Texto da Coleção CIEE
FORMAÇÃO DE ESPECIALISTAS
PARA O MERCADO GLOBALIZADO
Luiz Gonzaga Bertelli
Antes de abordarmos o tema propriamente dito desta exposição, gostaríamos de
situar as atividades desenvolvidas pelo Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE), uma
instituição não governamental e sem fins lucrativos criada em 1964 por um grupo de
empresários e de professores e que, ao longo destes 34 anos de existência, conseguiu
promover uma interface entre o sistema de ensino e o parque produtivo nacional. Durante o
decorrer da nossa atuação, conseguimos promover a colocação de 1,9 milhão de estagiários
por todos os rincões do nosso território de dimensões verdadeiramente continentais. Em
termos do volume de recursos envolvidos, isso equivale ao pagamento de bolsas de estudo
no valor R$ 150 milhões por ano. Por esta razão, o Presidente do Conselho do CIEE,
Professor Antônio Jacinto Caleiro Palma, ao dirigir-se em encontro da outorga do Prêmio
Professor Emérito de 97 (láurea concedida pelo CIEE com o apoio do jornal O Estado de
São Paulo) à Presidente do Conselho do Programa Comunidade Solidária e Primeira Dama
da Nação, Profa. Dra. Ruth Cardoso, fez questão de assegurar que o CIEE é hoje uma das
maiores ONGs (organizações não-governamentais) do país. Atualmente, nossa atuação
estende-se ao longo de 22 estados, nos quais estamos representados por 130 unidades
operacionais dispersas por mais de uma centena dos mais importantes centros urbanos do
país.
Contudo, por atuarmos no segmento da integração dos estudantes ao
mercado de trabalho, temos a obrigação de nos mantermos sensíveis e atualizados, não
apenas no que se refere ao ensino ofertado aos jovens do país, como também às demandas
do setor produtivo, sobretudo na época atual marcada inexorável e indelevelmente pela
globalização da economia. E é sobre esta era da globalização que gostaríamos de nos deter
para elaborar uma análise de seus componentes estruturais, objetivando poder visualizar os
panoramas prováveis e esperados até mesmo no curtíssimo prazo, já que podemos
vislumbrar, hoje, os primeiros albores do século XXI.
O primeiro aspecto a ser considerado numa análise rigorosa a respeito desta
questão refere-se à fluidez e à mobilidade dos ativos financeiros mundiais. Assim, a ordem
mundial vigente na atualidade mostra com insofismável clareza que a tônica do capitalismo
é a realização de lucros atraentes e vantajosos onde isso seja possível ou factível. São bem
conhecidos os mecanismos que apontam para a transferência de capitais de mercados
menos rentáveis para os mais lucrativos. Indubitavelmente, por força da enorme velocidade
na transmissão de dados e de voz, quando, por exemplo, o comportamento da Bolsa de
Valores de um determinado país asiático é insatisfatório para os investidores, os sistemas
on line são acionados para que haja transferência de vultosas cifras financeiras para as
Bolsas que operam no bloco ocidental. De igual maneira, o mercado comprador
internacional volta-se sistematicamente a se abastecer de bens, produtos e serviços oriundos
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de empresas que, independentemente de suas localizações geográficas, apresentem as
melhores e mais atraentes condições de qualidade, prazos e preços. Dentro deste panorama,
está claro que para vencer no acirrado mercado globalizado, torna-se imperativo que as
empresas que atuem nos setores primário, secundário ou terciário da Economia
desencadeiem esquemas táticos e logísticos voltados à otimização de seus sistemas
gerenciais, produtivos e comerciais. Acrescente-se a tais contingências, o fato de as regras
do livre mercado promoverem a internação de bens e de produtos produzidos no exterior,
motivada sobretudo pela crescente tendência de queda nas barreiras e nos constrangimentos
alfandegários ou aduaneiros. Mas, longe desta característica ser necessariamente perversa
ou indesejável, ela acaba, na verdade, por emular o desenvolvimento industrial autóctone
das nações importadoras, que naturalmente se vêem na contingência de também praticar
medidas destinadas a oferecer aos consumidores internos produtos de qualidade, a preços
evidentemente competitivos com os similares importados.
E isto nos remete ao segundo aspecto da questão referente à intricada matriz
que compõe um dos mais complexos paradigmas da era da globalização. Referimo-nos
aqui à questão envolvendo ciência, técnica e tecnologia. Sobretudo pelo fato de a
tecnologia constituir-se hoje no mais sensível e significativo fator de produção. Antes,
porém, de discorrermos a respeito da ciência, técnica ou tecnologia e seus impactos sobre a
globalização, é de bom alvitre esclarecermos que estes vocábulos admitem variadas
conceituações, segundo consideremos diferentes autores. Por esta razão, passaremos a
considerá-los de acordo com a tendência predominante manifestada pela grande maioria
dos membros da comunidade científica brasileira.
Ao nos referirmos à ciência, estaremos tomando-a num sentido amplo como
um conhecimento ou um saber que se adquire pela leitura e meditação, Em sentido restrito,
contudo, ela pode ser entendida como um conjunto organizado de conhecimentos relativos
a um determinado objeto, especialmente os obtidos mediante a observação e a
experimentação.
Com respeito á técnica, é oportuno salientarmos que, sempre que aqui
referida, ela será entendida como um conjunto de conhecimentos desenvolvidos com a
finalidade de equacionar soluções para problemas da ação, ou seja, naquilo que comumente
podemos associar ao "saber fazer" . A tecnologia, por seu turno, será denotada como a
técnica acrescida dos componentes que lhes foram incorporados pelo saber científico.
Saber este propugnado, em primeira instância, pelo sábio italiano Galileu Galilei (15641642), que instituiu no Ocidente o método empírico ou experimental. Seu trabalho foi
posteriormente consolidado pelo notável cientista britânico Isaac Newton (1643-1727),
sobretudo através da edição da sua obra "Princípios Matemáticos de Filosofia Natural",
surgida em 1687.
Desta forma, perfilhando a postura defendida pelo Prof. Dr. Décio Leal de
Zgottis, falecido precocemente há 2 ou 3 anos e que, além de Diretor da nossa respeitável e
secular Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, foi também Ministro de Estado da
Ciência e da Tecnologia na administração Sarney, podemos dizer que a tecnologia é um
"saber fazer" com conhecimento científico (Marques, 1992: 14).
