalho intelectual e trabalho industrial não apenas na escola, mas em toda vida social” (GRAMSCI, 2004, p.125). 39 O documento propõe varias ações que visam tornar a integração entre o EM e a EPT de nível médio, através do Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a), uma política pública educacional em todo território brasileiro. Essas ações devem estar orientadas e sincronizadas por um regime de coordenação e cooperação entre as esferas públicas em vários níveis e que está colaboração mútua tenha como objetivo a resolução e otimização das questões relacionadas com o EMI. Para o MEC/SETEC as questões vitais do funcionamento da integração são o financiamento, quadro de professores efetivos, formação inicial e continuada de docentes e técnico-administrativos e uma infra-estrutura física adequada. Um aspecto muito discutido no documento base do governo para a implementação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio é o quadro docente e sua formação. Para uma política pública se transformar num programa de governo na área de educação torna-se fundamental conhecer os sistemas educacionais, tão questionáveis e fragilizados, sem esquecer suas virtudes, sejam eles municipais, estaduais e municipais, na tentativa de um diagnóstico de sua superação. A formação continuada é peça chave para a consolidação do EMI e envolvem professores, gestores e técnicoadministrativos. O documento atenta para uma formação que vá alem das técnicas didáticas de transmissão (professores) e de técnicas de gestão (dirigentes). O seu objetivo deve estar direcionada para uma política pública de educação profissional de nível médio integrado ao ensino médio, isto é, deve ter orientações que englobe a técnica, mas que supere esta, focalizando mais o ser humano trabalhador e suas relações com o meio ambiente do que simplesmente o mercado de trabalho e suas correlações do tipo aprender fazendo, formar para o trabalho e aspectos economicistas. O uso e entendimento da tecnologia devem estar comprometidos com o social. Há uma preocupação com a produção de conhecimento no campo da educação profissional e tecnológica e como proposta, deve-se estimular a criação de grupos de pesquisa e programas de pós-graduação. A proposta do ensino médio integrado, segundo o documento, está inserida num processo de caráter crítico-reflexivo e orienta para os professores um comportamento que vai além das transmissões de conteúdos acríticos e validados por autores externos. O professor deve assumir uma postura crítica e de responsabilidade social, problematizador e mediador dos conflitos do processo ensino-aprendizagem com autoridade, responsabilidade e competência técnica de sua área de conhecimento. Prioriza esforços, na formação, dos professores que já estão em exercício, os que estão em processo de formação e os que ainda vão iniciar formação como futuros profissionais da EPT. A proposta é criar uma escola ativa e 40 criadora organicamente identificada com o dinamismo da classe trabalhadora, tendo como foco a formação humana entrelaçada com o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura. 1.4.2 Concepções e princípios do ensino médio integrado Analisaremos aqui as concepções e princípios da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, marcada por uma educação centralizada no sujeito e conhecimentos, superando a visão determinista do mercado de trabalho. Segundo o documento base que orienta a integração (BRASIL, 2007) o objetivo fundamental é o desenvolvimento integral do ser humano permeado por valores éticos, sociais e políticos, preservando a sua dignidade e desenvolvendo ações junto à sociedade baseada nesses mesmos valores, desenvolvendo uma leitura crítica e reflexiva do mundo moderno marcado por dimensões científico-tecnológicas, políticas, econômicas e culturais. O documento aborda os quatro fundamentos da formação do EMI: a formação humana integral, trabalho, ciência, tecnologia e cultura como categorias indissociáveis da formação humana, o trabalho como principio educativo, a pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção de conhecimento e a relação parte-totalidade na proposta curricular. A formação humana integral, segundo o documento, significa a tentativa de enfocar o trabalho como princípio educativo, na perspectiva de superar com a dicotomia: trabalho manual e trabalho intelectual, de incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo, de formar trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos. Este fundamento tem como base a omnilateralidade que se caracteriza pela integração de todas as dimensões da vida no processo educativo. Essas dimensões são o trabalho, a ciência, a tecnologia e a cultura. A educação dos indivíduos teria a função de desenvolver a formação no objetivo de aumentar todas as dimensões do ser humano. O conceito de omnilateralidade está relacionado com o desenvolvimento total, completo, multilateral na vida produtiva e nas necessidades e capacidades de satisfação do homem. Conforme Gonzalez (1996), a omnilateralidade é considerada como objetivo final da educação e deve ser alcançada através do aumento da capacidade produtiva consolidada a uma capacidade de consumo e prazeres. A omnilateralidade, de acordo com Gonzales (1996), é uma concepção relacionada com a realização/emancipação do homem através do trabalho. A idéia é estabelecer uma diferença entre trabalho alienado e trabalho produtivo. O trabalho alienado é 41 definido como a atividade que produz algo exterior a si mesmo, portanto uma atividade exteriorizada e objetivada, tendo a produção como uma característica que satisfaz as necessidades do mercado e não as necessidades do individuo. Para a autora, Gramsci, retoma as idéias de Marx: O trabalho é atividade humana que produz valor de troca. A produção é direcionada para a necessidade de outras pessoas e o seu produto não pertence ao trabalhador. Este recebe em troca um salário e o transforma em bens de subsistência para sua família. É no regime de assalariado que o trabalho revela a sua essência alienante: uma atividade que produz valor de troca para outro. O próprio homem é convertido em mercadoria e passa a ter valor pela sua capacidade de produzir valor. O homem de sujeito passa a ser objeto daquele para quem trabalha (GONZALES, 1996, p.4). Para Gonzales (1996), a introdução da máquina no processo produtivo, reduz, cada vez mais, a intervenção consciente do homem no trabalho. No trabalho alienado, o trabalho perde todo o caráter de atividade humana, isto é, desaparece a consciência de si pela qual o homem se projeta e se satisfaz no seu produto. É um trabalho de sacrifício. “No trabalho alienado o homem não produz significados. A contínua repetição de uma determinada operação instala a morte psicológica do sujeito” (GONZALES, 1996, p.4). Gonzales (1996) cita a concepção de Marx acerca da emancipação humana no trabalho, que só pode ser plenamente compreendida através da oposição entre trabalho alienado e trabalho produtivo. O trabalho para Marx não era uma categoria meramente econômica e sim uma categoria antropológica impregnada de juízo de valor oriundo de sua posição humanista. É através do trabalho que há a plena identificação do homem com a natureza. Marx acompanha o pensamento de Hegel que entendia o trabalho como "o ato de autocriação do homem". O trabalho produtivo é a atividade pela qual o homem desenvolve-se a si mesmo. É a expressão própria do homem, uma expressão de suas faculdades físicas e mentais (GONZALES, 1996, p.4). Marx defende a abolição completa, da sujeição do homem, a realização de uma única atividade durante toda a sua vida. Deve-se privilegiar o desenvolvimento do homem total e universal (omnilateralidade) e explicita que na sociedade capitalista, o homem, se dedica a uma atividade até o fim de sua vida para obter o seu salário. Como alternativa, Marx, propõe a sociedade comunista, onde o indivíduo, não tem uma esfera de exclusividade de atividade. Qualquer um pode realizar-se em qualquer ramo que desejar, pois a sociedade regula a produção geral e torna possível a multiplicidade de atividades (GONZALES, 1996). 42 Para o documento (BRASIL, 2007), o trabalho é entendido como realização humana e como prática econômica, a ciência compreendida como os conhecimentos produzidos pela humanidade e a cultura que valoriza as normas de conduta baseada na ética e a estética. Na área especifica do EMI ao ET é amalgamar a educação geral com a com a educação profissional em todos os campos do trabalho: no processo produtivo ou no processo educativo nos níveis técnico, tecnológico ou superior. A proposta para o EMI, segundo as suas diretrizes é superar a visão dos homens dividida entre aqueles que vão fazer ou executar e os outros que vão planejar dirigir ou pensar ou acabar com a visão simplificada da preparação para o trabalho, somente focada no aspecto operacional, adestrado, desprovido de saberes científicos e tecnológicos e sem sua compreensão de um ser histórico e social. Implica tratar a educação como totalidade social e nesse sentido entende-se que as relações sociais se manifestam em de todas as outras relações ou fenômenos. Os autores do documento citam Ramos (2007) para discutir os pressupostos da formação integrada. O primeiro pressuposto é entender que os seres humanos “são seres histórico-sociais que atuam no mundo concreto para satisfazerem suas necessidades subjetivas e sociais e, nessa ação, produzem conhecimentos” (BRASIL, 2007, p. 42) e suas necessidades são orientados pelo trabalho e por isso constrói conhecimentos. O segundo pressuposto versa sobre a totalidade e suas relações. A realidade, aquilo que existe efetivamente, é uma totalidade e que esta é o resultado de muitas relações. A totalidade é um todo organizado dialeticamente em partes. Para desvendar um fato em toda sua constituição é necessário conhecer suas relações intrínsecas e extrínsecas que a compõem. Compreender um conhecimento consiste em entendê-lo, como uma elaboração do pensamento pelo qual se assimila e se aprendem as relações que compõe e estruturam a realidade. Para entender e conhecer essas relações exige-se um método de análise que determina as relações gerais, fundamentais para a obtenção da realidade concreta. Após a análise, resta à busca de uma síntese que irá representar o concreto. Fazendo a transposição desse pressuposto para o trabalho pedagógico, o método deve “permear as relações dinâmicas e dialéticas entre os conceitos, reconstituindo as relações que configuram a totalidade concreta da qual se originaram, de modo que o objeto a ser conhecido revele-se gradativamente [...]” (BRASIL, 2007, p. 42). O currículo integrado deve obedecer esta configuração e os conhecimentos e os processos de ensino e aprendizagem estão em sincronia com sistema de relações de uma totalidade concreta que se pretende interpretar e entender. 43 De acordo com o documento (BRASIL, 2007), o segundo sentido do EMI defende que trabalho, ciência, tecnologia e cultura representem categorias indissociáveis da formação humana, portanto devem fazer parte do núcleo básico do currículo integrado. O trabalho é ponto de partida para a síntese dos conhecimentos e de cultura pelos diferentes grupos sociais. A capacidade de ter consciência de suas necessidades e de arquitetar meios para satisfazê-las, define o seu caráter teleológico do homem de se relacionar com a natureza, uma relação de sobrevivência (como qualquer animal) com consciência e com sua vontade (somente o homem), o que lhe confere liberdade e universalidade, logo produz conhecimentos, que sistematizado e aprovado no meio histórico-social, se transforma em ciência. O trabalho é sempre educativo ou em que condições o trabalho é tortura ou sofrimento. O trabalho pode ser educativo como: [...] atividade ontológica, estruturante do ser social, como um valor extrínseco à vida humana e ao conhecimento, que ele proporciona na relação com a natureza e com os demais. É trabalho como princípio de cidadania, no seu sentido de participação legitima nos benefícios da riqueza social, que se distingue das formas históricas e alienantes, de exploração do trabalhador, presentes na produção humana (CIAVATTA, 2005, p.92). Discute o documento (BRASIL, 2007) que para aprender um conhecimento, devemos conhecer suas relações e isto exige um método, que poderá nos levar as relações gerais, que são determinantes do fenômeno estudado. Quando essas relações estão ausentes ou não conectadas do seu contexto originário, tem-se simplesmente a teoria, isto é, o plano do pensamento, para se constituir um conhecimento, esta teoria deve ser incorporada ao homem na forma de uma força produtiva que lhe beneficie. A ciência é o conhecimento sistematizado e conceituado que representa as relações incorporadas e apreendidas da realidade. O conhecimento tematizado constitui os campos da ciência e em menor escala as disciplinas científicas. Estes conhecimentos científicos podem ser transmitidos ao longo do tempo e podem e devem ser questionados e até superados com o tempo, constituindo um movimento de elaboração e síntese de novos conhecimentos. A tecnologia é considerada como a transformação da ciência em força produtiva e esta tem como objetivo maior a satisfação de necessidades dos homens, logo uma extensão das capacidades humanas. “Podemos definir a tecnologia, então, como mediação entre ciência (apreensão e desvelamento do real) e produção (intervenção no real)” (BRASIL, 2007, p. 44). 44 No documento base do MEC (BRASIL, 2007), a cultura é entendida numa visão Gramsciniana, como norma de comportamento dos indivíduos numa sociedade e como expressão da organização político-econômica dessa sociedade, no que se refere às ideologias que cimentam o bloco social. Constitui o conjunto de representações, comportamentos e processo de socialização de uma comunidade, isto é, o seu modo de vida. Portanto uma formação integrada permite o acesso à ciência e a tecnologia e ao mesmo tempo facilita a reflexão critica sobre os padrões culturais de um grupo social. O terceiro sentido do EMI, de acordo com o documento (BRASIL, 2007), referencia o trabalho como princípio educativo, isto é, o trabalho permeia a relação do homem com a realidade material e social. Significa dizer que o homem constrói conhecimentos (produtor de sua realidade) e por isso pode se apropriar dos seus conhecimentos e transformar a realidade. Não significa dizer “aprender fazendo”, formar para o mercado de trabalho, esta seria uma visão muito reduzida da realidade humana. É estabelecida uma distinção entre trabalho alienado e trabalho produtivo. O primeiro é definido como a atividade que produz algo exterior a si mesmo sendo, portanto, uma atividade exteriorizada e objetivada. Sua característica fundamental consiste no fato de a produção ocorrer não para satisfazer as necessidades do indivíduo e sim as do mercado. O trabalho é atividade humana que produz valor de troca. A produção é direcionada para a necessidade de outras pessoas e o seu produto não pertence ao trabalhador. Este recebe em troca um salário e o transforma em bens de subsistência para sua família. É no regime de assalariado que o trabalho revela a sua essência alienante: uma atividade que produz valor de troca para outro. O próprio homem é convertido em mercadoria e passa a ter valor pela sua capacidade de produzir valor. O homem de sujeito passa a ser objeto daquele para quem trabalha (GONZALES, 1996, p.4). O trabalho como princípio educativo é ter uma formação escolar com conteúdos histórico-científicos incorporados de valores ético-políticos que caracterizam a existência humana. Na visão organizativa, o documento base propõe que o ensino médio integrado deve superar a dualidade EM e EP, projetando uma escola unitária, isto é, garantir num mesmo currículo a aprendizagem dos princípios científicos, tecnológicos, e históricos do mundo moderno e orientar/permitir os alunos à realização de múltiplas escolhas. “Com isso queremos erigir a escola ativa e criadora organicamente identificada com o dinamismo social da classe trabalhadora” (BRASIL, 2007, p.48). O quarto sentido do EMI relata a pesquisa como princípio educativo e sua relação com o trabalho de produção de conhecimento. Aqui a pesquisa atua como ação 45 potencializadora do trabalho como princípio educativo e que contribui para a autonomia dos alunos no sentido de compreender-se no mundo em que vivem e nele atuar, por meio do trabalho e em função das necessidades coletivas do homem, de sua preservação e das gerações futuras. Esta autonomia intelectual deve estar ligada ao ensino e deve estar centrada na pessoa humana (BRASIL, 2007). Prioriza a pesquisa como princípio educativo em toda educação escolar, pois esta incita, estimula e provoca o aluno no campo da curiosidade, gerando a procura do saber e evitando o aprendizado adestrado, apostilado e restrito de saberes, de informações e de visão do mundo em todos os aspectos do cotidiano. Esse comportamento da procura dos saberes, catalisada pela pesquisa na fase inicial do aluno, colabora em faixas etárias e níveis acadêmicos mais avançados na construção de projetos individuais ou coletivos na reconstrução de saberes, sempre num sentido ético na produção de conhecimentos científicos e de construção de tecnologias que estejam comprometidas com a vida coletiva dos homens e a natureza. O último sentido referenciado, no documento do MEC/SETEC (BRASIL, 2007), que orienta o EMI, é o da relação parte-totalidade na proposta curricular. A proposta dos autores é a construção de um currículo amalgamado nos princípios do trabalho, da ciência, da tecnologia e da cultura, tendo os conhecimentos gerais e específicos fundidos, estruturando uma totalidade curricular. O documento base (BRASIL, 2007) orienta [...] que o currículo é sempre uma seleção de conhecimentos a serem ensinados e aprendidos dependendo da finalidade e dos objetivos educacionais. Defendemos aqui a formação integral, plena, completa. Isso não pressupõe, entretanto, que se possa ensinar e aprender “tudo”. A questão é: como podemos proporcionar compreensões globais, totalizantes da realidade a partir da seleção de componentes e conteúdos curriculares? Como orientar a seleção de conteúdos no currículo da formação integrada? A resposta a tais perguntas implica buscar relacionar partes e totalidade (BRASIL, 2007, p.50). O documento base (BRASIL, 2007) referencia Kosik (1978), que considera cada fato ou grupos de fatos pode com maior ou menor grau revelar uma realidade. Pode ser que um fato tenha mais conteúdo para retratar o real, mas a idéia é que para se conhecer o real na sua essência é preciso conhecer e identificar seus fatos que mais retratam este real. É preciso separar o aquilo que constitui a natureza da coisa, o fundamental do secundário, do complemento do acessório. Na construção de um currículo, para fins formativos, o importante 46 é localizar e identificar cada componente do conteúdo desse currículo na perspectiva de um interelacionamento dinâmico sincrônico (o fato ocorre ao mesmo tempo, de forma concomitante e contemporaneamente) e diacrônico (fato observado quanto a sua evolução no tempo) com a intenção de sintetizar com maior amplitude o que se quer conhecer e em qual realidade ele está inserido. Contempla a explanação acima, segundo o documento (BRASIL, 2007) o fato de que o EMI trata de formação profissional e que os conhecimentos típicos de uma determinada área técnica não são capazes de determinar uma compreensão global de uma determinada realidade, devemos buscar conhecimentos da formação geral, ficando claro que os conhecimentos devem estar integrados. Para que ocorra na prática é adequado que conheçamos os conteúdos e problemas de uma área profissional especifica em sua totalidade, isto é, em múltiplas dimensões, como econômica, política, social, cultural e técnica. Assim, estamos construindo conteúdos de ensino sistematizados nas áreas e disciplinas na perspectiva de uma integração, num currículo único, relacionando parte e totalidade, conhecimentos gerais e específicos, contemporaneidade e historicidade. Nessa formatação fica a interdisciplinaridade como o preceito básico de organizar o currículo e como método principal de ensino e aprendizagem. Finalmente o documento que norteia o EMI (BRASIL, 2007) propõe alguns fundamentos para a elaboração de um projeto político-pedagógico integrado. O alicerce primordial de um projeto político-pedagógico é que ele deve ser elaborado de forma coletiva, participativa e democrática. Este projeto deve ser fruto de debates abertos a toda comunidade escolar, amplo, sincero, impessoal e profundo, que expresse as aspirações de toda a comunidade. Deve ser a síntese das decisões que mantém o grupo unido em direção do trabalho coletivo organizado, em ações de coerência entre princípios, finalidades, objetivos e métodos. A adoção da proposta de EM à educação profissional nas escolas deve ser uma medida aprovada pela comunidade, depois de uma decisão madura e coletiva, independente da direção da escola, secretaria de educação ou porque é uma política do MEC. É uma decisão endógena, dos sujeitos escolares, “É preciso que a comunidade escolar se convença da pertinência de implantá-lo e se mobilize para isso” (BRASIL, 2007, p.53). O documenta (BRASIL, 2007) alerta que os aspectos desfavoráveis para a implementação do EMIEP como ausência de condições nas escolas, quadro de professores e a ausência de uma estrutura física adequada, não deve funcionar como empecilhos dar inicio a um projeto de tanta importância para a educação brasileira. A conquista e implantação de tais 47 condições são um desafio e uma tarefa coletiva. O documento apresenta estratégias que possam viabilizar a implantação do EMIEP: Assim, pensamos que a primeira providência para se implantar o ensino médio integrado é a geração de tempos e espaços docente para a realização de atividades coletivas. Por vezes, pode ser pertinente a realização de seminários e encontros com convidados externos, tais como intelectuais e gestores da educação, proporcionando a discussão sobre concepções e políticas, oportunizando a comunidade escolar a apresentação de questões conceituais e operacionais, numa estratégia de envolvimento dos educadores e estudantes com o tema. [...] pois os educadores precisam, no diálogo entre si, perceber que um projeto dessa natureza é necessário e possível na sua escola; que não é “uma ilusão de intelectuais”, ou “uma promoção da secretaria ou do MEC que passará quando chegar à outra gestão” (BRASIL, 2007, p. 54 - 55). Para otimizar essas ações os gestores nacionais e estaduais devem criar medidas que proporcionam uma maior credibilidade aos educadores e medidas que devem ser conquistadas como: a instituição de quadro próprio de professores, com a realização de novos concursos, a consolidação de planos de carreira em que seja prevista a dedicação exclusiva dos professores e a melhoria salarial, a melhoria da estrutura física, material e tecnológica das escolas. As instituições não devem esperar que as condições sejam atingidas plenamente e devem seguir na construção de PPP integrado. Os autores terminam o documento base, orientador da implementação do ensino médio integrado, apresentando os pressupostos que as organizações escolares devem considerar para a elaboração do PPP integrado: não reduzir a educação às necessidades do mercado de trabalho, mas não ignorar as exigências da produção econômica, como campo de onde os sujeitos sociais retiram os meios de vida, construir e contar com a adesão de gestores e educadores responsáveis pela formação geral e da formação específica, bem como da comunidade em geral, articular a instituição com familiares dos estudantes e a sociedade em geral, considerar as necessidades materiais dos estudantes, bem como proporcionar condições didático-pedagógicas às escolas e aos professores, transformar o projeto de formação integrada em uma experiência de democracia participativa e de recriação permanente e resgatar a escola como um lugar de memória (BRASIL, 2007). 