Departamento
de Engenharia Química e Biológica
Valorização de Óleos Alimentares Usados
– Design do Produto
Dissertação apresentada para a obtenção do grau de Mestre em
Processos Químicos e Biológicos
Autor
Marta Filipe de Carvalho Nunes
Orientadores
Doutor Belmiro Duarte
Instituto Superior de Engenharia de Coimbra
Doutor Luís Miguel Moura Neves de Castro
Instituto Superior de Engenharia de Coimbra
Engenheira Paula Lopes
Victor Guedes, S.A.
Coimbra, Dezembro, 2011
AGRADECIMENTOS
Este trabalho apresenta-se como o culminar de uma fase importante da minha vida. Dediqueime com bastante empenho na elaboração do mesmo. Quero expressar o meu agradecimento a
todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para a sua concretização. É de salientar,
que tal não seria possível sem o apoio e incentivo constante dos meus pais, irmão e avós, aos
quais estou muito grata. Obrigada por me terem proporcionado esta feliz etapa da minha vida.
Aos meus Orientadores, Professor Doutor Belmiro Duarte e Professor Doutor Luís Miguel
Moura de Castro, agradeço o apoio, a partilha do saber e as valiosas contribuições para o
trabalho. Obrigada pela disponibilidade demonstrada para esclarecimento de dúvidas, sem
eles este trabalho não seria possível.
À Doutora Raquel Costa, por ter contribuído com o seu conhecimento e ainda me ter
facultado os meios para a realização de uma actividade experimental no âmbito do Capítulo 5.
Agradeço ainda, ao João Gomes e à Rita Garrido pelo apoio no laboratório e pela informação
gentilmente cedida. O trabalho realizado nesse capítulo só foi possível devido ao
financiamento por fundos FEDER através do Programa Operacional Factores de
Competitividade – COMPETE e por fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a
Ciência e a Tecnologia (FCT) no âmbito do projecto CONTROLCLAM (PTDC/AACAMB/113515/2009).
Estou grata aos membros do “Grupo Forte” pela partilha de informação e ainda por me terem
proporcionado agradáveis momentos nesta fase da minha vida académica.
Agradeço ainda aos meus amigos de longa data, que apesar de reclamarem a minha falta de
disponibilidade para estar com eles, deram-me força e motivação para continuar, contribuindo
com a sua boa disposição, permitindo momentos de descontracção e alegria.
iii
Valorização de Óleos Alimentares Usados
RESUMO
RESUMO
Em Portugal, apesar de existirem diversas iniciativas para promover a recolha e tratamento
dos óleos alimentares usados (OAU), o controlo do seu destino tem sido difícil. Actualmente
a rede de esgotos é o principal destino provocando impactes ambientais negativos relevantes.
Porém este cenário tem tendência a mudar com a publicação do Decreto-Lei 267/2009 de 29
de Setembro que estabelece o regime jurídico da gestão de OAU, produzidos pelos sectores
industrial, HORECA e doméstico. Este Decreto-Lei, para além de criar um conjunto de
normas que visam a implementação de circuitos de recolha selectiva, o seu correcto
transporte, tratamento e valorização por operadores devidamente licenciados para o efeito,
assenta também na co-responsabilização e no envolvimento de todos os intervenientes no
ciclo de vida dos óleos alimentares. Assim, a Victor Guedes, S.A., como grande operadora de
comercialização nacional de óleos alimentares, passa a estar obrigada a realizar acções na área
da investigação e desenvolvimento no domínio da prevenção e valorização dos óleos
alimentares usados.
Para satisfazer a referida obrigatoriedade, pretende-se desenvolver metodologias de
valorização de OAU, evidenciando quais as possibilidades de aplicação, bem como as suas
potencialidades. Pretende-se igualmente definir uma ideia de produto/especificações a obter e
avaliar economicamente, ainda que de uma forma simplista, o custo da potencial alternativa
tecnológica a implementar. Note-se que, o estudo aqui conduzido é meramente um passo
inicial no processo de investigação e industrialização. Naturalmente, estudos mais detalhados
e alargados relativamente a cada uma das alternativas devem ser conduzidos por forma a
reduzir o grau de incerteza que ainda existe sobre as várias estratégias/produtos.
As soluções encontradas para valorizar os OAU, para além da produção de biodiesel e de
sabão, que já se encontram implementadas em Portugal, são o uso de OAU como aditivo de
rações animais, matéria-prima para a produção de oleoquímicos, como substrato na produção
de biogás, para melhorar a performance dos digestores anaeróbios e, finalmente, integrados
como aditivos na produção de pesticidas/biocidas como adjuvantes. Como alternativa
tecnológica a implementar, a melhor solução encontrada, tendo em conta o método de
valorização que permite escoar parte significativa dos OAU gerados em Portugal, foi na área
de produção de oleoquímicos, nomeadamente na produção de ácido azelaico. Foi estudada
esta possibilidade de valorização, tendo-se projectado uma unidade com uma produção de
26000 toneladas anuais de ácido azelaico. Este projecto pressupõe um investimento de capital
de 123 M€ e custos de operação na ordem dos 75,5 M€/ano. O projecto tem um VAL de 933
M€, com um período de recuperação do investimento de 2,2 anos. Verificou-se que o projecto
é economicamente viável. No entanto, devido à dependência da estrutura de custos sobre os
geradores de ozono, que são unidades muito caras e que requerem grandes quantidades de
energia eléctrica, o projecto deve ser adaptado para produções inferiores.
Marta Nunes
v
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ABSTRACT
ABSTRACT
In Portugal several initiatives to promote the collection and treatment of used cooking oil
(UCO) are already in course. Although the control of the end recognizably difficult to target
in the past. This scenario is now changing due to the approval of the Decreto-Lei 267/2009 of
29th September by the Portuguese Parliament. This tool establishes the key steps for legal
management of UCO produced by industrial, HORECA and domestic sectors. More than the
creation of a set of rules, the law is aimed at establishing a transportation, collection,
treatment and recovery network.
Because of the law, Victor Guedes, S.A., a major national company in the area of cooking oil,
is obliged to promote activities of R&D focused on the prevention and recovery of the UCO.
To help the company to meet this goal, we analyzed a series of technological routes to recycle
UCO and recover it with added value. Severed technological alternatives were addressed. At
this level, the basic propose of this work was to define ideas of products and process
specifications that may be applied at the industrial scale. Although analysis carried out here
was very simplistic, it allowed the assessment of economic performance of one of the
alternatives considered. It should be noted that the study conducted in this thesis is an initial
step for the choice and industrialization of the technological alternatives. Obviously, we
advocate that a more detailed and extensive analysis should be performed regarding each of
the alternatives in order to reduce the uncertainty that is still associated with the various
approaches.
The solutions to add value to the UCO, in addition to the production of biodiesel and soap,
which are already being used in Portugal, are (i) the use of the oils as an additive for animal
feed, (ii) as raw material for producing oleochemicals, (iii) as a substrate in the production of
biogas as a carbon provider to improve the performance of anaerobic digesters, (iv) and
finally as an additive pesticides/biocides working as adjuvants.
The best technological alternative from all we considered consists of pre-treating the UCO
and using it to produce azelaic acid. The economical performance of this route was
characterized based on the design of a plant with a capacity of 26000 ton/year. Such a plant
requires a capital investment of 123 M€, and the its operating costs are 75,5 M€/year. The
plant denotes a NPV (net present value) of 933 M€ and a pay-back period of 2,2 years, which
points out to a economically viable alternative. However, due to the dependence of the cost
structure on the ozone generators, which are very expensive units with large power
requirements, the plant design should be scaled for lower production.
Marta Nunes
vii
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ÍNDICE
ÍNDICE
1.
INTRODUÇÃO............................................................................................................. 1
1.1. Contexto e enquadramento ............................................................................................ 1
1.1.1.
Regime jurídico dos OAU em Portugal ......................................................................... 2
1.2. Objectivos e metodologia .............................................................................................. 4
1.3. Organização da tese ...................................................................................................... 4
2.
CARACTERIZAÇÃO DOS OAU ................................................................................ 7
2.1. Óleos virgens vs óleos usados ....................................................................................... 8
2.2. Caracterização do fluxo actual de OAU ...................................................................... 10
3.
2.2.1.
Produção de OAU na Europa ......................................................................................10
2.2.2.
Custos de recolha / aquisição dos OAU ......................................................................15
ALTERANTIVAS TECNOLÓGICAS PARA VALORIZAÇÃO DE OAU ............. 17
3.1. Biodiesel ..................................................................................................................... 20
3.1.1.
Pré-tratamento dos OAU............................................................................................22
3.2. Produção de sabão ...................................................................................................... 29
3.3. Oleoquímicos .............................................................................................................. 30
3.3.1.
Polímeros...................................................................................................................32
3.3.2.
Surfactantes ...............................................................................................................32
3.3.3.
Pesticidas ...................................................................................................................33
3.3.4.
Lubrificantes ..............................................................................................................34
3.4. Ração animal .............................................................................................................. 35
3.5. Digestão anaeróbia ...................................................................................................... 36
4.
BIOGÁS - USO DE OAU COMO CO-SUBTRATO NA DIGESTÃO ANAERÓBIA
37
4.1. Processo de digestão anaeróbia ................................................................................... 38
4.1.1.
Vantagens e desvantagens da DA ...............................................................................38
4.1.2.
Etapas principais da DA ..............................................................................................39
4.1.3.
Condições operatórias ...............................................................................................43
4.1.4.
Co-digestão de resíduos .............................................................................................45
Marta Nunes
ix
ÍNDICE
5.
5.1.
5.2.
5.3.
5.4.
5.5.
6.
BIOCIDAS - USO DE OAU COMO ADJUVANTE ................................................. 51
Corbicula fluminea ..................................................................................................... 52
Estudo experimental .................................................................................................... 55
Materiais e métodos .................................................................................................... 56
Resultados e discussão ................................................................................................ 59
Conclusão ................................................................................................................... 63
ÁCIDO AZELAICO - USO DE OAU COMO MATÉRIA-PRIMA ......................... 65
6.1. Ozonólise .................................................................................................................... 67
6.2. Síntese do processo ..................................................................................................... 69
6.2.1.
Ozonização ................................................................................................................ 73
6.2.2.
Cisão e oxidação ozonídeos........................................................................................ 74
6.2.3.
Separação do ácido azelaico ...................................................................................... 75
6.3. Balanços mássicos ...................................................................................................... 75
6.3.1.
Reactor R-101 ............................................................................................................ 77
6.3.2.
Reactores R-102/103/104 .......................................................................................... 79
6.3.3.
Coluna de destilação CD-101...................................................................................... 82
6.3.4.
Balanço global ........................................................................................................... 85
6.4. Balanços energéticos ................................................................................................... 86
6.4.1.
Reactor R-101 ............................................................................................................ 87
6.4.2.
Reactores R-102/103/104 .......................................................................................... 88
6.4.3.
Coluna de destilação CD-101...................................................................................... 93
6.4.4.
Permutador de calor PC-101 ...................................................................................... 94
6.5. Dimensionamento ....................................................................................................... 95
6.5.1.
Tanques de armazenamento TA-101/102/103/104 .................................................... 95
6.5.2.
Reactores R-101/102/103/104 ................................................................................... 96
6.5.3.
Coluna de destilação CD-101.................................................................................... 103
6.5.4.
Permutador de calor PC-101 .................................................................................... 106
6.5.5.
Aglomerador A-101 - “flaker”................................................................................... 106
6.5.6.
Gerador de ozono .................................................................................................... 107
6.6. Análise económica .................................................................................................... 109
x
6.6.1.
Custos de instalação ................................................................................................ 110
6.6.2.
Custos de operação ................................................................................................. 111
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ÍNDICE
6.6.3.
Vendas de ácido azelaico .........................................................................................114
6.6.4.
Métricas de performance financeira.........................................................................118
6.6.5.
Análise de sensibilidade da performance económica ................................................120
7.
CONCLUSÕES GERAIS E TRABALHOS FUTUROS ......................................... 125
8.
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 129
Marta Nunes
xi
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ÍNDICE FIGURAS
ÍNDICE FIGURAS
Figura 2-1 – Representação de um triglicerídeo
7
Figura 3-1 – Representação de alguns ácidos gordos constituintes dos óleos: (1) ácido oleico,
(2) ácido linoleico, (3) ácido linolénico, (4) ácido erúcico, (5) ácido icinoleico, (6)
ácido petroselinico, (7) ácido 5-eicosenoico, (8) ácido calendico, (9) ácido
αeleosteárico, (10) ácido punicico (Metzger & Bornscheuer, 2006)
17
Figura 3-2 - Representação esquemática das duas vias de transformação/valorização
19
Figura 3-3 – Tendência da produção de biodiesel na Europa entre 1998 e 2011 (‘000ton)
(European Biodiesel Board, 2011)
20
Figura 3-4 – Representação esquemática do pré-tratamento do OAU
23
Figura 3-5 – Reacções de saponificação
Figura 3-6 - Processamento industrial de óleos e gorduras naturais e os seus produtos
derivados (Hill, 2007)
Figura 4-1 – Representação esquemática das fases do processo de digestão anaeróbia,
adaptado de (Gray, 2004)
29
30
39
Figura 5-1 – Corbicula fluminea (ameijoa asiática)
53
Figura 5-2 – Testes estáticos de curta duração em C. flumínea (após 24h)
57
Figura 5-3 – Taxa de mortalidade em função do tempo de exposição do tratamento
60
Figura 5-4 – Taxa de mortalidade obtida com a Corbicula fluminea para várias concentrações
de polyDADMAC e de polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo após 72 horas
de exposição
Figura 6-1 – Reacção geral do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
Figura 6-2 – Primeira etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
Figura 6-3 – Segunda etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
Figura 6-4 – Representação do processo de ozonólise do ácido oleico (Kockritz & Martin,
2011)
Figura 6-5 – Diagrama do processo
Figura 6-6 – Esquema representativo do reactor R-101
Figura 6-7 – Esquema representativo dos reactores R-102/103/104
Figura 6-8 – Esquema representativo da coluna de destilação CD-101
61
67
67
68
68
72
78
80
83
Figura 6-9 – Esquema representativo do permutador de calor PC-101
94
Figura 6-10 –Flaker ( Proton Engineering Works, 2011)
107
Figura 6-11 – Representação esquemática de um gerador por descarga corona, adaptado de
(Lenntech, 2011)
108
Figura 6-12 – Gerador de ozono (Degrémont Technologies, 2011)
Marta Nunes
108
xiii
ÍNDICE DE FIGURAS
Figura 6-13 – Cash-flow actualizado ao longo do tempo de vida do projecto
Figura 6-14 – Cash-flow actualizado em função do preço de venda do produto
Figura 6-15 - Cash-flow actualizado em função do preço da matéria-prima (OAU)
Figura 6-16 – Representação do ponto crítico de vendas
xiv
119
121
121
123
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ÍNDICE DE TABELAS
ÍNDICE TABELAS
Tabela 2-1 – Grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a fritura dos alimentos
(American Oil Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová, 2004)
9
Tabela 2-2 – Produção, importação, exportação e consumo de óleos alimentares virgens na
Europa em 2007 (ton/ ano) (FAOSTAT, 2011)
10
Tabela 2-3 – Produção de óleos alimentares usados na Europa considerando que 45%
constituem resíduos (ton/ano), para o ano de 2007
11
Tabela 2-4 – Produção, recolha, utilização e rejeição de óleos alimentares usados na Europa
(ton/ano) (BioDieNet, 2007-2009)
12
Tabela 2-5 - Produção de óleos alimentares usados na Europa estimada considerando que 80%
são resíduos (ton/ano), para o ano 2007 (FAOSTAT, 2011)
Tabela 2-6 - Produção de óleos alimentares usados na Europa em 2009 (Greenea, 2010)
Tabela 2-7 – kg de OAU per capita na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
Tabela 2-8 – Custo da recolha/aquisição de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
Tabela 3-1 – Aplicações dos OAU, para além do biodiesel, segundo o projecto BioDieNet
13
13
14
15
(2007-2009)
Tabela 3-2 – Produção de Biodiesel a partir de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
Tabela 3-3 – Características do crivo para a operação de filtração
Tabela 3-4 – Dimensões do decantador
Tabela 3-5 – Dimensionamento do tanque flash
18
21
23
24
25
Tabela 3-6 – Resultados do balanço energético ao condensador
Tabela 3-7 – Dimensões do condensador
Tabela 3-8 – Estimativas do custo dos equipamentos
25
26
26
Tabela 3-9 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo
Tabela 3-10 – Custo anual de energia eléctrica
27
28
Tabela 3-11 – Custo anual de água
28
Tabela 3-12 – Custo anual de gás natural
28
Tabela 5-1 – Composição dos recipientes
57
Tabela 5-2 – Composição dos recipientes
59
Tabela 5-3 – Resultados da análise ANOVA para os primeiros testes de mortalidade
60
Tabela 5-4 – Resultados da ANOVA para as mortalidades para diferentes concentrações de
polyDADMAC e de óleo ao longo do tempo
62
Tabela 5-5 – LC50 do polyDADMAC, polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo com a
Corbicula fluminea para o período de exposição de 72 horas
62
Marta Nunes
xv
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 6-1 – Valores utilizados nos balanços mássicos para a obtenção dos produtos das
reacções
77
Tabela 6-2 – Balanço mássico ao reactor R-101
78
Tabela 6-3 – Balanço mássico ao reactor R-102
80
Tabela 6-4 – Balanço mássico ao reactor R-103
81
Tabela 6-5 – Balanço mássico ao reactor R-104
82
Tabela 6-6 – Composição da corrente 114 (destilado) e da corrente 118 (resíduo) na coluna
destilação CD-101
83
Tabela 6-7 – Balanço mássico à coluna de destilação CD-101
84
Tabela 6-8 – Balanço mássico global
85
Tabela 6-9 – Valores obtidos do balanço energético ao reactor R-101
87
Tabela 6-10 – Valores de entalpia da reacção cisão (1) e oxidação (2) (Disselkamp & Dupuis,
2001)
Tabela 6-11 - Balanço energético ao reactor R-102
Tabela 6-12 – Balanço energético ao reactor R-103
Tabela 6-13 – Balanço energético ao reactor R-104
Tabela 6-14 - Balanço energético à coluna de destilação CD-101
89
90
91
92
93
Tabela 6-15 – Balanço energético ao permutador de calor PC-101
Tabela 6-16 – Dimensionamento dos tanques de armazenamento
Tabela 6-17 – Características mecânicas do reactor R-101
Tabela 6-18 – Dimensionamento do sistema de agitação do reactor R-101
94
96
98
99
Tabela 6-19 – Dimensionamento da espessura do isolamento do reactor R-101
99
Tabela 6-20 – Características mecânicas dos reactores R-102/103/104
100
Tabela 6-21 - Dimensionamento do sistema de agitação dos reactores R-102/103/104
101
Tabela 6-22 – Dimensionamento das camisas dos reactores R-102/103/104
102
Tabela 6-23 – Dimensionamento da espessura do isolamento dos reactores R-102/103/104102
Tabela 6-24 – Características da coluna de destilação CD-101
104
Tabela 6-25 – Dimensionamento mecânico da coluna de destilação CD-101 (Coulson &
Richardson, 1988)
105
Tabela 6-26 – Dimensionamento do permutador de calor PC-101
106
Tabela 6-27 – Custo das peças de equipamentos mais relevantes
110
Tabela 6-28 – Custo anual das matérias-primas
Tabela 6-29 – Necessidade e custo anual da água
Tabela 6-30 – Necessidade e custo anual de electricidade
Tabela 6-31 – Custos de operação
Tabela 6-32 – Vendas de ácido azelaico
111
112
112
113
114
Tabela 6-33 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo
114
xvi
Valorização de Óleos Alimentares Usados
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 6-34 – Taxas aplicadas no projecto (Economia e Finanças, 2011; IG Markets, 2011)
115
Tabela 6-35 – Parâmetros obtidos para utilizar na demonstração de resultados
115
Tabela 6-36 – Mapa de demonstração de resultados
117
Marta Nunes
xvii
Valorização de Óleos Alimentares Usados
SIMBOLOGIA E ABREVIATURAS
SIMBOLOGIA E ABREVIATURAS
AGL – Ácido Gordo Livre
AGV – Ácido Gordo Volátil
AGCL – Ácido Gordo Volátil Cadeia Longa
DA – Digestão Anaeróbia
CQO – Carência Química de Oxigénio
Cx – número de carbonos
ETA – Estações de tratamento de águas
ETAR – Estação de Tratamento de Águas Residuais
FOG – Óleos, Gorduras e Sebos (Fat, Oil and Grease)
IVL – Índice Volumétrico de Lamas
ICF – Investimento de Capital Fixo
IR – Índice de Rentabilidade
LC50 - valor que corresponde à concentração letal para 50% da amostra a ser testada
OAU – óleos alimentares usados
PRI – Período de retorno do Investimento
SV – Sólidos Voláteis
SVT – Sólidos Voláteis Totais
ST – Sólidos Totais
TIR – Taxa Interna de Rentabilidade
VAL – Valor Actualizado Líquido
Marta Nunes
xix
CAPÍTULO 1
1. INTRODUÇÃO
1.1. Contexto e enquadramento
Os óleos alimentares fazem parte da categoria de produtos óleos e gorduras alimentares, e
constituem produtos de largo consumo na sociedade actual.
Os óleos alimentares usados (OAU) são constituídos essencialmente por óleos de origem
vegetal e podem resultar de diversas fontes, nomeadamente do sector doméstico, industrial e
HORECA 1 . Nos sectores doméstico e HORECA, os óleos alimentares usados são
provenientes da fritura dos alimentos e no sector industrial estão essencialmente associados à
preparação e conservação de alimentos.
O consumo de óleos alimentares gera uma grande quantidade de resíduos, estes quando não
são devidamente encaminhados para destinos adequados, provocam impactes ambientais
negativos relevantes.
Em Portugal os OAU têm como principal destino a rede de esgotos, causando problemas de
obstrução de canalizações e sistemas de drenagem de edifícios e corrosão das tubagens das
redes públicas de esgoto e colectores municipais. Provocam, ainda, problemas de
desempenho/funcionamento das ETAR (Estações de Tratamento de Águas Residuais),
aumentando a carga poluente do efluente a tratar, o consumo de energia e o número de
intervenções de manutenção e limpeza e, consequentemente, os custos operativos. Os óleos e
gorduras alimentares têm sido também colocados em aterros, o que não constitui uma boa
prática de gestão deste resíduo, segundo a Directiva 1999/31/CE de 26 de Abril (Conselho da
União Europeia, 1999). A deposição directa nos solos e no meio hídrico constitui igualmente
um problema, na medida em que coloca em risco as águas subterrâneas e superficiais e os
solos. A queima dos OAU sem tratamento adequado provoca a libertação de substâncias
tóxicas e compostos orgânicos voláteis para a atmosfera. A descarga de óleos vegetais usados
e outras gorduras no ambiente pode gerar, ainda, problemas de maus cheiros e ser prejudicial
para a fauna e flora envolventes. Assim, pode concluir-se que práticas inadequadas de gestão
destes resíduos provocam diversos problemas de poluição (Inspecção-Geral do Ambiente e do
Ordenamento do Território, 2005).
A temática dos OAU tem sido ultimamente muito debatida, apesar de serem considerados um
resíduo não perigoso, segundo a classificação da Lista Europeia de Resíduos com o LER
200125 (Portaria 209/2004 de 3 de Março).
1
O sector HORECA é o “sector de actividade relativo aos empreendimentos turísticos, ao alojamento local e aos
estabelecimentos de restauração e bebidas” (in DL 267/2009 de 29 de Setembro) e abrange, portanto, hotéis,
restaurantes e cafés, serviços de catering, cantinas e refeitórios.
Marta Nunes
1
Introdução
Aliado aos problemas ambientais provocados pela má gestão dos OAU, está o aumento do
consumo de energia pelo Homem, surgindo assim a necessidade de incentivar a utilização de
energias alternativas e a investigação da aplicação de matérias-primas renováveis das quais os
OAU poderão fazer parte. A inovação e o desenvolvimento de novos produtos surgem como
uma oportunidade de mercado e abrem, assim, um caminho para uma sociedade mais
sustentável. Em Portugal, apesar de já existirem diversas iniciativas para promover a recolha
dos OAU e o seu tratamento por empresas licenciadas, o controlo do destino destes resíduos
tem sido difícil. A gestão dos OAU entre 2006 e 2009 foi assegurada pelo Decreto-Lei n.º
178/2006, de 5 de Setembro, mas o desrespeito do referido documento obrigou a rever o
regime jurídico aplicado e, portanto, uma gestão eficaz dos OAU começa agora com a
implementação de nova legislação.
1.1.1. Regime jurídico dos OAU em Portugal
Existem directivas que asseguram um regime jurídico de gestão de OAU, responsabilizando
os diferentes intervenientes no seu ciclo de vida. Para além de defender o enorme potencial do
óleo, essa orientação permite potenciar a reciclagem a nível nacional, essencial para cumprir
com as metas de reciclagem fixadas na Directiva n.º 2008/98/CE, de 19 de Novembro.
A reciclagem de OAU para a produção de biocombustível constitui também uma importante
mais-valia para garantir os objectivos para a energia, previstos na Directiva n.º 2009/28/CE,
de 23 de Abril, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis.
Em Portugal, desde há algum tempo que a promoção destas energias foi assumida como uma
prioridade política, representando parte importante da estratégia nacional para a redução das
emissões de gases com efeito de estufa e para o cumprimento dos compromissos assumidos
nesse sentido. Ao mesmo tempo, o aproveitamento dos recursos energéticos endógenos,
afigura-se essencial para a auto-suficiência do país em termos energéticos, reduzindo a sua
dependência da importação do petróleo.
As imposições legais destacam as inúmeras vantagens que advêm da reciclagem dos OAU e
já existem projectos implementados em Portugal, até agora de carácter voluntário,
principalmente em alguns municípios que aderiram à produção de biodiesel.
A recolha e reciclagem de OAU dependem frequentemente de pequenas e médias empresas,
algumas delas dedicadas ao tratamento do OAU, bem como outras que associam também a
produção de biodiesel. Contudo, a recolha selectiva de OAU em Portugal centra-se
essencialmente nos estabelecimentos HORECA e industrial, apresentando-se ainda muito
deficiente no sector doméstico. A dinamização desta actividade é, portanto, fundamental. Um
contributo importante foi dado com o acordo entre o entretanto extinto Instituto dos Resíduos
(actualmente integrado na Agência Portuguesa do Ambiente) e representantes de alguns dos
2
Introdução
CAPÍTULO 1
principais intervenientes no ciclo de vida dos OAU em Outubro de 2005, para um sistema
voluntário de gestão deste resíduo.
A gestão dos OAU foi inicialmente regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de
Setembro, referente à gestão de resíduos em geral. Contudo, pelo seu incumprimento, e pelas
vantagens ambientais, económicas e sociais, acima referidas, surgiu a necessidade da
publicação do Decreto-Lei 267/2009 de 29 de Setembro.
O Decreto-Lei 267/2009, de 29 de Setembro, estabelece o regime jurídico da gestão de OAU
produzidos pelos sectores industrial, HORECA e doméstico, excluindo-se do âmbito da sua
aplicação os resíduos da utilização das gorduras alimentares animais e vegetais, das
margarinas e dos cremes para barrar e do azeite definidos nos termos do Decreto-Lei n.º
32/94, de 5 de Fevereiro, e do Decreto-Lei n.º 106/2005, de 29 de Junho.
Para além de criar um conjunto de normas que visam a implementação de circuitos de recolha
selectiva, o seu correcto transporte, tratamento e valorização por operadores devidamente
licenciados para o efeito, o Decreto-Lei assenta também na co-responsabilização e no
envolvimento de todos os intervenientes no ciclo de vida dos óleos alimentares,
nomeadamente os consumidores, os produtores de óleos alimentares, os operadores da
distribuição, os produtores de OAU e os operadores de gestão. O referido diploma dá um
especial destaque à recolha de OAU no sector doméstico, atribuindo um papel de relevo aos
municípios que são assim responsáveis pelo transporte e posterior valorização dos OAU
recolhidos nas redes de recolha municipais, ou a entidades a quem seja transferida essa
responsabilidade. A valorização dos OAU apenas pode ser efectuada por operadores de gestão
de resíduos licenciados. Os produtores de OAU no sector HORECA e industrial são
igualmente responsáveis pelo seu encaminhamento, ou por operadores de gestão de resíduos
devidamente licenciados ou através do respectivo município, com o qual tenham acordo. Os
operadores envolvidos no ciclo de vida dos óleos alimentares estão obrigados a reportar,
através do sistema integrado de registo da Agência Portuguesa do Ambiente (SIRAPA), as
quantidades colocadas no mercado, recolhidas e o seu encaminhamento.
É de salientar, as responsabilidades específicas atribuídas aos produtores de óleos alimentares
em matéria de sensibilização e informação, bem como de investigação e desenvolvimento, no
domínio da prevenção e da valorização de OAU. A recolha, transporte, armazenamento e
valorização dos OAU passam agora a ser controlados e o potencial dos OAU será agora
investigado.
Neste contexto, a Victor Guedes, S.A. como grande entidade nacional dedicada à embalagem
e comercialização de óleos alimentares, passa a estar obrigada a realizar acções na área da
investigação e desenvolvimento no domínio da prevenção e valorização dos OAU. Para
satisfazer a referida obrigatoriedade, pretende-se desenvolver um trabalho no âmbito do
protocolo de colaboração entre a empresa Victor Guedes, S.A. e o ISEC. Nesse sentido este
Marta Nunes
3
Introdução
trabalho centrar-se-á no estudo de metodologias de valorização de OAU que não passem pela
produção de biodiesel.
1.2. Objectivos e metodologia
O presente trabalho consiste, então, em estudar possibilidades de aplicação de OAU que
contribuam para o aumento da taxa de reciclagem nacional deste resíduo e analisar as
potencialidades de OAU baseada em ferramentas de design de produto/processo. Pretende-se
deste modo definir uma ideia de produto/especificações a obter e avaliar economicamente o
custo da alternativa tecnológica a implementar.
Face ao exposto, investigar-se-ão alternativas de valorização de óleos alimentares usados,
iniciando o trabalho com uma análise dos fluxos envolvidos, que permita estimar e avaliar a
situação actual do resíduo em Portugal. Posteriormente realizar-se-á um estudo das
alternativas tecnológicas passíveis de implementação. Dessas alternativas, escolher-se-ão as
que permitem dar um destino adequado aos OAU e as que, apesar de não permitirem valorizar
uma fracção significativa dos OAU gerados em Portugal, do ponto de visto científico,
constituem alternativas também interessantes. Ao método de valorização dos OAU
seleccionado (produção de ácido azelaico), far-se-á o projecto de uma unidade fabril que
permitirá o escoamento de todos os OAU presentemente não recolhidos a nível nacional, bem
como a análise económica simplista para avaliar a viabilidade dessa alternativa.
1.3. Organização da tese
O trabalho está dividido em sete capítulos. O segundo capítulo, refere-se à caracterização dos
óleos alimentares, indicando-se as principais diferenças entre os óleos vegetais virgens e os
usados. Apresentam-se as estimativas dos fluxos deste resíduo na Europa e mais
especificamente em Portugal, nomeadamente em termos de produção, recolha e respectivo
custo. No capítulo 3, serão descritas algumas das alternativas tecnológicas passíveis de
implementação na valorização dos OAU. Pretende-se obter uma visão global do que está a ser
feito actualmente e, das possibilidades existentes, as que se poderão destacar como
alternativas viáveis. Os capítulo 4, 5 e 6 apresentam, de forma simples, as soluções, passíveis
de serem implementadas em Portugal, que se pensa serem de maior relevância, em alternativa
à produção de biodiesel, entre as quais, a incorporação na produção de biogás por via
anaeróbia, a incorporação na produção de biocidas e na produção de ácido azelaico. É de
salientar, que o objectivo consiste em traçar linhas de orientação para estudos a um nível de
maior elaboração. De facto, enquanto a integração como co-substrato em unidades de
produção de biogás por via anaeróbia e a integração como agente adjuvante de
biocidas/pesticidas foi estudada no quadro das alternativas teóricas em que os OAU não
4
Introdução
CAPÍTULO 1
carecem de síntese, a hipótese de produção de ácido azelaico foi analisada à luz de patentes e
conhecimento disponível. Neste último caso, a perspectiva foi a de dimensionar e estimar os
custos associados a uma planta industrial capaz de valorizar OAU segundo esta via. É de
notar, no entanto, que a bibliografia nunca configura efectivamente a produção de ácido
azelaico a partir de OAU, mas sim, a partir de óleos virgens. No entanto, pensa-se que uma
unidade de pré-tratamento, aqui também projectada, permitirá aproximar as características de
ambas as matérias-primas e trazer, assim, os OAU para o domínio das possibilidades de
valorização através da produção de ácido azelaico. O capítulo 7 apresenta as conclusões finais
sobre as potencialidades dos OAU, complementadas com algumas sugestões para trabalhos
futuros.
Marta Nunes
5
CAPÍTULO 2
2. CARACTERIZAÇÃO DOS OAU
Os óleos alimentares de origem vegetal são constituídos essencialmente por uma mistura de
ésteres derivados do glicerol, designados por glicerídeos. Os tri-, di- e monoglicerídeos são
constituídos por uma molécula de glicerol à qual estão ligadas três, duas ou uma molécula de
ácidos gordos, respectivamente (Maurício, 2008).
Os triglicerídeos são os elementos que constituem a maior proporção na composição química
dos óleos alimentares vegetais. De facto, é comum os óleos conterem cerca de 95% de
triglicerídeos, e cerca de 0,1% a 2% de diglicerídeos e monoglicerídeos. Para além dos
glicerídeos, nos óleos e gorduras naturais encontram-se também pequenas fracções de
fosfolípidos, terpenóides e outros compostos (Felizardo, 2003).
Os ácidos gordos que formam os triglicerídeos dos óleos e gorduras são cadeias de átomos de
carbono ligados a átomos de hidrogénio e a um grupo carboxilo, que assume a posição final
na cadeia (ver Figura 2-1). O comprimento dos ácidos gordos é variável, sendo o seu tamanho
dependente do número de átomos de carbono que os constituem. Os ácidos que ocorrem na
natureza têm predominantemente número par de carbonos, cadeia linear, são do tipo
monocarboxílico alifático, contendo muito frequentemente 4 a 24 átomos de carbono (C4C24) (Gunstone, 1996).
Figura 2-1 – Representação de um triglicerídeo
Os ácidos gordos podem ser divididos de acordo com a sua estrutura química em ácidos
gordos saturados e insaturados. Os saturados não possuem nenhuma ligação dupla entre os
átomos de carbono. Os insaturados possuem uma ou mais, variam no número, na posição
destas na cadeia e na configuração (Gunstone, 1996). Além dos ácidos gordos ligados a
moléculas de glicerol, existem também os que não possuem qualquer tipo de ligação e que se
encontram livres, designando-se por ácidos gordos livres (AGL). Estes são responsáveis pela
acidez dos óleos e gorduras e podem ascender a 0,04 a 2,0% da sua composição. No caso de
Marta Nunes
7
Caracterização dos OAU
OAU, os ácidos gordos livres podem representar um valor superior (até 7%) (Felizardo, 2003;
Greenea, 2010).