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Estabelecidas estas premissas básicas para a conceituação da ciência, da
técnica e da tecnologia, podemos assegurar que elas constituem a base do sistema da C&T
(Ciência e Tecnologia) que sustenta, hoje, no Brasil e no mundo, a base da economia e dos
sistemas de produção. Desta forma, não causará a menor estranheza nossa assertiva de que
os maiores dividendos produtivos e mercadológicos incidirão sobre as potências que, não
por acaso, se desenvolveram aportando o chamado capital de risco tecnológico. Aliás, esta
modalidade de investimento é o que marca as atividades em C&T, cuja principal
característica não se pauta, necessariamente, pelo retorno imediato do capital financeiro
investido. É preciso entendermos, definitivamente, que o retorno das inversões tanto em
C&T (Ciência e Tecnologia) como em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento) se dão, via de
regra, em prazos longos e com aplicações práticas não necessariamente imediatas. Neste
particular, somos obrigados a comentar, ainda que en passant que, mesmo a despeito de os
EUA e o Japão serem países capitalistas hegemônicos e com suas posições mundiais
consolidadas, ambos continuam a investir fortemente em C&T. E isto é de uma verdade
cristalina se considerarmos que os últimos levantamentos de que dispomos, referentes ao
ano de 1996, dão conta de que, naquele ano, o investimento global dos EUA, em C&T, foi
de US$ 178 bilhões (2,5% do PIB) e o do Japão de US$ 87 bilhões (2,3% do PIB). E notese que, já naquele período, as duas nações ocupavam posição de absoluto destaque no
ranking dos ofertantes de bens de elevado conteúdo tecnológico ao mercado então
globalizado.
Acresecente-se, ainda, que provas incontestes disso foram, dentre outras,
demonstradas, sobejamente, através dos investimentos norte-americanos praticados nas
áreas dos raios laser e das pílulas anticoncepcionais. No caso dos raios laser (sigla inglesa
de light amplification by stimulated emission of radiation), o desenvolvimento se deu ao
fim da década de 50 para aplicação efetiva 10 anos depois, quando astronautas dos EUA
instalaram o primeiro espelho refletor na superfície lunar, acontecimento que propiciou o
estabelecimento da exata distância da Terra – Lua. E tal acontecimento não beneficiou
única e tão somente a ciência. O conhecimento rigoroso desta distância permitiu aos
cientistas estabelecer o chamado Tempo das Efémerides que, dentre outras aplicações,
possibilita a aferição exata dos equipamentos de precisão cronológica empregados no
estabelecimento de normas internacionais para as áreas de normalização e metrologia. Já
com respeito à pílula anticoncepcional, é importante salientar que ela foi desenvolvida
pelos anos 20 ou 30 para só apresentar utilização em larga escala depois dos anos 50.
Mesmo o caso da Internet apresenta similitude com os exemplos mencionados, pois
começou nos Estados Unidos da América como um projeto militar (ao final dos anos 60),
estendeu-se para o meio acadêmico (segunda metade dos anos 80) e seu uso comercial e
individual pleno só veio a ocorrer por volta de 1994. E ninguém pode negar que sua
disseminação se processa de maneira fantástica no mundo todo. Para isto, basta lembrar
que, só no Brasil, contamos neste final de 1998 com nada menos que 3,4 milhões de
assinantes conectados a esta rede internacional de computadores. Em termos planetários,
dezenas de milhões de usuários utilizam-se da www (sigla inglesa da palavra world wide
web, que significa "teia mundial"), também denominada simplesmente de web, para enviar
e receber imagens, sons, arquivos de trabalho ou apenas como simples atividade de lazer e
de entretenimento. Aliás, uma das páginas mais visitadas do www é a conhecida como
servidor http (do inglês hyper text transport protocol) e que podem ser lidas através dos
programas browser (folheadores de páginas).
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Estes exemplos aleatórios foram mencionados apenas para demonstrar que o
desenvolvimento tecnológico representa a aquisição de um conhecimento que permanece
como que um verdadeiro estoque ou patrimônio de saber à disposição de uma dada
sociedade, que o empregará de forma mediata ou imediata, conforme as demandas sociais
assim o requeiram ou dele necessitem. De forma geral, este conhecimento é produzido no
seio das universidades que, pela existência e pela presença de massa crítica, representa o
locus privilegiado para a realização da chamada pesquisa básica à qual muitos autores
também denominam de pesquisa pura. Isto não impede, contudo, que empresas privadas
também produzam conhecimento. Mas, de maneira geral elas atuam em outros segmentos,
como desenvolvimento, inovação e aperfeiçoamentos tecnológicos. Vale ressalvar que,
como centros de excelência, onde atuam como verdadeiras maternidades ou incubadoras de
idéias e experimentos, as universidades detêm o mais forte elo da cadeia tecnológica que é
o sistema educacional.
Naturalmente, por ser um bem que se aprende fazendo e não uma mercadoria
que se possa comprar ou vender, defendemos a idéia de que o fortalecimento do sistema de
ensino, em todos os níveis, é condição sine qua non para que possamos pensar num
desenvolvimento autosustentado e que garanta ao Brasil condições para apresentar produtos
atraentes e de qualidade ante o disputado, competitivo e exigente mercado internacional. E
é este mesmo mercado internacional que rapidamente também se globaliza e se pauta por
ofertar bens e serviços cada vez com maior nível de sofisticação tecnológica.
Não nos esqueçamos que, no seu dia-a-dia, o homem conta com os mais
diversificados aparelhos e equipamentos, que o colocam num mundo inusitado e, muitas
vezes, insondável são os relógios a quartzo, calculadoras acionadas a energia solar e
sistemas de vídeo e de som totalmente manipuláveis mediante o uso de controladores
remotos. Mas é, também, o caso dos televisores que cabem na palma da mão e das
máquinas programáveis de lavar, secar ou cozinhar, só para citar alguns poucos exemplos
de bens de uso doméstico cotidiano. Nos escritórios, temos as copiadoras, scanners,
sistemas de telefonia, microcomputadores, laptops, notebooks e palmtops, dentre outros
inúmeros bens. Não podemos deixar de insistir no aspecto referente ao uso crescente da
Internet, responsável pela incorporação e pela consagração de termos que lhe são próprios e
para os quais temos até correspondentes em língua portuguesa, embora não os usemos.
Assim, expressões como deletar, navegar, salvar ou ainda links (ligações, em inglês) ou site
(lugar, também em língua inglesa) incorporaram-se ao jargão que permeia toda a nossa
comunicação, numa demonstração inequívoca de que a globalização já é um fenômeno
palpável e presente em todas as esferas do nosso tecido social. Aliás, no último dia 10 de
setembro deste corrente ano de 1998, a Academia Brasileira de Letras (a ABL, presidida
por um dos mais antigos, assíduos e constantes colaboradores do CIEE, o Prof. Arnaldo
Niskier) lançou a mais recente edição do seu "Vocabulário Ortográfico da Língua
Portuguesa", monumental obra que conta com 6.000 novas palavras, muitas das quais
introduzidas no nosso linguajar pelos novos hábitos ensejados pelo crescente uso da
informática.