48 2 AS DIFERENTES CONCEPÇÕES DE EDUCAÇÃO PROFISSIONAL O debate sobre as finalidades da educação acontece em nosso país e também fora dele. A esse respeito os indivíduos envolvidos com a educação, tanto da rede pública como aqueles que estão inseridos na rede privada estão polarizados em duas visões opostas dos fins da educação e de como atingi-los: de um lado a posição de civil democrática dos autores Marise Ramos, Maria Ciavatta, Gaudêncio Frigotto, Acácia Zeneida Kuenzer, Paul Singer, Demerval Saviani e Neise Deluiz e de outro lado a posição produtivista, dos autores com uma visão mercadológica da educação como Cláudio Moura Castro, Ruy Leite Berger Filho, João Batista de Araujo e Oliveira, André Médici e Jorge Tejada e os organismos internacionais como Banco Mundial (BIRD), Banco Interamericano (BID) e Fundo Monetário internacional (FMI). Para Singer (1996), as duas visões valorizam a educação como meio de melhorar a sociedade, mas as concepções de como a sociedade e a economia funcionam que identificam cada visão, são muito diversas e em legados ideológicos opostos. O autor alerta que “cumpre observar que há outras visões de educação além das duas aqui esquematizadas, mas que porém são atualmente ofuscadas pelo grande debate em andamento” (SINGER, 1996, p.6). Neste capítulo, discutiremos as principais concepções e projetos de educação profissional técnica de nível médio integrado ou não ao ensino médio, fruto de um processo histórico de disputas político-ideológicas empreendidas no âmbito da sociedade brasileira. 2.1 AS CONCEPÇÕES DA EDUCAÇÃO: VISÃO CIVIL DEMOCRÁTICA E A VISÃO PRODUTIVISTA De acordo com Singer (1996) a posição civil democrática é aquela que concebe a educação como a condição necessária ao processo de formação do cidadão, na perspectiva dos exercícios dos direitos e dos deveres em um Estado democrático. O educando das classes desprivilegiadas é o alvo desse tipo formação e tem como intenção, além de instrumentos intelectuais, profissionais e culturais, a construção de uma consciência e motivação, que lhe permita o engajamento em movimentos coletivos com o objetivo de tornar a sociedade mais democrática e igualitária. A visão democrática da educação não separa a formação do cidadão da formação profissional, pois pretende formar o indivíduo para os diferentes campos da vida adulta: profissional, familiar, esportiva, etc. No processo educativo é valorizada a autonomia do 49 educando, a sua capacidade de auto-educar-se e o respeito pelo desejo de aprender ao longo de sua vida. Singer (1996) explicita que a visão oposta é a denominada Produtivista. Essa visão compreende a educação com o intuito de preparar o indivíduo para o mercado de trabalho. Não descarta os demais propósitos da educação, mas enfatiza os benefícios competitivos que os indivíduos, ao adquirirem conhecimentos, possam lograr no mercado de trabalho. Para esta concepção de educação, o bem- estar de todos representa a soma dos ganhos de cada indivíduo: chamada pelos economistas de acumulação de capital humano. Conforme Singer (1996), cada indivíduo é visto como uma capacidade produtiva potencial, que para ser educado exige esforço próprio, familiares e de seus instrutores, esse esforço tem um custo, que pode ser contabilizado em termos de dinheiro ou capital. Este dinheiro representa o valor do capital humano de que cada indivíduo dispõe para desenvolver sua capacidade produtiva. A Teoria do Capital Humano afirma que uma maior escolarização contribui diretamente para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos, em função de um aumento de renda que decorre, diretamente, da sua melhor qualificação para o desempenho no mercado de trabalho. Em outras palavras, o incremento da produtividade – decorrente do aumento da capacitação – levaria a que o indivíduo também se beneficiasse pelo aumento dos seus salários (OLIVEIRA, 2002, p.28). Nesta visão, a educação levaria a um aumento da produtividade ajudando para a elevação do produto social e a eliminação da pobreza. As duas visões valorizam e concordam que a educação pode melhorar a sociedade. Mas discordam como a sociedade e a economia funciona e possui legados ideológicos distintos. Os conceitos teóricos utilizados na presente pesquisa se pautam na visão civil democrática, por acharmos que ela representa a corrente de que a educação é dever da família e do Estado, na busca de conhecimentos construídos e vividos pela humanidade e com o acesso à cultura. Inspirada nos princípios de liberdade e de solidariedade, preparando o indivíduo para a cidadania e para o trabalho, conforme art. 2º da LDB. 2.2 A INTEGRAÇÃO ENTRE O ENSINO MÉDIO E A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NA VISÃO CIVIL DEMOCRÁTICA As diferentes concepções de educação profissional variam conforme o tipo de abordagem utilizada. Nas concepções dos autores que buscam ordenar e argumentar os 50 conhecimentos científicos, tecnológicos e sociais com os conhecimentos do mundo do trabalho, a concepção de ensino médio deve ser politécnico ou tecnológico. Nesta visão a educação básica (fundamental e média) deve ser unitária, portanto não dualista, que articule cultura, conhecimento, tecnologia e trabalho como direito de todos e condição da cidadania e da democracia (FRIGOTTO; CIAVATTA; RAMOS, 2005). Nesse modelo, deve-se evitar a forma do saber fragmentado que leve a formação de um trabalhador do tipo “cidadão produtivo”, adaptado, adestrado, treinado para a sua inserção no mercado de trabalho. Uma educação integrada deve levar a formação de cidadãos com capacidade de atinar e interpretar a realidade social, econômico-política e cultural do mundo em que vivem, buscando superar o imediatismo do mercado de trabalho. De acordo com Ramos (2007), o modelo apresentado deve apresentar: [...] uma educação que, ao propiciar aos sujeitos o acesso aos conhecimentos e à cultura construídos pela humanidade, propicie a realização de escolhas e a construção de caminhos para a produção da vida. Esse caminho é o trabalho. O trabalho no seu sentido mais amplo, como realização e produção humana, mas também o trabalho como práxis econômica. Com isto apresentamos os dois pilares conceptuais de uma educação integrada: um tipo de escola que não seja dual, ao contrario, seja unitária, garantindo a todos o direito ao conhecimento; e uma educação politécnica, que possibilita o acesso à cultura, a ciência, ao trabalho, por meio de uma educação básica e profissional (RAMOS, 2007, p. 2-3). Para a autora dois pilares conceituais sustentam a educação integrada: um tipo de escola unitária que garanta a todos o direito do conhecimento e uma educação politécnica8, que possibilita o acesso à cultura, a ciência, ao trabalho, por meio de uma educação básica e profissional. Ramos (2007), propõe a integração do Ensino Médio e a Educação Profissional mediante três eixos norteadores que se complementam: a) omnilateralidade, b) a indissociabilidade entre a educação profissional e educação básica e c) a integralidade dos conhecimentos gerais e específicos como totalidade. A seguir descreveremos cada eixo citado. O primeiro sentido da integração pressupõe a formação humana omnilateral que implica na integração das dimensões fundamentais da vida que estruturam a prática social: o trabalho, a ciência e a cultura. O trabalho compreende a ação humana de interação com a 8 Politecnia significa uma educação que possibilita a compreensão dos princípios científico-tecnológicos e históricos da produção moderna, de modo a orientar os estudantes à realização de múltiplas escolhas. 51 realidade para a satisfação de necessidades, produção e criação de liberdade com suas lutas e conquistas pelo conhecimento, portanto o trabalho educa. A formação omnilateral deve superar a histórica vinculação mediada ou imediata com o mercado de trabalho e tornar os sujeitos o centro das finalidades dessa etapa da educação básica. O projeto deve estar centrado no desenvolvimento do estudante como sujeito de desejos, necessidades e potencialidades. A ciência compreende os conhecimentos produzidos pela humanidade, em processo mediado pelo trabalho, que se tornam legitimamente válidos de uma realidade, na busca de superar as suas necessidades. Compreende o resultado de um processo na busca da compreensão e transformação dos fenômenos naturais e sociais. A cultura deve se entendida como diferentes formas de criação e corresponde aos valores éticos, morais, simbólicos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade. Os conhecimentos de um tempo e de um grupo social possibilitam o avanço de uma sociedade. Compreender a relação indissociável entre trabalho, ciência e cultura significa compreender o trabalho como princípio educativo, o que não se confunde com o “aprender fazendo”, nem é sinônimo de formar para o exercício do trabalho. Considerar o trabalho como princípio educativo equivale dizer que o ser humano é produtor de sua realidade e, por isto, se apropria dela e pode transformá-la. Equivale dizer, ainda, que nós somos sujeitos de nossa história e de nossa realidade. Em síntese, o trabalho é a primeira mediação entre o homem e a realidade material e social (RAMOS, 2007, p.4). A formação omnilateral implica em garantir o direito a acesso aos conhecimentos, sobre uma base unitária que sintetize humanismo e tecnologia. Com finalidades ampliadas, entre as quais se incluem a preparação para o exercício de profissões técnicas, a iniciação científica, ampliação cultural e o aprofundamento dos estudos. Um projeto assim vai além de pensar o trabalho apenas como prática produtiva é pensar o trabalho como princípio educativo. Para Ramos (2007), o trabalho como princípio educativo no ensino médio, tem um duplo sentido: proporciona ao aluno a compreensão do processo histórico da produção científica e tecnológica para a transformação das condições da vida e a ampliação das capacidades, potencialidade e dos sentimentos humanos e colocar exigências específicas para o processo educativo, com o objetivo de inserir o aluno no trabalho socialmente produtivo. Este é o exercício produtivo que difere de uma formação profissionalizante, formar para o trabalho ou para o mercado. 52 O trabalho como princípio educativo, organiza a base unitária do ensino médio integrado a educação profissional e evita um ensino enciclopédico, rápido e adestrado que não permite aos alunos estabelecer relações sólidas entre a ciência e a realidade do dia a dia. Por fim é princípio educativo, porque leva ao entendimento “[...] que todos nós somos seres de trabalho, de conhecimento e de cultura e que o exercício pleno dessas potencialidades exige superar a exploração de uns pelos outros” (RAMOS, 2007, p.9). No aspecto organizacional, o ensino integrado não ocorreria juntando-se a mecanicamente ao currículo as disciplinas técnicas, ou de iniciação a ciência ou atividade culturais. Estes componentes serão desenvolvidos de forma integrada aos diversos conhecimentos, tendo o trabalho, o princípio educativo integrador de todas as dimensões mencionadas. A formação integrada deve formar um educando trabalhador de desenvolvimento multilateral que domine princípios e fundamentos da prática produtiva moderna. É preciso um esforço de toda comunidade escolar, pois Sabemos que não se trata de uma proposta fácil; antes, é um grande desafio a ser construído processualmente pelos sistemas e instituições de ensino, visando a práticas curriculares e pedagógicas que levem à formação plena do educando e possibilitem construções intelectuais elevadas, mediante a apropriação de conceitos necessários à intervenção consciente na realidade. Uma política de ensino médio integrado nessa perspectivas visaria fomentar estimular e gerar condições para que os sistemas e as instituições de ensino, com seus sujeitos, formulassem seus projetos em coerência com as suas necessidades e visando à consecução de finalidades universais postas para esta etapa de educação (Ramos, 2007, p.10). O segundo sentido da integração está relacionado com a indissociabilidade entre a educação profissional e a educação básica. O ensino médio com a educação profissional técnica, constituirão um único curso, tendo as concepções de uma educação unitária (ensino de formação integral – geral e técnica, na perspectiva da superação da dualidade escolar) e de educação politécnica ou tecnológica como fundamentos doutrinários. Fica garantido o direito à educação básica e a formação para o exercício profissional. Para Ramos (2007), este sentido deve garantir: integração de conhecimentos gerais e específicos, construção do conhecimento pela mediação do trabalho, da ciência e da cultura, utopia de superar a dominação dos trabalhadores e construir a emancipação na formação de dirigentes. A formação profissional dos alunos devera ser mediada pelo conhecimento e não apenas como uma política compensatória ou para atender o mercado de trabalho. A autora alerta que esta formação não pode ser confundida com o ensino 53 profissionalizante instituído pela Lei no. 5.692/71 (BRASIL, 1971), tanto por seus propósitos quanto pelo seu conteúdo. O terceiro e último sentido está relacionado com a integração dos conhecimentos gerais e específicos configurando um único currículo. A autora considera que nenhum conhecimento específico é definido como tal se não consideradas as finalidades e o contexto produtivo em que se aplicam. Afirma ainda que, os conhecimentos específicos, profissionalizantes, devem estar vinculados com as teorias gerais do campo científico em que foi formulado, pois só assim teremos um profissional bem formado. Para a autora o positivismo nos levou a acreditar ao longo da história que “[...] o professor da educação básica ministra as teorias gerais, enquanto o professor de formação técnica ministra as suas aplicações” (RAMOS, 2007, p.16). Insiste que a teoria deve estar sincronizada dinamicamente com a realidade e do potencial produtivo: Como teoria separada da realidade concreta torna-se abstrata, vazia. Podemos afirmar, então, que um conhecimento de formação geral só adquire sentido quando reconhecido em sua gênese a partir do real e em seu potencial produtivo. Esta última característica normalmente é considerada somente quando tratamos de conhecimentos da formação específica, com o objetivo profissionalizante. É preciso rever essas concepções (RAMOS, 2007, p.17). A vinculação do conhecimento geral com a sua força produtiva garante a compreensão dos fenômenos reais e remete ao trabalho o poder de educar, Istoé, ter o trabalho como princípio educativo. Na organização curricular, três pressupostos filosóficos são fundamentais: o trabalho como mediador na produção de conhecimentos, a realidade concreta é uma totalidade, sínteses de múltiplas relações e o processo do conhecimento implica, após a análise, elaborar a síntese do concreto. “o conhecimento não é de coisas, entidades, seres, etc, mas sim das relações que se trata de descobrir, apreender no plano do pensamento” (RAMOS, 2007, p.21). O trabalho como princípio educativo e a escola unitária fazem parte da proposta de educação de Antonio Gramsci. Esse pensador criticava o sistema dual na educação italiana, isto é, a existência de dois tipos de ensino: a escola humanista e as escolas particulares de diferentes níveis. A primeira destinada a desenvolver a cultura geral dos indivíduos da classe dominante e a segunda prepara os alunos, das classes sociais dominadas para o exercício de 54 profissões. A escola unitária se contrapõe à escola dual, na qual os percursos escolares são definidos a partir da origem de classe social (escola de rico x escola de pobre). Para Gramsci, a escola unitária seria de cultura geral, humanista, formativa, que equilibrasse equanimente o desenvolvimento da capacidade de trabalhar manualmente (técnicas industriais) e o desenvolvimento das capacidades de trabalho intelectual. Desta forma a educação poderia atingir todos os indivíduos sem distinção de classe. A idéia era que todo o cidadão pudesse se tornar um dirigente. Gramsci defende as idéias de Marx a respeito da omnilateralidade, através da realização e emancipação do homem através do trabalho: o trabalho alienado, exterior ao homem, que satisfaz as necessidades do mercado e o trabalho produtivo, interior ao homem, que identifica o homem com a natureza e leva ao homem a desenvolve-se a si mesmo. A politecnia é um conceito da concepção pedagógica que considera o homem como ser social e omnilateral. Para Ciavatta (2005), o tema da formação integrada coloca em discussão o tipo e a qualidade da educação brasileira: educar a todos ou uma minoria, considerada mais apta ao conhecimento? Que tipo de educação deve ser dada de modo a atender as necessidades da sociedade? A formação integrada deve superar o ser humano dividido historicamente pela divisão social do trabalho entre ação de executar de um lado e pensar, dirigir ou planejar de outro. O modelo integrado deve superar um ensino simplificado com o objetivo de preparar o aluno para o setor produtivo, sem os conhecimentos científico-tecnológico e na sua apropriação histórico-social. Para a autora o termo formação integrada, formação politécnica e educação tecnológica representam um aprendizado que responde as necessidades do mundo do trabalho, plasmando os conhecimentos da ciência e da tecnologia com as condições da maioria da população excluída, relegada as atividades precarizadas, ao subemprego, ao desemprego, à perda dos vínculos comunitários e da própria identidade. Face à realidade e às possibilidades da educação profissional, tal como existe em nosso sistema educacional, a autora apresenta alguns pressupostos para sua realização como formação integrada e humanizadora: O primeiro pressuposto é a existência de um projeto de sociedade que enfrente os problemas da realidade brasileira, que se manifesta numa corrente (governo, secretarias de educação, gestores das escolas e professores) de romper com a inércia política e superar a ótica mercadológica da educação. 