Consoante a espécie oleaginosa, verificam-se variações na composição química do óleo
vegetal, as quais são expressas na relação molar entre os diferentes ácidos gordos (Maurício,
2008). Os óleos vegetais são normalmente classificados em função dos ácidos gordos que
neles predominam, sendo os principais óleos listados a seguir:
 grupo do ácido láurico (C12): óleos relativamente saturados com índices de iodo 2
entre 5 e 30 (ex: óleo de coco);
 grupo do ácido palmítico (C16): óleos igualmente saturados (ex: óleo de palma);
 grupo do ácido oleico (C18:1): óleos insaturados com índices de iodo entre 80 e 110
(ex: azeite, óleo de amendoim e óleo de colza);
 grupo do ácido linoleico (C18:2): óleos insaturados com índices de iodos superiores a
110 (ex: óleos de girassol, soja e algodão).
Enquanto os óleos saturados são de grande viscosidade e resistentes à oxidação, os óleos que
possuem um teor elevado de ácido linoleico tendem a ser pouco resistentes à oxidação, sendo
facilmente degradados num curto período de tempo (Inspecção-Geral do Ambiente e do
Ordenamento do Território, 2005). A composição química dos óleos é bastante importante
porque influencia as suas propriedades físicas, como a viscosidade, o ponto de fusão, a
estabilidade térmica, permitindo, assim, prever o comportamento de um dado óleo vegetal e o
futuro potencial para os diferentes processos de valorização (Rodrigues, 2006).
2.1. Óleos virgens vs óleos usados
Os óleos vegetais usados são provenientes da fritura de alimentos. Este processo altera as
propriedades originais do óleo, nomeadamente ao nível da concentração de partículas em
suspensão (restos de comida) e da alteração da composição química. O aquecimento acima
dos 180ºC dá origem a compostos polinsaturados, podendo ainda apresentar fumos, fuligens e
cinzas em suspensão quando o aquecimento é demasiado alto (acima dos 250ºC), o que
confere ao óleo uma cor escura, tornando-o prejudicial à saúde humana (Cvengros &
Cvengrosová, 2004).
O pré-tratamento dos OAU assim como a estratégia tecnológica de valorização estão
dependentes das propriedades dos OAU. Contudo essas são difíceis de prever devido ao
elevado número de variáveis envolvidas, nomeadamente, o tipo de óleo e a forma como o
mesmo é utilizado. O teor em água no óleo alimentar usado também é um factor determinante,
pelo que as condições de recolha e armazenamento são relevantes.
2
O índice de iodo é a propriedade que indica o grau de saturação do óleo e aumenta com o número de ácidos
gordos insaturados presentes.
8
Caracterização dos OAU
CAPÍTULO 2
A Tabela 2-1 resume os principais grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a
fritura, alterações resultantes das elevadas temperaturas na presença de ar e humidade.
Tabela 2-1 – Grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a fritura dos alimentos (American Oil
Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová, 2004)
Alteração
Hidrólise
Agente
Humidade
Oxidação
Ar
Alteração térmica
Temperatura
Compostos formados
Ácidos gordos, diglicerídeos
Álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres e outros
hidrocarbonetos
Compostos poliméricos
Durante o processo de fritura, os alimentos tendem a perder parte da água que contêm. Esta,
ao dissolver-se no óleo, leva à hidrólise dos triglicerídeos, com consequente decomposição
destes em ácidos gordos livres e diglicerídeos, conduzindo a um aumento de acidez
(American Oil Chemists Society, 2011). Para além disso, devido à presença de ar e à
exposição a altas temperaturas, as reacções de oxidação constituem o principal mecanismo de
modificação das características físico-químicas e organolépticas dos óleos. O oxigénio do ar
dissolvido no óleo reage, sobretudo com os ácidos gordos insaturados, levando à formação de
vários produtos da oxidação, entre os quais hidroperóxidos, que por sua vez são oxidados a
álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres e outros hidrocarbonetos. A maioria destes produtos da
oxidação permanece no óleo, aumentando a sua viscosidade. No entanto, alguns deles
originam compostos polares voláteis, que se libertam para a atmosfera. O aquecimento
prolongado do óleo induz reacções de polimerização que contribuem também para o aumento
da viscosidade dos óleos (American Oil Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová,
2004).
Apesar das diferenças apresentadas entre os óleos virgens e usados, as propriedades do óleo
usado não constituem uma barreira significativa para a valorização destes como fonte de
energia, ou como matéria-prima para produtos que não tenham como finalidade a alimentação
humana. Na maioria dos casos, operações de filtração e decantação são processos suficientes
para pré-tratar os OAU (Felizardo, 2003).
As diferenças dos óleos alimentares usados face aos virgens, devem-se essencialmente ao teor
de sólidos, água e AGL (ácidos gordos livres). Estes parâmetros revelam-se fundamentais
para a sua utilização como matéria-prima, principalmente para a produção de biodiesel, pelo
que serão discutidos pormenorizadamente na secção 3.1.
Marta Nunes
9
Caracterização dos OAU
2.2. Caracterização do fluxo actual de OAU
Para caracterizar o fluxo actual de OAU, foi efectuada uma análise dos dados existentes até ao
momento, referente à produção e consumo de óleos alimentares vegetais e produção,
consumo, recolha e utilização de OAU na Europa e mais especificamente em Portugal, que se
apresenta de seguida.
2.2.1. Produção de OAU na Europa
A Tabela 2-2 indica os dados de produção, importação, exportação e consumo de óleos
alimentares virgens na Europa.
Tabela 2-2 – Produção, importação, exportação e consumo de óleos alimentares virgens na Europa em 2007 (ton/ ano)
(FAOSTAT, 2011)
País
Áustria
Bélgica
Croácia
República Checa
França
Alemanha
Holanda
Itália
Irlanda
Suíça
Eslováquia
Espanha
Reino Unido
Hungria
Noruega
Portugal
Roménia
Produção
184542
239215
70487
202733
1253453
1423918
288366
1646990
84741
138685
68373
1222188
1081665
195748
71206
188831
284456
Importação
9230
7872
60
1368
27186
12951
29960
25769
1536
1646
72
5111
7594
93
207
6627
378
Exportação
2561
1708
26
151
9558
3919
15542
21607
84
635
14
15859
5129
7342
49
5426
3
Consumo
191211
245379
70521
203950
1271081
1432950
302784
1651152
86193
139696
68431
1211440
1084130
188499
71364
190032
284831
As estatísticas relativas aos óleos alimentares usados são escassas, uma vez que não existia,
até data recente, regulamentação a esse respeito. Contudo, com a crescente preocupação com
o impacte ambiental que o seu tratamento inadequado acarreta e com o aumento das
preocupações ao nível da segurança alimentar, surge a necessidade de controlar estes
resíduos. A Tabela 2-3 apresenta uma estimativa da produção de OAU na Europa, calculada
com base no consumo de óleos alimentares virgens. Considerou-se que a produção de OAU é
10
Caracterização dos OAU
CAPÍTULO 2
45% do consumo dos óleos alimentares virgens, assumindo que 40% destes são incorporados
nos alimentos e 15% constituem perdas (Veloso, 2007; Maurício, 2008; Rodrigues, 2006).
Tabela 2-3 – Produção de óleos alimentares usados na Europa considerando que 45% constituem resíduos (ton/ano),
para o ano de 2007
País
Áustria
Bélgica
Croácia
República Checa
França
Alemanha
Holanda
Itália
Irlanda
Suíça
Eslováquia
Espanha
Reino Unido
Hungria
Noruega
Portugal
Roménia
Produção OAU (45%)
86045
110420
31734
91777
571986
644827
136253
743018
38787
62863
30794
545148
487859
84824
32114
85515
128174
Assumindo esta estimativa de OAU gerados, pode constatar-se que Portugal tem uma
produção estimada de OAU de 85514 ton/ano. Por forma a confrontar esta estimativa com
outros dados disponíveis para esta quantificação, procuraram-se outras fontes bibliográficas,
para assim proceder à sua validação.
A Tabela 2-4 apresenta a estimativa de produção, recolha, utilização e rejeição de OAU, cujos
valores foram obtidos num projecto financiado pela União Europeia designado por BioDieNet
(BioDieNet, 2007-2009). A informação deste projecto é referente apenas aos seguintes países:
Alemanha, Espanha, Holanda, Hungria, Itália, Noruega, Portugal, Reino Unido e Roménia.
Marta Nunes
11
Caracterização dos OAU
Tabela 2-4 – Produção, recolha, utilização e rejeição de óleos alimentares usados na Europa (ton/ano) (BioDieNet,
2007-2009)
País
Produção
Alemanha
230000
Espanha
1242000
Holanda
61640
Hungria
5520
Itália
55200
Noruega
1840
Portugal
88320
Reino Unido
91080
Nota: n/d – dados não disponíveis
Recolha
Rejeição
230000
248400
61640
5060
55200
920
26312
91080
0
993600
0
460
0
920
62008
0
Utilização
para
biodiesel
207000
n/d
n/d
n/d
n/d
276
14720
18168
Na Tabela 2-4 observa-se que existem países que já fazem uma recolha significativa, ou quase
total, dos óleos usados, como por exemplo a Alemanha. É de salientar que os dados da Tabela
2-4 referentes a alguns países não são concordantes com os dados estimados (Tabela 2-3). A
discrepância demonstrada, para alguns países, deve-se essencialmente à falta de dados
registados. Outro factor que pode também contribuir para tal discrepância é a comparação de
dados de anos diferentes, os dados de consumo de óleos alimentares são do ano de 2007 e os
dados obtidos pelo projecto BioDieNet são relativos ao período compreendido entre os anos
de 2007 e 2009. Se a este facto, se juntar a hipótese de que, em vez de 45% dos óleos vegetais
consumidos virem a traduzir-se em resíduos, se hipoteticamente se considerasse uma fracção
de 80% como referido em Veloso (2007), então, por exemplo, o valor para a situação de
Espanha (ver Tabela 2-5), aproxima-se mais do valor obtido pela Tabela 2-4 (1242000
ton/ano), relativamente ao valor encontrado na Tabela 2-3 (545148 ton/ano).
No caso de Itália, Hungria e Noruega verifica-se o contrário: a produção de OAU registada é
reduzida quando comparada com o consumo de óleos alimentares, levando a concluir que os
resultados obtidos para estes países são parciais, não considerando provavelmente todas as
fontes produtores de OAU, não sendo assim possível obter um valor global.
12
Caracterização dos OAU
CAPÍTULO 2
Tabela 2-5 - Produção de óleos alimentares usados na Europa estimada considerando que 80% são resíduos (ton/ano),
para o ano 2007 (FAOSTAT, 2011)
País
Áustria
Bélgica
Croácia
República Checa
França
Alemanha
Holanda
Itália
Irlanda
Suíça
Eslováquia
Espanha
Reino Unido
Hungria
Noruega
Portugal
Roménia
Produção OAU (80%)
152969
196303
56417
163160
1016865
1146360
242227
1320922
68955
111757
54745
969152
867304
150799
57091
152026
227865
Na Tabela 2-6 apresentam-se os dados de produção e recolha dos OAU segundo (Greenea,
2010).
Tabela 2-6 - Produção de óleos alimentares usados na Europa em 2009 (Greenea, 2010)
País
Alemanha
Espanha
Holanda
Itália
Reino Unido
Áustria
Bélgica
Croácia
República Checa
França
Irlanda
Suíça
Eslováquia
Marta Nunes
Produção OAU
(ton)
185000
113750
45920
70000
225000
42900
40000
13552
28560
95000
30000
12500
15120
Recolha OAU
(ton)
148000
54600
24600
40000
100000
9000
23126
2500
12240
32000
5300
9000
6480
13
Caracterização dos OAU
Comparando a tabela anterior com a Tabela 2-4, observa-se a discrepância de valores para
alguns países, nomeadamente para Espanha e Reino Unido, em que as diferenças são mais
acentuadas. Pode verificar-se que, segundo Greenea (2010), a Alemanha, Holanda, Itália e
Reino Unido não recolhem tudo o que produzem, como anteriormente se tinha já
perspectivado.
Na Tabela 2-7 está listado o valor de produção per capita de OAU ao nível de alguns países
da Europa. Observa-se que a seguir a Espanha, Portugal é o país com maior consumo per
capita. Isto indica-nos que é realmente urgente promover a recolha de óleos alimentares
usados, visto a produção ser elevada, este resíduo tem um potencial considerável de
valorização, quer na síntese de biocombustíveis, quer de outros materiais.
Tabela 2-7 – kg de OAU per capita na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
País
Alemanha
Espanha
Holanda
Hungria
Itália
Noruega
Portugal
Reino Unido
kg OAU per capita
2,80
27,92
3,77
0,55
0,93
0,40
8,34
1,36
As diferenças encontradas ao longo da análise dos dados sugerem que os hábitos alimentares
são diferentes de país para país e que, outro factor que possivelmente influencia a coerência é
a fonte dos OAU. Por exemplo, num país a produção de OAU pode ser maioritariamente do
sector HORECA e noutro país pode provir essencialmente do sector doméstico, influenciando
assim a qualidade do óleo e, consequentemente, a quantidade de óleo alimentar considerada
resíduo. É de referir que não existem dados documentados dos OAU e, como tal, os dados
encontrados são apenas estimativas.
Contudo, como o que se pretende analisar é a situação da produção e recolha de óleos
alimentares usados em Portugal, verifica-se que o valor obtido para Portugal na Tabela 2-3
(85514 ton/ano) é semelhante à estimativa da Tabela 2-4 (88320 ton/ano). Segundo Maurício
(2008) e Rodrigues (2006), a produção de OAU em Portugal é de 88336 ton/ano, valor que
também se aproxima dos quantitativos anteriormente mencionados. Face a esta coerência nas
fontes consultadas, assume-se que os valores encontrados para Portugal, deverão ser
aproximados do valor real.
Relativamente à quantidade de OAU recolhida em Portugal (29,8%), parte destina-se à
produção de biodiesel (55,9%) e outra à de sabão (BioDieNet, 2007-2009). Contudo, algo que
14
Caracterização dos OAU
CAPÍTULO 2
é claro é que a recolha de OAU em Portugal ainda é reduzida. Espera-se que com legislação
específica (Decreto-Lei n.º 267/2009 de 29 de Setembro, 2009) se verifique uma gestão mais
assertiva deste resíduo, aumentando assim a proporção recolhida.
2.2.2. Custos de recolha / aquisição dos OAU
Na Tabela 2-8 encontram-se listados os custos de recolha/aquisição de OAU na Europa.
Tabela 2-8 – Custo da recolha/aquisição de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
País
Alemanha
Espanha
Holanda
Hungria
Itália
Noruega
Portugal
Reino Unido
Custo (€/m3)
250
240
90
0
250
140
350
320
Os dados indicam que os custos de recolha de OAU não são significativamente diferentes nos
vários países. Portugal apresenta o valor mais elevado (350 €/m3), a Holanda apresenta o
custo mais baixo (90 €/m3) e na Hungria a recolha é gratuita, o que significa que deve estar a
ser subsidiada. Verifica-se, assim, que o custo médio de recolha dos OAU na Europa é de 234
€/m3,o que constitui um valor elevado. Contudo, de acordo com o projecto BioDieNet
(BioDieNet, 2007-2009), a forma como foi calculado não é clara, podendo aos valores mais
elevados estar inerentes os custos de aquisição.
Segundo Cvengros (2004), o custo de recolha e transporte dos OAU situa-se entre os 150 a
200 €/ton. Refere ainda que o tratamento dos mesmos fica entre 25 a 50 €/ton o que dá um
custo de OAU total entre 175 e 250 €/ton. Ora, estes valores são consideravelmente inferiores
ao custo de óleo vegetal virgem. O óleo de soja, por exemplo, tem um custo de 802 €/ton
(Barrientos, 2011).
Esta análise permite concluir que existe um elevado potencial de valorização e crescimento de
OAU em Portugal. No entanto, é de salientar que a estrutura de custos será condicionada pelo
custo da recolha. De facto, apenas uma estrutura logística orientada permitirá a redução
destes. Tal organização requer potencialmente subsidiação por parte do Estado e o
desenvolvimento de plataformas de recolha e transporte ao nível das autarquias e grupos de
autarquias.
Marta Nunes
15
Caracterização dos OAU
Com a publicação do Decreto-lei 267/2009 de 29 de Setembro a recolha, transporte,
armazenamento e valorização dos OAU passam agora a ser controlados e o potencial dos
OAU será agora investigado. Esses processos de valorização serão explorados no capítulo
seguinte.
16
CAPÍTULO 3
3. ALTERANTIVAS TECNOLÓGICAS PARA VALORIZAÇÃO DE OAU
Caracterizado o fluxo de OAU em Portugal, procedeu-se à elaboração de um estudo das
alternativas possíveis de valorização dos mesmos, com o intuito de descortinar potenciais vias
tecnológicas de transformação. É relevante avaliar quais as possibilidades para o destino do
óleo alimentar usado, verificar o que é feito actualmente em Portugal e noutros países, e o que
tem sido desenvolvido nos últimos anos para dar uma nova perspectiva a este resíduo.
O aumento do custo dos produtos derivados do petróleo, aliado à crescente preocupação com
questões ambientais, impactes negativos devido à gestão deficiente de determinados resíduos,
têm suscitado o estudo pelos produtos de base biológica. Assim, o uso das commodities
agrícolas têm gerado um interesse significativo para a indústria, sendo os óleos vegetais uma
matéria-prima potencial (Salimon, et al., 2010). Como já foi referido, alguns dos ácidos
gordos constituintes dos óleos possuem ligações duplas carbono-carbono, sendo o número
dessas ligações e a sua posição características importantes do ponto vista químico. Estes
compostos tornam-se industrialmente relevantes pela oportunidade de síntese que oferecem
(Metzger & Bornscheuer, 2006).
Na Figura 3-1 encontra-se uma representação esquemática de vários tipos de ácidos gordos
constituintes dos óleos vegetais.
Figura 3-1 – Representação de alguns ácidos gordos constituintes dos óleos: (1) ácido oleico, (2) ácido linoleico, (3)
ácido linolénico, (4) ácido erúcico, (5) ácido icinoleico, (6) ácido petroselinico, (7) ácido 5-eicosenoico, (8) ácido
calendico, (9) ácido αeleosteárico, (10) ácido punicico (Metzger & Bornscheuer, 2006)
A expectativa de criar produtos a partir de matérias-primas renováveis que correspondam às
exigências do mercado, torna-se um desafio constante e espera-se que num futuro próximo a
investigação nesse sentido aumente cada vez mais. Ao longo deste trabalho listar-se-ão
Marta Nunes
17
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
potenciais produtos desenvolvidos recentemente a partir de óleo vegetal, nomeadamente de
OAU (Salimon, et al., 2010).
A possibilidade mais comum e já muito estudada (já se encontra implementada em diversos
países, incluindo Portugal) consiste na utilização dos OAU como matéria-prima para a
produção de biodiesel. Nos últimos anos a utilização de óleos vegetais para a produção de
energia tem aumentado consideravelmente, e espera-se que a sua aplicação continue a
aumentar para dar resposta à legislação que se encontra em vigor (Decreto-Lei 117/2010 de
25 de Outubro) – incorporação de 10% de biocombustíveis no sector dos transportes até 2020.
Ainda que a produção de biodiesel a partir de OAU seja uma alternativa, pretendeu-se estudar
outras soluções, que pudessem também dar utilidade aos OAU como resíduo. De seguida,
estão reunidas as várias possibilidades, encontradas na literatura, de valorização dos óleos
vegetais, que se poderão estender aos OAU com um pré-tratamento, o qual será explicado
posteriormente.
Segundo o estudo BioDieNet (2007-2009), até ao momento do projecto as aplicações dadas
aos OAU nos países em estudo, para além do biodiesel, tinham sido as apresentadas na Tabela
3-1.
Tabela 3-1 – Aplicações dos OAU, para além do biodiesel, segundo o projecto BioDieNet (2007-2009)
País
Holanda
Itália
Portugal
Espanha
Alemanha
Hungria
Noruega
Aplicações
Indústria da madeira
Recuperação de calor e produção de óleos
lubrificantes
Produção de sabão
Combustível para caldeiras
Indústria química, unidades de biogás
(recentes)
Forragem, indústria química e de
processamento de asfalto
Incineração para recuperação de calor
Para além destas possibilidades, um estudo efectuado no Reino Unido detalhou que os OAU
têm actualmente diversas aplicações (Group, 2007):
 OAU do sector doméstico e HORECA – biodiesel, oleoquímicos e incineração;
 OAU do sector industrial – ração animal.
Note-se que a listagem acima não pretende ser exaustiva, mas somente dar conta de potenciais
vias para a valorização de resíduos, que põe dificuldades adicionais em termos de tratamento.
Por outro lado, é comum aceitar-se, como acontece em Inglaterra, que a fracção mais
importante de OAU é destinada ao processamento de biodiesel.
Nesta tese, discutem-se essencialmente duas vias de transformação/valorização:
18
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
A. Uso de OAU, após tratamento de purificação, para síntese de novos produtos (ex.:
biodiesel, sabão e alguns compostos na área da oleoquímica, nomeadamente ácidos);
B. Inclusão de OAU, após tratamento de purificação, em novos produtos sem que haja
reacção (ex: uso como adjuvante em pesticidas, uso como fonte de carbono em
sistemas envolvendo bactérias metanogénicas, rações animais).
A Figura 3-2 apresenta uma representação esquemática das vias de transformação/valorização
possíveis para os OAU e os produtos associados considerados nesta fase
Síntese
Biodiesel
Sabão
Ácidos
OAU
Purificação
Rações animais
Adição
Pesticidas
Biogás
Figura 3-2 - Representação esquemática das duas vias de transformação/valorização
A produção de biodiesel é de facto a via mais usada, uma vez que o estado-da-arte referente
ao uso de OAU para este fim parece estar neste momento dominado (Zhang, et al., 2003;
Refaat, 2009; Canakci & Sanli, 2008). Apesar das potenciais aplicações que não envolvem
síntese serem bastante interessantes, perspectiva-se que consumirão apenas uma pequena
parcela do total de OAU. Contudo, tem-se a consciência de que a sua utilização requer
estudos mais detalhados com o intuito de definir vantagens/desvantagens e impactos ao nível
do ciclo de vida.
Seguidamente serão analisadas sumariamente algumas das aplicações mencionadas.
Marta Nunes
19
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
3.1. Biodiesel
Esta secção é dedicada à análise da via referente à utilização de OAU para a produção de
biodiesel. Este tema será abordado apenas para analisar o modo como esta alternativa se
encontra em Portugal e qual a relevância dos OAU como matéria-prima.
É sabido que a utilização de OAU para a produção de biodiesel é o método de valorização
mais comum, já está em prática em vários países e, por isso, é uma estratégia viável de
valorização dos OAU.
O biodiesel é definido, de acordo com a Directiva 2003/30/CE de 8 de Maio, como éster
metílico produzido a partir de óleos vegetais ou animais com qualidade para ser usado como
biocombustível em motores diesel. A sua utilização está inerentemente associada à
substituição de combustíveis fósseis, sem necessidade de modificação dos motores.
As matérias-primas para a produção de biodiesel são óleos provenientes de fontes naturais ou
renováveis, como sejam óleos vegetais (óleo de palma (dendê), soja, babaçu, amendoim,
girassol, mamona, colza, pinhão, canola, algodão, entre outros), gorduras animais (sebo de
gordura animal, óleos de peixe, banha de porco, entre outros) ou residuais (OAU).
A seguir apresentam-se alguns dados estatísticos sobre a produção de biodiesel na Europa,
quer a partir de matéria-prima virgem, quer de OAU. Na Figura 3-3 observa-se a evolução da
produção de biodiesel na Europa ao longo dos anos.
Figura 3-3 – Tendência da produção de biodiesel na Europa entre 1998 e 20113 (‘000ton) (European Biodiesel Board,
2011)
Em 2010 a produção de biodiesel na Europa registou um aumento de 5,5% em relação a 2009.
Apesar deste aumento, ocorreu um abrandamento no crescimento, uma vez que a taxa de
crescimento foi inferior a anos anteriores, nomeadamente em 2009 (17%) e 2008 (35%).
3
As barras referentes a 2011 são apenas uma estimativa
20
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
Em 2010, a Espanha foi o terceiro maior produtor de biodiesel na Europa, à frente da Itália,
que teve um ligeiro declínio na produção. A Alemanha e a França continuam a ser os
principais países produtores de biodiesel. Em Julho de 2011, a capacidade de produção
europeia de biodiesel chegou a 22 milhões de toneladas. O número de instalações de biodiesel
existentes foi de 254, ligeiramente superior em relação a 2009 devido ao arranque de algumas
novas unidades de produção. Observa-se, a partir da figura anterior, que nos últimos anos a
Europa tem investido na indústria de biocombustíveis com particular destaque para o
biodiesel. Estimava-se, ainda, que em 2011 (no primeiro semestre) a produção de biodiesel
viesse a ter uma ligeira diminuição. O aumento das importações provenientes de outros
países, como a Argentina e a Indonésia, podem ter contribuído para diminuir essa produção.
Relativamente a Portugal, segundo a European Biodiesel Board (2003), em 2009 registou-se
uma produção de 250000 toneladas.
Na Tabela 3-2 encontram-se dados de produção de biodiesel a partir de OAU na Europa. É de
salientar que se considerou para efeitos de conversão que 1kg de OAU equivale a 0,85 L de
biodiesel (BioDieNet, 2007-2009).
Tabela 3-2 – Produção de Biodiesel a partir de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009)
País
Quantidade (m3/ano)
Alemanha
216614
Espanha
169182
Holanda
n/d
Hungria
0
Itália
n/d
Noruega
260
Portugal
12512
Reino Unido
39412
Nota: n/d – dados não disponíveis
Em Portugal a percentagem de OAU utilizada para biodiesel é de 55,9%, sendo que essa
parcela representa apenas 4,4% do biodiesel produzido actualmente em Portugal. Se em
Portugal todos os OAU produzidos fossem recolhidos, 29,2% da produção de biodiesel podia
ser obtida a partir de OAU.
Face aos dados apresentados acima, verifica-se que Portugal tem revelado um bom
desempenho no que se refere à produção de biodiesel com base em OAU. Tendo por base os
valores já apresentados no Capítulo 2, uma estratégia a adoptar para melhorar a performance
consiste em aumentar a quantidade de OAU recolhido e valorizá-lo como biodiesel.
Para aumentar a produção de biodiesel a partir de OAU poderá admitir-se a inserção destes,
nomeadamente a quantidade que actualmente não está a ser recolhida, numa linha de
produção de biodiesel (a partir de óleos virgens) já existente. De forma a facilitar a
Marta Nunes
21
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
distribuição dos OAU recolhidos poder-se-ia considerar a inserção dos óleos em duas ou mais
linhas de produção de biodiesel em Portugal.
As diferenças dos óleos alimentares usados, face aos virgens, devem-se essencialmente ao
teor de sólidos, água e AGL, como foi mencionado no Capítulo 2. Estes três parâmetros
revelam-se de extrema importância para a produção de biodiesel, sendo que a água não pode
exceder o teor de 0,05% (m/m) e os AGL devem apresentar um valor de 0,5% (m/m) ou
menos, pois podem formar emulsões e tornar a separação do biodiesel mais difícil, levando à
perda de rendimento (Sanford, et al., 2009). Assim sendo, para poder juntar o OAU com óleos
virgens, é necessário fazer um pré-tratamento aos OAU. O problema decorrente do teor de
AGL, resolve-se com a diluição dos OAU em óleos virgens. Com base nos dados da literatura
referentes aos AGL (Sanford, et al., 2009), verifica-se que se a percentagem de incorporação
dos OAU nos óleos virgens não for superior a 17% para óleo de girassol e 16% para óleo de
soja, não é necessário um tratamento específico para remoção destes compostos.
O custo de produção de biodiesel a partir de OAU toma o valor de 210 €/m3 de biodiesel
(Maurício, 2008). Segundo M. Canakci (2008) o biodiesel obtido a partir de OAU tem um
custo de 420 a 570 €/m3.
Este valor indica que a margem entre o custo da matéria-prima (350 €/m3) e o custo do
produto final é reduzida, significando que os custos de operação vão definir a praticabilidade
desta alternativa. Contudo, convém referir que a produção de biodiesel tem neste momento
alguns benefícios fiscais para incentivar a sua utilização, nomeadamente na isenção do
imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP). O valor de isenção varia entre 280 € e 300 € por
cada 1000 L de biodiesel produzidos (Decreto-lei 66/2006 de 22 de Março). Por outro lado é
clara a redução ao nível do impacto ambiental dos OAU.
É de salientar ainda, que a produção de biodiesel e todas as outras alternativas referidas no
presente trabalho, requerem um pré-tratamento dos OAU.
3.1.1. Pré-tratamento dos OAU
Para verificar se a utilização de OAU numa unidade de produção de biodiesel é uma solução
viável, é necessário averiguar os custos de instalação e operação que um projecto destes
acarreta. Para tal, de acordo com as referências bibliográficas, seria necessário uma filtração
para a remoção dos sólidos e uma destilação para a remoção de água, o que segundo Refaat
(2009) é o processo mais utilizado a nível industrial para o fim em mente. Por outro lado,
outros estudos referem que uma filtração, para a remoção dos sólidos grosseiros e uma
decantação, seguida de uma unidade de destilação flash para a remoção da água são
suficientes para o fim em causa. Esta sequência de tratamentos é idêntica, contudo no presente
estudo optou-se pela última abordagem, por ser uma estratégia potencialmente mais
económica. Pensa-se ainda que pelo facto da solubilidade da água no óleo ser
22
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
consideravelmente baixa, compreendida entre 0,0071 e 0,141% (v/v), a 1 e 32ºC (Gunstone,
2002), respectivamente, a água separar-se-á praticamente toda por decantação. Contudo, para
garantir que as normas de produção do biodiesel sejam cumpridas em relação à quantidade de
água máxima admissível, realizar-se-á uma destilação flash. Esta operação é equivalente à
destilação, mas mais simples e económica, uma vez que se considera um único andar de
equilíbrio. Este estágio irá promover a evaporação da água dissolvida. Por razões que se
prendem com a redução da quantidade de vapor a usar como fonte de aquecimento, este
estágio opera em vácuo (Rei, 2007).
Para avaliar a aplicabilidade deste tratamento é essencial fazer uma análise económica,
efectuando o dimensionamento dos equipamentos necessários, para posteriormente estimar os
custos. Para tal, admitiu-se a existência de dois centros de pré-tratamento dos OAU e,
portanto, o dimensionamento dos equipamentos está efectuado para metade do valor de OAU
que não está a ser recolhido neste momento, de acordo com as estimativas apresentadas.
Na Figura 3-4 encontra-se o esquema representativo do pré-tratamento dos OAU.
Condensador
OAU
Filtração
Decantação
Água
Sólidos
Água
Destilação
flash
Óleo tratado
Valorização
Figura 3-4 – Representação esquemática do pré-tratamento do OAU
A operação de filtração tem como objectivo remover essencialmente os sólidos de maiores
dimensões, como por exemplo, restos de comida. Deste modo, pretende-se um crivo, de
malha larga, que faça essa filtração. Admitiu-se uma velocidade de filtração de 0,5 m/h, tendo
em conta que é uma filtração rápida por gravidade (Amiad Filtration Systems, 2011).
Tabela 3-3 – Características do crivo para a operação de filtração
Crivo
3
Q (m /dia)
Q (m3/h)
Dimensão da malha
Material
Área filtração (m2)
101,21
4,22
1 mm
Aço inoxidável
8,4
onde, Q é o caudal volumétrico de OAU.
Marta Nunes
23
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
A decantação é uma operação relativamente simples. Consiste na separação de líquidos com
base na diferença das suas massas volúmicas. Os decantadores são essencialmente tanques
que proporcionam um tempo de permanência suficiente para que as gotículas da fase dispersa
subam ou desçam até à interface entre as fases e coalesçam. O recipiente cilíndrico é o mais
apropriado e também o mais económico para a operação (Coulson & Richardson, 1988).
Com a decantação pretende-se separar a água do óleo e os sólidos ainda existentes, que se
depositarão no fundo do tanque por acção da gravidade (sedimentação). As características
para o projecto do decantador encontram-se na Tabela 3-4. Convém referir que se admitiu
uma quantidade de água de 3% (Greenea, 2010) em relação ao óleo e o tempo de retenção
considerado teve por base os valores referência do tratamento de águas residuais.
Tabela 3-4 – Dimensões do decantador
Decantador
Qágua (m3/h)
Qóleo (m3/h)
Qtotal (m3/h)
Qtotal (m3/dia)
Diâmetro tubo alimentação (m)
τ (horas)
Altura tanque (m)
Volume tanque (m3)
Diâmetro tanque (m)
0,127
4,090
4,217
101,208
0,040
4
4,412
16,867
2,206
onde, Qágua é o caudal volumétrico de água, Qóleo é o caudal volumétrico de óleo, Qtotal é o
caudal volumétrico de óleo com água e τ é o tempo de residência
A água que não se separou por recurso à decantação será separada por uma destilação flash.
Deste modo, considerou-se para tal efeito, um tanque pressurizado, com uma corrente de
vapor a circular numa serpentina a promover o seu aquecimento, permitindo assim a
evaporação da água. Acoplado a este tanque está um condensador, que tem o objectivo de
condensar a água evaporada no mesmo. Para o projecto do tanque teve-se em conta os
seguintes pressupostos (Wilcox, 2009):






24
O volume total do tanque é o dobro do volume da massa de líquido:
O tempo de residência no tanque é de 5 min;
Razão altura/diâmetro igual a 5;
Fornecimento de calor através de uma serpentina;
Temperatura operação: 76 ºC
Pressão operação: 0,4 bar
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
O dimensionamento do tanque encontra-se descrito na Tabela 3-5.
Tabela 3-5 – Dimensionamento do tanque flash
Material
Qágua (m3/h)
Qóleo (m3/h)
Qtotal (m3/h)
τ (min)
Vtanque (m3)
Di (m)
H (m)
etanque (mm)
De (m)
Material isolamento
eisolamento (mm)
Calor a fornecer (kW)
Qvapor (kg/h)
Tanque flash
Aço inoxidável
0,13
4,09
4,22
5
0,70
0,56
2,82
6,4
0,57
Fibra mineral com reforço metálico
5
202,36
335,10
onde, Qágua é o caudal volumétrico de água, Qóleo é o caudal volumétrico de óleo, Qtota é o
caudal volumétrico do óleo com água, τ é o tempo de residência, Vtanque é o volume do tanque, Di é
o diâmetro interno, H é a altura do tanque , etanque é a espessura do tanque, De é o diâmetro externo,
eisolamento é a espessura do isolamento e Qvapor é o caudal mássico de vapor.
Com o objectivo de condensar a água que sai do tanque flash, dimensionou-se um
condensador, como apresentado na Tabela 3-7. O dimensionamento foi efectuado a partir de
simulações efectuadas com software Aspen Engineering Suite 2006, mais especificamente o
módulo HTFS. Para dimensionar este equipamento efectuou-se um balanço energético tendose obtido os resultados apresentados na Tabela 3-6.