Acresça-se a este infindável menu de opções, representados pelos inúmeros
exemplos citados à guisa de esclarecimento, a existência de redes noticiosas facilmente
acessáveis mediante o uso de sistemas televisivos por assinatura, como a CNN, a NBC e
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MTV, dentre outras, que permitem uma integração mundial via TV ou rádio. Muitas delas,
operando no sistema on-line, permitem que vejamos no exato momento de suas ocorrências
acontecimentos como os recentes bombardeios norte-americanos desfechados sobre o
Sudão e o Afeganistão, ou ainda (e ao vivo, pasmem!) o ataque dos Aliados sobre o Iraque,
na Guerra do Golfo (1991), quando sofisticados caças idealizados, projetados e construídos
pelos norte-americanos localizavam seus alvos mesmo na escuridão da noite, de vez que
empregavam sistema de detecção por sensores infravermelho, que se orientam unicamente
pela existência de fontes de calor, por menor que sejam elas.
Aliás, para aferir a velocidade de inserção do próprio Brasil no mercado
globalizado, basta lembrar que, no início desta atual década de 90, não havia sequer uma
empresa brasileira, dentre as filiadas à FIESP/CIESP, com a certificação ISSO 9000/9001 e
9002. Hoje, já passa de dois milhares o número de empresas nacionais que ostentam o
certificado internacional de qualidade, conferindo-lhes o aval para exportarem produtos
compatíveis com os parâmetros requeridos pelo mercado internacional.
Nesta altura, há de se registrar, contudo, a existência de dois pontos que
constituem o verdadeiro talão de Aquiles do processo de globalização da economia. São
eles, de um lado, o desemprego estrutural, decorrente do enxugamento dos recursos
humanos motivado pelo corte dos custos operacionais com o propósito de os empresários
manterem suas taxas de lucro, a despeito da oferta de produtos de menor preço e de maior
qualidade neste mesmo mercado globalizado. De outro, a imperiosa e premente
necessidade de melhoria nos sistemas de ensino (como já dissemos em todos os níveis, mas
com ênfase ao do terceiro grau), o que, sem dúvida, constitui a verdadeira pedra de toque
do crescimento econômico e do desenvolvimento social do nosso País. Afinal, o que
precisamos entender de forma definitiva é que, se não houver a compreensão de que sem
um bom e adequado gerenciamento do sistema da C&T nacional, todos nós estaremos
condenados a ser, no século XXI, um país do século XIX. Em outras palavras, uma nação
atrasada e, por isto mesmo, inapta a competir com igualdade de condições na era da
globalização. Já existe uma consciência nova que vem se traduzindo em tentativas e
iniciativas de colimar os objetivos entre o governo, as universidades e os centros de
pesquisa e o setor privado. Tanto as universidades têm procurado se abrir mais, através de
escritórios de transferência de tecnologia, ou de iniciativas como é, por exemplo, o Instituto
Uniemp-Universidade Empresa ou a Rede de Tecnologia no Rio de Janeiro, como a própria
Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), que tem tentado
caminhar no sentido de apoiar a empresa de base tecnológica. Existem, portanto, tentativas
de diversas origens, todas elas em nosso entender na direção correta. Mas falta ainda uma
política governamental de maior envergadura capaz de dar consistência e continuidade a
esta parceria entre o setor privado, as universidades e os centros de pesquisa. A bem da
verdade, não poderíamos deixar de citar a existência de contra-exemplos, dos quis talvez o
mais glamouroso seja o da Embraer. De fato, a Embraer foi privatizada, mas passou para o
controle de grupos nacionais e conseguiu uma solução de profissionalização de alta
qualidade da gestão da empresa, o que lhe permitiu continuar gerando novos produtos.
Uma empresa aeronáutica, se não continuar gerando novos produtos a cada três ou quatro
anos, falece. Isso demonstra que a Embraer conseguiu superar as dificuldades de inserção
no mercado mundial, realizando o desenvolvimento de novos e atraentes produtos. A
escolha do exemplo da Embraer não se deu por mero acaso. Ele foi trazido à baila
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exatamente para demonstrar que o setor produtivo nacional pode e deve se aproveitar do
transbordamento da overdose de conhecimento que migra da universidade para o setor
produtivo, num processo que os norte-americanos batizaram com o sugestivo nome de spinoff. Esta expressão não encontra um correspondente adequado em língua portuguesa, mas
poderia ser entendido como "crescimento para fora" ou "germinação de idéias que migram
das universidades, ou centros de pesquisa, para o setor produtivo". De fato, a Embraer está
localizada no município paulista de São José dos Campos, em área contígua ao ITA-CTA
(Instituto Técnico da Aeronáutica – Centro Técnico Aeroespacial, do Ministério da
Aeronáutica), importante instituição do ensino de engenharia do País, de onde é oriunda a
maioria de seu quadro funcional. Acrescente-se a isto, a existência no mesmo Município de
São José dos Campos do INPE (Instituto de Pesquisas Espaciais, vinculado ao CNPq),
também responsável pela formação dos quadros existentes nas dezenas de empresas
privadas de pequeno e médio portes, que atuam nas área de equipamentos para
meteorologia, sensoreamento remoto e componentes eletrônicos. É, da mesma forma, o
caso da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), na qual inúmeros professores
atuando como empreendedores, transferiram o conhecimento de suas pesquisas acadêmicas
para o setor produtivo, de forma a transformar o Município paulista de São Carlos num
verdadeiro pólo tecnológico de empresas que atuam, hoje, com pleno êxito comercial, nos
segmentos da mecânica-fina, óptica e novos materiais, dentre outros bens industriais de
elevado custo agregado.
Aliás, talvez o exemplo mais pujante seja o representado pelas atuais
reformas em andamento na Escola Politécnica da USP, que contemplam a implementação,
já para o próximo ano de 1999, de reestruturações visando a formação de engenheiros com
sólida base científica e conceitual. Mas, ao mesmo tempo, como um profissional
generalista e, por isto, capaz de adaptar-se a cada nova situação com a rapidez que os
tempos modernos exigem. As reformas em curso são decorrentes de um processo iniciado
em 1990, quando professores daquela respeitada instituição de ensino de engenharia
visitaram as 53 melhores escolas de engenharia do mundo, dispersas por países como a
Suíça, França, Alemanha, Canadá e Estados Unidos da América. Selecionamos o exemplo
da Poli pelo fato dela, no Estado de São Paulo, ser uma das favoritas dentre os
vestibulandos. E, tanto isto é verdade que, no último exame realizado pela Fundação para o
Vestibular (Fuvest), a concorrência foi de 42 candidatos por vaga. Vale ressalvar que o
aspecto dos estágios foi bastante valorizado na reforma, como demonstra a recente criação
da Coordenação de Estágios Supervisionados, que vai alocar estágios para os alunos e
tentar colocar o estudante nas empresas. O sentido da realização dos estágios é o da
elevação das condições de empregabilidade e de preparo para que o engenheiro recémformado possa assumir com experiência previamente desenvolvida o seu primeiro emprego.