55 O segundo pressuposto é a de normatizar em lei a articulação entre Ensino Médio de formação geral e a educação profissional em todas as suas modalidades, visando o seu suporte orçamentário. O terceiro pressuposto é a adesão de gestores e de professores responsáveis pela formação geral e pela formação especifica na construção de um projeto coletivo e estratégico que integre os conhecimentos gerais e específicos. O quarto pressuposto envolve a articulação da instituição com os alunos e os familiares através de um diálogo e conscientização sobre as próprias expectativas e sua possível realização com: auxílios aos alunos carentes e infra-estrutura adequada a uma formação integrada e humanizadora. O quinto pressuposto diz respeito às práticas da democracia participativa, através de uma ação coletiva que busque “professores abertos à inovação, disciplinas e temas mais adequados à integração” (op. cit. p. 101) e deve articular processos criativos entre arte e ciência o que capacita os alunos autonomia face ao mundo do trabalho e para ter condições de dar continuidades aos estudos. No sexto pressuposto enfatiza o resgate da escola como um lugar de memória, das lembranças de seus personagens e de momentos mais expressivos. No último pressuposto a autora defende a garantia de investimentos na educação. A boa educação e serviços públicos decentes exigem investimentos públicos da União, Estados e municípios. Na avaliação da pesquisadora, o Decreto 5.154/04 (BRASIL, 2004a) trouxe a abertura e o estímulo à formação integrada, mas não trouxe a garantia de investimentos para a sua implementação e por isso defende que os recursos para a educação profissional devam está previstos na Constituição Federal na forma de lei. Frigotto (2005) endossa as reflexões de Ciavatta (2005) ao afirmar que a formação integrada deve ser “[...] unitária, politécnica e, portanto não dualista que articule cultura, conhecimento, tecnologia e trabalho como direito de todos e condição da cidadania e da democracia efetivas” (p. 74), dando condições ao cidadão de superar a histórica dualidade do ensino que, por décadas, segregou a formação dos indivíduos. Saviani (2006, p.161) contribui para a reflexão feita pelos autores citados ao considerar que o parâmetro norteador de uma organização do ensino médio deve ser o de “[...] propiciar aos alunos o domínio dos fundamentos das técnicas diversificadas utilizadas na produção, e não mero adestramento em técnicas produtivas”. A priorização da formação de politécnicos e não de polivalentes (formação de técnicos especializados) é baseada nas reflexões de educação politécnica de Karl Marx. 56 Saviani (2006) enfatiza que este tipo de ensino médio integrado tem como objetivo quebrar os antigos modelos de uma educação, de um lado, tecnicista e voltada para a formação de trabalhadores para atender o mercado capitalista e, de outro, uma formação científica e com uma única função: preparar jovens para o ingresso nas universidades por meio de um projeto curricular emancipador, capaz de propiciar aos indivíduos uma socialização crítica dos conhecimentos. Kuenzer (2006) traz um aspecto relevante à discussão ao afirmar que a importância do ensino médio integrado a educação profissional deve ser priorizada como política de Estado. Para a autora é o reconhecimento do papel estratégico desempenhado pela educação e a produção do conhecimento científico-tecnológico e sócio-histórico no processo de construção de uma sociedade de novo tipo, que demanda processos educativos articulados entre a formação humana e sociedade, na perspectiva da autonomia crítica, ética e estética. Sociedade fundada na justiça social com a participação de todos na produção, na fruição produzida, na cultura e no poder. Para a autora é preciso clarear e diferenciar alguns conceitos para a formação integrada. Como exemplo cita as categorias polivalência e politécnica. A polivalência é uma terminologia utilizada pelo mercado de trabalho para caracterizar a flexibilidade (multifuncional), que determina que os trabalhadores possam e devem ter a capacidade de atuação em diversos postos de trabalho, ultrapassando a rigidez do taylorismo/fordismo, que se caracteriza pela especialização/treinamento em uma única função dentro de uma fábrica. De acordo com Deluiz (2004) as noções estruturantes do modelo das competências no mundo do trabalho são a flexibilidade, a transferibilidade, a polivalência e a empregabilidade. Para o capital, a gestão por competências implica em dispor de trabalhadores flexíveis para lidar com as mudanças no processo produtivo, enfrentar imprevistos (incidentes/eventos) e passíveis de serem transferidos de uma função a outra dentro da empresa requerendo-se, para tanto, a polivalência e a constante atualização de suas competências, o que lhes dá a medida correta de sua "empregabilidade". Kuenzer (1998) assevera que a politecnia ultrapassa a preparação para as ocupações do mercado e da educação geral baseadas nas áreas de conhecimento obturadas e autônomas. A concretização da politecnia ocorrerá somente através de uma nova estrutura curricular, com o trabalho como princípio organizador, onde os conteúdos se articulam enquanto totalidade, eliminando a fragmentação e autonomização das disciplinas. Frigotto (2006) defende uma educação técnico-profissional, para o ideário de uma sociedade de democrática, que tenha como pressuposto mínimo a universalização do ensino 57 de segundo grau politécnico (ou tecnológico em sentido dado por Gramsci), unitário, universal e público. Trata-se de uma formação que desenvolva o mais elevado domínio do avanço tecnológico, forneça as bases unitárias das ciências da natureza e das ciências humano-sociais, permitindo a cada aluno, não apenas dominar o avanço técnico existente como consumidores daquilo que os centros hegemônicos produzem, mas de criar conhecimento novo e, por fim, o desenvolvimento da capacidade crítica para que cada alunocidadão possa discernir o serviço de que e de quem está à tecnologia, a ciência e influenciar para sua democratização. O autor sustenta que a formação técnica e profissional deve buscar construir relações solidárias, democráticas e socialistas não apenas para o futuro, mas para o presente e as bases dessas relações devem estar configuradas no desenvolvimento omnilateral das capacidades humanas em oposição ao desenvolvimento unilateral e fragmentário hoje reinante. Para Frigotto (2006) a construção de um novo industrialismo, orgânico e unitário: É importante reafirmar que não se trata de negar o avanço científico e tecnológico nem processos de globalização democráticos. Trata-se de entender que o ser humano não se forma, não se produz, não se educa, a não ser limitadamente, dentro de um industrialismo excludente e inorgânico. Em termos gramscianos trata-se de construir um industrialismo de novo tipo, orgânico e cujo objetivo é responder às múltiplas necessidades humanas. Não se pode criar uma escola e processo de formação técnica e profissional de qualidade e democráticos numa sociedade profundamente excludente, desigual e, portanto antidemocrática. A tarefa precípua é, pois, de afirmar os valores de efetiva igualdade, qualidade para todos, solidariedade e da necessária ampliação da esfera pública democrática em contraposição à liberdade e qualidade para poucos regulados pelo mercado e das perspectivas do individualismo e do privatismo (FRIGOTTO, 2006, p.13). Frigotto (2006) focalizando as políticas de educação escolar e de formação técnico-profissional, que se consolidaram na hegemonia neoliberal, assinala que o objetivo foi à produção das qualificações necessárias ao funcionamento da economia nos setores restritos que exigem trabalhos complexos, aumento da formação para o trabalho simples e a formação de quadros para a produção e a propagação da pedagogia da hegemonia9. A prática era produzir um pacote de competências adequadas à formação do ‘cidadão produtivo’ ajustado 9 Refere-se à produção dos intelectuais para a pedagogia da hegemonia, cursos superiores, especialmente os de economia, engenharia, direito e administração com o objetivo de criar uma gerência do pensamento para a produção da consciência neoliberal (FRIGOTTO, 2006). 58 técnica e socialmente às demandas do capital. “Um cidadão que acredite que a ele não compete ser sujeito político” (FRIGOTTO, 2006, p. 266). O autor complementa que a nova política educacional denominada de ensino médio integrado deve se constituir num projeto de desenvolvimento com justiça social, na busca da igualdade, cidadania e democracia e ao mesmo tempo, responda, aos anseios da nova base científico-técnico na produção de natureza digital-molecular, que imprime grande velocidade à competição e conhecimentos obsoletos, preparando para dignamente o trabalho complexo. Para a visão civil democrática a educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio deve ser ofertados visando os melhores resultados pedagógicos e permitir com qualidade o papel de criação de aprendizagens que permitam aos alunos desenvolver as capacidades de conhecimentos relativas ao trabalho intelectual, sempre articulada e integrada, mas não reduzida, ao mundo do trabalho e das relações sociais. 2.3 A EDUCAÇÃO TÉCNICO-PROFISSIONAL NA VISÃO PRODUTIVISTA Na visão produtivista, a educação atende as demandas do mercado de trabalho. A produção educacional está articulada, subordinada e controlada às necessidades estabelecidas pela produção. Focando simplesmente nas demandas do mercado, a formação técnicoprofissional, admite apenas uma concepção unidimensional, se afastando dos planos social, cultural, ético-político, lúdico e estético da educação. Resultando concepções e práticas dualistas, fracionadas, separando a formação geral da específica. Na perspectiva produtivista os conceitos de formação, qualificação ou de competência está subalterno a lógica unidimensional da produção e do mercado. A formação é um processo de escolarização, necessário ao processo de trabalho, a qualificação está relacionada às exigências ligadas ao emprego ou experiência profissional e “por fim, a competência explicita-se pela capacidade de mobilizar conhecimentos, saberes, atitudes, tendo como foco os resultados” (FRIGOTTO, 2006, p.8). Com referência ao plano pedagógico, assevera o autor que o projeto executa a separação da formação geral da formação técnica e profissional especifica, levando a uma formação abstrata e polivalente ou uma escola que tenha a função de preparar ou requalificar para a empregabilidade através da formação técnica modular com menor duração e com currículos tecnicistas e reducionistas. O MEC, através da Secretaria Nacional do Ensino Técnico (Senete), elaborou em 1991, a proposta do Sistema Nacional de Educação Tecnológica. Tomando como o modelo os 59 países do primeiro mundo (detentores de tecnologia de ponta) o projeto defendia investimentos na formação e no desenvolvimento de recursos humanos, condição necessária para colocar o Brasil num novo patamar de desenvolvimento. Com a criação da Secretaria de Educação Média e Tecnológica (Semtec), o projeto serviu de orientação para a elaboração dos projetos de reformas do ensino médio e técnico, principalmente o Decreto no. 2.208/97(BRASIL, 1997a). A proposta configurou um ensino médio separado da formação acadêmica da educação profissional, aproximando-se muito mais dos interesses imediatista do setor produtivo “e das recomendações dos órgãos internacionais do que das perspectivas democráticas inerentes aos projetos defendidos pelas entidades as sociedade civil” (MANFREDI, 2002, p.119). O modelo brasileiro adotado é uma tendência que se aproxima da educação secundária argentina e, de forma espacial, da israelense, vinculada organicamente a produção: A estrutura educacional e o modelo de oferta têm que ser construídos de forma bastante flexível para atender a diferentes situações no tempo e no espaço, considerando tanto as rápidas mudanças tecnológicas e as necessidades da vida cidadã como as tendências regionais e do mercado internacional. [...] grande parte dos perfis profissionais propostos pelo setor produtivo apresenta características muito vinculadas à formação geral do trabalhador, no sentido de que ele tem que ter uma forte base humanística, científica e tecnológica e competências para tomada de decisão, para o trabalho em grupo e para se adequar às constantes mudanças que se processam no mundo do trabalho (BERGER FILHO, 1999, p.3). Para Berger Filho (1999) o Brasil rompeu com um modelo que preconizava a solução conciliatória entre os objetivos de preparar para o ensino superior e a formação para o trabalho num ensino de segundo grau profissionalizante. A educação profissional foi definida como complementar a educação básica e ao mesmo tempo terminal, que deve qualificar os jovens e adultos com capacidades e habilidades gerais e específicas para o exercício de atividades produtivas. Conforme Manfredi (2002) os empresários industriais brasileiros dos setores mais dinâmicos e modernos (CNI e FIESP), devido aos desafios decorrentes dos processos de modernização produtiva e de globalização econômica, tem defendido posições muito sintonizadas e articuladas no campo da educação. Os empresários citam um triplo desafio: renovar e transformar os sistemas de formação profissional, assumir uma postura mais ativa na superação dos baixos níveis de escolaridade e de analfabetismo na sociedade brasileira e 60 enfrentar o descompasso entre a formação geral executada pela escola e aquela exigida pelos processos de modernização produtiva. Manfredi (2002) cita o documento Custo Brasil: agenda no Congresso Nacional, em que os empresários recomendam um aumento da educação básica, melhoria qualitativa da escola pública e da reformulação e ampliação do sistema de ensino profissional, sem questionar sua dualidade. O projeto defende uma maior integração entre a educação formal e o sistema produtivo e atribuem o caráter indispensável da educação como condição geral de produção para o desenvolvimento do capitalismo da atualidade. O projeto dos empresários se aproxima das concepções do sistema de educação tecnológica do MEC, daquela época, resguardando seus níveis de autonomia na gestão do sistema S. Para Santos e Fidalgo (2007), a preocupação central do patronato no Brasil é com o baixo nível de escolaridade da População Economicamente Ativa (PEA) quando comparado com o já conquistado por outros países, sejam desenvolvidos ou emergentes, tais como os chamados “tigres asiáticos10”. Países que atingiram altos índices de crescimento econômico, devido às reformas educacionais implementadas. Os documentos empresariais afirmam que a década de 1980 foi possível a utilização de uma mão-de-obra com baixo nível de qualificação, os novos tempos estariam indicando a necessidade de uma forte elevação do nível de escolarização, de modo a permitir que os trabalhadores acompanhem os processos de trabalho em contínua mutação (SANTOS e FIDALGO, 2007, p.76). O objetivo da escolarização básica seria o desenvolvimento de habilidades fundamentais, como: ler e interpretar a realidade, expressar-se adequadamente, saber trabalhar em grupos na resolução de problemas, saber lidar com os conceitos matemáticos e científicos. A Confederação Nacional das Indústrias (CNI) recomenda que a educação básica deva revisar seu currículo a fim de contemplar o ensino de idiomas, especialmente o inglês e o espanhol, justificando que tais idiomas compõem os novos requisitos exigidos pelas inovações tecnológicas e pela integração internacional. Recomenda que as escolas devam fornecer conhecimentos relacionados com os conceitos de qualidade e produtividade e orientar os alunos na escolha profissional e na compreensão do seu papel social. Para Manfredi (2002), os empresários da indústria se posicionam em favor do aumento da escolaridade básica, da melhoria qualitativa da escola pública de nível 10 Hong Kong, Coreia do Sul, Singapura e Taiwan. 61 fundamental e da reformulação e ampliação do atual sistema de ensino profissional, não questionando sua natureza dual. Com relação à educação desenvolvida no âmbito das empresas, o patronato mantém sua reserva de domínio, renovando e ampliando os convênios com as entidades por eles gerenciadas, o sistema S. Os empresários a partir dos anos noventa, com os desafios decorrentes dos processos de globalização econômica e modernização produtiva: [...] ingressaram nessa década tendo de enfrentar um triplo desafio: renovar e transformar os sistemas de formação profissional do qual sempre se ocuparam; assumir um papel mais ativo na superação dos baixos níveis de escolaridade e de analfabetismo (endêmicos na sociedade brasileira); e, ainda, enfrentar o descompasso existente entre a formação geral e aquela exigida pelos processos de modernização produtiva e de globalização da economia (MANFREDI, 2002, p.122-123). O documento Custo Brasil: agenda no Congresso de 1996 determina a necessidade de se desenvolverem políticas que visem aumentar o nível de escolaridade e afirma que: “a educação escolar básica e universal, alem de ser condição fundamental para a geração de uma força de trabalho com consciência de sua cidadania, tem, também, impacto decisivo sobre a distribuição de renda”. O documento orienta as principais ações para a educação básica e tecnológica no Brasil (MANFREDI, 2002). Segundo Santos e Fidalgo (2007), até a década de 1980 foi possível a utilização de uma mão-de-obra com baixo nível de qualificação, mas com as modificações do sistema produtivo, devido à onda de inovações tecnológicas, estariam indicando a necessidade de uma forte elevação do nível de escolarização de modo a permitir que os trabalhadores acompanhem os processos de trabalho em contínua mutação. O trabalhador deixa de ser um executor de tarefas fragmentadas e passa a participar ativamente do conjunto da produção. A reestruturação das empresas e na organização do trabalho provoca o deslocamento do conceito de qualificação em direção do conceito de competências. Para Ramos (2006), diante dessas mudanças, a competência, passa ser o novo paradigma que vai orientar e nortear a formação de trabalhadores: Com a competência tomam lugar o saber-fazer proveniente da experiência, os registros provenientes da história individual ou coletiva dos trabalhadores, ao lado dos saberes mais teóricos tradicionalmente valorizados na lógica da qualificação. Enfim, fundamentada sobre a valorização da implicação subjetiva no conhecimento, ela desloca a atenção para a atitude, o comportamento e os sabres tácitos dos trabalhadores (RAMOS, 2006, p. 66). 62 A noção de competência se torna mais abrangente do que a qualificação, envolvendo as experiências adquiridas na vida, trabalho e o conhecimento formal adquirido na escola. Na qualificação o processo é preciso e terminal, a aquisição de competências é complexa, longa e necessita de uma ampla base de educação geral. Para Ferreti (1997), o modelo de competências provoca mudanças na formação profissional: fortes demandas por qualificação atualizada e contínua, destinadas a um contingente maior de trabalhadores e não apenas aos ocupantes de postos-chaves, introduzindo as inovações tecnológicas na formação complementar com cursos de especialização, atualização e complementação. Há, segundo o autor, uma progressiva extinção da modalidade de aprendizagem, à concentração de esforços na formação de técnicos, à instalação de cursos de curta duração e ao investimento em atividades de assessoria técnica a empresas. É o modelo de competências que vai dizer que capacitação precisa o trabalhador para cada situação, quantidade e por quanto tempo, tendo como objetivos racionalizar, otimizar e adequar a força de trabalho às demandas do sistema produtivo. Ramos (2006), considera que a competência não substitui a qualificação. O que ocorre é um deslocamento conceitual, pois a competência tanto reforça quanto nega as dimensões existentes no conceito de qualificação. Para Santos e Fidalgo (2007) o empresariado tem interesse em torno da educação informal e propõe inclusive a sua intervenção direta nas instituições do sistema educacional: na gestão administrativa e financeira da unidade escolar quanto nos conteúdos a serem trabalhados em sala de aula. [...] a educação e a formação profissional devem desenvolver a capacidade empreender, habilidade hoje elementar tanto para o desempenho profissional nos processos de trabalho como para responder as necessidades das pessoas de gerenciar sua própria vida e, por vezes, seu próprio negócio. Compreendem que são eles, os empresários, por conhecerem dos desafios da arte do empreendimento, os únicos que saberiam realmente colocar nos trilhos o sistema educacional adequando-o ao sistema produtivo (SANTOS e FIDALGO, 2007, p.123). Na visão de Santos e Fidalgo (2007), em virtude da baixa escolaridade dos trabalhadores brasileiros, uma das estratégias de adaptação da força de trabalho aos novos requisitos de qualidade e produtividade impostos pelo paradigma da flexibilidade, é o 63 reconhecimento dos saberes adquiridos na educação formal11 e não formal12. Quando a educação formal não é suficiente, as competências poderiam ser adquiridas nas empresas, no próprio local de trabalho. Nesse quadro, estaria se criando outra estratégia de reconhecimento de experiências e de saberes adquiridos, o local de trabalho. A certificação dos indivíduos seria a certificação de competências. O quadro abaixo mostra as alterações da formação profissional associada à passagem de uma economia tradicional para a nova economia. Tabela 2 – ECONOMIA X ALTERAÇÕES NA BASE DA FORMAÇÃO PROFISSIONAL ECONOMIA ALTERAÇÕES NA NOVA ECONOMIA TRADICIONAL FORMAÇÃO Baixa profissionalização e altos Diferenciação nas profissões e Diversificação dos programas salários nos salários de formação Organização alta, burocrática Organização baixa, com ênfase Valorização da certificação e e hierarquizada na flexibilidade funcional competência laboral Fragmentação e polarização da Ocupação em massa e padronizada força de trabalho, com um Formação generalizada, porém núcleo estável e a maior parte com diferenciação por funções instável Redução dos graus de Divisão entre administração e diferenciação entre níveis de Especialização trabalho na produção gerencia, formação multidisciplinar supervisão e flexível e produção A maior parte dos trabalhadores recebe uma formação mínima sobre o trabalho Formação orientada pela demanda de força de trabalho, com uso de programas públicos de formação Formação como investimento nacional, sendo o Estado um ator estratégico 11 Conforme a LDB constitui a educação básica: a infantil, ensino fundamental e o ensino médio. Processo educacional regulado por leis que orientam a organização de instrução e do ensino ministrados por estabelecimentos de ensinos autorizados. 12 Pode ser entendida por um tipo de educação que pode ocorrer em diferentes espaços formativos com o objetivo do desenvolvimento humano. 