Tabela 3-6 – Resultados do balanço energético ao condensador
Tentrada (ºC)
Tsaída (ºC)
Caudal (kg/h)
Calor transferido (kJ/h)
Marta Nunes
Corrente quente
(vapor de água)
Corrente fria
(água)
76
76
127
20
75
1277
293484
25
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
Tabela 3-7 – Dimensões do condensador
Condensador
Diâmetro da carcaça (mm)
Comprimento dos tubos requerido (mm)
Comprimento dos tubos actual (mm)
Padrão dos tubos
Queda de pressão (carcaça) (bar)
Queda de pressão (tubos) (bar)
Espaço de chicanas (mm)
Nº chicanas
Nº passagens no tubo
Nº tubos
Diâmetro exterior do tubo (mm)
Espessura da parede do tubo (mm)
202,72
1767,7
1800
Triangular
0,02856
0,01887
135
11
1
44
19,05
1,65
É de referir que no pré-tratamento são gerados alguns resíduos. Para além do óleo filtrado sai
também uma corrente de resíduos sólidos, no caso da filtração e duas correntes de água
provenientes da decantação e do condensador. Por este facto é necessário dar um fim a estes
resíduos, sendo que no caso dos sólidos podem ser enviados para uma empresa licenciada
para o efeito e no caso da água deverá ser feito um tratamento adequado.
Depois de especificadas as características dos equipamentos necessários, estimaram-se então
os custos de instalação e operação, como se apresentam na Tabela 3-8.
O custo dos equipamentos foi estimado com base no simulador online disponibilizado pela
McGraw-Hill (McGraw-Hill, 2003). O custo do equipamento para o estágio de filtração foi
determinado considerando um filtro estático. O custo do decantador foi estimado como se
fosse um tanque e o tanque flash como um vaporizador com serpentina.
É de salientar, que no custo dos equipamentos foi considerada a existência de uma caldeira
para a produção de vapor, que é necessário para o tanque flash.
Uma vez que os valores obtidos são em dólares americanos (USD), houve a necessidade de os
converter para euros (€), utilizando a taxa de câmbio referente à média mensal de Outubro de
2011, em que 0,7296 € equivale a 1 USD ( Banco de Portugal, 2009).
Tabela 3-8 – Estimativas do custo dos equipamentos
26
Equipamento
Custo (€)
Crivo
Decantador
Tanque flash
Condensador
Caldeira
Total
165683
99736
16430
4003
9850
295702
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
Para a determinação do investimento de capital fixo (ICF) utilizou-se o método de Guthrie
(Peters & Timmerhaus, 1991). Na Tabela 3-9 encontram-se os parâmetros que permitem obter
o factor correctivo
.
Tabela 3-9 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo
Parâmetro
Materiais para a
instalação
Overheads da
construção
Instalação de
equipamentos
Transporte,
seguros e taxas
Despesas de
engenharia
contratada
0,68
0,2
0,06
0,21
0,21
Assim obteve-se o valor de 2,822 para o factor correctivo
capital fixo é de 834587 €.
. O valor do investimento de
Tendo em conta um período de amortização de 10 anos para os equipamentos, a taxa de
amortização será de 10% ao ano.
Custos de operação
Pretende-se quantificar os custos que estão directamente relacionados com o pré-tratamento
do OAU, nomeadamente o custo da matéria-prima e de recursos, como a água, electricidade e
gás natural.
Para determinar os custos de operação do processo consideraram-se as seguintes tarifas:
 Custo da água (EPAL, 2011) = 1,4141 €/m3
 Custo energia eléctrica (EDP, 2011) = 0,11 €/kWh
 Custo gás natural ( Galp Energia, 2010) = 0,034966 €/kWh
3
 Custo OAU (BioDieNet, 2007-2009) = 350 €/m
Tendo em conta o custo do OAU verifica-se que o custo anual de aquisição de matéria-prima
é de 11795000 €.
Na determinação do custo da energia eléctrica, adicionou-se uma margem de 30% sobre o
valor determinado. Esta margem foi pensada para assegurar o consumo de energia para
bombas ou outros equipamentos que possam ser necessários que neste trabalho não estão
contabilizados. A Tabela 3-10 apresenta os custos referentes à energia eléctrica consumida.
Marta Nunes
27
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
Tabela 3-10 – Custo anual de energia eléctrica
Equipamento
kW
kWh/ano
€/ano
Iluminação
Total
2
15984
1758
2285
A água utilizada circulará num circuito fechado, admitindo que um dia é suficiente para fazer
esse circuito, a necessidade anual será o equivalente à necessidade diária, adicionando uma
margem de 10% por dia para eventuais perdas.
A Tabela 3-11 apresenta os custos anuais referentes ao consumo de água.
Tabela 3-11 – Custo anual de água
Equipamento
m3/ano
€/ano
Condensador
Caldeira
1053,48
276,40
1490
391
Total
1329,89
1881
A Tabela 3-12 apresenta os custos anuais de gás natural. O gás natural será o combustível da
caldeira para a produção de vapor.
Tabela 3-12 – Custo anual de gás natural
Equipamento
ton/ano
MJ
m3
kW
€/ano
Caldeira
1490,01
3599506,58
94948,74
125,11
34961
Total custos de operação = 11862005 €/ano
Após estimar os custos dos equipamentos e de operação é possível analisar a viabilidade deste
projecto. Para tal, tem-se em conta a taxa de amortização anual do custo dos equipamentos e
os custos de operação.
Somando à taxa de amortização anual de 83458 € (durante 10 anos) os custos de operação de
11862005 €/ano, dá um total anual de 11945463 €.
Sabendo que o custo do óleo vegetal virgem ronda os 802 €/ton (custo óleo soja) (Barrientos,
2011), admitindo a mesma quantidade de óleo por ano, a matéria-prima virgem tem um custo
de 24865208 €. Este valor é superior ao custo de recolha e tratamento do OAU, verificando-se
assim que a utilização de OAU em substituição do óleo virgem é economicamente favorável.
Com a utilização de OAU é possível reduzir os custos de matéria-prima em 52%.
28
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
É de salientar ainda, que as dimensões e custos associados aos equipamentos obtidos foram
determinados tendo como base metade da quantidade de OAU que poderia ser recolhida, mas
na realidade sabe-se que por agora esse montante é difícil de obter e poderá ser viável
considerar-se, por exemplo, a existência de equipamentos de menores dimensões.
Obviamente, que unidades de tratamento mais pequenas, implicam também custos inferiores.
Em suma, a conversão dos resíduos de óleo vegetal em biodiesel é, actualmente, uma
realidade, não só por imposições comunitárias, mas porque traz vantagens do ponto de vista
ambiental e apresenta a melhor relação preço-eficácia, em termos de recolha e recuperação.
3.2. Produção de sabão
A nível nacional, uma das principais indústrias a recorrer aos óleos vegetais usados é a
indústria do sabão, utilizando o OAU como matéria-prima auxiliar. A reacção de produção de
sabão, envolve a transformação dos triglicerídeos e dos ácidos gordos livres numa mistura de
sais de ácidos carboxílicos (o sabão) e de glicerol. As reacções de saponificação dos
triglicerídeos e de saponificação dos ácidos gordos livres, são as seguintes:
Figura 3-5 – Reacções de saponificação
A produção de sabão é efectuada em duas fases. A primeira envolve a conversão dos lípidos
em ácidos gordos livres, sendo conseguida através da ebulição com uma solução aquosa de
hidróxido de sódio. Na segunda fase, adiciona-se cloreto de sódio à mistura anterior para se
conseguir fazer precipitar o sabão (sais de ácidos carboxílicos) (Rodrigues, 2006). De acordo
com as estimativas apresentadas no capítulo 2, da quantidade recolhida de OAU em Portugal
(28600 m3/ano), 12600 m3/ano (44%) destinam-se à produção industrial de sabão (BioDieNet,
2007-2009).
Marta Nunes
29
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
3.3. Oleoquímicos
Das possibilidades de valorização dos OAU por recurso a síntese, várias encontram-se no
ramo da oleoquímica. Este ramo utiliza ácidos gordos, ésteres gordos e glicerol obtidos a
partir de oleaginosas como matérias-primas ou como produtos de base, desempenhando um
papel significativo na indústria química na mudança para os produtos de base biológica,
“amigos do ambiente” (Edser, 2004).
De acordo com Metzger e Bornscheuer (2006), os óleos vegetais são hoje a mais importante
matéria-prima renovável para a indústria química. Na Figura 3-6 apresentam-se alguns desses
compostos.
Cloretos de alquil
Óleos e gorduras
Ésteres metílicos de ácidos
gordos
Álcoois gordos
Álcoois gordos etoxilados
Sulfatos de álcoois gordos
Ésteres
Glicerina
Triacetina
Ésteres (poli)glicerol
Ácidos gordos
Ésteres de ácidos gordos
Ácidos gordos conjugados
Alquil epoxiésteres
Ácidos dimeros
Ácido azelaico/pelargónico
Ácidos amino acetilados
Figura 3-6 - Processamento industrial de óleos e gorduras naturais e os seus produtos derivados (Hill, 2007)
Analisando a representação esquemática acima, a partir de óleos e gorduras é possível
produzir uma vasta gama de produtos na indústria química, alguns dos quais serão
apresentados de seguida. É de salientar que na literatura consultada, na maior parte dos casos,
esses produtos são referidos como sendo processados a partir de matéria-prima virgem.
Contudo, como no presente trabalho se analisa a sua produção a partir de OAU, admite-se que
um tratamento prévio destes óleos é suficiente para ficar com as características desejadas para
subsequente processamento, mesmo admitindo quebras de eficiência.
Conforme se referiu anteriormente, os óleos e gorduras possuem diferentes composições
consoante a sua cadeia, dependendo da fonte de óleo utilizado. Reacções diferentes levam a
uma ampla gama de ésteres de ácidos gordos, cada um possuindo diferentes tipos de unidades
estruturais. Estas unidades estruturais podem ser utilizadas para introduzir novas
30
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
funcionalidades que podem ser convertidas em oportunidades de mercado (Bozell, 2004). Em
processos industriais, através da aplicação de diferentes tecnologias, podem dar origem a
ácidos gordos livres, ésteres metílicos de ácidos gordos, glicerol e, como produtos de
hidrogenação de ésteres metílicos de ácidos gordos, álcoois gordos (Salimon, et al., 2010).
Os oleoquímicos básicos são produzidos geralmente por reacções de transesterificação,
hidrólise ou hidrogenação a partir de óleos vegetais (Metzger & Bornscheuer, 2006) e podem
ser utilizados na síntese de compostos quimicamente puros. A partir do óleo de girassol, por
exemplo, pode produzir-se o ácido oleico; do óleo soja, o ácido linoleico; do óleo de linhaça,
o ácido linolénico; das sementes de colza, o ácido erúcico e do óleo de ricínio, o ácido
ricinoleico (Meier, et al., 2007).
Relativamente à produção de oleoquímicos, os diácidos são compostos importantes para a
produção de poliésteres e poliamidas. Diácidos, como o ácido azelaico (C9) e o ácido
brassílico (C13) podem ser produzidos a partir do ácido oleico e do ácido erúcico,
respectivamente, por ozonólise, originando o ácido nanaóico como sub-produto. O ácido
adípico e o ácido láurico podem ser obtidos a partir do ácido petroselínico. Os dímeros ácidos
C36 são também um grupo importante, utilizados principalmente para a produção de
poliamidas. O seu monómero é designado comercialmente por ácido isoesteárico e é usado
em cosméticos pela boa espalhabilidade, solubilidade e emoliência e também na indústria dos
lubrificantes por causa de baixa viscosidade, boa estabilidade oxidativa e hidrolítica e boa
solubilidade em vários solventes (Metzger & Bornscheuer, 2006).
Na indústria, epóxidos de óleo vegetal são actualmente utilizados principalmente como
estabilizadores de PVC. A preparação de polióis de epóxidos de ácidos gordos e óleos
vegetais para uso de poliuretano foi tema de muitos estudos. Eventualmente, polieteres-polióis
epoxidados derivados de compostos gordos podem substituir os compostos petroquímicos em
várias aplicações. Oleato de metilo foi epoxidado e ainda modificado com ácido acrílico para
formar um adesivo sensível à pressão (por exemplo o Post-It) (Bozell, 2004).
A conversão microbiana de ácidos gordos é também de grande interesse. A Cognis 4
desenvolveu uma linhagem de Candida tropicalis através da engenharia metabólica para
oxidar um grupo metil terminal de uma cadeia para depois obter o diácido C18 (Hill, 2007;
Metzger & Bornscheuer, 2006).
Uma ampla variedade de enzimas podem ser utilizadas para a conversão de gorduras e óleos e
a sua aplicação na modificação de lípidos está bem documentada na literatura. Os
biocatalisadores mais usados são lípases para os quais gorduras e óleos são os seus substratos
naturais. As lípases foram utilizadas em escala industrial para produzir ésteres simples com
aplicações em cosméticos, por exemplo (Metzger & Bornscheuer, 2006).
4
Conceituada empresa de oleoquímicos
Marta Nunes
31
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
Dentro dos produtos oleoquímicos, alguns dos quais já listados, vários grupos de produtos
podem ser destacados: oleoquímicos para aplicação em polímeros, lubrificantes, cosméticos,
surfactantes, emolientes e pesticidas são alguns deles. Os óleos vegetais têm também sido
utilizados há muito tempo na constituição de tintas e como materiais de revestimento (Meier,
et al., 2007).
A utilização de óleos vegetais mais especificamente OAU para aplicações em polímeros,
surfactantes, lubrificantes e pesticidas serão de seguida abordadas.
3.3.1. Polímeros
Oleoquímicos como matéria-prima para a produção de materiais poliméricos representam um
pequeno mercado, mas bem estabelecido. O óleo de linhaça, é usado para produzir linóleo.
Outro exemplo é o óleo de soja epoxidado (ESO), que é utilizado em plásticos e como
aditivos para revestimentos, tendo um mercado relativamente estável. Os ácidos
dicarboxílicos são produzidos industrialmente pela ozonólise do ácido oleico a ácido azelaico
(um dos poucos exemplos de utilização à escala industrial da ozonólise) ou por dimerização
do ácido linoleico e ácido oleico para obter misturas complexas de alto peso molecular
(Salimon, et al., 2010).
3.3.2. Surfactantes
Os surfactantes ou tensioactivos são compostos orgânicos, constituídos por moléculas
anfipáticas, tendo uma parte polar (cabeça) e outra apolar (cauda), com propriedades de
actividade superficial, resultado da adsorção destes compostos na superfície de líquidos ou na
interface entre dois líquidos imiscíveis.
Os surfactantes são utilizados em diferentes áreas. Os campos com maior importância, são
sem dúvida o da limpeza (por exemplo detergentes), do tratamento de têxteis e cosméticos.
Também são usados no sector alimentar, na protecção das culturas, na produção de tintas,
revestimentos e adesivos. Apesar de muitos surfactantes existentes continuarem a ser de base
química, existe uma tendência contínua para que estes sejam substituídos por surfactantes
com base em recursos renováveis. (Salimon, et al., 2010). Alguns destes surfactantes têm o
benefício adicional de tanto a parte hidrofílica como a parte hidrofóbica poderem ser de base
biológica, como um açúcar e um ácido gordo, respectivamente. O glicerol, sub-produto da
produção de biodiesel quando se utilizam processos catalisados por bases, é outra fonte de
baixo custo para o processamento de surfactantes de base biológica, designados por
poliglicéridos, estes compostos já demonstraram ser bons hidrófobos.
32
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
Actualmente, os surfactantes constituem um dos grupos mais importantes de oleoquímicos,
sendo a mais recente inovação, a produção de alquil poliglicosídeos pela catálise ácida da
reacção do álcool láurico com glucose (Metzger & Bornscheuer, 2006).
3.3.3. Pesticidas
Os pesticidas, fazendo parte do conjunto de tecnologias associadas à modernização da
agricultura, são depositados sobre a superfície de partes vegetais, como ramos, folhas e frutos.
Alguns devem permanecer sobre essas superfícies; outros devem ser absorvidos, para
exercerem o seu efeito no interior dos tecidos vegetais.
A superfície das plantas apresenta uma barreira para a penetração de líquidos, denominada
cutícula, cujas características variam de espécie para espécie e dependem da idade dos órgãos
vegetais e das condições climáticas. Para que os pesticidas consigam vencer as cutículas, são
utilizadas substâncias inertes, denominadas aditivos ou adjuvantes, capazes de modificar a
actividade dos produtos aplicados e as características da pulverização. Estes produtos podem
ser adicionados aos pesticidas pelas empresas fabricantes ou podem ser adicionados à calda
no momento da pulverização (Queiroz, et al., 2008).
As formulações de pesticidas incluem dois componentes principais: os compostos activos e os
inertes. Os primeiros são responsáveis por destruir, prevenir ou repelir insectos, fungos, ervas
daninhas, roedores ou outras pragas. Os compostos inertes não têm nenhuma acção pesticida.
Existem vários tipos de compostos inertes normalmente encontrados na formulação de
pesticidas, como por exemplo emulsionantes, solventes orgânicos, agentes dispersantes e
agentes humectantes.
Tendo sido feita uma pesquisa no sentido de incorporar os OAU na produção de pesticidas,
verificou-se que óleos vegetais são já adicionados a alguns pesticidas (herbicidas, fungicidas e
insecticidas) como adjuvantes e/ou solventes. As fracções adicionadas são reduzidas, mas o
uso de OAU permitirá a substituição dos óleos virgens e a valorização deste resíduo.
Os adjuvantes são substâncias que aumentam a eficiência ou modificam determinadas
propriedades da solução, visando facilitar a aplicação ou minimizar possíveis problemas
(Queiroz, et al., 2008). Os óleos vão reduzir a tensão superficial das gotas pulverizadas sobre
a planta, aumentando a área de contacto. A sua utilização vai aumentar a facilidade de
penetração do produto na cutícula da planta e, consequentemente, poderá diminuir a dose
necessária dos compostos químicos activos.
Estudos demonstram que alguns óleos vegetais (soja, algodão, linho, amendoim e girassol)
aderem melhor às folhas de plantas ou insectos, mesmo depois de chuvas fortes por causa da
sua natureza polinsaturada, aumentando assim a eficácia dos princípios activos, permitindo
reduzir as quantidades de ingredientes activos perdidos para o ambiente e, consequentemente
Marta Nunes
33
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
os custos. Ésteres metílicos de óleos vegetais são referidos também como bons solventes para
pesticidas (Salimon, et al., 2010).
É de salientar que os dados existentes na literatura para este tipo de aplicação são relativos aos
óleos vegetais, não havendo referência à utilização de óleos alimentares usados. Contudo,
como não são mencionadas especificações do óleo a utilizar, assume-se que fazendo um prétratamento aos OAU para remoção dos sólidos (discutido na secção 3.1.1), estes também
podem ser utilizados na formulação dos pesticidas.
Segundo a patente US 2010/0173782 A1 a quantidade de óleos que se incorpora nos
pesticidas é baixa, entre 0,05% e 0,5%, o que significa que esta alternativa teria apenas
potencial para integrar uma pequena fracção do OAU recolhido (Bohus, et al., 2010).
Sabendo que o consumo de herbicidas, insecticidas, fungicidas e bactericidas em Portugal se
estima em 14000 ton/ano ( Instituto Nacional de Estatística, 2011) verifica-se que se utilizaria
apenas cerca de 0,07% do OAU que pode vir a ser recolhido por ano. É de salientar que este
valor se encontra em excesso visto o consumo de pesticidas em Portugal ser superior à
produção, pois Portugal não exporta este tipo de produtos.
Conclui-se que a utilização dos OAU para a produção de pesticidas é uma alternativa mas não
resolve o problema dos OAU como resíduo.
Apesar da incorporação dos óleos em pesticidas não ser suficiente para o escoar, no presente
trabalho analisar-se-á esta via. De facto, é analisada a integração de OAU como adjuvante em
ensaios de teste de performance de um agente biocida (pesticida não agrícola). A perspectiva
aqui explorada (no Capítulo 5) é a de mais tarde vir igualmente a analisar a probabilidade de
incrementar gamas mais elevadas de OAU.
3.3.4. Lubrificantes
Tem havido uma constante procura dos chamados lubrificantes ''verdes'', isto é, lubrificantes
obtidos a partir de matérias-primas renováveis. O mercado nacional de lubrificantes de
automóveis é significativo, com um consumo entre 23 a 25 milhões de litros por ano. Os óleos
vegetais apenas fornecem uma fracção desse mercado. Os óleos vegetais apresentam boa
lubricidade, bom poder anti-corrosão e possuem a capacidade de não evaporarem a altas
temperaturas em aplicações industriais. A sua volatilidade é baixa, devido ao alto peso
molecular dos triglicerídeos e têm uma estreita faixa de variação da viscosidade com a
temperatura. No entanto, o seu uso ainda é restrito, devido à baixa estabilidade termooxidativa e ao seu comportamento quando sujeitos a baixas temperaturas, pois tendem a
formar estruturas macrocristalinas, limitando assim o seu uso. Existem várias maneiras para
minimizar a oxidação e o impacto ao nível do comportamento a baixas temperaturas. Estes
incluem a modificação pela utilização de calor, transformações químicas, mudanças genéticas
ou a utilização de aditivos.
34
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
CAPÍTULO 3
Relativamente às modificações genéticas, já foram produzidos óleos com semelhante ou
melhor estabilidade oxidativa em comparação com os lubrificantes de base petroquímica
(Hill, 2007; Salimon, et al., 2010).
De referir, que no caso dos lubrificantes, já existem referências na literatura quanto à
utilização de OAU para a sua produção (BioDieNet, 2007-2009; Salimon, et al., 2010).
Entre os produtos que potencialmente poderão ser processados integrando OAU listam-se o
ácido azelaico (ozonólise), o ácido dicarboxílico C18 (bio-oxidação), dímeros de ácidos
gordos (dimerização), polióis (epoxidação), entre outros (Hill, 2007). Esta utilização abre
claramente um vasto campo de oportunidades para gerar um produto de elevado potencial de
crescimento, à custa da valorização de OAU. Esta via será particularmente analisada com a
instalação de uma unidade industrial para a produção de ácido azelaico (Capítulo 6).
3.4. Ração animal
Em Portugal, a utilização de OAU como componente da ração animal poderá constituir um
processo de valorização do resíduo. Para que esta alternativa tecnológica se torne viável, seria
necessário implementar em Portugal pelo menos dois sistemas de recolha de OAU distintos:
um sistema que incluísse o sector doméstico e HORECA e outro para o sector industrial, tal
como acontece, por exemplo, no Reino Unido. Esta necessidade de sistemas de recolha
diferenciados, deve-se essencialmente à diferença dos óleos em questão. Os OAU
provenientes do sector doméstico ou HORECA têm geralmente menor qualidade, uma vez
que possuem maior quantidade de resíduos associados e podem conter uma mistura de vários
tipos de gorduras, nomeadamente gordura animal (principalmente no sector doméstico). Se
isto acontecer, a integração de OAU na cadeia alimentar não pode ser levada a cabo por
imposição legal decorrente da Decisão da Comissão, nos termos do Regulamento (CE) n.º
1774/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, no que respeita à utilização de óleos
alimentares usados nos alimentos para animais (Comissão das Comunidades Europeias,
2003). O tipo/qualidade de óleo recolhido é bastante difícil de controlar, geralmente os óleos
dos sectores domésticos e HORECA apresentam características muito variadas, sendo mais
fácil o controlo dos óleos no sector industrial, justificando assim a necessidade de dois
sistemas de recolha de OAU. É de salientar, que mesmo a glicerina produzida como produto
secundário da produção de biodiesel, não é passível de ser integrada em rações animais,
quando a ausência de gorduras animais não estiver assegurada e garantida.
É de referir ainda, que esta utilização é controversa, havendo mesmo alguns países europeus
nos quais a utilização de OAU (mesmo de origem vegetal) para rações animais, já foi
proibida. Em questão está, se a qualidade destes óleos constituirá ou não uma ameaça à saúde
Marta Nunes
35
Alternativas tecnológicas para valorização de OAU
dos animais e também a possibilidade dos OAU entrarem novamente na cadeia alimentar
através dos animais (Cvengros & Cvengrosová, 2004).
3.5. Digestão anaeróbia
A digestão anaeróbia de resíduos possibilita o tratamento de resíduos orgânicos e a produção
simultânea de energia, sendo um processo já estabelecido em Portugal. Muitos estudos têm
sido efectuados nos últimos tempos para melhorar o desempenho dos digestores anaeróbios.
Uma dessas possibilidades é a integração de óleos/gorduras como co-substrato na digestão
anaeróbia de resíduos orgânicos. Se esta via for viável à escala real, poderá trazer um aumento
significativo na produção de biogás, através da valorização de um resíduo que até agora não
possuía um destino adequado. A viabilidade desta aplicação será explorada no Capitulo 4.
Em suma, os óleos e as gorduras apresentam-se actualmente como um potencial recurso para
as mais diversificadas indústrias. Uma grande variedade de produtos à base de gorduras e
óleos têm sido desenvolvidos para diferentes usos. Para além da utilização dos óleos vegetais
na alimentação e ultimamente no biodiesel, estão ainda presentes nos mais diversificados
produtos, como plásticos, produtos farmacêuticos, tintas, adesivos, surfactantes, entre outros.
36
CAPÍTULO 4
4. BIOGÁS - USO DE OAU COMO CO-SUBTRATO NA DIGESTÃO
ANAERÓBIA
Actualmente existe um interesse crescente em fontes alternativas de energia como resultado
do aumento da procura de energia, do aumento do custo dos combustíveis disponíveis e da
necessidade de valorizar bioresíduos em alternativa à sua deposição em aterros. Todos estes
factos têm contribuído para aumentar os estudos nesta área, nomeadamente ao nível da
biodegradabilidade de potenciais substratos, uma vez que alguns efluentes quando tratados
adequadamente poderão gerar novas fontes de energia. A presença de componentes
biodegradáveis no efluente, juntamente com as vantagens do processo anaeróbio sobre outros
métodos de tratamento, como a produção de energia e a menor produção de biomassa, por
exemplo, torna a digestão anaeróbia (DA) uma opção adequada para o tratamento de efluentes
líquidos com elevada carga orgânica (Rajeshwari, et al., 2000; Neves, 2009).
Em Portugal a tecnologia de digestão anaeróbia de efluentes e/ou resíduos ainda é pouco
utilizada, ao contrário do que se passa em alguns países europeus. No entanto, a legislação
europeia actual, Directiva 2009/28/CE relativa à promoção da utilização de energia
proveniente de fontes renováveis, reconhece o seu potencial, prevendo a sua implementação
tanto na gestão integrada de resíduos, como na produção de energia. Segundo o Plano
Nacional de Reformas – Portugal 2020, em 2020 pretende-se atingir os 150 MW por esta via.
O elevado volume de resíduos biodegradáveis agro-industriais, agro-pecuários e alimentares
produzidos, torna esses substratos interessantes para a produção de biogás e, assim, torna-os
instrumentos relevantes na concretização desse objectivo (Neves, 2009).
A co-digestão de resíduos orgânicos tem surgido como uma área interessante de investigação,
sendo citada como uma alternativa à digestão anaeróbia convencional. As vantagens
principais são o aumento da produção de biogás e também a valorização de determinados cosubstratos. A co-digestão permite uma melhoria na relação de nutrientes na mistura de
substratos e também uma melhoria na capacidade tampão do sistema, tornando o processo de
tratamento de resíduos e de produção de biogás mais eficientes (Zhu, et al., 2011).
Estudos recentes demonstraram que a produção de biogás aumenta quando são adicionados
pulsos de óleo a diferentes substratos (resíduos orgânicos). Portanto, alterações no substrato,
como o aumento da base lipídica em determinados intervalos de tempo, podem trazer
benefícios na performance dos co-digestores anaeróbios (Kabouris & Tezel, 2009; Neves,
2009; Wan, et al., 2011). Deste modo a co-digestão de substratos orgânicos poderá ser uma
alternativa a dar ao óleo alimentar usado. Nas secções seguintes será abordado o processo de
digestão anaeróbia e da co-digestão de substratos orgânicos.
Marta Nunes
37
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
4.1. Processo de digestão anaeróbia
A digestão anaeróbia é um processo mediado por uma comunidade complexa de
microrganismos, que promovem a decomposição e degradação da matéria orgânica em
compostos químicos mais simples e nutrientes dissolvidos, na ausência de oxigénio,
permitindo assim, a estabilização bioquímica de resíduos orgânicos. O processo de DA
consiste, então, na degradação da matéria orgânica com formação de um gás constituído por
dióxido de carbono (CO2), amónia (NH3), sulfureto de hidrogénio (H2S) e metano (CH4),
geralmente, designado como biogás. Este é uma fonte de energia renovável, podendo ser
utilizado na produção de electricidade ou como combustível em veículos de transporte. Os
compostos orgânicos resultantes do processo de digestão anaeróbia são normalmente
utilizados para fins agrícolas (Neves, 2009; Silveira, 2009).
Na maioria dos processos de digestão anaeróbia, o dióxido de carbono e o metano constituem
mais de 99% do total de gás produzido. A composição do biogás varia de acordo com as
características do resíduo e as condições de funcionamento do processo de digestão. Em
média, é composto por 60% (55 – 70%) de metano (CH4) e 40% (30 – 45%) de dióxido de
carbono (CO2) e quantidades vestigiais de outros gases (Silvério, 2011; Deublein &
Steinhauser, 2008).
O bom funcionamento do processo está dependente da acção cooperativa, sequencial e muitas
vezes sintrófica de diferentes grupos tróficos de bactérias (Silveira, 2009).
A digestão anaeróbia é um método adequado para o tratamento de resíduos de explorações
agro-pecuárias, indústrias agro-alimentares, estações de tratamento de águas residuais e em
sistemas de gestão de resíduos sólidos (Silvério, 2011).
4.1.1. Vantagens e desvantagens da DA
Os processos de tratamento por via anaeróbia apresentam vantagens significativas
relativamente aos processos convencionais aeróbios, das quais se destacam (Silveira, 2009;
Ward, et al., 2008; Neves, 2009):
 Menor produção de biomassa (cerca de 5 vezes menor comparativamente ao processo
aeróbio);
 Menor necessidade em nutrientes;
 Remoção mais eficaz de microrganismos patogénicos;
 Redução de odores;
 Capacidade da biomassa aguentar longos períodos sem alimentação;
 Utilização das lamas produzidas como fertilizante agrícola;
 Capacidade de suportar efluentes com grande carga orgânica;
38
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
Nos processos aeróbios, além de não se obter nenhum produto com valor económico, há um
consumo energético associado ao fornecimento de oxigénio necessário. Por cada 100 kg de
matéria orgânica degradada, expressa em CQO, consomem-se 100 kWh por via aeróbia,
enquanto por via anaeróbia são produzidos 285 kWh (Neves, 2002).
As principais desvantagens do processo anaeróbio são a velocidade lenta do processo
comparativamente ao processo aeróbio, a elevada sensibilidade a substâncias tóxicas, o
arranque lento do processo e a necessidade de se proceder a um tratamento final subsequente
de modo a satisfazer os requisitos para descarga no meio receptor (Silveira, 2009). Podem
também surgir alguns problemas, nomeadamente baixo rendimento em CH4 (Neves, 2009) e o
washout da biomassa e, consequentemente, a instabilidade do processo (Rajeshwari, et al.,
2000). O washout da biomassa pode ser resolvido pelo uso de membranas acopladas ao
digestor para a retenção da biomassa. Estes factores contribuem para que esta tecnologia
ainda não seja amplamente utilizada (Rajeshwari, et al., 2000).
4.1.2. Etapas principais da DA
Resumidamente, o processo de digestão anaeróbia pode ser dividido em quatro etapas
principais, como se apresenta de seguida (ver Figura 4-1).
Figura 4-1 – Representação esquemática das fases do processo de digestão anaeróbia, adaptado de (Gray, 2004)
Marta Nunes
39
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
Hidrólise
Os substratos, como hidratos de carbono, proteínas e lípidos não podem ser utilizados
directamente pelos microrganismos anaeróbios, tornando-se necessário a sua conversão em
moléculas mais simples. Este processo ocorre durante a etapa de hidrólise, em que compostos
complexos são hidrolisados nas suas unidades básicas. Os produtos da degradação enzimática
dos hidratos de carbono, proteínas e lípidos são monossacarídeos, aminoácidos e ácidos
gordos de cadeia longa (AGCL) e glicerol, respectivamente (Gray, 2004).
A hidrólise de polímeros orgânicos é levada a cabo por enzimas extracelulares, as hidrolases,
que são excretadas pelas bactérias fermentativas. Em paralelo actuam também as celulases,
proteases e lípases no processo de degradação da matéria orgânica (Neves, 2009). As
moléculas mais pequenas, atravessam as membranas celulares, podendo ser utilizadas pelas
bactérias fermentativas durante o processo subsequente de acidogénese. Dentro da célula,
estas moléculas constituem uma fonte de energia e de material orgânico para a síntese de
componentes celulares (Silveira, 2009; Gray, 2004).
O bom funcionamento do processo de hidrólise está dependente do contacto eficiente entre a
biomassa e o substrato.
A velocidade do processo de hidrólise depende fundamentalmente do comprimento das
cadeias dos ácidos gordos voláteis (AGV), do estado do substrato (sólido ou líquido) e da área
superficial específica, no caso dos lípidos. No caso das proteínas, depende essencialmente da
sua composição (globular ou fibrosa), área superficial e solubilidade. A presença de
concentrações elevadas de amónia no líquido em digestão pode inibir o processo de hidrólise,
uma vez que provocam uma redução da produção enzimática (Silveira, 2009). As reacções
levadas a cabo pelos microrganismos são fortemente dependentes das condições
experimentais, nomeadamente de temperatura, pH, tamanho das partículas, agitação e razão
inóculo/substrato (Neves, 2009).
A hidrólise normalmente é a fase limitante da velocidade do processo anaeróbio quando o
substrato em digestão é constituído por um teor elevado de sólidos e partículas como os
efluentes de suínos, bovinos e lamas domésticas. Quando são utilizados substratos de
composição simples e facilmente biodegradáveis, a metanogénese ou a acetogénese são
geralmente o passo limitante do processo anaeróbio (Silveira, 2009).
Acidogénese
Durante a acidogénese, ou fermentação ácida, os produtos resultantes da fase de hidrólise são
degradados pelas bactérias fermentativas, constituídas por uma série de estirpes bacterianas
anaeróbias estritas e facultativas. Estas bactérias possuem um metabolismo variado,
apresentando diferentes vias de conversão, dando origem a diversos produtos. Durante uma
operação estável, os principais produtos da acidogénese são AGV, como o acetato, propionato
40
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
e butirato, CO2, H2 e outros produtos orgânicos, tais como, lactato e álcoois. O acetato, CO 2 e
H2 e os compostos monocarbonados podem ser directamente utilizados na fase metanogénica
(Neves, 2009; Silveira, 2009).
Os níveis de AGV e H2 são uma importante fonte de informação no que se refere ao equilíbrio
do processo. A acumulação de AGV no digestor baixa o pH do meio, podendo originar a
supressão da actividade metanogénica e consequentemente a falha do processo (Deublein &
Steinhauser, 2008).
A conversão dos produtos da hidrólise dá-se no interior das células bacterianas. O
desenvolvimento da acidogénese é mais rápido e menos sensível a variações de pH do que a
acetogénese e a metanogénese (Neves, 2009).
A quantidade e o tipo de produtos obtidos na acidogénese dependem fundamentalmente da
pressão parcial de H2 no digestor, que está associada a actividade de bactérias utilizadores de
hidrogénio, como por exemplo algumas espécies de bactérias metanogénicas e redutoras de
sulfatos. Quanto maior for a pressão parcial do hidrogénio, menor o número de compostos
reduzidos formados, como o acetato (Deublein & Steinhauser, 2008).
Geralmente a população fermentativa representa cerca de 90% do total da população
microbiana presente nos digestores (Silveira, 2009).