Neste sentido, e em recentes declarações, o Vice-Diretor da Escola Politécnica, Prof. Dr.
Vahan Agopyan, assegurou que " o estágio é uma tarefa que possibilita absorver as
experiências que a indústria possui e levá-las para dentro da universidade ". Mas, as
referidas reformas não pararam por aí. Essa mesma Poli, que tantos profissionais de
Engenharia colocou nos mais importantes cargos privados e públicos do País (computandose dentre eles Prefeitos, Governadores e até mesmo Ministros de Estado) já deu início à
construção, prevista para estar concluída no decorrer do próximo ano de 1999, do seu
Centro de Vivência. Nele, em área construída de aproximadamente três mil metros
quadrados, estarão instaladas lojas e espaços destinados à disseminação da cultura e do
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lazer. Uma demonstração inequívoca de que seus atuais dirigentes estão preocupados, hoje,
em formar os profissionais do futuro. Afinal, não basta um espaço físico para apenas
transmitir conhecimentos formais. É preciso, como temos assinalado ultimamente no
CIEE, que os estudantes ampliem seus conhecimentos e as suas vivências interagindo,
ainda que informalmente, com outros públicos. E aos alunos, além das atividades em salas
de aulas, serão ofertadas oportunidades de intercâmbio com os demais agentes da
sociedade, representados pelos professores, funcionários e visitantes que também
freqüentarão o mesmo espaço, quer para usufruir da infra-estrutura comercial (lojas,
estabelecimentos comerciais de vendas de suprimentos, instituições bancárias, teatro etc...),
ou simplesmente para trocar experiências que, certamente, solidificarão as dimensões de
cidadania da sociedade como um todo.
Este elenco de exemplos e argumentações permite-nos assegurar que, sem
sombra de dúvida, o grande e único produto da era da globalização é a informação gerada e
decorrente das relações interpessoais, com ênfase ao processo de apropriação do
conhecimento gerado na relação "empresa-escola". Referimo-nos, obviamente, à sinergia
que se estabelece na migração do conhecimento gerado nos núcleos de excelência para o
setor produtivo e no seu feed-back para o meio acadêmico, que acaba incorporando em seu
patrimônio de conhecimentos as técnicas ou os procedimentos de superação dos entraves
eventualmente encontrados para a produção de u7Mecänica determinado bem, de forma a
adequá-lo mais corretamente às demandas de mercado. Isto se dá, em geral, mediante o
emprego de um expediente bastante disseminado no mundo e que é conhecido pela
expressão inglesa operacional research (que poderia ser traduzida para a língua portuguesa
como pesquisa operacional). Este conceito, aliás, foi definido pelo grande físico inglês
deste século John Desmond Bernal – diversas vezes finalista do processo de concessão do
Prêmio Novel, mas que morreu, contudo, sem havê-lo recebido -, que o conceituou como
"o emprego do método científico, especialmente o da medição, para chegar às decisões em
que deve se basear a ação da execução" (Bernal, 1969: 833). Assim, a pesquisa operacional
pode ser intendida como a tentativa de aplicação da metodologia das ciências exatas e
naturais ao aumento da eficiência produtiva. Surgida no decorrer da Segunda Grande
Guerra Mundial ela mostrou, por exemplo, que, com o auxílio da estatística e do cálculo de
probabilidade, era perfeitamente possível calcular a melhor forma de usar os aviões
bombardeiros ou, ainda, qual seria o melhor arranjo da bateria dos canhões antiaéreos para
enfrentar os ataques inimigos. É interessante observar que, já em 1942, sob a orientação de
Vannevar Bush – o conselheiro científico do governo dos EUA durante a II Guerra -, a
pesquisa operacional é incorporada à estratégia norte-americana. Sob a mesma inspiração,
o renomado físico norte-americano K. T. Compton inaugurou, em 1943, o chamado field
service (serviço de campo) como um dos mecanismos do OSDR (Office of Scientific
Research and Development). De início, o serviço de campo representava um método de
interação entre o front e a vanguarda tecnocientífica. Quando, por exemplo, uma nova
arma era idealizada, os técnicos e cientistas acompanhavam o seu emprego nos campos de
batalha. A seguir, voltavam aos laboratórios e às fábricas, relatavam seus defeitos e
qualidades para que seus pares pudessem pensar nos melhoramentos possíveis. Por fim,
para encerrar o ciclo, o equipamento retornava ao front para o aprimoramento do invento, já
em sua versão melhorada. Pelas razões citadas, ao término da guerra, o status da C&T
perante a sociedade ascendeu exponencialmente, não só em função do aprimoramento das
armas e do desenvolvimento do radar e da penicilina, dentre inúmeros outros, como
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também pela eficiência das formas de atuação, que foram então levadas ao
desenvolvimento de outros bens de consumo voltados ao bem-estar da própria sociedade
civil.
Sentimo-nos compelidos a fazer esta breve digressão de natureza histórica
para mostrar as vantagens da mobilidade do conhecimento, que ora flui dos centros de
excelência para os setores produtivos e em outros momentos migra do setor produtivo para
as universidades e para os centros de pesquisa, fazendo com que o principal beneficiário
desta troca de informações seja o usuário final dos bens, produtos ou serviços. E esta
verdadeira oxigenação no sangue tanto do gerador de conhecimento quanto do parque
produtivo se dá através do elemento que estabelece a ponte entre ambos: o estagiário. Mas
este é um assunto que exigirá uma reflexão mais aprofundada, razão pela qual em seguida
retornaremos a este mesmo assunto.
Falemos, agora, das principais peculiaridades do mercado de trabalho
globalizado.
Como já dissemos, um dos corolários da era da globalização é a queda ou até
mesmo o desaparecimento das barreiras comerciais, a exemplo do que já ocorre hoje, por
exemplo, com as nações integrantes da União Européia . É o fim do protecionismo, já que
o mercado comprador se suprirá dos bens, produtos ou serviços ofertados pelas empresas
que apresentarem condições mais vantajosas tanto em qualidade, como em preços e prazos.
E como não poderia ser diferente, esta dinâmica própria do mercado globalizado traz em
seu bojo enormes mudanças nas relações de trabalho e no plano funcional das carreiras.