64 Fonte: (SANTOS E FIDALGO 2007 apud POCHMANN, 1999-2000, p.62). O Brasil apresenta três categorias de oferta para o ensino profissional: a formação acoplada à escola acadêmica (escolas técnicas), a formação constituída por um conjunto complexo, organizado e operado pelas organizações patronais e financiado por um tributo na folha salarial (sistema S) e um conglomerado de cursos, não formais e invisíveis (cursos informais). Os referidos cursos são uma colcha de retalhos, desarticulados, funcionando com grandes variedades de financiamentos e operadores. Mas que acaba sendo eficaz “a lógica do mercado leva à oferta dos treinamentos de que a sociedade necessita – menos no caso das escolas técnicas” (CASTRO, 2009, p.163). Castro é um opositor das escolas técnicas brasileiras, principalmente da forma de oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. O autor é contrário a integração do ensino profissionalizante ao ensino médio e cita algumas razões para os maus resultados: não há uma preocupação em oferecer cursos onde há demanda no mercado de trabalho, o baixo número de graduados que se dirige para o mercado de trabalho e a clientela que freqüenta esses cursos, constituída por uma elite de classe média e alta, que estão interessadas nos vestibulares mais concorridos. Quando o MEC separou o ensino médio da educação profissional, através do Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a), as modificações: [...] foram inicialmente bem recebidas pelos diretores das escolas técnicas federais. Porém, acabaram por gerar uma forte reação contrária, sobretudo em grupos inspirados pelo ideal gramsciano de combinar educação, formação profissional e trabalho. Difícil dizer se essa pureza doutrinaria teria sido mais importante do que a orientação elitista do nosso ensino técnico federal. No espírito dos seus professores, mais vale um graduado de máquinas e motores passar no vestibular de Direito de universidade pública do que trabalhar como técnico em uma indústria mecânica (CASTRO, 2009, p.165). Castro (2008) propõe um ensino médio direcionado a algumas áreas profissionais, descartando a antiga formatação do médio profissionalizante e dando uma nova finalidade ao ensino médio para deixar de ser meramente propedêutico. Para o autor a idéia não seria a de profissionalizar, mas, sim, “vestir” os mesmos conteúdos acadêmicos (ciências, matemática, comunicação, escrita) com “roupagens” da área. E exemplifica: aprende-se matemática 65 aplicada nos negócios; física, estudando máquinas-ferramentas; ler e escrever, redigindo relatórios e lendo manuais de computador. Seria a “tecnização” do ensino médio. Para Deluiz (2004), a política econômica brasileira é fortemente influenciada por organismo internacionais (Banco Mundial, Banco Interamericano de Desenvolvimento, Organização das Nações Unidas para Educação, Ciências e Cultura e organização Internacional do trabalho) que acabam orientando e financiando diretamente nas políticas educacionais nacionais. As recomendações dos organismos multilaterais determinam ao poder público, prioriza investimentos no ensino fundamental, que pode ser complementado por qualificação profissional de curta duração e baixo custo. Considera a formação técnicoprofissional um processo longo e caro e recomenda que sejam repassados para esfera privada. Para a autora o contexto do ideário neoliberal, de despolitização da economia, de desregulamentação do mercado financeiro e do trabalho, do desmonte do Estado de BemEstar Social e do pacto fordista, as reformas educacionais, realizadas sob a orientação e apoio financeiro de organismos internacionais (BIRD, BID, UNESCO, OIT), começaram a tomar forma no Brasil dos anos 90. Para (DELUIZ, 2004, p. 4), a necessidade de “articular e subordinar a produção educacional às necessidades estabelecidas pelo mercado de trabalho e a necessidade de estabelecer mecanismos de controle e avaliação da qualidade dos serviços educacionais” foram os objetivos a que se propuseram os seus idealizadores. As instituições internacionais concedem créditos à educação, mas regulam as reformas e à política educacional, principalmente àquelas voltadas à educação profissionalizante de visão produtivista ou de mercado: [...] embora tenham ampla importância a educação primária e secundária, bem como a educação profissionalizante, estas não devem estar articuladas. Ou seja, os resultados da educação profissionalizante podem se muito melhores se esta não estiver sendo ministrada nos espaços de educação formal. [...] a educação profissionalizante necessita de um modo flexível e, em sendo ministrado em instituições que detenham certa autonomia, poderá direcionar suas atividades considerando o movimento econômico (OLIVEIRA, 2002, p. 1). O Banco Mundial reafirma a política contrária á formação integrada e a manter a dicotomia entre os ensinos médio e técnico, visando capacitar mão de obra para os interesses do mercado e sugere a abertura da educação profissional à iniciativa privada, retirando da responsabilidade do Estado o financiamento desta modalidade de ensino. A visão produtivista 66 da educação crítica a forte intervenção do Estado brasileiro no campo dos serviços sociais, principalmente nas áreas da seguridade social e na educação universal. As principais críticas dos produtivistas ao Estado do bem-estar social, segundo Singer (1996), são o paternalismo – que são os auxílios sociais, a ineficiência – caracterizada pelos desperdícios de recursos públicos e o corporativismo – representados por profissionais do setor público que lutam pela ampliação dos serviços e o aumento de dotações orçamentárias que o sustentam. Para os defensores do Estado mínimo seria uma meta o fim da gratuidade do ensino e a rede escolar sujeita as regras do mercado. Considerando que a competição em mercado é o melhor meio para promover a eficiência, isto é, a combinação de qualidade e baixo custo. Para Castro, Médici e Tejada (2000) a separação entre o acadêmico e o técnico foi à grande revolução do Decreto N° 2.208/97(BRASIL, 1997a) e permitiu a entrada do BID no processo. O BID e a cúpula do MEC concordavam que o ensino técnico havia perdido o seus caminhos por conta de uma indefinição do seu produto: propedêutico ou profissional? Na maioria das escolas de melhor nível, a grande maioria dos alunos freqüentava o técnico por ser uma escola acadêmica boa e gratuita. Os autores defendem a associação dos governos locais com as empresas para garantir uma mão de obra altamente qualificada, fator de atração de novos investimentos. A separação dá aos cursos profissionais contatos com as empresas, pesquisa de mercado, redefinição do currículo e novos mecanismo de financiamento. Castro, Médici e Tejada (2000) observam que ao separar o lado propedêutico do profissionalizante, esse último passou a ter sentido apenas pela sua capacidade de dar aos graduados boas chances de encontrar empregos condizentes. Esta era uma das hipóteses em que apostavam os defensores da separação. Para grande alívio, foi possível verificar que a hipótese parece ser correta. Os cursos, agora divorciados do acadêmico, passaram a ser objeto de maior atenção e questionamento. Há claras preocupações com o mercado dos graduados e uma progressiva aproximação com o mundo empresarial. Os produtivistas defendem uma organização curricular para a educação profissional, baseada nos princípios da flexibilidade e laborabilidade. A abordagem das atividades produtivas que constituem o mundo do trabalho é constituída por três segmentos: produção de bens, produção de conhecimentos e produção de serviços. Essas atividades produtivas devem nortear as diretrizes curriculares nacionais. A definição de competências e habilidades e das bases tecnológicas requeridas para a formação de um profissional possuem como elementos norteadores a análise do processo produtivo de cada área profissional. As 67 organizações dos projetos curriculares adotam como diretrizes: organicidade, flexibilidade e adequação às atividades produtivas. A educação profissional deve formar para o processo produtivo, e cada curso está referido a uma área específica da atividade laboral, a um processo de produção. A análise deste processo é o primeiro passo que nos parece ser razoável para a definição de como deve ser a construção das condições de preparação para o exercício de atividades neste processo. [...] que gerasse uma matriz de funções e sub-funções para cada uma das áreas ou famílias profissionais previamente definidas, e em seguida construir uma matriz de competências e habilidades. [...] um quadro dos saberes ou bases tecnológicas envolvidas na construção das competências e habilidades neste momento, e dos saberes ou bases científicas e instrumentais requeridas para a formação profissional (BERGER FILHO, 1999, p.12). O resultado deste processo é uma matriz de competências a serem construídas pelos estudantes da educação profissional ao longo de sua formação. Para Berger Filho (1999, p.9), competências são esquemas mentais ou as ações e operações mentais “de caráter cognitivo, sócio-afetivo ou psicomotor que, mobilizadas e associadas a saberes teóricos ou experienciais, geram habilidades ou um saber fazer”. Para Deluiz (2004) o Brasil implementou medidas legais visando um reordenamento da educação profissional sob a ótica do modelo das competências a partir da Lei no. 9394/96 (LDB), principalmente nos dispositivos de regulamentação, como o Decreto no. 2208/97 (BRASIL, 1997a) e as Diretrizes Curriculares Nacionais, implementadas no Parecer CNE/CEB no. 16/99 (BRASIL, 1999a) na Resolução CNE/CEB no. 04/99 (BRASIL, 1999b) e nos Referencias Curriculares Nacionais. Na prática o modelo enfatiza o mercado de trabalho ou no indivíduo, desarticula a formação profissional da formação geral e valoriza a avaliação da qualidade dos serviços educacionais. Na formulação e na organização do currículo, o modelo de competências, sinaliza algumas indicações gerais e segundo Deluiz (2004), essas indicações são vagas, abstratas e desprovidas de um significado mais explícito e concreto se não forem consideradas as formas como serão implementadas e suas vinculações com as matrizes teórico-conceituais. Para a autora, as referidas matrizes estão organizadas “em modelos epistemológicos que as fundamentam, e podem ser identificadas como matriz condutivista ou behaviorista; a funcionalista; a construtivista e a crítico-emancipatória” (DELUIZ, 2004, p.6-7). No modelo de competências as propostas para a organização do currículo são, de acordo com a autora: 68 [...] investigação dos processos de trabalho para a identificação de perfis profissionais de conclusão; definição dos blocos de competências profissionais básicas, gerais e específicas relacionados aos perfis identificados; desenho da estrutura do currículo, em geral flexível e modularizado; definição dos itinerários profissionais com critérios de acesso aos módulos e ao curso; definição das estratégias de aprendizagem – prática pedagógica interdisciplinar e contextualizada, processo centrado na aprendizagem do aluno, individualização dos percursos de formação, construção significativa do conhecimento, seleção de situações de aprendizagem baseadas na pedagogia de projetos e situações-problema; e definição do processo de avaliação da aprendizagem (DELUIZ, 2004, p.7). Para a referida autora o projeto pedagógico da linha produtivista deve ser organizado em torno de competências prioritariamente técnicas. A lógica da educação profissional, na perspectiva produtivista, deve ser a da mobilização para a construção das competências necessárias para a atividade a ser desenvolvida pelos alunos no mundo do trabalho e não a formação humana. Este processo é contraditório na medida em que é defendida uma pedagogia tecnicista e que busque garantir um aprender a aprender e um aprender a fazer. De acordo com Deluiz (2004), a organização da educação profissional deve ser modular e diferenciada, pois a diversidade caracteriza a contemporaneidade. A argumentação é baseada nas necessidades do aluno e do trabalho cada vez mais heterogêneos. A marca da pedagogia produtivista é individualista: os alunos têm projetos pessoais, trajetos educacionais e experienciais diferentes. A vida civil e o mundo da produção estão cada vez mais complexos e a diversidade da oferta de trajetos formativos, de desenhos curriculares e de práticas pedagógicas, é a possibilidade de se abordar a complexidade e da heterogeneidade no mundo do trabalho. O projeto pedagógico pautado na perspectiva produtivista da educação é orientado por uma relação do binômio: professores profissionais x profissionais professores. Nessa perspectiva é priorizada a parceria entre o mundo da escola e o mundo do trabalho para a concretização de uma educação profissional de boa qualidade. Os professores são agentes mobilizadores, conhecedores do processo de aprendizagem e os profissionais das áreas são formuladores de problemas, reguladores do processo e estimuladores de inovação. Finalizando, Deluiz (2004) focaliza que o projeto deve ser um planejamento, articulado entre o conjunto dos representantes do mundo trabalho e dos educadores. 69 Para Castro (2009), o ensino médio profissionalizante ou propedêutico, possui um nível de qualidade inadequado, tendo no currículo sua maior fragilidade. Caracteriza os currículos como: vagos, abundantes como se fossem para gênios e decora-se em vez de aprender. Finalizando o autor considera o professor fraco, as jornadas curtas, a gestão é amadorística e a profissionalização é capenga. “Por essas e outras razões, grande parte da formação profissional é oferecida pelo sistema S. Em paralelo, prospera um gigantesco não sistema, ignorado e praticamente livre de regulamentações” (CASTRO, 2009, p.168). Para Singer (1996) o debate sobre a crise educacional poderá ser frutífera, se os que defendem a tradição democrática e igualitária conseguirem passar à ofensiva, com propostas mais criativas tendo como pano de fundo a democratização do processo educativo, onde o ensino deva ser público e de acesso universal. Com relação ao EMI, acreditamos que sua expansão, planejada e coordenada democraticamente, deva sedimentar as bases de um modelo de educação tecnológica pública, gratuita e de qualidade para toda a sociedade brasileira. Possibilidade de futuro incerto, pois a linha política da educação profissional no Brasil, há décadas, vem sendo implementada pela orientação produtivista. O Decreto no 5.154/04 (BRASIL, 2004a) representa uma oportunidade de formação de educação tecnológica. O projeto do EMI deve ser assumido como uma política pública de ensino, de formação para o trabalho, organicamente articulada com a elevação dos níveis escolares, no sentido de uma formação omnilateral e vinculando os conhecimentos da ciência, trabalho, tecnologia e cultura. Dando continuidade a esse estudo, finalizaremos nossa investigação com o terceiro e ultimo capítulo, apresentando os resultados da pesquisa, procurando responder ao problema que se levantou no início da investigação: a implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF/Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, na percepção dos gestores responsáveis pelo processo de implementação dos cursos integrados de Edificações, Eletromecânica, Eletrotécnica, Informática, Mecânica e Metalurgia, tomando por base as concepções e princípios da integralidade contidos no Documento-Base do Ministério da Educação/Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2007). 70 3 EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO IF SUDESTE MG – CAMPUS JUIZ DE FORA: A IMPLANTAÇÃO NA TEORIA E NA PRÁTICA Este capítulo apresenta os resultados da pesquisa de campo e faz uma discussão dos dados coletados, levando-se em consideração ao objetivo geral da pesquisa e a partir da fundamentação teórica desenvolvida. Antes de tratarmos especificamente das discussões dos dados, faremos uma breve contextualização da instituição investigada13, procurando situá-la em relação a sua localização, criação, público e vocação sócio-econômica da região. O cenário do Brasil na década de 50, marcado pelo processo de crescimento urbano e industrial, proclamava a necessidade de criação de cursos técnicos que atendessem a demanda por mão-de-obra qualificada no país. Diante desse contexto, foi inaugurado no dia 02 de fevereiro de 1957, nas dependências da Escola de Engenharia, o Colégio Técnico Universitário, sob a denominação de "Cursos Técnicos da Escola de Engenharia". Os cursos oferecidos eram os de Máquinas e Motores, Eletrotécnica, Pontes e Estradas, e Edificações. Ainda em consonância com o crescente desenvolvimento econômico no país, já na década de 60, a necessidade de qualificação profissional e integração escola/empresa fizeram com que os "Cursos Industriais Técnicos da Escola de Engenharia" fossem reconhecidos e incorporados à Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF em janeiro de 1965, passando então à denominação de Colégio Técnico Universitário. Hoje o campus de Juiz de Fora do Instituto Federal do Sudeste de MG possui um espaço físico de 36.000 m2, com aproximadamente 2.000 m2 de área construída, em expansão. Nessa trajetória, o Campus de Juiz de Fora do Instituto Federal do Sudeste de MG cresceu consideravelmente, tanto na quantidade de alunos, como na ampliação do corpo docente e da oferta de cursos. Hoje são quase 3.000 alunos distribuídos nos cursos de Informática, Design de Móveis, Mecânica, Metalurgia, Eventos, Transações Imobiliárias, Transporte Rodoviário, Eletromecânica, Eletrotécnica, Edificações, Eletrônica e Transporte Ferroviário. Ainda oferece cursos técnicos na modalidade a distância (EaD), com os curso de Enfermagem, Segurança do Trabalho e Serviços Públicos. Possui três cursos superiores: Engenharia Mecatrônica, Licenciatura em Física e Sistemas de Informação. Atualmente a Escola faz parte do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Sudeste de Minas Gerais, em conjunto com outras Instituições Federais de 13 Os dados e as informações institucionais foram retirados do site: www.jf.ifsudeste.edu.br. 71 Ensino da Zona da Mata e Campo das Vertentes. A nova Instituição abre novos horizontes para a Escola, potencializa o crescimento quantitativo e qualitativo de suas ações e continua a marcar cada vez mais a importância da sua contribuição para o desenvolvimento econômico e social de Juiz de Fora e região. Após a escolha do local da pesquisa, a seleção dos participantes, os instrumentos de investigação e a autorização à direção do IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora para a realização do estudo iniciou-se as atividades de campo com a coleta de dados com o intuito de captar elementos capazes de responder ao objeto da investigação. Esse trabalho de campo teve início em outubro de 2010, através das entrevistas. Os dados foram obtidos por meio de entrevistas semi-estruturadas, através da utilização de um roteiro, que procurou contemplar as questões referentes às concepções e princípios do documento base (BRASIL, 2007), que propõe e orienta a formação integral do ensino médio integrado nos Institutos Federais. No roteiro de entrevista elaborado, as questões contempladas são as orientadas pelo documento base do MEC/SETEC (2007), como à formação humana integral, trabalho, ciência, tecnologia e cultura como categorias indissociáveis da formação humana, o trabalho como princípio educativo, a pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção do conhecimento, a relação parte-totalidade na proposta curricular e os fundamentos para a construção de um projeto político-pedagógico integrado. Na coleta de dados através das entrevistas trabalhamos com todos os gestores responsáveis pela implementação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio: diretor geral, diretor de ensino e pesquisa, coordenador didáticopedagógico dos cursos integrados, e todos os coordenadores dos cursos integrados, perfazendo um total de nove entrevistados, que representa os sujeitos da pesquisa. Com a exceção da diretoria geral, todos os outros gestores são professores dos cursos integrados pesquisados. A partir do mês de fevereiro de 2011, foram coletados os documentos oficiais dos cursos integrados, que foram analisados com base no referencial teórico, no intuito de responder ao objeto da investigação. Foram analisados oito atas do conselho de unidade, um anteprojeto de implantação dos cursos de educação profissional de nível médio integrado, um relatório de gestão, duas resoluções do conselho de unidade, uma resolução do seminário “desafios da integração” (maio de 2007) com o objetivo de definir o papel do CTU no cenário da educação profissional e tecnológica e uma resolução do seminário da integração (agosto de 2007) para elaboração dos projetos pedagógicos dos cursos integrados. 72 Todos os gestores entrevistados são professores que vivenciaram as mudanças mais representativas, como a LDB/1996, o Decreto n°. 2.208/1997 (BRASIL, 1997a) e o Decreto n°. 5.154/2004 (BRASIL, 2004a), que ocorreram na educação profissional de nível técnico no atual IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. Atendendo aos critérios préestabelecidos consideramos que os entrevistados estavam devidamente habilitados para nos informar sobre a implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. A tabela14 abaixo representa o perfil e a situação profissional dos gestores entrevistados: Tabela 3 – Perfil e a situação profissional dos gestores GESTORES 14 ÁREA DE JORNADA DE SITUAÇÃO ATUAÇÃO TRABALHO FUNCIONAL G1 Propedêutica G2 Técnica G3 Propedêutica G4 Técnica G5 Técnica G6 Técnica G7 Técnica G8 Técnica G9 Técnica Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva Dedicação exclusiva FORMAÇÃO Efetivo Mestre Efetivo Mestrando Efetivo Especialista Efetivo Mestrando Efetivo Doutor Efetivo Doutor Efetivo Mestrando Efetivo Mestre Efetivo Doutor Quadro criado pelo autor baseado nas entrevistas com a finalidade de melhor ilustrar o grupo entrevistado. 73 Segue uma análise descritivo-interpretativa de cada categoria selecionada e fundamentada na tentativa de responder o objetivo da investigação, baseado nos documentos escolhidos e da contribuição dos interlocutores nos diferentes momentos da etapa da coleta dos dados, na instituição pesquisada. 