Departamento de Engenharia Química e Biológica Valorização de Óleos Alimentares Usados – Design do Produto Dissertação apresentada para a obtenção do grau de Mestre em Processos Químicos e Biológicos Autor Marta Filipe de Carvalho Nunes Orientadores Doutor Belmiro Duarte Instituto Superior de Engenharia de Coimbra Doutor Luís Miguel Moura Neves de Castro Instituto Superior de Engenharia de Coimbra Engenheira Paula Lopes Victor Guedes, S.A. Coimbra, Dezembro, 2011 AGRADECIMENTOS Este trabalho apresenta-se como o culminar de uma fase importante da minha vida. Dediqueime com bastante empenho na elaboração do mesmo. Quero expressar o meu agradecimento a todas as pessoas que de alguma forma contribuíram para a sua concretização. É de salientar, que tal não seria possível sem o apoio e incentivo constante dos meus pais, irmão e avós, aos quais estou muito grata. Obrigada por me terem proporcionado esta feliz etapa da minha vida. Aos meus Orientadores, Professor Doutor Belmiro Duarte e Professor Doutor Luís Miguel Moura de Castro, agradeço o apoio, a partilha do saber e as valiosas contribuições para o trabalho. Obrigada pela disponibilidade demonstrada para esclarecimento de dúvidas, sem eles este trabalho não seria possível. À Doutora Raquel Costa, por ter contribuído com o seu conhecimento e ainda me ter facultado os meios para a realização de uma actividade experimental no âmbito do Capítulo 5. Agradeço ainda, ao João Gomes e à Rita Garrido pelo apoio no laboratório e pela informação gentilmente cedida. O trabalho realizado nesse capítulo só foi possível devido ao financiamento por fundos FEDER através do Programa Operacional Factores de Competitividade – COMPETE e por fundos Nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT) no âmbito do projecto CONTROLCLAM (PTDC/AACAMB/113515/2009). Estou grata aos membros do “Grupo Forte” pela partilha de informação e ainda por me terem proporcionado agradáveis momentos nesta fase da minha vida académica. Agradeço ainda aos meus amigos de longa data, que apesar de reclamarem a minha falta de disponibilidade para estar com eles, deram-me força e motivação para continuar, contribuindo com a sua boa disposição, permitindo momentos de descontracção e alegria. iii Valorização de Óleos Alimentares Usados RESUMO RESUMO Em Portugal, apesar de existirem diversas iniciativas para promover a recolha e tratamento dos óleos alimentares usados (OAU), o controlo do seu destino tem sido difícil. Actualmente a rede de esgotos é o principal destino provocando impactes ambientais negativos relevantes. Porém este cenário tem tendência a mudar com a publicação do Decreto-Lei 267/2009 de 29 de Setembro que estabelece o regime jurídico da gestão de OAU, produzidos pelos sectores industrial, HORECA e doméstico. Este Decreto-Lei, para além de criar um conjunto de normas que visam a implementação de circuitos de recolha selectiva, o seu correcto transporte, tratamento e valorização por operadores devidamente licenciados para o efeito, assenta também na co-responsabilização e no envolvimento de todos os intervenientes no ciclo de vida dos óleos alimentares. Assim, a Victor Guedes, S.A., como grande operadora de comercialização nacional de óleos alimentares, passa a estar obrigada a realizar acções na área da investigação e desenvolvimento no domínio da prevenção e valorização dos óleos alimentares usados. Para satisfazer a referida obrigatoriedade, pretende-se desenvolver metodologias de valorização de OAU, evidenciando quais as possibilidades de aplicação, bem como as suas potencialidades. Pretende-se igualmente definir uma ideia de produto/especificações a obter e avaliar economicamente, ainda que de uma forma simplista, o custo da potencial alternativa tecnológica a implementar. Note-se que, o estudo aqui conduzido é meramente um passo inicial no processo de investigação e industrialização. Naturalmente, estudos mais detalhados e alargados relativamente a cada uma das alternativas devem ser conduzidos por forma a reduzir o grau de incerteza que ainda existe sobre as várias estratégias/produtos. As soluções encontradas para valorizar os OAU, para além da produção de biodiesel e de sabão, que já se encontram implementadas em Portugal, são o uso de OAU como aditivo de rações animais, matéria-prima para a produção de oleoquímicos, como substrato na produção de biogás, para melhorar a performance dos digestores anaeróbios e, finalmente, integrados como aditivos na produção de pesticidas/biocidas como adjuvantes. Como alternativa tecnológica a implementar, a melhor solução encontrada, tendo em conta o método de valorização que permite escoar parte significativa dos OAU gerados em Portugal, foi na área de produção de oleoquímicos, nomeadamente na produção de ácido azelaico. Foi estudada esta possibilidade de valorização, tendo-se projectado uma unidade com uma produção de 26000 toneladas anuais de ácido azelaico. Este projecto pressupõe um investimento de capital de 123 M€ e custos de operação na ordem dos 75,5 M€/ano. O projecto tem um VAL de 933 M€, com um período de recuperação do investimento de 2,2 anos. Verificou-se que o projecto é economicamente viável. No entanto, devido à dependência da estrutura de custos sobre os geradores de ozono, que são unidades muito caras e que requerem grandes quantidades de energia eléctrica, o projecto deve ser adaptado para produções inferiores. Marta Nunes v Valorização de Óleos Alimentares Usados ABSTRACT ABSTRACT In Portugal several initiatives to promote the collection and treatment of used cooking oil (UCO) are already in course. Although the control of the end recognizably difficult to target in the past. This scenario is now changing due to the approval of the Decreto-Lei 267/2009 of 29th September by the Portuguese Parliament. This tool establishes the key steps for legal management of UCO produced by industrial, HORECA and domestic sectors. More than the creation of a set of rules, the law is aimed at establishing a transportation, collection, treatment and recovery network. Because of the law, Victor Guedes, S.A., a major national company in the area of cooking oil, is obliged to promote activities of R&D focused on the prevention and recovery of the UCO. To help the company to meet this goal, we analyzed a series of technological routes to recycle UCO and recover it with added value. Severed technological alternatives were addressed. At this level, the basic propose of this work was to define ideas of products and process specifications that may be applied at the industrial scale. Although analysis carried out here was very simplistic, it allowed the assessment of economic performance of one of the alternatives considered. It should be noted that the study conducted in this thesis is an initial step for the choice and industrialization of the technological alternatives. Obviously, we advocate that a more detailed and extensive analysis should be performed regarding each of the alternatives in order to reduce the uncertainty that is still associated with the various approaches. The solutions to add value to the UCO, in addition to the production of biodiesel and soap, which are already being used in Portugal, are (i) the use of the oils as an additive for animal feed, (ii) as raw material for producing oleochemicals, (iii) as a substrate in the production of biogas as a carbon provider to improve the performance of anaerobic digesters, (iv) and finally as an additive pesticides/biocides working as adjuvants. The best technological alternative from all we considered consists of pre-treating the UCO and using it to produce azelaic acid. The economical performance of this route was characterized based on the design of a plant with a capacity of 26000 ton/year. Such a plant requires a capital investment of 123 M€, and the its operating costs are 75,5 M€/year. The plant denotes a NPV (net present value) of 933 M€ and a pay-back period of 2,2 years, which points out to a economically viable alternative. However, due to the dependence of the cost structure on the ozone generators, which are very expensive units with large power requirements, the plant design should be scaled for lower production. Marta Nunes vii Valorização de Óleos Alimentares Usados ÍNDICE ÍNDICE 1. INTRODUÇÃO............................................................................................................. 1 1.1. Contexto e enquadramento ............................................................................................ 1 1.1.1. Regime jurídico dos OAU em Portugal ......................................................................... 2 1.2. Objectivos e metodologia .............................................................................................. 4 1.3. Organização da tese ...................................................................................................... 4 2. CARACTERIZAÇÃO DOS OAU ................................................................................ 7 2.1. Óleos virgens vs óleos usados ....................................................................................... 8 2.2. Caracterização do fluxo actual de OAU ...................................................................... 10 3. 2.2.1. Produção de OAU na Europa ......................................................................................10 2.2.2. Custos de recolha / aquisição dos OAU ......................................................................15 ALTERANTIVAS TECNOLÓGICAS PARA VALORIZAÇÃO DE OAU ............. 17 3.1. Biodiesel ..................................................................................................................... 20 3.1.1. Pré-tratamento dos OAU............................................................................................22 3.2. Produção de sabão ...................................................................................................... 29 3.3. Oleoquímicos .............................................................................................................. 30 3.3.1. Polímeros...................................................................................................................32 3.3.2. Surfactantes ...............................................................................................................32 3.3.3. Pesticidas ...................................................................................................................33 3.3.4. Lubrificantes ..............................................................................................................34 3.4. Ração animal .............................................................................................................. 35 3.5. Digestão anaeróbia ...................................................................................................... 36 4. BIOGÁS - USO DE OAU COMO CO-SUBTRATO NA DIGESTÃO ANAERÓBIA 37 4.1. Processo de digestão anaeróbia ................................................................................... 38 4.1.1. Vantagens e desvantagens da DA ...............................................................................38 4.1.2. Etapas principais da DA ..............................................................................................39 4.1.3. Condições operatórias ...............................................................................................43 4.1.4. Co-digestão de resíduos .............................................................................................45 Marta Nunes ix ÍNDICE 5. 5.1. 5.2. 5.3. 5.4. 5.5. 6. BIOCIDAS - USO DE OAU COMO ADJUVANTE ................................................. 51 Corbicula fluminea ..................................................................................................... 52 Estudo experimental .................................................................................................... 55 Materiais e métodos .................................................................................................... 56 Resultados e discussão ................................................................................................ 59 Conclusão ................................................................................................................... 63 ÁCIDO AZELAICO - USO DE OAU COMO MATÉRIA-PRIMA ......................... 65 6.1. Ozonólise .................................................................................................................... 67 6.2. Síntese do processo ..................................................................................................... 69 6.2.1. Ozonização ................................................................................................................ 73 6.2.2. Cisão e oxidação ozonídeos........................................................................................ 74 6.2.3. Separação do ácido azelaico ...................................................................................... 75 6.3. Balanços mássicos ...................................................................................................... 75 6.3.1. Reactor R-101 ............................................................................................................ 77 6.3.2. Reactores R-102/103/104 .......................................................................................... 79 6.3.3. Coluna de destilação CD-101...................................................................................... 82 6.3.4. Balanço global ........................................................................................................... 85 6.4. Balanços energéticos ................................................................................................... 86 6.4.1. Reactor R-101 ............................................................................................................ 87 6.4.2. Reactores R-102/103/104 .......................................................................................... 88 6.4.3. Coluna de destilação CD-101...................................................................................... 93 6.4.4. Permutador de calor PC-101 ...................................................................................... 94 6.5. Dimensionamento ....................................................................................................... 95 6.5.1. Tanques de armazenamento TA-101/102/103/104 .................................................... 95 6.5.2. Reactores R-101/102/103/104 ................................................................................... 96 6.5.3. Coluna de destilação CD-101.................................................................................... 103 6.5.4. Permutador de calor PC-101 .................................................................................... 106 6.5.5. Aglomerador A-101 - “flaker”................................................................................... 106 6.5.6. Gerador de ozono .................................................................................................... 107 6.6. Análise económica .................................................................................................... 109 x 6.6.1. Custos de instalação ................................................................................................ 110 6.6.2. Custos de operação ................................................................................................. 111 Valorização de Óleos Alimentares Usados ÍNDICE 6.6.3. Vendas de ácido azelaico .........................................................................................114 6.6.4. Métricas de performance financeira.........................................................................118 6.6.5. Análise de sensibilidade da performance económica ................................................120 7. CONCLUSÕES GERAIS E TRABALHOS FUTUROS ......................................... 125 8. REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 129 Marta Nunes xi Valorização de Óleos Alimentares Usados ÍNDICE FIGURAS ÍNDICE FIGURAS Figura 2-1 – Representação de um triglicerídeo 7 Figura 3-1 – Representação de alguns ácidos gordos constituintes dos óleos: (1) ácido oleico, (2) ácido linoleico, (3) ácido linolénico, (4) ácido erúcico, (5) ácido icinoleico, (6) ácido petroselinico, (7) ácido 5-eicosenoico, (8) ácido calendico, (9) ácido αeleosteárico, (10) ácido punicico (Metzger & Bornscheuer, 2006) 17 Figura 3-2 - Representação esquemática das duas vias de transformação/valorização 19 Figura 3-3 – Tendência da produção de biodiesel na Europa entre 1998 e 2011 (‘000ton) (European Biodiesel Board, 2011) 20 Figura 3-4 – Representação esquemática do pré-tratamento do OAU 23 Figura 3-5 – Reacções de saponificação Figura 3-6 - Processamento industrial de óleos e gorduras naturais e os seus produtos derivados (Hill, 2007) Figura 4-1 – Representação esquemática das fases do processo de digestão anaeróbia, adaptado de (Gray, 2004) 29 30 39 Figura 5-1 – Corbicula fluminea (ameijoa asiática) 53 Figura 5-2 – Testes estáticos de curta duração em C. flumínea (após 24h) 57 Figura 5-3 – Taxa de mortalidade em função do tempo de exposição do tratamento 60 Figura 5-4 – Taxa de mortalidade obtida com a Corbicula fluminea para várias concentrações de polyDADMAC e de polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo após 72 horas de exposição Figura 6-1 – Reacção geral do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) Figura 6-2 – Primeira etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) Figura 6-3 – Segunda etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) Figura 6-4 – Representação do processo de ozonólise do ácido oleico (Kockritz & Martin, 2011) Figura 6-5 – Diagrama do processo Figura 6-6 – Esquema representativo do reactor R-101 Figura 6-7 – Esquema representativo dos reactores R-102/103/104 Figura 6-8 – Esquema representativo da coluna de destilação CD-101 61 67 67 68 68 72 78 80 83 Figura 6-9 – Esquema representativo do permutador de calor PC-101 94 Figura 6-10 –Flaker ( Proton Engineering Works, 2011) 107 Figura 6-11 – Representação esquemática de um gerador por descarga corona, adaptado de (Lenntech, 2011) 108 Figura 6-12 – Gerador de ozono (Degrémont Technologies, 2011) Marta Nunes 108 xiii ÍNDICE DE FIGURAS Figura 6-13 – Cash-flow actualizado ao longo do tempo de vida do projecto Figura 6-14 – Cash-flow actualizado em função do preço de venda do produto Figura 6-15 - Cash-flow actualizado em função do preço da matéria-prima (OAU) Figura 6-16 – Representação do ponto crítico de vendas xiv 119 121 121 123 Valorização de Óleos Alimentares Usados ÍNDICE DE TABELAS ÍNDICE TABELAS Tabela 2-1 – Grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a fritura dos alimentos (American Oil Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová, 2004) 9 Tabela 2-2 – Produção, importação, exportação e consumo de óleos alimentares virgens na Europa em 2007 (ton/ ano) (FAOSTAT, 2011) 10 Tabela 2-3 – Produção de óleos alimentares usados na Europa considerando que 45% constituem resíduos (ton/ano), para o ano de 2007 11 Tabela 2-4 – Produção, recolha, utilização e rejeição de óleos alimentares usados na Europa (ton/ano) (BioDieNet, 2007-2009) 12 Tabela 2-5 - Produção de óleos alimentares usados na Europa estimada considerando que 80% são resíduos (ton/ano), para o ano 2007 (FAOSTAT, 2011) Tabela 2-6 - Produção de óleos alimentares usados na Europa em 2009 (Greenea, 2010) Tabela 2-7 – kg de OAU per capita na Europa (BioDieNet, 2007-2009) Tabela 2-8 – Custo da recolha/aquisição de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009) Tabela 3-1 – Aplicações dos OAU, para além do biodiesel, segundo o projecto BioDieNet 13 13 14 15 (2007-2009) Tabela 3-2 – Produção de Biodiesel a partir de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009) Tabela 3-3 – Características do crivo para a operação de filtração Tabela 3-4 – Dimensões do decantador Tabela 3-5 – Dimensionamento do tanque flash 18 21 23 24 25 Tabela 3-6 – Resultados do balanço energético ao condensador Tabela 3-7 – Dimensões do condensador Tabela 3-8 – Estimativas do custo dos equipamentos 25 26 26 Tabela 3-9 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo Tabela 3-10 – Custo anual de energia eléctrica 27 28 Tabela 3-11 – Custo anual de água 28 Tabela 3-12 – Custo anual de gás natural 28 Tabela 5-1 – Composição dos recipientes 57 Tabela 5-2 – Composição dos recipientes 59 Tabela 5-3 – Resultados da análise ANOVA para os primeiros testes de mortalidade 60 Tabela 5-4 – Resultados da ANOVA para as mortalidades para diferentes concentrações de polyDADMAC e de óleo ao longo do tempo 62 Tabela 5-5 – LC50 do polyDADMAC, polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo com a Corbicula fluminea para o período de exposição de 72 horas 62 Marta Nunes xv ÍNDICE DE TABELAS Tabela 6-1 – Valores utilizados nos balanços mássicos para a obtenção dos produtos das reacções 77 Tabela 6-2 – Balanço mássico ao reactor R-101 78 Tabela 6-3 – Balanço mássico ao reactor R-102 80 Tabela 6-4 – Balanço mássico ao reactor R-103 81 Tabela 6-5 – Balanço mássico ao reactor R-104 82 Tabela 6-6 – Composição da corrente 114 (destilado) e da corrente 118 (resíduo) na coluna destilação CD-101 83 Tabela 6-7 – Balanço mássico à coluna de destilação CD-101 84 Tabela 6-8 – Balanço mássico global 85 Tabela 6-9 – Valores obtidos do balanço energético ao reactor R-101 87 Tabela 6-10 – Valores de entalpia da reacção cisão (1) e oxidação (2) (Disselkamp & Dupuis, 2001) Tabela 6-11 - Balanço energético ao reactor R-102 Tabela 6-12 – Balanço energético ao reactor R-103 Tabela 6-13 – Balanço energético ao reactor R-104 Tabela 6-14 - Balanço energético à coluna de destilação CD-101 89 90 91 92 93 Tabela 6-15 – Balanço energético ao permutador de calor PC-101 Tabela 6-16 – Dimensionamento dos tanques de armazenamento Tabela 6-17 – Características mecânicas do reactor R-101 Tabela 6-18 – Dimensionamento do sistema de agitação do reactor R-101 94 96 98 99 Tabela 6-19 – Dimensionamento da espessura do isolamento do reactor R-101 99 Tabela 6-20 – Características mecânicas dos reactores R-102/103/104 100 Tabela 6-21 - Dimensionamento do sistema de agitação dos reactores R-102/103/104 101 Tabela 6-22 – Dimensionamento das camisas dos reactores R-102/103/104 102 Tabela 6-23 – Dimensionamento da espessura do isolamento dos reactores R-102/103/104102 Tabela 6-24 – Características da coluna de destilação CD-101 104 Tabela 6-25 – Dimensionamento mecânico da coluna de destilação CD-101 (Coulson & Richardson, 1988) 105 Tabela 6-26 – Dimensionamento do permutador de calor PC-101 106 Tabela 6-27 – Custo das peças de equipamentos mais relevantes 110 Tabela 6-28 – Custo anual das matérias-primas Tabela 6-29 – Necessidade e custo anual da água Tabela 6-30 – Necessidade e custo anual de electricidade Tabela 6-31 – Custos de operação Tabela 6-32 – Vendas de ácido azelaico 111 112 112 113 114 Tabela 6-33 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo 114 xvi Valorização de Óleos Alimentares Usados ÍNDICE DE TABELAS Tabela 6-34 – Taxas aplicadas no projecto (Economia e Finanças, 2011; IG Markets, 2011) 115 Tabela 6-35 – Parâmetros obtidos para utilizar na demonstração de resultados 115 Tabela 6-36 – Mapa de demonstração de resultados 117 Marta Nunes xvii Valorização de Óleos Alimentares Usados SIMBOLOGIA E ABREVIATURAS SIMBOLOGIA E ABREVIATURAS AGL – Ácido Gordo Livre AGV – Ácido Gordo Volátil AGCL – Ácido Gordo Volátil Cadeia Longa DA – Digestão Anaeróbia CQO – Carência Química de Oxigénio Cx – número de carbonos ETA – Estações de tratamento de águas ETAR – Estação de Tratamento de Águas Residuais FOG – Óleos, Gorduras e Sebos (Fat, Oil and Grease) IVL – Índice Volumétrico de Lamas ICF – Investimento de Capital Fixo IR – Índice de Rentabilidade LC50 - valor que corresponde à concentração letal para 50% da amostra a ser testada OAU – óleos alimentares usados PRI – Período de retorno do Investimento SV – Sólidos Voláteis SVT – Sólidos Voláteis Totais ST – Sólidos Totais TIR – Taxa Interna de Rentabilidade VAL – Valor Actualizado Líquido Marta Nunes xix CAPÍTULO 1 1. INTRODUÇÃO 1.1. Contexto e enquadramento Os óleos alimentares fazem parte da categoria de produtos óleos e gorduras alimentares, e constituem produtos de largo consumo na sociedade actual. Os óleos alimentares usados (OAU) são constituídos essencialmente por óleos de origem vegetal e podem resultar de diversas fontes, nomeadamente do sector doméstico, industrial e HORECA 1 . Nos sectores doméstico e HORECA, os óleos alimentares usados são provenientes da fritura dos alimentos e no sector industrial estão essencialmente associados à preparação e conservação de alimentos. O consumo de óleos alimentares gera uma grande quantidade de resíduos, estes quando não são devidamente encaminhados para destinos adequados, provocam impactes ambientais negativos relevantes. Em Portugal os OAU têm como principal destino a rede de esgotos, causando problemas de obstrução de canalizações e sistemas de drenagem de edifícios e corrosão das tubagens das redes públicas de esgoto e colectores municipais. Provocam, ainda, problemas de desempenho/funcionamento das ETAR (Estações de Tratamento de Águas Residuais), aumentando a carga poluente do efluente a tratar, o consumo de energia e o número de intervenções de manutenção e limpeza e, consequentemente, os custos operativos. Os óleos e gorduras alimentares têm sido também colocados em aterros, o que não constitui uma boa prática de gestão deste resíduo, segundo a Directiva 1999/31/CE de 26 de Abril (Conselho da União Europeia, 1999). A deposição directa nos solos e no meio hídrico constitui igualmente um problema, na medida em que coloca em risco as águas subterrâneas e superficiais e os solos. A queima dos OAU sem tratamento adequado provoca a libertação de substâncias tóxicas e compostos orgânicos voláteis para a atmosfera. A descarga de óleos vegetais usados e outras gorduras no ambiente pode gerar, ainda, problemas de maus cheiros e ser prejudicial para a fauna e flora envolventes. Assim, pode concluir-se que práticas inadequadas de gestão destes resíduos provocam diversos problemas de poluição (Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, 2005). A temática dos OAU tem sido ultimamente muito debatida, apesar de serem considerados um resíduo não perigoso, segundo a classificação da Lista Europeia de Resíduos com o LER 200125 (Portaria 209/2004 de 3 de Março). 