Em geral, as bactérias envolvidas nesta etapa têm um tempo de duplicação curto e, portanto a
acidogénese não é considerada como um passo limitante no processo de digestão (Costa,
2008).
Acetogénese
A acetogénese é etapa seguinte, na qual ocorre a conversão dos produtos da acidogénese em
compostos que formam os substratos para a produção de metano: acetato, hidrogénio e
dióxido de carbono.
Na acetogénese, as bactérias acetogénicas procedem à degradação dos compostos formados
durante a fase anterior (acidogénese), como AGV (propionato, butirato, valerato), álcoois,
alguns aminoácidos e compostos aromáticos. Os produtos resultantes da degradação destes
compostos são H2, formato, CO2 e acetato, que vão servir de substrato para as bactérias
metanogénicas. O acetato e o propionato são os produtos intermediários que se encontram
usualmente em maior quantidade nos digestores anaeróbios. A degradação deste último é
muitas vezes o passo limitante da velocidade da digestão anaeróbia, sendo oxidado em
acetato, bicarbonato, H2 ou formato (Silveira, 2009).
Dependendo do estado de oxidação do material orgânico a ser digerido, a formação de ácido
acético pode ser acompanhada pelo desenvolvimento de dióxido de carbono ou hidrogénio
(Gray, 2004).
Marta Nunes
41
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
A formação de acetato pela oxidação dos ácidos gordos de cadeia longa (por exemplo, ácido
propiónico ou butírico) é termodinamicamente possível apenas quando a pressão parcial do
H2 é muito baixa. Contudo, as bactérias metanogénicas crescem mais facilmente quando o H 2
se encontra em maiores quantidades. Nesta fase uma relação sintrófica entre os diferentes
microrganismos é necessária para que as reacções ocorram, estando, portanto, a quantidade e
a composição do biogás, dependente da actividade das bactérias acetogénicas (Deublein &
Steinhauser, 2008).
Metanogénese
A metanogénese é a etapa final, quando ocorre a produção de CH4. Este processo é efectuado
pelas Arquea metanogénicas (microrganismos anaeróbios estritos), que metabolizam os
produtos finais das reacções anteriores, principalmente o H2, CO2, e acetato para produzir
CH4. Outros compostos, como formato, metanol e metilaminas, também podem ser utilizados
pelas Arquea metanogénicas para a produção de metano (Neves, 2009).
As bactérias metanogénicas constituem um grupo diverso de microrganismos que obtém
energia para o crescimento a partir de reacções que conduzem à produção de metano. Estão
dependentes do bom funcionamento de todas as fases anteriores que proporcionam a
disponibilidade dos substratos adequados para a sua actividade (Silveira, 2009). As Arquea
metanogénicas são extremamente sensíveis à temperatura, taxa de carga orgânica, bem como
flutuações de pH e são inibidas por vários compostos.
As bactérias metanogénicas podem efectuar as suas funções essenciais no processo anaeróbio
por duas vias (Neves, 2009). A primeira, designada por metanogénese acetotrófica, consiste
na produção de CH4 e CO2 a partir da degradação do acetato, sendo as bactérias envolvidas
nos processos designadas por metanogénicas acetoclásticas ou acetotróficas. Os géneros
predominantes são: Methanosarcina e Methanosaeta (Gray, 2004). A metanogénese
acetotrófica é responsável pela produção de cerca de 70% do metano gerado e é dada pela
equação seguinte (Deublein & Steinhauser, 2008):
(4-1)
A segunda via corresponde à produção de metano a partir da utilização do CO2 como fonte de
carbono e o hidrogénio como fonte de energia. As bactérias que a levam a cabo são
designadas por hidrogenotróficas. Controlam o potencial redox do meio, mantendo a
concentração de hidrogénio em níveis baixos. Os géneros predominantes são
Methanobacterium, Methanospirillum e Mathanobrevibacter (Gray, 2004). A metanogénese
hidrogenotrófica é dada pela seguinte equação (Deublein & Steinhauser, 2008):
(4-2)
42
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
As espécies metanogénicas são mais sensíveis a uma diminuição de pH do que as espécies
produtoras de ácido, o que pode provocar uma acumulação maior de ácidos e eventualmente
levar à falha do processo. A produção de metano está directamente relacionada com a
diminuição da carência química de oxigénio (CQO) dos efluentes. Assim, o rendimento de
CH4 pode ser avaliado a partir do balanço da CQO no sistema, com base na CQO removida.
Em condições normais, a produção de metano teórica é cerca de 0,35 m3/kg CQO degradada
(Gray, 2004; Neves, 2009).
Em suma, para uma produção de CH4 eficiente é importante ter um equilíbrio entre as taxas
das reacções das diferentes etapas envolvidas na digestão anaeróbia da matéria orgânica.
Como se pode verificar, há uma grande dependência entre os diferentes grupos de
microrganismos, pelo facto dos produtos de uma fase constituírem o substrato para os
microrganismos da fase seguinte (Neves, 2009).
4.1.3. Condições operatórias
Em todos os processos de tratamento biológicos de águas residuais, a remoção eficaz de
poluentes e contaminantes depende, não só do potencial metabólico dos microrganismos, mas
também da existência de condições ambientais adequadas que permitam a sua actividade. De
seguida apresentam-se os parâmetros operatórios principais num processo de digestão
anaeróbia.
Temperatura
A temperatura de operação assume uma grande influência na eficiência do processo. Afecta a
actividade metabólica dos microrganismos e consequentemente a velocidade de digestão e a
produção de CH4.
Relativamente à actividade microbiana são consideradas três gamas de temperatura: psicrófila
(<20°C), mesófila (20–45°C) e termófila (>45°C). As bactérias metanogénicas apresentam
um crescimento máximo na gama mesófila, a 35°C e na gama termófila a 55°C (Neves,
2009).
Num processo de DA não existe uma temperatura ideal. A escolha da temperatura de
operação óptima depende de factores económicos e operacionais, sendo no entanto a maior
parte dos processos realizados a temperaturas mesófilas.
Os microrganismos que operam na gama de temperatura mesófila são mais resistentes,
toleram mudanças maiores nos parâmetros ambientais do que os termófilos. A operação de
DA na gama mesófila é considerada como sendo um processo mais estável, uma vez que as
bactérias termófilas são mais sensíveis a compostos tóxicos, como AGV e amónia, e a
Marta Nunes
43
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
flutuações de temperaturas fora da gama ideal (Neves, 2009). A maior estabilidade dos
processos mesófilos juntamente com o menor gasto energético faz com que as instalações
industriais de digestão anaeróbia operem essencialmente na gama de temperatura mesófilas.
No entanto, a utilização de temperaturas elevadas no processo (regime termófilo) apresenta
algumas vantagens, como o aumento da solubilidade de compostos orgânicos, facilitando a
sua assimilação pelos microrganismos; aumenta a velocidade das reacções químicas e
biológicas, acelerando o processo de conversão, permitindo a utilização de reactores de
menores dimensões e com um tempo de retenção hidráulico (TRH) inferior; melhora a
difusibilidade dos substratos solúveis; aumenta a taxa de transferência da fase líquida para a
fase gasosa devido à diminuição da solubilidade da fase gasosa; aumenta a taxa de destruição
de bactérias patogénicas. No entanto, a utilização de temperaturas elevadas aumenta a fracção
de amónia livre (NH3) que é inibitória para os microrganismos; origina um sobrenadante de
pior qualidade com quantidades elevadas de sólidos dissolvidos; tem maior potencial para a
geração de odores; e, como referido anteriormente, apresenta menor estabilidade
relativamente aos processos mesófilos, exigindo assim um maior controlo do mesmo. Para
além de todos os factores referidos a cima, a temperatura tem um efeito significativo na
pressão parcial do H2, influenciando a cinética do metabolismo sintrófico. Em condições
padrão, as reacções endotérmicas como a degradação do propionato em acetato, CO2 e H2,
tornam-se reacções energeticamente mais favoráveis a temperaturas superiores, enquanto as
reacções exotérmicas, como a metanogénese hidrogenotrófica, são desfavorecidas a essas
temperaturas (Deublein & Steinhauser, 2008; Silveira, 2009).
Alcalinidade e pH
O pH tem um efeito na actividade enzimática dos microrganismos. A actividade das enzimas
depende da gama de pH, sendo máxima para um valor de pH óptimo. O pH do meio afecta a
taxa de crescimento dos microrganismos, uma vez que influencia o seu metabolismo,
nomeadamente no que diz respeito à utilização das fontes de carbono e energia, às reacções de
síntese e à produção de metabolitos extracelulares. O processo de digestão anaeróbia é uma
sequência de degradações levadas a cabo por diferentes grupos de bactérias, sendo por isso
importante conhecer qual o pH que maximiza a eficiência global do processo.
Os diferentes grupos de bactérias apresentam actividade máxima para valores de pH não
muito diferentes: pH entre 7 e 7,4 é óptimo para as bactérias hidrolíticas e acetogénicas; as
bactérias fermentativas actuam numa gama de pH mais ampla, suportando valores entre 4 e
8,5, sendo o pH óptimo 6; e as bactérias metanogénicas actuam num intervalo estreito de pH,
entre 5,5 e 8,5, com um pH óptimo entre 6,5 e 8, sendo esta última considerada normalmente
apropriada para o funcionamento do processo de digestão anaeróbia (Silveira, 2009).
44
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
A capacidade tampão pode ser definida como a resistência de uma solução a mudanças de pH,
sendo um parâmetro importante na estabilidade dos processos de DA. Resulta da presença de
hidróxidos, carbonatos, bicarbonatos ou de elementos, tais como, cálcio, magnésio, sódio,
potássio e amónia.
O controlo da alcalinidade assume assim particular importância no processo de DA, por
traduzir a capacidade de reacção a situações de instabilidade provocada por variações de pH,
devidas, por exemplo, a um aumento da concentração de AGV.
A capacidade tampão é relatada como um método mais fiável para medir desequilíbrio do
digestor do que as medições directas de pH, uma vez que a acumulação de ácidos gordos de
cadeia curta reduz a capacidade tampão significativamente antes do pH diminuir (Neves,
2009).
Outros compostos que influenciam o balanço do pH, quando presentes em concentrações
elevadas, são as várias formas de amónia (NH4+, NH3), sulfuretos (H2S, HS-, S2-) e fosfatos
(H3PO4, H2PO4-, HPO42-, PO43-) (Silveira, 2009).
O ião amónio (NH4+) e a amónia livre (NH3) são as duas formas predominantes de azoto
inorgânico presente no líquido em digestão, sendo esta última mais tóxica, pelo facto de
possuir a capacidade de penetrar nas paredes das células por difusão passiva, causando uma
desregulação no balanço protónico e/ou uma deficiência em potássio (Deublein &
Steinhauser, 2008).
A forma ionizada (NH4+) apresenta um efeito benéfico para o processo, está associada à
produção de hidróxido que reage com o CO2 no gás, formando bicarbonato, sendo este um
composto importante por contribuir para o aumento da capacidade tampão do meio (Silveira,
2009).
Concentrações elevadas de compostos de amónia fazem subir o valor de pH, inibindo as
bactérias metanogénicas. A sua inibição provoca a acumulação de AGV, que pode provocar
uma descida do pH do meio e, consequentemente, diminuir a concentração de amónia. Com
esta sucessão de fenómenos o processo de digestão permanece estável, embora com uma
produção de metano inferior, devido à inibição das bactérias metanogénicas (Ribeiro, 1999;
Gray, 2004).
4.1.4. Co-digestão de resíduos
A co-digestão de resíduos consiste na utilização de dois ou mais substratos num mesmo
digestor. Esta técnica constitui uma solução interessante, tanto para aumentar o rendimento da
produção de biogás como para efectuar uma gestão adequada de outros tipos de resíduos, pelo
que vem sendo sucessivamente mais utilizada. Para além do tratamento de resíduos e da
Marta Nunes
45
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
produção de energia, a co-digestão apresenta vantagens significativas sobre outras tecnologias
de tratamento de resíduos.
O princípio básico da co-digestão consiste em equilibrar vários parâmetros numa mistura de
vários substratos, provenientes de diferentes fontes.
Recentemente, muitos estudos têm sido feitos sobre a co-digestão anaeróbia de lamas de
ETAR com resíduos sólidos urbanos e/ou com resíduos agro-pecuários e, nos vários
resultados apresentados (Wu, 2007; Neves, 2009; Martín-González, et al., 2010), verifica-se
um aumento significativo na produção de biogás, o que torna esta solução como sustentável.
Além do maior rendimento de biogás devido a efeitos sinérgicos positivos sobre os
microrganismos, a co-digestão apresenta outros benefícios em relação à digestão dos resíduos
isoladamente, como a diluição de substâncias tóxicas (amónia e AGV); melhoria no equilíbrio
de nutrientes, reduzindo a deficiência em micro e macronutrientes, na estabilidade do
processo e nas condições de humidade necessárias à alimentação. Para além destes factores,
juntam-se benefícios de ordem económica que podem ser significativos, uma vez que as infraestruturas e equipamentos são semelhantes aos da digestão anaeróbia (Neves, 2009; Silveira,
2009).
Em processos de co-digestão é fundamental entender como as mudanças na composição dos
substratos afectam o processo, uma vez que a percentagem dos seus constituintes,
nomeadamente de hidratos de carbono, lípidos, celulose e proteínas, variam de fonte para
fonte e de dia para dia (Wan, et al., 2011).
Co-digestão de óleos e outros lípidos
Para além dos resíduos agro-pecuários serem co-substratos benéficos, também os lípidos
(óleos, gorduras e sebos, correntemente designados pela sigla inglesa FOG de fats, oil and
grease) se apresentam como um potencial co-substrato para a digestão anaeróbia, podendo ser
encontrados em variados resíduos e nos efluentes domésticos e industriais provenientes de
matadouros e lacticínios, por exemplo. Os lípidos, quando comparados com outros resíduos
orgânicos de composição bioquímica diferente, são teoricamente mais interessantes para a
produção de biogás, pois têm maior potencial de geração de metano (Cirne, et al., 2007;
Neves, et al., 2009b). Os lípidos como substrato ou co-substrato para os processos de digestão
anaeróbia apresentam uma produção de metano (teórica) de 0,99 LNCH4/g, os hidratos de
carbono 0,42 LNCH4/g e as proteínas 0,63 LNCH4/g, (Alves, et al., 2009; Neves, et al., 2009a).
Neste contexto, efluentes ricos em lípidos podem ser considerados como uma fonte de energia
renovável de grande potencial (Cirne, et al., 2007). No entanto, vários autores (Neves, et al.,
2009b) têm referenciado a inibição da digestão anaeróbia quando os resíduos ricos em lípidos
são digeridos, principalmente em reactores com alimentação contínua. As causas apontadas
para o fracasso do processo têm sido diversas. Os lípidos podem originar problemas
46
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
operacionais em digestores anaeróbios, como entupimento de tubos, formação de espumas,
flotação de lamas, devido à adsorção dos lípidos na camada de lamas em torno da superfície e
perda de biomassa activa, levando ao washout provocado pela flotação da biomassa que se
adere à gordura. Todos estes problemas limitam a eficiência operacional dos digestores.
Lípidos presentes nos resíduos consistem principalmente em gorduras neutras e ácidos gordos
de cadeia longa (AGCL). As gorduras neutras podem ser facilmente hidrolisadas a AGCL e
glicerol através de lípases excretadas pelas bactérias acidogénicas durante a digestão
anaeróbica. Os AGCL são posteriormente convertidos em acetato e H 2 pelo processo
anteriormente descrito de oxidação por bactérias sintróficas acetogénicas com posterior
conversão em metano pelas bactérias metanogénicas hidrogenotróficas e acetoclásticas
(Cirne, et al., 2007).
Apesar de, conforme se referiu anteriormente, os AGCL poderem ser compostos inibitórios de
várias reacções essenciais, por exemplo, da reacção de degradação de AGCL e da
metanogénese, pois tornam-se tóxicos para as bactérias metanogénicas hidrogenotróficas e
acetotróficas, foi recentemente relatado (Wan, et al., 2011) que a inibição dos AGCL pode ser
reversível, na medida em que foi observado que os microrganismos recomeçaram a degradar
AGCL após uma fase de latência. A inibição transitória observada foi parcialmente atribuída à
limitação do transporte de nutrientes às células, devido a adsorção dos AGCL nas superfícies
microbianas, em vez de exclusivamente a fenómenos metabólicos. Este facto abre novos
horizontes para a digestão e co-digestão anaeróbia de resíduos e efluentes com alto teor
lipídico.
A co-digestão de FOG com lamas domésticas, estrume ou outros substratos facilmente
degradáveis (por exemplo, a glicose), a adição de adsorventes e o aumento da população
microbiana (bioaumento) têm sido utilizados para superar a inibição provocada pelos AGCL.
Além dos métodos acima mencionados, a existência de micronutrientes disponíveis, por
exemplo, Co, Fe, Mo, Ni e Se, são importantes para a estabilidade do digestor, assim como
para o crescimento e metabolismo dos microrganismos (Wan, et al., 2011).
São vários os efluentes ricos em lípidos que são produzidos em quantidades consideráveis e
que podem ser utilizados como potenciadores da formação de metano.
Estudos (Li, et al., 2002) demonstraram que os resíduos de alimentos que contenham alto teor
de lípidos, variando o seu conteúdo entre 8 a 40% pela adição de óleo vegetal e banha de
porco, foram degradados pelo processo de co-digestão, sendo mais de 85% do teor de lípidos
degradados. Num outro trabalho (Nielsen & Ahring, 2006) verificou-se que a adição de 5% de
óleo residual de peixe a um digestor com estrume duplicou a produção de metano por unidade
de volume de substrato. A adição de pulsos de oleato a reactores termófilos com misturas de
estrume de gado teve um efeito positivo sobre todo o processo (Neves, et al., 2009a).
Marta Nunes
47
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
Neves, et al. (2009b) estudaram a co-digestão de estrume de vaca com resíduos alimentares,
através da aplicação de concentrações crescentes de pulsos intermitentes de óleo residual,
proveniente de uma indústria de conservas de peixe. Foi demonstrado que a co-digestão de
estrume e resíduos alimentares pode ser melhorada através da adição de resíduos oleosos. O
aumento da produção de metano foi conseguido até a alimentação atingir 12 gCQO óleo/lreactor.
Este valor corresponde a uma alimentação contínua de 100/10 (V estrume/Vresíduos alimentares) com a
adição de pulsos intermitentes de óleo de 5% (Vóleo/Vestrume). A alimentação do pulso de 18
gCQOóleo/lreactor induziu uma inibição persistente no processo. Este estudo foi efectuado em
condições mesófilas (37°C) em reactores contínuos perfeitamente agitados, com um tempo de
retenção hidráulico de 15 dias, alimentados diariamente com estrume de gado e resíduos
alimentares com uma carga orgânica de 4,6±0,1 gCQO/(Lreactordia).
Neves, et al. (2009a) determinaram a quantidade específica de AGCL que pode ser adsorvido
na fase sólida, sem comprometer a estabilidade do processo de co-digestão anaeróbia a partir
de estrume de vaca e resíduos alimentares, tendo observado que no reactor, apenas com
estrume de vaca e resíduos alimentares (sem óleo), o único AGCL detectado foi o ácido
palmítico (C16:0). No entanto, na matriz sólida dos restantes reactores, aos quais tinham sido
adicionadas diferentes quantidades de óleo, para além do ácido palmítico, também foi
encontrado o ácido esteárico. Esta experiência demonstrou que os valores limite de
acumulação para os AGCL e C16: 0 sobre a matriz sólida, são de cerca de 180-220 gCQOAGCL/kgTS e 120-150 gCQO-C16:0/kgTS, respectivamente. Estes valores não devem ser
ultrapassados, sob risco de ocorrer a inibição do processo.
Kabouris & Tezel (2009) avaliaram a biodegradabilidade anaeróbia de uma mistura de lamas
primárias domésticas, lamas activadas espessadas e FOG, através de um processo semicontínuo, em condições de temperatura mesófilas (35°C) e termófilas (52°C), tendo obtido um
rendimento de metano 2,95 vezes maior a 35°C e 2,6 vezes maior a 52°C quando uma fracção
de FOG foi adicionada (48% do total de SV alimentado). Os resultados deste estudo
demonstraram que a co-digestão de lamas com FOG pode aumentar significativamente a
produção de metano.
Martín-González, et al. (2010) relataram que o rendimento de biogás passou de 0,38±0,02
L/gSValimentado para 0,55±0,05 L/gSValimentado quando foi realizada a co-digestão de resíduos
sólidos urbanos com óleo e gordura proveniente das ETAR, em condições mesófilas. Em
condições termófilas, os mesmos autores (Martín-González, et al., 2011) observaram uma
melhoria na produção de biogás de 52%, assim como um aumento na produção de metano de
36%, quando óleo e gordura proveniente de ETAR foram co-digeridos com resíduos sólidos
urbanos.
Zhu, et al. (2011) analisaram a produção de metano a partir da co-digestão de resíduos de
gorduras, provenientes do tratamento primário efectuado nas ETAR, com lamas domésticas,
tendo verificado que a produção de metano foi 65% superior quando as gorduras foram
48
Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia
CAPÍTULO 4
adicionadas como co-substrato a um caudal de cerca de 5,5 gSV/L, que representa uma adição
de gorduras inferior a 4% (V/V). Nos digestores com cargas orgânicas de gordura superiores a
5,5 gSV/L houve inibição do processo de digestão, dando origem à diminuição da produção
de metano. O estudo demonstrou que nesses digestores (com adição de gorduras superior)
levou à acumulação de AGV e à diminuição do pH, sendo estes parâmetros indicadores da
instabilidade do processo.
Li, et al. (2011) demonstraram que a co-digestão de lamas activadas com FOG aumentou a
produção de metano de 117 mL/gSVT para 418 mL/gSVT. Wan, et al. (2011) relataram que a
co-digestão de lamas activadas espessadas com FOG (64% dos SV totais), para um sistema
semi-contínuo, em condições de temperaturas mesófilas, foi possível obter um rendimento
diário de metano de 598 L/kgSV, sendo este valor 137% maior do que o obtido a partir da
digestão apenas de lamas activadas espessadas. Verificou ainda que a adição de
micronutrientes à co-digestão não melhorou significativamente a produção de biogás. Para a
adição de FOG com 74% dos SV totais, o digestor inicialmente falhou, mas foi lentamente
recuperando, sendo o rendimento de biogás apenas 50% do rendimento de um reactor sem
falhas com a mesma taxa de carga orgânica.
Um aumento no rendimento de metano de 9 a 27% foi observado quando gorduras removidas
nos sistemas de desengorduramento das ETAR (10 a30% de SValimentado) foram co-digeridos
com lamas domésticas. Quando foram adicionadas gorduras até 46% de SV, a produção de
metano aumentou em 66% (Wan, et al., 2011).
Visto os resultados dos últimos estudos sobre a co-digestão anaeróbia de FOG com substratos
orgânicos serem bastante positivos, os OAU tornam-se, assim, um potencial co-substrato a ser
utilizado no processo de co-digestão anaeróbia. A produção instalada de biogás é de 38,9 MW
(Direcção Geral de Energia e Geologia, 2011). Se se considerasse a co-digestão de óleos com
lamas em ETAR, a produção de biogás, nessas unidades de tratamento, podia aumentar entre
10 a 65% (Wan, et al., 2011; Zhu, et al., 2011). Este aumento poderá ter um impacto
significativo no cumprimento das metas para a energia provenientes de fonte renováveis
previstas para 2020 (Directiva n.º 2009/28/CE), bem como para atingir o objectivo dos 150
MW.
No presente estudo foram efectuados alguns ensaios experimentais, que se pretendiam
exploratórios, para verificar as potencialidades da co-digestão de óleo com efluentes da
indústria de lacticínios. Contudo, até ao momento de conclusão do trabalho não foi possível
obter resultados conclusivos.
Marta Nunes
49
CAPÍTULO 5
5. BIOCIDAS - USO DE OAU COMO ADJUVANTE
Neste capítulo será analisada muito sumariamente a utilização de OAU após tratamento como
aditivo de agentes biocidas, em particular moluscicidas para o controlo de bivalves
infestantes. Ficou claro do Capítulo 3 que esta aplicação, pelo limite de incorporação de óleo,
não deverá resolver o problema na sua globalidade. Por outro lado, a literatura não refere
consistentemente o impacto da adição de OAU a estes agentes. Espera-se que os OAU
adicionados em pequenas fracções ao composto activo se revelem uma mais-valia em termos
de eficiência do agente biocida.
No presente estudo foram levadas a cabo apenas análises preliminares, tirando partido de uma
estrutura já existente e orientada para estudos de eco-toxicologia (Costa, et al., 2008). Note-se
que a ideia central foi somente recolher alguma informação, validada cientificamente, acerca
da potencial utilização de OAU para aumentar a eficiência de agentes biocidas, podendo ser
esta uma possibilidade de integração dos mesmos.
Neste estudo, usou-se o princípio activo polydiallyldimethyl-ammonium chloride
(polyDADMAC) e os testes foram realizados em Corbicula fluminea. Desde já, alerta-se para
o facto da bateria de casos levada a cabo não ter sido suficientemente lata para tirar
conclusões indubitáveis. No entanto, abre uma janela de oportunidade para um estudo mais
alargado, em que poderão variar-se os agentes usados e mesmo os organismos alvo.
Os produtos biocidas são definidos como substâncias activas e preparações que contenham
um ou mais constituintes, que se destinam a destruir, travar o crescimento, tornar inofensivo,
evitar ou controlar de qualquer outra forma a acção de um organismo prejudicial, por
mecanismos químicos ou biológicos, e que se incluam num dos 23 tipos de produtos que
constam na lista apresentada no Decreto-Lei 121/2002 de 3 de Março. Deste grupo de
compostos estão excluídos os pesticidas de uso agrícola. Os produtos designados por biocidas
apresentam características diferenciadas do ponto de vista da sua composição, e cobrem um
amplo leque de utilizações, constituindo uma arma muito eficaz no combate aos organismos
nocivos. Actuam, assim, com nítido benefício para a protecção da saúde humana e animal e
para a salvaguarda do ambiente (Decreto-Lei n.º 121/2002 de 3 de Março, 2002).
Actualmente, um número considerável de indústrias hidro-dependentes tem problemas com
espécies invasoras. É comum a água que circula nas instalações industriais estar contaminada
com espécies biológicas invasoras que se traduzem em problemas nos sistemas onde é usada
como matéria-prima ou utilidade (Andrew J. Cooper, et al., 2002; Rosa, et al., 2011).
Os biocidas são utilizados para controlar o crescimento de diversas espécies, entre
microrganismos que podem desenvolver-se e formar filmes biológicos, levando
consideráveis na produção e dando origem a graves problemas de corrosão. Mas
macrorganismos, como por exemplo moluscos ou crustáceos, que podem
Marta Nunes
as quais,
a perdas
também,
provocar
51
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
incrustações e que são difíceis de remover (Vanlaer, 1996). No que respeita aos
macroinvertebrados, geralmente nos sistemas de água industriais existe uma triagem. No
entanto, este rastreio não impede a passagem dos organismos juvenis. Estes, devido à sua
capacidade de dispersão, são facilmente capturados para o interior de unidades industriais
com captação superficial, passando, devido às suas dimensões reduzidas, pelos crivos
responsáveis pelo impedimento da passagem de objectos obstrutivos (Bidwell, et al., 1995).
Quando a velocidade da água permite, estabelecem-se nas unidades até atingirem a
maturação, desenvolvendo populações densas que causam assim fortes problemas de bioincrustação. Isto é resultado do acumular de algumas espécies invasoras em equipamentos e
estruturas, o que provoca o seu desgaste e degradação, sendo depois necessária a reparação ou
substituição, o que acarreta elevados prejuízos (Vanlaer, 1996).
Como consequência do crescimento biológico descontrolado de algumas espécies em muitos
processos industriais, diferentes biocidas e antimicrobianos têm sido desenvolvidos para
auxiliar o seu controlo. Muitas vezes, um biocida é insuficiente para controlar esse
crescimento e, por esse facto, os biocidas podem actuar em conjunto. Isto é, sinergicamente,
para melhorar o seu desempenho, por oposição à eficácia obtida quando cada um é usado
separadamente. Os mecanismos pelos quais os biocidas exercem a sua actividade tóxica
dependem de uma série de factores, que incluem as propriedades químicas do mesmo e as
características bioquímicas e fisiológicas do organismo alvo. Alguns biocidas actuam ao nível
da membrana celular ou da parede celular, outros atacam enzimas ou os processos
metabólicos, levando à morte celular ou à interrupção da replicação celular do organismo. A
combinação de dois biocidas, se bem formulado, permite a adição de quantidades menores de
cada um para alcançar o nível desejado de controlo, trazendo benefícios, tanto ambientais,
como económicos (Andrew J. Cooper, et al., 2002).
Os compostos biocidas são geralmente usados na forma de uma solução ou dispersão numa
fase aquosa que pode conter solventes orgânicos (Vanlaer, 1996). Os dois principais
requisitos que estes devem possuir são: i) ser tóxico suficiente para matar a espécie de forma
eficiente; ii) não causar impactos significativos no meio ambiente.
No presente trabalho será avaliada a utilização de OAU com um princípio activo já conhecido
sobre uma espécie invasora. A espécie em causa é a Corbicula fluminea, mais conhecida
como a amêijoa asiática. Na próxima secção serão listadas algumas das características
principais desta espécie.
5.1. Corbicula fluminea
A amêijoa asiática (ver Figura 5-1) é uma das espécies mais comuns em termos de invasão de
ecossistemas de água doce. Esta espécie, originária do continente Asiático, é hoje em dia um
organismo comum nos habitats de água doce Americanos e Europeus (Sousa, 2008). A
amêijoa asiática causa fortes problemas de bio-incrustação em equipamentos e estruturas. A
52
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
nível industrial, acumula-se em tubagens, sistemas de captação e outros equipamentos,
bloqueando-os, reduzindo a sua eficiência de operação e favorecendo a sua corrosão,
originando, por isso, custos avultados. Pode ainda colocar questões de segurança à unidade
industrial e causar perturbações associadas a paragens periódicas para acções de limpeza. Esta
amêijoa causa grandes problemas a indústrias que dependem do uso intensivo da água, tais
como, cimenteiras, centrais termoeléctricas, extractoras de areia, indústrias de pasta e do
papel, sistemas de rega e ETA.
Com base nos problemas causados vulgarmente pelo organismo em causa, identificou-se a
necessidade de desenvolver biocidas eficazes, ambientalmente aceitáveis, com impactos
reduzidos em organismos não-alvo e que cumpram os requisitos legais, principalmente nos
casos em que a água se destina ao consumo humano.
Figura 5-1 – Corbicula fluminea (ameijoa asiática)
Do ponto de vista da sua biologia, a Corbicula fluminea apresenta as características descritas
de seguida.
Trata-se de uma espécie hermafrodita. A fertilização ocorre no interior da cavidade paleal e as
larvas são incubadas nos tubos branquiais. Os indivíduos possuem assim um período de
protecção, evoluindo para um estado pós larva, estando então na fase juvenil. Devido ao seu
pequeno tamanho, estes podem-se disseminar pelas instalações, e aí estabelecerem-se. A
dimensão de um juvenil, aquando da libertação dos progenitores para o exterior é de
aproximadamente 0.2 mm. Esta espécie possui uma elevada capacidade de reprodução. O
período de maturação sexual ocorre nos primeiros 3 a 6 meses quando o comprimento de
concha atinge 6 a 10 mm (Sousa, 2008) e a partir daí torna-se capaz de produzir cerca de
Marta Nunes
53
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
70000 juvenis por ano (Wittmann, et al., 2008). A temperatura mínima para o crescimento e
desenvolvimento da amêijoa ronda os 10 – 11ºC (Karatev, et al., 1998).
A mortalidade dos adultos depende de diversos factores do ecossistema. A expectativa de vida
desta espécie é extremamente variável, mediando entre 1 a 5 anos. O tempo máximo de vida
registado é de 7 anos (Wittmann, et al., 2008; Sousa, 2008).
A Corbicula fluminea reproduz-se duas vezes por ano, uma na Primavera e outra no Outono
(Sousa, 2008). O período de reprodução é sobretudo controlado pela temperatura, com o
intervalo mais adequado entre os 15 e 20ºC, e pela disponibilidade de alimento (Rajagopal, et
al., 2000).
A amêijoa asiática tem como principais características uma elevada capacidade de filtração,
taxa de reprodução elevada e uma grande capacidade de dispersão num curto período de
tempo, sendo por estes factores considerada uma espécie invasora com grandes impactos
(Sousa, 2008).
A espécie não tolera teores de salinidade elevados, mas sobrevive a baixas temperaturas da
água (2-34ºC). Prefere água doce e não poluída e sedimentos arenosos misturados com limo e
argila (que aumentam o teor de matéria orgânica) (Sousa, et al., 2008; Minchin, 2008).
A grande capacidade invasiva e reprodutiva de C. fluminea torna esta espécie um importante
componente dos ecossistemas aquáticos. Do ponto de vista do ambiente, o principal problema
desta peste reside na eventual mudança nas condições ecológicas dos ecossistemas invadidos,
pois compete com as espécies nativas por alimento e espaço. Em densidades elevadas reduz
significativamente a turbidez da água (Minchin, 2008).
Apesar dos impactes negativos, a ameijoa asiática também pode ter efeitos positivos nos
ecossistemas invadidos. Esta espécie pode proporcionar habitats para outros organismos e
constitui alimento para várias espécies (Sousa, 2008).
A dispersão de C. fluminea em ecossistemas aquáticos resulta de várias actividades do
Homem, como por exemplo a sua utilização como isco para a pesca, e de fenómenos naturais
em que juvenis são transportados pelas correntes ou através de aves aquáticas (Sousa, 2008).
A amêijoa asiática causa fortes problemas de bio-incrustação e, portanto, o conhecimento das
características fisiológicas da espécie é crucial para encontrar e implementar um controlo
eficaz nas instalações industriais (Rosa, et al., 2011).
Actualmente existem métodos mecânicos e químicos para o controlo da espécie. O controlo
mecânico é feito geralmente por crivos. Estes métodos têm baixo impacto ambiental mas têm
menor eficiência. Os métodos químicos são os mais utilizados por serem económicos e
versáteis. Pelas razões mencionadas, o método de controlo mais popular para minimizar os
efeitos de C. fluminea na indústria, passa pela dosagem de químicos (métodos químicos)
(Post, et al., 2006).
54
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
5.2. Estudo experimental
Como já referido, existem vários métodos para o controlo de pragas, sendo que o controlo
químico, envolvendo a dosagem de biocidas, tende a ser o método mais popular devido à sua
versatilidade. Apesar de já se ter demonstrado actividade tóxica de um grande número de
substâncias contra a amêijoa asiática, o controlo químico apresenta como principais
desvantagens a relação custo – eficiência de muitos biocidas e os impactos ambientais
negativos, pelos seus efeitos em espécies não-alvo. Assim, há todo o interesse em identificar
possíveis substâncias que aumentem a eficácia dos biocidas, diminuindo a sua dosagem ou
acelerando o controlo.
Com o objectivo de verificar o potencial do OAU quando associado a um moluscicida com
efeito já conhecido, foram realizados vários testes para analisar se o óleo aumenta a taxa de
mortalidade e/ou tem a capacidade de acelerar o processo de controlo, tornando o
macrorganismo mais vulnerável. Como já citado anteriormente, até à data, a utilização de óleo
vegetal em biocidas com o objectivo de aumentar o seu potencial tóxico não foi mencionado
na literatura.
