Artigo ORIGINAL / ORIGINAL ARTICLE Avaliação da ASIA e do potencial evocado somatosensorial em indivíduos com paraplegia Evaluation of ASIA and somatosensory evoked potential in individuals with paraplegia Evalución de la ASIA y potencial evocado somatosentitivo em indivíduos com paraplejía Maria Izabel Fernandes de Arruda Serra Gaspar1 Alberto Cliquet Júnior2 Vera Maura Fernandes Lima3 Daniela Cristina Carvalho de Abreu4 RESUMO Objetivo: avaliar se há relação entre os registros do potencial evocado somatosensorial (PESS) do nervo tibial posterior (TP) de indivíduos paraplégicos de acordo com a classificação da ASIA (American Spinal Injury Association), e verificar se há diferença intergrupo e intragrupo nos valores de latência do PESS. Métodos: foram estudados dez indivíduos paraplégicos (Grupo 1) com, no mínimo, um ano de lesão, sendo três ASIA C, dois ASIA B, cinco ASIA A e oito indivíduos normais (Grupo 2). A avaliação eletrofisiológica foi realizada com um aparelho para medir o potencial evocado e pelo exame neurológico de acordo com a escala da ASIA. As latências N8, N22 e N45 foram analisadas baseando-se na sua ausência ou presença e se estavam normais ou prolongadas, utilizando-se, para isto, o modelo de efeitos mistos. Resultados: em todos os indivíduos foi observada ABSTRACT Objective: to evaluate if there is a relationship between somatosensory evoked potential (SSEP) of tibial nerve of people with paraplegia and classification of ASIA (American Spinal Injury Association) and to assess the difference intra- and intergroup in the latency’s values of the tibial SSEP. Methods: ten individuals with paraplegia (Group 1), one year of lesion at least, 3 ASIA C, 2 ASIA B and 5 ASIA A and 8 healthy individuals (Group 2) were evaluated. Electrophysiological assessment of the median nerve was performed by evoked potential equipment and the injury level was obtained by ASIA. The N8, N22 and N45 latencies were analyzed based on the presence or absence of such variables and observed whether SSEP recordings were normal or delayed using the mixed linear models. Results: in all individuals the N8 and RESUMEN Objetivo: evaluar si hay relación entre registros de potencial evocado somatosensitivo (PESS) del nervio tibial posterior (TP) de parapléjicos con la clasificación de la ASIA (American Spinal Injury Association), y verificar si hay diferencia intergrupo e intragrupo en los valores de latencias del PESS. Métodos: fueron estudiados 10 parapléjicos (grupo 1), con el mínimo un año de lesión, 3 ASIA C, 2 ASIA B y 5 ASIA A y 8 individuos saludables (grupo 2). La evaluación electrofisiología fue hecha por un aparato de potencial evocado, y el examen neurológico por la ASIA. Se analizó las latencias N8, N22 y N45 basándose en la ausencia o presencia de las mismas y si estaban normales o prolongadas, utilizando, para eso, el modelo de ejemplos mixtos. Resultados: en todos los indi-viduos se obtuvo las latencias N8 y N22. En los parapléjicos ASIA A y B no hubo re- Trabalho realizado no laboratório de Biomecânica e Reabilitação do Aparelho Locomotor do Hospital de Clínicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil. (Parte da dissertação de Mestrado apresentada à Universidade de Campinas - UNICAMP - Campinas (SP), Brasil. Pós-graduanda do Curso de Fisioterapia, Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil. 2 Professor Titular do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP – Campinas (SP), Brasil; Professor Titular do Departamento de Engenharia Elétrica – Universidade de São Paulo - campus São Carlos (SP), Brasil; 3 Gerência Geral do Laboratório de Saúde Pública – ANVISA São Paulo (SP), Brasil. 