Dentro deste panorama, é preciso atentarmos para o fato de que a
competição no mercado globalizado apresenta como requerimento básico a necessidade
premente de modernização e criatividade de todo o sistema produtivo local. Aliás, abordar
a modernização não é uma tarefa fácil. Até porque, num certo sentido, ela pode se
confundir com inovação, progresso e outros vocábulos afins. É uma questão secularmente
complexa, tanto que, há mais de quatro séculos, o ideólogo político e pensador italiano
Nicolau Maquiavel registrava na sua famosa e citadíssima obra ´O Príncipe´, a seguinte
assertiva: "não há nada mais difícil de manejar, mais perigoso de conduzir ou mais incerto
de suceder que levar adiante a introdução de uma ordem de coisas, pois a inovação tem por
seus inimigos todos os que se deram bem nas condições antigas, e por defensores frágeis
todos aqueles que talvez possam se dar bem nas novas".
Contudo, assim como fizemos com os termos ciência, técnica e tecnologia,
estabeleçamos um referencial teórico e adotemos uma conceituação que aqui será tomada
do eminente cientista político Norberto Bobbio, para quem a "modernização é um
fenômeno complexo, de amplo fôlego e multidimensional, que acontece em períodos de
tempo diferentes e em todos os setores do sistema social.(...)". Para que a compreensão
seja completa e exata, exige-se uma atenção constante às interações entre os vários setores
[diz, referindo-se à sociedade] e o uso de métodos múltiplos de abordagens
interdisciplinares. Os dois temas que emergem no estudo da modernização são: de um
lado, a tentativa do homem em controlar a natureza e sujeitá-la às suas necessidades, fica
configurada a possibilidade de a encararmos pelo vetor da técnica. Contudo, como a
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distância existente hoje entre a ciência e a técnica é tão pequena que há, até, a possibilidade
de as confundir, podemos ampliar a abrangência, defendendo a idéia de que o conceito de
modernização, tal como o adotamos preliminarmente, permite conduzi-lo tanto pelo lado da
técnica, quanto pelo da ciência. Por outro lado, e ainda como corolário do conceito
proposto por Bobbio, será lícito considerarmos que o esforço perene de ampliar o âmbito
das opções sociais e políticas para o maior número possível de pessoas, imbrica-se,
necessariamente, à atual necessidade de melhoria e expansão do sistema educacional.
Argumentos, aliás, fortalecidos pelo fato de tanto a educação ser de importância vital para
ciência, técnica e tecnologia, como, também, para o pleno exercício da cidadania. Esta
última encarada, sobretudo, através do aspecto referente ao fortalecimento dos sistemas de
ensino em todos os níveis.
Ressalte-se, neste particular, que quem complementa e atualiza de maneira
definitiva o complexo conceito da modernização é o abalizado Catedrático da Universidade
de Harvard, David S. Landes, que, em seu livro The Unbound Prometheus (Prometeu
desacorrentado), de tanto sucesso ao final da década de 60 e início da de 70, afiançou que
modernização "trata-se da combinação de mudanças – no modo de produção e de governo,
na ordem social e institucional, no corpo de conhecimentos e nas atitudes e valores – que
possibilita a uma sociedade manter-se no século XX, isto é, competir em termos de
igualdade na geração de riquezas materiais e culturais, preservar sua independência e
promover novas mudanças, adaptando-se a elas. A modernização abrange avanços como a
urbanização (concentração da população em cidades que servem como núcleos de produção
industrial, de administração e de atividades intelectual e artística); a redução acentuada das
taxas de mortalidade e natalidade em comparação com os níveis tradicionais (a chamada
transição demográfica); o estabelecimento de uma burocracia governamental eficaz e
bastante centralizada; a criação de um sistema educacional capaz de formar e socializar
crianças, levando-as a um nível compatível com suas aptidões e com os melhores
conhecimentos contemporâneos; e, é claro, a aquisição da capacidade e dos meios de
utilizar uma tecnologia atualizada. Todos esses elementos são interdependentes, (...), mas
cada um deles tem certo grau de autonomia, sendo perfeitamente possível progredir em
algumas áreas enquanto se fica por trás em outras – como testemunham algumas chamadas
"nações emergentes", ou "em desenvolvimento", de hoje. O único ingrediente da
modernização que é absolutamente indispensável é a maturidade tecnológica, com a
industrialização que a acompanha; caso contrário, o que se tem são os adornos sem a
substância, a aparência sem a realidade" (1994: 11-2). A leitura acurada do texto dispensa
maiores considerações, exatamente por mostrar de forma explícita que o renomado autor
faz alusão direta ao que modernamente qualificamos como imperiosa necessidade de
inserção do nosso universo sociocultural à era do conhecimento.
E esta é a tese nuclear da atuação do CIEE, pois, entendemos que o
paradigma do próximo milênio encontra-se fortemente calcado na chamada sociedade do
conhecimento. Conhecimento este que, como já dissemos, é o que alavancará a inserção
privilegiada, ou não, dos países na era da globalização. E para que isto ocorra com
plenitude no Brasil, é necessário o fortalecimento da base educacional até para que os
indivíduos se tornem operacionais e sejam minimizados, a um limite tendendo a zero, os
impactos do chamado desemprego estrutural. É oportuno esclarecer que, embora o
conceito de desemprego estrutural figure na atualidade como um dos paradoxos do sistema
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de globalização, tal expressão foi empregada pela primeira vez pelo economista britânico
John Maynard Keynes, quando num ensaio (de título The General Theory of Employment,
Interest and Money),publicado em 1930, ele vaticinava que a ”nossa descoberta de meios
para economizar trabalho progride mais rápido do que a nossa capacidade de encontrar
novos empregos para a mão- de- obra” (Araújo, 1998:70). Aliás, já se tratava da incrível
antevisão dos impactos que seriam provocados pela escalada da tecnologia, tanto que, no
mesmo documento, Keynes assim de manifestou: "estamos acometidos de uma nova
doença da qual alguns leitores talvez ainda não tenham ouvido falar, mas sobre a qual
ouvirão falar muito nos próximos anos – o ´desemprego tecnológico"´(Rifkin, 1995: 25).
Embora muito tenha sido feito no Brasil em prol da Educação, a realidade
atual mostra pontos de extrema precariedade e fragilidade. O próprio poder público federal
reconhece que dois terços da população economicamente ativa não possui o primeiro grau
completo, o que equivale, nos dias de hoje, a um contingente de quase 50 milhões de
trabalhadores. O que fazer, então, para qualificar tal força de trabalho? Ademais, como
combater com eficiência e determinação o analfabetismo que beira hoje a faixa dos 15%
(note-se que isto sem contar com o analfabetismo funcional, representado pelas pessoas que
não conseguem compreender textos da vida cotidiana ou resolver questões da aritmética
elementar, também situado no patamar de 15%, o que gera um analfabetismo global e
efetivo de nada menos de 30% da população brasileira após os 7 anos de idade), quando,
por exemplo, no Paraguai ele é de 8%, na Argentina 4%, no Chile 3% e no Uruguai de
apenas 2,8%? Em nossa atuação no CIEE temos defendido a tese de combater esta
verdadeira nódoa nos indicadores sociais do País, mobilizando as mais variadas instituições
brasileiras – como associações de classe, centros de filantropia, clubes desportivos, igrejas
e templos, as Forças Armadas etc... – como centros irradiadores da educação fundamental.