De seguida apresentar-se-ão sumariamente os testes efectuados. O moluscicida usado em
conjunto com o óleo foi o polyDADMAC. Este é um polímero catiónico que pode ser usado
no tratamento de água para consumo humano e como coagulante que neutraliza partículas
coloidais carregadas negativamente. A sua utilização na neutralização de macrorganismos é já
comum (Getsinger, 2000).
É de salientar, que a actividade experimental foi realizada tendo por base o conhecimento
prático já adquirido pelo Departamento de Engenharia Química da Universidade de Coimbra.
Daí que se tenha utilizado este princípio activo como referência para avaliar a capacidade
adjuvante dos OAU, o qual já teve o seu efeito comprovado no que respeita ao controlo da
amêijoa asiática (McMahon, 1988). O óleo utilizado neste estudo é um óleo alimentar virgem
e, portanto, assume-se que os resultados obtidos com este serão extrapoláveis no caso de ser
utilizado OAU após pré-tratamento.
O primeiro objectivo do trabalho consistiu em analisar a capacidade de dispersão do óleo na
água. Tendo em linha de conta a baixa solubilidade dos óleos em água e a necessidade de usar
sistemas que tenham a forma de uma fase perfeitamente emulsionada, haveria de se obter
certeza de que tal ocorre. Ora, como foram utilizadas apenas concentrações reduzidas de óleo,
verificou-se uma perfeita homogeneização da mistura água-polyDADMAC-óleo.
Após esta conclusão, analisou-se o impacto do óleo na mortalidade dos microrganismos pelo
uso de polyDADMAC. Numa primeira fase, a concentração do agente biocida usada como
referência foi a correspondente ao LC50 para um período de exposição de 72 horas.
Tendo-se percebido que valeria a pena explorar este sistema, numa segunda fase, procedeu-se
à determinação de curvas dose-resposta para o polyDADMAC na presença/ausência de óleo.
Marta Nunes
55
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
No modelo utilizado, a avaliação da mortalidade da amêijoa asiática constitui a resposta e a
concentração de biocida (dose) o factor variado. Isto vai permitir avaliar o potencial efeito
sinergético em termos da diminuição do LC50 na presença do óleo.
Os testes de toxicidade vulgarmente levados a cabo podem ser estáticos ou contínuos. Quanto
à duração, os testes podem ser de curta ou longa duração. Nos primeiros utilizam-se gamas de
concentrações elevadas, de forma a obter resultados relativos à resistência de C. fluminea num
curto período de tempo. Convém referir que as concentrações utilizadas são demasiado altas
para serem usadas na prática, mas permitem rapidamente tirar conclusões sobre os perfis de
mortalidade dos químicos, nomeadamente permitem calcular valores de LC50 e assim obter
uma primeira avaliação rápida do seu potencial. Com os testes de longa duração, testam-se
concentrações de gama muito mais baixa, passíveis de ser aplicadas na prática, com o
objectivo de tirar conclusões mais realistas do desempenho dos biocidas (EUROPEAN
COMMISSION HEALTH & CONSUMER PROTECTION, 2002).
Os testes efectuados neste trabalho foram realizados em condições estáticas, em períodos de
curta duração. Para tal, recorreu-se à monitorização da taxa de mortalidade de 24 em 24 horas
durante um período de 72 horas.
5.3. Materiais e métodos
Os materiais e equipamentos utilizados foram os normalmente presentes num laboratório. O
químico usado foi o polyDADMAC (40% principio activo) e o óleo, um óleo vegetal
alimentar virgem.
Nos testes laboratoriais utilizaram-se adultos de C. flumínea recolhidos num canal
proveniente da ria de Mira, situado em Casal de São Tomé, concelho de Mira. A densidade
populacional da C. fluminea neste local é de aproximadamente 100 indivíduos/m2. A
temperatura da água rondava os 20ºC na altura da colheita, que foi no mês de Abril para o
caso dos primeiros testes e Julho no caso dos segundos. No laboratório, as amêijoas foram
distribuídas por baldes, com água da rede desclorinada e com arejamento adequado, onde
permaneceram até serem utilizadas nos ensaios, sendo devidamente alimentadas com
microalgas durante esse período. Geralmente, foram mantidas em laboratório antes de serem
usadas no teste por um período máximo de 3 semanas.
Os testes foram realizados em recipientes de plástico, cada um contendo 10 indivíduos adultos
e 500 mL de água desclorinada, como se apresenta na Figura 5-2. Decorreram numa sala de
temperatura controlada a 20ºC. Para cada tratamento fizeram-se três réplicas, para assegurar a
reprodutibilidade dos resultados. Os espécimes utilizados nas experiências foram escolhidos
tendo em conta a dimensão da concha, neste caso, a dimensão intermédia. Esta escolha serviu
para minimizar os efeitos provocados por variações de dimensões nos testes de mortalidade.
56
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
Figura 5-2 – Testes estáticos de curta duração em C. flumínea (após 24h)
Numa primeira fase de estudo, fez-se uma avaliação preliminar da potencialidade do óleo,
sendo para isso realizados testes de toxicidade apenas com uma concentração específica de
polyDADMAC. Nestes ensaios foram colocados 10 adultos em 3 recipientes, isentos de
químico e óleo, com o papel de pote de controlo. Nos restantes recipientes (Tabela 5-1 –
Composição dos recipientes colocou-se, para além dos 500 mL de água desclorinada, óleo em
concentrações de 10 mg/L e 100 mg/L, polyDADMAC na concentração do LC50 para uma
exposição de 72 horas (obtido em estudos anteriores, nas mesmas condições, pelo
Departamento de Engenharia Química da Universidade de Coimbra) tendo-se depois
diversificado as combinações entre as concentrações de polyDADMAC e as de óleo. É de
salientar que todos os recipientes tinham arejamento em contínuo, para garantir condições
adequadas. O tratamento a que cada pote de indivíduos foi submetido está caracterizado na
Tabela 5-1.
Tabela 5-1 – Composição dos recipientes
Marta Nunes
Recipientes
Tratamento
1, 2, 3
4,5, 6
7, 8, 9
10, 11, 12
13, 14. 15
16, 17, 18
Controlo
10 mg/L óleo
100 mg/L óleo
1102 mg/L polyDADMAC
1102 mg/L polyDADMAC + 10 mg/L óleo
1102 mg/L polyDADMAC + 100 mg/L óleo
57
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
Para a preparação dos tratamentos com polyDADMAC foi feita uma solução stock de 6 g/L, a
partir da qual se preparou as soluções diluídas correspondentes da Tabela 5-1. De notar que,
como o volume da solução stock a diluir ainda era considerável, foi retirada igual quantidade
de água (dos 500 mL) para evitar efeitos de diluição adicional. No caso do óleo, para a
solução de concentração igual a 10 mg/L, como a quantidade a introduzir era muito pequena,
preparou-se uma solução de 2 L com água desclorinada e foi colocado um volume de óleo 4
vezes maior à quantidade necessária em cada pote, para minimizar os erros. A partir desta,
retiraram-se 500 mL para cada pote. No caso da solução de óleo de 100 mg/L, utilizou-se uma
micropipeta e introduziu-se directamente o volume necessário em cada recipiente.
Os testes tiveram a duração de 72 horas após a dosagem do químico e do óleo. A cada 24
horas foram efectuadas observações de mortalidade.
O método de observação da mortalidade é importante, uma vez que nem sempre é fácil
distinguir os organismos mortos dos vivos. Por este motivo, foi definido um método de
observação com o intuito de minimizar a incerteza dos resultados. A actividade dos sifões
torna-se fundamental para ter a percepção se os organismos estão vivos ou mortos, sendo que
quando a concha está aberta e o sifão se encontra à vista, o organismo está vivo, reagindo ao
toque e fechando a concha em simultâneo. Se a concha se encontra totalmente aberta e não há
actividade dos sifões nem resposta ao toque, o organismo está morto. Porém, nos casos em
que as amêijoas se encontram completamente fechadas e imobilizadas não se pode assumir
automaticamente que estão mortas. Nesses casos, coloca-se cuidadosamente uma agulha na
junção das duas valvas da concha perto da zona dos sifões, sem causar qualquer dano, e forçase a entrada da agulha abrindo ligeiramente a concha. Quando as amêijoas estão vivas,
oferecem resistência à entrada da agulha e, se abrirem, fecham-se imediatamente quando se
retira a agulha. Por outro lado, se estiverem mortas, ao colocar a agulha não oferecem
qualquer resistência e, na maioria dos casos, inserindo a agulha mais um pouco, ficam
completamente abertas.
Após as observações de mortalidade, a cada 24 horas, foram removidos os indivíduos mortos
para evitar a deterioração do meio devido à sua biodegradação. O objectivo destes testes foi
verificar, num prazo de 72 horas, quantos espécimes morrem em cada recipiente, podendo
depois averiguar a influência do óleo na mortalidade.
Na segunda fase do estudo, orientada para a determinação de curvas dose-resposta para o
polyDADMAC na presença e ausência de óleo, procedeu-se de modo semelhante ao descrito
anteriormente. Porém, a solução stock de polyDADMAC foi de 5 g/L. No caso dos
recipientes com 10 mg/L de óleo e polyDADMAC, preparou-se, como referido em cima, uma
solução de maior volume, para minimizar os erros, mas desta vez introduziu-se primeiro o
polyDADMAC, o óleo e só depois se perfez o volume com água desclorinada. A
caracterização dos potes usados nos ensaios de avaliação da curva dose-resposta está
sistematizada na Tabela 5-2.
58
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
Tabela 5-2 – Composição dos recipientes
Recipientes
Tratamento
1, 2, 3
4, 5, 6
7, 8, 9
10, 11, 12
13, 14, 15
16, 17, 18
19, 20, 21
22, 23, 24
24, 25, 26
27, 28, 29
30, 31, 32
33, 34, 35
36, 37, 38
39, 40, 41
42, 43, 44
45, 46, 47
48, 49, 50
51, 52, 53
54, 55, 56
57, 58, 59
60, 61, 62
63, 64, 65
Controlo
polyDADMAC 25 mg/L
polyDADMAC 75 mg/L
polyDADMAC 150 mg/L
polyDADMAC 300 mg/L
polyDADMAC 600 mg/L
polyDADMAC 1200 mg/L
polyDADMAC 1500 mg/L
polyDADMAC 25 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 75 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 150 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 300 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 600 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 1200 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 1500 mg/L + óleo10 mg/L
polyDADMAC 25 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 75 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 150 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 300 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 600 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 1200 mg/L + óleo100 mg/L
polyDADMAC 1500 mg/L + óleo100 mg/L
5.4. Resultados e discussão
Nesta secção analisam-se as taxas de mortalidade obtidas nos ensaios levados a cabo. Para tal,
contou-se o número de mortos em cada réplica e posteriormente, a partir do número de
organismos expostos ao tratamento, determinou-se a taxa de mortalidade.
Na Figura 5-3 apresenta-se o resultado obtido para os primeiros testes, onde se analisa
preliminarmente a mistura do óleo para a concentração LC50 de polyDADMAC para um
período de 72 horas de exposição. A figura ilustra o efeito do óleo sobre a taxa de
mortalidade, sendo esse efeito mais significativo às 48 horas. Após 72 horas observa-se que a
taxa de mortalidade obtida nos testes em que se utilizou 100 mg/L de óleo foi superior (37%).
No caso de polyDADMAC e polyDADMAC com 10 mg/L de óleo, a taxa de mortalidade foi
idêntica, aproximadamente 20%. Porém, verifica-se que para 48 horas, o polyDADMAC com
óleo 10 e 100 mg/L apresentam uma taxa de mortalidade superior ao do polyDADMAC
isento de óleo. O pote controlo teve uma mortalidade de 3,3%.
Marta Nunes
59
% Mortalidade
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
0
10
20
30
40
50
60
70
80
Tempo (horas)
10 mg/L óleo
100 mg/L óleo
PolyDADMAC
PolyDADMAC + 10mg/L óleo
PolyDADMAC + 100mg/L óleo
Figura 5-3 – Taxa de mortalidade em função do tempo de exposição do tratamento
Na Tabela 5-3 apresenta-se a análise estatística dos dados obtidos. Esta foi levada a cabo
usando Análise de Variância (ANOVA) através do software STATISTICA 7. Considerou-se
dois factores: i. a concentração de óleo (0, 10 e 100 mg/L); ii. o tempo (24, 48 e 72 h). A
técnica estatística usada correspondente a Two-Way ANOVA factorial, permite avaliar o
impacto de cada um dos factores variados, mas também de combinações deles. Esta estratégia
está directamente associada ao facto do impacto de um factor poder ou não ser potenciado
dinamicamente. Considerou-se significativo, efeitos cujo valor de p do teste estatístico fosse
inferior a 0,05.
Tabela 5-3 – Resultados da análise ANOVA para os primeiros testes de mortalidade
Factores
Óleo
Tempo
Óleo*Tempo
gl
2
2
4
F
6,2472
52,2681
3,6637
p
0,008699
0,000000
0,023674
Esta análise permite confirmar que a presença do óleo tem significância estatística na taxa de
mortalidade da Corbicula fluminea. Verifica-se que o óleo, o tempo e a combinação
Óleo*Tempo têm significado estatístico e, portanto, influenciam a taxa de mortalidade. Isto,
intrinsecamente, aponta para que a presença de óleo aumente a taxa de difusão do agente
biocida para a espécie invasora ou predisponha mais o sistema desta a absorver o biocida.
Testes multicomparação, mais precisamente o teste de Bonferoni confirma que o
polyDADMAC quando combinado com 100 mg/L de óleo tem significância estatística para as
72 horas de exposição relativamente ao tratamento com polyDADMAC isento de óleo e com
10 mg/L de óleo. Aparentemente a acção do óleo ocorre para tempos menores, ou seja, o óleo
60
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
acelera a acção biocida, apesar de às 24 horas não se observar grandes diferenças. Contudo,
estatisticamente este resultado não se revelou significativo.
% Mortalidade
Na Figura 5-4 apresentam-se os resultados obtidos nos estudos dose-resposta. A análise
centra-se nas curvas para 72 horas de exposição, pois estas cobrem o intervalo 0-100% de
resposta na gama de concentrações testada.
100
90
80
70
60
50
40
30
20
10
0
0
200
400
600
800
1000
1200
1400
1600
Concentração PolyDADMAC (mg/L)
PolyDadmac
PolyDadmac 10 mg/L óleo
Polydadmac 100 mg/L óleo
Figura 5-4 – Taxa de mortalidade obtida com a Corbicula fluminea para várias concentrações de polyDADMAC e de
polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo após 72 horas de exposição
A Figura 5-4 ilustra o facto de a adição de óleo ter efeito significativo na taxa de mortalidade
com a Corbicula fluminea. É evidente que a taxa de mortalidade sofre um acréscimo com o
aumento da concentração de polyDADMAC, excepto nas concentrações 150 e 300 mg/L
quando o óleo está presente. Este facto pode ser explicado devido à presença de óleo, isto é,
para gamas de mortalidade mais baixas (até cerca de 60%), parece haver um claro aumento de
susceptibilidade da espécie invasora na presença do óleo. Porém, nas gamas de mortalidade
mais elevadas, esse aumento de susceptibilidade é menos evidente, daí a diminuição da
mortalidade com o aumento da concentração do agente biocida. No final das 72 horas de teste
a mortalidade não foi significativamente diferente se se comparar a inclusão ou não de óleo.
De qualquer forma, surge aqui um resultado que permite antever o óleo como agente
potenciador da acção do biocida. É de referir que a mortalidade observada nos potes controlo
foi de 13,3%.
Para confirmar estes resultados apresenta-se na Tabela 5-4 a ANOVA admitindo três factores:
i. a concentração de óleo usada (0, 10 e 100 mg/L); ii.a concentração de biocida (25, 75, 150,
300, 600, 1200 e 1500 mg/L); iii. o tempo, aqui referente aos instantes de monitorização (24,
Marta Nunes
61
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
48 e 72 horas). Note-se que neste caso a ANOVA levada a cabo é do tipo Three-Way
factorial.
Tabela 5-4 – Resultados da ANOVA para as mortalidades para diferentes concentrações de polyDADMAC e de óleo
ao longo do tempo
Tempo
Óleo
PolyDADMAC
Tempo*Óleo
Tempo*PolyDADMAC
Óleo*PolyDADMAC
Tempo*Óleo*PolyDADMAC
gl
F
p
2
2
7
4
14
14
28
419,9
17,1
49,4
4,2
11,1
2,0
0,8
0,000
0,000
0,000
0,003
0,000
0,018
0,701
Os dados robustecem a conclusão de que o óleo quando combinado com polyDADMAC é
estatisticamente relevante para a taxa de morte da espécie invasora. Porém a combinação
tempo, óleo, polyDADMAC não é estatisticamente significativa.
No sentido de avaliar a existência de performances diferentes para diferentes concentrações
do agente biocida foram realizados posteriormente testes multicomparação, nomeadamente o
teste de Bonferroni. Os resultados confirmam que a presença de óleo tem maior impacto na
mortalidade para concentrações de polyDADMAC mais baixas. Para concentrações de
polyDADMAC de 25 e 75 mg/L, a concentração de óleo de 100 mg/L tem significado
estatístico.
Com o intuito de complementar a análise comparando métricas mais agregadas de
mortalidade, foram calculados valores de LC50 para exposições de 72 horas. Para tal,
recorreu-se ao software EPA Probit analysis Program versão 1.5. A Tabela 5-5 apresenta a
concentração LC50 para o polyDADMAC isento de óleo, com 10 e 100 mg/L.
Tabela 5-5 – LC50 do polyDADMAC, polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo com a Corbicula fluminea para o
período de exposição de 72 horas
Parâmetros
PolyDADMAC
PolyDADMAC +
10 mg/L óleo
PolyDADMAC +
100 mg/L óleo
LC50
+95%
-95%
242,43
466,72
125,93
246,53
585,11
103,87
43,30
389,71
4,81
A Tabela 5-5 ilustra o facto de, com base nos ensaios realizados, se poder antever que para
gamas de mortalidade baixas, o efeito do óleo ser relativamente significativo. De facto, a
concentração para eliminar metade dos macrorganismos (LC50) com a mistura
polyDADMAC e 100 mg/L de óleo é inferior à necessária quando o biocida é usado sozinho
62
Biocidas - Uso de OAU como adjuvante
CAPÍTULO 5
(apesar de algumas limitações na significância estatística dos dados). Isto configura uma
primeira ideia de que o uso de OAU como adjuvante poderá ser interessante. Porém, do ponto
de vista do controlo, interessa sobretudo a gama de mortalidade mais elevada, este potencial
tem de ser ainda investigado com mais detalhe, nomeadamente confirmando os resultados
obtidos neste estudo e realizando estudos de longa duração numa gama de mortalidade mais
baixa.
5.5. Conclusão
Os testes aqui apresentados tinham como principal objectivo averiguar qual o potencial do
óleo como adjuvante num biocida. Nos primeiros testes efectuados verificou-se que a
presença de óleo tem influência na taxa de mortalidade. Observou-se ainda que, através da
realização dos testes dose-resposta o óleo tem maior influência para baixas gamas de
mortalidade e portanto, neste caso, para concentrações de polyDADMAC baixas. Verificou-se
também, que concentrações maiores de óleo (gama de 100 mg/L) poderão potenciar mais a
acção biocida.
Obviamente que os testes realizados são preliminares e por isso requerem mais estudos, no
sentido de avaliar a selectividade do óleo perante outros organismos, assim como o estudo das
quantidades de óleo adicionadas a partir das quais possam ser consideradas poluentes para os
cursos de água. Ainda que as quantidades de óleo a escoar neste tipo de produtos não seja
elevada, fica em aberto mais uma possibilidade de valorização de OAU.
Marta Nunes
63
CAPÍTILO 6
6. ÁCIDO AZELAICO - USO DE OAU COMO MATÉRIA-PRIMA
Após uma enumeração das outras alternativas existentes para valorizar OAU apresentada nos
capítulos 3, 4 e 5, neste capítulo, será dado destaque à produção de ácido azelaico.
Na produção de oleoquímicos, caracterizada por envolver síntese química, o principal factor a
ter em conta na escolha do produto a desenvolver é o perfil de óleo em causa, uma vez que
este pode variar significativamente na sua constituição e, consequentemente, ter impacto nos
produtos obtidos. No presente trabalho, considera-se o OAU como sendo maioritariamente
constituído pelo ácido oleico e linoleico, consideração suportada pelo histórico do consumo
de óleos em Portugal e, assim, considerar-se-á a utilização do OAU para a produção de ácido
azelaico.
O ácido azelaico é utilizado em diversos sectores industriais, tais como o alimentar, para a
produção de embalagens de alimentos (papel e filmes), o têxtil (calçado, etiquetas,
emblemas), o automóvel (revestimentos, assentos estofados dos carros) e electrónica (placas
de circuito impresso flexível, isolamento de bobinas). É utilizado industrialmente como
constituinte de uma série de aplicações químicas, tais como poliamidas, poliésteres, plásticos,
produtos farmacêuticos, plastificantes, lubrificantes e fluidos hidráulicos (Rani, et al., 2008;
Kockritz & Martin, 2011). É um componente de elevada valência na preparação de
copolímeros de alta performance para uso em adesivos, películas e fibras e encontra-se em
crescente aplicação como um agente complexante para sais de lítio em graxas de lítio de alta
performance (Emery Oleochemicals Group, 2009). Possui, ainda, boa solubilidade em
solventes orgânicos e água em comparação com outros ácidos dicarboxílicos com cadeia
semelhante, tais como a gama C4-C12 (Kockritz & Martin, 2011).
Hoje em dia, o ácido azelaico é produzido pela clivagem oxidativa do ácido oleico via
ozonólise. O ácido pelargónico é formado como um subproduto da reacção na quantidade
estequiométrica, sendo passível de ser utilizado em aplicações industriais e nos transportes
como lubrificante sintético, em ésteres plastificantes e também como um derivado do sector
agro-químico (Emery Oleochemicals Group, 2009).
Ultimamente têm sido investigadas alternativas para o processo de ozonólise ou para a sua
melhoria, sobretudo na China, devido à sua grande exigência energética e aos riscos de
segurança a ele associados. Apesar destas desvantagens, o processo de ozonólise apresenta
algumas vantagens, como sejam a ausência de resíduos ambientalmente críticos, boa
selectividade, e um reprocessamento simples. Daí que seja considerado como o melhor
método, até ao momento, para a produção de ácido azelaico (Kockritz & Martin, 2011).
A optimização do processo de ozonólise, principalmente da segunda etapa, referente à
oxidação do ozonídeo secundário, tem sido alvo de muitos estudos. No entanto, alternativas
práticas ainda não foram encontradas. Algumas das razões apontadas para tal facto são os
Marta Nunes
65
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
baixos rendimentos obtidos, baixa selectividade, catalisadores caros, falta de actividade
catalítica, oxidantes que não são actualmente aceites industrialmente e a difícil purificação.
A oxidação pela Candida tropicalis parece ser uma opção favorável dentro de pouco tempo
(Kockritz & Martin, 2011), tirando partido da utilização de organismos biológicos para a
síntese de produtos.
Apesar do processo de ozonólise do ácido oleico ser conhecido há muito tempo como um
processo sofisticado e bem estabelecido, tem sido objecto de investigação e de
desenvolvimento ao longo dos anos. No entanto, para aplicações a nível industrial, os
rendimentos obtidos de ácido azelaico por outros processos não são ainda suficientemente
atractivos (Kockritz & Martin, 2011).
Como referido, actualmente o ácido azelaico é produzido a partir do ácido oleico. Contudo, o
que se pretende avaliar neste estudo é a sua produção a partir dos OAU, que são
maioritariamente constituídos por triglicerídeos (conjunto de 3 ácidos gordos), mais
especificamente ácidos gordos insaturados, nomeadamente o ácido oleico e o linoleico.
Segundo Sadowska, et al. (2008) a reacção do ozono com ésteres de ácidos gordos
insaturados (triglicerídeos) é bem descrita pelo mecanismo de Criegee. Porém, convém
salientar, que o facto de o processo não se dar apenas com um tipo de ácido gordo insaturado
(ácido oleico), mas sim por vários, inclusive ácidos gordos saturados, vai afectar o processo, e
por isso problemas decorrentes da sua presença poderão surgir ao nível da pureza do produto
final. A constituição dos OAU, apresentada neste trabalho (secção 6.2.1) prende-se com o
consumo de óleos alimentares em Portugal.
Neste estudo pretende-se fundamentalmente estudar tecnológica e economicamente sem ter
veleidades de se ser exaustivo, a instalação de uma unidade industrial orientada para a
produção de ácido azelaico a partir de OAU via ozonólise. Ainda que de acordo com o nosso
conhecimento uma tal unidade não exista, esta utilização de OAU permite responder
assertivamente ao problema de génese do trabalho – definição de vias inovadoras,
potencialmente envolvendo valorização de OAU. Nas sub-secções seguintes avaliar-se-á o
projecto de engenharia da linha proposta, bem como a performance económica da operação.
Note-se que o trabalho aqui reportado está ao nível de um projecto conceptual, pois a sua
concretização envolve possivelmente bastante mais informação, bem como eventuais ensaios
a nível laboratorial.
Sendo assim, o maior objectivo é aqui reportar uma via tecnológica que permite responder
potencialmente ao problema e analisar à custa de métricas de performance financeira,
simplistas e estáticas, a sua rentabilidade económica.
66
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.1. Ozonólise
A ozonólise é um método de clivagem oxidativa de alcenos e alcinos utilizando o ozono (O3).
O ozono ao reagir com os alcenos, gera um produto intermediário, designado ozonídeo, que é
então reduzido a produtos carbonilo. As reacções provocam a quebra das ligações duplas
carbono-carbono, sendo então substituídas por uma ligação carbono-oxigénio (ChemWiki,
2010).
A reacção geral do ozono com alcenos segue a seguinte sequência:
Figura 6-1 – Reacção geral do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
O processo de ozonólise divide-se em duas etapas. Na primeira dá-se a adição inicial
eletrofílica do ozono à ligação dupla carbono-carbono, que então forma um intermediário,
designado por molozonídeo. Devido ao facto desta molécula ser muito instável, continua
ainda a reacção e divide-se para formar um carbonilo e uma molécula de óxido de carbonilo,
como se pode observar na Figura 6-2.
Figura 6-2 – Primeira etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
A segunda etapa consiste na reorganização da molécula de carbonilo e do óxido de carbonilo,
para formar um ozonídeo intermediário mais estável, como se observa na Figura 6-3. O poder
oxidativo converte o ozonídeo e dá origem a dois ácidos carboxílicos.
Marta Nunes
67
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Figura 6-3 – Segunda etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010)
De um modo geral, durante a reacção de ozonólise, o ozonídeo primário (molozonídeo) é
formado a partir de um ácido envolvendo uma ligação dupla, como seja o ácido oleico e o
ozono, via cicloadição 1,3. Este é então convertido num ozonídeo secundário, o qual é
designado por 1,2,4-trioxolane (ozonídeo secundário), e pode ser oxidado a ácidos
carboxílicos quando as devidas condições para a reacção oxidativa estão reunidas.
Apresenta-se de seguida a síntese geral do ácido azelaico, tendo como sub-produto o ácido
pelargónico, a partir da ozonólise do ácido oleico:
Figura 6-4 – Representação do processo de ozonólise do ácido oleico (Kockritz & Martin, 2011)
68
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.2. Síntese do processo
A síntese do processo consiste na definição da sequência de operações básicas, com vista a
transformar a matéria-prima em produto final. Esta secção tem como objectivo expor de
forma sucinta as etapas do processamento do ácido azelaico por recurso às bases conceptuais
que definem a utilização das diferentes operações unitárias, bem como, a apresentação do
diagrama do processo e as características da matéria-prima.
As etapas principais do processo de produção do ácido azelaico consistem essencialmente na
quebra das ligações duplas dos ácidos gordos pela adição do ozono, seguida da cisão e
oxidação dos ozonídeos pelo aumento de temperatura. A representação esquemática dessa
sequência de operações unitárias constitui o diagrama de processo (Process Flow Diagram –
PFD).
Na produção industrial de ácido azelaico a matéria-prima geralmente é o ácido oleico, como
já referido anteriormente. No caso em estudo será o óleo alimentar usado. Das etapas de
produção a seguir representadas no diagrama de processo é de salientar a importância das
seguintes:
1. Ozonização: Consiste no ataque das ligações duplas dos ácidos gordos por uma
molécula de ozono. Se esta fase for controlada a uma temperatura relativamente baixa,
a absorção do ozono por parte dos ácidos gordos continua até se atingir a capacidade
máxima de absorção dos ácidos e os produtos resultantes, geralmente designados por
ozonídeos, determinam o rendimento da produção do ácido azelaico.
2. Cisão e oxidação: consiste na cisão e oxidação dos ozonídeos. É necessária a elevação
da temperatura, cerca de 60ºC, até à temperatura de cisão dos ozonídeos para a reacção
ser induzida. Os ozonídeos, agora muito instáveis (molozonídeos) são “quebrados” e
reorganizados, convertendo-se em produtos mais estáveis (ozonídeos secundários).
Estes são de seguida oxidados pelo oxigénio, dando assim origem a ácidos
carboxílicos. Estas reacções são altamente exotérmicas, exigindo um rigoroso controlo
do processo, particularmente da temperatura.
O processo de ozonólise tem sido estudado ao longo dos anos, contudo as variações
introduzidas a nível industrial não são muito significativas. Algumas operações unitárias,
essencialmente de separação, poderão diferir de uma unidade industrial para outra,
dependendo do grau de pureza do ácido azelaico desejado.
A estrutura sintetizada para o processo apresentado neste trabalho assenta na patente US
2,813,113 publicada em 12 de Novembro de 1957 e na informação teórica de alguns artigos
científicos publicados referentes ao processo de ozonólise. Este processo embora seja alvo de
muitos estudos, continua a ter alguns pontos menos conhecidos devido à instabilidade
química dos produtos intermediários e, por este facto, ao longo do trabalho foi necessário
Marta Nunes
69
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
recorrer a algumas considerações, que serão explicitadas sempre que necessário (Kockritz &
Martin, 2011; Goebel, et al., 1957).
De notar, que a patente US 2,813,113 é relativa à produção de ácido azelaico a partir da
ozonólise do ácido oleico. Contudo, esta também refere que o mesmo processo é possível a
partir de outros ácidos gordos insaturados com tamanho de cadeia 10 a 24 carbonos, ou a
partir de gorduras naturais, óleo e sebos, onde facilmente se enquadram os OAU após o prétratamento levado a cabo. Deste modo, permite extrapolar o processo para óleos vegetais,
ainda que os sub-produtos não sejam exactamente iguais. Sadowska, et al. (2008) caracterizou
os óleos vegetais e ácidos gordos puros ozonizados, tendo verificado que a reacção do ozono
com óleos vegetais ocorre quase exclusivamente nas duplas ligações presentes nas cadeias
insaturadas dos ácidos gordos. Por outro lado, notou que a sua saturação e consequente
formação dos ozonídeos foram quase iguais, comparando a reacção a partir de ácidos gordos
puros e a partir de óleos vegetais. Contudo, verificou que o tempo de ozonização para o
consumo total das ligações duplas foi dez vezes maior para os óleos vegetais do que para os
ácidos gordos puros. Este estudo sustenta a ideia de que a ozonólise dos óleos vegetais será,
em parte, semelhante à ozonólise dos ácidos gordos e, portanto, poder-se-á seguir as linhas de
orientação da patente em relação ao ácido oleico. No entanto, há que considerar que
eficiências similares são somente possíveis se houver maior tempo de retenção nos reactores.
É de salientar também que os óleos utilizados como matéria-prima são OAU mas admitindo
que um pré-tratamento é efectuado (secção 3.1.1) considera-se que as propriedades são
semelhantes aos óleos vegetais virgens, não constituindo por isso, um problema na produção
de ácido azelaico.
A unidade de produção de ácido azelaico será desenvolvida visando a produção de cerca de
26000 toneladas anuais, o que se traduz na utilização de 62008 ton/ano de óleo usado. Esta é a
quantidade de óleo que hoje em dia não é devidamente tratada em Portugal, e que
prospectivamente, em cenários de oportunidade, é possível recolher e valorizar, conforme
discutido nos Capítulos 1 e 2. Segundo a patente de referência, a unidade industrial em causa
operará em modo contínuo e as reacções de cisão e oxidação ocorrerão em simultâneo. Este
modo permite ganhos de aproximadamente 10% de ácido azelaico. A possível explicação para
isto é que os aldeídos no geral tendem a polimerizar muito rápido, enquanto a cisão e
oxidação em simultâneo tendem a converter os aldeídos a ácidos antes de eles polimerizarem
e formarem substâncias de elevado peso molecular. A operação em contínuo permite a
diluição dos ozonídeos frescos continuamente e, portanto, optimizar a utilização do volume
reaccional disponível.
Outra escolha importante é a pureza do oxigénio usado. O oxigénio utilizado poderá ser
proveniente do ar ou ser puro (p. ex. 99,5% pureza). No presente trabalho tradicionalmente
considerou-se a utilização de oxigénio puro. Esta escolha deve-se essencialmente a evitar
problemas decorrentes de impurezas e da capacidade do gerador de ozono.
70
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
A seguir serão apresentadas de forma relativamente detalhada todos os passos do processo. A
Figura 6-5 mostra a representação esquemática de toda a linha de produção.
Como se pode observar, na representação gráfica do diagrama do processo, existem duas
zonas distintas (zona 1 e zona 2) na unidade de produção. Esta divisão em duas zonas deve-se
essencialmente a questões de segurança, o equipamento para a geração de ozono requer muita
energia e por isso é um sistema instalado à parte da linha de produção.
Marta Nunes
71
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Legenda:
129
210
TA – Tanque de armazenamento
PC-201
PE-201
201
R – Reactor
202
OX-201
209
123
203
CD – Coluna de destilação
130
VD-201
101
TA-101
B-101
102
PC – Permutador de calor
AB-101
VD-101
205
R-101
R-101
105
107
108
109
110
R-103
111
112
113
106
204
B-103
B-104
132
133
B-105
134
137
136
135
104
TA-102
103
B – Bomba
B-106
A – Aglomerador
PE – Precipitador electrostático
122
VD-202
124
126
128
C – Condensador
B-102
203
125
127
VD-102
OX – Oxigénio
VD-103
V-101
206
S – Secador
122
I – Injector
139
119
S-201
120
PC-102
121
GO – Gerador de Ozono
113
VD-104
118
B-108
VD – Válvula de derivação
138
TA-103
113
CD-101
131
208
207
GO-201
I-201
114
115
116
117
TA-104
B-107
A-101
Figura 6-5 – Diagrama do processo
72
Ácido azelaico
V – Válvula
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.2.1. Ozonização
A primeira etapa a realizar é a absorção do ozono. Esta etapa consiste na clivagem dos ácidos
gordos utilizando uma molécula de ozono, conseguida pelo contacto entre o oxigénio
ozonizado proveniente do sistema de geração de ozono (GO-201) com o óleo, provocando um
aumento de peso no óleo de 17% em massa. O óleo encontra-se no tanque TA-101/102 à
temperatura ambiente (20ºC).