4 Professora do Curso de Fisioterapia, Departamento de Biomecânica, Medicina e Reabilitação do Aparelho Locomotor da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP - Ribeirão Preto (SP), Brasil. 1 Recebido: 27/06/2008 Aprovado: 24/09/2008 COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 Gaspar MIFAS, Cliquet Junior A, Lima VMF, Abreu DCC 224 latência N8 e N22. Nos indivíduos paraplégicos ASIA A e B não foi observada resposta cortical, enquanto que nos indivíduos paraplégicos ASIA C houve resposta cortical, com diferença entre as latências dos indivíduos saudáveis e dos paraplégicos (P<0,05). Entre os indivíduos paraplégicos houve diferença entre o lado direito e esquerdo (p<0,05), fato que coincidiu com a avaliação de acordo com a classificação da ASIA. Conclusão: os resultados sugerem que há relação entre a avaliação por meio da escala da ASIA e do PESS, uma vez que o exame de PESS confirmou a avaliação clínica realizada por meio da avaliação da ASIA. Esta relação é bem relevante visto que o exame de PESS nem sempre é possível de ser realizado e a avaliação da ASIA é simples, fácil de aplicar e de baixo custo. N22 were found. In paraplegics ASIA A and B the cortical latency was absent; in paraplegics ASIA C the cortical latency was present, but with difference between the latencies of healthy and paraplegic people (p<0.05). The differences between the sides, right and left, in the group 1 (p<0.05) were also verified by ASIA. Conclusion: these results suggest that there is a relation between the ASIA and SSEP evaluations, since the SSEP exam confirmed the clinical evaluation done by ASIA. This relation is important due to the fact that the SSEP evaluation is not always available and, on the other hand, the ASIA assessment is simple, cheap and easy to apply. spuesta cortical; ya en los parapléjicos ASIA C hubo respuesta cortical, y hubo diferencia entre las latencias de los individuos saludables e de los parapléjicos (p< 0,05) y entre los parapléjicos hubo diferencia entre los lados derecho e izquierdo (p<0,05), lo que coincidió con la ASIA. Conclusión: los resultados sugieren que hay relación entre la evaluación de la ASIA y PESS, una vez que el examen de PESS confirmó la evaluación clínica hecha por la ASIA. Esta relación es muy importante pues el examen de PESS ni siempre es posible de ser hecho y la evaluación de la ASIA es simple, fácil de aplicar y cuesta poco. DESCRITORES: Traumatismos da medula espinal; Paraplegia/ classificação; Potencial evocado somatossensorial; Nervo tibial KEYWORDS: Spinal cord injuries; Paraplejia/classification; Evoked potentials, somatosensory; Tibial nerve DESCRIPTORES: Traumatismos de la médula espinal; Paraplejia/ classificación; Potenciales evocados somatosensoriales; Nervio tibial INTRODUÇÃO Informações entre o encéfalo e o sistema nervoso periférico (SNP) são carreadas pela medula espinhal (ME)1-2. A lesão medular (LME), seja traumática ou não, acarreta incapacidades e graves danos, devido à interrupção da conexão entre encéfalo e SNP3. Entre os vários déficits que um indivíduo com LME apresenta, destaca-se a disfunção sensitivo-motora abaixo do nível da lesão4. Esta disfunção tem sido avaliada pela escala de deficiência proposta pela American Spinal Injury Association (ASIA), cuja avaliação clínica e qualitativa permite estabelecer o tipo e nível da lesão5-6 e a extensão da lesão em cinco níveis (A – E). A) Lesão completa, nenhuma função motora ou sensorial nos segmentos sacrais baixos (S4 – S5); B) Lesão incompleta, nenhuma função motora, mas alguma função sensorial preservada abaixo do nível neurológico incluindo os segmentos sacrais S4 – S5; C) Lesão incompleta, função motora preservada abaixo do nível neurológico, porém mais da metade dos músculos (MM) abaixo deste nível apresentam grau de força muscular (FM), abaixo de 3; D) Lesão incompleta, função motora preservada abaixo do nível neurológico com pelo menos metade dos músculos (MM) abaixo deste nível com grau de FM > 3; E) Normal, funções motora e sensitiva intactas3. Porém, essa classificação não permite uma extensa compreensão das alterações que a LME ocasiona, já que é baseada somente em escores da função motora e sensitiva7 e necessita da cooperação do indivíduo. O potencial evocado somatosensorial (PESS), que é uma avaliação eletrofisiológica e pode ser utilizado COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 nos pacientes com LME como exame complementar para determinar as características da lesão e colaborar para o melhor entendimento do prognóstico8-9, já que permite uma avaliação quantitativa do sistema somatosensorial10-11. As respostas cerebrais de PESS por estimulação dos nervos periféricos foram registradas pela primeira vez por Dawson, em 194712. Depois disso, pesquisas com PESS para doenças específicas têm sido feitas, como acidente vascular encefálico e LME13. Entretanto, para a realização do exame de PESS é necessária a disponibilidade do equipamento de avaliação, assim como profissional com experiência na realização do teste, o que dificulta a sua execução na prática clínica. O objetivo deste estudo foi avaliar, por meio de dois métodos diferentes – ASIA e PESS, a lesão neurológica do nervo tibial posterior (TP) de pacientes paraplégicos e verificar se há uma relação entre estes tipos de avaliação, visto que uma é qualitativa e a outra quantitativa. MÉTODOS Foram estudados dez indivíduos paraplégicos (T3 – T10) (Grupo 1), sem trauma crânio-encefálico associado, com pelo menos um ano de lesão e oito indivíduos normais, sem lesões neurológicas (Grupo 2), todos do sexo masculino. As características antropométricas e da lesão dos paraplégicos estão apresentadas na Tabela 1 e as características antropométricas do grupo controle na Tabela 2. A avaliação clínica foi realizada conforme o protocolo de avaliação proposto pela ASIA e sempre pelo mesmo terapeuta, para quem o exame era familiar. A avaliação eletrofisiológica Avaliação da ASIA e do potencial evocado somatosensorial em indivíduos com paraplegia 225 ocorreu por meio de um equipamento de potencial evocado Neuropack Four® (Nihon Kohden, Tóquio, Japão), com quatro canais simultâneos de registro. O nervo estimulado foi o tibial posterior (TP) ao nível do maléolo medial, por ser o mais freqüentemente avaliado dos membros inferiores (MMII) de indivíduos com paraplegia14. Os eletrodos (0.7cm de prata) foram colocados sobre a pele. O eletrodo de estimulação foi posicionado em cima do nervo tibial posterior ao nível do maléolo medial. Os eletrodos de registro foram posicionados na fossa poplítea com a referência do côndilo lateral da tíbia (canal 4), em T12 com a referência no sacro (canal 3) em Cz (baseado no sistema TABELA 1 – Características antropométricas e internacional 10/20) com a referência no da lesão dos indivíduos com paraplegia ínion (canal 2) e em Cz’ (baseado no sistema Indivíduos Idade Peso Altura Tempo de Causa Nível ASIA internacional 10/20) com a referência no ínion (canal 1). O parâmetro utilizado para analisar (anos) (kg) (cm) lesão (anos) da lesão as respostas de PESS foi a latência, que possui 1 22 73 1,73 5 ac. Auto* T9 A maior relevância clínica 16, e os registros de 2 32 76 1,78 5 FAF** T4 B potencial evocado foram avaliados de acordo com a presença ou ausência da latência N 8 3 34 60 1,56 2 ac. auto T5 A (fossa poplítea), da latência N 22 (medula 4 53 96 1,79 30 vírus T10 C tóraco-lombar) e da latência N 45 (cortical). 