Temos ido além e defendido a implementação de escolas sem luxo ou ostentação, estejam
elas instaladas em barracas, galpões ou simplesmente à sombra de árvores.
Aliás, a respeito do perfil ideal para o ensino de primeiro e de segundo
graus, quem sintetiza adequadamente as atuais necessidades é o economista Roberto
Macedo, docente da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, que
em sugestivo capítulo de livro, assim se manifesta: "Levando em conta as condições
econômicas, sociais e culturais do Brasil e supondo que cabe à escola dar ao aluno,
inclusive depois de formado, condições de ter acesso ao conhecimento, contribuindo para
sua evolução enquanto pessoa e para sua formação como cidadão atento e responsável e,
ainda, dar-lhes condições de enfrentar o mercado de trabalho, entendo que as escolas de
primeiro e segundo graus precisam cumprir, entre outras, as seguintes funções: - ensinar
com a preocupação centrada na funcionalidade do conhecimento, enfatizando a sua
utilidade – para que serve a álgebra? – e exercitando-a, como para entender o sistema de
compra e prestações e dos juros nele implícitos;...enfatizar o conhecimento da matemática
básica do primeiro e segundo graus e de sua utilização para diagnóstico por exemplo,
gráficos de controle de qualidade – e solução de problemas, destacando relações de causa e
efeito;...enfatizar, no ensino de português, a leitura, a compreensão e a
redação;...desenvolver também a habilidade de usar computadores, para tarefas simples
como processamento de textos..."(1997: 105-6).
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Já quanto ao ensino superior, entendemos que os currículos devem se
conformar e se amoldar às demandas do setor produtivo, que requer profissionais bem
preparados, versáteis, criativos e que, obviamente, se adeqüem aos cânones da economia
globalizada, onde o domínio da informática e a familiaridade com outros idiomas já
representam uma constante e um item de solicitação rotineira por parte das empresas
contratantes de mão-de-obra. Aliás, nada mais oportuno neste momento que nos
lembrarmos do que disse ao passado o grande matemático francês Henry Poincaré, de
expressiva produção científica na passagem do século XIX para o XX, para quem "na
ciência tudo é uma questão de sorte, mas ela terá maior probabilidade de ocorrer nas
pessoas bem preparadas".
Outra característica importante do mercado de trabalho na era da
globalização é a substituição gradual do paradigma fordista – baseado fundamentalmente
na economia de escala – pelo modelo econômico da acumulação flexível, no qual o
trabalho manual e intelectual repetitivo cedem espaço ao trabalho criativo e dinâmico capaz
de atender a rápida evolução do mercado internacional sempre ávido por novos bens,
produtos e serviços. Do setor da informática, podemos extrair um exemplo para corroborar
esta nossa assertiva: a obsolescência dos hardwares e dos softwares é tão grande que as
defasagens se dão, por vezes, em questão de poucos meses. Até poucos meses passados, os
Pentium I representavam o que havia de mais avançado em termos de processadores. Hoje,
porém, não é assim. Eles deram lugar aos modelos Pentium II, sobretudo na versão MMX
que, certamente, logo serão substituídos por outros. No segmento dos outros. No
segmento dos softwares, é bem conhecido o fato de que o Windows 95 já estar cedendo
espaço à versão Windows 98, recentemente entregue ao mercado mundial e, também,
brasileiro. Isto sem falar nos programas antivírus que, muitas vezes, apresentam versões
subsequentes no prazo de apenas algumas poucas semanas. O exemplo citado na área da
informática também não foi casual. Foi escolhido para permitir a identificação de um
ponto muito importante do paradigma do modelo econômico da acumulação flexível e que
se refere ao aspecto da educação para o trabalho. Por estar calcado na premissa de que no
seio das instituições de ensino, por mais privilegiadas que elas sejam, torna-se impossível a
simulação real das atividades e das realidades do parque produtivo. Desta forma, só através
da dinamização dos mecanismos reguladores da parceria empresa-escola é que será
possível a aplicação prática dos conhecimentos adquiridos, pelos estudantes, nos centros de
formação escolar.
Há, por fim, no que se refere ao item mercado de trabalho globalizado, um
aspecto de grande relevância e que diz respeito ao aumento da terceirização de serviços.
Trata-se de uma prática que tem se disseminado largamente nos últimos tempos e que
consiste em uma empresa concentrar seus esforços apenas na sua atividade-fim, liberando a
execução das atividades que lhes são acessórias a outras instituições de prestação de
serviços. Como exemplos, poderíamos citar desde casos simples e corriqueiros, como a
contratação de serviços de vigilância e de segurança, até modelos bastante complexos de
terceirização. É o caso, por exemplo de empresas de grande porte nos setores químico,
petroquímico, farmacêutico e de bebidas e alimentos, que hoje já deixam de investir em
ativos de utilidades (ar condicionado, produção de vapor, fluidos de refrigeração e
cogeração de energia), confiando-as a outras empresas com quem, muitas vezes,
estabelecem contratos em regime de risco. O objetivo, obviamente, é o de que as
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contratantes imobilizem capital única e tão somente nas atividades produtivas específicas
de sua área de atuação. Tal característica determina novos padrões de inter-relacionamento
funcional. Fazendo com que as profissões e as funções estejam imbricadas, fortemente,
através de um sistema que pode ser comparado ao princípio dos vasos comunicantes, tal
como enunciou séculos atrás o físico italiano Torriccelli.
Abordemos, agora, o que se relaciona às características do profissional apto
a atuar na era da globalização. De forma genérica, o que o mercado atual espera como
perfil profissional é o amplo domínio na sua área de especialização, aliado a um consistente
conhecimento da realidade que o cerca – não apenas em relação à área em que atua, mas
também da realidade social em que vive – e de uma visão de conjunto que lhe permita
adotar os procedimentos profissionais mais eficazes, nas horas em que lhe for necessário
tomar decisões.