1 O sector HORECA é o “sector de actividade relativo aos empreendimentos turísticos, ao alojamento local e aos estabelecimentos de restauração e bebidas” (in DL 267/2009 de 29 de Setembro) e abrange, portanto, hotéis, restaurantes e cafés, serviços de catering, cantinas e refeitórios. Marta Nunes 1 Introdução Aliado aos problemas ambientais provocados pela má gestão dos OAU, está o aumento do consumo de energia pelo Homem, surgindo assim a necessidade de incentivar a utilização de energias alternativas e a investigação da aplicação de matérias-primas renováveis das quais os OAU poderão fazer parte. A inovação e o desenvolvimento de novos produtos surgem como uma oportunidade de mercado e abrem, assim, um caminho para uma sociedade mais sustentável. Em Portugal, apesar de já existirem diversas iniciativas para promover a recolha dos OAU e o seu tratamento por empresas licenciadas, o controlo do destino destes resíduos tem sido difícil. A gestão dos OAU entre 2006 e 2009 foi assegurada pelo Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, mas o desrespeito do referido documento obrigou a rever o regime jurídico aplicado e, portanto, uma gestão eficaz dos OAU começa agora com a implementação de nova legislação. 1.1.1. Regime jurídico dos OAU em Portugal Existem directivas que asseguram um regime jurídico de gestão de OAU, responsabilizando os diferentes intervenientes no seu ciclo de vida. Para além de defender o enorme potencial do óleo, essa orientação permite potenciar a reciclagem a nível nacional, essencial para cumprir com as metas de reciclagem fixadas na Directiva n.º 2008/98/CE, de 19 de Novembro. A reciclagem de OAU para a produção de biocombustível constitui também uma importante mais-valia para garantir os objectivos para a energia, previstos na Directiva n.º 2009/28/CE, de 23 de Abril, relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis. Em Portugal, desde há algum tempo que a promoção destas energias foi assumida como uma prioridade política, representando parte importante da estratégia nacional para a redução das emissões de gases com efeito de estufa e para o cumprimento dos compromissos assumidos nesse sentido. Ao mesmo tempo, o aproveitamento dos recursos energéticos endógenos, afigura-se essencial para a auto-suficiência do país em termos energéticos, reduzindo a sua dependência da importação do petróleo. As imposições legais destacam as inúmeras vantagens que advêm da reciclagem dos OAU e já existem projectos implementados em Portugal, até agora de carácter voluntário, principalmente em alguns municípios que aderiram à produção de biodiesel. A recolha e reciclagem de OAU dependem frequentemente de pequenas e médias empresas, algumas delas dedicadas ao tratamento do OAU, bem como outras que associam também a produção de biodiesel. Contudo, a recolha selectiva de OAU em Portugal centra-se essencialmente nos estabelecimentos HORECA e industrial, apresentando-se ainda muito deficiente no sector doméstico. A dinamização desta actividade é, portanto, fundamental. Um contributo importante foi dado com o acordo entre o entretanto extinto Instituto dos Resíduos (actualmente integrado na Agência Portuguesa do Ambiente) e representantes de alguns dos 2 Introdução CAPÍTULO 1 principais intervenientes no ciclo de vida dos OAU em Outubro de 2005, para um sistema voluntário de gestão deste resíduo. A gestão dos OAU foi inicialmente regulamentada pelo Decreto-Lei n.º 178/2006, de 5 de Setembro, referente à gestão de resíduos em geral. Contudo, pelo seu incumprimento, e pelas vantagens ambientais, económicas e sociais, acima referidas, surgiu a necessidade da publicação do Decreto-Lei 267/2009 de 29 de Setembro. O Decreto-Lei 267/2009, de 29 de Setembro, estabelece o regime jurídico da gestão de OAU produzidos pelos sectores industrial, HORECA e doméstico, excluindo-se do âmbito da sua aplicação os resíduos da utilização das gorduras alimentares animais e vegetais, das margarinas e dos cremes para barrar e do azeite definidos nos termos do Decreto-Lei n.º 32/94, de 5 de Fevereiro, e do Decreto-Lei n.º 106/2005, de 29 de Junho. Para além de criar um conjunto de normas que visam a implementação de circuitos de recolha selectiva, o seu correcto transporte, tratamento e valorização por operadores devidamente licenciados para o efeito, o Decreto-Lei assenta também na co-responsabilização e no envolvimento de todos os intervenientes no ciclo de vida dos óleos alimentares, nomeadamente os consumidores, os produtores de óleos alimentares, os operadores da distribuição, os produtores de OAU e os operadores de gestão. O referido diploma dá um especial destaque à recolha de OAU no sector doméstico, atribuindo um papel de relevo aos municípios que são assim responsáveis pelo transporte e posterior valorização dos OAU recolhidos nas redes de recolha municipais, ou a entidades a quem seja transferida essa responsabilidade. A valorização dos OAU apenas pode ser efectuada por operadores de gestão de resíduos licenciados. Os produtores de OAU no sector HORECA e industrial são igualmente responsáveis pelo seu encaminhamento, ou por operadores de gestão de resíduos devidamente licenciados ou através do respectivo município, com o qual tenham acordo. Os operadores envolvidos no ciclo de vida dos óleos alimentares estão obrigados a reportar, através do sistema integrado de registo da Agência Portuguesa do Ambiente (SIRAPA), as quantidades colocadas no mercado, recolhidas e o seu encaminhamento. É de salientar, as responsabilidades específicas atribuídas aos produtores de óleos alimentares em matéria de sensibilização e informação, bem como de investigação e desenvolvimento, no domínio da prevenção e da valorização de OAU. A recolha, transporte, armazenamento e valorização dos OAU passam agora a ser controlados e o potencial dos OAU será agora investigado. Neste contexto, a Victor Guedes, S.A. como grande entidade nacional dedicada à embalagem e comercialização de óleos alimentares, passa a estar obrigada a realizar acções na área da investigação e desenvolvimento no domínio da prevenção e valorização dos OAU. Para satisfazer a referida obrigatoriedade, pretende-se desenvolver um trabalho no âmbito do protocolo de colaboração entre a empresa Victor Guedes, S.A. e o ISEC. Nesse sentido este Marta Nunes 3 Introdução trabalho centrar-se-á no estudo de metodologias de valorização de OAU que não passem pela produção de biodiesel. 1.2. Objectivos e metodologia O presente trabalho consiste, então, em estudar possibilidades de aplicação de OAU que contribuam para o aumento da taxa de reciclagem nacional deste resíduo e analisar as potencialidades de OAU baseada em ferramentas de design de produto/processo. Pretende-se deste modo definir uma ideia de produto/especificações a obter e avaliar economicamente o custo da alternativa tecnológica a implementar. Face ao exposto, investigar-se-ão alternativas de valorização de óleos alimentares usados, iniciando o trabalho com uma análise dos fluxos envolvidos, que permita estimar e avaliar a situação actual do resíduo em Portugal. Posteriormente realizar-se-á um estudo das alternativas tecnológicas passíveis de implementação. Dessas alternativas, escolher-se-ão as que permitem dar um destino adequado aos OAU e as que, apesar de não permitirem valorizar uma fracção significativa dos OAU gerados em Portugal, do ponto de visto científico, constituem alternativas também interessantes. Ao método de valorização dos OAU seleccionado (produção de ácido azelaico), far-se-á o projecto de uma unidade fabril que permitirá o escoamento de todos os OAU presentemente não recolhidos a nível nacional, bem como a análise económica simplista para avaliar a viabilidade dessa alternativa. 1.3. Organização da tese O trabalho está dividido em sete capítulos. O segundo capítulo, refere-se à caracterização dos óleos alimentares, indicando-se as principais diferenças entre os óleos vegetais virgens e os usados. Apresentam-se as estimativas dos fluxos deste resíduo na Europa e mais especificamente em Portugal, nomeadamente em termos de produção, recolha e respectivo custo. No capítulo 3, serão descritas algumas das alternativas tecnológicas passíveis de implementação na valorização dos OAU. Pretende-se obter uma visão global do que está a ser feito actualmente e, das possibilidades existentes, as que se poderão destacar como alternativas viáveis. Os capítulo 4, 5 e 6 apresentam, de forma simples, as soluções, passíveis de serem implementadas em Portugal, que se pensa serem de maior relevância, em alternativa à produção de biodiesel, entre as quais, a incorporação na produção de biogás por via anaeróbia, a incorporação na produção de biocidas e na produção de ácido azelaico. É de salientar, que o objectivo consiste em traçar linhas de orientação para estudos a um nível de maior elaboração. De facto, enquanto a integração como co-substrato em unidades de produção de biogás por via anaeróbia e a integração como agente adjuvante de biocidas/pesticidas foi estudada no quadro das alternativas teóricas em que os OAU não 4 Introdução CAPÍTULO 1 carecem de síntese, a hipótese de produção de ácido azelaico foi analisada à luz de patentes e conhecimento disponível. Neste último caso, a perspectiva foi a de dimensionar e estimar os custos associados a uma planta industrial capaz de valorizar OAU segundo esta via. É de notar, no entanto, que a bibliografia nunca configura efectivamente a produção de ácido azelaico a partir de OAU, mas sim, a partir de óleos virgens. No entanto, pensa-se que uma unidade de pré-tratamento, aqui também projectada, permitirá aproximar as características de ambas as matérias-primas e trazer, assim, os OAU para o domínio das possibilidades de valorização através da produção de ácido azelaico. O capítulo 7 apresenta as conclusões finais sobre as potencialidades dos OAU, complementadas com algumas sugestões para trabalhos futuros. Marta Nunes 5 CAPÍTULO 2 2. CARACTERIZAÇÃO DOS OAU Os óleos alimentares de origem vegetal são constituídos essencialmente por uma mistura de ésteres derivados do glicerol, designados por glicerídeos. Os tri-, di- e monoglicerídeos são constituídos por uma molécula de glicerol à qual estão ligadas três, duas ou uma molécula de ácidos gordos, respectivamente (Maurício, 2008). Os triglicerídeos são os elementos que constituem a maior proporção na composição química dos óleos alimentares vegetais. De facto, é comum os óleos conterem cerca de 95% de triglicerídeos, e cerca de 0,1% a 2% de diglicerídeos e monoglicerídeos. Para além dos glicerídeos, nos óleos e gorduras naturais encontram-se também pequenas fracções de fosfolípidos, terpenóides e outros compostos (Felizardo, 2003). Os ácidos gordos que formam os triglicerídeos dos óleos e gorduras são cadeias de átomos de carbono ligados a átomos de hidrogénio e a um grupo carboxilo, que assume a posição final na cadeia (ver Figura 2-1). O comprimento dos ácidos gordos é variável, sendo o seu tamanho dependente do número de átomos de carbono que os constituem. Os ácidos que ocorrem na natureza têm predominantemente número par de carbonos, cadeia linear, são do tipo monocarboxílico alifático, contendo muito frequentemente 4 a 24 átomos de carbono (C4C24) (Gunstone, 1996). Figura 2-1 – Representação de um triglicerídeo Os ácidos gordos podem ser divididos de acordo com a sua estrutura química em ácidos gordos saturados e insaturados. Os saturados não possuem nenhuma ligação dupla entre os átomos de carbono. Os insaturados possuem uma ou mais, variam no número, na posição destas na cadeia e na configuração (Gunstone, 1996). Além dos ácidos gordos ligados a moléculas de glicerol, existem também os que não possuem qualquer tipo de ligação e que se encontram livres, designando-se por ácidos gordos livres (AGL). Estes são responsáveis pela acidez dos óleos e gorduras e podem ascender a 0,04 a 2,0% da sua composição. No caso de Marta Nunes 7 Caracterização dos OAU OAU, os ácidos gordos livres podem representar um valor superior (até 7%) (Felizardo, 2003; Greenea, 2010). Consoante a espécie oleaginosa, verificam-se variações na composição química do óleo vegetal, as quais são expressas na relação molar entre os diferentes ácidos gordos (Maurício, 2008). Os óleos vegetais são normalmente classificados em função dos ácidos gordos que neles predominam, sendo os principais óleos listados a seguir: grupo do ácido láurico (C12): óleos relativamente saturados com índices de iodo 2 entre 5 e 30 (ex: óleo de coco); grupo do ácido palmítico (C16): óleos igualmente saturados (ex: óleo de palma); grupo do ácido oleico (C18:1): óleos insaturados com índices de iodo entre 80 e 110 (ex: azeite, óleo de amendoim e óleo de colza); grupo do ácido linoleico (C18:2): óleos insaturados com índices de iodos superiores a 110 (ex: óleos de girassol, soja e algodão). Enquanto os óleos saturados são de grande viscosidade e resistentes à oxidação, os óleos que possuem um teor elevado de ácido linoleico tendem a ser pouco resistentes à oxidação, sendo facilmente degradados num curto período de tempo (Inspecção-Geral do Ambiente e do Ordenamento do Território, 2005). A composição química dos óleos é bastante importante porque influencia as suas propriedades físicas, como a viscosidade, o ponto de fusão, a estabilidade térmica, permitindo, assim, prever o comportamento de um dado óleo vegetal e o futuro potencial para os diferentes processos de valorização (Rodrigues, 2006). 2.1. Óleos virgens vs óleos usados Os óleos vegetais usados são provenientes da fritura de alimentos. Este processo altera as propriedades originais do óleo, nomeadamente ao nível da concentração de partículas em suspensão (restos de comida) e da alteração da composição química. O aquecimento acima dos 180ºC dá origem a compostos polinsaturados, podendo ainda apresentar fumos, fuligens e cinzas em suspensão quando o aquecimento é demasiado alto (acima dos 250ºC), o que confere ao óleo uma cor escura, tornando-o prejudicial à saúde humana (Cvengros & Cvengrosová, 2004). O pré-tratamento dos OAU assim como a estratégia tecnológica de valorização estão dependentes das propriedades dos OAU. Contudo essas são difíceis de prever devido ao elevado número de variáveis envolvidas, nomeadamente, o tipo de óleo e a forma como o mesmo é utilizado. O teor em água no óleo alimentar usado também é um factor determinante, pelo que as condições de recolha e armazenamento são relevantes. 2 O índice de iodo é a propriedade que indica o grau de saturação do óleo e aumenta com o número de ácidos gordos insaturados presentes. 8 Caracterização dos OAU CAPÍTULO 2 A Tabela 2-1 resume os principais grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a fritura, alterações resultantes das elevadas temperaturas na presença de ar e humidade. Tabela 2-1 – Grupos de compostos formados a partir dos óleos durante a fritura dos alimentos (American Oil Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová, 2004) Alteração Hidrólise Agente Humidade Oxidação Ar Alteração térmica Temperatura Compostos formados Ácidos gordos, diglicerídeos Álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres e outros hidrocarbonetos Compostos poliméricos Durante o processo de fritura, os alimentos tendem a perder parte da água que contêm. Esta, ao dissolver-se no óleo, leva à hidrólise dos triglicerídeos, com consequente decomposição destes em ácidos gordos livres e diglicerídeos, conduzindo a um aumento de acidez (American Oil Chemists Society, 2011). Para além disso, devido à presença de ar e à exposição a altas temperaturas, as reacções de oxidação constituem o principal mecanismo de modificação das características físico-químicas e organolépticas dos óleos. O oxigénio do ar dissolvido no óleo reage, sobretudo com os ácidos gordos insaturados, levando à formação de vários produtos da oxidação, entre os quais hidroperóxidos, que por sua vez são oxidados a álcoois, aldeídos, cetonas, ésteres e outros hidrocarbonetos. A maioria destes produtos da oxidação permanece no óleo, aumentando a sua viscosidade. No entanto, alguns deles originam compostos polares voláteis, que se libertam para a atmosfera. O aquecimento prolongado do óleo induz reacções de polimerização que contribuem também para o aumento da viscosidade dos óleos (American Oil Chemists Society, 2011; Cvengros & Cvengrosová, 2004). Apesar das diferenças apresentadas entre os óleos virgens e usados, as propriedades do óleo usado não constituem uma barreira significativa para a valorização destes como fonte de energia, ou como matéria-prima para produtos que não tenham como finalidade a alimentação humana. Na maioria dos casos, operações de filtração e decantação são processos suficientes para pré-tratar os OAU (Felizardo, 2003). As diferenças dos óleos alimentares usados face aos virgens, devem-se essencialmente ao teor de sólidos, água e AGL (ácidos gordos livres). Estes parâmetros revelam-se fundamentais para a sua utilização como matéria-prima, principalmente para a produção de biodiesel, pelo que serão discutidos pormenorizadamente na secção 3.1. Marta Nunes 9 Caracterização dos OAU 2.2. Caracterização do fluxo actual de OAU Para caracterizar o fluxo actual de OAU, foi efectuada uma análise dos dados existentes até ao momento, referente à produção e consumo de óleos alimentares vegetais e produção, consumo, recolha e utilização de OAU na Europa e mais especificamente em Portugal, que se apresenta de seguida. 2.2.1. Produção de OAU na Europa A Tabela 2-2 indica os dados de produção, importação, exportação e consumo de óleos alimentares virgens na Europa. Tabela 2-2 – Produção, importação, exportação e consumo de óleos alimentares virgens na Europa em 2007 (ton/ ano) (FAOSTAT, 2011) País Áustria Bélgica Croácia República Checa França Alemanha Holanda Itália Irlanda Suíça Eslováquia Espanha Reino Unido Hungria Noruega Portugal Roménia Produção 184542 239215 70487 202733 1253453 1423918 288366 1646990 84741 138685 68373 1222188 1081665 195748 71206 188831 284456 Importação 9230 7872 60 1368 27186 12951 29960 25769 1536 1646 72 5111 7594 93 207 6627 378 Exportação 2561 1708 26 151 9558 3919 15542 21607 84 635 14 15859 5129 7342 49 5426 3 Consumo 191211 245379 70521 203950 1271081 1432950 302784 1651152 86193 139696 68431 1211440 1084130 188499 71364 190032 284831 As estatísticas relativas aos óleos alimentares usados são escassas, uma vez que não existia, até data recente, regulamentação a esse respeito. Contudo, com a crescente preocupação com o impacte ambiental que o seu tratamento inadequado acarreta e com o aumento das preocupações ao nível da segurança alimentar, surge a necessidade de controlar estes resíduos. A Tabela 2-3 apresenta uma estimativa da produção de OAU na Europa, calculada com base no consumo de óleos alimentares virgens. Considerou-se que a produção de OAU é 10 Caracterização dos OAU CAPÍTULO 2 45% do consumo dos óleos alimentares virgens, assumindo que 40% destes são incorporados nos alimentos e 15% constituem perdas (Veloso, 2007; Maurício, 2008; Rodrigues, 2006). Tabela 2-3 – Produção de óleos alimentares usados na Europa considerando que 45% constituem resíduos (ton/ano), para o ano de 2007 País Áustria Bélgica Croácia República Checa França Alemanha Holanda Itália Irlanda Suíça Eslováquia Espanha Reino Unido Hungria Noruega Portugal Roménia Produção OAU (45%) 86045 110420 31734 91777 571986 644827 136253 743018 38787 62863 30794 545148 487859 84824 32114 85515 128174 Assumindo esta estimativa de OAU gerados, pode constatar-se que Portugal tem uma produção estimada de OAU de 85514 ton/ano. Por forma a confrontar esta estimativa com outros dados disponíveis para esta quantificação, procuraram-se outras fontes bibliográficas, para assim proceder à sua validação. A Tabela 2-4 apresenta a estimativa de produção, recolha, utilização e rejeição de OAU, cujos valores foram obtidos num projecto financiado pela União Europeia designado por BioDieNet (BioDieNet, 2007-2009). A informação deste projecto é referente apenas aos seguintes países: Alemanha, Espanha, Holanda, Hungria, Itália, Noruega, Portugal, Reino Unido e Roménia. Marta Nunes 11 Caracterização dos OAU Tabela 2-4 – Produção, recolha, utilização e rejeição de óleos alimentares usados na Europa (ton/ano) (BioDieNet, 2007-2009) País Produção Alemanha 230000 Espanha 1242000 Holanda 61640 Hungria 5520 Itália 55200 Noruega 1840 Portugal 88320 Reino Unido 91080 Nota: n/d – dados não disponíveis Recolha Rejeição 230000 248400 61640 5060 55200 920 26312 91080 0 993600 0 460 0 920 62008 0 Utilização para biodiesel 207000 n/d n/d n/d n/d 276 14720 18168 Na Tabela 2-4 observa-se que existem países que já fazem uma recolha significativa, ou quase total, dos óleos usados, como por exemplo a Alemanha. É de salientar que os dados da Tabela 2-4 referentes a alguns países não são concordantes com os dados estimados (Tabela 2-3). A discrepância demonstrada, para alguns países, deve-se essencialmente à falta de dados registados. Outro factor que pode também contribuir para tal discrepância é a comparação de dados de anos diferentes, os dados de consumo de óleos alimentares são do ano de 2007 e os dados obtidos pelo projecto BioDieNet são relativos ao período compreendido entre os anos de 2007 e 2009. Se a este facto, se juntar a hipótese de que, em vez de 45% dos óleos vegetais consumidos virem a traduzir-se em resíduos, se hipoteticamente se considerasse uma fracção de 80% como referido em Veloso (2007), então, por exemplo, o valor para a situação de Espanha (ver Tabela 2-5), aproxima-se mais do valor obtido pela Tabela 2-4 (1242000 ton/ano), relativamente ao valor encontrado na Tabela 2-3 (545148 ton/ano). No caso de Itália, Hungria e Noruega verifica-se o contrário: a produção de OAU registada é reduzida quando comparada com o consumo de óleos alimentares, levando a concluir que os resultados obtidos para estes países são parciais, não considerando provavelmente todas as fontes produtores de OAU, não sendo assim possível obter um valor global. 12 Caracterização dos OAU CAPÍTULO 2 Tabela 2-5 - Produção de óleos alimentares usados na Europa estimada considerando que 80% são resíduos (ton/ano), para o ano 2007 (FAOSTAT, 2011) País Áustria Bélgica Croácia República Checa França Alemanha Holanda Itália Irlanda Suíça Eslováquia Espanha Reino Unido Hungria Noruega Portugal Roménia Produção OAU (80%) 152969 196303 56417 163160 1016865 1146360 242227 1320922 68955 111757 54745 969152 867304 150799 57091 152026 227865 Na Tabela 2-6 apresentam-se os dados de produção e recolha dos OAU segundo (Greenea, 2010). Tabela 2-6 - Produção de óleos alimentares usados na Europa em 2009 (Greenea, 2010) País Alemanha Espanha Holanda Itália Reino Unido Áustria Bélgica Croácia República Checa França Irlanda Suíça Eslováquia Marta Nunes Produção OAU (ton) 185000 113750 45920 70000 225000 42900 40000 13552 28560 95000 30000 12500 15120 Recolha OAU (ton) 148000 54600 24600 40000 100000 9000 23126 2500 12240 32000 5300 9000 6480 13 Caracterização dos OAU Comparando a tabela anterior com a Tabela 2-4, observa-se a discrepância de valores para alguns países, nomeadamente para Espanha e Reino Unido, em que as diferenças são mais acentuadas. Pode verificar-se que, segundo Greenea (2010), a Alemanha, Holanda, Itália e Reino Unido não recolhem tudo o que produzem, como anteriormente se tinha já perspectivado. Na Tabela 2-7 está listado o valor de produção per capita de OAU ao nível de alguns países da Europa. Observa-se que a seguir a Espanha, Portugal é o país com maior consumo per capita. Isto indica-nos que é realmente urgente promover a recolha de óleos alimentares usados, visto a produção ser elevada, este resíduo tem um potencial considerável de valorização, quer na síntese de biocombustíveis, quer de outros materiais. Tabela 2-7 – kg de OAU per capita na Europa (BioDieNet, 2007-2009) País Alemanha Espanha Holanda Hungria Itália Noruega Portugal Reino Unido kg OAU per capita 2,80 27,92 3,77 0,55 0,93 0,40 8,34 1,36 As diferenças encontradas ao longo da análise dos dados sugerem que os hábitos alimentares são diferentes de país para país e que, outro factor que possivelmente influencia a coerência é a fonte dos OAU. Por exemplo, num país a produção de OAU pode ser maioritariamente do sector HORECA e noutro país pode provir essencialmente do sector doméstico, influenciando assim a qualidade do óleo e, consequentemente, a quantidade de óleo alimentar considerada resíduo. É de referir que não existem dados documentados dos OAU e, como tal, os dados encontrados são apenas estimativas. Contudo, como o que se pretende analisar é a situação da produção e recolha de óleos alimentares usados em Portugal, verifica-se que o valor obtido para Portugal na Tabela 2-3 (85514 ton/ano) é semelhante à estimativa da Tabela 2-4 (88320 ton/ano). Segundo Maurício (2008) e Rodrigues (2006), a produção de OAU em Portugal é de 88336 ton/ano, valor que também se aproxima dos quantitativos anteriormente mencionados. Face a esta coerência nas fontes consultadas, assume-se que os valores encontrados para Portugal, deverão ser aproximados do valor real. Relativamente à quantidade de OAU recolhida em Portugal (29,8%), parte destina-se à produção de biodiesel (55,9%) e outra à de sabão (BioDieNet, 2007-2009). Contudo, algo que 14 Caracterização dos OAU CAPÍTULO 2 é claro é que a recolha de OAU em Portugal ainda é reduzida. Espera-se que com legislação específica (Decreto-Lei n.