Naturalmente, a composição do óleo alimentar usado varia, em qualquer um dos sectores,
donde é oriundo. No caso de se considerar óleo recolhido maioritariamente do sector
doméstico, e tendo em conta a própria variabilidade de ácidos encontrados nos óleos em causa
é por demais evidente que o processo vai ser sujeito a uma certa variabilidade das
características da matéria-prima. No entanto, e para efeito de projecto, considera-se que o óleo
alimentar usado possui a seguinte composição (Canakci & Sanli, 2008):




Ácido oleico (C18H34O2) – 53%
Ácido linoleico (C18H32O2) – 33%
Ácido linolénico (C18H30O2) – 1%
Outros ácidos – 13%
No processo de ozonização assume-se que as reacções ocorrem exclusivamente nas ligações
duplas, consideração sustentada por (Sadowska, et al., 2008).
O óleo é encaminhado do tanque TA-101/102 para o reactor R-101 e em contra-corrente é
adicionado o oxigénio ozonizado, proveniente do sistema de geração de ozono (GO-201).
Segundo a patente, a injecção em contra-corrente do oxigénio ozonizado é mais eficiente do
que em co-corrente, sendo por isso esse o método utilizado. A eficiência desta etapa está
fortemente dependente das condições de contacto entre o líquido e o gás e, consequentemente,
da agitação. A mistura permanece neste reactor até os ácidos gordos absorverem o máximo
possível de ozono, o que acontece quando o óleo tem um incremento de peso de 17%. Este
processo ocorre entre 20 e 40ºC, a estas temperaturas o oxigénio existente é considerado
inerte. Neste reactor (R-101) é ainda introduzida a corrente 122, que contribuirá como
solvente e ajudará na purificação do ácido azelaico em etapas posteriores. O seu caudal é
metade (m/m) da corrente 105 e entra no reactor à temperatura de 96,3ºC, evitando assim a
necessidade de outro tipo de equipamento para o aquecimento da mistura para atingir os 40ºC.
Ou seja, a corrente de reciclo serve como potenciador da indução da ozonização. No reactor
R-101 a mistura permanecerá 1 hora, valor superior ao previsto (10 minutos) (Kockritz &
Martin, 2011), uma vez que a matéria-prima é o óleo e portanto constituído por vários
componentes e não por um componente apenas (caso do ácido oleico), e como tal, o processo
de absorção do ozono é mais demorado (Sadowska, et al., 2008).
A partir do reactor R-101 são formadas duas correntes (correntes 106 e 123). A corrente 123,
composta por oxigénio, vapor de água, vapor orgânico e partículas é direccionada para o
Marta Nunes
73
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
sistema de geração de ozono. Este trajecto inclui a passagem pelo precipitador electrostático
(PE-201) para remoção das partículas, depois por um condensador (C-201) para remoção do
vapor de água, e seguidamente por uma válvula, VD-201, que fracciona a corrente em duas
(correntes 203 e 204). A corrente 203 é encaminhada para os reactores R-102/103/104, onde
ocorrerão as reacções de cisão e oxidação dos ozonídeos, e a corrente 204 junta-se à corrente
205, constituída pelo oxigénio fresco. A corrente 206, agora formada, passa pelo secador S201 para remoção da humidade ainda existente e é devolvida ao gerador de ozono GO-201.
Nesta etapa são adicionados ¾ do oxigénio total para a formação dos ácidos carboxílicos
(Goebel, et al., 1957).
O sistema de geração de ozono não será explorado de forma pormenorizada neste trabalho,
pela sua complexidade e por se tratar de um equipamento que normalmente se instala por
contratualização com companhias dedicadas a esse negócio.
6.2.2. Cisão e oxidação ozonídeos
Após a passagem pelo reactor R-101, o óleo ozonizado a 40ºC, corrente 106, é direccionada
para os reactores R-102/103/104 que se dispõe em série. Nesta etapa dão-se simultaneamente
as reacções de cisão e oxidação dos ozonídeos. No reactor R-102 entram as correntes 107 e
124, aquecidas até à temperatura de cisão dos ozonídeos, cerca de 60ºC. Este aquecimento
será efectuado apenas uma vez (ou sempre que se inicie o processo), pois a linha de produção
operará de modo contínuo. Neste momento os ozonídeos, também chamados molozonídeos,
são espécies muito instáveis e a sua decomposição, reacção de cisão, é rápida e extremamente
exotérmica. Esta reacção é bem descrita pelo mecanismo de Criegee (Sadowska, et al., 2008).
Os produtos formados são então mais estáveis, sendo seguidamente oxidados pelo oxigénio,
através de reacção também exotérmica, dando origem aos ácidos carboxílicos, mais
especificamente, aos ácidos azelaico, pelargónico, hexanóico, malónico entre outros. A
formação destes ácidos está dependente do número de carbonos da cadeia dos ácidos gordos
que lhe deu origem. É importante a existência de agitação em todos os reactores para
promover um contacto eficiente entre o óleo ozonizado e o oxigénio e para que o calor
transferido seja eficientemente retirado.
Todo este processo dá-se aproximadamente em 4 a 8 horas, sendo o valor de referência
considerado 6 horas (Goebel, et al., 1957), e exige um rigoroso controlo da temperatura, que
deverá ser mantida em torno dos 100ºC (melhores rendimentos de ácido azelaico (Goebel, et
al., 1957)) nos três reactores, sendo para isso necessário um arrefecimento constante em todos
eles por meio de camisas. O arrefecimento em causa é promovido por uma corrente de água
(correntes 132, 134 e 136 para cada reactor) que entrará nas camisas dos reactores à
temperatura de 15ºC. As correntes de água são provenientes de uma torre de refrigeração. A
corrente 107 passa, assim, de reactor em reactor até o processo estar completo.
74
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
De referir que a corrente 203 (oxigénio) passa através da válvula VD-201 e é distribuída pelos
3 reactores através de válvulas divisoras VD-102/103 e V-101. Teoricamente, nesta etapa é
introduzida a quantidade de oxigénio em falta, ¼ do valor total, sendo necessária a adição de
4 átomos de oxigénio por cada ligação dupla (Goebel, et al., 1957).
No último reactor, a corrente 130 constitui uma purga e tem o intuito de libertar alguns
compostos voláteis e, assim, manter o grau de pureza desejada do oxigénio. A corrente 129 é
enviada ao sistema de geração de ozono, mais concretamente ao precipitador electrostático
PE-101 para a remoção de partículas, de modo a que o oxigénio que vai para o gerador de
ozono não vá contaminado.
6.2.3. Separação do ácido azelaico
A corrente 112 sai do reactor R-104 a 100ºC e é direccionada para a coluna de destilação, CD101. Esta coluna operará em condições bastante rigorosas, à pressão de 0,2 bar e à
temperatura de 239ºC. Desta coluna sairá a corrente 118 (destilado), a 185,49ºC, constituída
por ácido pelargónico, hexanóico, malónico entre outros ácidos, que sucessivamente passará
pelo permutador de calor PC-101 para promover o arrefecimento até 96,3ºC e pela válvula
VD-104 que a fraccionará em duas (correntes 121 e 122). A corrente 122, já arrefecida é
agora recirculada para o reactor R-101 e a corrente 121 segue para o tanque TA-103.
A corrente 114, constituída essencialmente por ácido azelaico (~96% de pureza), à
temperatura de 291,71ºC, é dirigida para o aglomerador A-101, que promovendo a remoção
de calor até ao ponto de fusão, permitirá a solidificação do produto na forma de flocos. Estes
serão depois enviados para o tanque TA-104, para serem armazenados.
6.3. Balanços mássicos
O objectivo da produção de ácido azelaico é a utilização de todo o óleo alimentar usado que
hoje em dia não é tratado, cerca de 62008 ton/ano, o que dará uma produção de 26000 ton
anuais deste ácido, com a operação da linha prevista para 333 dias por ano. Nos restantes dias
do ano, o processo de produção está parado, de modo a proceder-se a realização de trabalhos
de manutenção, substituição de equipamentos, limpeza, entre outros.
A realização de balanços materiais permite caracterizar as quantidades de matéria-prima e
reagentes necessários ao processo, bem como estimar todos os fluxos envolvidos, tornando-se
fundamental para calcular as capacidades dos equipamentos necessários ao processo, bem
como efectuar posteriormente uma estimativa dos custos de operação e instalação.
Marta Nunes
75
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Ao caracterizar-se os fluxos mássicos na unidade de produção de ácido azelaico pretende-se
determinar a quantidade exacta de produto, assim como, determinar caudais e composições
das correntes envolvidas no processo de produção admitindo condições de estacionariedade.
O balanço mássico de um processo baseia-se no princípio da conservação da massa enunciado
por Lavoisier:
(6-1)
O desenvolvimento dos balanços materiais foi realizado assumindo que o processo se
comporta estacionariamente, sem que haja acumulação. Para além desta consideração, os
balanços materiais efectuados são fundamentados pelas seguintes suposições:
 Os balanços materiais efectuados têm como base a produção por hora, sendo a
produção esperada de ácido azelaico de 3,26 ton/h (96% pureza);
 Uma vez que existem 3 reactores em série, e que neles ocorrem duas reacções em
simultâneo, para efeitos de cálculo, é assumido que o grau de avanço das reacções é
igual nos três reactores;
Após as considerações expostas, apresentam-se os balanços materiais intrínsecos a cada etapa
do processo a fim de caracterizar todas as correntes envolvidas. A resolução matemática dos
balanços materiais foi desenvolvida em folha de cálculo (MS-Excel 2010), sendo esta uma
ferramenta informática simples, que possibilita de uma forma rápida simular pequenas
alterações. No final desta secção apresenta-se um balanço de massa global ao processo que
permite validar os valores obtidos pelos balanços de massa parciais.
Na resolução dos balanços mássicos, para além das considerações atrás já referidas, começou
por se ter em conta:
 Composição óleo usado (referida na secção 6.2);
 A necessidade de oxigénio, tendo em consideração que o oxigénio ozonizado é
constituído por 20% de ozono;
 Um produto final com 96% pureza;
 O facto de as reacções serem completas, sendo que ocorrem apenas nas ligações
duplas dos ácidos gordos;
 Os ácidos que entram na corrente 122, corrente de reciclo, não reagem.
Como em qualquer processo industrial, existe geralmente a formação de outros sub-produtos
através de reacções secundárias. Na produção de ácido azelaico, a partir de ácido oleico, há a
76
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
produção de cerca de 20% de outros ácidos, sendo os restantes 80% ácido azelaico e
pelargónico (40% de cada) (Goebel, et al., 1957). Ora, no caso em estudo, os ácidos oleico,
linoleico e linolénico, são os ácidos que poderão dar origem ao ácido azelaico, atendendo à
fórmula molecular de cada um e admitindo que se formam cerca de 20% de outros ácidos
quando reagem, os produtos das reacções são os apresentados na Tabela 6-1. Note-se que o
ácido linoleico e linolénico por serem diácidos dão origem aos ácidos hexanóico e malónico,
no primeiro caso e malónico no segundo.
Tabela 6-1 – Valores utilizados nos balanços mássicos para a obtenção dos produtos das reacções
Ácido oleico (%m/m)
40% ácido azelaico
40% ácido pelargónico
20% AFRS
Ácido linoleico (%m/m)
40% ácido azelaico
13,33% ácido malónico
26,67% ácido hexanóico
20% AFRS
Ácido linolénico (%m/m)
40% ácido azelaico
40% ácido malónico
20% AFRS
Assim, e tendo em conta que o grupo outros ácidos que fazem parte da constituição dos OAU
reagem, mas não originam ácido azelaico, os seus produtos daqui em diante serão designados
por ácidos formados por reacções secundárias (AFRS). Este grupo quando entra no reactor R101 não volta a reagir.
6.3.1. Reactor R-101
No reactor R-101 dará entrada a corrente 105 proveniente do tanque de armazenamento (TA101/102), a corrente 122, proveniente da válvula de derivação e a corrente 131 que é a
corrente de oxigénio ozonizado.
A quantidade de oxigénio introduzida neste reactor foi calculada tendo em conta que na
ozonólise do ácido oleico por cada 1000 lb de ácido oleico são necessárias 9700 lb de
oxigénio ozonizado, sendo a composição em ozono de 1,75%. No presente trabalho
considerou-se que a pureza do ozono é de 20% e que a quantidade de oxigénio ozonizado
necessária é introduzida nas mesmas proporções para todos os ácidos constituintes dos OAU.
Admite-se que os ácidos AFRS, azelaico, pelargónico, hexanóico e malónico da corrente 122
(reciclo) não reagem e portanto também não sofrem o aumento de peso neste reactor. Esta
corrente actua como solvente e tem apenas o objectivo de facilitar a separação dos produtos
no final. De referir ainda, que o grupo designado por outros ácidos da corrente 105 é diferente
dos AFRS da corrente 122, sendo que o primeiro grupo reage, dando origem ao grupo
intermediário outros ozonídeos.
Do reactor R-101 surgem duas correntes, a 106 e a 123. A primeira será encaminhada para os
reactores R-102/103/104 e a segunda, constituída essencialmente por oxigénio, vapor de água,
Marta Nunes
77
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
vapor orgânico e partículas, será encaminhada para o precipitador electrostático PE-101. Na
Figura 6-6 pode-se visualizar as correntes de entrada e saída do reactor R-101.
123
AB-101
105
106
122
131
Figura 6-6 – Esquema representativo do reactor R-101
O balanço mássico referente ao reactor R-101 encontra-se na Tabela 6-2.
Tabela 6-2 – Balanço mássico ao reactor R-101
Entrada
Corrente 105
%
Componente
(m/m)
Ácido linolénico
1,00
Ácido oleico
53,00
Ácido linoleico
33,00
Outros ácidos
13,00
Total
100,00
Corrente 122
Ácido azelaico
0,43
Ácido pelargónico
33,06
Ácido hexanóico
13,72
Ácido malónico
7,49
Corrente 106
Massa
(ton)
0,08
4,11
2,56
1,01
7,76
Componente
% (m/m)
Ozonídeos ác. linolénico
Ozonídeos ác. oleico
Ozonídeos ác. linoleico
Ácido pelargónico
Outros ozonídeos
0,70
37,13
23,12
9,90
9,11
Massa
(ton)
0,09
4,81
3,00
1,28
1,18
0,02
1,28
0,53
0,29
Ácido hexanóico
Ácido malónico
AFRS
Ácido azelaico
Total
4,11
2,24
13,56
0,09
100,00
0,53
0,29
1,76
0,02
12,96
Corrente 123
Oxigénio+vapor de
água+ vapor orgânico+
100,00
partículas
Total
100,00
5,27
AFRS
45,30
1,75
Total
100,00
3,88
Corrente 131
Oxigénio
80,00
Ozono
20,00
Total
100,00
Total de entrada
78
Saída
5,27
5,27
1,32
6,59
18,22
Total de saída
18,22
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.3.2.Reactores R-102/103/104
No reactor R-102 entra a corrente 107, proveniente de R-101 e a corrente 124. A corrente de
saída 108 é encaminhada para o R-103. Neste reactor entra também a corrente 126 e sai a
corrente 110 que é direccionada para o próximo reactor (R-103). No reactor R-103, para além
da corrente 111 entra a corrente 128 e saem as correntes 112, 129 e 130. É neste conjunto de
reactores que ocorrem as reacções de cisão e oxidação. A corrente 112 segue para a coluna de
destilação, a corrente 129 vai para o precipitador electrostático (pertencente ao sistema de
geração de ozono) e a corrente 130 é uma purga, para permitir que o oxigénio que circula no
sistema possua um grau de pureza aceitável.
Para calcular a composição destas correntes foi necessário recorrer a várias considerações.
Assumiu-se que os compostos voláteis presentes na corrente 130 traduzem o incremento de
massa que ocorre pela adição do oxigénio. Esta assunção tem por base dados da patente que
referem que os compostos voláteis libertados são equivalentes ao aumento de peso gerado
pela adição do oxigénio (Goebel, et al., 1957). Considera-se, ainda, que todos os compostos
voláteis saem na purga e na corrente 129 sai apenas o oxigénio ozonizado não reagido. O
oxigénio necessário a esta etapa é cerca de 10% da quantidade (m/m) de óleo ozonizado que
entra no reactor R-102 (Goebel, et al., 1957). Este valor tem um excesso 23,6% ao
estequiometricamente necessário e será mantido em todos os reactores.
Na corrente 112 saem os produtos das reacções calculados, tendo por base os valores de
referência da Tabela 6-1. Considera-se, ainda, que o grau de avanço das reacções é igual em
cada reactor, sendo o seu valor de 0,5437, obtido pela expressão que se segue e tendo em
conta que o grau de conversão é 1,
(6-2)
onde
é o grau de avanço.
O balanço efectuado à unidade de reacção assume que ela é constituída por três equipamentos
similares na geometria e na capacidade, a operar em série.
A corrente resultante (corrente 112) é enviada à coluna de destilação para se levar a cabo a
separação do produto final. O balanço mássico ao reactor foi efectuado com base nas
assunções elencadas, estando a representação esquemática dele ilustrada na Figura 6-7.
Marta Nunes
79
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
129
130
R-101
R-101
107
108
109
110
B-104
132
133
R-103
111
112
B-105
134
124
137
136
135
126
128
203
125
127
VD-102
VD-103
V-101
113
Figura 6-7 – Esquema representativo dos reactores R-102/103/104
139
O balanço mássico referente ao reactor R-102 encontra-se na Tabela 6-3. Na corrente 108
surgem agora compostos voláteis que se formam aquando da cisão e oxidação dos ozonídeos.
Tabela 6-3 – Balanço mássico ao reactor R-102
Entrada
Corrente 107
%
Componente
(m/m)
Ozonídeos ác. linolénico
0,70
Ozonídeos ác. oleico
37,13
Ozonídeos ác. linoleico
23,12
Ácido pelargónico
9,90
Outros ozonídeos
9,11
Ácido hexanóico
4,11
Ácido malónico
2,24
Ácido azelaico
0,13
AFRS
13,56
Total
100,00
Corrente 124
Oxigénio
100,00
Total
Total entrada
80
100,00
Saída
Corrente 108
Massa
(ton)
0,09
4,81
3,00
1,28
1,18
0,53
0,29
0,02
1,76
12,96
0,49
Componente
Ozonídeos ác. linolénico
Ozonídeos ác. oleico
Ozonídeos ác. linoleico
Ácido pelargónico
Outros ozonídeos
Ácido hexanóico
Ácido malónico
Ácido azelaico
AFRS
Oxigénio
Compostos voláteis
Total
%
(m/m)
0,31
16,32
10,16
17,32
4,00
7,19
3,92
12,89
24,22
0,70
2,97
100,00
Massa
(ton)
0,04
2,20
1,37
2,33
0,54
0,97
0,53
1,73
3,26
0,09
0,40
13,45
0,49
13,45
Total saída
13,45
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Na Tabela 6-4 apresenta-se o balanço mássico ao reactor R-103.
Tabela 6-4 – Balanço mássico ao reactor R-103
Entrada
Corrente 109
%
Componente
(m/m)
Ozonídeos ác. linolénico
0,31
Ozonídeos ác. oleico
16,32
Ozonídeos ác. linoleico
10,16
Ácido pelargónico
17,32
Outros ozonídeos
4,00
Ácido hexanóico
7,19
Ácido malónico
3,92
Ácido azelaico
12,89
AFRS
24,22
Oxigénio
0,70
Compostos voláteis
2,97
Total
100,00
Corrente 126
Oxigénio
100,00
Total
100,00
Total entrada
Marta Nunes
Saída
Corrente 110
Massa
(ton)
0,04
2,20
1,37
2,33
0,54
0,97
0,53
1,73
3,26
0,09
0,40
13,45
Componente
Ozonídeos ác. linolénico
Ozonídeos ác. oleico
Ozonídeos ác. linoleico
Ácido pelargónico
Outros ozonídeos
Ácido hexanóico
Ácido malónico
Ácido azelaico
AFRS
Oxigénio
Compostos voláteis
Total
%
(m/m)
0,11
5,64
3,51
21,12
1,38
8,77
4,78
19,45
29,69
1,06
4,49
100,00
Massa
(ton)
0,01
0,77
0,48
2,90
0,19
1,20
0,66
2,67
4,07
0,15
0,62
13,72
0,27
0,27
13,72
Total saída
13,72
81
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Na Tabela 6-5 apresenta-se o balanço mássico ao reactor R-104.
Tabela 6-5 – Balanço mássico ao reactor R-104
Entrada
Corrente 111
%
Componente
(m/m)
Ozonídeos ác. linolénico
0,11
Ozonídeos ác. oleico
5,64
Ozonídeos ác. linoleico
3,51
Ácido pelargónico
21,12
Outros ozonídeos
1,38
Ácido hexanóico
8,77
Ácido malónico
Ácido azelaico
AFRS
Oxigénio
Compostos voláteis
Total
4,78
19,45
29,69
1,06
4,49
100,00
Corrente 128
Oxigénio
100,00
Total
100,00
Total entrada
Saída
Massa
(ton)
0,01
0,77
0,48
2,90
0,19
1,20
0,66
2,67
4,07
0,15
0,62
13,72
Corrente 112
%
Componente
(m/m)
Ácido pelargónico
24,75
Ácido hexanóico
10,27
Ácido malónico
5,60
Ácido azelaico
24,51
AFRS
34,86
Total
100,00
Massa
(ton)
3,21
1,33
0,73
3,18
4,52
12,96
Corrente 129
Oxigénio
100,00
Total
100,00
0,15
0,15
Corrente 130
Oxigénio
2,80
Compostos voláteis
97,20
0,02
0,73
Total
100,00
0,76
0,15
0,15
13,86
Total saída
13,86
6.3.3. Coluna de destilação CD-101
Na coluna de destilação CD-101, cuja função é a separação do ácido azelaico dos restantes
produtos de reacção, entra a corrente 113 e saem as correntes 114 (resíduo) e 118 (destilado).
Na Figura 6-8 pode-se visualizar simbolicamente a arquitectura da coluna de destilação CD101.
82
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
118
113
CD-101
114
Figura 6-8 – Esquema representativo da coluna de destilação CD-101
Os balanços mássicos a esta unidade foram levados a cabo tendo em conta fracções de corte
estimadas com base no modelo da coluna objecto de dimensionamento (secção 6.5.3), o qual
foi realizado com base no modelo Radfrac da package Aspen Engineering Suite 2006.
Detalhes sobre o modelo e a sua utilização, neste contexto, serão fornecidos na secção 6.5.3.
No entanto, intrinsecamente, ele acarreta no conceito de andar de equilíbrio e em modelos
reais usados no cálculo de estimativas dos coeficientes de volatilidade.
Na Tabela 6-6 apresentam-se as composições do destilado (corrente 118) e do produto de
cauda (corrente 114), admitindo uma pureza de ácido azelaico de cerca de 96%.
Tabela 6-6 – Composição da corrente 114 (destilado) e da corrente 118 (resíduo) na coluna destilação CD-101
Produtos
Ácido azelaico
Ácido pelargónico
Ácido hexanóico
Ácido malónico
AFRS
Corrente 114
0,0131
1
1
1
0,9727
Corrente 118
0,9869
0
0
0
0,0273
De referir ainda, que na simulação efectuada pelo Aspen Engineering Suite 2006, que permitiu
obter os valores atrás referidos, nos compostos AFRS teve-se em conta que estes podiam ter
cadeia com variado número de carbonos e portanto considerou-se que 50% destes tinham
cadeias com número de carbonos inferior a 8 e os outros 50% tinham cadeia até 15 carbonos.
Mais especificamente, assumiu-se que o ácido octanóico (8 carbonos) representa os
compostos até 8 carbonos e o ácido pentadecanóico (15 carbonos) representa os compostos
até 15 carbonos. Surgiu a necessidade desta suposição, pois na coluna destilação compostos
com número de carbono maior que 9 (número de carbonos do ácido azelaico) poderiam sair
Marta Nunes
83
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
na corrente de resíduo e assim dificultar a separação. Deste modo, com 50% de ácidos com
cadeia de 15 carbonos (situações que representa compostos com elevado número de
carbonos), apenas uma pequena fracção sai na corrente de resíduo, sendo esses os compostos
que constituem as impurezas do ácido azelaico.
É de salientar também, que para além dos ácidos com 15 carbonos, o ácido malónico é um
composto que também exige condições operatórias da coluna bastante severas, pois este ácido
por ter dois grupos ácidos (diácido) tem uma baixa volatilidade. Admitiu-se, por isso, que o
grupo de AFRS não possui nenhum diácido.
A corrente de destilado (118) é posteriormente enviada, após separação, ao equipamento que
tornará o ácido azelaico em flocos (A-101). Isto ocorre por remoção de calor, o que leva a
baixar-lhe a temperatura, promovendo a solidificação, sendo depois embalado e armazenado
no tanque TA-104.
Na Tabela 6-7 encontram-se os valores obtidos no balanço mássico à coluna de destilação
CD-101.
Tabela 6-7 – Balanço mássico à coluna de destilação CD-101
Entrada
Saída
Corrente113
Ácido azelaico
Ácido pelargónico
Ácido hexanóico
Ácido malónico
AFRS
%
(m/m)
24,41
24,75
10,27
5,60
34,86
Massa
(ton)
3,18
3,21
1,33
0,73
4,52
Total
100,00
12,96
Componente
Total Entrada
84
12,96
Corrente 118
%
Componente
(m/m)
Ácido azelaico
0,43
Ácido pelargónico
33,06
Ácido hexanóico
13,72
Ácido malónico
7,49
AFRS <15C
45,30
Total
Massa
(ton)
0,04
3,21
1,33
0,73
4,39
100,00
9,70
Corrente 114
Ácido azelaico
95,52
Ácido pelargónico
0,00
Ácido hexanóico
0,00
Ácido malónico
0,00
AFRS <15C
4,48
Total
100,00
3,13
0,00
0,00
0,00
0,12
3,26
Total Saída
12,96
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.3.4. Balanço global
Para validar os balanços mássicos, apresenta-se um balanço de massa global somando todas
as entradas e saídas (Tabela 6-8).
Tabela 6-8 – Balanço mássico global
Entrada
Saída
Corrente 105
Corrente 123
Componente
%
(m/m)
Massa
(ton)
Ácido linolénico
1,00
0,08
Ácido oleico
53,00
4,11
Ácido linoleico
Outros ácidos
Total
33,00
13,00
100,00
2,56
1,01
7,76
Corrente 122
Ácido azelaico
0,43
Ácido pelargónico
33,06
Ácido hexanóico
13,72
Ácido malónico
7,49
AFRS
45,30
Total
100,00
0,02
1,28
0,53
0,29
1,76
3,88
Corrente 131
Oxigénio
80,00
Ozono
20,00
Total
100,00
5,27
1,32
6,59
Corrente 203
Oxigénio
80,00
Total
100,00
0,91
0,91
%
(m/m)
Massa
(ton)
100,00
5,27
100,00
5,27
2,80
97,20
100,00
0,02
0,73
0,76
Corrente 129
Oxigénio
100,00
Compostos voláteis
0,00
Total
100,00
0,15
0,00
0,15
Corrente 121
Ácido azelaico
0,43
Ácido pelargónico
33,06
Ácido hexanóico
13,72
Ácido malónico
7,49
AFRS <15C
45,30
Total
100,00
0,04
3,21
1,33
0,73
4,39
9,70
Corrente 117
Ácido azelaico
96,21
3,13
Componente
Oxigénio+vapor de água+
vapor orgânico+ partículas
Total
Corrente 130
Oxigénio
Compostos voláteis
Total
Ácido pelargónico
Ácido hexanóico
Ácido malónico
AFRS<15C
Total
Total entrada
Marta Nunes
19,13
Total saída
0,00
0,00
0,00
3,79
100,00
0,00
0,00
0,00
0,12
3,26
19,13
85
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.4. Balanços energéticos
Nesta secção pretende-se avaliar os fluxos energéticos do processo em causa, de modo a
caracterizar os recursos energéticos necessários. No caso dos balanços energéticos há que ter
em consideração as perdas e gerações de calor.
Tendo em conta, o princípio da conservação da energia, também designado pela 1ª lei da
termodinâmica, serão avaliados os fluxos energéticos do processo envolvidos no
processamento do produto. Assumindo estado estacionário, a lei genérica traduz-se na
igualdade:
(6-3)
Os balanços energéticos foram desenvolvidos com o balanço mássico apresentado na secção
anterior (6.3) e nas seguintes considerações:
 A temperatura ambiente é de 20ºC;
 A temperatura e a pressão de referência são 25°C e 1 atm para todos os componentes,
com o estado de referência sendo o estado das espécies às condições PTN;
 Admite-se que o sistema se encontra perfeitamente isolado, não se contabilizando
quaisquer perdas de calor para o exterior ao longo deste;
 Os calores específicos dos ácidos foram calculados com base no método de
Rowlinson-Bondi (Morad, et al., 2000).
Na impossibilidade de determinar os calores específicos (Cp), nomeadamente dos compostos
designados por outros ácidos e AFRS foi efectuada uma média dos valores referentes aos
ácidos presentes na corrente em causa. No caso dos ozonídeos foi assumido que eram iguais
aos dos ácidos correspondentes. É certo que este valor não será exactamente igual, mas a
informação a este respeito é ainda escassa a nível da bibliografia, principalmente por se tratar
de espécies bastante instáveis e difíceis de isolar e medir.
A expressão que permite calcular o calor transferido (Q), num processo isobárico com
variação de temperatura é:
(6-4)
onde é o calor transferido,
é a massa,
é o calor específico e
temperatura da corrente e a temperatura de referência.
86
é a diferença entre a
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.4.1. Reactor R-101
Na Figura 6-6 encontra-se a representação esquemática do reactor R-101. A corrente 105, que
provém do tanque de armazenamento TA-101/102 e a corrente 131 entram no reactor à
temperatura ambiente (20ºC). A corrente 122 entra a 96,3ºC, elevando assim a temperatura da
mistura que se forma dentro do reactor até aos 40ºC.
No balanço a esta unidade considerou-se que esta operava adiabaticamente e a dissipação da
potência fornecida pelo agitador não tinha acção relevante na temperatura do sistema. Na
Tabela 6-9 encontram-se os valores obtidos para o balanço energético ao reactor R-101.
Tabela 6-9 – Valores obtidos do balanço energético ao reactor R-101
Entrada
Saída
Corrente 105
Massa
Entalpia
Componentes
(ton)
(kJ)
Ácido
0,08
-698,85
linolénico
Ácido oleico
4,11
-41089,95
Ácido
2,56
-24370,95
linoleico
Outros ácidos
1,01
-9588,12
Total
7,76
-75747,87
Ácido azelaico
Ácido
pelargónico
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
AFRS
Total
Oxigénio
Ozono
Total
20,00
Corrente 122
0,02
2815,71
1,28
217415,94
0,53
89780,02
0,29
48763,70
1,76
296387,80
3,88
655163,16
Corrente 131
5,27
-24165,99
1,32
-5346,34
6,59
-29512,34
Total entrada
Marta Nunes
T
(ᵒC)
549902,95
96,28
Corrente 106
Massa
Entalpia
T
Componentes
(ton)
(kJ)
(ᵒC)
Ozonídeos ác.
0,09
2697,41
linolénico
Ozonídeos ác. oleico
4,81
152184,50
Ozonídeos ác.
3,00
92052,44
linoleico
Ácido pelargónico
1,28
40689,82
Outros ozonídeos
1,18
36219,24 40,00
Ácido hexanóico
0,53
16475,69
Ácido malónico
0,29
8197,33
AFRS
1,76
53236,66
Ácido azelaico
0,02
510,16
Total
12,96
402263,25
Corrente 123
Oxigénio+vapor de
água+ vapor
5,27
147639,70 40,00
orgânico+ partículas
Total
5,27
147639,70
20,00
Total saída
549902,95
87
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.4.2. Reactores R-102/103/104
Reportando a representação esquemática da secção de reacção à Figura 6-7, o balanço
energético foi desenvolvido tendo em conta o facto de no primeiro reactor se dar o
aquecimento da corrente rica em ácido oleico de 40ºC à temperatura de operação desta
unidade. Esta estratégia revela o facto de, o primeiro reactor funcionar simultaneamente como
permutador e unidade de reacção, explorando uma integração de processos que pode
eventualmente ser objecto de optimização. Por outro lado, configura a necessidade de
fornecer uma boa parte do calor requerido pela secção na unidade R-101. É certo também, que
após o start-up da reacção, e uma vez que esta é altamente exotérmica ocorre a libertação de
calor que preenche os requisitos de aumento da temperatura da corrente de entrada.
Nos reactores R-102/103/104 entra a corrente 107, a 40ºC e uma corrente com o oxigénio
necessário à reacção de oxidação, à temperatura ambiente de 20ºC (proveniente do sistema
geração de ozono).
Para induzir a reacção, mais especificamente à reacção de cisão dos ozonídeos é necessário
elevar a temperatura da mistura à sua temperatura de cisão, cerca de 60ºC. O aquecimento é
efectuado com recurso a água quente. No entanto, este passo da sequência é apenas requerido
no start-up do processo e não será aqui analisado, uma vez que ele representa um regime
trasiente. De qualquer modo, cálculos efectuados apontam para a necessidade de 4,14 ton/h de
água quente a 98ºC.
Tal como já tinha sido enfatizado (Figura 6-5), a operação do reactor envolve a geração de
calor, uma vez que as duas reacções que ocorrem são exotérmicas, envolvendo por isso o
aumento da temperatura.
Analisando informação constante na literatura verificou-se que a energia libertada nas duas
reacções é grande e que não varia consideravelmente de espécie para espécie de ozonídeo. A
energia de activação dos ozonídeos é de 20 kcal/mol (Reusch, 1999), valor idêntico ao
apresentado por Huang & Wang (2008). Neste último estudo, observa-se que para o composto
fulereno (C70) a energia de activação ronda as 16,5 kcal/mol (Huang & Wang, 2008) . Ora,
este composto tem um número de carbonos elevado e contudo a energia de activação não
varia muito relativamente ao valor mencionado por (Reusch, 1999). O mesmo se pode
constatar no trabalho referente à ozonólise do eteno, cuja energia de activação é de 18
kcal/mol (Disselkamp & Dupuis, 2001). Apesar das diferenças dos compostos a barreira
energética que os ozonídeos têm de vencer para reagir é muito semelhante. Esta informação
torna-se importante, uma vez que não foi possível obter dados para os ozonídeos dos ácidos
em estudo, contudo, a energia, neste caso libertada pelas reacções, pelos factos acimas
mencionados, poderá aproximar-se aos valores reportados por Disselkamp & Dupuis (2001)
para o caso do propeno.
88
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Os calores de reacção listados na Tabela 6-10 foram estimados com base na ozonólise do
propeno (Disselkamp & Dupuis, 2001).
Tabela 6-10 – Valores de entalpia da reacção cisão (1) e oxidação (2) (Disselkamp & Dupuis, 2001)
Reacção
Ácido oleico
Ácido linoleico
Ácido linolénico
Outros ácidos
Σ∆Hreacção 1+2 (kJ)
∆Hreacção1
(kcal/mol)
-55,6
-55,6
-55,6
-55,6
∆Hreacção2
(kcal/mol)
-115,6
-115,6
-115,6
-115,6
-19760293,1
Como se pode observar a entalpia das duas reacções é consideravelmente elevada. Assim, a
exotermicidade das reacções leva a que se verifique um aumento de temperatura da massa nos
reactores. Deste modo, e como se pretende controlar a temperatura a cerca de 100 C, nos
reactores nesta fase, valor que proporciona melhores rendimentos de ácido azelaico, uma
corrente de água fria circulará numa camisa de arrefecimento para assegurar que tal seja
conseguido. Esta corrente entrará no reactor à temperatura de 15ºC e virá da torre de
refrigeração, onde será novamente devolvida.