Para que isto ocorra, entendemos que, pontualmente, devam ser
considerados os seguintes quesitos:
• Sólida formação acadêmica – neste particular, reiteramos a posição de que as
instituições de ensino superior ofertem currículos de bom nível técnico intrínseco aos
cursos ministrados, contemplando o ensino de matérias de conteúdo humanístico e o de
línguas, incluindo o da língua estrangeira, o estudante possa se expressar com clareza
no nosso idioma nacional;
• Experiência prática – como as empresas dispõem, cada vez menos, de tempo
e de recursos para o aprimoramento funcional dos ingressantes, torna-se vital a prática
do estágio, através do qual o estudante não só dinamiza o sistema de estudo formal
mediante a transferência para a escola dos problemas enfrentados no seu mundo de
trabalho, como também da colocação em prática do que lhe é ensinado na escola.
Assim, a par do enriquecimento do sistema de ensino, a salutar prática do estágio faz
com que, ao ingressar profissionalmente no sistema produtivo, o estudante seja detentor
de uma bagagem de conhecimentos que lhe permita a superação imediata dos
problemas profissionais que se lhe afigurarem no dia-a-dia;
• Domínio da informática e de outros idiomas – este aspecto já foi abordado
anteriormente, mas não seria demais insistir no ponto de que este importante quesito
deve ser rigorosamente observado, de vez que, no mercado globalizado, muitos dos
interlocutores comunicam-se empregando seus idiomas nacionais e que, cada dia mais,
cresce a troca de mensagens e de arquivos através dos sofisticados softwares, com
menus em inglês, usualmente empregados pelos equipamentos de telefonia e de
transmissão de dados;
• Conhecimento de outras culturas – pelo exposto no item cima, fica claro que
tanto maiores serão as chances de êxito profissional, quanto maior for o conhecimento
de outras culturas. Não nos referimos aqui unicamente ao domínio lingüístico já
mencionado, mas sobretudo ao conhecimento da idiossincrasia de uma determinada
sociedade, através da qual se pode depreender as tendências de mercado e demandas
para a satisfação de suas necessidades em termos de bens, produtos e serviços.
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• Investimento no autodesenvolvimento – neste item desejamos abordar a
necessidade premente de superar os entraves concernentes à sobrevivência profissional
de as pessoas se sustentarem num mercado de trabalho marcado pela enorme
competitividade. Com efeito, observa-se, com freqüência, que o mercado profissional
está cada vez mais exigente. Por esta razão, é preciso estarmos atentos às novidades, já
que só sobreviverão aqueles que forem verdadeiramente apaixonados pela aquisição de
novos conhecimentos. Ou seja, os que encararem o aprendizado como um processo
contínuo. Ou, ainda, como advertiu o renomado jornalista Gilberto Dimenstein, em
recente palestra na sede do CIEE, "é fundamental, neste final de século, que os
professores nas escolas ensinem a paixão pelo conhecimento. É função do mestre ser
muito mais que um administrador de informações, ele precisa ser um administrador da
curiosidade "(1998: 21). Daí assegurarmos, com toda a convicção que, para haver
preparo adequado para enfrentar as atuais vicissitudes do mercado de trabalho, temos de
nos comportar como verdadeiros aprendizes do futuro, investindo com afinco e denodo
no autodesenvolvimento pessoal.
Podemos, então e neste momento, explicitar o rol das habilidades requeridas
como novo perfil de formação de especialistas para o mercado globalizado:
•
Espírito empreendedor – esta necessidade deverá consubstanciar-se
no arrojo em ousar tomar atitudes eficazes no momento correto, com o propósito de
manter a sobrevivência e a expansão das atividades empresariais mesmo dentro das
adversidades que marcam a acirrada competitividade das empresas concorrentes,
todas elas também globalizadas.
•
Capacidade de inovação – quesito igualmente de grade importância
sobretudo pelo fato de a tecnologia constituir-se, hoje, no bem mais sensível e
valioso fator da competição econômica. E a nossa constatação é convalidada por
um dos maiores expoentes mundiais da moderna administração. Referimo-nos ao
conhecidíssimo Prof. Peter Drucker, da Universidade de Harvard e autor de
inúmeros best-sellers, dentre os quais a "Sociedade pós-capitalista ", no qual ele
assevera em alto e bom som que "a tecnologia será importante, principalmente
porque irá nos forçar a fazer coisas novas, e não porque irá permitir que façamos
melhor as coisas velhas".
•
Polivalência – atributo indispensável na nova dinâmica das relações
de trabalho, onde as rotinas se restringem ao mínimo possível e a parcela majoritária
das tarefas se concentra na inter-relação com os pares de trabalho e sobre inúmeras
atividades terceirizadas por força do que já comentamos há pouco. Assim, é
absolutamente necessário que o funcionário apto a atuar no mercado globalizado
tenha uma visão de conjunto, o que só será possível se ele for, de fato, um
elementos de expressiva polivalência pessoal e funcional;
•
Visão estratégica – em função do dinamismo e da enorme agilidade
da necessidade de desenvolvimento de novos produtos e serviços, torna-se
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imperativo que os profissionais estejam atentos não só às mudanças iminentes,
como àquelas que deverão se processar a curto e médio prazos. Daí a necessidade
de que haja a visão estratégica de antever, com razoável agilidade, para onde o
mercado se dirige.
•
Espírito de equipe – mencionamos, por fim, a atenção necessária com
o espírito de equipe, de vez que, cada vez mais, os sistemas produtivos caminham
em direção à realização de atividades envolvendo equipes multidisciplinares. Muito
embora diversas pessoas possam se alternar na condução dos trabalhos (sempre em
função das etapas operacionais atingidas ou finalizadas), é preciso que o perfil do
novo profissional inclua o espírito de equipe, fazendo-o aglutinar-se às pessoas e
adotar procedimentos operacionais a serem seguidos, nos momentos em que isso se
fizer conveniente ou necessário.
Vale lembrar que o modo mais rápido e eficaz de atingir os objetivos acima
nominados é o estabelecimento da parceria educação-trabalho, um instrumento
capaz de assegurar a consolidação da formação profissional requerida pelas novas
exigências de mercado, exaustivamente comentada até este momento. Para a
consecução deste objetivo surge a figura do estágio, que estabelece uma ponte entre
a escola e a empresa. E, ao mesmo tempo, entre ambas e o porvir.
Afinal, não podemos nos esquecer da oportuna advertência feita pelo
notável economista norte-americano Jeremy Rifkin que, em seu instigante livro "O
fim dos empregos", traça um perfil muito nítido do que se requer dos profissionais
que estão ingressando nesta era da globalização. Afiança ele que "os trabalhadores
do conhecimento [que é o novo paradigma ao qual já nos referimos] são um grupo
distinto, unidos pelo uso da tecnologia da informação de última geração para
identificar, intermediar e solucionar problemas. São criadores, manipuladores e
abastecedores do fluxo de informação que constrói a economia global pós-industrial
e pós-serviço. Suas fileiras incluem pesquisadores científicos, engenheiros
projetistas, engenheiros civis, analistas de software, pesquisadores em
biotecnologia, especialistas em relações públicas, advogados, profissionais do
mercado financeiro, consultores gerenciais, consultores financeiros e tributaristas,
arquitetos, planejadores estratégicos, especialistas em marketing, produtores e
editores de filmes, diretores de arte, editores, escritores e jornalistas" (1995: 192 –
os grifos são nossos).