5 34 100 1,75 19 ac. auto T5 C Os dados obtidos foram analisados com base 6 26 66 1,80 4 ac. auto T8 C nas latências normais ou prolongadas dos registros de PESS. Para avaliar se a latência 7 23 65 1,73 1 ac. auto T7 A estava ou não prolongada comparou-se as 8 23 70 1,75 5 ac. auto T5 A latências dos indivíduos paraplégicos com 9 21 80 1,90 2 ac. auto T3 A as dos indivíduos saudáveis. Compararam10 42 74 1,68 3 ac. auto T10 B se também as latências entre os hemicorpos *ac. auto = acidente automobilístico; **FAF = ferimento por arma de fogo dos indivíduos com paraplegia (nervos tibiais direito e esquerdo) para ver se havia assimetria de lesão. Tabela 2 – Características A análise estatística foi efetuada de acordo com o antropométricas dos modelo linear misto 17-18 para verificar se as latências indivíduos normais dos indivíduos com paraplegia estavam normais ou Controles Idade Peso Altura prolongadas comparadas às dos indivíduos saudáveis, (anos) (kg) (cm) através do SAS versão 9 19. Os resultados foram 1 30 73 1,78 apresentados como média e desvio padrão (DP). As diferenças foram consideradas relevantes com 2 24 70 1,75 p<0.05. 3 24 63 1,63 4 26 80 1,86 5 24 72 1,70 6 32 85 1,79 7 36 77 1,80 8 32 70 1,78 O estímulo elétrico apresentou os seguintes parâmetros: onda quadrada de 0,2ms de duração a uma freqüência de 5Hz e impedância de 10kΩ de acordo com os padrões da Federação Internacional de Neurofisiologia Clínica15. As avaliações foram repetidas três vezes, em três dias diferentes, para obter resposta mais fidedigna e média dos valores, levando-se também em consideração a variabilidade do dia-a-dia e do próprio paciente. Em cada avaliação eram realizadas três análises, cada qual com 2000 respostas e uma resposta era sobreposta à outra para maior fidedignidade dos resultados. A intensidade do estímulo foi ajustada de modo a produzir contração muscular visível ou atingir o limiar motor, sendo que a máxima intensidade atingiu 40mA. O potencial de ação foi obtido na região da fossa poplítea. Os indivíduos foram posicionados na posição supina em uma maca (Figura 1). A B Figura 1 Paciente em exame de PESS. A) Posição supina na maca. B) Demonstração do posicionamento de alguns eletrodos: eletrodo C de referência localizado no côndilo medial; eletrodo terra localizado entre o eletrodo de estimulação e um dos eletrodos de captação (localizado na fossa poplítea); eletrodo de estimulação. C) Eletrodo de estimulação localizado ao nível do maléolo medial COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 Gaspar MIFAS, Cliquet Junior A, Lima VMF, Abreu DCC 226 RESULTADOS A média dos valores das latências N8, N22 e N45 para cada indivíduo estudado está apresentada na Tabela 3. A descrição dos dados referente às latências N8, N22 e N45 está ilustrada nas Figuras 2 (A, B e C), as quais mostram a média, mediana, valores mínimo e máximo das latências dos indivíduos controle e dos indivíduos com paraplegia. Foram realizadas comparações de médias entre os grupos para cada lado e entre os lados para cada grupo. Os valores estão demonstrados nas Tabelas 4 e 5. Os resultados mostraram que as latências N8 e N22 estão presentes em todos os indivíduos com paraplegia, e os valores encontrados foram todos normais, isto é, não se obteve latência prolongada em nenhum indivíduo paraplégico quando se compara com os indivíduos normais estudados. Isto era esperado visto que as latências N8 e N22 foram captadas abaixo do nível de lesão. A latência N45 estava presente somente nos indivíduos com paraplegia