3.1 O TRAJETO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL TÉCNICA DE NÍVEL MÉDIO INTEGRADA AO ENSINO MÉDIO NO IF SUDESTE MG – CAMPUS JUIZ DE FORA O Colégio Técnico Universitário (CTU/UFJF), atual IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora, foi à última instituição da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica do Estado de Minas Gerais a implementar a educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. A aprovação da referida forma de oferta de educação ocorreu no mês de outubro de 2007 com início para o ano letivo de 2008. No mês de setembro do mesmo ano, a administração do CTU/UFJF, a partir da compilação das proposições discutidas no seminário “Desafios da Integração” (31 de agosto de 2007) e das sugestões apresentadas pela equipe de sistematização do seminário, elaborou um documento intitulado "Implantação dos cursos de educação profissional de nível médio integrado no CTU/UFJF - Anteprojeto”15, que serviu como orientação para a discussão com os chefes de departamentos, coordenadores e chefe de secretaria da instituição. O referido documento foi elaborado pelos professores (as) Jocelaine C. Pereira, Maria da Graça M. Guerra, Paulo César S. Ignácio, Paulo Rogério A. Guimarães, Sebastião Sérgio de Oliveira, Silvana T. Faceroli e a servidora Rosa Maria G. Cunha. A justificativa do CTU/UFJF ser a última instituição do estado a optar pelo ensino médio integrado, segundo depoimento de alguns gestores entrevistados, se deve a acomodação conservadora dos professores e da direção que apoiavam a reforma do governo anterior e eram contra a aprovação do Ensino Médio Integrado na instituição. O Anteprojeto (2007) elaborado pela instituição e não citado em nenhum momento pelos gestores entrevistados apresentava uma concepção de educação que caminhava para superar a formação da dimensão mercantil, que reduzia o jovem à mera condição de capital humano: 15 Baseado no documento “As políticas para a Educação Profissional e Tecnológica” publicado pelo Grupo de Trabalho de Política Educação – GTPE-SN em junho de 2005. 74 [...] a proposta de implantação no CTU/UFJF da educação profissional e tecnológica integrada à educação básica se articula à superação de dicotomias antigas do sistema educacional brasileiro. Busca-se a articulação da teoria com a prática, a relação entre saber científico e saber tácito, a articulação entre parte e totalidade e, superar a dualidade que opõe formação propedêutica e formação profissional e que estabelece a disciplinaridade de saberes gerais e específicos (ANTEPROJETO, 2007, p.11). O Anteprojeto (2007) alertava que por acreditar na concepção em questão, defendia que a implantação da proposta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, significava o desenvolvimento do CTU/UFJF e que este desenvolvimento iria gerar um impacto significativo no dia a dia da escola. Defendia o processo formativo integral, pois este iria buscar compreender a problematização social do jovem como sujeito de direitos, contribuir para a sua inserção na vida adulta, no mundo do trabalho como cidadão e a continuidade de estudos em nível superior. Esclarece o Anteprojeto (2007) que através de avaliações e percepções da situação do CTU/UFJF, a evasão nos cursos técnicos concomitantes era elevadíssima, e ainda, observava-se a queda de qualidade na formação técnica. Relacionava alguns motivos observados para tal situação: falta de bases científicas dos grupos de concomitância externa e a existência de turmas heterogêneas. O documento orientava sobre os requisitos de acesso, a organização curricular, um estudo da carga horária dos cursos a serem integrados, os critérios de avaliação e progressão, o exercício orientado da profissão e a certificação de qualificação profissional. É importante salientar que o Anteprojeto (2007), que serviu como o documento norteador para a implementação do EMI na instituição para os gestores, não foi comentado e nem citado por nenhum gestor nas entrevistas da pesquisa. A aprovação da proposta de estabelecer a oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio ocorreu no órgão máximo do CTU/UFJF – o conselho de unidade. A reunião, segundos participantes, foi polêmica, tensa e sem consenso, pois muitos dos chefes de departamentos que compõem o referido conselho sentiram dificuldade em votar pela aprovação da integração, baseado no documento norteador, por se tratar de um anteprojeto e não um projeto final, ausência de um estudo da grade curricular e seus impactos na carga horária, ausência no documento da discussão do tema, a falta de um envolvimento maior do corpo docente, um estudo de como a interdisciplinaridade envolveria os conhecimentos gerais com os conhecimentos específicos, tão fundamental na proposta do MEC e a necessidade de uma maior discussão nas bases para a solidificação da proposta de 75 integração. É importante pontuar que os alunos, através dos seus representantes discentes, votaram contra a proposta da integração. Segundo os gestores as dificuldades para debater o assunto e construir um consenso para a proposta foi dificultado por vários fatores como: escassa discussão sobre o tema da integração, pouca participação da comunidade, pouco envolvimento e contribuição dos professores da instituição, falta de conhecimento na proposta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, um tipo de cultura do professor que dificulta a assimilação adequada da proposta, resistência de um grupo de professores às mudanças pretendidas e pela ausência de um projeto político pedagógico que orientase as mudanças. A ausência de um projeto político pedagógico foi muito comentada pelos gestores como um ponto negativo e que foi um obstáculo para a implementação da integração no atual IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora. O documento-base MEC/SETEC (2007) que orienta os princípios e diretrizes do ensino médio integrado, alerta que a construção de um projeto político pedagógico deve ser de forma coletiva, participativa e democrática, expressando as concepções, princípios e finalidades da instituição com o objetivo de unificar a comunidade escolar. Para isso, todos devem ser autores desse projeto e sujeitos de sua criação e desenvolvimento. Todos os gestores foram unânimes em afirmar que os cursos integrados deveriam ser reavaliados, principalmente agora que o ciclo tinha se encerrado, isto é, as turmas tinham concluído os cursos. O ano de 2011 foi citado por todos como o ano da avaliação dos cursos integrados implementados em 2008. As propostas curriculares deveriam ser otimizadas com o intuito de adequá-las e avançá-las no sentido da integração. Seguem algumas falas que ilustram tais conclusões: [...] depois de três anos, esse é o primeiro momento que a gente vai começar um processo de avaliação, nós já mudamos algumas coisas, mas que não mexeram com a estrutura para provocar acertos entendo que já foi um avanço muito grande, mas que temos muita, mas muita coisa para corrigir, sem falar em carga horária, sem falar em disciplina que podem atuar integradas (GESTOR 1) [...] A gente passou pela fase da criação da integração, ai a gente olhou primeira a parte que precisa em termos de professores e tudo, agora não existe nenhuma proposta de criar novos cursos, mas sim de consolidar, então é aparte da gente tentar consolidar isso, busca essa integração, eu vejo através de seminários dos professores, reunião dos professores (GESTOR 3). 76 [...] então já é uma proposta da direção ainda no mês de fevereiro provavelmente já vai ser marcado no calendário escolar, dois dias em que as aulas vão ser suspensas para a gente reavaliar o nosso planejamento estratégico, não só fazer outro, descartar aquele, mas reavaliar para todos conhecerem e com certeza um ponto que vai ser os cursos integrados, buscar uma, consolidar os cursos, buscando uma integração (GESTOR 3). A Diretoria de Ensino e Pesquisa do IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora, na época das entrevistas, tinha como proposta da direção, o mês de fevereiro de 2011, um encontro com todo o corpo docente dos cursos integrados, para a referida avaliação, mas estamos no mês de maio de 2011, e a avaliação tão esperada pelos gestores não aconteceu. As discordâncias e resistências a implementação do ensino médio integrado ao ensino profissional foram citados por 3 gestores. Um dos gestores justifica a discordância baseado na abrangência da referida modalidade de ensino: Na minha visão o que eu vejo é o seguinte: o ensino profissionalizante integrado, a abrangência dele é restrita, existe muito pouco interesse para o ensino profissionalizante. Tem até aquele estudo, que diz que somente 1/3 dos alunos do ensino médio quer o ensino profissionalizante, o restante está querendo ensino médio simples, na realidade o ensino profissionalizante para os demais, é mais um estorvo do que uma vantagem (GESTOR 2). O gestor 2 acrescentou ainda que “o ensino médio integrado engessa demais para os alunos, que estes não estão interessados em ensino profissional, apenas no ensino médio para ingresso no terceiro grau”. Defendeu o Decreto no. 2.208/97 (BRASIL, 1997a) por apresentar maior flexibilidade para a formação do aluno do ensino médio. O gestor expressa uma opinião radicalmente contrária a integração “porque dirige uma coisa e obriga o aluno que quer o ensino de qualidade a fazer uma coisa que ele não quer que é o ensino profissionalizante”. Enfatizando que os gastos com o ensino integrado são excessivos e seus resultados são de pouca valia. Para Castro (2007), no Brasil, é enorme a ineficiência dos investimentos nas escolas técnicas federais, dada a pequena proporção de formandos que se dirige para as profissões para as quais foram formados, objetivando um descaso com o mercado de trabalho. O autor alerta que os cursos integrados são excelentes academicamente, mas acaba atraindo uma elite de classe média e alta, que não tem interesse pelo exercício da profissão apreendida e sim a busca de um excelente ensino no intuito da aprovação nos vestibulares mais cobiçados. O autor cita o Banco Mundial, que avaliando diferentes modalidades de formação 77 profissional, conclui que a opção com mais casos de fracasso foi à profissionalização do ensino médio. São as tentativas de profissionalizar o currículo do ensino médio em um curso único, proposto pelas escolas técnicas federais. Para o gestor 4, a sua discordância em aprovar a integração se deve a urgência e a falta de um planejamento da instituição em elaborar uma discussão com a base da escola que são os professores e funcionários: Eu na época da integração, eu era contra a integração, quando surgiram os documentos e as discussões começarem, eu ainda coordenador eu me lembro na reunião de assessoria educacional, eu fui contra não pelo fato da integração, mas pela urgência que eles queriam implementar, fez uma discussão e outra, da qual eu não participei e não concordava com isso, porque precisava de demanda de tempo para fazer uma integração correta, esse era o meu entendimento, inclusive eu fui o único que votei contra e hoje vários outros professores já falaram comigo que se pudessem voltavam atrás (GESTOR 4). As discussões da implementação da proposta da integração ocorrem simultaneamente à criação dos IFET – Institutos Federais de Educação e Tecnologia. O Governo Federal, através do Decreto no. 6.095/07 (BRASIL, 2007), estabelecia as diretrizes para o processo de integração e regionalização das escolas técnicas federais. Era grande a discussão na comunidade do CTU/UFJF com relação à desvinculação da UFJF e criação do IFET, principalmente com relação a recursos, gestão, autonomia e objetivos. A aprovação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, para alguns representantes do conselho de unidade, foi à alternativa real para solucionar a falta de recursos dentro das escolas vinculadas às universidades. Na planilha orçamentária do MEC, os alunos do ensino médio não eram pontuados, isto é, não existiam recursos para estes alunos. A proposta aprovada transformou quatro turmas de ensino médio e de seis turmas dos cursos técnicos, em seis cursos de educação profissional de nível médio integrado. Os seis cursos aprovados foram: Edificações, Eletromecânica, Eletrotécnica, Informática, Mecânica e Metalurgia. A escolha desses cursos foi baseada nas experiências anteriores de integração média e técnica na instituição, mesmo sabendo que o modelo proposto guardava diferenças em relação ao modelo anterior. A organização curricular aprovada (modelo de competências) foi baseada em legislação específica, que é fixada pelos órgãos competentes do MEC e no projeto político pedagógico da instituição. Vale ressaltar que o projeto político da instituição na época não existia e se encontra em fase inicial de construção na instituição. A carga horária obedeceu às 78 cargas mínimas estabelecidas por lei tanto para formação geral quanto para a formação especifica. Alguns gestores avaliam que a contribuição da implementação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, para os alunos como sendo uma referência nova, que pode ter dois caminhos: preparar para as profissões técnicas e prosseguir os estudos, o que pode determinar uma autonomia para o aluno, com o ensino médio simplesmente, o aluno teria somente a possibilidade, se aprovado, de cursar o ensino superior. Para a maioria dos gestores pesquisados, o EMI ofereceu para os alunos uma referência nova. Consideram que com o ensino médio integrado ao ensino técnico, existem dois caminhos que atendam as expectativas dos alunos: uma de preparar para as profissões técnicas e outra de preparar para prosseguir os estudos, criando possibilidades melhores para os alunos “[...] então acho que para o alunado isso trás um crescimento, um enriquecimento, até um amadurecimento mais tranqüilo, mas tranqüilo no sentido de ele tem essas duas possibilidades” (GESTOR1). Os gestores pesquisados não citam em nenhum momento os pilares conceituais de uma educação integrada: um tipo de escola unitária, não dual, que garanta a todos o direito ao conhecimento e uma educação politécnica que possibilite o acesso à cultura, à ciência e ao trabalho, por meio de uma educação básica e profissional. Conforme Ramos (2007), a politecnia deve ser entendida como a educação que possibilita o entendimento dos princípios científico-tecnológicos e históricos da produção moderna, na perspectiva de orientar os alunos a realizar múltiplas escolhas. Para o documento-base (BRASIL, 2007), entre as razões do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, a opção pelo apoio a forma de oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio dá-se, principalmente, pelo fato de ser a que apresenta melhores resultados pedagógicos. A centralidade do ensino médio se desenvolve entre os sujeitos e conhecimentos, buscando superar a determinação histórica do mercado de trabalho sobre essa etapa de ensino, seja de sua forma imediata, predominantemente pela vertente profissionalizante; seja de forma mediata, pela vertente propedêutica. A orientação dada pelo documento é pela construção de um projeto que supere a dualidade entre formação específica e formação geral e que desloque o foco dos seus objetivos do mercado de trabalho para a educação “[...] da pessoa humana, tendo como dimensões indissociáveis o trabalho, a ciência, a cultura e a tecnologia” (BRASIL, 2007, p.6). 79 3.2 A AVALIAÇÃO DOS GESTORES E OS PRINCÍPIOS DA INTEGRAÇÃO Segue uma análise de cada categoria selecionada das concepções e princípios do ensino médio integrado do Documento – Base (BRASIL, 2007), de acordo com os dados obtidos das entrevistas semi-estruturadas com os gestores. 3.2.1 Formação humana integral: o direito a uma formação completa para a leitura do mundo e para a atuação como cidadão A maioria dos gestores entrevistados entende que a educação profissional tem como principal finalidade a inserção do indivíduo no mundo do trabalho e a aquisição de habilidades para o trabalho. Alguns entrevistados acrescentam que além do mercado, a educação profissional deve se preocupar com lado humanístico do aluno ou sua preparação para a vida. Educação para mim é mercado de trabalho, é claro que a gente não pode esquecer a formação humana, a educação em geral, mas o objetivo é o mercado de trabalho, tanto é que nas minhas aulas eu sempre foco bem o mercado de trabalho, dou dicas para os alunos, tenho contato com empresários e sempre indico aluno para fazer estágio (GESTOR 8). Para Castro (2008) da linha produtivista, alem das missões mais tradicionais, as escolas técnicas devem preparar os alunos para o mercado de trabalho. O autor alerta que o abarrotamento do currículo impede a aquisição de uma base acadêmica sólida para enfrentar o mundo do trabalho. O documento-base (BRASIL, 2007) orienta que a concepção de formação humana deve ser omnilateral, isto é, deve integrar todas as dimensões da vida dos sujeitos, não só o trabalho, mas a ciência e a cultura. No ensino médio integrado ao ensino técnico, a concepção de educação integrada determina que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional em todos os campos onde se dá a preparação para o trabalho: nos processos produtivos e nos processos educativos. Significa adotar o trabalho como princípio educativo, no sentido de superar a dicotomia trabalho manual do trabalho intelectual, de incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo. 80 A preocupação da preparação para o setor produtivo se manifesta como prioritário na visão da maioria dos gestores. Quando são citadas as disciplinas da parte propedêuticas são no sentido de contextualizar a preparação para o mercado de trabalho. [...] você prepara o individuo pode ser no ensino médio integrado ou não para um fim, qual é o fim dele? A empresa, agora quando o cara já vem com uma preparação técnica, profissional, mais trabalhado, ele vai contribuir muito mais para o emprego, contribuir quando ele abarca outras disciplinas, ele sai um cara mais preparado [...] quando você está fazendo um curso técnico, você entra e vê como é uma empresa, ele sai mais preparado e competente para a empresa (GESTOR 7). Ramos (2007) chama atenção para o fato de que os cursos técnicos, ao longo de sua história, estiveram predominantemente centrados no mercado de trabalho. Em nenhum momento esteve centrado no desenvolvimento do estudante como sujeitos como potencialidades, desejos e necessidades. Ressaltando que o Art. 22 da LDB, assegura a formação do indivíduo para a o exercício da cidadania e progressão dos estudos. A idéia é tirar o mercado de trabalho do foco do projeto educacional e colocá-los sobre os sujeitos, cujo projeto de vida se constrói pelas relações sociais, com o intuito de sua emancipação. Para o gestor 5 o ensino médio integrado, permite o aluno a fazer a relação do aprendizado das bases cientificas com as bases tecnológicas, mas sempre como pano de fundo a questão da inserção do indivíduo no mercado de trabalho: [...] então na educação profissional, o aluno começa a fazer uma correlação das bases cientificas com as bases tecnológicas e a aplicação daquilo no mundo do trabalho, ai ele começa a ver que pode transformar esses conhecimentos em algo prático, em algo que vá gerar um benefício para a comunidade e também gerar renda para ele e para a sua família, ai ele começa a enxergar responsabilidade e os benefícios que isso pode trazer para ele, isso principalmente para quem não teve muita oportunidade e começa a mudar o seu horizonte, o horizonte do aluno começa a se abrir, então eu acho começa a gerar nele um grau de responsabilidade (GESTOR 5). O que se percebe é a falta de conhecimento da proposta do MEC ou a ausência de um aprofundamento da concepção e diretrizes do ensino médio integrado com relação aos gestores, que foram os principais responsáveis16 pela implementação da referida modalidade 16 Os principais responsáveis pela implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio foram: Diretor geral do CTU/UFJF, Diretor de Ensino, Coordenadoria de Ensino Médio e os Coordenadores dos cursos integrados: Edificações, Eletromecânica, Eletrotécnica, Informática, Mecânica e Metalurgia, que constituem os sujeitos da pesquisa. 