Aliás, o expediente da realização de estágio é regulada por legislação
específica já existente. Referimo-nos aqui à Lei 6494, de 7 de dezembro de 1977,
regulamentada pelo Decreto 87497, de 18 de agosto de 1982. Sua prática constitui
uma verdadeira estratégia de profissionalização, na qual não apenas os estudantes e
as empresas saem ganhando, mas também, a própria Economia do País. Entendido
como um conjunto de atividades de aprendizagem profissional, social e cultural
proporcionadas ao estudante pela participação em situações reais de trabalho, ele é
vantajoso para o estudante por permitir:
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− a aplicação prática da teoria aprendida na escola, permitindo, com isso, uma
maior assimilação do conteúdo das matérias da grade curricular;
− a avaliação do acerto da escolha profissional, até mesmo com o eventual
suprimento das eventuais deficiências e impropriedades da sua formação escolar;
− a atenuação do impacto da passagem da vida estudantil para o mundo do
trabalho;
− a antecipação do desenvolvimento de posturas ou atitudes profissionais, com
estímulo ao senso crítico e à criatividade.
Do lado da empresa, ele também traz inúmeras vantagens, que se estendem
no curto, médio e longo prazos. Vejamos as principais delas:
− por inexistir vínculo empregatício entre o estudante e a empresa, esta
última está dispensada da obrigatoriedade de recolhimento de encargos sociais
ou de outras obrigações trabalhistas de que trata a legislação específica em
vigor.
− o investimento financeiro realizado em programas de estágios é
considerado, por lei, como despesa operacional;
− possibilita a ampliação ou a renovação de quadros funcionais,
técnicos e administrativos, com custos reduzidos;
− representa um sistema eficaz de recrutamento e seleção de novos
profissionais, facilitando a descoberta de novos talentos capazes de assegurar a
formação quadro qualificado de recursos humanos;
− constitui-se num eficiente meio de avaliação profissional, reduzindo
o investimento em tempo, salários e treinamento necessários nos casos de
contratação de recém-formados sem prática profissional;
− proporciona um canal de acompanhamento em relação aos avanços
tecnológicos e conceituais gerados e produzidos no seio das escolas;
− cria e mantém o espírito de renovação e oxigenação permanente, o
que é vital para o futuro das empresas que, através dos estágios, acompanha o
"estado da arte" em sua área de atuação;
− permite aos empresários cumprirem o seu papel social de contribuir
para formar novas gerações profissionais, com a rapidez e a qualificação que o
País necessita.
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Gostaríamos de acrescentar, também, que além do que já foi dito a respeito
do CIEE, nossa instituição oferece diversos serviços à comunidade e que são:
• Estágio de estudantes – visa a capacitação de futuros profissionais que
permite integrar a formação acadêmica à experiência prática, mediante a inserção do
jovem estudante no mercado de trabalho, onde ele realiza atividades programadas
juntos aos setores produtivos, em conformidade com os requisitos legais em vigência no
País;
• Processos seletivos – neste particular, o CIEE recruta, seleciona ou orienta e
encaminha estudantes, além de recém-formados para os Programas Trainee e para a
contratação via cumprimento da CLT. Vale salientar que o Programa Trainee tem
como objetivo capacitar novos talentos para ocupar cargos estratégicos ou de liderança
nas empresas. São voltados exclusivamente para estudantes em final de curso ou
recém-formados. O Programa Recém-Formado (ou seja, destinado à contratação via
CLT) oferece oportunidades para o ingresso no mercado de trabalho do jovem formado
até dois anos, para desenvolver atividades de conformidade com a área de formação,
objetivando suprir as necessidades de exercício profissional e de demanda do mercado;
• Programas de Desenvolvimento Estudantil – todos eles implicam
desenvolvimento de ações planejadas e orientadas para disponibilizar à comunidade,
programas que propiciem a preparação de jovens estudantes, com a finalidade não
apenas de melhorar suas qualificações profissionais, como também contribuir para seu
ingresso pleno no mercado de trabalho. Dentre eles, destacam-se a realização de
Workshops, Visitas In Company, Intercâmbio e Laboratório de Informática, incluindo,
ainda, cursos de Redação e de Interpretação de Textos. Acrescente-se a este leque de
opções, a eventual oferta de estágios internacionais e de cursos de idiomas em outras
línguas estrangeiras;
• Programas de Desenvolvimento Profissional – todos eles voltados ao
desenvolvimento de ações planejadas e orientadas para disponibilizar à comunidade,
programas e atividades que contribuam para o desenvolvimento pessoal e funcional de
profissionais aos quais se oferecem atualizações de conhecimentos, o que, sem dúvida,
colabora decisivamente para suas permanências no mercado de trabalho. Dentre eles,
ressaltam-se o Fórum de Debates sobre a Realidade Brasileira (com publicações
periódicas sobre a discussão apresentada por especialistas, a respeito de temas atuais
que afetam os destinos do País, bem como os que contribuem para o equacionamento
dos problemas concernentes às grandes questões nacionais) e o Ciclo de Conferências
sobre RH e Questões Educacionais;
• Programas Sociais – são aqueles que desenvolvem ações planejadas e
orientadas para disponibilizar à comunidade programas especiais que contribuam
decisivamente para atender os adultos e adolescentes de baixa escolaridade, oferecendolhes condições para melhorar as suas chances de ingresso no mercado de trabalho,
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aliando uma filosofia filantrópica a resultados concretos. Dentre elas, poderíamos citar
a que trata especificamente da Alfabetização de Adultos;
• Publicações – todas as publicações do CIEE objetivam manter seus públicos
informados sobre as atividades da instituição, criando, com isto, condições para que
todos possam beneficiar-se delas. Dentre outras ações, destacam-se os convênios de
divulgação permanente, mantidos com os mais importantes meios de comunicação de
massa do País, a página do CIEE na Internet (a nossa http://www.ciee.org.br), o que
tem se mostrado de grande utilidade para as empresas, escolas e estudantes, além de
uma série de publicações especiais, desenvolvidas para a leitura de jovens estudantes e
de empresários de toda a Nação. Além disto, o CIEE também publica, periodicamente,
a Revista Agitação, que veicula assuntos relacionados à formação e desenvolvimento
profissionais, tanto para o universo escolar, como para o empresarial.
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