Na Figura 6-7 ilustra-se o balanço ao sistema de reacção. É de referir, que a massa reaccional
ao passar de reactor em reactor vai tendo cada vez menos ácido oleico, linoleico e linolénico
capazes de reagir. Ora, isto leva a prever que no primeiro reactor, sendo a extensão da reacção
significativamente maior, vai ocorrer uma potencial maior libertação de calor, o que configura
a necessidade de aqui o caudal de água de arrefecimento a usar ser maior.
Marta Nunes
89
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Na Tabela 6-11 encontra-se o balanço energético ao reactor R-102.
Tabela 6-11 - Balanço energético ao reactor R-102
Entrada
Componentes
Ozonídeos ác.
linolénico
Ozonídeos ác.
oleico
Ozonídeos ác.
linoleico
Ácido
pelargónico
Outros
ozonídeos
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Ácido azelaico
AFRS
Total
Corrente 107
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
0,09
2697,41
4,81
152184,50
3,00
92052,44
1,28
40689,82
1,18
36219,24
Saída
T
(ºC)
40,00
0,53
16475,69
0,29
8197,33
0,02
1,76
12,96
510,16
53236,66
402263,25
Corrente 124
Oxigénio
Total
0,49
0,49
-2263,97
-2263,97
Água
Total
Calor reacção
Corrente 132
24,81 -1053032,18
24,81 -1053032,18
10743454,25
Total entrada
10090421,34
90
20,00
15,00
Componentes
Ozonídeos ác.
linolénico
Ozonídeos ác.
oleico
Ozonídeos ác.
linoleico
Ácido
pelargónico
Outros
ozonídeos
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Ácido azelaico
AFRS
Oxigénio
Compostos
voláteis
Total
Água
Total
Total saída
Corrente 108
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
0,04
7827,48
2,20
401690,86
1,37
254583,23
2,33
418669,36
0,54
100191,84
T
(ºC)
100,00
0,97
173097,80
0,53
94504,70
1,73
3,26
0,09
311870,47
584617,34
6545,30
0,40
49688,01
13,45
2403286,40
Corrente 133
24,81
7687134,95
24,81
7687134,95
10090421,34
98,00
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
O balanço ao reactor R-103 é apresentado na Tabela 6-12.
Tabela 6-12 – Balanço energético ao reactor R-103
Componentes
Ozonídeos ác.
linolénico
Ozonídeos ác.
oleico
Ozonídeos ác.
linoleico
Ácido
pelargónico
Outros
ozonídeos
Ácido
hexanóico
Entrada
Corrente 109
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
0,04
7827,48
2,20
401690,86
1,37
254583,23
2,33
418669,36
0,54
100191,84
100,00
0,97
173097,80
Ácido malónico
0,53
94504,70
Ácido azelaico
ARFS
Oxigénio
Compostos
voláteis
Total
1,73
3,26
0,09
311870,47
584617,34
6545,30
0,40
49688,01
13,45
2403286,40
Oxigénio
Total
Corrente 126
0,27
-1230,90
0,27
-1230,90
Corrente 134
Água
16,53 -701499,60
Total
16,53 -701499,60
Calor de reacção
5841098,04
Total entrada
Marta Nunes
T
(ºC)
7541653,93
Componentes
Ozonídeos ác.
linolénico
Ozonídeos ác.
oleico
Ozonídeos ác.
linoleico
Ácido
pelargónico
Outros
ozonídeos
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Ácido azelaico
ARFS
Oxigénio
Compostos
voláteis
Total
Saída
Corrente 110
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
0,01
2756,85
0,77
141475,98
0,48
89664,50
2,90
520930,76
0,19
35287,68
1,20
215377,52
0,66
117587,79
2,67
4,07
0,15
479804,19
731014,80
10103,91
0,62
76702,84
13,72
2420706,82
T
(ºC)
100,00
20,00
15,00
Água
Total
Total saída
Corrente 135
16,53
5120947,11
16,53
5120947,11
98,00
7541653,93
91
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Na Tabela 6-13 encontra-se o balanço energético ao reactor R-104.
Tabela 6-13 – Balanço energético ao reactor R-104
Entrada
Componentes
Ozonídeos ác.
linolénico
Ozonídeos ác.
oleico
Ozonídeos ác.
linoleico
Ácido
pelargónico
Outros
ozonídeos
Ácido
hexanóico
Ácido malónico
Ácido azelaico
AFRS
Oxigénio
Compostos
voláteis
Total
Oxigénio
Total
Saída
Corrente 111
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
92
Componentes
Ácido
pelargónico
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Ácido
azelaico
0,01
2756,85
0,77
141475,98
0,48
89664,50
2,90
520930,76
0,19
35287,68
1,20
215377,52
0,66
2,67
4,07
0,15
117587,79
479804,19
731014,80
10103,91
Oxigénio
Total
0,62
76702,84
Oxigénio
13,72
2420706,82
Corrente 128
0,15
-669,23
0,15
-669,23
Corrente 136
Água
9,34
-396255,87
Total
9,34
-396255,87
Calor de reacção
3175740,82
Total entrada
T
(ºC)
5199522,55
100,00
Corrente 112
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
3,21
576529,17
1,33
238364,54
0,73
130137,82
3,18
571107,90
ARFS
4,52
810609,49
Total
12,96
2326748,92
Corrente 129
0,15
10569,29
0,15
10569,29
T
(ºC)
100,00
100,00
Corrente 130
Compostos
voláteis
Total
0,02
1469,40
0,73
91390,50
0,76
92859,91
100,00
20,00
15,00
Água
Total
Total saída
Corrente 137
9,34
2892667,84
9,34
2892667,84
5199522,55
98,00
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.4.3. Coluna de destilação CD-101
A representação esquemática da coluna de destilação CD-101 está na Figura 6-8. O ácido
azelaico e restantes produtos são provenientes da secção de reacção à temperatura de 100ºC.
O balanço energético foi desenvolvido com base em alguns parâmetros utilizando o modelo
Radfrac da package Aspen Engineering Suite 2006. Este modelo foi sobretudo usado numa
perspectiva de dimensionamento do equipamento em causa (secção 6.5.3). No entanto, alguns
dados físicos foram estruturados por recurso a ele, nomeadamente capacidades calorificas e
calores de vaporização. Nesta instância o modelo permitiu, para além da estimativa das
composições das correntes de destilado e resíduo (secção 6.3.3), a estimativa do perfil de
temperaturas na coluna por forma a obter-se a separação requerida, correspondente às
fracções de corte previamente objectivo. Foi assumido que a coluna opera a 0,2 bar, tendo o
modelo Radfrac permitido estimar a temperatura do destilado (no condensador), cujo valor é
185,49ºC e a temperatura do resíduo, 291,71ºC. O calor requerido é fornecido na forma de
vapor.
A Tabela 6-14 apresenta o balanço à coluna de destilação CD-101. Dos resultados é evidente
que esta unidade é largamente consumidora de energia. Nesta perspectiva, é conveniente
proceder à optimização da unidade e haverá aqui algum espaço para integração energética.
Tabela 6-14 - Balanço energético à coluna de destilação CD-101
Entrada
Componentes
Ácido
azelaico
Ácido
pelargónico
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Outros ácidos
Total
Corrente 113
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
3,18
739609,90
3,21
712209,17
1,33
303147,65
0,73
4,52
12,96
185453,55
1059262,75
2999683,02
Calor a fornecer
4285031,96
Total entrada
7284714,97
Marta Nunes
Saída
T
(ᵒC)
Componentes
Corrente 118
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
Ácido azelaico
Ácido
pelargónico
100,00 Ácido hexanóico
0,04
18541,63
3,21
1389340,44
1,33
584384,07
T
(ᵒC)
185,49
Ácido malónico
0,73
341932,84
Outros ácidos
4,39
1964696,46
Total
9,70
4298895,43
Corrente 114
Ácido azelaico
3,13 2871716,45
Outros ácidos
0,12
114103,09
Total
3,26 2985819,54
Total saída
291,71
7284714,97
93
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.4.4. Permutador de calor PC-101
Na Figura 6-9 encontra-se a representação esquemática do permutador de calor PC-101. Nesta
unidade entram as correntes 119 e 138 e sairão as correntes 120 e 139. Com este equipamento
pretende-se arrefecer a corrente 119, proveniente da coluna de destilação, mais
especificamente pretende-se a diminuição da temperatura de 185,49ºC para 96,28ºC. Este
arrefecimento é promovido por uma corrente de água que entra a 15ºC e sai a 90ºC, o que
representa a necessidade de 7,88 ton/h de água.
139
119
120
PC-102
138
Figura 6-9 – Esquema representativo do permutador de calor PC-101
Na Tabela 6-15 encontra-se o balanço efectuado ao permutador de calor PC-101.
Tabela 6-15 – Balanço energético ao permutador de calor PC-101
Entrada
Componentes
Corrente 119
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
Ácido azelaico
Ácido
pelargónico
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
0,04
18541,63
3,21
1389340,44
1,33
584384,07
0,73
341932,84
Saída
T
(ºC)
185,49
Outros ácidos
4,39 1964696,46
Total
9,70 4298895,43
Corrente 138
Água
7,88
-354769,58
Total
7,88
-354769,58
Total entrada
94
3944125,85
15,00
Componentes
Ácido
azelaico
Ácido
pelargónico
Ácido
hexanóico
Ácido
malónico
Outros
ácidos
Total
Água
Total
Corrente 120
Massa
Entalpia
(ton)
(kJ)
0,04
7040,20
3,21
543611,41
1,33
224479,60
0,73
121925,29
4,39
741067,05
9,70
1638123,55
Corrente 139
7,88
2306002,30
7,88
2306002,30
Total saída
3944125,85
T
(ºC)
96,28
90,00
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.5. Dimensionamento
Nesta secção é apresentado o dimensionamento preliminar dos equipamentos envolvidos na
linha de produção sintetizada. Este cálculo visa a determinação das principais características
específicas de cada uma das unidades da linha de produção, que possibilitem, posteriormente,
estimar custos de instalação e de operação da unidade industrial. É importante referir que as
estratégias de dimensionamento usadas se sustentam por modelos estacionários de processo,
não garantindo, naturalmente, a optimização da performance e dos custos.
A maioria dos equipamentos é de aço inoxidável, pois este material tem elevada resistência à
oxidação e apresenta uma boa resistência à corrosão, mesmo quando exposto a condições
adversas, como sejam temperaturas e pressões elevadas. É, ainda, um material inerte, de
limpeza fácil, tendo baixa rugosidade superficial.
6.5.1. Tanques de armazenamento TA-101/102/103/104
O dimensionamento dos tanques de armazenamento consiste na determinação do volume,
diâmetro, altura e espessura, bem como a selecção do material de construção. Relativamente a
este último aspecto, um dos principais factores a ter em conta é a resistência do material à
corrosão.
No processo de dimensionamento de um tanque de armazenamento é necessário tomar as
seguintes considerações (Coulson & Richardson, 1988):
 Existe uma espessura mínima que garante a estabilidade estrutural dos tanques, para
que suportem o seu próprio peso, o peso do fluido no seu interior e eventuais cargas
acidentais. Essa espessura inclui também uma margem de corrosão, normalmente de 2
mm.
 As tampas dos tanques são de formato elipsoidal e a sua espessura é igual à espessura
do respectivo tanque;
 Uma razão de altura de líquido/diâmetro do tanque igual a um, de modo a obter-se o
design óptimo, assumindo que o mesmo material é usado para tampa e abas;
 Uma margem de 20% de segurança relativamente ao volume óptimo, de modo a
acautelar eventuais situações extremas ao nível da operação;
 Os tanques de armazenamento iniciais (TA-101/102) possuem um tempo de residência
de 2 dias por prevenção, caso ocorram atrasos na entrega da matéria-prima,
prevenindo desta forma paragens de produção. O tanque de armazenamento TA-103
possui um tempo de residência de 1 dia;
 Os tanques de armazenamento operam à temperatura ambiente (20ºC) e à pressão
atmosférica;
Marta Nunes
95
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
  material escolhido para todos os tanques foi aço inoxidável, pelas suas propriedades
(robustez e resistência à corrosão) e custo.
O algoritmo usado para o cálculo dos tanques consiste, basicamente, na assunção de um
tempo de residência e no cálculo do volume requerido (com 20% de sobredimensionamento).
De seguida, considerando geometria cilíndrica, são dimensionados o diâmetro e a altura. De
referir que as dimensões resultantes não foram standardizadas. A Tabela 6-16 apresenta os
parâmetros obtidos para o dimensionamento dos tanques de armazenamento.
Tabela 6-16 – Dimensionamento dos tanques de armazenamento
Tanque
Material
(ton/dia)
τ (dias)
Vtanque (m3)
Di (m)
Htanque (m)
etanque (mm)
De (m)
etampa (mm)
onde,
TA-101
TA-102
TA-103
TA-104
Aço
inoxidável
93,11
2
253,00
6,36
7,95
12,00
6,39
12,00
Aço
inoxidável
93,11
2
253,00
6,36
7,95
12,00
6,39
12,00
Aço
inoxidável
139,69
1
189,79
5,78
7,23
12,00
5,81
12,00
Aço
inoxidável
78,18
1
106,22
4,77
5,96
12,00
4,79
12,00
é o caudal mássico que neles passa, τ é o tempo de retenção, Vtanque é o volume do tanque,
Di é o diâmetro interno, Htanque é a altura, etanque é a espessura da parede, De é o diâmetro externo e etampa
é a espessura da tampa.
6.5.2. Reactores R-101/102/103/104
Em termos genéricos os reactores químicos são as peças de equipamento ondem ocorrem as
transformações químicas dos reagentes em produtos. Para o dimensionamento dos reactores
da linha de produção é fundamental conhecer à partida o caudal de alimentação, o número de
unidades e o seu modo de operação. Estas dimensões de decisão foram definidas na secção
6.2, onde com base em critérios comummente usados na síntese de processos químicos e em
informação bibliográfica relevante, se considerou que a secção de reacção é formada por 3
unidades em série a operar continuamente, que se seguem ao reactor de absorção de O 3.
A literatura disponível, tanto quanto é do nosso conhecimento, não define cinéticas para as
reacções de cisão e oxidação. Este facto levou a que o dimensionamento das unidades de
reacção tivesse sido feito com base no conceito de tempo de retenção e em dados
bibliográficos onde valores para este parâmetro são referidos (Goebel, et al., 1957).
96
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
O dimensionamento de um reactor envolve o cálculo:
 Do volume do vaso onde ocorre a reacção
 Das condições de operação que maximizam a performance, nomeadamente
temperatura e pressão;
 Das características mecânicas do vaso, nomeadamente da espessura da parede;
 Das características do sistema de agitação, nomeadamente a tipologia do agitador e a
sua potência;
 Das características do isolamento do reactor, quando necessário;
 Das características dimensionais das camisas de arrefecimento, nomeadamente quando
é necessário aquecer ou arrefecer a massa reaccional.
Na indústria é frequente a associação de reactores contínuos perfeitamente agitados
(continuous stirred tank reactors – CSTR), principalmente quando as reacções são lentas.
Associando reactores em série permite diminuir o volume de cada um deles e também a
potência da agitação necessária para obter uma mistura homogénea, diminuindo assim os
custos (Walas, et al., 2010).
A medida usada para estimar o tamanho de reactores contínuos é o tempo de retenção (τ).
Este corresponde ao tempo necessário para processar em média um volume de alimentação
definido e atingir um dado grau de conversão. No caso vertente, é referido que as reacções de
cisão e oxidação requerem um tempo de retenção 6 horas (Goebel, et al., 1957), tendo-se
assumido que os reactores são geometricamente iguais e, por isso, cada um deles tem um
tempo de retenção de 2 horas. Quanto ao reactor para a absorção do ozono foi considerado um
tempo de retenção de 1 hora.
O dimensionamento mecânico do vaso foi determinado de modo análogo ao dos tanques de
armazenamento. Considerando a geometria cilíndrica dos reactores procedeu-se também ao
cálculo do diâmetro e altura de cada um, admitindo, tal como nos tanques, uma relação altura
de líquido/diâmetro do reactor igual a um. O volume do agitador foi desprezado para o
cálculo do volume total de cada reactor, mas teve-se em conta a margem de segurança de
20%. O material escolhido para o dimensionamento dos reactores foi o aço inoxidável.
 Reactor R-101
O R-101 encontra-se à pressão atmosférica e a temperatura de operação entre os 20 e os 40ºC.
Na Tabela 6-17 encontram-se listados os parâmetros referentes às dimensões da unidade R101.
Marta Nunes
97
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Tabela 6-17 – Características mecânicas do reactor R-101
Reactor
R-101
Material
τ (h)
Q (m3/h)
Vreactor
Di (m)
Hreactor (m)
ereactor (mm)
De (m)
etampa (mm)
Aço inoxidável
1,00
10,88
13,60
2,40
3,00
9,00
2,42
9,00
onde, Q é o caudal volumétrico, τ é o tempo de retenção, Vreactor é o volume do reactor, Di é o
diâmetro interno, Hreactor é a altura do reactor, ereactor é a espessura da parede do reactor, De é o diâmetro
externo e etampa é a espessura da tampa.
- Sistema de agitação
O agitador a instalar depende do tipo de mistura requerida, da capacidade do recipiente e,
principalmente, das propriedades do fluido, nomeadamente a viscosidade. Para fluidos pouco
viscosos utilizam-se agitadores de pequenas dimensões e elevadas velocidades e para fluidos
muito viscosos usam-se princípios de escolha opostos (Walas, et al., 2010).
O uso de agitação é fundamental neste processo industrial, ela tem como função principal
homogeneizar a mistura reaccional, garantindo o contacto máximo entre o líquido e o gás.
Nesta etapa a agitação determinará em grande medida a eficiência da absorção do ozono e,
consequentemente, o aumento de peso dos ácidos gordos.
O sistema de agitação escolhido para o R-101 foi uma turbina do tipo Rushton com seis pás
planas. Esta escolha justifica-se pelos valores relativamente baixos de viscosidade da mistura.
É de referir que o sistema de agitação permite genericamente obter uma mistura perfeitamente
homogénea. De forma a minimizar os vórtices formados, sugere-se uma estrutura de quatro
anteparos dispostos verticalmente a toda a altura do tanque e imediatamente adjacentes à
parede do mesmo.
O dimensionamento do sistema de agitação foi levado a cabo com base no algoritmo referido
em (Walas, et al., 2010). Na Tabela 6-18 encontram-se listadas as principais características do
sistema de agitação da unidade R-101.
98
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Tabela 6-18 – Dimensionamento do sistema de agitação do reactor R-101
Agitação
R-101
Tipo agitador
DA (m)
HA
N (rps)
Nº anteparos
Largura dos anteparos (m)
Largura das pás (m)
Altura das pás (m)
S (m)
Potência agitação (kW)
Turbina com 6 pás planas
0,80
0,80
1,71
4,00
0,24
0,20
0,16
0,1
6,23
onde DA é o diâmetro do agitador, HA é a altura do agitador ao fundo do reactor, N é o número de
rotações por segundo e S é o comprimento da pá do agitador montada no disco central.
- Espessura do isolamento do reactor
O último passo do dimensionamento do reactor será estimar a espessura do isolamento.
Para a determinação da espessura do isolamento do reactor é necessário ter em conta o perfil
de temperaturas e a transferência de calor do interior do reactor para o exterior. Considerou-se
que o topo e a base do cilindro estão perfeitamente isoladas, apenas existindo transferência de
calor pela parte lateral do cilindro. Admitiu-se ainda que a temperatura ambiente era cerca de
20ºC.
Para o dimensionamento da espessura do isolamento do reactor foi utilizado um método
iterativo até se obter uma temperatura exterior no isolamento aceitável, próximo da
temperatura ambiente (Geankoplis, 2003; Johnson, 1999).
Na Tabela 6-19 apresentam-se os parâmetros obtidos para as dimensões do isolamento do
reactor R-101.
Tabela 6-19 – Dimensionamento da espessura do isolamento do reactor R-101
Isolamento
Material isolamento
hint (J/(sKm2))
hext (J/(sKm2))
Treactor (ᵒC)
Text (ᵒC)
TS,e (ᵒC)
eisolamento (m)
r3
Marta Nunes
R-101
Fibra mineral com reforço
metálico
95,36
5,00
40,00
20,00
22,41
0,05
1,27
99
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
onde, hint é o coeficiente de transferência de calor no interior, hext é o coeficiente de
transferência de calor no exterior , Treactor é a temperatura no interior do reactor, Text é a
temperatura no exterior do reactor, TS,e é a temperatura da superfície externa do reactor,
eisolamento é a espessura do isolamento e r3 é o raio exterior do reactor envolvendo o isolamento.
 Reactores R-102/103/104
Os reactores R-102/103/104 foram dimensionados de modo semelhante ao reactor R-101. De
acordo com o que foi definido na secção 6.2, onde se apresentou a análise que levou à
definição do diagrama de processo, o tempo de retenção desta unidade de reacção é de 6
horas, com cada unidade tendo um valor de
horas. Na Tabela 6-20 encontram-se os
parâmetros obtidos para o dimensionamento dos reactores R-102/103/104.
Tabela 6-20 – Características mecânicas dos reactores R-102/103/104
Reactor
R-102
R-103
R-104
Material
τ (h)
Q (m3/h)
Vreactor
Di (m)
Hreactor (m)
ereactor (mm)
De (m)
etampa (mm)
Aço inoxidável
2
3,97
29,80
3,12
3,90
12,00
3,14
12,00
Aço inoxidável
2
3,97
29,80
3,12
3,90
12,00
3,14
12,00
Aço inoxidável
2
3,97
29,80
3,12
3,90
12,00
3,14
12,00
onde, Q é o caudal volumétrico, τ é o tempo de retenção, Vreactor é o volume do reactor, Di é o
diâmetro interno, Hreactor é a altura do reactor, ereactor é a espessura da parede do reactor, De é o diâmetro
externo e etampa é a espessura da tampa.
100
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
- Sistema de agitação
O sistema de agitação escolhido foi uma turbina do tipo Rushton com seis pás planas. Na
Tabela 6-21 encontram-se os parâmetros obtidos para o dimensionamento do sistema de
agitação dos reactores R-102/103/104.
Tabela 6-21 - Dimensionamento do sistema de agitação dos reactores R-102/103/104
Agitação
Tipo agitador
DA (m)
HA
N (rps)
Nº anteparos
Largura dos anteparos (m)
Largura das pás (m)
Altura das pás (m)
S (m)
Potência agitação (kW)
R-102
R-103
R-104
Turbina com 6
pás planas
1,04
1,04
1,71
4,00
0,31
0,26
0,21
0,13
33,39
Turbina com 6 pás
planas
1,04
1,04
1,71
4,00
0,31
0,26
0,21
0,13
36,40
Turbina com 6
pás planas
1,04
1,04
1,71
4,00
0,31
0,26
0,21
0,13
39,41
onde DA é o diâmetro do agitador, HA é a altura do agitador ao fundo do tanque, N é o número
de rotações por minuto e S é o comprimento da pá do agitador montada no disco central.
- Camisa aquecimento/arrefecimento
As reacções que ocorrem nos reactores R-102/103/104 são extremamente exotérmicas. Para
contornar essa situação é necessário arrefecer os reactores, de modo a que a temperatura não
ultrapasse os 100ºC. Este arrefecimento vai ser efectuado por meio de uma camisa de
arrefecimento, onde circulará água, que entrará a 15ºC. As camisas foram dimensionadas
tendo em conta a quantidade de água necessária para arrefecer a massa reaccional, valor
apresentado anteriormente nos balanços energéticos (secção 6.4). A camisa de arrefecimento
envolverá o reactor (excepto o topo), de modo a aumentar a eficiência da transferência de
calor.
A Tabela 6-22 apresenta as características das camisas de arrefecimento dos reactores R102/103/104, a qual foi calculada tendo por base os valores dos coeficientes de transferência
de calor obtidos dentro da camisa, ou seja, quando foram considerados aceitáveis. O calor a
retirar a partir das camisas vem do balanço energético (secção 6.4.2.).
Marta Nunes
101
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Tabela 6-22 – Dimensionamento das camisas dos reactores R-102/103/104
Camisa
R-102
R-103
R-104
Material
τ (h)
Aço inoxidável
0,33
Aço inoxidável
0,33
Aço inoxidável
0,33
Tentrada água (ᵒC)
15,00
15,00
15,00
Qágua (m3/h)
24,81
16,53
8,99
Vcamisa (m3)
8,19
5,46
2,97
ecamisa (m)
0,40
0,27
0,15
eparede camisa (mm)
12,00
12,00
12,00
Hcamisa (m)
3,90
3,90
3,90
onde τ é o tempo de retenção, Tentrada água é a temperatura de entrada da água na camisa, Qágua é o
caudal volumétrico, Vcamisa é o volume da camisa, ecamisa é a espessura da camisa, eparede camisa é a
espessura da parede da camisa e Hcamisa é a altura da camisa.
- Espessura do isolamento do reactor
O isolamento dos reactores foi dimensionado de modo análogo ao isolamento do reactor R101, com a diferença, de que estes têm uma camisa de arrefecimento. O material seleccionado
foi fibra mineral com reforço metálico para os três reactores. É de salientar que o isolamento
foi calculado admitindo uma temperatura média da água de arrefecimento na camisa, 56,5ºC,
valor médio entre a temperatura de entrada e de saída da água da camisa. O calor perdido em
cada reactor rondará os 700 W. Na Tabela 6-23 apresentam-se as dimensões do isolamento
dos reactores R-102/103/104.
Tabela 6-23 – Dimensionamento da espessura do isolamento dos reactores R-102/103/104
Isolamento
Material isolamento
Treactor (ᵒC)
Text (ᵒC)
TS,e (ᵒC)
eisolamento (m)
Raio total
(reactor+camisa+isol)
R-102
R-103
R-104
Fibra mineral com reforço
metálico
100
20
22,89
0,08
Fibra mineral com
reforço metálico
100
20
22,88
0,08
Fibra mineral com
reforço metálico
100
20
22,88
0,08
2,06
1,94
1,81
onde, Treactor é a temperatura no interior do reactor, Text é a temperatura no exterior do reactor, TS,e é a
temperatura da superfície externa do reactor e eisolamento é a espessura do isolamento.
102
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.5.3. Coluna de destilação CD-101
No dimensionamento da coluna de destilação pode considerar-se que esta é constituída por
uma série de andares em equilíbrio que vão promovendo, sucessivamente, o enriquecimento
nos componentes mais voláteis, da fase vapor que sobe na coluna, e nos componentes menos
voláteis, da fase líquida que desce na coluna. Deste modo, considera-se que uma coluna de
destilação se encontra dividida em duas secções, a zona de empobrecimento, que se localiza
por baixo da alimentação, onde os componentes mais voláteis são transferidos para a fase de
vapor e a zona de rectificação localizada acima da alimentação, onde ocorre a concentração
dos constituintes mais voláteis na fase de vapor (Seader & Henley, 2006).
Na linha de operação do processo descrito na secção 6.2, a coluna de destilação tem como
objectivo separar o ácido azelaico dos outros constituintes, saindo o ácido azelaico na corrente
de resíduo. O conceito base para o dimensionamento da coluna destilação CD-101 é a
assunção de pratos de equilíbrio como representação dos andares físicos da coluna. No prato
de equilíbrio assume-se a existência de equilíbrio termodinâmico entre as composições dos
componentes em ambas as fases.
O projecto da coluna de destilação foi desenvolvido no módulo Radfrac do software Aspen
Engineering Suite 2006. O modelo utilizado para a estimativa das propriedades dos
componentes e dos dados de equilíbrio foi o UNIFAC. O módulo Radfrac modela a coluna
como um conjunto de equações algébricas não lineares, envolvendo os balanços mássicos a
cada prato e fase (M), os balanços entálpicos em cada prato (H), as restrições decorrentes de
cada fase e prato, o somatório das fracções molares ser 1 (S) e as equações que permitem
calcular o coeficiente de actividade de cada constituinte em cada fase e prato (A). A
agregação das equações algébricas dá origem ao modelo, vulgarmente designado por MASH,
é resolvido no módulo Radfrac à custa de métodos exactos (Seader & Henley, 2006). O
método usado é baseado no algoritmo do tipo Newton para a resolução do sistema de
equações algébricas. A eficiência do método é optimizada por uma estratégia envolvendo a
adaptatividade do factor de aceleração α.
Com base no software mencionado foram realizadas várias simulações para determinar as
características da coluna, sendo que inicialmente foram feitas algumas considerações
relativamente à coluna:






Tem condensador total;
Tem reebulidor do tipo kettle;
A queda de pressão ao longo da coluna é de 0,01 bar;
A % pureza aproximadamente de 96%;
Opera próximo de 0,20 bar;
O caudal de alimentação e a composição da corrente de alimentação são as que
resultam do balanço mássico (secção 6.3.3);
Marta Nunes
103
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
 A composição do destilado e o respectivo caudal são impostos de forma a satisfazer os
requisitos da unidade;
 A razão de refluxo foi igualmente imposta.
Note-se que o design final foi obtido após a optimização relativamente a um conjunto de
cenários simulados, em que se variou a razão de refluxo e o número de andares de equilíbrio.
É de salientar que a coluna operará com condições bastantes rigorosas, que se prendem pelo
facto de haver componentes a separar do ácido azelaico com volatilidades relativas próximas
da sua. Isto é, a eficiência de separação do ácido azelaico relativamente a outros componentes
é baixa (Douglas, 1998). Por outro lado, é de destacar que sendo o ponto de vaporização dos
vários constituintes relativamente elevado, a temperatura de operação é elevada, podendo ser
reduzida com o intuito de haver poupança económica ao nível dos custos energéticos, pelo
uso de vácuo. Foi constatado, que enquanto o ácido malónico é facilmente separado, saindo
na corrente de destilado, ácidos de grande cadeia saem como resíduo, formando potenciais
impurezas do ácido azelaico. No entanto, a simulação de diferentes condições e arquitecturas
para a coluna permitiu chegar a uma unidade capaz de satisfazer os requisitos de pureza do
mercado (96%). Na Tabela 6-24 apresentam-se os parâmetros de dimensionamento da coluna
de destilação CD-101.
Tabela 6-24 – Características da coluna de destilação CD-101
Coluna destilação
CD-101
F (ton/h)
Nº pratos
Andar da alimentação
Talimentação (ᵒC)
Palimentação (bar)
Ptopo (bar)
Queda pressão (bar)
Taxa destilado (ton/h)
Razão refluxo (mássica)
Tipo condensador
Tipo reebulidor
Ttopo (ᵒC)
Tbase (ᵒC)
Qcondensador (kW)
Qreebulidor (kW)
12,96
14
7
100
1
0,19
0,01
9,44
2
total
kettle
185,49
291,71
-3699,72
4640,56
onde Talimentação é a temperatura de entrada da alimentação, Palimentação é a pressão da corrente
de alimentação, Ptopo é a pressão no topo da coluna, Ttopo é a temperatura no topo da coluna,
Tbase é a temperatura na base da coluna, Qcondensador é o calor que é necessário retirar no
104
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
condensador e Qreebulidor é calor que é necessário fornecer ao reebulidor. Note-se que a
corrente de alimentação antes de entrar na coluna é passada num compressor, de onde sai a
0,20 bar.
- Características mecânicas
Após se ter calculado as características da coluna foi possível efectuar o seu dimensionamento
mecânico, como se demonstra na Tabela 6-25. Os pratos escolhidos foram do tipo fluxo
cruzado, por serem os mais utilizados, e mais concretamente pratos-peneiro (Coulson &
Richardson, 1988).
Tabela 6-25 – Dimensionamento mecânico da coluna de destilação CD-101 (Coulson & Richardson, 1988)
Coluna destilação
CD-101
Material coluna
Material prato
Espaçamento entre pratos (m)
Espessura dos pratos (m)
Altura da represa (m)
ρv (kg/m3)
ρL (kg/m3)
QV (kg/s)
L (kg/s)
V (kg/s)
FLV
k1
uF (m/s)
uV (m/s)
Dc (m)
Ae (m2)
As (m2)
Altura que vai desde a base até ao último prato (m)
Altura que vai desde o topo até ao primeiro prato (m)
Hcoluna (m)
ecoluna (mm)
Aço inoxidável
Aço inoxidável
0,500
0,003
0,006
0,743
851,318
13,877
6,451
8,436
0,023
0,100
3,382
2,368
3,168
7,883
8,759
1,2
1,2
9,526
12,7
onde ρv é a massa volúmica do vapor, ρL é a massa volúmica do líquido, QV é o caudal mássico
de vapor admissível, L é o caudal da corrente de líquido descendente acima do andar de
alimentação, V é o caudal da corrente de vapor ascendente acima do andar de alimentação,
FLV é o factor de caudal líquido-vapor, k1 é uma constante obtida a partir do figura 11.27
referido em (Coulson & Richardson, 1988), uF é a velocidade de inundação, uV é a velocidade
Marta Nunes
105
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
de inundação do vapor, Dc é o diâmetro da coluna, Ae é a área efectiva, As é a área da secção
transversal, Hcoluna é a altura da coluna e ecoluna é a espessura da parede da coluna.
6.5.4. Permutador de calor PC-101
Permutadores de calor são equipamentos utilizados na indústria para promoverem a
transferência de calor entre dois fluidos. Os mais utilizados na indústria são os permutadores
de carcaça e tubos, essencialmente pelas suas vantagens, nomeadamente, a grande área de
superfície num pequeno volume, que oferece boa facilidade de fabrico e limpeza.
O dimensionamento do permutador PC-101 foi feito por recurso ao software Aspen
Engineering Suite 2006, mais concretamente ao módulo HTFS, sendo para tal necessário
especificar as características das correntes de entrada e saída. Na Tabela 6-26 listam-se os
parâmetros característicos do permutador de calor PC-101.
Tabela 6-26 – Dimensionamento do permutador de calor PC-101
Permutador de calor
PC-101
Diâmetro da carcaça (mm)
Comprimento dos tubos requerido (mm)
Comprimento dos tubos actual (mm)
Diâmetro externo dos tubos (mm)
Espessura da parede dos tubos (mm)
Padrão dos tubos
Queda de pressão (carcaça) (bar)
Queda de pressão (tubos) (bar)
Espaço de chicanas (mm)
Nº chicanas
Nº passagens no tubo
Nº tubos
Coeficiente transferência calor carcaça (W/m2K)
Coeficiente transferência calor tubo (W/m2K)
Coeficiente global transferência calor (W/m2K)
Resistência total (W/K)
211,56
4626,2
4650
19,05
1,24
Triangular
0,034
0,029
215
20
1
47
982,8
1592,7
574,4
0,00174
6.5.5. Aglomerador A-101 - “flaker”
O aglomerador (flaker) terá como papel promover a formação de flocos de ácido azelaico à
custa da sua solidificação. Nesse processo é removido calor. Na Figura 6-10 ilustra-se
genericamente uma unidade de aglomeração.
106
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Figura 6-10 –Flaker ( Proton Engineering Works, 2011)
Um flaker de tambor rotativo consiste num tambor cilíndrico que é refrigerado internamente,
neste caso por meio de água. Enquanto o cilindro gira, um filme líquido solidifica-se, adere à
parte externa do tambor e é posteriormente removido da superfície por uma lâmina, na forma
de flocos ou de filme, no caso do ácido azelaico será em flocos. Este equipamento operará de
modo contínuo ( Sharpenn Technologies, 2011). Sabendo que o ponto de fusão do ácido
azelaico se dá a 111ºC é necessário remover 2314153 kJ/h, o que equivale a 6,9 ton/h de água
a entrar a 20ºC e a sair a 99ºC.