81 de ensino. Os gestores falam em desconhecimento da proposta pela maioria dos professores, principalmente agora em que 60% dos professores e 90% dos técnicos administrativos, concursados para o IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora, são novatos e não vivenciaram as discussões da integração e as modificações por que passaram o ensino médio e o ensino profissionalizante dentro da instituição. A gente fez um planejamento estratégico há dois anos atrás, hoje 60% do nosso pessoal é novato, é novo, tem menos de dois, embora o planejamento estratégico ele tenha a duração de uns cinco anos, mas a gente já entende que deve ser feito outro, nos funcionários que nós temos aqui, apenas dois funcionários que tem mais de dois anos, o resto tudo é gente nova, e professores também, então você olha, por exemplo, por área, na matemática nos somos hoje, oito professores, quatro novos e quatro antigos, a física esta na mesma situação. Na área de elétrica a quantidade de professores novos que tem lá é muito maior do que a quantidade de professores que tinha antes, porque muita gente aposentou e a expansão previu novas vagas, não foi só o problema da aposentadoria, mas foi à expansão, temos que fazer uma nova discussão de E.M.I. Os professores novatos estão pedindo mais discussão sobre o integrado, a gente tem notado que eles vêm procurar para conversar, então já é uma proposta da direção ainda no mês de fevereiro provavelmente já vai ser marcado no calendário escolar, dois dias em que as aulas vão ser suspensas para a gente reavaliar o nosso planejamento estratégico, não só fazer outro, descartar aquele, mas reavaliar para todos conhecerem e buscar uma consolidação, uma integração mais efetiva para que esses cursos realmente sejam integrados (GESTOR 3). A idéia de formar para o trabalho como pensam a maioria dos gestores entrevistados, é ter uma visão unidirecional do indivíduo, é apenas formar mão de obra, sem a sua emancipação como ser humano. A proposta do EMI deve superar esta visão reducionista de trabalho e este deve ser um processo coletivo, organizado e de busca das transformações das relações desumanizadoras, portanto deseducativas. A consciência critica é o primeiro elemento desse processo e permite construir outras relações, onde o trabalho se torne manifestação de vida e, portanto, educativa (RAMOS, 2007). Para a autora é preciso incorporar valores ético-políticos e conteúdos históricos e científicos no sentido de habilitar as pessoas para o exercício autônomo e crítico de profissões. A organização do ensino médio integrado deve superar a disputa com a educação profissional, na perspectiva de construir um projeto unitário, integrando seus objetivos e métodos, tendo como base o trabalho como princípio educativo. Esta concepção de trabalho deve estar associado à concepção de ciência. A relação trabalho, ciência e cultura é assim interpretada pela autora: 82 Compreender a relação indissociável entre trabalho, ciência e cultura significa compreender o trabalho como princípio educativo, o que não se confunde com o “aprender fazendo”, nem é sinônimo de formar para o exercício do trabalho. Considerar o trabalho como princípio educativo equivale dizer que o ser humano é produtor de sua realidade e, por isto, se apropria dela e pode transformá-la. Equivale dizer, ainda, que nós somos sujeitos de nossa história e de nossa realidade. Em síntese, o trabalho é a primeira mediação entre o homem e a realidade material e social. O trabalho também se constitui como prática econômica, obviamente porque nós garantimos nossa existência produzindo riquezas e satisfazendo necessidades [...] Portanto, formar profissionalmente não é preparar exclusivamente para o exercício do trabalho, mas [...] também habilitar as pessoas para o exercício autônomo e crítico de profissões, sem nunca se esgotar a elas (RAMOS, 2007, p.4 e 5). De acordo com Ciavatta (2005) tentar superar a redução da preparação para o trabalho, vista sob o aspecto operacional, simplificado, sem os conhecimentos científicotecnológicos e sem o entendimento histórico-social, é garantir uma formação integral, politécnica e educação tecnológica. É fugir das atividades precarizadas, ao subemprego, desemprego, dos vínculos comunitários e da própria identidade. 3.2.2 Trabalho, ciência, tecnologia e cultura como categorias indissociáveis da formação humana Os gestores dos cursos integrados do IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora são unânimes em afirmar que não há ensino médio integrado nos cursos estudados. Houve apenas uma junção de dois cursos concomitantes: o ensino médio e o ensino profissionalizante. Essa junção resultou na teoria uma dissociação da formação humana do aluno e consequentemente um desacordo com as concepções e diretrizes do documento-base (BRASIL, 2007) que orienta a integração. Na prática, resultou num aumento generalizado de disciplinas e excessiva carga horária o que gera uma reclamação e desmotivação por parte dos docentes e discentes. A maioria dos gestores acredita que a aprovação do ensino médio integrado ocorreu de forma abrupta, sem um debate aprofundado, que a aprovação, visava atender as exigências do MEC com os seus recursos e dos diretores da instituição que apoiavam a proposta. O excesso da carga horária é uma unanimidade em todas as falas dos entrevistados e um empecilho para o processo da integração dos cursos estudados. Na prática, o que ocorreu 83 para os gestores entrevistados, é a construção de dois cursos independentes e extensos, como ilustra o seguinte gestor: [...] se você pegar a carga horária do curso de edificações tem em média 42 aulas por semana nas três séries, é a média da carga horária deles, isso é carga horária de um trabalhador, e aí onde fica a parte esportiva, a parte cultural e o lazer. Na verdade o que aconteceu, na prática, se juntou a matriz do ensino médio que não caiu nada em termos de disciplinas, manteve-se e juntamos com a matriz do ensino técnico, houve apenas uma junção. Na verdade era a tendência de atender uma emergência, da força política de induzir: “olha se adotar o EMI vem recursos, se não adotar não vem recursos” (GESTOR 1). O documento-base (BRASIL, 2007) orienta que não é vantajoso que se implante o ensino médio integrado à educação profissional porque essa é a política do MEC ou porque a direção da escola assim decidiu. É preciso que a comunidade escolar se convença da importância de implantá-lo e se mobilize para isso. Cita que as relações institucionais, nos sistemas de ensino e nas escolas são de cima para baixo e de pouca democracia e propõe como solução, a construção coletiva do projeto político pedagógico e do currículo para o ensino médio integrado a educação profissional. O planejamento inadequado dos conteúdos no currículo da formação integrada, por parte dos gestores e professores, refletiu numa reclamação generalizada por toda comunidade do IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora. O nosso aluno a princípio, na construção do integrado, ele foi um pouco penalizado, a turma que foi pioneira, porque existia um ensino médio muito forte e o técnico, no principio não teve outro jeito foi quase como uma junção dos dois cursos, porque o professor da base comum não queria abrir mão da sua carga horária e o professor do técnico também não, então tem alguns conteúdos que esta havendo superposição, então é necessário que os colegiados de cursos se reúnam, para discutirem e começarem a integrar, por exemplo, na eletrotécnica, a física com o pessoal da elétrica, a química com a metalurgia (GESTOR 2). Para a maioria dos gestores entrevistados, a escola assume com franqueza que ofertam os cursos integrados mais voltados para o mercado de trabalho, sem a desejável educação politécnica ou tecnológica que relacione trabalho, ciência e cultura na sua prática e nos seus fundamentos científico-tecnológicos e histórico-sociais. Alguns fatores que dificultam a indissociabilidade entre trabalho, ciência, tecnologia e cultura, puderam ser 84 captadas pela investigação, como: a estrutura fechadas e engessadas das disciplinas, a dificuldade em compreender a proposta dessa relação, a integração, quando ocorre, é apenas nas disciplinas do ensino médio e não destas com as disciplinas do ensino profissional. O que existiu com a justaposição dos conhecimentos gerais com os específicos é uma falsa integração, pois existem claramente dois currículos de dois cursos separados que estão mecanicamente juntos, longe de desenvolver atividades relacionadas ao trabalho, ciência, tecnologia e cultura. A atitude tomada pelos gestores na junção dos dois currículos é uma decisão herdada do antigo “integrado” do ensino profissionalizante nos moldes da Lei no. 5.692/71 (BRASIL, 1971). Caracterizado por um ensino tecnicista, de pouca fundamentação de conteúdo geral e voltado para as demandas do mercado. Esta concepção mecanicista, convencional e estática de organizar os currículos, infringe os ditames da LDB (BRASIL, 1996), do Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) e das respectivas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN). O Parecer CNE/CEB nº. 39/2004 (BRASIL, 2004b), que trata da aplicação do Decreto nº. 5.154/2004 (BRASIL, 2004a) na educação profissional técnica e no ensino médio, orienta que para o curso integrado, é exigida uma “nova e atual concepção”. O integrado “[...] não pode e nem deve ser entendido como um curso que represente a somatória de dois cursos distintos, embora complementares, que possam ser desenvolvidos de forma bipolar, com uma parte de educação geral e outra de educação profissional” (BRASIL, 2004a, p. 10). Essa foi à lógica da revogada Lei nº. 5.692/1971 (BRASIL, 1971). O Decreto nº. 5.154/2004 (BRASIL, 2004a) rejeitam essa dicotomia entre teoria e prática, entre conhecimentos e suas aplicações. Para Ramos (2007), devemos ter cuidado para que a opção de ensino médio integrado não se traduza numa nova versão de ensino profissionalizante nos moldes antigos: Do ponto de vista organizacional, isto não ocorreria simplesmente acrescentando-se mecanicamente ao currículo componentes técnicos, ou de iniciação à ciência ou, ainda, atividades culturais. Obviamente tais componentes deverão existir, mas seriam necessariamente desenvolvidos de forma integrada aos diversos conhecimentos, tendo o trabalho, nos sentidos em que já discutimos como o principio educativo integrador de todas essas dimensões. Sabemos que não se trata de uma proposta fácil; antes, é um grande desafio a ser construído processualmente pelos sistemas e instituições de ensino, visando a práticas curriculares e pedagógicas que levem à formação plena do educando e possibilitem construções intelectuais elevadas, mediante a apropriação de conceitos necessários à intervenção consciente na realidade (RAMOS, 2007, p.10). 85 A maioria dos gestores pesquisados confunde17 a proposta da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio com o ensino profissionalizante citado acima, os gestores o chamam de “integrado antigo”. É importante diferenciá-los, tanto por seus propósitos quanto pelo seu conteúdo. O ensino técnico baseado na Lei no. 5.692/71 (BRASIL, 1971) surgiu no contexto desenvolvimentista dos governos civil-militares, ordenado pela Teoria do Capital Humano e planejado pela regras do Man Power Aproach18, que tinha dois objetivos: atender à demanda por técnicos de nível médio e de conter a pressão sobre o ensino superior. O argumento se consubstanciava pelos governos baseada na escassez de técnicos no mercado em expansão e a tentativa de amenizar a frustração dos jovens que não ingressavam nas universidades brasileiras. O descontentamento dos jovens seria compensado pela formação técnica e um cargo no mercado de trabalho, o que chamamos de terminalidade do ensino técnico. Essa terminalidade é muito exigida pelos gestores entrevistados, o que vem confirmar a comparação e a confusão dos dois modelos de ensino profissionalizante. Houve uma preocupação maior com o plano legal e certo relaxamento com os planos doutrinário e real, do dia-a-dia da escola. A maioria das reuniões foi mais para decidir questões relacionadas com a legislação nacional em vigor e as normas pertinentes e significativas para implementar a integração. [...] eu fiz parte da elaboração do plano de curso da edificação e que nos foi passada pela direção do colégio, uma pasta com documentações, com tudo o que a gente tinha que seguir e que nós éramos obrigados a acatar e na época [...] tinha a questão de carga horária mínima que nós tínhamos que seguir, tempo de estagio, coisas assim, e íamos acatando na medida do possível. Houve a montagem da grade, critérios, habilidades e competências que para a gente foi uma dificuldade a gente entender o que era habilidade e o que era competência e até hoje agente confunde o que é habilidade e o que é competências [...] por que a gente não poderia feri a legislação por que cada curso queria ter a sua particularidade, a gente mandava isso para o MEC e um avaliador do MEC tava outra olhada, devolvia e a gente corrigia (GESTOR 9). 17 No anteprojeto elaborado pela administração do CTU/UFJF, em sua apresentação, o documento cita que os cursos integrados “não é novidade”, e conclui que a escola foi criada há 50 anos para oferta de ensino profissionalizante na forma integrada (ANTEPROJETO, 2007). 18 Preceito pelo qual se considerava ser possível calcular a relação ótima entre quantidade de mão-de-obra necessária e formada (RAMOS, 2007). 86 O que observamos é que são muitas as dificuldades para a elaboração e organização de um currículo integrado. A organização por áreas de conhecimento, obedecendo às disciplinas tradicionais e adotada pela instituição, é ultrapassada e convencional, que em nada colabora para uma organização curricular inovadora, que esbarra na constituição do corpo docente que se julga “dono” da disciplina que ministra, pois é formado e selecionado por disciplinas específicas. O caminho para responder tais dificuldades seria a capacitação dos docentes, gestores e técnicos, para planejar e aplicar currículos que superem a soma de currículos e criem metodologias que ultrapasse a dualidade educacional e valorizem a educação tecnológica. Ciavatta (2005) esclarece que a formação integrada entre ensino geral e a educação profissional, exige construção de currículos, orientados pelo pensamento e pela produção da vida. Não deve ser alicerçada apenas das praticas de educação profissional e das teorias da educação propedêutica que adestram para o vestibular. “Ambas são práticas operacionais e mecanicistas, e não de formação humana no seu sentido pleno” (CIAVATTA, 2005, p.94). 3.2.3 O trabalho como princípio educativo Os gestores não têm clareza suficiente de compreender o trabalho como princípio educativo. A maioria relaciona como formar o aluno para o trabalho, no sentido de qualificálo profissionalmente para o mercado de trabalho e o sustento pessoal e de sua família. [...] ele ao terminar a educação básica ele já tem uma qualificação profissional e essa qualificação pode servir como inicio como uma formação inicial e continuada e pode também, como para muitos, possibilitar ele depois a fazer um curso superior, já trabalhando como técnico. Nós temos muitos casos de alunos que ao terminar o curso, ele usa o seu diploma de técnico, até para se sustentar e pode continuar os seus estudos (GESTOR 3). Para Ramos (2005) um currículo integrado tem o trabalho como princípio educativo, quando este permite, concretamente, a compreensão do significado econômico, social, histórico, político e cultural das ciências e das artes e da tecnologia. Um currículo nesses moldes baseia-se numa epistemologia que considere a unidade de conhecimentos gerais e conhecimentos específicos e numa metodologia que permita a identificação das especificidades desses conhecimentos quanto à sua historicidade, finalidades e potencialidades. Pedagogicamente visa à construção conjunta de conhecimentos gerais e 87 específicos, no sentido de que os gerais fundamentam os específicos e estes evidenciam o caráter produtivo concreto dos gerais. Nessa perspectiva, não procede delimitar o quanto se destina à formação geral e à específica, posto que, estes são indissociáveis e, portanto, não podem ser predeterminadas e recortadas quantitativamente. Para Frigotto (2005), o trabalho como princípio educativo é oriundo da necessidade que os seres humanos têm em alimentar-se, proteger-se e criar seus meios de vida. O ser deve saber desde cedo que a tarefa de prover a subsistência e outras atividades da vida é conseguida pelo trabalho e é comum a todos os seres humanos. Com isto, evita-se criar indivíduos ou grupos que exploram e vivem do trabalho dos outros. O autor utiliza uma expressão de Gramsci para exemplificar esses seres: “[...] podem ser considerados mamíferos de luxo - seres de outra espécie que acham natural explorar outros seres humanos” (FRIGOTTO, 2005, p.60). Não é formar somente para o exercício do trabalho, mas dimensioná-lo para compreender as relações dinâmicas sócio-produtivas do mundo, com suas vitorias e derrotas, “[...] e também habilitar as pessoas para o exercício autônomo e crítico de profissões, sem nunca se esgotar a elas” (BRASIL, 2007, p.45). A dificuldade de compreensão da proposta é vista no depoimento de um gestor: A principal finalidade que eu vejo é porque a pessoa já tem uma visão da profissão já desde chão da fabrica, mesmo se ela for seguir a sua carreira, mesmo se ela for para outra carreira, ela vai entender melhor aquele cara que trabalha aquele técnico ou mesmo aquele pião da fabrica, porque ela de certa forma no nosso caso aqui, a gente tem uma vivencia maior dos cursos profissionalizantes da área industrial, ela tem estágio que permite que ela conviva com esse pessoal, conheça melhor independente que ela vá continuar que tenha futuro ou não naquela carreira, mas acho que como ser humano a pessoa cresce muito (GESTOR 3). Focalizando a fala dos gestores com relação ao conhecimento dos documentos legais que norteiam o ensino médio integrado, a maioria dos entrevistados admitem que tenha uma documentação de orientação, mas na hora de citar tais documentos, os gestores divagam e acabam não comentando. Eles desconhecem a concepção do trabalho como princípio educativo. O documento mais citado foi o Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) e sempre relacionando que os cursos técnicos passariam ser ministrados juntos com o ensino médio. O documento-base (BRASIL, 2007) que serviu como norteador da forma de oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio, não foi citado por nenhum gestor pesquisado. 88 Naquela ocasião, foi uma supressa para todo mundo, pegou todo mundo com as calças na mão. [...] tanto é que colégio não mudou no começo, na ocasião, eu tava chegando ao colégio, isso para mim era grego [...] e ai o que acontece, depois começaram a pingar as resoluções, é só olhar as datas, isso para o legislador isso não tem problema, mas para o colégio que está na linha de frente, tem que enfrentar o aluno, o fim do semestre esta chegando, ele teve que fazer uma reforma sem saber o que estava fazendo [...] tinha uma idéia geral, só vinha esclarecimento daquela idéia seis meses depois, e outro problema só vinha muito tempo depois, então muita coisa foi difícil implementar. A implementação foi no escuro, depois a foi uma supressa e o que aconteceu? Como foi que o colégio reagiu? Reagiu do jeito que pode, ele mudou o EM, porque o EM estava regulamentado, o EP não estava regulamentado ainda (GESTOR 2). Alguns gestores concordam que o arcabouço teórico, fundamentado na educação unitária foi fortemente assumido pela direção do CTU/UFJF, mas que vai se fraquejando até só repercutir levemente na instituição com pouca ação e participação dos professores: Os documentos que eu me lembro, o número é o 5154, na época eu fiz leitura sobre a LDB também para fazer essa vinculação, como o colégio já foi determinado na votação da integração, eu deixei que a diretoria de ensino e os que outros lá determinassem o que seria feito, e eu fiquei preocupado com a matriz curricular do nosso curso, com os conteúdos, como foi voto vencido e tudo, a discussão coube a eles, já veio preparado para a mudança, esse é o meu entendimento da reunião da assessoria educacional (GESTOR 4). Eu lembro que a gente estava participando das reuniões dos coordenadores juntamente com a direção de ensino, nós naquele momento surgiu então à necessidade que houvesse a adequação ao decreto 5154, daí a gente teve acesso ao decreto, à minuta do decreto ou alguma coisa assim houve, onde a gente começou a fazer uma leitura de como esse decreto estaria impactando a nossa realidade aqui na instituição que era o CTU ainda, do que eu me lembro agora, foi à minuta ou o decreto 5154 ou se existia algum outro documento que pudesse nos auxiliar nesse momento, eu não estou conseguindo agora lembrar. Fizemos seminário para organizar grupos para discutir como se daria essa integração, como a gente estava trabalhando com os cursos modulares à gente tinha que encontrar uma maneira de adequar à carga horária, aquilo que era solicitado para o E.M e tinha que adequar àquela carga horária dos cursos, da formação especifica (GESTOR 6). Não me lembro desses documentos, leis e decretos. Eu me lembro das discussões, debates e seminário sobre o curso do ensino médio integrado, lembro-me dessas mudanças que ocorreram no ensino profissionalizante, mas documentos eu não lembro (GESTOR 8). 89 O número de leis eu não vou lembrar nenhum, eu sei que quando eu fiz parte da elaboração do plano de curso da edificação e que nos foi passada pela direção do colégio, uma pasta com documentações, com tudo o que a gente tinha que seguir e que nós éramos obrigados a acatar (GESTOR 9). A mobilização da comunidade escolar em torno do da integração ocorreu de forma pouca participativa e a proposta da integração entre a educação básica e a profissional continua fragmentada: “[...] embora com o nome ‘integrado’ continua igual ao ensino modular as disciplinas técnicas e as disciplinas teóricas, e piorou um pouco nessa formação” (GESTOR 4). Alguns gestores entendem o trabalho como princípio educativo para o ensino médio profissional num sentido único e de terminalidade, isto é, os alunos cursariam o ensino médio integrado com o objetivo de uma habilitação profissional que proporcionasse condições essenciais de formação capaz de assegurar o exercício de uma profissão. A idéia ou o objetivo do aluno em tentar o vestibular e prosseguir para o nível superior acaba incomodando alguns gestores: [...] outra coisa é o pessoal, o público alvo, não é quem vai fazer vestibular, mas é gente que tem necessidade de trabalhar, é nos selecionamos justamente ao contrário, nós estamos selecionando elite, só à elite, quando ele chega aqui ele vê que tem condição de fazer um curso superior, ele não entra no mercado de trabalho agora, ele pode entrar mais tarde, ai ele usa isso aqui só como trampolim para o vestibular (GESTOR 8). [...] ele não sabe o que quer a gente observa principalmente no 3º ano e no final do semestre a preocupação deles com o PISM e passar no vestibular, essa é a preocupação deles, o ensino técnico fica por segundo plano (GESTOR 4). Tem que profissionalizar mais o EMI, hoje nós preparamos o aluno mais para fazer o vestibular, hoje estamos muito preocupado em preparar o aluno para o vestibular, e o aluno sabe disso, ele sabe que a ascensão é via do 3º grau (GESTOR 2). Para a linha produtivista é enorme a ineficiência das escolas técnicas federais, dada a pequena proporção de formandos que se dirige às profissões técnicas para as quais foram preparados e formados. Por sua excelência acadêmica, acabam por atrair uma elite da 90 classe media e alta, mas interessada na aprovação nos vestibulares mais cobiçados, sem qualquer interesse pelo exercício da profissão aprendida. É preciso entender, são escolas caras e que oferecem um excelente ensino, mesmo nos assuntos profissionalizantes. O problema é o descompasso entre a proposta de oferecer um ensino técnico e o perfil dos estudantes que têm pouco interesse por ele – pelo seu alto status intelectual e social (CASTRO, 2009, p.164). Para o BID, as escolas técnicas mostraram mais defeitos do que resultados positivos. As mesmas não cumpriram, com eficiência, sua função formativa para ingresso imediato no mercado de trabalho, já que a maioria de seus egressos direcionaram-se para a continuidade dos estudos, via entrada no ensino superior, ou seja, para o Banco Interamericano, a ambigüidade destas escolas, ao articularem ensino secundário com ensino profissionalizante, termina por diluir seus esforços, não alcançando eficientemente nenhum dos objetivos traçados. O dualismo está presente nas práticas dos gestores, a educação profissional está mais voltada para inserir o aluno no mercado de trabalho. O Art. 1o do Decreto no. 5.154/04 (BRASIL, 2004a) determina no III que a educação profissional será desenvolvida nas áreas de graduação e a escola única que origina a integração é fundamentada em dois princípios: o da continuidade e da terminalidade. 