ASIA C, ou seja, com motricidade abaixo do nível da lesão, pois em indivíduos paraplégicos ASIA A e mesmo em indivíduos paraplégicos ASIA B a latência estava ausente. Nos indivíduos ASIA C os valores das latências estavam prolongados comparados aos indivíduos saudáveis, mostrando que houve diferença estatística entre os grupos (p<0.05). Ao se comparar os nervos tibiais posteriores de ambos os lados, direito e esquerdo, houve diferença estatística no grupo dos indivíduos com paraplegia (p<0.05), o que coincidiu com a avaliação da ASIA, demonstrando haver assimetria entre os lados, o que é freqüentemente observado na prática clínica. As Figuras 3, 4, 5 e 6 mostram os gráficos de PESS dos seguintes indivíduos: um normal, um paraplégico ASIA A, um paraplégico ASIA B e um paraplégico ASIA C, respectivamente. A primeira linha indica Cz’ (latência N45), a segunda linha indica Cz, a terceira linha representa T12 (latência N22) e a quarta linha representa a fossa poplítea (N8). Estes gráficos mostram a ausência de resposta cortical nos indivíduos paraplégicos ASIA A e B e a presença de resposta cortical nos indivíduos paraplégicos ASIA C. Tabela 3 - Média dos valores das latências N8, N22 e N45 para cada indivíduo Indivíduos paraplégicos Direito N22 N45 N22 N45 1 7,66 21,14 ND 7,79 21,16 ND 2 8,01 20,17 ND 7,87 20 ND 3 8,06 20,1 ND 7,44 19,72 ND 4 8,19 19,03 48,86 7,44 20,08 54,64 5 8,34 20,52 52,23 9,12 21,45 55,07 6 8,2 19,33 49,81 8,4 20,48 53,8 7 9,04 20,56 ND 9,14 20,98 ND 8 8,1 19,11 ND 8,46 19,31 ND 9 8,84 19,86 ND 9,24 21,58 ND 11,4 21,9 ND 11,01 19,53 ND Média 8,85 19,91 43,57 9 20,06 43,99 DP 0,50 0,41 1,56 0,15 1,25 10 N 8 Esquerdo N8 Controles 0,30 N8 = latência N8 (captada na fossa poplítea); N22 = latência N22 (latência da medula tócaco-lombar); N45 = latência N45 (latência cortical); ND = não detectável; DP = desvio padrão Figura 2 Latências do nervo mediano. A) Box-plot para média, mediana, valores máximos e mínimos dos controles e sujeitos com paraplegia para a latência N8 para cada lado; P = Grupo de paciente; C = Grupo controle. B) Box plot para média, mediana, valores máximos e mínimos dos controles e sujeitos com paraplegia para a latência N22 para cada lado; P = grupo de paciente; C = Grupo controle. C) Box plot para média, mediana, valores máximos e mínimos dos controles e indivíduos com paraplegia para a latência N45 para cada lado; P = grupo; C = grupo controlede paciente COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 2A) Box-plot para a variável N8 para cada grupo e lado 2B) Box-plot para a variável Medula (N22) para cada grupo e lado 2C) Box-plot para a variável Córtex (N45) para cada grupo e lado Avaliação da ASIA e do potencial evocado somatosensorial em indivíduos com paraplegia 227 Tabela 4 - Comparação de médias entre os grupos para cada lado Variável Lado Comparação Média N8 D C 8,85 0,50 P 9,00 0,30 C 8,57 1,11 P 9,06 2,64 C 19,91 0,41 P 20,06 0,15 C 20,18 1,09 P 20,59 1,07 C 43,57 1,56 P 43,99 1,25 C 51,01 2,22 P 54,58 0,73 E N22 D E N45 D E DP Diferença I.C 95% Valor-p 0,33 (-0,56; 1,22) 0,41 0,31 (-0,58; 1,21) 0,41 -0,23 (-1,04; 0,57) 0,57 -0,49 (-1,31; 0,32) 0,24 -7,23 (-9,29; -5,17) <0,01* -10,39 (-12,45; -8,33) <0,01* D = lado direito; E = lado esquerdo; DP = desvio padrão; IC = intervalo de confiança. *Diferença estatística Tabela 5 - Comparação de médias entre os lados para cada grupo Variável Grupo Comparação Média DP Diferença N8 C D 8,85 0,50 -0,16 (-0,72; 0,41) 0,56 E 8,57 1,11 P D 9,00 0,30 -0,17 (-0,51; 0,17) 0,33 E 9,06 2,64 D 19,91 0,41 -0,15 (-1,02; 0,73) 0,73 E 20,06 0,15 D 20,06 0,15 -0,40 (-0,92; 0,11) 0,12 E 20,59 1,07 D 43,57 1,56 -0,42 (-1,38; 