º 267/2009 de 29 de Setembro, 2009) se verifique uma gestão mais assertiva deste resíduo, aumentando assim a proporção recolhida. 2.2.2. Custos de recolha / aquisição dos OAU Na Tabela 2-8 encontram-se listados os custos de recolha/aquisição de OAU na Europa. Tabela 2-8 – Custo da recolha/aquisição de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009) País Alemanha Espanha Holanda Hungria Itália Noruega Portugal Reino Unido Custo (€/m3) 250 240 90 0 250 140 350 320 Os dados indicam que os custos de recolha de OAU não são significativamente diferentes nos vários países. Portugal apresenta o valor mais elevado (350 €/m3), a Holanda apresenta o custo mais baixo (90 €/m3) e na Hungria a recolha é gratuita, o que significa que deve estar a ser subsidiada. Verifica-se, assim, que o custo médio de recolha dos OAU na Europa é de 234 €/m3,o que constitui um valor elevado. Contudo, de acordo com o projecto BioDieNet (BioDieNet, 2007-2009), a forma como foi calculado não é clara, podendo aos valores mais elevados estar inerentes os custos de aquisição. Segundo Cvengros (2004), o custo de recolha e transporte dos OAU situa-se entre os 150 a 200 €/ton. Refere ainda que o tratamento dos mesmos fica entre 25 a 50 €/ton o que dá um custo de OAU total entre 175 e 250 €/ton. Ora, estes valores são consideravelmente inferiores ao custo de óleo vegetal virgem. O óleo de soja, por exemplo, tem um custo de 802 €/ton (Barrientos, 2011). Esta análise permite concluir que existe um elevado potencial de valorização e crescimento de OAU em Portugal. No entanto, é de salientar que a estrutura de custos será condicionada pelo custo da recolha. De facto, apenas uma estrutura logística orientada permitirá a redução destes. Tal organização requer potencialmente subsidiação por parte do Estado e o desenvolvimento de plataformas de recolha e transporte ao nível das autarquias e grupos de autarquias. Marta Nunes 15 Caracterização dos OAU Com a publicação do Decreto-lei 267/2009 de 29 de Setembro a recolha, transporte, armazenamento e valorização dos OAU passam agora a ser controlados e o potencial dos OAU será agora investigado. Esses processos de valorização serão explorados no capítulo seguinte. 16 CAPÍTULO 3 3. ALTERANTIVAS TECNOLÓGICAS PARA VALORIZAÇÃO DE OAU Caracterizado o fluxo de OAU em Portugal, procedeu-se à elaboração de um estudo das alternativas possíveis de valorização dos mesmos, com o intuito de descortinar potenciais vias tecnológicas de transformação. É relevante avaliar quais as possibilidades para o destino do óleo alimentar usado, verificar o que é feito actualmente em Portugal e noutros países, e o que tem sido desenvolvido nos últimos anos para dar uma nova perspectiva a este resíduo. O aumento do custo dos produtos derivados do petróleo, aliado à crescente preocupação com questões ambientais, impactes negativos devido à gestão deficiente de determinados resíduos, têm suscitado o estudo pelos produtos de base biológica. Assim, o uso das commodities agrícolas têm gerado um interesse significativo para a indústria, sendo os óleos vegetais uma matéria-prima potencial (Salimon, et al., 2010). Como já foi referido, alguns dos ácidos gordos constituintes dos óleos possuem ligações duplas carbono-carbono, sendo o número dessas ligações e a sua posição características importantes do ponto vista químico. Estes compostos tornam-se industrialmente relevantes pela oportunidade de síntese que oferecem (Metzger & Bornscheuer, 2006). Na Figura 3-1 encontra-se uma representação esquemática de vários tipos de ácidos gordos constituintes dos óleos vegetais. Figura 3-1 – Representação de alguns ácidos gordos constituintes dos óleos: (1) ácido oleico, (2) ácido linoleico, (3) ácido linolénico, (4) ácido erúcico, (5) ácido icinoleico, (6) ácido petroselinico, (7) ácido 5-eicosenoico, (8) ácido calendico, (9) ácido αeleosteárico, (10) ácido punicico (Metzger & Bornscheuer, 2006) A expectativa de criar produtos a partir de matérias-primas renováveis que correspondam às exigências do mercado, torna-se um desafio constante e espera-se que num futuro próximo a investigação nesse sentido aumente cada vez mais. Ao longo deste trabalho listar-se-ão Marta Nunes 17 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU potenciais produtos desenvolvidos recentemente a partir de óleo vegetal, nomeadamente de OAU (Salimon, et al., 2010). A possibilidade mais comum e já muito estudada (já se encontra implementada em diversos países, incluindo Portugal) consiste na utilização dos OAU como matéria-prima para a produção de biodiesel. Nos últimos anos a utilização de óleos vegetais para a produção de energia tem aumentado consideravelmente, e espera-se que a sua aplicação continue a aumentar para dar resposta à legislação que se encontra em vigor (Decreto-Lei 117/2010 de 25 de Outubro) – incorporação de 10% de biocombustíveis no sector dos transportes até 2020. Ainda que a produção de biodiesel a partir de OAU seja uma alternativa, pretendeu-se estudar outras soluções, que pudessem também dar utilidade aos OAU como resíduo. De seguida, estão reunidas as várias possibilidades, encontradas na literatura, de valorização dos óleos vegetais, que se poderão estender aos OAU com um pré-tratamento, o qual será explicado posteriormente. Segundo o estudo BioDieNet (2007-2009), até ao momento do projecto as aplicações dadas aos OAU nos países em estudo, para além do biodiesel, tinham sido as apresentadas na Tabela 3-1. Tabela 3-1 – Aplicações dos OAU, para além do biodiesel, segundo o projecto BioDieNet (2007-2009) País Holanda Itália Portugal Espanha Alemanha Hungria Noruega Aplicações Indústria da madeira Recuperação de calor e produção de óleos lubrificantes Produção de sabão Combustível para caldeiras Indústria química, unidades de biogás (recentes) Forragem, indústria química e de processamento de asfalto Incineração para recuperação de calor Para além destas possibilidades, um estudo efectuado no Reino Unido detalhou que os OAU têm actualmente diversas aplicações (Group, 2007): OAU do sector doméstico e HORECA – biodiesel, oleoquímicos e incineração; OAU do sector industrial – ração animal. Note-se que a listagem acima não pretende ser exaustiva, mas somente dar conta de potenciais vias para a valorização de resíduos, que põe dificuldades adicionais em termos de tratamento. Por outro lado, é comum aceitar-se, como acontece em Inglaterra, que a fracção mais importante de OAU é destinada ao processamento de biodiesel. Nesta tese, discutem-se essencialmente duas vias de transformação/valorização: 18 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 A. Uso de OAU, após tratamento de purificação, para síntese de novos produtos (ex.: biodiesel, sabão e alguns compostos na área da oleoquímica, nomeadamente ácidos); B. Inclusão de OAU, após tratamento de purificação, em novos produtos sem que haja reacção (ex: uso como adjuvante em pesticidas, uso como fonte de carbono em sistemas envolvendo bactérias metanogénicas, rações animais). A Figura 3-2 apresenta uma representação esquemática das vias de transformação/valorização possíveis para os OAU e os produtos associados considerados nesta fase Síntese Biodiesel Sabão Ácidos OAU Purificação Rações animais Adição Pesticidas Biogás Figura 3-2 - Representação esquemática das duas vias de transformação/valorização A produção de biodiesel é de facto a via mais usada, uma vez que o estado-da-arte referente ao uso de OAU para este fim parece estar neste momento dominado (Zhang, et al., 2003; Refaat, 2009; Canakci & Sanli, 2008). Apesar das potenciais aplicações que não envolvem síntese serem bastante interessantes, perspectiva-se que consumirão apenas uma pequena parcela do total de OAU. Contudo, tem-se a consciência de que a sua utilização requer estudos mais detalhados com o intuito de definir vantagens/desvantagens e impactos ao nível do ciclo de vida. Seguidamente serão analisadas sumariamente algumas das aplicações mencionadas. Marta Nunes 19 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU 3.1. Biodiesel Esta secção é dedicada à análise da via referente à utilização de OAU para a produção de biodiesel. Este tema será abordado apenas para analisar o modo como esta alternativa se encontra em Portugal e qual a relevância dos OAU como matéria-prima. É sabido que a utilização de OAU para a produção de biodiesel é o método de valorização mais comum, já está em prática em vários países e, por isso, é uma estratégia viável de valorização dos OAU. O biodiesel é definido, de acordo com a Directiva 2003/30/CE de 8 de Maio, como éster metílico produzido a partir de óleos vegetais ou animais com qualidade para ser usado como biocombustível em motores diesel. A sua utilização está inerentemente associada à substituição de combustíveis fósseis, sem necessidade de modificação dos motores. As matérias-primas para a produção de biodiesel são óleos provenientes de fontes naturais ou renováveis, como sejam óleos vegetais (óleo de palma (dendê), soja, babaçu, amendoim, girassol, mamona, colza, pinhão, canola, algodão, entre outros), gorduras animais (sebo de gordura animal, óleos de peixe, banha de porco, entre outros) ou residuais (OAU). A seguir apresentam-se alguns dados estatísticos sobre a produção de biodiesel na Europa, quer a partir de matéria-prima virgem, quer de OAU. Na Figura 3-3 observa-se a evolução da produção de biodiesel na Europa ao longo dos anos. Figura 3-3 – Tendência da produção de biodiesel na Europa entre 1998 e 20113 (‘000ton) (European Biodiesel Board, 2011) Em 2010 a produção de biodiesel na Europa registou um aumento de 5,5% em relação a 2009. Apesar deste aumento, ocorreu um abrandamento no crescimento, uma vez que a taxa de crescimento foi inferior a anos anteriores, nomeadamente em 2009 (17%) e 2008 (35%). 3 As barras referentes a 2011 são apenas uma estimativa 20 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 Em 2010, a Espanha foi o terceiro maior produtor de biodiesel na Europa, à frente da Itália, que teve um ligeiro declínio na produção. A Alemanha e a França continuam a ser os principais países produtores de biodiesel. Em Julho de 2011, a capacidade de produção europeia de biodiesel chegou a 22 milhões de toneladas. O número de instalações de biodiesel existentes foi de 254, ligeiramente superior em relação a 2009 devido ao arranque de algumas novas unidades de produção. Observa-se, a partir da figura anterior, que nos últimos anos a Europa tem investido na indústria de biocombustíveis com particular destaque para o biodiesel. Estimava-se, ainda, que em 2011 (no primeiro semestre) a produção de biodiesel viesse a ter uma ligeira diminuição. O aumento das importações provenientes de outros países, como a Argentina e a Indonésia, podem ter contribuído para diminuir essa produção. Relativamente a Portugal, segundo a European Biodiesel Board (2003), em 2009 registou-se uma produção de 250000 toneladas. Na Tabela 3-2 encontram-se dados de produção de biodiesel a partir de OAU na Europa. É de salientar que se considerou para efeitos de conversão que 1kg de OAU equivale a 0,85 L de biodiesel (BioDieNet, 2007-2009). Tabela 3-2 – Produção de Biodiesel a partir de OAU na Europa (BioDieNet, 2007-2009) País Quantidade (m3/ano) Alemanha 216614 Espanha 169182 Holanda n/d Hungria 0 Itália n/d Noruega 260 Portugal 12512 Reino Unido 39412 Nota: n/d – dados não disponíveis Em Portugal a percentagem de OAU utilizada para biodiesel é de 55,9%, sendo que essa parcela representa apenas 4,4% do biodiesel produzido actualmente em Portugal. Se em Portugal todos os OAU produzidos fossem recolhidos, 29,2% da produção de biodiesel podia ser obtida a partir de OAU. Face aos dados apresentados acima, verifica-se que Portugal tem revelado um bom desempenho no que se refere à produção de biodiesel com base em OAU. Tendo por base os valores já apresentados no Capítulo 2, uma estratégia a adoptar para melhorar a performance consiste em aumentar a quantidade de OAU recolhido e valorizá-lo como biodiesel. Para aumentar a produção de biodiesel a partir de OAU poderá admitir-se a inserção destes, nomeadamente a quantidade que actualmente não está a ser recolhida, numa linha de produção de biodiesel (a partir de óleos virgens) já existente. De forma a facilitar a Marta Nunes 21 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU distribuição dos OAU recolhidos poder-se-ia considerar a inserção dos óleos em duas ou mais linhas de produção de biodiesel em Portugal. As diferenças dos óleos alimentares usados, face aos virgens, devem-se essencialmente ao teor de sólidos, água e AGL, como foi mencionado no Capítulo 2. Estes três parâmetros revelam-se de extrema importância para a produção de biodiesel, sendo que a água não pode exceder o teor de 0,05% (m/m) e os AGL devem apresentar um valor de 0,5% (m/m) ou menos, pois podem formar emulsões e tornar a separação do biodiesel mais difícil, levando à perda de rendimento (Sanford, et al., 2009). Assim sendo, para poder juntar o OAU com óleos virgens, é necessário fazer um pré-tratamento aos OAU. O problema decorrente do teor de AGL, resolve-se com a diluição dos OAU em óleos virgens. Com base nos dados da literatura referentes aos AGL (Sanford, et al., 2009), verifica-se que se a percentagem de incorporação dos OAU nos óleos virgens não for superior a 17% para óleo de girassol e 16% para óleo de soja, não é necessário um tratamento específico para remoção destes compostos. O custo de produção de biodiesel a partir de OAU toma o valor de 210 €/m3 de biodiesel (Maurício, 2008). Segundo M. Canakci (2008) o biodiesel obtido a partir de OAU tem um custo de 420 a 570 €/m3. Este valor indica que a margem entre o custo da matéria-prima (350 €/m3) e o custo do produto final é reduzida, significando que os custos de operação vão definir a praticabilidade desta alternativa. Contudo, convém referir que a produção de biodiesel tem neste momento alguns benefícios fiscais para incentivar a sua utilização, nomeadamente na isenção do imposto sobre os produtos petrolíferos (ISP). O valor de isenção varia entre 280 € e 300 € por cada 1000 L de biodiesel produzidos (Decreto-lei 66/2006 de 22 de Março). Por outro lado é clara a redução ao nível do impacto ambiental dos OAU. É de salientar ainda, que a produção de biodiesel e todas as outras alternativas referidas no presente trabalho, requerem um pré-tratamento dos OAU. 3.1.1. Pré-tratamento dos OAU Para verificar se a utilização de OAU numa unidade de produção de biodiesel é uma solução viável, é necessário averiguar os custos de instalação e operação que um projecto destes acarreta. Para tal, de acordo com as referências bibliográficas, seria necessário uma filtração para a remoção dos sólidos e uma destilação para a remoção de água, o que segundo Refaat (2009) é o processo mais utilizado a nível industrial para o fim em mente. Por outro lado, outros estudos referem que uma filtração, para a remoção dos sólidos grosseiros e uma decantação, seguida de uma unidade de destilação flash para a remoção da água são suficientes para o fim em causa. Esta sequência de tratamentos é idêntica, contudo no presente estudo optou-se pela última abordagem, por ser uma estratégia potencialmente mais económica. Pensa-se ainda que pelo facto da solubilidade da água no óleo ser 22 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 consideravelmente baixa, compreendida entre 0,0071 e 0,141% (v/v), a 1 e 32ºC (Gunstone, 2002), respectivamente, a água separar-se-á praticamente toda por decantação. Contudo, para garantir que as normas de produção do biodiesel sejam cumpridas em relação à quantidade de água máxima admissível, realizar-se-á uma destilação flash. Esta operação é equivalente à destilação, mas mais simples e económica, uma vez que se considera um único andar de equilíbrio. Este estágio irá promover a evaporação da água dissolvida. Por razões que se prendem com a redução da quantidade de vapor a usar como fonte de aquecimento, este estágio opera em vácuo (Rei, 2007). Para avaliar a aplicabilidade deste tratamento é essencial fazer uma análise económica, efectuando o dimensionamento dos equipamentos necessários, para posteriormente estimar os custos. Para tal, admitiu-se a existência de dois centros de pré-tratamento dos OAU e, portanto, o dimensionamento dos equipamentos está efectuado para metade do valor de OAU que não está a ser recolhido neste momento, de acordo com as estimativas apresentadas. Na Figura 3-4 encontra-se o esquema representativo do pré-tratamento dos OAU. Condensador OAU Filtração Decantação Água Sólidos Água Destilação flash Óleo tratado Valorização Figura 3-4 – Representação esquemática do pré-tratamento do OAU A operação de filtração tem como objectivo remover essencialmente os sólidos de maiores dimensões, como por exemplo, restos de comida. Deste modo, pretende-se um crivo, de malha larga, que faça essa filtração. Admitiu-se uma velocidade de filtração de 0,5 m/h, tendo em conta que é uma filtração rápida por gravidade (Amiad Filtration Systems, 2011). Tabela 3-3 – Características do crivo para a operação de filtração Crivo 3 Q (m /dia) Q (m3/h) Dimensão da malha Material Área filtração (m2) 101,21 4,22 1 mm Aço inoxidável 8,4 onde, Q é o caudal volumétrico de OAU. Marta Nunes 23 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU A decantação é uma operação relativamente simples. Consiste na separação de líquidos com base na diferença das suas massas volúmicas. Os decantadores são essencialmente tanques que proporcionam um tempo de permanência suficiente para que as gotículas da fase dispersa subam ou desçam até à interface entre as fases e coalesçam. O recipiente cilíndrico é o mais apropriado e também o mais económico para a operação (Coulson & Richardson, 1988). Com a decantação pretende-se separar a água do óleo e os sólidos ainda existentes, que se depositarão no fundo do tanque por acção da gravidade (sedimentação). As características para o projecto do decantador encontram-se na Tabela 3-4. Convém referir que se admitiu uma quantidade de água de 3% (Greenea, 2010) em relação ao óleo e o tempo de retenção considerado teve por base os valores referência do tratamento de águas residuais. Tabela 3-4 – Dimensões do decantador Decantador Qágua (m3/h) Qóleo (m3/h) Qtotal (m3/h) Qtotal (m3/dia) Diâmetro tubo alimentação (m) τ (horas) Altura tanque (m) Volume tanque (m3) Diâmetro tanque (m) 0,127 4,090 4,217 101,208 0,040 4 4,412 16,867 2,206 onde, Qágua é o caudal volumétrico de água, Qóleo é o caudal volumétrico de óleo, Qtotal é o caudal volumétrico de óleo com água e τ é o tempo de residência A água que não se separou por recurso à decantação será separada por uma destilação flash. Deste modo, considerou-se para tal efeito, um tanque pressurizado, com uma corrente de vapor a circular numa serpentina a promover o seu aquecimento, permitindo assim a evaporação da água. Acoplado a este tanque está um condensador, que tem o objectivo de condensar a água evaporada no mesmo. Para o projecto do tanque teve-se em conta os seguintes pressupostos (Wilcox, 2009): 24 O volume total do tanque é o dobro do volume da massa de líquido: O tempo de residência no tanque é de 5 min; Razão altura/diâmetro igual a 5; Fornecimento de calor através de uma serpentina; Temperatura operação: 76 ºC Pressão operação: 0,4 bar Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 O dimensionamento do tanque encontra-se descrito na Tabela 3-5. Tabela 3-5 – Dimensionamento do tanque flash Material Qágua (m3/h) Qóleo (m3/h) Qtotal (m3/h) τ (min) Vtanque (m3) Di (m) H (m) etanque (mm) De (m) Material isolamento eisolamento (mm) Calor a fornecer (kW) Qvapor (kg/h) Tanque flash Aço inoxidável 0,13 4,09 4,22 5 0,70 0,56 2,82 6,4 0,57 Fibra mineral com reforço metálico 5 202,36 335,10 onde, Qágua é o caudal volumétrico de água, Qóleo é o caudal volumétrico de óleo, Qtota é o caudal volumétrico do óleo com água, τ é o tempo de residência, Vtanque é o volume do tanque, Di é o diâmetro interno, H é a altura do tanque , etanque é a espessura do tanque, De é o diâmetro externo, eisolamento é a espessura do isolamento e Qvapor é o caudal mássico de vapor. Com o objectivo de condensar a água que sai do tanque flash, dimensionou-se um condensador, como apresentado na Tabela 3-7. O dimensionamento foi efectuado a partir de simulações efectuadas com software Aspen Engineering Suite 2006, mais especificamente o módulo HTFS. Para dimensionar este equipamento efectuou-se um balanço energético tendose obtido os resultados apresentados na Tabela 3-6. Tabela 3-6 – Resultados do balanço energético ao condensador Tentrada (ºC) Tsaída (ºC) Caudal (kg/h) Calor transferido (kJ/h) Marta Nunes Corrente quente (vapor de água) Corrente fria (água) 76 76 127 20 75 1277 293484 25 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU Tabela 3-7 – Dimensões do condensador Condensador Diâmetro da carcaça (mm) Comprimento dos tubos requerido (mm) Comprimento dos tubos actual (mm) Padrão dos tubos Queda de pressão (carcaça) (bar) Queda de pressão (tubos) (bar) Espaço de chicanas (mm) Nº chicanas Nº passagens no tubo Nº tubos Diâmetro exterior do tubo (mm) Espessura da parede do tubo (mm) 202,72 1767,7 1800 Triangular 0,02856 0,01887 135 11 1 44 19,05 1,65 É de referir que no pré-tratamento são gerados alguns resíduos. Para além do óleo filtrado sai também uma corrente de resíduos sólidos, no caso da filtração e duas correntes de água provenientes da decantação e do condensador. Por este facto é necessário dar um fim a estes resíduos, sendo que no caso dos sólidos podem ser enviados para uma empresa licenciada para o efeito e no caso da água deverá ser feito um tratamento adequado. Depois de especificadas as características dos equipamentos necessários, estimaram-se então os custos de instalação e operação, como se apresentam na Tabela 3-8. O custo dos equipamentos foi estimado com base no simulador online disponibilizado pela McGraw-Hill (McGraw-Hill, 2003). O custo do equipamento para o estágio de filtração foi determinado considerando um filtro estático. O custo do decantador foi estimado como se fosse um tanque e o tanque flash como um vaporizador com serpentina. É de salientar, que no custo dos equipamentos foi considerada a existência de uma caldeira para a produção de vapor, que é necessário para o tanque flash. Uma vez que os valores obtidos são em dólares americanos (USD), houve a necessidade de os converter para euros (€), utilizando a taxa de câmbio referente à média mensal de Outubro de 2011, em que 0,7296 € equivale a 1 USD ( Banco de Portugal, 2009). Tabela 3-8 – Estimativas do custo dos equipamentos 26 Equipamento Custo (€) Crivo Decantador Tanque flash Condensador Caldeira Total 165683 99736 16430 4003 9850 295702 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 Para a determinação do investimento de capital fixo (ICF) utilizou-se o método de Guthrie (Peters & Timmerhaus, 1991). Na Tabela 3-9 encontram-se os parâmetros que permitem obter o factor correctivo . Tabela 3-9 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo Parâmetro Materiais para a instalação Overheads da construção Instalação de equipamentos Transporte, seguros e taxas Despesas de engenharia contratada 0,68 0,2 0,06 0,21 0,21 Assim obteve-se o valor de 2,822 para o factor correctivo capital fixo é de 834587 €. . O valor do investimento de Tendo em conta um período de amortização de 10 anos para os equipamentos, a taxa de amortização será de 10% ao ano. Custos de operação Pretende-se quantificar os custos que estão directamente relacionados com o pré-tratamento do OAU, nomeadamente o custo da matéria-prima e de recursos, como a água, electricidade e gás natural. Para determinar os custos de operação do processo consideraram-se as seguintes tarifas: Custo da água (EPAL, 2011) = 1,4141 €/m3 Custo energia eléctrica (EDP, 2011) = 0,11 €/kWh Custo gás natural ( Galp Energia, 2010) = 0,034966 €/kWh 3 Custo OAU (BioDieNet, 2007-2009) = 350 €/m Tendo em conta o custo do OAU verifica-se que o custo anual de aquisição de matéria-prima é de 11795000 €. Na determinação do custo da energia eléctrica, adicionou-se uma margem de 30% sobre o valor determinado. Esta margem foi pensada para assegurar o consumo de energia para bombas ou outros equipamentos que possam ser necessários que neste trabalho não estão contabilizados. A Tabela 3-10 apresenta os custos referentes à energia eléctrica consumida. Marta Nunes 27 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU Tabela 3-10 – Custo anual de energia eléctrica Equipamento kW kWh/ano €/ano Iluminação Total 2 15984 1758 2285 A água utilizada circulará num circuito fechado, admitindo que um dia é suficiente para fazer esse circuito, a necessidade anual será o equivalente à necessidade diária, adicionando uma margem de 10% por dia para eventuais perdas. A Tabela 3-11 apresenta os custos anuais referentes ao consumo de água. Tabela 3-11 – Custo anual de água Equipamento m3/ano €/ano Condensador Caldeira 1053,48 276,40 1490 391 Total 1329,89 1881 A Tabela 3-12 apresenta os custos anuais de gás natural. O gás natural será o combustível da caldeira para a produção de vapor. Tabela 3-12 – Custo anual de gás natural Equipamento ton/ano MJ m3 kW €/ano Caldeira 1490,01 3599506,58 94948,74 125,11 34961 Total custos de operação = 11862005 €/ano Após estimar os custos dos equipamentos e de operação é possível analisar a viabilidade deste projecto. Para tal, tem-se em conta a taxa de amortização anual do custo dos equipamentos e os custos de operação. Somando à taxa de amortização anual de 83458 € (durante 10 anos) os custos de operação de 11862005 €/ano, dá um total anual de 11945463 €. Sabendo que o custo do óleo vegetal virgem ronda os 802 €/ton (custo óleo soja) (Barrientos, 2011), admitindo a mesma quantidade de óleo por ano, a matéria-prima virgem tem um custo de 24865208 €. Este valor é superior ao custo de recolha e tratamento do OAU, verificando-se assim que a utilização de OAU em substituição do óleo virgem é economicamente favorável. Com a utilização de OAU é possível reduzir os custos de matéria-prima em 52%. 