3.2.4 A pesquisa como princípio educativo: o trabalho de produção de conhecimento Segundo o documento orientador da integração esse preceito está endogenamente ligado ao trabalho como princípio educativo. A pesquisa tem o papel de potencializar este princípio, na construção de sujeitos autônomos e com a capacidade de interpretar e compreender o mundo. Criando as condições de atuar, por meio do trabalho, na transformação da natureza em função das necessidades da humanidade e na preservação dessa natureza em face às necessidades das gerações futuras. Nessa perspectiva a pesquisa, ligado ao ensino, colabora na construção da autonomia intelectual dos indivíduos e orienta os estudos na busca de resolução para os problemas teóricos e práticos da população trabalhadora (BRASIL, 2007). 91 Apenas um gestor colocou a importância da pesquisa, porém não relacionar com a construção de sujeitos autônomos conforme documento-base (BRASIL, 2007), relacionando mais com a formação do professor: Outra coisa é fazer pesquisa, tem que fazer muito, a nossa escola faz muito pouca pesquisa, uma coisa que eu tenho orgulho de falar é que no curso de edificação, a gente está implantando essa parte de pesquisa, o que a gente faz, alem dos alunos fazerem pesquisa de treinamento profissional, hoje nós temos lá na construção civil, nove pesquisas de treinamento profissional, nós temos quatro pesquisas com a FAPEMIG, em iniciação cientifica, nós temos três trabalhos, fora isso nós temos, dois trabalhos de mestrado que estão sendo executado dentro da escola com os alunos trabalhando na pesquisa e dois trabalhos de doutorados, o professor que está fazendo o seu doutorado ele trabalha com três alunos da edificação para poder ajudar nas pesquisas que ele está desenvolvendo, mas isso é muito pouco ainda, se você olhar o nosso curso tem coisa que a gente não faz. Eu acho que tem que dá uma mexida nisso, por isso que é importante a qualificação do professor, o professor não pode ficar parado muito tempo não, temos que incentivar o professores a fazer mestrado, fazer doutorado, fazer qualificações, congressos, seminários, é incentivar o professor apresentar as suas pesquisas e não engavetar a pesquisa, se você tem esse procedimento, o que a comunidade ganha com isso, nós temos mostrar essa pesquisa em seminários e congressos (GESTOR 9). O documento orientador considera que a pesquisa deve estar presente no cotidiano da escola, pois esta instiga curiosidade e gera inquietude no aluno, evitando o enciclopedismo, pacotes fechados de visão do mundo, de informações e saberes do senso comum. A pesquisa potencializa a inquietação, no início das fases escolares, contribuindo para que em níveis educacionais mais avançadas, o cidadão possa buscar respostas e criar investigações para reconstruções de conhecimentos. Para o documento base (BRASIL, 2007), a pesquisa está intimamente relacionada ao trabalho como princípio educativo na construção de seres autônomos e intelectualmente capazes. E orienta: Nesse sentido, é necessário que a pesquisa como princípio educativo esteja presente em toda a educação escolar dos que vivem e viverão do próprio trabalho. Ela instiga o estudante no sentido da curiosidade em direção ao mundo que o cerca, gera inquietude, para que não sejam incorporados pacotes fechados de visão de mundo, de informações e de saberes, quer sejam do senso comum, escolares ou científicos (BRASIL, 2007, p.48). O gestor 5 comenta a importância da infra-estrutura da instituição para que o princípio da pesquisa seja incorporado nos projetos pedagógicos dos cursos e cita algumas medidas que convergem para este objetivo: 92 [...] vou começar pela infraestrutura, o que eu digo de infraestrutura, primeiro nós temos que criar condições de trabalho adequado [...] como é que você tem um local para você atender um aluno, atender um aluno no plantão, atender o aluno num bate papo para a iniciação a pesquisa, nós não conseguimos criar uma condição de permanência do professor, isso é até um objetivo nosso, temos que ter essa infra-estrutura [...] Assim você começa a ter condições de poder trabalhar o processo de formação, nos três pilares, no ensino, na pesquisa e na extensão, se a gente não der condições de trabalho, a gente não consegue fazer isso ai [...] a outra questão é a otimização do horário dos alunos, otimizar para que os alunos tenham disponibilidade para fazer as suas atividades e outra coisa é criar linhas de fomento, são os programas de iniciação cientificas, a bolsa de treinamento profissional, que já está avançando bem, os programas de bolsas hoje, tem muitos programas de bolsas e muitas possibilidades (GESTOR 5). Por fim o referido documento alerta para o fortalecimento do ensino e pesquisa na produção de conhecimentos num sentido ético e na melhora das condições de vida de todos e não apenas fortalecer o mercado “[...] e privilegiar o valor de troca em detrimento do valor de uso, concentrando riqueza e aumentando o fosso entre os incluídos e os excluídos” (BRASIL, 2007, p.49). A maioria dos gestores considera que faltou uma discussão mais voltada para o modelo educacional proposto e considera que o corpo docente da instituição desconhece os fundamentos teóricos e metodológicos da proposta que norteia a implantação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio. 3.2.5 A relação parte – totalidade na proposta curricular As discussões para a construção dos currículos dos cursos foram polêmicas, o que se caracterizou na prática, foi à existência de dois cursos juntos, o que os gestores chamam de uma “falsa integração”. A preocupação com a relação a sua concepção integradora ficou só no papel, o que houve foi apenas uma proposta de grade curricular que acomodassem as disciplinas do ensino propedêutico com o técnico, como uma simples divisão de responsabilidades, uma discussão técnica. Escolher as qualificações e habilitações de cada curso com suas respectivas demandas e ajustar os currículos a essas demandas, foi um desafio para os gestores. O que se percebe é que a seleção de conhecimentos a serem ensinados e a integração dos conhecimentos gerais e específicos foram poucos discutidos na instituição, como aborda o seguinte gestor: 93 Uma dificuldade que eu tive quando foi fazer a integração, era o professor falar assim: “essa cadeira é minha e eu não aceito que outra pessoa vá desenvolver esse assunto”, eu acho errado, isso acabou por eu não ter uma formação em biologia, eu não posso falar em meio ambiente? Eu escutei assim: “você não está qualificada para falar nisso”, “você não está qualificada a dar essa disciplina”, a integração não foi só ensino propedêutico com o ensino técnico não, foi o técnico com o técnico também [...] teve professor da área técnica, que requisitou as ementas das disciplinas por que ele queria saber se tinha na ementa, alguma parte do departamento dele, por quê? Porque só o departamento poderia lecionar as disciplinas voltadas para aquela área, gente isso não existe mais, não existe. [...] então eu acho que isso foi um problema que eu senti, as pessoas tinham aquela opinião que eram dona da cadeira, é isso não funciona mais, a própria palavra fala, é “integrar”, e você pegar os pontos fortes de cada setor, de cada professor (GESTOR 9). A formação integral, plena e completa não é aprender tudo. Segundo o documento-base (BRASIL, 2007), o importante é como chegar a compreensões globais, totalizantes da realidade, a partir dos componentes e conteúdos curriculares. A idéia é trilhar o bom relacionamento entre partes e totalidade. Para fins de aprendizagem torna-se necessário identificar os componentes e conteúdos curriculares que permitam fazer relações sincrônicas (ocorrem ao mesmo tempo) e diacrônicas (ocorrem com a evolução do tempo) radicais entre o aprendizado e a realidade em que esse aprendizado está inserido. É preciso estudar os problemas de uma determinada área profissional em suas múltiplas dimensões: econômica, técnica, política, social e cultural, está é a formação omnilateral. O documento base orienta: No ensino médio integrado à educação profissional esses problemas podem ser aqueles que advêm da área profissional para a qual se preparam os estudantes. Mesmo que os processos de produção dessas áreas se constituam em partes da realidade mais completa, é possível estudá-los em múltiplas dimensões, de forma que, para compreendê-los, torna-se necessário recorrer a conhecimentos que explicam outros fenômenos que tenham o mesmo fundamento. Portanto, a partir de questões específicas pode-se necessitar de conhecimentos gerais e, assim, apreendê-los para diversos fins além daqueles que motivaram sua apreensão (BRASIL, 2007, p.51). A maioria dos gestores entrevistados desconhece da proposta de se construir os currículos integrados de conhecimento gerais e específicos como totalidade. Na montagem desses currículos a importância do pressuposto da totalidade não foi considerada e a prioridade das discussões foi viabilizar a grade de cada curso integrado e a questão da relação parte-totalidade e a interdisciplinaridade não foram contempladas, como observa o gestor entrevistado: 94 A proposta inicial para cada curso era no máximo 35 aulas semanais, quando chegou na hora de montar o currículo, todo mundo falava assim: ”em nome da qualidade do ensino não pode reduzir as minhas aulas, o quantitativo de aulas” [...] Eu acho um absurdo essa carga horária, eu comentei com os alunos gente nós não queremos nos submeter a 40 horas semanais e queremos que os alunos se submetam a essa carga, eu acho isso cruel, se agente consegue fazer essa integração de fato, a hora que a gente conseguir, não é fácil não ta, porque isso depende de cultura, de formação nossa, da resistência de cada um isso é difícil, “ninguém vai invadir a minha praia não”, esses feudos são difíceis de lidar. Nossa formação é assim, nós não fomos formados para trabalhar interdisciplinarmente, nós não fomos formados para isso não, na verdade foi feito uma junção de estruturas curriculares, mas integração de fato, nós não conseguimos fazer. [...] com isso nós podemos diminuir um pouco e você abre mais espaço para que o aluno tenha outras formações e atividades lúdicas que ajuda ele como cultura e esportes (GESTOR 5). A interdisciplinaridade é problema citado por todos os gestores entrevistados, desejada, mas muito pouca praticada pelos professores da instituição. Quando ocorre é em casos isolados e individuais. O professor é considerado o maior empecilho para que a interdisciplinaridade ocorra no dia a dia: Voltando a interdisciplinaridade, o nosso caso aqui, a gente se considera quase como dono da disciplina, então a gente não quer abrir mão da nossa disciplina, falta um pouco de conhecimento, de alguém que nos oriente, o nosso curso é muito novo, eu acho que ela pode acontecer sim, eu acho que tem muitos professores querendo, estão sentindo uma carga horária em cima dos alunos muito pesada, o aluno está ficando cansado no final do dia, ele podia ter um rendimento melhor se a gente soubesse aproveitar melhor essa interdisciplinaridade, ela tem que ser feita. Eu estou com uma expectativa muito grande agora, que pela primeira vez a nossa escola, quase sempre trabalhou sem praticamente um profissional nenhum da área pedagógica que pode dá esse suporte, como a gente tem agora uma pessoa na supervisão que vai começar a participar dos colegiados, que vai tentar discutir com os professores para ver quais são as barreiras que existem. [...] Integrar mesmo as disciplinas, para diminuir essa excessiva carga horária. [...] Então a nossa interdisciplinaridade ela feita de uma forma muito tímida, por exemplo, a própria matemática com a genética, genética é matemática, o aluno estuda na matemática e aplica lá, mas não tem essa integração a ponto de diminuir um pouco a carga para o professor (GESTOR 3). Percebemos que na maioria das vezes a discussão da interdisciplinaridade está relacionada erroneamente com a diminuição da carga horária, e que a sua prática viria para resolver todos os males de carga horária e o bom funcionamento dos cursos integrados. 95 Algumas citações ilustram o problema: “A interdisciplinaridade hoje, são casos isolados, a gente não tem como políticas nossas efetivamente, temos algumas experiências isoladas” (GESTOR 1), “Se a integração e a interdisciplinaridade ocorressem mais efetivamente, poderíamos resolver a questão da carga horária exagerada, evitando dois ou mais professores falar o mesmo assunto” (GESTOR 9). Ramos (2007) orienta que a escola não pode trabalhar teoria separada da realidade concreta, do seu potencial produtivo, pois esta teoria se torna vazia e abstrata. Propõe ir alem dos guias escolares e livros didáticos, que no máximo, podem servir de apoio, e avançarmos na unificação do geral com o específico. A autora cita exemplos que ilustram a vinculação de conhecimentos: os processos digestivos e hábitos alimentares, a degradação ambiental e o aquecimento global, com a crise do petróleo e o problema da energia nuclear. A perspectiva maior é a compreensão dos fenômenos reais que são conhecimentos que se pode fazer e compreender. Alguns gestores acreditam que para tentar construir um currículo integrado nos moldes exigidos, a formação dos professores em exercício e daqueles que estão sendo formados é insuficiente, isto é, as universidades brasileiras teriam que incorporar nos seus currículos a educação profissional sob esta perspectiva. Na prática o que vem acontecendo é apenas uma complementação pedagógica e/ou formação para campo específico das profissões de uma forma aligeirada. Nesse aspecto a universidade fica a dever, as licenciaturas deveriam também preparar professores para a educação profissional integrada. Um quadro qualificado de professores e uma estratégia adequada de formação facilitaria a implementação de um currículo baseado nos moldes parte – totalidade. A maioria dos gestores acreditam que o desenho de um currículo integrado apresenta dificuldade devido à tradição de organização e divisão das disciplinas, incorporadas e consolidadas na formação desses professores. Outro aspecto que podemos pontuar em relação à questão do currículo, na instituição pesquisada, foi a discussão quase exclusiva, para a adequação à lei e as normas vigentes. A questão legal falou mais alto do que a opção pedagógica ou de um projeto político pedagógico que representasse as aspirações do ensino médio integrado, representado pelos princípios do trabalho, ciência, tecnologia e cultura. Feito isso poderíamos ter trabalhado internamente com o professor na perspectiva de romper com a sua visão individualista (“o professor é dono da disciplina”) do ‘meu’ e partir para o ‘nosso’. A elaboração das ementas e a grade curricular foram o começo e o final da discussão da construção curricular, esquecemos o mais importante o projeto político pedagógico. 96 Para a maioria dos gestores o centro e o final das preocupações foram a confecção das matrizes curriculares entendendo a matriz curricular como a síntese e não como processo de toda a discussão. Os casos onde houve alguma discussão, esta ocorreu apenas nos sentido de acomodar as disciplinas e obedecer aos modelos de matrizes que o MEC recomendava. A sobreposição de conteúdos permanece e os gestores indicam como solução, uma avaliação de todos os cursos integrados, na tentativa de melhorar o diálogo entre as disciplinas, os conhecimentos e incentivar e valorizar o trabalho coletivo dos professores. Se a integração ocorresse mais efetivamente, poderíamos resolver a questão da carga horária exagerada, evitando dois ou mais professores falar o mesmo assunto, falta melhorar essa interação, em resistência dos materiais, por exemplo, eles estudam centro de gravidade, só que eles vêem centro de gravidade na física no 3º ano novamente, então vamos resolver assim: quem ficar com essa parte de centro de gravidade? Vai ser o pessoal da física ou da resistência dos materiais? A física que é dada para o curso de metalurgia, não pode ser a mesma que vai ser dada para a edificação, não é a mesma que se dá para a Eletrotécnica, então você tem que ter tratamentos e focos diferentes, se os professores lá no médio focarem de maneira diferente. Eu acho que tanto o ensino propedêutico pode ajudar a gente, como pode o ensino técnico ajudar o propedêutico (GESTOR 9). Para Kuenzer (2006), o currículo, na perspectiva da integração, origina-se do princípio pedagógico que mostra a ineficiência de ações simplesmente conteudistas, organizadas na quantidade de informações que não necessariamente se articulam. O currículo deve propor ações que levem os estudantes a uma relação com o aprender e o saber. As disciplinas devem integrar conhecimentos das diversas áreas, através da ação de ricas e variadas relações, evitando a compartimentalização especifica, isto é a fragmentação da ciência. Quando se questionam os gestores sobre a elaboração da proposta curricular, o currículo é indicado de forma espontânea como a matriz curricular, e não como o conjunto de conhecimentos histórico-sociais que são organizados e que devem estar presentes no cotidiano do aluno para a prática da cidadania na sociedade. Conhecimentos estes, que devem ser selecionados a partir de amplo diálogo dos professores, tendo como foco central o aluno, as disciplinas e a carga horária. A maioria dos gestores pesquisados concorda que a capacitação de dirigentes, docentes e técnicos envolvidos no ensino médio integrado é um caminho a ser trilhado, focando principalmente a questão do currículo, considerado um ponto pouco desenvolvido na instituição. A concepção, planejamento, implementação e avaliação dos currículos dos cursos 97 é uma discussão urgente e reivindicada por todos, só assim teremos a garantia da integração da formação geral com a profissional na perspectiva da educação tecnológica integral. 3.2.6 Os obstáculos e as conquistas da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora Os gestores apontam que uma das maiores dificuldades para a concretização do ensino médio integrado foi a não adesão de gestores, professores e técnicos administrativos em relação à proposta adotada. É unânime entre os entrevistados a afirmação a respeito da baixa participação dos professores que podem ser traduzidas como: “melhorar a participação do professor”, “falta de comprometimento do professor”, os professores têm que mudar as suas aulas, mas eles não querem mudar”, “o desconhecimento da proposta afasta o professor do envolvimento das atividades da instituição”, “questão cultural do professor”, “a vaidade do professor” e o “professor não se adaptam na integração, ele ainda se considera dono da disciplina e de seus conteúdos”. Para Ciavatta (2005) a adesão de gestores e professores responsáveis pela formação geral e específica é um pressuposto para a formação integrada: É preciso que se discuta e se procure elaborar, coletivamente, as estratégias acadêmico-científicas de integração. Tanto os processos de ensinoaprendizagem como de elaboração curricular devem ser objeto de reflexão e de sistematização do conhecimento através das disciplinas básicas e do desenvolvimento de projetos que articulem o geral e o específico, a teoria e a prática dos conteúdos, inclusive com o aproveitamento das lições que os ambientes de trabalho podem proporcionar (CIAVATTA, 2005, p.100). Conforme apregoa o documento-base (BRASIL, 2007) a formação continuada dos professores é fundamental e estratégica para consolidação com êxito do ensino integrado. É necessária uma mudança na cultura pedagógica que tire o professor da tão comentada expressão: “instalado e acomodado” e que rompa com os conhecimentos fragmentados. O MEC deve elaborar e executar ações de formação para os professores e funcionários, tanto inicial quando continuada, que forem atuar na formação de profissionais na educação média integrado. Essa formação deve ser superar a aquisição de técnicas didáticas de transmissão de conhecimentos para os professores e de técnicas de gestão para os dirigentes e incorporar aspectos que possam superar o modelo socioeconômico vigente e focalize o ser humano trabalhador e suas relações com o meio ambiente. 