0,55) 0,30 E 51,01 2,22 D 43,99 1,25 -3,58 (-4,61; -2,55) <0,01* E 54,58 0,73 N22 C P N45 C P I.C 95% Valor-p D = lado direito; E = lado esquerdo; DP = desvio padrão; IC = intervalo de confiança. *Diferença estatística N45 Cz’ - ínion Cz - ínion N22 T12 - sacro N8 Fossa Poplítea Figura 3 Traçado de PESS do nervo tibial posterior de um indivíduo saudável. A primeira linha representa Cz’ (latência N45); a segunda linha representa Cz; a terceira linha representa a medula tóraco-lombar (latência N22) e a última linha representa a fossa poplítea (latência N8) COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 Gaspar MIFAS, Cliquet Junior A, Lima VMF, Abreu DCC 228 DISCUSSÃO Cz’ - ínion Cz - ínion N22 T12 - sacro N8 Fossa Poplítea Figura 4 Traçado de PESS do nervo tibial posterior de um indivíduo com lesão medular ASIA A. A primeira linha representa Cz’ (latência N45); a segunda linha representa Cz; a terceira linha representa a medula tóracolombar (latência N22) e a última linha representa a fossa poplítea (latência N8) Cz’ - ínion Cz - ínion N22 T12 - sacro N8 Fossa Poplítea Figura 5 Traçado de PESS do nervo tibial posterior de um indivíduo com lesão medular ASIA B. A primeira linha representa Cz’ (latência N45); a segunda linha representa Cz; a terceira linha representa a medula tóraco-lombar (latência N22) e a última linha representa a fossa poplítea (latência N8) N45 Cz’ - ínion Cz - ínion N22 T12 - sacro N8 Fossa Poplítea Figura 6 Traçado de PESS do nervo tibial posterior de um indivíduo com lesão medular ASIA C. A primeira linha representa Cz’ (latência N45); a segunda linha representa Cz; a terceira linha representa a medula tóraco-lombar (latência N22) e a última linha representa a fossa poplítea (latência N8) Após a LME, a transmissão das informações entre o sistema nervoso central e o sistema nervoso periférico ficam parcial ou totalmente prejudicadas. É importante conhecer as formas de se avaliar a LME e se estas apresentam relação entre si. O melhor entendimento da relação entre a avaliação da ASIA e as respostas eletrofisiológicas obtidas pelo PESS é importante, visto que o exame do potencial evocado nem sempre é possível de ser realizado na prática clínica, enquanto que a avaliação da ASIA é uma avaliação simples, fácil de aplicar e de baixo custo, além de proporcionar informações sobre o comprometimento sensitivo-motor3,5-6. Entretanto, necessita da cooperação do paciente e não pode ser quantificada, enquanto que o exame de PESS é uma avaliação quantitativa, não necessita da cooperação do paciente e permite avaliar a lesão no sistema nervoso20-22. Portanto, pesquisas que mostrem a relação entre a ASIA e o PESS, no que se refere ao melhor entendimento da extensão da lesão e os seus comprometimentos, são importantes, permitindo, assim, por meio da avaliação da ASIA, estabelecer relação com a preservação ou não da conexão entre o sistema nervoso central e periférico, uma vez que há controvérsias na literatura sobre as respostas de PESS nas lesões completas da medula, visto que um estudo mostrou que não há resposta cortical em lesões medulares completas, mas somente em incompletas23. Outros estudos mostraram que houve resposta cortical tanto nas lesões completas quanto nas incompletas, mas estas respostas não significam recuperação sensorial ou motora24-25. Os resultados deste estudo mostraram que somente os indivíduos com paraplegia ASIA C possuem resposta cortical, visto que nenhum paraplégico ASIA A ou mesmo ASIA B apresentaram tal resposta, sugerindo que é necessário algum grau de motricidade abaixo do nível da lesão para apresentar resposta cortical. E quando esta resposta existe, a