28 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 É de salientar ainda, que as dimensões e custos associados aos equipamentos obtidos foram determinados tendo como base metade da quantidade de OAU que poderia ser recolhida, mas na realidade sabe-se que por agora esse montante é difícil de obter e poderá ser viável considerar-se, por exemplo, a existência de equipamentos de menores dimensões. Obviamente, que unidades de tratamento mais pequenas, implicam também custos inferiores. Em suma, a conversão dos resíduos de óleo vegetal em biodiesel é, actualmente, uma realidade, não só por imposições comunitárias, mas porque traz vantagens do ponto de vista ambiental e apresenta a melhor relação preço-eficácia, em termos de recolha e recuperação. 3.2. Produção de sabão A nível nacional, uma das principais indústrias a recorrer aos óleos vegetais usados é a indústria do sabão, utilizando o OAU como matéria-prima auxiliar. A reacção de produção de sabão, envolve a transformação dos triglicerídeos e dos ácidos gordos livres numa mistura de sais de ácidos carboxílicos (o sabão) e de glicerol. As reacções de saponificação dos triglicerídeos e de saponificação dos ácidos gordos livres, são as seguintes: Figura 3-5 – Reacções de saponificação A produção de sabão é efectuada em duas fases. A primeira envolve a conversão dos lípidos em ácidos gordos livres, sendo conseguida através da ebulição com uma solução aquosa de hidróxido de sódio. Na segunda fase, adiciona-se cloreto de sódio à mistura anterior para se conseguir fazer precipitar o sabão (sais de ácidos carboxílicos) (Rodrigues, 2006). De acordo com as estimativas apresentadas no capítulo 2, da quantidade recolhida de OAU em Portugal (28600 m3/ano), 12600 m3/ano (44%) destinam-se à produção industrial de sabão (BioDieNet, 2007-2009). Marta Nunes 29 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU 3.3. Oleoquímicos Das possibilidades de valorização dos OAU por recurso a síntese, várias encontram-se no ramo da oleoquímica. Este ramo utiliza ácidos gordos, ésteres gordos e glicerol obtidos a partir de oleaginosas como matérias-primas ou como produtos de base, desempenhando um papel significativo na indústria química na mudança para os produtos de base biológica, “amigos do ambiente” (Edser, 2004). De acordo com Metzger e Bornscheuer (2006), os óleos vegetais são hoje a mais importante matéria-prima renovável para a indústria química. Na Figura 3-6 apresentam-se alguns desses compostos. Cloretos de alquil Óleos e gorduras Ésteres metílicos de ácidos gordos Álcoois gordos Álcoois gordos etoxilados Sulfatos de álcoois gordos Ésteres Glicerina Triacetina Ésteres (poli)glicerol Ácidos gordos Ésteres de ácidos gordos Ácidos gordos conjugados Alquil epoxiésteres Ácidos dimeros Ácido azelaico/pelargónico Ácidos amino acetilados Figura 3-6 - Processamento industrial de óleos e gorduras naturais e os seus produtos derivados (Hill, 2007) Analisando a representação esquemática acima, a partir de óleos e gorduras é possível produzir uma vasta gama de produtos na indústria química, alguns dos quais serão apresentados de seguida. É de salientar que na literatura consultada, na maior parte dos casos, esses produtos são referidos como sendo processados a partir de matéria-prima virgem. Contudo, como no presente trabalho se analisa a sua produção a partir de OAU, admite-se que um tratamento prévio destes óleos é suficiente para ficar com as características desejadas para subsequente processamento, mesmo admitindo quebras de eficiência. Conforme se referiu anteriormente, os óleos e gorduras possuem diferentes composições consoante a sua cadeia, dependendo da fonte de óleo utilizado. Reacções diferentes levam a uma ampla gama de ésteres de ácidos gordos, cada um possuindo diferentes tipos de unidades estruturais. Estas unidades estruturais podem ser utilizadas para introduzir novas 30 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 funcionalidades que podem ser convertidas em oportunidades de mercado (Bozell, 2004). Em processos industriais, através da aplicação de diferentes tecnologias, podem dar origem a ácidos gordos livres, ésteres metílicos de ácidos gordos, glicerol e, como produtos de hidrogenação de ésteres metílicos de ácidos gordos, álcoois gordos (Salimon, et al., 2010). Os oleoquímicos básicos são produzidos geralmente por reacções de transesterificação, hidrólise ou hidrogenação a partir de óleos vegetais (Metzger & Bornscheuer, 2006) e podem ser utilizados na síntese de compostos quimicamente puros. A partir do óleo de girassol, por exemplo, pode produzir-se o ácido oleico; do óleo soja, o ácido linoleico; do óleo de linhaça, o ácido linolénico; das sementes de colza, o ácido erúcico e do óleo de ricínio, o ácido ricinoleico (Meier, et al., 2007). Relativamente à produção de oleoquímicos, os diácidos são compostos importantes para a produção de poliésteres e poliamidas. Diácidos, como o ácido azelaico (C9) e o ácido brassílico (C13) podem ser produzidos a partir do ácido oleico e do ácido erúcico, respectivamente, por ozonólise, originando o ácido nanaóico como sub-produto. O ácido adípico e o ácido láurico podem ser obtidos a partir do ácido petroselínico. Os dímeros ácidos C36 são também um grupo importante, utilizados principalmente para a produção de poliamidas. O seu monómero é designado comercialmente por ácido isoesteárico e é usado em cosméticos pela boa espalhabilidade, solubilidade e emoliência e também na indústria dos lubrificantes por causa de baixa viscosidade, boa estabilidade oxidativa e hidrolítica e boa solubilidade em vários solventes (Metzger & Bornscheuer, 2006). Na indústria, epóxidos de óleo vegetal são actualmente utilizados principalmente como estabilizadores de PVC. A preparação de polióis de epóxidos de ácidos gordos e óleos vegetais para uso de poliuretano foi tema de muitos estudos. Eventualmente, polieteres-polióis epoxidados derivados de compostos gordos podem substituir os compostos petroquímicos em várias aplicações. Oleato de metilo foi epoxidado e ainda modificado com ácido acrílico para formar um adesivo sensível à pressão (por exemplo o Post-It) (Bozell, 2004). A conversão microbiana de ácidos gordos é também de grande interesse. A Cognis 4 desenvolveu uma linhagem de Candida tropicalis através da engenharia metabólica para oxidar um grupo metil terminal de uma cadeia para depois obter o diácido C18 (Hill, 2007; Metzger & Bornscheuer, 2006). Uma ampla variedade de enzimas podem ser utilizadas para a conversão de gorduras e óleos e a sua aplicação na modificação de lípidos está bem documentada na literatura. Os biocatalisadores mais usados são lípases para os quais gorduras e óleos são os seus substratos naturais. As lípases foram utilizadas em escala industrial para produzir ésteres simples com aplicações em cosméticos, por exemplo (Metzger & Bornscheuer, 2006). 4 Conceituada empresa de oleoquímicos Marta Nunes 31 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU Dentro dos produtos oleoquímicos, alguns dos quais já listados, vários grupos de produtos podem ser destacados: oleoquímicos para aplicação em polímeros, lubrificantes, cosméticos, surfactantes, emolientes e pesticidas são alguns deles. Os óleos vegetais têm também sido utilizados há muito tempo na constituição de tintas e como materiais de revestimento (Meier, et al., 2007). A utilização de óleos vegetais mais especificamente OAU para aplicações em polímeros, surfactantes, lubrificantes e pesticidas serão de seguida abordadas. 3.3.1. Polímeros Oleoquímicos como matéria-prima para a produção de materiais poliméricos representam um pequeno mercado, mas bem estabelecido. O óleo de linhaça, é usado para produzir linóleo. Outro exemplo é o óleo de soja epoxidado (ESO), que é utilizado em plásticos e como aditivos para revestimentos, tendo um mercado relativamente estável. Os ácidos dicarboxílicos são produzidos industrialmente pela ozonólise do ácido oleico a ácido azelaico (um dos poucos exemplos de utilização à escala industrial da ozonólise) ou por dimerização do ácido linoleico e ácido oleico para obter misturas complexas de alto peso molecular (Salimon, et al., 2010). 3.3.2. Surfactantes Os surfactantes ou tensioactivos são compostos orgânicos, constituídos por moléculas anfipáticas, tendo uma parte polar (cabeça) e outra apolar (cauda), com propriedades de actividade superficial, resultado da adsorção destes compostos na superfície de líquidos ou na interface entre dois líquidos imiscíveis. Os surfactantes são utilizados em diferentes áreas. Os campos com maior importância, são sem dúvida o da limpeza (por exemplo detergentes), do tratamento de têxteis e cosméticos. Também são usados no sector alimentar, na protecção das culturas, na produção de tintas, revestimentos e adesivos. Apesar de muitos surfactantes existentes continuarem a ser de base química, existe uma tendência contínua para que estes sejam substituídos por surfactantes com base em recursos renováveis. (Salimon, et al., 2010). Alguns destes surfactantes têm o benefício adicional de tanto a parte hidrofílica como a parte hidrofóbica poderem ser de base biológica, como um açúcar e um ácido gordo, respectivamente. O glicerol, sub-produto da produção de biodiesel quando se utilizam processos catalisados por bases, é outra fonte de baixo custo para o processamento de surfactantes de base biológica, designados por poliglicéridos, estes compostos já demonstraram ser bons hidrófobos. 32 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 Actualmente, os surfactantes constituem um dos grupos mais importantes de oleoquímicos, sendo a mais recente inovação, a produção de alquil poliglicosídeos pela catálise ácida da reacção do álcool láurico com glucose (Metzger & Bornscheuer, 2006). 3.3.3. Pesticidas Os pesticidas, fazendo parte do conjunto de tecnologias associadas à modernização da agricultura, são depositados sobre a superfície de partes vegetais, como ramos, folhas e frutos. Alguns devem permanecer sobre essas superfícies; outros devem ser absorvidos, para exercerem o seu efeito no interior dos tecidos vegetais. A superfície das plantas apresenta uma barreira para a penetração de líquidos, denominada cutícula, cujas características variam de espécie para espécie e dependem da idade dos órgãos vegetais e das condições climáticas. Para que os pesticidas consigam vencer as cutículas, são utilizadas substâncias inertes, denominadas aditivos ou adjuvantes, capazes de modificar a actividade dos produtos aplicados e as características da pulverização. Estes produtos podem ser adicionados aos pesticidas pelas empresas fabricantes ou podem ser adicionados à calda no momento da pulverização (Queiroz, et al., 2008). As formulações de pesticidas incluem dois componentes principais: os compostos activos e os inertes. Os primeiros são responsáveis por destruir, prevenir ou repelir insectos, fungos, ervas daninhas, roedores ou outras pragas. Os compostos inertes não têm nenhuma acção pesticida. Existem vários tipos de compostos inertes normalmente encontrados na formulação de pesticidas, como por exemplo emulsionantes, solventes orgânicos, agentes dispersantes e agentes humectantes. Tendo sido feita uma pesquisa no sentido de incorporar os OAU na produção de pesticidas, verificou-se que óleos vegetais são já adicionados a alguns pesticidas (herbicidas, fungicidas e insecticidas) como adjuvantes e/ou solventes. As fracções adicionadas são reduzidas, mas o uso de OAU permitirá a substituição dos óleos virgens e a valorização deste resíduo. Os adjuvantes são substâncias que aumentam a eficiência ou modificam determinadas propriedades da solução, visando facilitar a aplicação ou minimizar possíveis problemas (Queiroz, et al., 2008). Os óleos vão reduzir a tensão superficial das gotas pulverizadas sobre a planta, aumentando a área de contacto. A sua utilização vai aumentar a facilidade de penetração do produto na cutícula da planta e, consequentemente, poderá diminuir a dose necessária dos compostos químicos activos. Estudos demonstram que alguns óleos vegetais (soja, algodão, linho, amendoim e girassol) aderem melhor às folhas de plantas ou insectos, mesmo depois de chuvas fortes por causa da sua natureza polinsaturada, aumentando assim a eficácia dos princípios activos, permitindo reduzir as quantidades de ingredientes activos perdidos para o ambiente e, consequentemente Marta Nunes 33 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU os custos. Ésteres metílicos de óleos vegetais são referidos também como bons solventes para pesticidas (Salimon, et al., 2010). É de salientar que os dados existentes na literatura para este tipo de aplicação são relativos aos óleos vegetais, não havendo referência à utilização de óleos alimentares usados. Contudo, como não são mencionadas especificações do óleo a utilizar, assume-se que fazendo um prétratamento aos OAU para remoção dos sólidos (discutido na secção 3.1.1), estes também podem ser utilizados na formulação dos pesticidas. Segundo a patente US 2010/0173782 A1 a quantidade de óleos que se incorpora nos pesticidas é baixa, entre 0,05% e 0,5%, o que significa que esta alternativa teria apenas potencial para integrar uma pequena fracção do OAU recolhido (Bohus, et al., 2010). Sabendo que o consumo de herbicidas, insecticidas, fungicidas e bactericidas em Portugal se estima em 14000 ton/ano ( Instituto Nacional de Estatística, 2011) verifica-se que se utilizaria apenas cerca de 0,07% do OAU que pode vir a ser recolhido por ano. É de salientar que este valor se encontra em excesso visto o consumo de pesticidas em Portugal ser superior à produção, pois Portugal não exporta este tipo de produtos. Conclui-se que a utilização dos OAU para a produção de pesticidas é uma alternativa mas não resolve o problema dos OAU como resíduo. Apesar da incorporação dos óleos em pesticidas não ser suficiente para o escoar, no presente trabalho analisar-se-á esta via. De facto, é analisada a integração de OAU como adjuvante em ensaios de teste de performance de um agente biocida (pesticida não agrícola). A perspectiva aqui explorada (no Capítulo 5) é a de mais tarde vir igualmente a analisar a probabilidade de incrementar gamas mais elevadas de OAU. 3.3.4. Lubrificantes Tem havido uma constante procura dos chamados lubrificantes ''verdes'', isto é, lubrificantes obtidos a partir de matérias-primas renováveis. O mercado nacional de lubrificantes de automóveis é significativo, com um consumo entre 23 a 25 milhões de litros por ano. Os óleos vegetais apenas fornecem uma fracção desse mercado. Os óleos vegetais apresentam boa lubricidade, bom poder anti-corrosão e possuem a capacidade de não evaporarem a altas temperaturas em aplicações industriais. A sua volatilidade é baixa, devido ao alto peso molecular dos triglicerídeos e têm uma estreita faixa de variação da viscosidade com a temperatura. No entanto, o seu uso ainda é restrito, devido à baixa estabilidade termooxidativa e ao seu comportamento quando sujeitos a baixas temperaturas, pois tendem a formar estruturas macrocristalinas, limitando assim o seu uso. Existem várias maneiras para minimizar a oxidação e o impacto ao nível do comportamento a baixas temperaturas. Estes incluem a modificação pela utilização de calor, transformações químicas, mudanças genéticas ou a utilização de aditivos. 34 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU CAPÍTULO 3 Relativamente às modificações genéticas, já foram produzidos óleos com semelhante ou melhor estabilidade oxidativa em comparação com os lubrificantes de base petroquímica (Hill, 2007; Salimon, et al., 2010). De referir, que no caso dos lubrificantes, já existem referências na literatura quanto à utilização de OAU para a sua produção (BioDieNet, 2007-2009; Salimon, et al., 2010). Entre os produtos que potencialmente poderão ser processados integrando OAU listam-se o ácido azelaico (ozonólise), o ácido dicarboxílico C18 (bio-oxidação), dímeros de ácidos gordos (dimerização), polióis (epoxidação), entre outros (Hill, 2007). Esta utilização abre claramente um vasto campo de oportunidades para gerar um produto de elevado potencial de crescimento, à custa da valorização de OAU. Esta via será particularmente analisada com a instalação de uma unidade industrial para a produção de ácido azelaico (Capítulo 6). 3.4. Ração animal Em Portugal, a utilização de OAU como componente da ração animal poderá constituir um processo de valorização do resíduo. Para que esta alternativa tecnológica se torne viável, seria necessário implementar em Portugal pelo menos dois sistemas de recolha de OAU distintos: um sistema que incluísse o sector doméstico e HORECA e outro para o sector industrial, tal como acontece, por exemplo, no Reino Unido. Esta necessidade de sistemas de recolha diferenciados, deve-se essencialmente à diferença dos óleos em questão. Os OAU provenientes do sector doméstico ou HORECA têm geralmente menor qualidade, uma vez que possuem maior quantidade de resíduos associados e podem conter uma mistura de vários tipos de gorduras, nomeadamente gordura animal (principalmente no sector doméstico). Se isto acontecer, a integração de OAU na cadeia alimentar não pode ser levada a cabo por imposição legal decorrente da Decisão da Comissão, nos termos do Regulamento (CE) n.º 1774/2002 do Parlamento Europeu e do Conselho, no que respeita à utilização de óleos alimentares usados nos alimentos para animais (Comissão das Comunidades Europeias, 2003). O tipo/qualidade de óleo recolhido é bastante difícil de controlar, geralmente os óleos dos sectores domésticos e HORECA apresentam características muito variadas, sendo mais fácil o controlo dos óleos no sector industrial, justificando assim a necessidade de dois sistemas de recolha de OAU. É de salientar, que mesmo a glicerina produzida como produto secundário da produção de biodiesel, não é passível de ser integrada em rações animais, quando a ausência de gorduras animais não estiver assegurada e garantida. É de referir ainda, que esta utilização é controversa, havendo mesmo alguns países europeus nos quais a utilização de OAU (mesmo de origem vegetal) para rações animais, já foi proibida. Em questão está, se a qualidade destes óleos constituirá ou não uma ameaça à saúde Marta Nunes 35 Alternativas tecnológicas para valorização de OAU dos animais e também a possibilidade dos OAU entrarem novamente na cadeia alimentar através dos animais (Cvengros & Cvengrosová, 2004). 3.5. Digestão anaeróbia A digestão anaeróbia de resíduos possibilita o tratamento de resíduos orgânicos e a produção simultânea de energia, sendo um processo já estabelecido em Portugal. Muitos estudos têm sido efectuados nos últimos tempos para melhorar o desempenho dos digestores anaeróbios. Uma dessas possibilidades é a integração de óleos/gorduras como co-substrato na digestão anaeróbia de resíduos orgânicos. Se esta via for viável à escala real, poderá trazer um aumento significativo na produção de biogás, através da valorização de um resíduo que até agora não possuía um destino adequado. A viabilidade desta aplicação será explorada no Capitulo 4. Em suma, os óleos e as gorduras apresentam-se actualmente como um potencial recurso para as mais diversificadas indústrias. Uma grande variedade de produtos à base de gorduras e óleos têm sido desenvolvidos para diferentes usos. Para além da utilização dos óleos vegetais na alimentação e ultimamente no biodiesel, estão ainda presentes nos mais diversificados produtos, como plásticos, produtos farmacêuticos, tintas, adesivos, surfactantes, entre outros. 36 CAPÍTULO 4 4. BIOGÁS - USO DE OAU COMO CO-SUBTRATO NA DIGESTÃO ANAERÓBIA Actualmente existe um interesse crescente em fontes alternativas de energia como resultado do aumento da procura de energia, do aumento do custo dos combustíveis disponíveis e da necessidade de valorizar bioresíduos em alternativa à sua deposição em aterros. Todos estes factos têm contribuído para aumentar os estudos nesta área, nomeadamente ao nível da biodegradabilidade de potenciais substratos, uma vez que alguns efluentes quando tratados adequadamente poderão gerar novas fontes de energia. A presença de componentes biodegradáveis no efluente, juntamente com as vantagens do processo anaeróbio sobre outros métodos de tratamento, como a produção de energia e a menor produção de biomassa, por exemplo, torna a digestão anaeróbia (DA) uma opção adequada para o tratamento de efluentes líquidos com elevada carga orgânica (Rajeshwari, et al., 2000; Neves, 2009). Em Portugal a tecnologia de digestão anaeróbia de efluentes e/ou resíduos ainda é pouco utilizada, ao contrário do que se passa em alguns países europeus. No entanto, a legislação europeia actual, Directiva 2009/28/CE relativa à promoção da utilização de energia proveniente de fontes renováveis, reconhece o seu potencial, prevendo a sua implementação tanto na gestão integrada de resíduos, como na produção de energia. Segundo o Plano Nacional de Reformas – Portugal 2020, em 2020 pretende-se atingir os 150 MW por esta via. O elevado volume de resíduos biodegradáveis agro-industriais, agro-pecuários e alimentares produzidos, torna esses substratos interessantes para a produção de biogás e, assim, torna-os instrumentos relevantes na concretização desse objectivo (Neves, 2009). A co-digestão de resíduos orgânicos tem surgido como uma área interessante de investigação, sendo citada como uma alternativa à digestão anaeróbia convencional. As vantagens principais são o aumento da produção de biogás e também a valorização de determinados cosubstratos. A co-digestão permite uma melhoria na relação de nutrientes na mistura de substratos e também uma melhoria na capacidade tampão do sistema, tornando o processo de tratamento de resíduos e de produção de biogás mais eficientes (Zhu, et al., 2011). Estudos recentes demonstraram que a produção de biogás aumenta quando são adicionados pulsos de óleo a diferentes substratos (resíduos orgânicos). Portanto, alterações no substrato, como o aumento da base lipídica em determinados intervalos de tempo, podem trazer benefícios na performance dos co-digestores anaeróbios (Kabouris & Tezel, 2009; Neves, 2009; Wan, et al., 2011). Deste modo a co-digestão de substratos orgânicos poderá ser uma alternativa a dar ao óleo alimentar usado. Nas secções seguintes será abordado o processo de digestão anaeróbia e da co-digestão de substratos orgânicos. Marta Nunes 37 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia 4.1. Processo de digestão anaeróbia A digestão anaeróbia é um processo mediado por uma comunidade complexa de microrganismos, que promovem a decomposição e degradação da matéria orgânica em compostos químicos mais simples e nutrientes dissolvidos, na ausência de oxigénio, permitindo assim, a estabilização bioquímica de resíduos orgânicos. O processo de DA consiste, então, na degradação da matéria orgânica com formação de um gás constituído por dióxido de carbono (CO2), amónia (NH3), sulfureto de hidrogénio (H2S) e metano (CH4), geralmente, designado como biogás. Este é uma fonte de energia renovável, podendo ser utilizado na produção de electricidade ou como combustível em veículos de transporte. Os compostos orgânicos resultantes do processo de digestão anaeróbia são normalmente utilizados para fins agrícolas (Neves, 2009; Silveira, 2009). Na maioria dos processos de digestão anaeróbia, o dióxido de carbono e o metano constituem mais de 99% do total de gás produzido. A composição do biogás varia de acordo com as características do resíduo e as condições de funcionamento do processo de digestão. Em média, é composto por 60% (55 – 70%) de metano (CH4) e 40% (30 – 45%) de dióxido de carbono (CO2) e quantidades vestigiais de outros gases (Silvério, 2011; Deublein & Steinhauser, 2008). O bom funcionamento do processo está dependente da acção cooperativa, sequencial e muitas vezes sintrófica de diferentes grupos tróficos de bactérias (Silveira, 2009). A digestão anaeróbia é um método adequado para o tratamento de resíduos de explorações agro-pecuárias, indústrias agro-alimentares, estações de tratamento de águas residuais e em sistemas de gestão de resíduos sólidos (Silvério, 2011). 4.1.1. Vantagens e desvantagens da DA Os processos de tratamento por via anaeróbia apresentam vantagens significativas relativamente aos processos convencionais aeróbios, das quais se destacam (Silveira, 2009; Ward, et al., 2008; Neves, 2009): Menor produção de biomassa (cerca de 5 vezes menor comparativamente ao processo aeróbio); Menor necessidade em nutrientes; Remoção mais eficaz de microrganismos patogénicos; Redução de odores; Capacidade da biomassa aguentar longos períodos sem alimentação; Utilização das lamas produzidas como fertilizante agrícola; Capacidade de suportar efluentes com grande carga orgânica; 38 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 Nos processos aeróbios, além de não se obter nenhum produto com valor económico, há um consumo energético associado ao fornecimento de oxigénio necessário. Por cada 100 kg de matéria orgânica degradada, expressa em CQO, consomem-se 100 kWh por via aeróbia, enquanto por via anaeróbia são produzidos 285 kWh (Neves, 2002). As principais desvantagens do processo anaeróbio são a velocidade lenta do processo comparativamente ao processo aeróbio, a elevada sensibilidade a substâncias tóxicas, o arranque lento do processo e a necessidade de se proceder a um tratamento final subsequente de modo a satisfazer os requisitos para descarga no meio receptor (Silveira, 2009). Podem também surgir alguns problemas, nomeadamente baixo rendimento em CH4 (Neves, 2009) e o washout da biomassa e, consequentemente, a instabilidade do processo (Rajeshwari, et al., 2000). O washout da biomassa pode ser resolvido pelo uso de membranas acopladas ao digestor para a retenção da biomassa. Estes factores contribuem para que esta tecnologia ainda não seja amplamente utilizada (Rajeshwari, et al., 2000). 