98 Alguns gestores relatam que as palestras realizadas tiveram pouca ressonância na comunidade e o seminário “Desafios da integração”, que pretendia criar ações para viabilizar a implantação dos cursos técnicos integrados, se concentrou na construção de matrizes curriculares para atender as exigências do MEC. Questionaram a ausência de cursos de capacitação para a nova concepção de educação profissional, entendendo que uma proposta de tal envergadura, que busca mudanças estruturais e históricas, constitui uma tarefa de difícil implantação e de longa duração. Nós temos que ter uma mudança, principalmente com a questão cultural, enquanto a gente mantiver essa coisa de tratar a base comum de um jeito e a base técnica de outra essa integração não acontece, a gente acaba não cumprindo essa base legal, você trata ainda isso com os coordenadores de um modo geral, ele entende que ele é coordenador da base técnica, da base comum não, tanto é que muitas dificuldades [...] mas a nossa cultura ainda não assimilou adequadamente. Então você fica vendo que a questão legal ela não rompe com a questão cultural, isso dificulta, certamente agora, a partir do momento que iniciarmos a avaliação, tem uma tendência de termos um crescimento e aí tá corrigindo esses erros de percurso, até algumas matrizes curriculares foram mexidas, muito poucas, até para atenderem uma exigência legal (GESTOR 1). Frigotto, Ciavatta e Ramos (2005) alertaram para este problema e criticou as (in)decisões tomadas pelo MEC. O ministério deveria fomentar a implantação do ensino médio integrado na rede federal e nas redes estaduais. O MEC como formulador e coordenador da política de integração, deveria criar um plano de implementação dessa modalidade, com um acompanhamento com discussão, avaliação e sistematização das experiências implementadas. No caso da rede federal, os autores, aconselhavam a utilização do Proep como fonte de financiamento para essa iniciativa, juntamente com o processo de convencimento político, tanto dos dirigentes como da comunidade em geral. Outro ponto negativo comentado por todos os gestores foi a excessiva carga horária que é submetida os alunos dos cursos integrados. Os gestores investigados são unânimes em afirmar que a justaposição das grades do ensino geral com o ensino específico, portanto sem aplicação das mudanças necessárias da integração, “incharam” as grades dos cursos pesquisados. As grades “inchadas”, para a maioria dos gestores pesquisados, é a prova cabal da não integração dos cursos estudados e a consolidação da idéia de dois cursos justapostos, o curso propedêutico de preparação para o vestibular e o curso profissionalizante de nível técnico. O gestor entrevistado analisa a situação vivida até o momento na instituição, da seguinte maneira: 99 A integração não existe, houve apenas a união da parte geral com a específica, falta uma conversa das partes. Naquele momento o que nós fizemos foi estabelecer o que seria a carga horária, conteúdo de formação geral, a parte diversificada e o que seria o conteúdo e carga horária de formação especifica, dentro dessas três formulações estabelecidas e contempladas para a formação do individuo, como a gente estava trabalhando nessa formatação modular a gente teve que agrupar conteúdos, eu acho que existe tanto uma dificuldade grande na formação especifica porque nos agrupamos todos os conteúdos e às vezes precisam melhor ser conversados e temos também a questão da integração com a parte geral, e quando nós começamos discutir a questão da carga horária, a gente tinha exato onde a nossa carga horária está em media 42 aulas/semana, é um curso com uma carga horária muito alta, eu acho de certa forma para o aluno, isso é muito desgastante (GESTOR 6). A ausência de um projeto político pedagógico, na instituição, é considerada como um obstáculo considerável para a implementação de um ensino técnico integrado. Primeiramente tem que ter o projeto político pedagógico bem elaborado bem discutido e aprovado pela maioria como deve ser a partir do projeto político pedagógico. Ele vai ser o guiar às diretrizes, as definições das ações que devem ser feitas uma maneira de que as pessoas cumpram e respeitam a decisão, tem que haver a participação de todos porque antes nos tínhamos pouquíssimos professores, agora tem um monte de professores, tem um monte de funcionários, cada um num lado. (GESTOR 6). Assevera o documento-base (BRASIL, 2007) que o projeto político pedagógico integrado deve representar a expressão viva de concepções, princípios, finalidades, objetivos e normas que unificam a comunidade de uma instituição. A aprovação do ensino médio integrado deve ser uma das propostas validada pelo projeto político pedagógico, que vai constituir numa política de referência, organizada, pautado pela coerência entre princípios, finalidades, objetivos e métodos de ação. Isso, em outras palavras, caracteriza a práxis coletiva, isto é, a coerência e a unidade entre teoria e prática. Outros fatores citados como obstáculos a implementação da oferta de educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio são: a instituição ainda foca o vestibular e não o ensino profissional, a ausência de uma avaliação dos cursos integrados, a inexistência de cursos focados na capacitação de professores voltados para o ensino médio integrado e a falta de compreensão da concepção do ensino técnico integrado por toda comunidade escolar. Por se tratar de mudanças estruturais no ensino profissionalizante, a capacitação dos docentes é fundamental para que a proposta possa ser construída no interior da instituição. 100 A concepção de ensino médio integrado com os seus fundamentos teóricos e metodológicos, ainda está distante da comunidade e do dia a dia dos alunos. Dentro dos aspectos positivos citados pelos entrevistados podemos destacar: o espaço físico da instituição, as melhorias dos laboratórios, quadro próprio de professores, o regime de dedicação exclusiva dos professores, capacitação e qualificação dos docentes, reformulação da biblioteca, a construção do restaurante pela instituição e o perfil do aluno que passou a estudar na escola, menos elitizado, mais participativo e com uma maior convivência entre os colegas e com a instituição. Com relação ao quadro próprio de professores na instituição, citada com ponto positivo pelos gestores entrevistados, o MEC através do documento orientador do ensino médio integrado (BRASIL, 2007), alerta que para uma efetivação de uma política pública e não apenas um programa de governo, é necessário conhecer as potencialidades e fragilidades dos sistemas educacionais, na busca da sua superação. O documento cita como primeira fragilidade a falta de professores efetivos no domínio da educação profissional. A segunda fragilidade, segundo o MEC (BRASIL, 2007), seria a formação dos professores e orienta: Também é necessário levar em consideração que mesmo os professores licenciados carecem de formação com vistas à atuação no ensino médio integrado, posto que tiveram sua formação voltada para a atuação no ensino fundamental e no ensino médio de caráter propedêutico, uma vez que as licenciaturas brasileiras, em geral, não contemplam em seus currículos estudos sobre as relações entre trabalho e educação ou, mais especificamente, sobre a educação profissional e suas relações com a educação básica (BRASIL, 2007, p.33). Para o MEC (BRASIL, 2007), a formação continuada é fundamental para consolidar uma cultura pedagógica que rompa com os conhecimentos fragmentados e alerta como ponto central “que a formação dos profissionais para o ensino médio integrado deve guardar suas especificidades, mas também precisa estar inserida em um campo mais amplo, o da formação de profissionais para a educação profissional e tecnológica” (BRASIL, 2007, p.34). Essa orientação tem a intenção de nortear a formação desses profissionais por uma visão que ultrapasse a técnica e vá além dela, incorporando aspectos que contribuam para a superação do modelo de desenvolvimento socioeconômico vigente e, dessa forma, privilegie o ser humano trabalhador e suas relações com o meio ambiente do que, os aspectos econômicos 101 do mercado de trabalho (BRASIL, 2007). A formação dos professores deve ser orientada por três eixos: conhecimentos específicos de uma área profissional, formação didático-políticopedagógica e a integração entre a EPT e a educação básica. Esses três eixos devem ainda contemplar: as relações entre estado, sociedade, ciência, tecnologia, trabalho, cultura, formação humana e educação; as políticas públicas e, sobretudo, educacionais de uma forma geral e da educação profissional e tecnológica em particular; o papel dos profissionais da educação, em geral, e da educação profissional e tecnológica, em particular; a concepção da unidade ensino-pesquisa; a concepção de docência que se sustente numa base humanista; a profissionalização do docente da educação profissional e tecnológica: formação inicial e continuada, carreira, remuneração e condições de trabalho; o desenvolvimento local e a inovação (BRASIL, 2007). Finalmente, encerrando esse capítulo, acreditamos que o processo de implementação da educação profissional integrada ao ensino médio no IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora, com todos os seus aspectos positivos e negativos passa a ser um desafio político e pedagógico constante para toda a instituição e não apenas as modificações dos aspectos legais da política educacional proposto pelo MEC. O momento é de buscar a integração dos cursos de forma planejada e coordenada de modo a superar a lógica que vem sendo aplicada, baseada na Lei no. 5692/71 e caminharmos no sentido da aplicação do decreto no. 5154/04, marco legal que confere a liberdade e a autonomia para a implementação do ensino médio integrado. Como nos orienta Ramos (2007): Ou nos imbuímos da vontade política, uma vontade ética de transformar, ou não sabemos o que será de nós. O sentido da vida está na consciência e na vontade de realizarmos, de agirmos, mesmo em condições adversas, pois o que significaria somente constatarmos que as condições são difíceis e dizermos: então façamos o de sempre. Acreditemos na capacidade transformadora dos sujeitos, especialmente na aliança coletiva que caracteriza a prática social dos educadores. Não há questões absolutas nesse contexto, mas sim uma análise da realidade, sempre orientada pelo sentido histórico dos fenômenos (RAMOS, 2007, p.28-29). Esperamos que esse trabalho estimule e contribua para a implementação de políticas de integração do ensino profissionalizante com o ensino médio no IF Sudeste MG – campus Juiz de Fora e outras instituições pelo Brasil. 102 CONSIDERAÇÕES FINAIS Essa investigação atendeu ao objetivo de conhecer o processo de implementação da educação profissional técnica de nível médio integrada ao ensino médio no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, a partir das percepções dos gestores responsáveis pelo processo de implementação dos cursos integrados, tendo como base as concepções e princípios da integralidade contidos no Documento-Base do Ministério da Educação/Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (BRASIL, 2007). Diante do estudo exposto, percebe-se que a oferta de educação profissional técnica integrada ao ensino médio no IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora, ocorreu de forma a atender mais as questões legais, limitando-se à construção das grades curriculares, carga horária e a adequação do exame de seleção à nova realidade, ficando o plano doutrinário representado apenas pela proposta elaborada pela instituição, documento que os gestores e professores tiveram pouco acesso. No cotidiano da escola, as ações implementadas não foram capazes de elaborar um curso único e integrado, não superando a dualidade entre o ensino médio e o ensino técnico profissional. Numa análise mais ampla das razões que dificultaram a concretização do ensino médio integrado, destacam-se as questões inerentes ao projeto político-pedagógico, à organização curricular, ao distanciamento das concepções e princípios da integração por parte dos gestores, a falta de formação inicial e continuada do corpo docente. Constata-se que a ausência de um projeto político pedagógico na escola dificultou e dificulta a implementação da proposta do ensino médio integrado. Percebe-se que a ausência de uma proposta coletiva tem levado o professor atuar individualmente com relação, por exemplo, à seleção dos conteúdos e às estratégias de ensino-aprendizagem. A construção de uma proposta coletiva, participativa e democrática poderia unificar a comunidade escolar e expressar os objetivos e normas da instituição, evitando assim a participação individual do professor, segundo sua cultura, entendimento e motivação. Uma proposta coerente e democrática deve caminhar para a construção de projeto político pedagógico integrado. Verifica-se que no processo da organização curricular, a preocupação maior foi atender as disciplinas da base comum com as disciplinas especificas de cada curso isoladamente, tendo como preocupação maior a carga horária e não os requisitos da integração. O que se percebe é que a dicotomia permanece: as disciplinas técnicas são trabalhadas sob a orientação da pedagogia de competências, do saber fazer, focando o 103 mercado de trabalho e as disciplinas propedêuticas orientadas para o vestibular. A organização dos currículos dos cursos se assemelha à praticada na época da Lei no. 5.692/71. Observa-se também, que a organização curricular dos cursos analisados se limitou à simples justaposição de um número elevado de disciplinas, o que acarretou a insatisfação tanto dos professores como dos alunos, não havendo tempos e espaços para as atividades culturais e esportivas. Acredita-se que a construção do projeto político-pedagógico e a organização curricular dos cursos integrados devam ser elaboradas, discutidas e reformuladas pela escola, de forma conjunta, à luz dos princípios e fundamentos da integração, considerando nesse processo o entendimento de ser o trabalho um princípio educativo, eixo central e norteador dessa modalidade de educação profissional. Outro aspecto importante que podemos destacar que limita a pretendida integração do ensino médio concentra-se na formação dos docentes. Percebe-se algumas resistências por parte de alguns gestores e professores com relação implementação do ensino médio integrado, que na maioria das vezes se deve a falta de capacitação de conhecimentos mínimos necessários para fazer avançar no dia a dia da escola a proposta aprovada. Constatase que os professores não foram preparados para a modalidade de ensino médio integrado, o que prejudica a sua atuação e os mantém isolados e não participativos da nova proposta. A instituição deveria criar oficinas específicas na preparação dos docentes na busca dos conhecimentos mínimos necessários para estas novas concepções e a realização de seminários para reavaliar todo o processo de implementação dos cursos integrados. O que se viu na prática com a aprovação do ensino médio integrado no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, foi os professores como meros executores das normas aprovadas sem a preocupação de capacitá-los. A adesão dos professores e gestores é fundamental para o êxito da proposta da integração e deve ser uma busca constante dentro da instituição. Os resultados detectaram uma quantidade exagerada de disciplinas da base comum e especifica nos cursos estudados, o que leva uma carga horária acima da proposta inicial dos gestores, o que acarretando uma reclamação generalizada por parte dos docentes e discentes. A junção dos cursos do ensino médio e ensino técnico incharam a grade e não propiciam tempo livre, fora da sala de aula, para os estudantes que reclamam da falta de tempo para parte cultural e esportiva. Percebe-se que em todo processo de implementação do ensino profissional integrado ao ensino médio, a proposta dos gestores não considerou a participação dos alunos e seus familiares, ficando limitadas ao âmbito institucional. Acreditamos que o envolvimento 104 dos alunos e familiares, no processo de implementação dessa modalidade formativa oferecida pela escola, expande e consolida o processo educacional em questão. Observou-se também que com à transformação do CTU/UFJF em IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, acarretou varias mudanças no cotidiano da escola, como estabelecimento de uma reitoria administrativa independente com sede em Juiz de Fora autônoma. A Instituição passou a ofertar além do ensino médio integrado, cursos de terceiro grau na área de tecnologia, o que levou uma demanda na contratação de novos professores e técnicos administrativos. Os novos professores concursados não conhecem a proposta de ensino médio integrado o que dificulta a participação desse professores e a efetivação da proposta da integração. Torna-se urgente uma ação política especifica, por parte da instituição no intuito de apropriar por parte dos professores novatos os princípios e fundamentos da proposta em questão. Constata-se que a aprovação do ensino médio integrado no IF sudeste MG – Campus Juiz de Fora, resgatou o objetivo histórico da instituição que há cinqüenta e três anos trabalha com ensino profissionalizante articulado com o ensino médio. Os cursos técnicos contam com boa infraestrutura de laboratórios, salas de aulas, biblioteca e restaurante para os alunos, o que deveria refletir positivamente na prática pedagógica. A falta da interdisciplinaridade dos conteúdos, projetos coletivos das disciplinas e uma metodologia comum, prejudicam a integração na prática. Tornam-se necessários encontros dos professores para discutirem e organizarem suas ações, comprometidas com a proposta norteadora da integração. Outro aspecto importante detectado pela pesquisa é como os alunos dos cursos integrados se distinguem dos outros alunos dos cursos subsequente ou ensino médio regular. Observa-se uma autoestima positiva que os diferenciam dos outros alunos, dando a entender que o curso integrado possibilita uma escolha mais qualificada e contribui para que a esses alunos tenham acesso ao trabalho e/ou a continuidade dos estudos. Este aspecto abre novas possibilidades de investigação na área da educação profissional integrada ao ensino médio. Outra área que merece investigação no interior do IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora seria um estudo comparativo dos alunos egressos dos cursos integrados e dos cursos subsequentes na perspectiva de obtenção de dados que ajudem a analisar a repercussão da implantação da nova estrutura a partir de 2008. Esses resultados devem ser discutidos com todas as instituições que praticam o ensino médio integrado no Brasil. Identificou-se pela fala de alguns gestores e negados por outros que a aprovação da oferta integrada visava também a atender os interesses orçamentários da instituição, pois os 105 alunos do curso médio não eram contabilizados para efeitos de recursos e a aprovação resultaria na transformação do ensino médio em cursos técnicos o que iria gerar uma dotação orçamentária maior. Constatou-se, através do processo de triangulação de fontes dos dados coletados, que o processo da integração também tinha uma conotação de busca de novos recursos, pois o projeto que apoiava a forma de oferta integrada, Programa Brasil Profissionalizante, determinava uma assistência financeira para a construção de laboratórios, aquisição de acervo bibliográfico, material de consumo e formação de docentes, gestores e pessoal técnico-administrativos. Concluindo este trabalho, temos um diagnóstico do processo de implementação do ensino médio integrado no IF Sudeste MG – Campus de Juiz de Fora, diante dos relatos dos gestores da pesquisa. O aspecto mais relevante que leve o aprimoramento da oferta de educação profissional técnica integrado ao ensino médio concentra-se na formação do docente. Verificou-se que a falha principal da oferta do EMI é propor mudanças sem a preocupação em capacitar aos que estão no chão da escola, os professores e os técnicos administrativos. Acreditamos que a resistência ao novo, requer uma mudança de paradigma, de idéias, de teorias e práticas, que torna um processo demorado e complexo. Não basta apenas a vontade política, é necessário criar as condições materiais e principalmente as condições humanas para a consolidação dessa proposta. Torna-se urgente a retomada da implementação do ensino médio integrado no IF Sudeste MG – Campus Juiz de Fora, com a revisão dos planos dos cursos integrados e uma avaliação permanente das práticas pedagógicas dos docente, para que a proposta não fique apenas na intenção e que se torne num processo de avanço na construção de uma educação profissional criativa e emancipatoria. 106 REFERÊNCIAS ALVES-MAZZOTTI, A. J; GEWANDSZNAJDER, F. Método nas ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2. ed. São Paulo, Pioneira, 1999. AMARAL, Cláudia Tavares do; OLIVEIRA, Maria Auxiliadora Monteiro. 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Disponível em: http://unesdoc.unesco.org/images/0018/001864/186402por.pdf 110 APÊNDICE A ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA ENTREVISTADOS: GESTORES DOS CURSOS INTEGRADOS 1] Na sua avaliação qual é a contribuição da implementação dos cursos profissionalizantes de ensino médio integrado no IF/Sudeste MG – Campus Juiz de Fora para os alunos? 2] O que você entende de educação profissional e qual a sua principal finalidade? (Qual a sua concepção de EMI? e em sua opinião um curso integrado é preciso ser interdisciplinar?) 3] Quais os documentos legais sobre o ensino médio integrado você conhece? Esses princípios estão sendo adotados pela Instituição? (se necessário lê as Concepções e os Princípios do MEC/SETEC - 2007). 4] O que falta no IFET para que estes princípios sejam adotados nos projetos pedagógicos dos cursos? 5] A educação profissional está mais voltada para os conhecimentos técnicos ou propedêuticos (ciências humanas)? Há uma integração entre os dois que se manifeste no currículo? De que maneira foi pensada a integração das disciplinas do curso? 6] Baseado na sua experiência na instituição quais os fatores que facilitam a integração entre a formação geral e a formação profissional? Comente sobre eles. 111 7] Na sua avaliação quais são os tipos de dificuldades encontradas para essa integração? Exemplifique sua resposta. 8] Em sua opinião qual foi o motivo da implantação da modalidade de EMI no campus JF? 9] Você gostaria de acrescentar mas algum comentário sobre EMI?