latência é prolongada comparada aos indivíduos saudáveis. Estes dados corroboram com Kovindha & Mahachai13, que também não observaram resposta cortical nos indivíduos com lesão medular completa ou com grande perda sensorial. A Tabela 4 demonstra que não houve diferença nas latências N8 e N 22 quando se compara o grupo de pacientes com o grupo controle, para ambos os lados, direito e esquerdo. Quando se faz a mesma comparação para a latência cortical nota-se uma diferença entre os grupos para os dois hemicorpos, mostrando que o grupo de indivíduos paraplégicos apresenta uma latência prolongada comparando com o grupo controle. O mesmo ocorreu no trabalho de Curt & Dietz8, no qual também foi observada latência cortical prolongada nas lesões medulares. Na prática clínica, é freqüente a observação da assimetria na LME. Ela é facilmente diagnosticada pela avaliação da ASIA, já que permite uma avaliação de ambos os lados, direito e esquerdo, em separado3. No exame de PESS verificou-se uma assimetria na LME quando se comparou os COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229 Avaliação da ASIA e do potencial evocado somatosensorial em indivíduos com paraplegia lados direito e esquerdo dos indivíduos com paraplegia (Tabela 5), coincidindo com o que foi observado pela avaliação da ASIA no exame clínico. Os resultados sugerem que há relação entre a avaliação da ASIA e o exame do PESS, conforme estudo de Curt & Dietz8 que também observaram estreita relação entre a ASIA e o PESS. Embora estas duas avaliações devam ser complementares para melhor compreensão do comprometimento medular, a utilização da avaliação ASIA na prática clínica já possibilita um bom entendimento sobre a extensão da lesão em indivíduos paraplégicos. Estudos com tamanho amostral maior e com maior variedade de níveis de lesão medular devem ser realizados para confirmarem os resultados aqui demonstrados. Além disso, estudos longitudinais que incluam o tratamento da reabilitação são importantes para esclarecer se os exames de PESS e ASIA possuem relação com o prognóstico sensorial e motor de pacientes com lesão medular. 229 CONCLUSão A metodologia proposta pela ASIA e o exame de PESS são muito importantes na avaliação e acompanhamento da LME. Embora a primeira seja uma avaliação qualitativa e a segunda quantitativa, os resultados deste estudo mostraram que há relação entre estes dois tipos de avaliação. Agradecimentos Os autores agradecem ao Prof. Dr. Fernando Cendes e ao Dr. Marcondes Cavalcanti Franca Júnior pelo auxílio nesta pesquisa. Agradecem também o suporte dado pela Fundação de Amparo e Pesquisa do Estado de São Paulo – FAPESP (#2005/53530-0, # 2003/05856-9 e #1996/12198-2); à Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência- FAEPA do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP pelo auxílio financeiro concedido e ao Centro de Métodos Quantitativos - CEMEQ da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP pela análise estatística realizada. REFERÊNCIAS 1. Machado A. Neuroanatomia funcional. 2a ed. São Paulo: Atheneu; 2003. 2. Graaff V. Anatomia humana. 6a ed. Barueri (SP): Manole; 2003. 3. Staas WE, Formal CS, Freedman MK, Fried GW, Read MES. Lesões medulares e tratamento medico nas lesões medulares. In: Delisa JA, Gans BM, editors. Tratado de medicina de reabilitação: princípios e prática. 3a ed. São Paulo: Manoel;2002. p. 1325- 59. 4. 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Correspondência Daniela Cristina Carvalho de Abreu Av. Bandeirantes, 3900 Ribeirão Preto, SP, Brasil CEP: 14049-900 Tel: + 16 3602-4413 / 3058 E-mails: [email protected] [email protected] COLUNA/COLUMNA. 2008;7(3)223-229