4.1.2. Etapas principais da DA Resumidamente, o processo de digestão anaeróbia pode ser dividido em quatro etapas principais, como se apresenta de seguida (ver Figura 4-1). Figura 4-1 – Representação esquemática das fases do processo de digestão anaeróbia, adaptado de (Gray, 2004) Marta Nunes 39 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia Hidrólise Os substratos, como hidratos de carbono, proteínas e lípidos não podem ser utilizados directamente pelos microrganismos anaeróbios, tornando-se necessário a sua conversão em moléculas mais simples. Este processo ocorre durante a etapa de hidrólise, em que compostos complexos são hidrolisados nas suas unidades básicas. Os produtos da degradação enzimática dos hidratos de carbono, proteínas e lípidos são monossacarídeos, aminoácidos e ácidos gordos de cadeia longa (AGCL) e glicerol, respectivamente (Gray, 2004). A hidrólise de polímeros orgânicos é levada a cabo por enzimas extracelulares, as hidrolases, que são excretadas pelas bactérias fermentativas. Em paralelo actuam também as celulases, proteases e lípases no processo de degradação da matéria orgânica (Neves, 2009). As moléculas mais pequenas, atravessam as membranas celulares, podendo ser utilizadas pelas bactérias fermentativas durante o processo subsequente de acidogénese. Dentro da célula, estas moléculas constituem uma fonte de energia e de material orgânico para a síntese de componentes celulares (Silveira, 2009; Gray, 2004). O bom funcionamento do processo de hidrólise está dependente do contacto eficiente entre a biomassa e o substrato. A velocidade do processo de hidrólise depende fundamentalmente do comprimento das cadeias dos ácidos gordos voláteis (AGV), do estado do substrato (sólido ou líquido) e da área superficial específica, no caso dos lípidos. No caso das proteínas, depende essencialmente da sua composição (globular ou fibrosa), área superficial e solubilidade. A presença de concentrações elevadas de amónia no líquido em digestão pode inibir o processo de hidrólise, uma vez que provocam uma redução da produção enzimática (Silveira, 2009). As reacções levadas a cabo pelos microrganismos são fortemente dependentes das condições experimentais, nomeadamente de temperatura, pH, tamanho das partículas, agitação e razão inóculo/substrato (Neves, 2009). A hidrólise normalmente é a fase limitante da velocidade do processo anaeróbio quando o substrato em digestão é constituído por um teor elevado de sólidos e partículas como os efluentes de suínos, bovinos e lamas domésticas. Quando são utilizados substratos de composição simples e facilmente biodegradáveis, a metanogénese ou a acetogénese são geralmente o passo limitante do processo anaeróbio (Silveira, 2009). Acidogénese Durante a acidogénese, ou fermentação ácida, os produtos resultantes da fase de hidrólise são degradados pelas bactérias fermentativas, constituídas por uma série de estirpes bacterianas anaeróbias estritas e facultativas. Estas bactérias possuem um metabolismo variado, apresentando diferentes vias de conversão, dando origem a diversos produtos. Durante uma operação estável, os principais produtos da acidogénese são AGV, como o acetato, propionato 40 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 e butirato, CO2, H2 e outros produtos orgânicos, tais como, lactato e álcoois. O acetato, CO 2 e H2 e os compostos monocarbonados podem ser directamente utilizados na fase metanogénica (Neves, 2009; Silveira, 2009). Os níveis de AGV e H2 são uma importante fonte de informação no que se refere ao equilíbrio do processo. A acumulação de AGV no digestor baixa o pH do meio, podendo originar a supressão da actividade metanogénica e consequentemente a falha do processo (Deublein & Steinhauser, 2008). A conversão dos produtos da hidrólise dá-se no interior das células bacterianas. O desenvolvimento da acidogénese é mais rápido e menos sensível a variações de pH do que a acetogénese e a metanogénese (Neves, 2009). A quantidade e o tipo de produtos obtidos na acidogénese dependem fundamentalmente da pressão parcial de H2 no digestor, que está associada a actividade de bactérias utilizadores de hidrogénio, como por exemplo algumas espécies de bactérias metanogénicas e redutoras de sulfatos. Quanto maior for a pressão parcial do hidrogénio, menor o número de compostos reduzidos formados, como o acetato (Deublein & Steinhauser, 2008). Geralmente a população fermentativa representa cerca de 90% do total da população microbiana presente nos digestores (Silveira, 2009). Em geral, as bactérias envolvidas nesta etapa têm um tempo de duplicação curto e, portanto a acidogénese não é considerada como um passo limitante no processo de digestão (Costa, 2008). Acetogénese A acetogénese é etapa seguinte, na qual ocorre a conversão dos produtos da acidogénese em compostos que formam os substratos para a produção de metano: acetato, hidrogénio e dióxido de carbono. Na acetogénese, as bactérias acetogénicas procedem à degradação dos compostos formados durante a fase anterior (acidogénese), como AGV (propionato, butirato, valerato), álcoois, alguns aminoácidos e compostos aromáticos. Os produtos resultantes da degradação destes compostos são H2, formato, CO2 e acetato, que vão servir de substrato para as bactérias metanogénicas. O acetato e o propionato são os produtos intermediários que se encontram usualmente em maior quantidade nos digestores anaeróbios. A degradação deste último é muitas vezes o passo limitante da velocidade da digestão anaeróbia, sendo oxidado em acetato, bicarbonato, H2 ou formato (Silveira, 2009). Dependendo do estado de oxidação do material orgânico a ser digerido, a formação de ácido acético pode ser acompanhada pelo desenvolvimento de dióxido de carbono ou hidrogénio (Gray, 2004). Marta Nunes 41 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia A formação de acetato pela oxidação dos ácidos gordos de cadeia longa (por exemplo, ácido propiónico ou butírico) é termodinamicamente possível apenas quando a pressão parcial do H2 é muito baixa. Contudo, as bactérias metanogénicas crescem mais facilmente quando o H 2 se encontra em maiores quantidades. Nesta fase uma relação sintrófica entre os diferentes microrganismos é necessária para que as reacções ocorram, estando, portanto, a quantidade e a composição do biogás, dependente da actividade das bactérias acetogénicas (Deublein & Steinhauser, 2008). Metanogénese A metanogénese é a etapa final, quando ocorre a produção de CH4. Este processo é efectuado pelas Arquea metanogénicas (microrganismos anaeróbios estritos), que metabolizam os produtos finais das reacções anteriores, principalmente o H2, CO2, e acetato para produzir CH4. Outros compostos, como formato, metanol e metilaminas, também podem ser utilizados pelas Arquea metanogénicas para a produção de metano (Neves, 2009). As bactérias metanogénicas constituem um grupo diverso de microrganismos que obtém energia para o crescimento a partir de reacções que conduzem à produção de metano. Estão dependentes do bom funcionamento de todas as fases anteriores que proporcionam a disponibilidade dos substratos adequados para a sua actividade (Silveira, 2009). As Arquea metanogénicas são extremamente sensíveis à temperatura, taxa de carga orgânica, bem como flutuações de pH e são inibidas por vários compostos. As bactérias metanogénicas podem efectuar as suas funções essenciais no processo anaeróbio por duas vias (Neves, 2009). A primeira, designada por metanogénese acetotrófica, consiste na produção de CH4 e CO2 a partir da degradação do acetato, sendo as bactérias envolvidas nos processos designadas por metanogénicas acetoclásticas ou acetotróficas. Os géneros predominantes são: Methanosarcina e Methanosaeta (Gray, 2004). A metanogénese acetotrófica é responsável pela produção de cerca de 70% do metano gerado e é dada pela equação seguinte (Deublein & Steinhauser, 2008): (4-1) A segunda via corresponde à produção de metano a partir da utilização do CO2 como fonte de carbono e o hidrogénio como fonte de energia. As bactérias que a levam a cabo são designadas por hidrogenotróficas. Controlam o potencial redox do meio, mantendo a concentração de hidrogénio em níveis baixos. Os géneros predominantes são Methanobacterium, Methanospirillum e Mathanobrevibacter (Gray, 2004). A metanogénese hidrogenotrófica é dada pela seguinte equação (Deublein & Steinhauser, 2008): (4-2) 42 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 As espécies metanogénicas são mais sensíveis a uma diminuição de pH do que as espécies produtoras de ácido, o que pode provocar uma acumulação maior de ácidos e eventualmente levar à falha do processo. A produção de metano está directamente relacionada com a diminuição da carência química de oxigénio (CQO) dos efluentes. Assim, o rendimento de CH4 pode ser avaliado a partir do balanço da CQO no sistema, com base na CQO removida. Em condições normais, a produção de metano teórica é cerca de 0,35 m3/kg CQO degradada (Gray, 2004; Neves, 2009). Em suma, para uma produção de CH4 eficiente é importante ter um equilíbrio entre as taxas das reacções das diferentes etapas envolvidas na digestão anaeróbia da matéria orgânica. Como se pode verificar, há uma grande dependência entre os diferentes grupos de microrganismos, pelo facto dos produtos de uma fase constituírem o substrato para os microrganismos da fase seguinte (Neves, 2009). 4.1.3. Condições operatórias Em todos os processos de tratamento biológicos de águas residuais, a remoção eficaz de poluentes e contaminantes depende, não só do potencial metabólico dos microrganismos, mas também da existência de condições ambientais adequadas que permitam a sua actividade. De seguida apresentam-se os parâmetros operatórios principais num processo de digestão anaeróbia. Temperatura A temperatura de operação assume uma grande influência na eficiência do processo. Afecta a actividade metabólica dos microrganismos e consequentemente a velocidade de digestão e a produção de CH4. Relativamente à actividade microbiana são consideradas três gamas de temperatura: psicrófila (<20°C), mesófila (20–45°C) e termófila (>45°C). As bactérias metanogénicas apresentam um crescimento máximo na gama mesófila, a 35°C e na gama termófila a 55°C (Neves, 2009). Num processo de DA não existe uma temperatura ideal. A escolha da temperatura de operação óptima depende de factores económicos e operacionais, sendo no entanto a maior parte dos processos realizados a temperaturas mesófilas. Os microrganismos que operam na gama de temperatura mesófila são mais resistentes, toleram mudanças maiores nos parâmetros ambientais do que os termófilos. A operação de DA na gama mesófila é considerada como sendo um processo mais estável, uma vez que as bactérias termófilas são mais sensíveis a compostos tóxicos, como AGV e amónia, e a Marta Nunes 43 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia flutuações de temperaturas fora da gama ideal (Neves, 2009). A maior estabilidade dos processos mesófilos juntamente com o menor gasto energético faz com que as instalações industriais de digestão anaeróbia operem essencialmente na gama de temperatura mesófilas. No entanto, a utilização de temperaturas elevadas no processo (regime termófilo) apresenta algumas vantagens, como o aumento da solubilidade de compostos orgânicos, facilitando a sua assimilação pelos microrganismos; aumenta a velocidade das reacções químicas e biológicas, acelerando o processo de conversão, permitindo a utilização de reactores de menores dimensões e com um tempo de retenção hidráulico (TRH) inferior; melhora a difusibilidade dos substratos solúveis; aumenta a taxa de transferência da fase líquida para a fase gasosa devido à diminuição da solubilidade da fase gasosa; aumenta a taxa de destruição de bactérias patogénicas. No entanto, a utilização de temperaturas elevadas aumenta a fracção de amónia livre (NH3) que é inibitória para os microrganismos; origina um sobrenadante de pior qualidade com quantidades elevadas de sólidos dissolvidos; tem maior potencial para a geração de odores; e, como referido anteriormente, apresenta menor estabilidade relativamente aos processos mesófilos, exigindo assim um maior controlo do mesmo. Para além de todos os factores referidos a cima, a temperatura tem um efeito significativo na pressão parcial do H2, influenciando a cinética do metabolismo sintrófico. Em condições padrão, as reacções endotérmicas como a degradação do propionato em acetato, CO2 e H2, tornam-se reacções energeticamente mais favoráveis a temperaturas superiores, enquanto as reacções exotérmicas, como a metanogénese hidrogenotrófica, são desfavorecidas a essas temperaturas (Deublein & Steinhauser, 2008; Silveira, 2009). Alcalinidade e pH O pH tem um efeito na actividade enzimática dos microrganismos. A actividade das enzimas depende da gama de pH, sendo máxima para um valor de pH óptimo. O pH do meio afecta a taxa de crescimento dos microrganismos, uma vez que influencia o seu metabolismo, nomeadamente no que diz respeito à utilização das fontes de carbono e energia, às reacções de síntese e à produção de metabolitos extracelulares. O processo de digestão anaeróbia é uma sequência de degradações levadas a cabo por diferentes grupos de bactérias, sendo por isso importante conhecer qual o pH que maximiza a eficiência global do processo. Os diferentes grupos de bactérias apresentam actividade máxima para valores de pH não muito diferentes: pH entre 7 e 7,4 é óptimo para as bactérias hidrolíticas e acetogénicas; as bactérias fermentativas actuam numa gama de pH mais ampla, suportando valores entre 4 e 8,5, sendo o pH óptimo 6; e as bactérias metanogénicas actuam num intervalo estreito de pH, entre 5,5 e 8,5, com um pH óptimo entre 6,5 e 8, sendo esta última considerada normalmente apropriada para o funcionamento do processo de digestão anaeróbia (Silveira, 2009). 44 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 A capacidade tampão pode ser definida como a resistência de uma solução a mudanças de pH, sendo um parâmetro importante na estabilidade dos processos de DA. Resulta da presença de hidróxidos, carbonatos, bicarbonatos ou de elementos, tais como, cálcio, magnésio, sódio, potássio e amónia. O controlo da alcalinidade assume assim particular importância no processo de DA, por traduzir a capacidade de reacção a situações de instabilidade provocada por variações de pH, devidas, por exemplo, a um aumento da concentração de AGV. A capacidade tampão é relatada como um método mais fiável para medir desequilíbrio do digestor do que as medições directas de pH, uma vez que a acumulação de ácidos gordos de cadeia curta reduz a capacidade tampão significativamente antes do pH diminuir (Neves, 2009). Outros compostos que influenciam o balanço do pH, quando presentes em concentrações elevadas, são as várias formas de amónia (NH4+, NH3), sulfuretos (H2S, HS-, S2-) e fosfatos (H3PO4, H2PO4-, HPO42-, PO43-) (Silveira, 2009). O ião amónio (NH4+) e a amónia livre (NH3) são as duas formas predominantes de azoto inorgânico presente no líquido em digestão, sendo esta última mais tóxica, pelo facto de possuir a capacidade de penetrar nas paredes das células por difusão passiva, causando uma desregulação no balanço protónico e/ou uma deficiência em potássio (Deublein & Steinhauser, 2008). A forma ionizada (NH4+) apresenta um efeito benéfico para o processo, está associada à produção de hidróxido que reage com o CO2 no gás, formando bicarbonato, sendo este um composto importante por contribuir para o aumento da capacidade tampão do meio (Silveira, 2009). Concentrações elevadas de compostos de amónia fazem subir o valor de pH, inibindo as bactérias metanogénicas. A sua inibição provoca a acumulação de AGV, que pode provocar uma descida do pH do meio e, consequentemente, diminuir a concentração de amónia. Com esta sucessão de fenómenos o processo de digestão permanece estável, embora com uma produção de metano inferior, devido à inibição das bactérias metanogénicas (Ribeiro, 1999; Gray, 2004). 4.1.4. Co-digestão de resíduos A co-digestão de resíduos consiste na utilização de dois ou mais substratos num mesmo digestor. Esta técnica constitui uma solução interessante, tanto para aumentar o rendimento da produção de biogás como para efectuar uma gestão adequada de outros tipos de resíduos, pelo que vem sendo sucessivamente mais utilizada. Para além do tratamento de resíduos e da Marta Nunes 45 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia produção de energia, a co-digestão apresenta vantagens significativas sobre outras tecnologias de tratamento de resíduos. O princípio básico da co-digestão consiste em equilibrar vários parâmetros numa mistura de vários substratos, provenientes de diferentes fontes. Recentemente, muitos estudos têm sido feitos sobre a co-digestão anaeróbia de lamas de ETAR com resíduos sólidos urbanos e/ou com resíduos agro-pecuários e, nos vários resultados apresentados (Wu, 2007; Neves, 2009; Martín-González, et al., 2010), verifica-se um aumento significativo na produção de biogás, o que torna esta solução como sustentável. Além do maior rendimento de biogás devido a efeitos sinérgicos positivos sobre os microrganismos, a co-digestão apresenta outros benefícios em relação à digestão dos resíduos isoladamente, como a diluição de substâncias tóxicas (amónia e AGV); melhoria no equilíbrio de nutrientes, reduzindo a deficiência em micro e macronutrientes, na estabilidade do processo e nas condições de humidade necessárias à alimentação. Para além destes factores, juntam-se benefícios de ordem económica que podem ser significativos, uma vez que as infraestruturas e equipamentos são semelhantes aos da digestão anaeróbia (Neves, 2009; Silveira, 2009). Em processos de co-digestão é fundamental entender como as mudanças na composição dos substratos afectam o processo, uma vez que a percentagem dos seus constituintes, nomeadamente de hidratos de carbono, lípidos, celulose e proteínas, variam de fonte para fonte e de dia para dia (Wan, et al., 2011). Co-digestão de óleos e outros lípidos Para além dos resíduos agro-pecuários serem co-substratos benéficos, também os lípidos (óleos, gorduras e sebos, correntemente designados pela sigla inglesa FOG de fats, oil and grease) se apresentam como um potencial co-substrato para a digestão anaeróbia, podendo ser encontrados em variados resíduos e nos efluentes domésticos e industriais provenientes de matadouros e lacticínios, por exemplo. Os lípidos, quando comparados com outros resíduos orgânicos de composição bioquímica diferente, são teoricamente mais interessantes para a produção de biogás, pois têm maior potencial de geração de metano (Cirne, et al., 2007; Neves, et al., 2009b). Os lípidos como substrato ou co-substrato para os processos de digestão anaeróbia apresentam uma produção de metano (teórica) de 0,99 LNCH4/g, os hidratos de carbono 0,42 LNCH4/g e as proteínas 0,63 LNCH4/g, (Alves, et al., 2009; Neves, et al., 2009a). Neste contexto, efluentes ricos em lípidos podem ser considerados como uma fonte de energia renovável de grande potencial (Cirne, et al., 2007). No entanto, vários autores (Neves, et al., 2009b) têm referenciado a inibição da digestão anaeróbia quando os resíduos ricos em lípidos são digeridos, principalmente em reactores com alimentação contínua. As causas apontadas para o fracasso do processo têm sido diversas. Os lípidos podem originar problemas 46 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 operacionais em digestores anaeróbios, como entupimento de tubos, formação de espumas, flotação de lamas, devido à adsorção dos lípidos na camada de lamas em torno da superfície e perda de biomassa activa, levando ao washout provocado pela flotação da biomassa que se adere à gordura. Todos estes problemas limitam a eficiência operacional dos digestores. Lípidos presentes nos resíduos consistem principalmente em gorduras neutras e ácidos gordos de cadeia longa (AGCL). As gorduras neutras podem ser facilmente hidrolisadas a AGCL e glicerol através de lípases excretadas pelas bactérias acidogénicas durante a digestão anaeróbica. Os AGCL são posteriormente convertidos em acetato e H 2 pelo processo anteriormente descrito de oxidação por bactérias sintróficas acetogénicas com posterior conversão em metano pelas bactérias metanogénicas hidrogenotróficas e acetoclásticas (Cirne, et al., 2007). Apesar de, conforme se referiu anteriormente, os AGCL poderem ser compostos inibitórios de várias reacções essenciais, por exemplo, da reacção de degradação de AGCL e da metanogénese, pois tornam-se tóxicos para as bactérias metanogénicas hidrogenotróficas e acetotróficas, foi recentemente relatado (Wan, et al., 2011) que a inibição dos AGCL pode ser reversível, na medida em que foi observado que os microrganismos recomeçaram a degradar AGCL após uma fase de latência. A inibição transitória observada foi parcialmente atribuída à limitação do transporte de nutrientes às células, devido a adsorção dos AGCL nas superfícies microbianas, em vez de exclusivamente a fenómenos metabólicos. Este facto abre novos horizontes para a digestão e co-digestão anaeróbia de resíduos e efluentes com alto teor lipídico. A co-digestão de FOG com lamas domésticas, estrume ou outros substratos facilmente degradáveis (por exemplo, a glicose), a adição de adsorventes e o aumento da população microbiana (bioaumento) têm sido utilizados para superar a inibição provocada pelos AGCL. Além dos métodos acima mencionados, a existência de micronutrientes disponíveis, por exemplo, Co, Fe, Mo, Ni e Se, são importantes para a estabilidade do digestor, assim como para o crescimento e metabolismo dos microrganismos (Wan, et al., 2011). São vários os efluentes ricos em lípidos que são produzidos em quantidades consideráveis e que podem ser utilizados como potenciadores da formação de metano. Estudos (Li, et al., 2002) demonstraram que os resíduos de alimentos que contenham alto teor de lípidos, variando o seu conteúdo entre 8 a 40% pela adição de óleo vegetal e banha de porco, foram degradados pelo processo de co-digestão, sendo mais de 85% do teor de lípidos degradados. Num outro trabalho (Nielsen & Ahring, 2006) verificou-se que a adição de 5% de óleo residual de peixe a um digestor com estrume duplicou a produção de metano por unidade de volume de substrato. A adição de pulsos de oleato a reactores termófilos com misturas de estrume de gado teve um efeito positivo sobre todo o processo (Neves, et al., 2009a). Marta Nunes 47 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia Neves, et al. (2009b) estudaram a co-digestão de estrume de vaca com resíduos alimentares, através da aplicação de concentrações crescentes de pulsos intermitentes de óleo residual, proveniente de uma indústria de conservas de peixe. Foi demonstrado que a co-digestão de estrume e resíduos alimentares pode ser melhorada através da adição de resíduos oleosos. O aumento da produção de metano foi conseguido até a alimentação atingir 12 gCQO óleo/lreactor. Este valor corresponde a uma alimentação contínua de 100/10 (V estrume/Vresíduos alimentares) com a adição de pulsos intermitentes de óleo de 5% (Vóleo/Vestrume). A alimentação do pulso de 18 gCQOóleo/lreactor induziu uma inibição persistente no processo. Este estudo foi efectuado em condições mesófilas (37°C) em reactores contínuos perfeitamente agitados, com um tempo de retenção hidráulico de 15 dias, alimentados diariamente com estrume de gado e resíduos alimentares com uma carga orgânica de 4,6±0,1 gCQO/(Lreactordia). Neves, et al. (2009a) determinaram a quantidade específica de AGCL que pode ser adsorvido na fase sólida, sem comprometer a estabilidade do processo de co-digestão anaeróbia a partir de estrume de vaca e resíduos alimentares, tendo observado que no reactor, apenas com estrume de vaca e resíduos alimentares (sem óleo), o único AGCL detectado foi o ácido palmítico (C16:0). No entanto, na matriz sólida dos restantes reactores, aos quais tinham sido adicionadas diferentes quantidades de óleo, para além do ácido palmítico, também foi encontrado o ácido esteárico. Esta experiência demonstrou que os valores limite de acumulação para os AGCL e C16: 0 sobre a matriz sólida, são de cerca de 180-220 gCQOAGCL/kgTS e 120-150 gCQO-C16:0/kgTS, respectivamente. Estes valores não devem ser ultrapassados, sob risco de ocorrer a inibição do processo. Kabouris & Tezel (2009) avaliaram a biodegradabilidade anaeróbia de uma mistura de lamas primárias domésticas, lamas activadas espessadas e FOG, através de um processo semicontínuo, em condições de temperatura mesófilas (35°C) e termófilas (52°C), tendo obtido um rendimento de metano 2,95 vezes maior a 35°C e 2,6 vezes maior a 52°C quando uma fracção de FOG foi adicionada (48% do total de SV alimentado). Os resultados deste estudo demonstraram que a co-digestão de lamas com FOG pode aumentar significativamente a produção de metano. Martín-González, et al. (2010) relataram que o rendimento de biogás passou de 0,38±0,02 L/gSValimentado para 0,55±0,05 L/gSValimentado quando foi realizada a co-digestão de resíduos sólidos urbanos com óleo e gordura proveniente das ETAR, em condições mesófilas. Em condições termófilas, os mesmos autores (Martín-González, et al., 2011) observaram uma melhoria na produção de biogás de 52%, assim como um aumento na produção de metano de 36%, quando óleo e gordura proveniente de ETAR foram co-digeridos com resíduos sólidos urbanos. Zhu, et al. (2011) analisaram a produção de metano a partir da co-digestão de resíduos de gorduras, provenientes do tratamento primário efectuado nas ETAR, com lamas domésticas, tendo verificado que a produção de metano foi 65% superior quando as gorduras foram 48 Biogás - Uso de OAU como co-substrato na digestão anaeróbia CAPÍTULO 4 adicionadas como co-substrato a um caudal de cerca de 5,5 gSV/L, que representa uma adição de gorduras inferior a 4% (V/V). Nos digestores com cargas orgânicas de gordura superiores a 5,5 gSV/L houve inibição do processo de digestão, dando origem à diminuição da produção de metano. O estudo demonstrou que nesses digestores (com adição de gorduras superior) levou à acumulação de AGV e à diminuição do pH, sendo estes parâmetros indicadores da instabilidade do processo. Li, et al. (2011) demonstraram que a co-digestão de lamas activadas com FOG aumentou a produção de metano de 117 mL/gSVT para 418 mL/gSVT. Wan, et al. (2011) relataram que a co-digestão de lamas activadas espessadas com FOG (64% dos SV totais), para um sistema semi-contínuo, em condições de temperaturas mesófilas, foi possível obter um rendimento diário de metano de 598 L/kgSV, sendo este valor 137% maior do que o obtido a partir da digestão apenas de lamas activadas espessadas. Verificou ainda que a adição de micronutrientes à co-digestão não melhorou significativamente a produção de biogás. Para a adição de FOG com 74% dos SV totais, o digestor inicialmente falhou, mas foi lentamente recuperando, sendo o rendimento de biogás apenas 50% do rendimento de um reactor sem falhas com a mesma taxa de carga orgânica. Um aumento no rendimento de metano de 9 a 27% foi observado quando gorduras removidas nos sistemas de desengorduramento das ETAR (10 a30% de SValimentado) foram co-digeridos com lamas domésticas. Quando foram adicionadas gorduras até 46% de SV, a produção de metano aumentou em 66% (Wan, et al., 2011). Visto os resultados dos últimos estudos sobre a co-digestão anaeróbia de FOG com substratos orgânicos serem bastante positivos, os OAU tornam-se, assim, um potencial co-substrato a ser utilizado no processo de co-digestão anaeróbia. A produção instalada de biogás é de 38,9 MW (Direcção Geral de Energia e Geologia, 2011). Se se considerasse a co-digestão de óleos com lamas em ETAR, a produção de biogás, nessas unidades de tratamento, podia aumentar entre 10 a 65% (Wan, et al., 2011; Zhu, et al., 2011). Este aumento poderá ter um impacto significativo no cumprimento das metas para a energia provenientes de fonte renováveis previstas para 2020 (Directiva n.