6.5.6. Gerador de ozono
O sistema de geração de ozono será introduzido no presente trabalho de forma sucinta, devido
à sua complexidade e ao facto de o seu dimensionamento ter de ser feito em colaboração com
o fornecedor, no sentido de se adquirir uma solução capaz de preencher os requisitos em
causa.
Os dois princípios fundamentais usados na geração de ozono são luz UV e a descarga corona.
A geração de ozono por descarga corona é mais comum e tem mais vantagens, como sejam a
maior sustentabilidade da unidade, a maior produção de ozono e a maior rentabilidade em
relação ao custo. O método baseado no uso de luz UV pode ser viável para a produção de
pequenas quantidades de ozono (laboratórios, por exemplo). Assim prevê-se que na linha de
produção de ácido azelaico, o equipamento funcionará por descarga corona.
No processo do efeito corona, para além do gerador de ozono, são necessários outros
equipamentos complementares, nomeadamente o precipitador electroestático, o condensador e
o secador, para purificar o oxigénio que circula no sistema de modo a garantir uma geração de
ozono eficiente. O electrofiltro visa eliminar pequenas partículas e gotículas que provenham
das unidades de reacção e separação nas correntes recicladas. O condensador e o secador
visam retirar do sistema alguma água que pode potencialmente reduzir a eficiência da
produção de ozono a partir de O2.
Marta Nunes
107
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
O gerador de ozono consiste basicamente num tubo (dieléctrico) no qual passa o oxigénio e
onde uma descarga eléctrica constante (efeito corona), gerada através de um transformador
nele existente, promove a reacção da molécula de oxigénio com um ião O- formando-se uma
molécula de ozono. A Figura 6-11 representa o gerador de ozono com base em descarga
eléctrica.
Eléctrodo
Fonte de alta
voltagem
Dieléctrico
O2
Abertura de descarga
Ozono
Eléctrodo
Figura 6-11 – Representação esquemática de um gerador por descarga corona, adaptado de (Lenntech, 2011)
Factores importantes que influenciam a geração de ozono são a qualidade do oxigénio,
nomeadamente a presença ou não de humidade e a sua pureza, parâmetros eléctricos e
temperatura da água de arrefecimento. A geração de ozono é acompanhada pela formação de
calor e por isso é necessário que o ozonizador seja arrefecido, no caso em estudo será por
meio de água. A reacção do ozono é reversível, sendo favorecida pelo aumento da
temperatura. Para limitar a decomposição do ozono, a temperatura na abertura de descarga
não deve ser superior a 25 °C.
Na Figura 6-12 apresenta-se um gerador de ozono de grande capacidade, 250 – 350 kg
ozono/h. Para a linha de produção satisfazer as necessidades considera-se que serão
necessárias cinco unidades similares a esta (Degrémont Technologies, 2011).
Figura 6-12 – Gerador de ozono (Degrémont Technologies, 2011)
108
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.6. Análise económica
A análise económica é um ponto fulcral na determinação da viabilidade de um projecto que
requer investimento de um montante considerável. É um conjunto sistematizado de
informação que vai permitir avaliar a viabilidade do projecto a priori. Mais uma vez se alerta
para o facto de a análise levada a cabo no presente trabalho não ter veleidades de ser exaustiva
e contabilizar todos os factores relevantes a ter em linha de conta. Antes, é seu objectivo,
fornecer uma gama de custos associados aos aspectos mais relevantes, referentes à operação
de uma linha de produção de ácido azelaico a partir de OAU.
Na análise económica que se segue, foram utilizados preços constantes, quer do produto, quer
da matéria-prima. A análise de performance estática visa sobretudo dar uma ideia da
viabilidade do projecto no cenário actual. As métricas usadas para caracterizar
economicamente a linha são estáticas, considerando-se concretamente que as decisões
estratégicas associadas à unidade são estabelecidas no início do período de vida da mesma.
A análise económica é baseada nos seguintes pressupostos:








O projecto tem um tempo de vida de 20 anos;
Tem um tempo associado às depreciações das instalações de 10 anos;
No ano 1 a fábrica encontra-se em construção;
No ano 2 a fábrica opera apenas a 50% da sua capacidade, sendo que no ano 3
e restantes, opera na capacidade máxima;
Toda a produção é vendida;
O capital circulante utilizado é 30% do capital requerido;
O valor investido na fábrica no primeiro ano é de 70% do capital requerido e
no segundo ano é de 30%;
A taxa de rentabilidade é 8,51%.
Para avaliar a viabilidade económica do projecto é necessário determinar o custo dos
equipamentos e a sua instalação, assim como os custos de operação intrínsecos ao processo.
Estes custos podem ser estimados com base em diferentes métodos, nomeadamente com base
em dados de fornecedores, heurísticas baseadas em factores dimensionais característicos ou
em dados de produção instalada em unidades concorrentes. As três estratégias serão usadas na
presente análise. Por outo lado, é de realçar que a tónica foi posta na estimativa dos custos
f.o.b. (free on board) das peças mais relevantes envolvidas no processo, a partir das quais se
calculou uma estimativa do custo de instalação da unidade.
Marta Nunes
109
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.6.1. Custos de instalação
Para determinar o custo dos equipamentos recorreu-se ao software disponível online da
McGraw-Hill e também a algumas heurísticas disponíveis na literatura (Walas, et al., 2010).
Estas últimas foram utilizadas como base de comparação dos valores obtidos pelos
simuladores e também para estimar o custo da torre de refrigeração.
Uma vez que, os valores obtidos são em dólares dos Estados Unidos (USD) houve a
necessidade de os converter para euros (€), utilizando a taxa de câmbio referente à média
mensal de Outubro de 2011, em que 0,7296 € equivale a 1 USD ( Banco de Portugal, 2009).
De referir ainda que os permutadores de calor foram determinados a partir do módulo HTFS
do Aspen Engineering Suite 2006. O custo f.o.b. de cada equipamento apresenta-se na Tabela
6-27.
Tabela 6-27 – Custo das peças de equipamentos mais relevantes
Equipamento
Custo (€)
R-101
R-102
R-103
R-104
CD-101
PC-101
TA-101
TA-102
TA-103
TA-104
Torre refrigeração
OZ-101
PE-101
S-101
C-101
A-101
206550
312998
312998
312998
86562
8926
76170
76170
68545
58656
239309
35020800
168346
72960
7296
1000000
Total
38029285
A unidade de produção para além dos equipamentos atrás mencionados envolve um conjunto
de bombas. Apesar do seu custo estar envolvido no custo de equipamento geral, pelo facto de
não ter sido feita uma análise muito detalhada à sua real necessidade, elas não foram
englobadas no equipamento considerado mais relevante. Da Tabela 6-27 há que reter que o
sistema de geração de ozono é a parcela mais relevante do custo do equipamento, o que
decorre directamente da complexidade e inovação tecnológica associada a este tipo de
sistemas, ainda hoje em dia.
110
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
6.6.2. Custos de operação
Nesta secção pretende-se quantificar os custos que estão directamente relacionados com a
produção de ácido azelaico, particularmente os referentes a termos que dependem do nível de
produção, vulgarmente da classe dos custos variáveis. Ou seja, o custo referente às matériasprimas e ao consumo de utilidades.
Utilidades
O aquecimento e arrefecimento das correntes num processo industrial é essencial, para isso
recorre-se a diversos equipamentos. No presente trabalho as utilidades consistem
essencialmente em energia eléctrica e água, portanto o único equipamento necessário para
satisfazer as necessidades é uma torre de refrigeração. Esta terá como objectivo refrigerar a
água proveniente do arrefecimento dos reactores, dos permutadores de calor e do gerador de
ozono.
 Matérias-primas
Na linha de produção as matérias-primas para a produção de ácido azelaico são o óleo
alimentar usado e o oxigénio. Como apresentado no Capítulo 2, o óleo terá um custo de
recolha de 350 €/m3 e de tratamento de 2 €/m3, ou seja, tem um custo total de 352 €/m3. O
oxigénio circulará num circuito fechado e portanto é necessário apenas introduzir uma
quantidade de oxigénio continuamente. Este valor é a soma do oxigénio ozonizado gasto na
etapa de absorção do ozono, correspondente a 1,32 ton/h (Tabela 6-2) e do oxigénio
consumido e perdido na etapa de cisão e oxidação, correspondente a 0,76 ton/h (Tabela 6-3,
Tabela 6-4 e Tabela 6-5) Isto dá origem a um consumo de 2,08 ton/h. O oxigénio tem um
custo de 2412,7 €/ton (Remediation & Natural Attenuation Services, 1998). Na Tabela 6-28
lista-se o custo expectável anual das matérias-primas.
Tabela 6-28 – Custo anual das matérias-primas
Matéria-prima
OAU
Oxigénio
Total
Marta Nunes
Necessidade
(ton/ano)
Custo anual
(k€)
62008
16579
23724
39999
63723
111
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
 Custos com fornecimento de serviços externos
Para além da matéria-prima, existem serviços que se tornam indispensáveis à produção de
ácido azelaico, nomeadamente a água de arrefecimento e a electricidade que é requerida por
todos os equipamentos.
A água utilizada na linha de operação circulará em circuito fechado, admitindo que a
necessidade de água fresca diária é de 10% relativamente à água circulante, para compensar
eventuais perdas no sistema. Associado às necessidades de água fresca está ainda o custo de
operação da torre de refrigeração.
A tarifa da água considerada foi de 1,4141 €/m3 (EPAL, 2011). Na Tabela 6-29 encontram-se
as necessidades anuais de água e o seu custo.
Tabela 6-29 – Necessidade e custo anual da água
Necessidade
(m3/ano)
Custo anual
(€)
337415
477138
O custo de refrigerar a água na torre de refrigeração é 0,042 USD/m3 (Peters & Timmerhaus,
1991), sendo este valor referente ao ano de 1990, que actualizado para 2011 corresponde a
0,077 USD/m3. Anualmente é necessário refrigerar cerca de 2257057 m3 de água, sendo o seu
custo de 126454 €.
Na Tabela 6-30 encontra-se a estimativa das necessidades de electricidade e o seu custo anual.
A tarifa de electricidade aplicada é referente à média das horas de ponta, cheias e vazio para
longas utilizações, sendo o valor de 0,11 kWh (EDP, 2011). As estimativas das potências
requeridas decorrem dos balanços térmicos apresentados na secção 6.4 e do dimensionamento
(secção 6.5).
Tabela 6-30 – Necessidade e custo anual de electricidade
Equipamentos
Necessidade
(kW)
Custo anual
(€)
R-101
R-102
R-103
R-104
A-101
OZ-101
PE-101
S-101
Iluminação
Total
6,23
33,39
36,40
39,41
20
9000
10
20
2
9167
5480
29358
32004
34650
17582
7912080
8791
17582
1758
8059286
Total com margem de 20%
112
9671143
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
A partir da Tabela 6-30 verifica-se que energeticamente a unidade será muito exigente,
destacando-se a unidade de geração de ozono. Reconhece-se que a potência energética
requerida pelo gerador de ozono poderá potencialmente causar problemas de implementação
da unidade de produção em causa.
A energia requerida pela coluna de destilação CD-101 será fornecida por vapor de alta
pressão, nomeadamente a 350ºC e a 4,5MPa. O custo do vapor é de 10,56 €/ton (IChemE
Education Subject Group, 2002). A necessidade anual de vapor é de 43344 ton e o seu custo
457709 €.
 Matérias subsidiárias
As matérias subsidiárias correspondem às embalagens usadas para embalagem e
comercialização do produto final. Neste caso, considerou-se que a comercialização é feita em
embalagens de 5 kg em média, com a forma de recipientes de polipropileno. O custo estimado
para elas é 0,20 €/unidade. Isto traduz-se num custo total de 1041326 €.
 Custos de operação totais
Os custos totais de operação apresentam-se na Tabela 6-31.
Tabela 6-31 – Custos de operação
Matérias/serviços
Custo anual (€)
Matéria-prima
Serviços externos
Refrigeração água
Vapor alta pressão
Matérias subsidiárias
Total
63723329
10148281
126454
457708
1041326
75497099
Com base na análise da Tabela 6-31 consta-se que os custos de operação definem em grande
medida a rentabilidade do projecto. Sem dúvida que o custo da água e da electricidade
(serviços externos) constituem uma parcela fundamental para os custos da unidade de
produção em causa. Como já referido, a unidade de geração de ozono é energeticamente
muito exigente, reflectindo-se consideravelmente nos custos de operação.
Marta Nunes
113
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.6.3. Vendas de ácido azelaico
O preço de venda do ácido azelaico ficou estabelecido em 20 €/kg. Vários produtores
praticam preços de venda superiores (City chemical, 2010; EBioChem, 2011). No entanto,
assume-se um valor conservador. A razão prende-se com o facto de o ácido azelaico
produzido nesta linha de operação ser proveniente de OAU e, portanto, de matéria-prima
reutilizada. Para além de, eventualmente, ter uma pureza inferior, os preços praticados
poderão ser também menores pela redução dos custos conseguida pela matéria-prima.
Na Tabela 6-32 apresentam-se as vendas de ácido azelaico quando a linha de operação está a
trabalhar na capacidade máxima (a partir do terceiro ano).
Tabela 6-32 – Vendas de ácido azelaico
Vendas
Produção (ton/ano)
Peso das embalagens (kg)
Unidades produzidas
Preço (€/unidade)
Preço (€/ton)
Vendas
26033
5
5206631
100
20000
520663092
 Investimento de Capital Fixo
Para a determinação do investimento de capital fixo a partir do custo do equipamento f.o.b.
(estimado na Tabela 6-27) utilizou-se o método de Guthrie (Peters & Timmerhaus, 1991). Na
Tabela 6-33 encontram-se os parâmetros que permitem calcular o factor correctivo
.
Tabela 6-33 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo
Parâmetro
Materiais para a instalação
Overheads da construção
Instalação de equipamentos
Transporte, seguros e taxas
0,68
0,2
0,06
0,21
Despesas de engenharia contratada
0,21
Despesas gerais
0,25
Total
3,24
Assim, o valor do investimento de capital fixo é de 123 M€. Este valor é consideravelmente
elevado, verifica-se mais uma vez a importância da unidade de geração de ozono.
114
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
 Taxa de actualização
Para avaliar a viabilidade do projecto calcula-se a taxa de actualização (i), também designada
de taxa mínima de rentabilidade do projecto. Esta taxa depende essencialmente de três
parâmetros: taxa de juro nominal de uma aplicação sem risco (T1); prémio de risco (T2) que
corresponde à taxa dependente da evolução económica, financeira, global e sectorial do
projecto, assim como do montante total envolvido e da taxa de inflação (T3). A taxa de
actualização (i) é calculada com base na Equação 6-5.
(6-5)
Na Tabela 6-34 apresentam-se os valores dos parâmetros envolvidos.
Tabela 6-34 – Taxas aplicadas no projecto (Economia e Finanças, 2011; IG Markets, 2011)
Taxas
T1 (%)
T2 (%)
T3 (%)
i (%)
4,25
7
2,8
8,51
A taxa de actualização determinada foi, assim, de 8,51%, sendo esta a taxa que um potencial
investidor requer para investir no projecto. A Tabela 6-35 apresenta as considerações usadas
para determinar a rentabilidade do projecto.
Tabela 6-35 – Parâmetros obtidos para utilizar na demonstração de resultados
Parâmetros
Custo de capital (ICF) (€)
Produção máxima (€/ano)
Custo de equipamento (Cp) (€)
Capital circulante (€)
Capital Fixo (€)
Valor investido no 1ºano (%)
Valor investido no 2º ano (%)
Capacidade de produção 1ºano (ton)
Capacidade de produção 2ºano (ton)
Capacidade de produção 3ºano e posteriores (ton)
Taxa sobre o lucro (%)
Taxa de actualização (i)
Custos de operação (€/ano)
Tempo de vida útil dos equipamentos (ano)
Tempo de amortização dos equipamentos (anos)
Marta Nunes
1,23E+08
2,60E+04
3,80E+07
3,69E+07
1,23E+08
70
30
0
1,30E+07
2,60E+07
34,5
8,51
7,55E+07
20
10
115
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
 Depreciação
A depreciação expressa a perda de valor que os imóveis utilizados no decorrer da actividade
empresarial sofrem ao longo do tempo, em resultado do desgaste ou perda de utilidade. Para
determinar a depreciação teve-se em conta o método do balanço com dupla descida em que o
valor é depreciado anualmente ao longo de 10 anos, período considerado como sendo o de
amortização do equipamento. A depreciação, segundo esta metodologia, determina-se com
base na seguinte expressão:
(6-6)
onde
é a depreciação pelo método do balanço com dupla descida,
é o investimento
do capital fixo,
é o somatório da depreciação dos anos anteriores e n o tempo de
depreciação dos equipamentos.
Na Tabela 6-36 estão apresentados os fluxos financeiros do projecto obtidos a partir das
tabelas anteriores. O capital requerido diz respeito à quantidade mínima requerida para
financiar a construção da linha de produção, tendo em conta neste caso, apenas os custos de
capital. O taxado é o valor do lucro ao qual se retira a depreciação. A taxa paga é o valor do
taxado ao qual se impõe a taxa sobre o lucro das empresas praticada em Portugal (34,5%). O
cash-flow é a medida de rentabilidade do projecto. Os registos relevantes para a medida do
cash-flow são as receitas e as despesas efectivas em numerário. Partindo do valor do cashflow actualizado de cada ano foi possível estimar o cash-flow actualizado e acumulado,
essencial para averiguar a rentabilidade do projecto, com base em métricas de performance
estática.
116
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Tabela 6-36 – Mapa de demonstração de resultados
Ano
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
Capital
Requerido
Vendas
(€)
Custo de
Operaçao
(€)
Lucros
(€)
8,62E+07
7,39E+07
0
2,60E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
5,21E+08
0
3,77E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
7,55E+07
0
2,23E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
-3,69E+07
Marta Nunes
Depreciação
(€)
2,46E+07
1,97E+07
1,58E+07
1,26E+07
1,01E+07
8,07E+06
6,46E+06
5,17E+06
4,13E+06
Taxados
(€)
Taxa paga
(€)
Cash-flow
(€)
Cash-flow
actualizado
(€)
Cash-flow actual
acumulado (NPV)
(€)
0
1,98E+08
4,01E+08
3,85E+08
3,72E+08
3,62E+08
3,54E+08
3,48E+08
3,43E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
4,45E+08
0
6,83E+07
1,38E+08
1,33E+08
1,28E+08
1,25E+08
1,22E+08
1,20E+08
1,18E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
1,54E+08
-8,62E+07
4,27E+07
2,31E+08
2,37E+08
2,41E+08
2,45E+08
2,47E+08
2,50E+08
2,51E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,16E+08
2,53E+08
-7,94E+07
3,62E+07
1,81E+08
1,71E+08
1,60E+08
1,50E+08
1,40E+08
1,30E+08
1,21E+08
9,55E+07
8,80E+07
8,11E+07
7,47E+07
6,89E+07
6,35E+07
5,85E+07
5,39E+07
4,97E+07
4,58E+07
4,94E+07
-7,94E+07
-4,32E+07
1,38E+08
3,09E+08
4,69E+08
6,19E+08
7,59E+08
8,89E+08
1,01E+09
1,10E+09
1,19E+09
1,27E+09
1,35E+09
1,42E+09
1,48E+09
1,54E+09
1,59E+09
1,64E+09
1,69E+09
1,74E+09
117
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
6.6.4. Métricas de performance financeira
A rentabilidade dos projectos de investimento é normalmente avaliada através de critérios que
permitem decidir se esse projecto deve ou não ser implementado. Os critérios de avaliação de
projectos mais usuais são: VAL – Valor Actualizado Líquido; TIR – Taxa Interna de
Rentabilidade; PRI – Período de Recuperação do Investimento e IR – Índice de Rentabilidade.
 Valor Actualizado Líquido (VAL)
O VAL avalia investimentos através da comparação entre os Cash-flows gerados por um
projecto e o capital investido e é dado pela expressão:
(6-7)
em que,
é o Cash-flow do ano t, n é o tempo de vida da fábrica, i a taxa de actualização.
Para o projecto em questão obteve-se um VAL de 933.394.467 €.
 Taxa Interna de Rentabilidade (TIR)
A TIR de um projecto que necessita de investimento é a taxa de actualização que anula o
valor actual líquido ao fim do tempo de vida da unidade. Pode dizer-se que a taxa interna de
rentabilidade é a taxa mais elevada a que o investidor pode contrair um empréstimo para
financiar um investimento sem perdas.
(6-8)
Em termos de decisão, considera-se que se a TIR < Taxa de actualização, VAL < 0, o projecto
não é atractivo, se a TIR > Taxa de actualização, VAL > 0, o projecto é atractivo e se a TIR =
Taxa de actualização, VAL = 0, o projecto não gerará lucro nem perda considerável.
A taxa interna de rentabilidade do projecto em questão é de 123% e, sendo, a taxa de
actualização de 8,51%, verifica-se que o projecto é aceitável e economicamente viável.
118
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
 Período de Recuperação do Investimento (PRI)
O PRI (ou payback period) é o tempo necessário para a recuperação do capital investido tendo
como base os cash-flows actualizados e acumulados. Trata-se do período de tempo a partir do
qual o cash-flow actualizado e acumulado passa de negativo a positivo. Assim, quanto maior
o valor do PRI, maior é o risco do projecto.
Cash-flow actualizado acumulado (M€)
Na Figura 6-13 apresenta-se uma representação do Cash-Flow actualizado acumulado em
função do tempo de vida do projecto (20 anos). E evidente que o período de recuperação do
investimento é de 2,2 anos.
2,00E+03
1,50E+03
1,00E+03
5,00E+02
0,00E+00
1
2
3
4
5
6
7
8
9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20
-5,00E+02
-1,00E+03
Tempo (anos)
Figura 6-13 – Cash-flow actualizado ao longo do tempo de vida do projecto
 Índice de Rentabilidade (IR)
O índice de rentabilidade
ou retorno do investimento (Return of Investement) é a
medida da rentabilidade efectiva do projecto por unidade de capital investido e é determinado
pela seguinte expressão:
(6-9)
onde I é o investimento. Em termos de decisão, se
, o valor actual líquido do projecto é
nulo, se
, o valor actual líquido é superior a zero e, logo, o projecto é rentável e se
, o valor actual líquido do projecto é negativo, o que indica que este não é rentável.
Marta Nunes
119
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
Para o projecto em causa obteve-se um valor de IR igual a 14, o que indicia que o projecto é
rentável.
Deste modo, verifica-se que o projecto de produção de ácido azelaico é um processo rentável
e economicamente viável, tendo um período de recuperação do investimento de apenas 2,2
anos. Os restantes indicadores financeiros confirmaram também esta ideia.
Contudo, há que ter em conta que no presente trabalho não foram contabilizadas todas as
parcelas dos custos de equipamentos, somente os mais importantes. Exemplo disso, é a
existência de bombas na unidade de produção que têm um custo de aquisição e também de
operação que pode ser considerável. A massa salarial dos funcionários da unidade de
produção, o edifício e terreno também não foram tidos em conta. Apesar destes custos não
serem contabilizados verifica-se que o processo em causa é energeticamente intensivo e, de
facto, será o consumo energético ou de um modo geral os custos de operação que definirão a
rentabilidade do projecto. De qualquer forma, a estrutura de custos indicia que são os custos
de operação, particularmente os que estão associados à energia, que contribuem em grande
parte para a viabilidade económica. É de salientar a importância da unidade de geração de
ozono. Por outro lado, é por demais evidente que uma integração do processo optimizada
poderá minimizar os custos energéticos. Outra consideração relevante nesta análise é a de que
a procura permite consumir todo o produto processado, que este tem uma qualidade estável,
passível de lhe conferir um valor de mercado de 20 €/kg.
6.6.5. Análise de sensibilidade da performance económica
A análise de sensibilidade da performance económica tem como principal objectivo o estudo
da influência da alteração das variáveis mais relevantes na viabilidade do projecto. Desta
forma, a análise de sensibilidade permite traçar vários cenários de análise e verificar se a
viabilidade do projecto se mantém face às alterações nas suas variáveis mais relevantes. As
variáveis a ter em conta, neste caso, são o custo da matéria-prima e do produto.
Na Figura 6-14 representa-se a análise de sensibilidade referente ao preço de venda do
produto final.
120
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
Cash-flow actualizado acumulado
(M€)
5000
4000
3000
2000
1000
0
0
10
20
-1000
30
40
50
Custo produto (€/kg)
Figura 6-14 – Cash-flow actualizado em função do preço de venda do produto
A partir da análise da Figura 6-14 verifica-se que o preço limite de venda do ácido azelaico é
de 7,4 €/kg, valor a partir do qual o projecto deixa de ser rentável. Ora, o preço de venda
considerado no projecto em estudo é de 20 €/kg, verificando-se que existe uma margem
importante entre o valor limite e o preço praticado, não esquecendo que este valor (20 €/kg) é
já bastante inferior à média do preço de outras unidades concorrentes.
Na Figura 6-15 representa-se a análise de sensibilidade relativamente ao preço de aquisição da
matéria-prima, neste caso apenas se considerou o OAU.
Cash-flow actualizado acumulado
(M€)
2500,00
2000,00
1500,00
1000,00
500,00
0,00
-500,00
0
1000
2000
3000
4000
5000
-1000,00
-1500,00
-2000,00
Custo matéria-prima (€/m3)
Figura 6-15 - Cash-flow actualizado em função do preço da matéria-prima (OAU)
Marta Nunes
121
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
A partir da análise da Figura 6-15 verifica-se que o preço limite a partir do qual o projecto
deixa de ser rentável é de aproximadamente 2268 €/m3. Este valor é em larga medida superior
ao considerado no projecto.
Após a caracterização de toda a unidade de produção de ácido azelaico verifica-se que esta é
bastante exigente, principalmente ao nível energético, colocando questões do ponto de vista
da implementação industrial. Deste modo, poder-se-á pensar nesta linha de produção a uma
escala menor. De facto, tendo em conta a importância dos ozonizadores perspectiva-se que a
redução da capacidade da unidade poderá permitir menos unidades de ozonização. Ora, isto,
terá um impacto realmente importante quer nos custos de instalação, quer particularmente na
potência eléctrica necessária, uma vez que se tratam de unidades de necessidades muitos
relevantes.
O projecto apresentado neste trabalho está desenvolvido para a capacidade máxima de
produção de ácido azelaico a partir de OAU potencialmente disponíveis em Portugal.
Contudo, sabe-se que, por agora, é difícil recolher todos os OAU produzidos e, portanto, a
quantidade de OAU disponível como matéria-prima é também menor. A unidade para
tratamento de uma produção inferior à apresentada, é uma solução, uma vez que os custos de
operação diminuiriam e o processo seria mais fácil de controlar, continuando a ser
economicamente viável. A Figura 6-16 ilustra esse facto. A análise de Break-Even demonstra
o valor a partir do qual o projecto deixa de gerar lucros, designado por ponto crítico (Porfírio,
et al., 2004). Esta análise permite, assim, avaliar a flexibilidade de um projecto face à
incerteza do mercado (Porfírio, et al., 2004).
Apesar do resultado da análise em causa, ela dará apenas uma ideia do valor de produção
anual de ácido azelaico a partir do qual se gera lucro, devido ao facto de no processo existir
um equipamento que é dependente da produção, o gerador de ozono, influenciando assim os
custos fixos. A capacidade desta unidade é discretamente variável, tal como os custos de
operação a ela associados.
Para a representação da Figura 6-16 considerou-se o custo fixo como sendo igual à
amortização, ou seja, 10% do ICF, que o custo variável é proporcional às quantidades
produzidas e que o preço de vendas não sofre alterações com a capacidade de produção.
122
Valor (€)
Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima
CAPÍTULO 6
1,00E+08
9,00E+07
8,00E+07
7,00E+07
6,00E+07
5,00E+07
4,00E+07
3,00E+07
2,00E+07
1,00E+07
0,00E+00
0
1000
2000
3000
4000
5000
Produção (ton/ano)
Custos fixos
Custos variáveis
Custos fixos + custos variáveis
Vendas
Figura 6-16 – Representação do ponto crítico de vendas
A Figura 6-16, mesmo tendo por base uma análise linear simplista e desprezando o carácter
discreto dos custos fixos e variáveis, permite confirmar que o projecto de produção de ácido
azelaico a partir de OAU é economicamente viável para produções inferiores. O ponto a partir
do qual o projecto deixa de gerar lucro é 616 ton/ano, sendo este valor bastante inferior ao
considerado neste estudo (26000 ton/ano). Assim, valores acima do ponto crítico podem ser
considerados para a linha de produção em causa e, tendo em conta que é substancialmente
inferior ao projectado poderá tornar a implementação da unidade mais fácil, principalmente ao
nível energético.
Marta Nunes
123
CAPÍTILO 7
7. CONCLUSÕES GERAIS E TRABALHOS FUTUROS
A valorização dos OAU apresenta-se como uma solução que permite uma gestão ambiental
com benefícios sociais e económicos.
Em Portugal, o consumo de óleos alimentares é, em termos europeus, elevado, e como tal há
geração de uma grande quantidade de resíduos, que provoca impactes ambientais negativos
quando não são devidamente encaminhados. Os OAU, pelas suas propriedades, tornam-se
interessantes resíduos para valorização e a sua recolha é, neste momento, um factor crucial
para a exploração das suas potencialidades.
Espera-se que a criação de normas que visam a recolha, tratamento e valorização dos OAU e
o envolvimento de todos os intervenientes no seu ciclo de vida possam contribuir para uma
gestão integrada deste resíduo (Decreto-Lei n.º 267/2009 de 29 de Setembro, 2009).
No presente trabalho, foram analisadas diversas vias tecnológicas passíveis de implementação
por forma a valorizar os OAU. Apesar de se assumir que este é um estudo preliminar e que a
sua industrialização requer ainda bastante mais conhecimento, das alternativas existentes, uma
delas é a produção de biogás por via anaeróbia. Esta via tem como objectivo melhorar a
performance dos digestores anaeróbios, permitindo um aumento do rendimento da produção
de biogás através da co-digestão dos óleos com outros substratos. Actualmente existe um
interesse crescente em fontes alternativas de energia como resultado do aumento da procura,
do aumento do custo dos combustíveis disponíveis e da necessidade de valorizar bioresíduos
em alternativa à sua deposição em aterros. A legislação actual (Directiva 2009/28/CE)
reconhece o seu potencial, prevendo a sua implementação, tanto na gestão integrada de
resíduos, como na produção de energia, pois em 2020 pretende-se atingir os 150 MW. Porém,
reconhece-se que esta via permite escoar apenas uma fracção dos OAU, em virtude da
quantidade passível de adicionar aos digestores anaeróbios existentes ser relativamente
pequena.
Outra possibilidade de valorização dos OAU é a sua incorporação em pesticidas. Os OAU
seriam integrados como adjuvantes e/ou solventes. Neste campo, desconhece-se fontes
bibliográficas reportando o seu uso, mas a integração de óleos vegetais é já conhecida e,
portanto, espera-se que os OAU após pré-tratamento tenham papéis próximos. A fracção de
óleos que se incorpora nos pesticidas é baixa, entre 0,05% e 0,5%, o que significa que esta
alternativa teria apenas potencial para integrar uma pequena fracção do OAU recolhido.
Contudo, permitiria a substituição dos óleos virgens, bem como a valorização de um resíduo.
No quadro da análise da viabilidade desta alternativa foram realizados ensaios preliminares.
Isto é, foi ainda analisada a integração de OAU como adjuvante em ensaios de teste de
performance de um agente biocida. Nos primeiros testes efectuados verificou-se que a
presença de óleo tem influência significativa na taxa de mortalidade, principalmente nas
Marta Nunes
125
Conclusões Gerais e Trabalhos Futuros
primeiras 48 horas, potenciando a acção do agente biocida. Observou-se ainda que, através da
realização dos testes dose-resposta, o óleo tem maior influência para baixas gamas de
mortalidade e portanto, neste caso, para concentrações de polyDADMAC baixas. Assim,
verificou-se que concentrações maiores de óleo (gama de 100 mg/L) poderão potenciar um
incremento da acção biocida.
Outro método de valorização dos OAU explorado neste trabalho foi a sua utilização como
matéria-prima para a produção de oleoquímicos. Foi dado especial destaque à produção de
ácido azelaico, que no âmbito deste trabalho constitui a via tecnológica que melhor se adequa
ao problema do resíduo em causa, pois perspectiva o seu consumo integral. A sua valorização
em ácido azelaico constitui uma mais-valia, tanto ambiental como económica. Uma unidade
de produção baseada num processo de oxidação por ozono foi projectada para 26000
toneladas anuais de ácido azelaico, implica um investimento de capital de 123 M€ e custos de
operação na ordem dos 75,5 M€/ano. Esta capacidade está em sintonia com o potencial de
recolha no país. O projecto tem um VAL de 933 M€ com um período de recuperação do
investimento de 2,2 anos. Verificou-se que o projecto é economicamente viável, mas de facto
do ponto de vista da implementação é mais atractivo para uma escala de produção menor,
devido à exigência energética do processo.
Foi ainda referida a utilização de OAU para a produção de ração animal, sabão e biodiesel.
Estes métodos de valorização já se encontram implementadas em Portugal e, por isso foram
aqui tratados com menor relevância.
Ainda que não fizesse parte dos objectivos principais desta dissertação, a produção de
biodiesel a partir de OAU, foi explorada de modo simplificado. Tendo em conta a quantidade
de OAU que actualmente não está a ser recolhida, considerou-se a possibilidade de integrar
parte dessa fracção em unidades de produção de biodiesel já existentes a partir de óleos
virgens. Esta abordagem foi feita com o intuito de analisar o impacto económico que a
utilização de OAU poderia trazer caso se substituísse parte dos óleos virgens por OAU. Deste
modo, os custos considerados para esta estrutura foram os de recolha e de pré-tratamento dos
OAU, tendo-se obtido uma diminuição nos custos da matéria-prima em cerca de 52%. É de
salientar que o pré-tratamento dos OAU terá que ser efectuado sempre, independentemente da
via tecnológica a seguir, para a remoção de sólidos e água. O pré-tratamento tem associados
custos de operação no valor de 11862005 €/ano, correspondendo este valor a
aproximadamente 2 €/m3.
O trabalho subjacente a esta tese deixou em aberto várias questões que merecem ser
abordadas em estudos futuros. Seria interessante dar continuidade ao estudo da potencialidade
dos OAU como adjuvantes a incorporar em agentes biocidas, nomeadamente pela avaliação
da selectividade do óleo perante outros organismos, assim como o estudo das quantidades de
óleo adicionadas a partir da qual possam ser consideradas poluentes para os cursos de água.
126
Conclusões Gerais e Trabalhos Futuros
CAPÍTULO 7
Do ponto de vista da produção de ácido azelaico, poder-se-ia fazer o estudo de uma unidade
industrial para uma capacidade de OAU menor e verificar/confirmar a viabilidade económica
do projecto.
A área de oleoquímicos é muito vasta, e por isso os OAU têm nesse campo várias aplicações
que poderão ser estudadas, sendo a síntese de compostos por conversão microbiana também
de grande interesse.
Marta Nunes
127
CAPÍTILO 8
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