º 2009/28/CE), bem como para atingir o objectivo dos 150 MW. No presente estudo foram efectuados alguns ensaios experimentais, que se pretendiam exploratórios, para verificar as potencialidades da co-digestão de óleo com efluentes da indústria de lacticínios. Contudo, até ao momento de conclusão do trabalho não foi possível obter resultados conclusivos. Marta Nunes 49 CAPÍTULO 5 5. BIOCIDAS - USO DE OAU COMO ADJUVANTE Neste capítulo será analisada muito sumariamente a utilização de OAU após tratamento como aditivo de agentes biocidas, em particular moluscicidas para o controlo de bivalves infestantes. Ficou claro do Capítulo 3 que esta aplicação, pelo limite de incorporação de óleo, não deverá resolver o problema na sua globalidade. Por outro lado, a literatura não refere consistentemente o impacto da adição de OAU a estes agentes. Espera-se que os OAU adicionados em pequenas fracções ao composto activo se revelem uma mais-valia em termos de eficiência do agente biocida. No presente estudo foram levadas a cabo apenas análises preliminares, tirando partido de uma estrutura já existente e orientada para estudos de eco-toxicologia (Costa, et al., 2008). Note-se que a ideia central foi somente recolher alguma informação, validada cientificamente, acerca da potencial utilização de OAU para aumentar a eficiência de agentes biocidas, podendo ser esta uma possibilidade de integração dos mesmos. Neste estudo, usou-se o princípio activo polydiallyldimethyl-ammonium chloride (polyDADMAC) e os testes foram realizados em Corbicula fluminea. Desde já, alerta-se para o facto da bateria de casos levada a cabo não ter sido suficientemente lata para tirar conclusões indubitáveis. No entanto, abre uma janela de oportunidade para um estudo mais alargado, em que poderão variar-se os agentes usados e mesmo os organismos alvo. Os produtos biocidas são definidos como substâncias activas e preparações que contenham um ou mais constituintes, que se destinam a destruir, travar o crescimento, tornar inofensivo, evitar ou controlar de qualquer outra forma a acção de um organismo prejudicial, por mecanismos químicos ou biológicos, e que se incluam num dos 23 tipos de produtos que constam na lista apresentada no Decreto-Lei 121/2002 de 3 de Março. Deste grupo de compostos estão excluídos os pesticidas de uso agrícola. Os produtos designados por biocidas apresentam características diferenciadas do ponto de vista da sua composição, e cobrem um amplo leque de utilizações, constituindo uma arma muito eficaz no combate aos organismos nocivos. Actuam, assim, com nítido benefício para a protecção da saúde humana e animal e para a salvaguarda do ambiente (Decreto-Lei n.º 121/2002 de 3 de Março, 2002). Actualmente, um número considerável de indústrias hidro-dependentes tem problemas com espécies invasoras. É comum a água que circula nas instalações industriais estar contaminada com espécies biológicas invasoras que se traduzem em problemas nos sistemas onde é usada como matéria-prima ou utilidade (Andrew J. Cooper, et al., 2002; Rosa, et al., 2011). Os biocidas são utilizados para controlar o crescimento de diversas espécies, entre microrganismos que podem desenvolver-se e formar filmes biológicos, levando consideráveis na produção e dando origem a graves problemas de corrosão. Mas macrorganismos, como por exemplo moluscos ou crustáceos, que podem Marta Nunes as quais, a perdas também, provocar 51 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante incrustações e que são difíceis de remover (Vanlaer, 1996). No que respeita aos macroinvertebrados, geralmente nos sistemas de água industriais existe uma triagem. No entanto, este rastreio não impede a passagem dos organismos juvenis. Estes, devido à sua capacidade de dispersão, são facilmente capturados para o interior de unidades industriais com captação superficial, passando, devido às suas dimensões reduzidas, pelos crivos responsáveis pelo impedimento da passagem de objectos obstrutivos (Bidwell, et al., 1995). Quando a velocidade da água permite, estabelecem-se nas unidades até atingirem a maturação, desenvolvendo populações densas que causam assim fortes problemas de bioincrustação. Isto é resultado do acumular de algumas espécies invasoras em equipamentos e estruturas, o que provoca o seu desgaste e degradação, sendo depois necessária a reparação ou substituição, o que acarreta elevados prejuízos (Vanlaer, 1996). Como consequência do crescimento biológico descontrolado de algumas espécies em muitos processos industriais, diferentes biocidas e antimicrobianos têm sido desenvolvidos para auxiliar o seu controlo. Muitas vezes, um biocida é insuficiente para controlar esse crescimento e, por esse facto, os biocidas podem actuar em conjunto. Isto é, sinergicamente, para melhorar o seu desempenho, por oposição à eficácia obtida quando cada um é usado separadamente. Os mecanismos pelos quais os biocidas exercem a sua actividade tóxica dependem de uma série de factores, que incluem as propriedades químicas do mesmo e as características bioquímicas e fisiológicas do organismo alvo. Alguns biocidas actuam ao nível da membrana celular ou da parede celular, outros atacam enzimas ou os processos metabólicos, levando à morte celular ou à interrupção da replicação celular do organismo. A combinação de dois biocidas, se bem formulado, permite a adição de quantidades menores de cada um para alcançar o nível desejado de controlo, trazendo benefícios, tanto ambientais, como económicos (Andrew J. Cooper, et al., 2002). Os compostos biocidas são geralmente usados na forma de uma solução ou dispersão numa fase aquosa que pode conter solventes orgânicos (Vanlaer, 1996). Os dois principais requisitos que estes devem possuir são: i) ser tóxico suficiente para matar a espécie de forma eficiente; ii) não causar impactos significativos no meio ambiente. No presente trabalho será avaliada a utilização de OAU com um princípio activo já conhecido sobre uma espécie invasora. A espécie em causa é a Corbicula fluminea, mais conhecida como a amêijoa asiática. Na próxima secção serão listadas algumas das características principais desta espécie. 5.1. Corbicula fluminea A amêijoa asiática (ver Figura 5-1) é uma das espécies mais comuns em termos de invasão de ecossistemas de água doce. Esta espécie, originária do continente Asiático, é hoje em dia um organismo comum nos habitats de água doce Americanos e Europeus (Sousa, 2008). A amêijoa asiática causa fortes problemas de bio-incrustação em equipamentos e estruturas. A 52 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 nível industrial, acumula-se em tubagens, sistemas de captação e outros equipamentos, bloqueando-os, reduzindo a sua eficiência de operação e favorecendo a sua corrosão, originando, por isso, custos avultados. Pode ainda colocar questões de segurança à unidade industrial e causar perturbações associadas a paragens periódicas para acções de limpeza. Esta amêijoa causa grandes problemas a indústrias que dependem do uso intensivo da água, tais como, cimenteiras, centrais termoeléctricas, extractoras de areia, indústrias de pasta e do papel, sistemas de rega e ETA. Com base nos problemas causados vulgarmente pelo organismo em causa, identificou-se a necessidade de desenvolver biocidas eficazes, ambientalmente aceitáveis, com impactos reduzidos em organismos não-alvo e que cumpram os requisitos legais, principalmente nos casos em que a água se destina ao consumo humano. Figura 5-1 – Corbicula fluminea (ameijoa asiática) Do ponto de vista da sua biologia, a Corbicula fluminea apresenta as características descritas de seguida. Trata-se de uma espécie hermafrodita. A fertilização ocorre no interior da cavidade paleal e as larvas são incubadas nos tubos branquiais. Os indivíduos possuem assim um período de protecção, evoluindo para um estado pós larva, estando então na fase juvenil. Devido ao seu pequeno tamanho, estes podem-se disseminar pelas instalações, e aí estabelecerem-se. A dimensão de um juvenil, aquando da libertação dos progenitores para o exterior é de aproximadamente 0.2 mm. Esta espécie possui uma elevada capacidade de reprodução. O período de maturação sexual ocorre nos primeiros 3 a 6 meses quando o comprimento de concha atinge 6 a 10 mm (Sousa, 2008) e a partir daí torna-se capaz de produzir cerca de Marta Nunes 53 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante 70000 juvenis por ano (Wittmann, et al., 2008). A temperatura mínima para o crescimento e desenvolvimento da amêijoa ronda os 10 – 11ºC (Karatev, et al., 1998). A mortalidade dos adultos depende de diversos factores do ecossistema. A expectativa de vida desta espécie é extremamente variável, mediando entre 1 a 5 anos. O tempo máximo de vida registado é de 7 anos (Wittmann, et al., 2008; Sousa, 2008). A Corbicula fluminea reproduz-se duas vezes por ano, uma na Primavera e outra no Outono (Sousa, 2008). O período de reprodução é sobretudo controlado pela temperatura, com o intervalo mais adequado entre os 15 e 20ºC, e pela disponibilidade de alimento (Rajagopal, et al., 2000). A amêijoa asiática tem como principais características uma elevada capacidade de filtração, taxa de reprodução elevada e uma grande capacidade de dispersão num curto período de tempo, sendo por estes factores considerada uma espécie invasora com grandes impactos (Sousa, 2008). A espécie não tolera teores de salinidade elevados, mas sobrevive a baixas temperaturas da água (2-34ºC). Prefere água doce e não poluída e sedimentos arenosos misturados com limo e argila (que aumentam o teor de matéria orgânica) (Sousa, et al., 2008; Minchin, 2008). A grande capacidade invasiva e reprodutiva de C. fluminea torna esta espécie um importante componente dos ecossistemas aquáticos. Do ponto de vista do ambiente, o principal problema desta peste reside na eventual mudança nas condições ecológicas dos ecossistemas invadidos, pois compete com as espécies nativas por alimento e espaço. Em densidades elevadas reduz significativamente a turbidez da água (Minchin, 2008). Apesar dos impactes negativos, a ameijoa asiática também pode ter efeitos positivos nos ecossistemas invadidos. Esta espécie pode proporcionar habitats para outros organismos e constitui alimento para várias espécies (Sousa, 2008). A dispersão de C. fluminea em ecossistemas aquáticos resulta de várias actividades do Homem, como por exemplo a sua utilização como isco para a pesca, e de fenómenos naturais em que juvenis são transportados pelas correntes ou através de aves aquáticas (Sousa, 2008). A amêijoa asiática causa fortes problemas de bio-incrustação e, portanto, o conhecimento das características fisiológicas da espécie é crucial para encontrar e implementar um controlo eficaz nas instalações industriais (Rosa, et al., 2011). Actualmente existem métodos mecânicos e químicos para o controlo da espécie. O controlo mecânico é feito geralmente por crivos. Estes métodos têm baixo impacto ambiental mas têm menor eficiência. Os métodos químicos são os mais utilizados por serem económicos e versáteis. Pelas razões mencionadas, o método de controlo mais popular para minimizar os efeitos de C. fluminea na indústria, passa pela dosagem de químicos (métodos químicos) (Post, et al., 2006). 54 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 5.2. Estudo experimental Como já referido, existem vários métodos para o controlo de pragas, sendo que o controlo químico, envolvendo a dosagem de biocidas, tende a ser o método mais popular devido à sua versatilidade. Apesar de já se ter demonstrado actividade tóxica de um grande número de substâncias contra a amêijoa asiática, o controlo químico apresenta como principais desvantagens a relação custo – eficiência de muitos biocidas e os impactos ambientais negativos, pelos seus efeitos em espécies não-alvo. Assim, há todo o interesse em identificar possíveis substâncias que aumentem a eficácia dos biocidas, diminuindo a sua dosagem ou acelerando o controlo. Com o objectivo de verificar o potencial do OAU quando associado a um moluscicida com efeito já conhecido, foram realizados vários testes para analisar se o óleo aumenta a taxa de mortalidade e/ou tem a capacidade de acelerar o processo de controlo, tornando o macrorganismo mais vulnerável. Como já citado anteriormente, até à data, a utilização de óleo vegetal em biocidas com o objectivo de aumentar o seu potencial tóxico não foi mencionado na literatura. De seguida apresentar-se-ão sumariamente os testes efectuados. O moluscicida usado em conjunto com o óleo foi o polyDADMAC. Este é um polímero catiónico que pode ser usado no tratamento de água para consumo humano e como coagulante que neutraliza partículas coloidais carregadas negativamente. A sua utilização na neutralização de macrorganismos é já comum (Getsinger, 2000). É de salientar, que a actividade experimental foi realizada tendo por base o conhecimento prático já adquirido pelo Departamento de Engenharia Química da Universidade de Coimbra. Daí que se tenha utilizado este princípio activo como referência para avaliar a capacidade adjuvante dos OAU, o qual já teve o seu efeito comprovado no que respeita ao controlo da amêijoa asiática (McMahon, 1988). O óleo utilizado neste estudo é um óleo alimentar virgem e, portanto, assume-se que os resultados obtidos com este serão extrapoláveis no caso de ser utilizado OAU após pré-tratamento. O primeiro objectivo do trabalho consistiu em analisar a capacidade de dispersão do óleo na água. Tendo em linha de conta a baixa solubilidade dos óleos em água e a necessidade de usar sistemas que tenham a forma de uma fase perfeitamente emulsionada, haveria de se obter certeza de que tal ocorre. Ora, como foram utilizadas apenas concentrações reduzidas de óleo, verificou-se uma perfeita homogeneização da mistura água-polyDADMAC-óleo. Após esta conclusão, analisou-se o impacto do óleo na mortalidade dos microrganismos pelo uso de polyDADMAC. Numa primeira fase, a concentração do agente biocida usada como referência foi a correspondente ao LC50 para um período de exposição de 72 horas. Tendo-se percebido que valeria a pena explorar este sistema, numa segunda fase, procedeu-se à determinação de curvas dose-resposta para o polyDADMAC na presença/ausência de óleo. Marta Nunes 55 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante No modelo utilizado, a avaliação da mortalidade da amêijoa asiática constitui a resposta e a concentração de biocida (dose) o factor variado. Isto vai permitir avaliar o potencial efeito sinergético em termos da diminuição do LC50 na presença do óleo. Os testes de toxicidade vulgarmente levados a cabo podem ser estáticos ou contínuos. Quanto à duração, os testes podem ser de curta ou longa duração. Nos primeiros utilizam-se gamas de concentrações elevadas, de forma a obter resultados relativos à resistência de C. fluminea num curto período de tempo. Convém referir que as concentrações utilizadas são demasiado altas para serem usadas na prática, mas permitem rapidamente tirar conclusões sobre os perfis de mortalidade dos químicos, nomeadamente permitem calcular valores de LC50 e assim obter uma primeira avaliação rápida do seu potencial. Com os testes de longa duração, testam-se concentrações de gama muito mais baixa, passíveis de ser aplicadas na prática, com o objectivo de tirar conclusões mais realistas do desempenho dos biocidas (EUROPEAN COMMISSION HEALTH & CONSUMER PROTECTION, 2002). Os testes efectuados neste trabalho foram realizados em condições estáticas, em períodos de curta duração. Para tal, recorreu-se à monitorização da taxa de mortalidade de 24 em 24 horas durante um período de 72 horas. 5.3. Materiais e métodos Os materiais e equipamentos utilizados foram os normalmente presentes num laboratório. O químico usado foi o polyDADMAC (40% principio activo) e o óleo, um óleo vegetal alimentar virgem. Nos testes laboratoriais utilizaram-se adultos de C. flumínea recolhidos num canal proveniente da ria de Mira, situado em Casal de São Tomé, concelho de Mira. A densidade populacional da C. fluminea neste local é de aproximadamente 100 indivíduos/m2. A temperatura da água rondava os 20ºC na altura da colheita, que foi no mês de Abril para o caso dos primeiros testes e Julho no caso dos segundos. No laboratório, as amêijoas foram distribuídas por baldes, com água da rede desclorinada e com arejamento adequado, onde permaneceram até serem utilizadas nos ensaios, sendo devidamente alimentadas com microalgas durante esse período. Geralmente, foram mantidas em laboratório antes de serem usadas no teste por um período máximo de 3 semanas. Os testes foram realizados em recipientes de plástico, cada um contendo 10 indivíduos adultos e 500 mL de água desclorinada, como se apresenta na Figura 5-2. Decorreram numa sala de temperatura controlada a 20ºC. Para cada tratamento fizeram-se três réplicas, para assegurar a reprodutibilidade dos resultados. Os espécimes utilizados nas experiências foram escolhidos tendo em conta a dimensão da concha, neste caso, a dimensão intermédia. Esta escolha serviu para minimizar os efeitos provocados por variações de dimensões nos testes de mortalidade. 56 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 Figura 5-2 – Testes estáticos de curta duração em C. flumínea (após 24h) Numa primeira fase de estudo, fez-se uma avaliação preliminar da potencialidade do óleo, sendo para isso realizados testes de toxicidade apenas com uma concentração específica de polyDADMAC. Nestes ensaios foram colocados 10 adultos em 3 recipientes, isentos de químico e óleo, com o papel de pote de controlo. Nos restantes recipientes (Tabela 5-1 – Composição dos recipientes colocou-se, para além dos 500 mL de água desclorinada, óleo em concentrações de 10 mg/L e 100 mg/L, polyDADMAC na concentração do LC50 para uma exposição de 72 horas (obtido em estudos anteriores, nas mesmas condições, pelo Departamento de Engenharia Química da Universidade de Coimbra) tendo-se depois diversificado as combinações entre as concentrações de polyDADMAC e as de óleo. É de salientar que todos os recipientes tinham arejamento em contínuo, para garantir condições adequadas. O tratamento a que cada pote de indivíduos foi submetido está caracterizado na Tabela 5-1. Tabela 5-1 – Composição dos recipientes Marta Nunes Recipientes Tratamento 1, 2, 3 4,5, 6 7, 8, 9 10, 11, 12 13, 14. 15 16, 17, 18 Controlo 10 mg/L óleo 100 mg/L óleo 1102 mg/L polyDADMAC 1102 mg/L polyDADMAC + 10 mg/L óleo 1102 mg/L polyDADMAC + 100 mg/L óleo 57 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante Para a preparação dos tratamentos com polyDADMAC foi feita uma solução stock de 6 g/L, a partir da qual se preparou as soluções diluídas correspondentes da Tabela 5-1. De notar que, como o volume da solução stock a diluir ainda era considerável, foi retirada igual quantidade de água (dos 500 mL) para evitar efeitos de diluição adicional. No caso do óleo, para a solução de concentração igual a 10 mg/L, como a quantidade a introduzir era muito pequena, preparou-se uma solução de 2 L com água desclorinada e foi colocado um volume de óleo 4 vezes maior à quantidade necessária em cada pote, para minimizar os erros. A partir desta, retiraram-se 500 mL para cada pote. No caso da solução de óleo de 100 mg/L, utilizou-se uma micropipeta e introduziu-se directamente o volume necessário em cada recipiente. Os testes tiveram a duração de 72 horas após a dosagem do químico e do óleo. A cada 24 horas foram efectuadas observações de mortalidade. O método de observação da mortalidade é importante, uma vez que nem sempre é fácil distinguir os organismos mortos dos vivos. Por este motivo, foi definido um método de observação com o intuito de minimizar a incerteza dos resultados. A actividade dos sifões torna-se fundamental para ter a percepção se os organismos estão vivos ou mortos, sendo que quando a concha está aberta e o sifão se encontra à vista, o organismo está vivo, reagindo ao toque e fechando a concha em simultâneo. Se a concha se encontra totalmente aberta e não há actividade dos sifões nem resposta ao toque, o organismo está morto. Porém, nos casos em que as amêijoas se encontram completamente fechadas e imobilizadas não se pode assumir automaticamente que estão mortas. Nesses casos, coloca-se cuidadosamente uma agulha na junção das duas valvas da concha perto da zona dos sifões, sem causar qualquer dano, e forçase a entrada da agulha abrindo ligeiramente a concha. Quando as amêijoas estão vivas, oferecem resistência à entrada da agulha e, se abrirem, fecham-se imediatamente quando se retira a agulha. Por outro lado, se estiverem mortas, ao colocar a agulha não oferecem qualquer resistência e, na maioria dos casos, inserindo a agulha mais um pouco, ficam completamente abertas. Após as observações de mortalidade, a cada 24 horas, foram removidos os indivíduos mortos para evitar a deterioração do meio devido à sua biodegradação. O objectivo destes testes foi verificar, num prazo de 72 horas, quantos espécimes morrem em cada recipiente, podendo depois averiguar a influência do óleo na mortalidade. Na segunda fase do estudo, orientada para a determinação de curvas dose-resposta para o polyDADMAC na presença e ausência de óleo, procedeu-se de modo semelhante ao descrito anteriormente. Porém, a solução stock de polyDADMAC foi de 5 g/L. No caso dos recipientes com 10 mg/L de óleo e polyDADMAC, preparou-se, como referido em cima, uma solução de maior volume, para minimizar os erros, mas desta vez introduziu-se primeiro o polyDADMAC, o óleo e só depois se perfez o volume com água desclorinada. A caracterização dos potes usados nos ensaios de avaliação da curva dose-resposta está sistematizada na Tabela 5-2. 58 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 Tabela 5-2 – Composição dos recipientes Recipientes Tratamento 1, 2, 3 4, 5, 6 7, 8, 9 10, 11, 12 13, 14, 15 16, 17, 18 19, 20, 21 22, 23, 24 24, 25, 26 27, 28, 29 30, 31, 32 33, 34, 35 36, 37, 38 39, 40, 41 42, 43, 44 45, 46, 47 48, 49, 50 51, 52, 53 54, 55, 56 57, 58, 59 60, 61, 62 63, 64, 65 Controlo polyDADMAC 25 mg/L polyDADMAC 75 mg/L polyDADMAC 150 mg/L polyDADMAC 300 mg/L polyDADMAC 600 mg/L polyDADMAC 1200 mg/L polyDADMAC 1500 mg/L polyDADMAC 25 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 75 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 150 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 300 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 600 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 1200 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 1500 mg/L + óleo10 mg/L polyDADMAC 25 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 75 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 150 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 300 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 600 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 1200 mg/L + óleo100 mg/L polyDADMAC 1500 mg/L + óleo100 mg/L 5.4. Resultados e discussão Nesta secção analisam-se as taxas de mortalidade obtidas nos ensaios levados a cabo. Para tal, contou-se o número de mortos em cada réplica e posteriormente, a partir do número de organismos expostos ao tratamento, determinou-se a taxa de mortalidade. Na Figura 5-3 apresenta-se o resultado obtido para os primeiros testes, onde se analisa preliminarmente a mistura do óleo para a concentração LC50 de polyDADMAC para um período de 72 horas de exposição. A figura ilustra o efeito do óleo sobre a taxa de mortalidade, sendo esse efeito mais significativo às 48 horas. Após 72 horas observa-se que a taxa de mortalidade obtida nos testes em que se utilizou 100 mg/L de óleo foi superior (37%). No caso de polyDADMAC e polyDADMAC com 10 mg/L de óleo, a taxa de mortalidade foi idêntica, aproximadamente 20%. Porém, verifica-se que para 48 horas, o polyDADMAC com óleo 10 e 100 mg/L apresentam uma taxa de mortalidade superior ao do polyDADMAC isento de óleo. O pote controlo teve uma mortalidade de 3,3%. Marta Nunes 59 % Mortalidade Biocidas - Uso de OAU como adjuvante 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 10 20 30 40 50 60 70 80 Tempo (horas) 10 mg/L óleo 100 mg/L óleo PolyDADMAC PolyDADMAC + 10mg/L óleo PolyDADMAC + 100mg/L óleo Figura 5-3 – Taxa de mortalidade em função do tempo de exposição do tratamento Na Tabela 5-3 apresenta-se a análise estatística dos dados obtidos. Esta foi levada a cabo usando Análise de Variância (ANOVA) através do software STATISTICA 7. Considerou-se dois factores: i. a concentração de óleo (0, 10 e 100 mg/L); ii. o tempo (24, 48 e 72 h). A técnica estatística usada correspondente a Two-Way ANOVA factorial, permite avaliar o impacto de cada um dos factores variados, mas também de combinações deles. Esta estratégia está directamente associada ao facto do impacto de um factor poder ou não ser potenciado dinamicamente. Considerou-se significativo, efeitos cujo valor de p do teste estatístico fosse inferior a 0,05. Tabela 5-3 – Resultados da análise ANOVA para os primeiros testes de mortalidade Factores Óleo Tempo Óleo*Tempo gl 2 2 4 F 6,2472 52,2681 3,6637 p 0,008699 0,000000 0,023674 Esta análise permite confirmar que a presença do óleo tem significância estatística na taxa de mortalidade da Corbicula fluminea. Verifica-se que o óleo, o tempo e a combinação Óleo*Tempo têm significado estatístico e, portanto, influenciam a taxa de mortalidade. Isto, intrinsecamente, aponta para que a presença de óleo aumente a taxa de difusão do agente biocida para a espécie invasora ou predisponha mais o sistema desta a absorver o biocida. Testes multicomparação, mais precisamente o teste de Bonferoni confirma que o polyDADMAC quando combinado com 100 mg/L de óleo tem significância estatística para as 72 horas de exposição relativamente ao tratamento com polyDADMAC isento de óleo e com 10 mg/L de óleo. Aparentemente a acção do óleo ocorre para tempos menores, ou seja, o óleo 60 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 acelera a acção biocida, apesar de às 24 horas não se observar grandes diferenças. Contudo, estatisticamente este resultado não se revelou significativo. % Mortalidade Na Figura 5-4 apresentam-se os resultados obtidos nos estudos dose-resposta. A análise centra-se nas curvas para 72 horas de exposição, pois estas cobrem o intervalo 0-100% de resposta na gama de concentrações testada. 100 90 80 70 60 50 40 30 20 10 0 0 200 400 600 800 1000 1200 1400 1600 Concentração PolyDADMAC (mg/L) PolyDadmac PolyDadmac 10 mg/L óleo Polydadmac 100 mg/L óleo Figura 5-4 – Taxa de mortalidade obtida com a Corbicula fluminea para várias concentrações de polyDADMAC e de polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo após 72 horas de exposição A Figura 5-4 ilustra o facto de a adição de óleo ter efeito significativo na taxa de mortalidade com a Corbicula fluminea. É evidente que a taxa de mortalidade sofre um acréscimo com o aumento da concentração de polyDADMAC, excepto nas concentrações 150 e 300 mg/L quando o óleo está presente. Este facto pode ser explicado devido à presença de óleo, isto é, para gamas de mortalidade mais baixas (até cerca de 60%), parece haver um claro aumento de susceptibilidade da espécie invasora na presença do óleo. Porém, nas gamas de mortalidade mais elevadas, esse aumento de susceptibilidade é menos evidente, daí a diminuição da mortalidade com o aumento da concentração do agente biocida. No final das 72 horas de teste a mortalidade não foi significativamente diferente se se comparar a inclusão ou não de óleo. De qualquer forma, surge aqui um resultado que permite antever o óleo como agente potenciador da acção do biocida. É de referir que a mortalidade observada nos potes controlo foi de 13,3%. Para confirmar estes resultados apresenta-se na Tabela 5-4 a ANOVA admitindo três factores: i. a concentração de óleo usada (0, 10 e 100 mg/L); ii.a concentração de biocida (25, 75, 150, 300, 600, 1200 e 1500 mg/L); iii. o tempo, aqui referente aos instantes de monitorização (24, Marta Nunes 61 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante 48 e 72 horas). Note-se que neste caso a ANOVA levada a cabo é do tipo Three-Way factorial. Tabela 5-4 – Resultados da ANOVA para as mortalidades para diferentes concentrações de polyDADMAC e de óleo ao longo do tempo Tempo Óleo PolyDADMAC Tempo*Óleo Tempo*PolyDADMAC Óleo*PolyDADMAC Tempo*Óleo*PolyDADMAC gl F p 2 2 7 4 14 14 28 419,9 17,1 49,4 4,2 11,1 2,0 0,8 0,000 0,000 0,000 0,003 0,000 0,018 0,701 Os dados robustecem a conclusão de que o óleo quando combinado com polyDADMAC é estatisticamente relevante para a taxa de morte da espécie invasora. Porém a combinação tempo, óleo, polyDADMAC não é estatisticamente significativa. No sentido de avaliar a existência de performances diferentes para diferentes concentrações do agente biocida foram realizados posteriormente testes multicomparação, nomeadamente o teste de Bonferroni. Os resultados confirmam que a presença de óleo tem maior impacto na mortalidade para concentrações de polyDADMAC mais baixas. Para concentrações de polyDADMAC de 25 e 75 mg/L, a concentração de óleo de 100 mg/L tem significado estatístico. Com o intuito de complementar a análise comparando métricas mais agregadas de mortalidade, foram calculados valores de LC50 para exposições de 72 horas. Para tal, recorreu-se ao software EPA Probit analysis Program versão 1.5. A Tabela 5-5 apresenta a concentração LC50 para o polyDADMAC isento de óleo, com 10 e 100 mg/L. Tabela 5-5 – LC50 do polyDADMAC, polyDADMAC com 10 e 100 mg/L de óleo com a Corbicula fluminea para o período de exposição de 72 horas Parâmetros PolyDADMAC PolyDADMAC + 10 mg/L óleo PolyDADMAC + 100 mg/L óleo LC50 +95% -95% 242,43 466,72 125,93 246,53 585,11 103,87 43,30 389,71 4,81 A Tabela 5-5 ilustra o facto de, com base nos ensaios realizados, se poder antever que para gamas de mortalidade baixas, o efeito do óleo ser relativamente significativo. De facto, a concentração para eliminar metade dos macrorganismos (LC50) com a mistura polyDADMAC e 100 mg/L de óleo é inferior à necessária quando o biocida é usado sozinho 62 Biocidas - Uso de OAU como adjuvante CAPÍTULO 5 (apesar de algumas limitações na significância estatística dos dados). Isto configura uma primeira ideia de que o uso de OAU como adjuvante poderá ser interessante. Porém, do ponto de vista do controlo, interessa sobretudo a gama de mortalidade mais elevada, este potencial tem de ser ainda investigado com mais detalhe, nomeadamente confirmando os resultados obtidos neste estudo e realizando estudos de longa duração numa gama de mortalidade mais baixa. 5.5. Conclusão Os testes aqui apresentados tinham como principal objectivo averiguar qual o potencial do óleo como adjuvante num biocida. Nos primeiros testes efectuados verificou-se que a presença de óleo tem influência na taxa de mortalidade. Observou-se ainda que, através da realização dos testes dose-resposta o óleo tem maior influência para baixas gamas de mortalidade e portanto, neste caso, para concentrações de polyDADMAC baixas. Verificou-se também, que concentrações maiores de óleo (gama de 100 mg/L) poderão potenciar mais a acção biocida. Obviamente que os testes realizados são preliminares e por isso requerem mais estudos, no sentido de avaliar a selectividade do óleo perante outros organismos, assim como o estudo das quantidades de óleo adicionadas a partir das quais possam ser consideradas poluentes para os cursos de água. Ainda que as quantidades de óleo a escoar neste tipo de produtos não seja elevada, fica em aberto mais uma possibilidade de valorização de OAU. Marta Nunes 63 CAPÍTILO 6 6. ÁCIDO AZELAICO - USO DE OAU COMO MATÉRIA-PRIMA Após uma enumeração das outras alternativas existentes para valorizar OAU apresentada nos capítulos 3, 4 e 5, neste capítulo, será dado destaque à produção de ácido azelaico. Na produção de oleoquímicos, caracterizada por envolver síntese química, o principal factor a ter em conta na escolha do produto a desenvolver é o perfil de óleo em causa, uma vez que este pode variar significativamente na sua constituição e, consequentemente, ter impacto nos produtos obtidos. No presente trabalho, considera-se o OAU como sendo maioritariamente constituído pelo ácido oleico e linoleico, consideração suportada pelo histórico do consumo de óleos em Portugal e, assim, considerar-se-á a utilização do OAU para a produção de ácido azelaico. O ácido azelaico é utilizado em diversos sectores industriais, tais como o alimentar, para a produção de embalagens de alimentos (papel e filmes), o têxtil (calçado, etiquetas, emblemas), o automóvel (revestimentos, assentos estofados dos carros) e electrónica (placas de circuito impresso flexível, isolamento de bobinas). É utilizado industrialmente como constituinte de uma série de aplicações químicas, tais como poliamidas, poliésteres, plásticos, produtos farmacêuticos, plastificantes, lubrificantes e fluidos hidráulicos (Rani, et al., 2008; Kockritz & Martin, 2011). É um componente de elevada valência na preparação de copolímeros de alta performance para uso em adesivos, películas e fibras e encontra-se em crescente aplicação como um agente complexante para sais de lítio em graxas de lítio de alta performance (Emery Oleochemicals Group, 2009). Possui, ainda, boa solubilidade em solventes orgânicos e água em comparação com outros ácidos dicarboxílicos com cadeia semelhante, tais como a gama C4-C12 (Kockritz & Martin, 2011). Hoje em dia, o ácido azelaico é produzido pela clivagem oxidativa do ácido oleico via ozonólise. O ácido pelargónico é formado como um subproduto da reacção na quantidade estequiométrica, sendo passível de ser utilizado em aplicações industriais e nos transportes como lubrificante sintético, em ésteres plastificantes e também como um derivado do sector agro-químico (Emery Oleochemicals Group, 2009). Ultimamente têm sido investigadas alternativas para o processo de ozonólise ou para a sua melhoria, sobretudo na China, devido à sua grande exigência energética e aos riscos de segurança a ele associados. Apesar destas desvantagens, o processo de ozonólise apresenta algumas vantagens, como sejam a ausência de resíduos ambientalmente críticos, boa selectividade, e um reprocessamento simples. Daí que seja considerado como o melhor método, até ao momento, para a produção de ácido azelaico (Kockritz & Martin, 2011). A optimização do processo de ozonólise, principalmente da segunda etapa, referente à oxidação do ozonídeo secundário, tem sido alvo de muitos estudos. No entanto, alternativas práticas ainda não foram encontradas. Algumas das razões apontadas para tal facto são os Marta Nunes 65 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima baixos rendimentos obtidos, baixa selectividade, catalisadores caros, falta de actividade catalítica, oxidantes que não são actualmente aceites industrialmente e a difícil purificação. A oxidação pela Candida tropicalis parece ser uma opção favorável dentro de pouco tempo (Kockritz & Martin, 2011), tirando partido da utilização de organismos biológicos para a síntese de produtos. Apesar do processo de ozonólise do ácido oleico ser conhecido há muito tempo como um processo sofisticado e bem estabelecido, tem sido objecto de investigação e de desenvolvimento ao longo dos anos. No entanto, para aplicações a nível industrial, os rendimentos obtidos de ácido azelaico por outros processos não são ainda suficientemente atractivos (Kockritz & Martin, 2011). Como referido, actualmente o ácido azelaico é produzido a partir do ácido oleico. Contudo, o que se pretende avaliar neste estudo é a sua produção a partir dos OAU, que são maioritariamente constituídos por triglicerídeos (conjunto de 3 ácidos gordos), mais especificamente ácidos gordos insaturados, nomeadamente o ácido oleico e o linoleico. Segundo Sadowska, et al. (2008) a reacção do ozono com ésteres de ácidos gordos insaturados (triglicerídeos) é bem descrita pelo mecanismo de Criegee. Porém, convém salientar, que o facto de o processo não se dar apenas com um tipo de ácido gordo insaturado (ácido oleico), mas sim por vários, inclusive ácidos gordos saturados, vai afectar o processo, e por isso problemas decorrentes da sua presença poderão surgir ao nível da pureza do produto final. A constituição dos OAU, apresentada neste trabalho (secção 6.2.1) prende-se com o consumo de óleos alimentares em Portugal. Neste estudo pretende-se fundamentalmente estudar tecnológica e economicamente sem ter veleidades de se ser exaustivo, a instalação de uma unidade industrial orientada para a produção de ácido azelaico a partir de OAU via ozonólise. Ainda que de acordo com o nosso conhecimento uma tal unidade não exista, esta utilização de OAU permite responder assertivamente ao problema de génese do trabalho – definição de vias inovadoras, potencialmente envolvendo valorização de OAU. Nas sub-secções seguintes avaliar-se-á o projecto de engenharia da linha proposta, bem como a performance económica da operação. Note-se que o trabalho aqui reportado está ao nível de um projecto conceptual, pois a sua concretização envolve possivelmente bastante mais informação, bem como eventuais ensaios a nível laboratorial. Sendo assim, o maior objectivo é aqui reportar uma via tecnológica que permite responder potencialmente ao problema e analisar à custa de métricas de performance financeira, simplistas e estáticas, a sua rentabilidade económica. 66 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.1. Ozonólise A ozonólise é um método de clivagem oxidativa de alcenos e alcinos utilizando o ozono (O3). O ozono ao reagir com os alcenos, gera um produto intermediário, designado ozonídeo, que é então reduzido a produtos carbonilo. As reacções provocam a quebra das ligações duplas carbono-carbono, sendo então substituídas por uma ligação carbono-oxigénio (ChemWiki, 2010). A reacção geral do ozono com alcenos segue a seguinte sequência: Figura 6-1 – Reacção geral do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) O processo de ozonólise divide-se em duas etapas. Na primeira dá-se a adição inicial eletrofílica do ozono à ligação dupla carbono-carbono, que então forma um intermediário, designado por molozonídeo. Devido ao facto desta molécula ser muito instável, continua ainda a reacção e divide-se para formar um carbonilo e uma molécula de óxido de carbonilo, como se pode observar na Figura 6-2. Figura 6-2 – Primeira etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) A segunda etapa consiste na reorganização da molécula de carbonilo e do óxido de carbonilo, para formar um ozonídeo intermediário mais estável, como se observa na Figura 6-3. O poder oxidativo converte o ozonídeo e dá origem a dois ácidos carboxílicos. Marta Nunes 67 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Figura 6-3 – Segunda etapa da reacção do ozono com alcenos (ChemWiki, 2010) De um modo geral, durante a reacção de ozonólise, o ozonídeo primário (molozonídeo) é formado a partir de um ácido envolvendo uma ligação dupla, como seja o ácido oleico e o ozono, via cicloadição 1,3. Este é então convertido num ozonídeo secundário, o qual é designado por 1,2,4-trioxolane (ozonídeo secundário), e pode ser oxidado a ácidos carboxílicos quando as devidas condições para a reacção oxidativa estão reunidas. Apresenta-se de seguida a síntese geral do ácido azelaico, tendo como sub-produto o ácido pelargónico, a partir da ozonólise do ácido oleico: Figura 6-4 – Representação do processo de ozonólise do ácido oleico (Kockritz & Martin, 2011) 68 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.2. Síntese do processo A síntese do processo consiste na definição da sequência de operações básicas, com vista a transformar a matéria-prima em produto final. Esta secção tem como objectivo expor de forma sucinta as etapas do processamento do ácido azelaico por recurso às bases conceptuais que definem a utilização das diferentes operações unitárias, bem como, a apresentação do diagrama do processo e as características da matéria-prima. As etapas principais do processo de produção do ácido azelaico consistem essencialmente na quebra das ligações duplas dos ácidos gordos pela adição do ozono, seguida da cisão e oxidação dos ozonídeos pelo aumento de temperatura. A representação esquemática dessa sequência de operações unitárias constitui o diagrama de processo (Process Flow Diagram – PFD). Na produção industrial de ácido azelaico a matéria-prima geralmente é o ácido oleico, como já referido anteriormente. No caso em estudo será o óleo alimentar usado. Das etapas de produção a seguir representadas no diagrama de processo é de salientar a importância das seguintes: 1. Ozonização: Consiste no ataque das ligações duplas dos ácidos gordos por uma molécula de ozono. Se esta fase for controlada a uma temperatura relativamente baixa, a absorção do ozono por parte dos ácidos gordos continua até se atingir a capacidade máxima de absorção dos ácidos e os produtos resultantes, geralmente designados por ozonídeos, determinam o rendimento da produção do ácido azelaico. 2. Cisão e oxidação: consiste na cisão e oxidação dos ozonídeos. É necessária a elevação da temperatura, cerca de 60ºC, até à temperatura de cisão dos ozonídeos para a reacção ser induzida. Os ozonídeos, agora muito instáveis (molozonídeos) são “quebrados” e reorganizados, convertendo-se em produtos mais estáveis (ozonídeos secundários). Estes são de seguida oxidados pelo oxigénio, dando assim origem a ácidos carboxílicos. Estas reacções são altamente exotérmicas, exigindo um rigoroso controlo do processo, particularmente da temperatura. O processo de ozonólise tem sido estudado ao longo dos anos, contudo as variações introduzidas a nível industrial não são muito significativas. Algumas operações unitárias, essencialmente de separação, poderão diferir de uma unidade industrial para outra, dependendo do grau de pureza do ácido azelaico desejado. A estrutura sintetizada para o processo apresentado neste trabalho assenta na patente US 2,813,113 publicada em 12 de Novembro de 1957 e na informação teórica de alguns artigos científicos publicados referentes ao processo de ozonólise. Este processo embora seja alvo de muitos estudos, continua a ter alguns pontos menos conhecidos devido à instabilidade química dos produtos intermediários e, por este facto, ao longo do trabalho foi necessário Marta Nunes 69 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima recorrer a algumas considerações, que serão explicitadas sempre que necessário (Kockritz & Martin, 2011; Goebel, et al., 1957). De notar, que a patente US 2,813,113 é relativa à produção de ácido azelaico a partir da ozonólise do ácido oleico. Contudo, esta também refere que o mesmo processo é possível a partir de outros ácidos gordos insaturados com tamanho de cadeia 10 a 24 carbonos, ou a partir de gorduras naturais, óleo e sebos, onde facilmente se enquadram os OAU após o prétratamento levado a cabo. Deste modo, permite extrapolar o processo para óleos vegetais, ainda que os sub-produtos não sejam exactamente iguais. Sadowska, et al. (2008) caracterizou os óleos vegetais e ácidos gordos puros ozonizados, tendo verificado que a reacção do ozono com óleos vegetais ocorre quase exclusivamente nas duplas ligações presentes nas cadeias insaturadas dos ácidos gordos. Por outro lado, notou que a sua saturação e consequente formação dos ozonídeos foram quase iguais, comparando a reacção a partir de ácidos gordos puros e a partir de óleos vegetais. Contudo, verificou que o tempo de ozonização para o consumo total das ligações duplas foi dez vezes maior para os óleos vegetais do que para os ácidos gordos puros. Este estudo sustenta a ideia de que a ozonólise dos óleos vegetais será, em parte, semelhante à ozonólise dos ácidos gordos e, portanto, poder-se-á seguir as linhas de orientação da patente em relação ao ácido oleico. No entanto, há que considerar que eficiências similares são somente possíveis se houver maior tempo de retenção nos reactores. É de salientar também que os óleos utilizados como matéria-prima são OAU mas admitindo que um pré-tratamento é efectuado (secção 3.1.1) considera-se que as propriedades são semelhantes aos óleos vegetais virgens, não constituindo por isso, um problema na produção de ácido azelaico. A unidade de produção de ácido azelaico será desenvolvida visando a produção de cerca de 26000 toneladas anuais, o que se traduz na utilização de 62008 ton/ano de óleo usado. Esta é a quantidade de óleo que hoje em dia não é devidamente tratada em Portugal, e que prospectivamente, em cenários de oportunidade, é possível recolher e valorizar, conforme discutido nos Capítulos 1 e 2. Segundo a patente de referência, a unidade industrial em causa operará em modo contínuo e as reacções de cisão e oxidação ocorrerão em simultâneo. Este modo permite ganhos de aproximadamente 10% de ácido azelaico. A possível explicação para isto é que os aldeídos no geral tendem a polimerizar muito rápido, enquanto a cisão e oxidação em simultâneo tendem a converter os aldeídos a ácidos antes de eles polimerizarem e formarem substâncias de elevado peso molecular. A operação em contínuo permite a diluição dos ozonídeos frescos continuamente e, portanto, optimizar a utilização do volume reaccional disponível. Outra escolha importante é a pureza do oxigénio usado. O oxigénio utilizado poderá ser proveniente do ar ou ser puro (p. ex. 99,5% pureza). No presente trabalho tradicionalmente considerou-se a utilização de oxigénio puro. Esta escolha deve-se essencialmente a evitar problemas decorrentes de impurezas e da capacidade do gerador de ozono. 70 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 A seguir serão apresentadas de forma relativamente detalhada todos os passos do processo. A Figura 6-5 mostra a representação esquemática de toda a linha de produção. Como se pode observar, na representação gráfica do diagrama do processo, existem duas zonas distintas (zona 1 e zona 2) na unidade de produção. Esta divisão em duas zonas deve-se essencialmente a questões de segurança, o equipamento para a geração de ozono requer muita energia e por isso é um sistema instalado à parte da linha de produção. Marta Nunes 71 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Legenda: 129 210 TA – Tanque de armazenamento PC-201 PE-201 201 R – Reactor 202 OX-201 209 123 203 CD – Coluna de destilação 130 VD-201 101 TA-101 B-101 102 PC – Permutador de calor AB-101 VD-101 205 R-101 R-101 105 107 108 109 110 R-103 111 112 113 106 204 B-103 B-104 132 133 B-105 134 137 136 135 104 TA-102 103 B – Bomba B-106 A – Aglomerador PE – Precipitador electrostático 122 VD-202 124 126 128 C – Condensador B-102 203 125 127 VD-102 OX – Oxigénio VD-103 V-101 206 S – Secador 122 I – Injector 139 119 S-201 120 PC-102 121 GO – Gerador de Ozono 113 VD-104 118 B-108 VD – Válvula de derivação 138 TA-103 113 CD-101 131 208 207 GO-201 I-201 114 115 116 117 TA-104 B-107 A-101 Figura 6-5 – Diagrama do processo 72 Ácido azelaico V – Válvula Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.2.1. Ozonização A primeira etapa a realizar é a absorção do ozono. Esta etapa consiste na clivagem dos ácidos gordos utilizando uma molécula de ozono, conseguida pelo contacto entre o oxigénio ozonizado proveniente do sistema de geração de ozono (GO-201) com o óleo, provocando um aumento de peso no óleo de 17% em massa. O óleo encontra-se no tanque TA-101/102 à temperatura ambiente (20ºC). Naturalmente, a composição do óleo alimentar usado varia, em qualquer um dos sectores, donde é oriundo. No caso de se considerar óleo recolhido maioritariamente do sector doméstico, e tendo em conta a própria variabilidade de ácidos encontrados nos óleos em causa é por demais evidente que o processo vai ser sujeito a uma certa variabilidade das características da matéria-prima. No entanto, e para efeito de projecto, considera-se que o óleo alimentar usado possui a seguinte composição (Canakci & Sanli, 2008): Ácido oleico (C18H34O2) – 53% Ácido linoleico (C18H32O2) – 33% Ácido linolénico (C18H30O2) – 1% Outros ácidos – 13% No processo de ozonização assume-se que as reacções ocorrem exclusivamente nas ligações duplas, consideração sustentada por (Sadowska, et al., 2008). O óleo é encaminhado do tanque TA-101/102 para o reactor R-101 e em contra-corrente é adicionado o oxigénio ozonizado, proveniente do sistema de geração de ozono (GO-201). Segundo a patente, a injecção em contra-corrente do oxigénio ozonizado é mais eficiente do que em co-corrente, sendo por isso esse o método utilizado. A eficiência desta etapa está fortemente dependente das condições de contacto entre o líquido e o gás e, consequentemente, da agitação. A mistura permanece neste reactor até os ácidos gordos absorverem o máximo possível de ozono, o que acontece quando o óleo tem um incremento de peso de 17%. Este processo ocorre entre 20 e 40ºC, a estas temperaturas o oxigénio existente é considerado inerte. Neste reactor (R-101) é ainda introduzida a corrente 122, que contribuirá como solvente e ajudará na purificação do ácido azelaico em etapas posteriores. O seu caudal é metade (m/m) da corrente 105 e entra no reactor à temperatura de 96,3ºC, evitando assim a necessidade de outro tipo de equipamento para o aquecimento da mistura para atingir os 40ºC. Ou seja, a corrente de reciclo serve como potenciador da indução da ozonização. No reactor R-101 a mistura permanecerá 1 hora, valor superior ao previsto (10 minutos) (Kockritz & Martin, 2011), uma vez que a matéria-prima é o óleo e portanto constituído por vários componentes e não por um componente apenas (caso do ácido oleico), e como tal, o processo de absorção do ozono é mais demorado (Sadowska, et al., 2008). A partir do reactor R-101 são formadas duas correntes (correntes 106 e 123). A corrente 123, composta por oxigénio, vapor de água, vapor orgânico e partículas é direccionada para o Marta Nunes 73 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima sistema de geração de ozono. Este trajecto inclui a passagem pelo precipitador electrostático (PE-201) para remoção das partículas, depois por um condensador (C-201) para remoção do vapor de água, e seguidamente por uma válvula, VD-201, que fracciona a corrente em duas (correntes 203 e 204). A corrente 203 é encaminhada para os reactores R-102/103/104, onde ocorrerão as reacções de cisão e oxidação dos ozonídeos, e a corrente 204 junta-se à corrente 205, constituída pelo oxigénio fresco. A corrente 206, agora formada, passa pelo secador S201 para remoção da humidade ainda existente e é devolvida ao gerador de ozono GO-201. Nesta etapa são adicionados ¾ do oxigénio total para a formação dos ácidos carboxílicos (Goebel, et al., 1957). O sistema de geração de ozono não será explorado de forma pormenorizada neste trabalho, pela sua complexidade e por se tratar de um equipamento que normalmente se instala por contratualização com companhias dedicadas a esse negócio. 6.2.2. Cisão e oxidação ozonídeos Após a passagem pelo reactor R-101, o óleo ozonizado a 40ºC, corrente 106, é direccionada para os reactores R-102/103/104 que se dispõe em série. Nesta etapa dão-se simultaneamente as reacções de cisão e oxidação dos ozonídeos. No reactor R-102 entram as correntes 107 e 124, aquecidas até à temperatura de cisão dos ozonídeos, cerca de 60ºC. Este aquecimento será efectuado apenas uma vez (ou sempre que se inicie o processo), pois a linha de produção operará de modo contínuo. Neste momento os ozonídeos, também chamados molozonídeos, são espécies muito instáveis e a sua decomposição, reacção de cisão, é rápida e extremamente exotérmica. Esta reacção é bem descrita pelo mecanismo de Criegee (Sadowska, et al., 2008). Os produtos formados são então mais estáveis, sendo seguidamente oxidados pelo oxigénio, através de reacção também exotérmica, dando origem aos ácidos carboxílicos, mais especificamente, aos ácidos azelaico, pelargónico, hexanóico, malónico entre outros. A formação destes ácidos está dependente do número de carbonos da cadeia dos ácidos gordos que lhe deu origem. É importante a existência de agitação em todos os reactores para promover um contacto eficiente entre o óleo ozonizado e o oxigénio e para que o calor transferido seja eficientemente retirado. Todo este processo dá-se aproximadamente em 4 a 8 horas, sendo o valor de referência considerado 6 horas (Goebel, et al., 1957), e exige um rigoroso controlo da temperatura, que deverá ser mantida em torno dos 100ºC (melhores rendimentos de ácido azelaico (Goebel, et al., 1957)) nos três reactores, sendo para isso necessário um arrefecimento constante em todos eles por meio de camisas. O arrefecimento em causa é promovido por uma corrente de água (correntes 132, 134 e 136 para cada reactor) que entrará nas camisas dos reactores à temperatura de 15ºC. As correntes de água são provenientes de uma torre de refrigeração. A corrente 107 passa, assim, de reactor em reactor até o processo estar completo. 74 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 De referir que a corrente 203 (oxigénio) passa através da válvula VD-201 e é distribuída pelos 3 reactores através de válvulas divisoras VD-102/103 e V-101. Teoricamente, nesta etapa é introduzida a quantidade de oxigénio em falta, ¼ do valor total, sendo necessária a adição de 4 átomos de oxigénio por cada ligação dupla (Goebel, et al., 1957). No último reactor, a corrente 130 constitui uma purga e tem o intuito de libertar alguns compostos voláteis e, assim, manter o grau de pureza desejada do oxigénio. A corrente 129 é enviada ao sistema de geração de ozono, mais concretamente ao precipitador electrostático PE-101 para a remoção de partículas, de modo a que o oxigénio que vai para o gerador de ozono não vá contaminado. 6.2.3. Separação do ácido azelaico A corrente 112 sai do reactor R-104 a 100ºC e é direccionada para a coluna de destilação, CD101. Esta coluna operará em condições bastante rigorosas, à pressão de 0,2 bar e à temperatura de 239ºC. Desta coluna sairá a corrente 118 (destilado), a 185,49ºC, constituída por ácido pelargónico, hexanóico, malónico entre outros ácidos, que sucessivamente passará pelo permutador de calor PC-101 para promover o arrefecimento até 96,3ºC e pela válvula VD-104 que a fraccionará em duas (correntes 121 e 122). A corrente 122, já arrefecida é agora recirculada para o reactor R-101 e a corrente 121 segue para o tanque TA-103. A corrente 114, constituída essencialmente por ácido azelaico (~96% de pureza), à temperatura de 291,71ºC, é dirigida para o aglomerador A-101, que promovendo a remoção de calor até ao ponto de fusão, permitirá a solidificação do produto na forma de flocos. Estes serão depois enviados para o tanque TA-104, para serem armazenados. 6.3. Balanços mássicos O objectivo da produção de ácido azelaico é a utilização de todo o óleo alimentar usado que hoje em dia não é tratado, cerca de 62008 ton/ano, o que dará uma produção de 26000 ton anuais deste ácido, com a operação da linha prevista para 333 dias por ano. Nos restantes dias do ano, o processo de produção está parado, de modo a proceder-se a realização de trabalhos de manutenção, substituição de equipamentos, limpeza, entre outros. A realização de balanços materiais permite caracterizar as quantidades de matéria-prima e reagentes necessários ao processo, bem como estimar todos os fluxos envolvidos, tornando-se fundamental para calcular as capacidades dos equipamentos necessários ao processo, bem como efectuar posteriormente uma estimativa dos custos de operação e instalação. Marta Nunes 75 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Ao caracterizar-se os fluxos mássicos na unidade de produção de ácido azelaico pretende-se determinar a quantidade exacta de produto, assim como, determinar caudais e composições das correntes envolvidas no processo de produção admitindo condições de estacionariedade. O balanço mássico de um processo baseia-se no princípio da conservação da massa enunciado por Lavoisier: (6-1) O desenvolvimento dos balanços materiais foi realizado assumindo que o processo se comporta estacionariamente, sem que haja acumulação. Para além desta consideração, os balanços materiais efectuados são fundamentados pelas seguintes suposições: Os balanços materiais efectuados têm como base a produção por hora, sendo a produção esperada de ácido azelaico de 3,26 ton/h (96% pureza); Uma vez que existem 3 reactores em série, e que neles ocorrem duas reacções em simultâneo, para efeitos de cálculo, é assumido que o grau de avanço das reacções é igual nos três reactores; Após as considerações expostas, apresentam-se os balanços materiais intrínsecos a cada etapa do processo a fim de caracterizar todas as correntes envolvidas. A resolução matemática dos balanços materiais foi desenvolvida em folha de cálculo (MS-Excel 2010), sendo esta uma ferramenta informática simples, que possibilita de uma forma rápida simular pequenas alterações. No final desta secção apresenta-se um balanço de massa global ao processo que permite validar os valores obtidos pelos balanços de massa parciais. Na resolução dos balanços mássicos, para além das considerações atrás já referidas, começou por se ter em conta: Composição óleo usado (referida na secção 6.2); A necessidade de oxigénio, tendo em consideração que o oxigénio ozonizado é constituído por 20% de ozono; Um produto final com 96% pureza; O facto de as reacções serem completas, sendo que ocorrem apenas nas ligações duplas dos ácidos gordos; Os ácidos que entram na corrente 122, corrente de reciclo, não reagem. Como em qualquer processo industrial, existe geralmente a formação de outros sub-produtos através de reacções secundárias. Na produção de ácido azelaico, a partir de ácido oleico, há a 76 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 produção de cerca de 20% de outros ácidos, sendo os restantes 80% ácido azelaico e pelargónico (40% de cada) (Goebel, et al., 1957). Ora, no caso em estudo, os ácidos oleico, linoleico e linolénico, são os ácidos que poderão dar origem ao ácido azelaico, atendendo à fórmula molecular de cada um e admitindo que se formam cerca de 20% de outros ácidos quando reagem, os produtos das reacções são os apresentados na Tabela 6-1. Note-se que o ácido linoleico e linolénico por serem diácidos dão origem aos ácidos hexanóico e malónico, no primeiro caso e malónico no segundo. Tabela 6-1 – Valores utilizados nos balanços mássicos para a obtenção dos produtos das reacções Ácido oleico (%m/m) 40% ácido azelaico 40% ácido pelargónico 20% AFRS Ácido linoleico (%m/m) 40% ácido azelaico 13,33% ácido malónico 26,67% ácido hexanóico 20% AFRS Ácido linolénico (%m/m) 40% ácido azelaico 40% ácido malónico 20% AFRS Assim, e tendo em conta que o grupo outros ácidos que fazem parte da constituição dos OAU reagem, mas não originam ácido azelaico, os seus produtos daqui em diante serão designados por ácidos formados por reacções secundárias (AFRS). Este grupo quando entra no reactor R101 não volta a reagir. 6.3.1. Reactor R-101 No reactor R-101 dará entrada a corrente 105 proveniente do tanque de armazenamento (TA101/102), a corrente 122, proveniente da válvula de derivação e a corrente 131 que é a corrente de oxigénio ozonizado. A quantidade de oxigénio introduzida neste reactor foi calculada tendo em conta que na ozonólise do ácido oleico por cada 1000 lb de ácido oleico são necessárias 9700 lb de oxigénio ozonizado, sendo a composição em ozono de 1,75%. No presente trabalho considerou-se que a pureza do ozono é de 20% e que a quantidade de oxigénio ozonizado necessária é introduzida nas mesmas proporções para todos os ácidos constituintes dos OAU. Admite-se que os ácidos AFRS, azelaico, pelargónico, hexanóico e malónico da corrente 122 (reciclo) não reagem e portanto também não sofrem o aumento de peso neste reactor. Esta corrente actua como solvente e tem apenas o objectivo de facilitar a separação dos produtos no final. De referir ainda, que o grupo designado por outros ácidos da corrente 105 é diferente dos AFRS da corrente 122, sendo que o primeiro grupo reage, dando origem ao grupo intermediário outros ozonídeos. Do reactor R-101 surgem duas correntes, a 106 e a 123. A primeira será encaminhada para os reactores R-102/103/104 e a segunda, constituída essencialmente por oxigénio, vapor de água, Marta Nunes 77 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima vapor orgânico e partículas, será encaminhada para o precipitador electrostático PE-101. Na Figura 6-6 pode-se visualizar as correntes de entrada e saída do reactor R-101. 123 AB-101 105 106 122 131 Figura 6-6 – Esquema representativo do reactor R-101 O balanço mássico referente ao reactor R-101 encontra-se na Tabela 6-2. Tabela 6-2 – Balanço mássico ao reactor R-101 Entrada Corrente 105 % Componente (m/m) Ácido linolénico 1,00 Ácido oleico 53,00 Ácido linoleico 33,00 Outros ácidos 13,00 Total 100,00 Corrente 122 Ácido azelaico 0,43 Ácido pelargónico 33,06 Ácido hexanóico 13,72 Ácido malónico 7,49 Corrente 106 Massa (ton) 0,08 4,11 2,56 1,01 7,76 Componente % (m/m) Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos 0,70 37,13 23,12 9,90 9,11 Massa (ton) 0,09 4,81 3,00 1,28 1,18 0,02 1,28 0,53 0,29 Ácido hexanóico Ácido malónico AFRS Ácido azelaico Total 4,11 2,24 13,56 0,09 100,00 0,53 0,29 1,76 0,02 12,96 Corrente 123 Oxigénio+vapor de água+ vapor orgânico+ 100,00 partículas Total 100,00 5,27 AFRS 45,30 1,75 Total 100,00 3,88 Corrente 131 Oxigénio 80,00 Ozono 20,00 Total 100,00 Total de entrada 78 Saída 5,27 5,27 1,32 6,59 18,22 Total de saída 18,22 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.3.2.Reactores R-102/103/104 No reactor R-102 entra a corrente 107, proveniente de R-101 e a corrente 124. A corrente de saída 108 é encaminhada para o R-103. Neste reactor entra também a corrente 126 e sai a corrente 110 que é direccionada para o próximo reactor (R-103). No reactor R-103, para além da corrente 111 entra a corrente 128 e saem as correntes 112, 129 e 130. É neste conjunto de reactores que ocorrem as reacções de cisão e oxidação. A corrente 112 segue para a coluna de destilação, a corrente 129 vai para o precipitador electrostático (pertencente ao sistema de geração de ozono) e a corrente 130 é uma purga, para permitir que o oxigénio que circula no sistema possua um grau de pureza aceitável. Para calcular a composição destas correntes foi necessário recorrer a várias considerações. Assumiu-se que os compostos voláteis presentes na corrente 130 traduzem o incremento de massa que ocorre pela adição do oxigénio. Esta assunção tem por base dados da patente que referem que os compostos voláteis libertados são equivalentes ao aumento de peso gerado pela adição do oxigénio (Goebel, et al., 1957). Considera-se, ainda, que todos os compostos voláteis saem na purga e na corrente 129 sai apenas o oxigénio ozonizado não reagido. O oxigénio necessário a esta etapa é cerca de 10% da quantidade (m/m) de óleo ozonizado que entra no reactor R-102 (Goebel, et al., 1957). Este valor tem um excesso 23,6% ao estequiometricamente necessário e será mantido em todos os reactores. Na corrente 112 saem os produtos das reacções calculados, tendo por base os valores de referência da Tabela 6-1. Considera-se, ainda, que o grau de avanço das reacções é igual em cada reactor, sendo o seu valor de 0,5437, obtido pela expressão que se segue e tendo em conta que o grau de conversão é 1, (6-2) onde é o grau de avanço. O balanço efectuado à unidade de reacção assume que ela é constituída por três equipamentos similares na geometria e na capacidade, a operar em série. A corrente resultante (corrente 112) é enviada à coluna de destilação para se levar a cabo a separação do produto final. O balanço mássico ao reactor foi efectuado com base nas assunções elencadas, estando a representação esquemática dele ilustrada na Figura 6-7. Marta Nunes 79 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 129 130 R-101 R-101 107 108 109 110 B-104 132 133 R-103 111 112 B-105 134 124 137 136 135 126 128 203 125 127 VD-102 VD-103 V-101 113 Figura 6-7 – Esquema representativo dos reactores R-102/103/104 139 O balanço mássico referente ao reactor R-102 encontra-se na Tabela 6-3. Na corrente 108 surgem agora compostos voláteis que se formam aquando da cisão e oxidação dos ozonídeos. Tabela 6-3 – Balanço mássico ao reactor R-102 Entrada Corrente 107 % Componente (m/m) Ozonídeos ác. linolénico 0,70 Ozonídeos ác. oleico 37,13 Ozonídeos ác. linoleico 23,12 Ácido pelargónico 9,90 Outros ozonídeos 9,11 Ácido hexanóico 4,11 Ácido malónico 2,24 Ácido azelaico 0,13 AFRS 13,56 Total 100,00 Corrente 124 Oxigénio 100,00 Total Total entrada 80 100,00 Saída Corrente 108 Massa (ton) 0,09 4,81 3,00 1,28 1,18 0,53 0,29 0,02 1,76 12,96 0,49 Componente Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Oxigénio Compostos voláteis Total % (m/m) 0,31 16,32 10,16 17,32 4,00 7,19 3,92 12,89 24,22 0,70 2,97 100,00 Massa (ton) 0,04 2,20 1,37 2,33 0,54 0,97 0,53 1,73 3,26 0,09 0,40 13,45 0,49 13,45 Total saída 13,45 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Na Tabela 6-4 apresenta-se o balanço mássico ao reactor R-103. Tabela 6-4 – Balanço mássico ao reactor R-103 Entrada Corrente 109 % Componente (m/m) Ozonídeos ác. linolénico 0,31 Ozonídeos ác. oleico 16,32 Ozonídeos ác. linoleico 10,16 Ácido pelargónico 17,32 Outros ozonídeos 4,00 Ácido hexanóico 7,19 Ácido malónico 3,92 Ácido azelaico 12,89 AFRS 24,22 Oxigénio 0,70 Compostos voláteis 2,97 Total 100,00 Corrente 126 Oxigénio 100,00 Total 100,00 Total entrada Marta Nunes Saída Corrente 110 Massa (ton) 0,04 2,20 1,37 2,33 0,54 0,97 0,53 1,73 3,26 0,09 0,40 13,45 Componente Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Oxigénio Compostos voláteis Total % (m/m) 0,11 5,64 3,51 21,12 1,38 8,77 4,78 19,45 29,69 1,06 4,49 100,00 Massa (ton) 0,01 0,77 0,48 2,90 0,19 1,20 0,66 2,67 4,07 0,15 0,62 13,72 0,27 0,27 13,72 Total saída 13,72 81 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Na Tabela 6-5 apresenta-se o balanço mássico ao reactor R-104. Tabela 6-5 – Balanço mássico ao reactor R-104 Entrada Corrente 111 % Componente (m/m) Ozonídeos ác. linolénico 0,11 Ozonídeos ác. oleico 5,64 Ozonídeos ác. linoleico 3,51 Ácido pelargónico 21,12 Outros ozonídeos 1,38 Ácido hexanóico 8,77 Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Oxigénio Compostos voláteis Total 4,78 19,45 29,69 1,06 4,49 100,00 Corrente 128 Oxigénio 100,00 Total 100,00 Total entrada Saída Massa (ton) 0,01 0,77 0,48 2,90 0,19 1,20 0,66 2,67 4,07 0,15 0,62 13,72 Corrente 112 % Componente (m/m) Ácido pelargónico 24,75 Ácido hexanóico 10,27 Ácido malónico 5,60 Ácido azelaico 24,51 AFRS 34,86 Total 100,00 Massa (ton) 3,21 1,33 0,73 3,18 4,52 12,96 Corrente 129 Oxigénio 100,00 Total 100,00 0,15 0,15 Corrente 130 Oxigénio 2,80 Compostos voláteis 97,20 0,02 0,73 Total 100,00 0,76 0,15 0,15 13,86 Total saída 13,86 6.3.3. Coluna de destilação CD-101 Na coluna de destilação CD-101, cuja função é a separação do ácido azelaico dos restantes produtos de reacção, entra a corrente 113 e saem as correntes 114 (resíduo) e 118 (destilado). Na Figura 6-8 pode-se visualizar simbolicamente a arquitectura da coluna de destilação CD101. 82 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 118 113 CD-101 114 Figura 6-8 – Esquema representativo da coluna de destilação CD-101 Os balanços mássicos a esta unidade foram levados a cabo tendo em conta fracções de corte estimadas com base no modelo da coluna objecto de dimensionamento (secção 6.5.3), o qual foi realizado com base no modelo Radfrac da package Aspen Engineering Suite 2006. Detalhes sobre o modelo e a sua utilização, neste contexto, serão fornecidos na secção 6.5.3. No entanto, intrinsecamente, ele acarreta no conceito de andar de equilíbrio e em modelos reais usados no cálculo de estimativas dos coeficientes de volatilidade. Na Tabela 6-6 apresentam-se as composições do destilado (corrente 118) e do produto de cauda (corrente 114), admitindo uma pureza de ácido azelaico de cerca de 96%. Tabela 6-6 – Composição da corrente 114 (destilado) e da corrente 118 (resíduo) na coluna destilação CD-101 Produtos Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico AFRS Corrente 114 0,0131 1 1 1 0,9727 Corrente 118 0,9869 0 0 0 0,0273 De referir ainda, que na simulação efectuada pelo Aspen Engineering Suite 2006, que permitiu obter os valores atrás referidos, nos compostos AFRS teve-se em conta que estes podiam ter cadeia com variado número de carbonos e portanto considerou-se que 50% destes tinham cadeias com número de carbonos inferior a 8 e os outros 50% tinham cadeia até 15 carbonos. Mais especificamente, assumiu-se que o ácido octanóico (8 carbonos) representa os compostos até 8 carbonos e o ácido pentadecanóico (15 carbonos) representa os compostos até 15 carbonos. Surgiu a necessidade desta suposição, pois na coluna destilação compostos com número de carbono maior que 9 (número de carbonos do ácido azelaico) poderiam sair Marta Nunes 83 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima na corrente de resíduo e assim dificultar a separação. Deste modo, com 50% de ácidos com cadeia de 15 carbonos (situações que representa compostos com elevado número de carbonos), apenas uma pequena fracção sai na corrente de resíduo, sendo esses os compostos que constituem as impurezas do ácido azelaico. É de salientar também, que para além dos ácidos com 15 carbonos, o ácido malónico é um composto que também exige condições operatórias da coluna bastante severas, pois este ácido por ter dois grupos ácidos (diácido) tem uma baixa volatilidade. Admitiu-se, por isso, que o grupo de AFRS não possui nenhum diácido. A corrente de destilado (118) é posteriormente enviada, após separação, ao equipamento que tornará o ácido azelaico em flocos (A-101). Isto ocorre por remoção de calor, o que leva a baixar-lhe a temperatura, promovendo a solidificação, sendo depois embalado e armazenado no tanque TA-104. Na Tabela 6-7 encontram-se os valores obtidos no balanço mássico à coluna de destilação CD-101. Tabela 6-7 – Balanço mássico à coluna de destilação CD-101 Entrada Saída Corrente113 Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico AFRS % (m/m) 24,41 24,75 10,27 5,60 34,86 Massa (ton) 3,18 3,21 1,33 0,73 4,52 Total 100,00 12,96 Componente Total Entrada 84 12,96 Corrente 118 % Componente (m/m) Ácido azelaico 0,43 Ácido pelargónico 33,06 Ácido hexanóico 13,72 Ácido malónico 7,49 AFRS <15C 45,30 Total Massa (ton) 0,04 3,21 1,33 0,73 4,39 100,00 9,70 Corrente 114 Ácido azelaico 95,52 Ácido pelargónico 0,00 Ácido hexanóico 0,00 Ácido malónico 0,00 AFRS <15C 4,48 Total 100,00 3,13 0,00 0,00 0,00 0,12 3,26 Total Saída 12,96 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.3.4. Balanço global Para validar os balanços mássicos, apresenta-se um balanço de massa global somando todas as entradas e saídas (Tabela 6-8). Tabela 6-8 – Balanço mássico global Entrada Saída Corrente 105 Corrente 123 Componente % (m/m) Massa (ton) Ácido linolénico 1,00 0,08 Ácido oleico 53,00 4,11 Ácido linoleico Outros ácidos Total 33,00 13,00 100,00 2,56 1,01 7,76 Corrente 122 Ácido azelaico 0,43 Ácido pelargónico 33,06 Ácido hexanóico 13,72 Ácido malónico 7,49 AFRS 45,30 Total 100,00 0,02 1,28 0,53 0,29 1,76 3,88 Corrente 131 Oxigénio 80,00 Ozono 20,00 Total 100,00 5,27 1,32 6,59 Corrente 203 Oxigénio 80,00 Total 100,00 0,91 0,91 % (m/m) Massa (ton) 100,00 5,27 100,00 5,27 2,80 97,20 100,00 0,02 0,73 0,76 Corrente 129 Oxigénio 100,00 Compostos voláteis 0,00 Total 100,00 0,15 0,00 0,15 Corrente 121 Ácido azelaico 0,43 Ácido pelargónico 33,06 Ácido hexanóico 13,72 Ácido malónico 7,49 AFRS <15C 45,30 Total 100,00 0,04 3,21 1,33 0,73 4,39 9,70 Corrente 117 Ácido azelaico 96,21 3,13 Componente Oxigénio+vapor de água+ vapor orgânico+ partículas Total Corrente 130 Oxigénio Compostos voláteis Total Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico AFRS<15C Total Total entrada Marta Nunes 19,13 Total saída 0,00 0,00 0,00 3,79 100,00 0,00 0,00 0,00 0,12 3,26 19,13 85 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.4. Balanços energéticos Nesta secção pretende-se avaliar os fluxos energéticos do processo em causa, de modo a caracterizar os recursos energéticos necessários. No caso dos balanços energéticos há que ter em consideração as perdas e gerações de calor. Tendo em conta, o princípio da conservação da energia, também designado pela 1ª lei da termodinâmica, serão avaliados os fluxos energéticos do processo envolvidos no processamento do produto. Assumindo estado estacionário, a lei genérica traduz-se na igualdade: (6-3) Os balanços energéticos foram desenvolvidos com o balanço mássico apresentado na secção anterior (6.3) e nas seguintes considerações: A temperatura ambiente é de 20ºC; A temperatura e a pressão de referência são 25°C e 1 atm para todos os componentes, com o estado de referência sendo o estado das espécies às condições PTN; Admite-se que o sistema se encontra perfeitamente isolado, não se contabilizando quaisquer perdas de calor para o exterior ao longo deste; Os calores específicos dos ácidos foram calculados com base no método de Rowlinson-Bondi (Morad, et al., 2000). Na impossibilidade de determinar os calores específicos (Cp), nomeadamente dos compostos designados por outros ácidos e AFRS foi efectuada uma média dos valores referentes aos ácidos presentes na corrente em causa. No caso dos ozonídeos foi assumido que eram iguais aos dos ácidos correspondentes. É certo que este valor não será exactamente igual, mas a informação a este respeito é ainda escassa a nível da bibliografia, principalmente por se tratar de espécies bastante instáveis e difíceis de isolar e medir. A expressão que permite calcular o calor transferido (Q), num processo isobárico com variação de temperatura é: (6-4) onde é o calor transferido, é a massa, é o calor específico e temperatura da corrente e a temperatura de referência. 86 é a diferença entre a Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.4.1. Reactor R-101 Na Figura 6-6 encontra-se a representação esquemática do reactor R-101. A corrente 105, que provém do tanque de armazenamento TA-101/102 e a corrente 131 entram no reactor à temperatura ambiente (20ºC). A corrente 122 entra a 96,3ºC, elevando assim a temperatura da mistura que se forma dentro do reactor até aos 40ºC. No balanço a esta unidade considerou-se que esta operava adiabaticamente e a dissipação da potência fornecida pelo agitador não tinha acção relevante na temperatura do sistema. Na Tabela 6-9 encontram-se os valores obtidos para o balanço energético ao reactor R-101. Tabela 6-9 – Valores obtidos do balanço energético ao reactor R-101 Entrada Saída Corrente 105 Massa Entalpia Componentes (ton) (kJ) Ácido 0,08 -698,85 linolénico Ácido oleico 4,11 -41089,95 Ácido 2,56 -24370,95 linoleico Outros ácidos 1,01 -9588,12 Total 7,76 -75747,87 Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico AFRS Total Oxigénio Ozono Total 20,00 Corrente 122 0,02 2815,71 1,28 217415,94 0,53 89780,02 0,29 48763,70 1,76 296387,80 3,88 655163,16 Corrente 131 5,27 -24165,99 1,32 -5346,34 6,59 -29512,34 Total entrada Marta Nunes T (ᵒC) 549902,95 96,28 Corrente 106 Massa Entalpia T Componentes (ton) (kJ) (ᵒC) Ozonídeos ác. 0,09 2697,41 linolénico Ozonídeos ác. oleico 4,81 152184,50 Ozonídeos ác. 3,00 92052,44 linoleico Ácido pelargónico 1,28 40689,82 Outros ozonídeos 1,18 36219,24 40,00 Ácido hexanóico 0,53 16475,69 Ácido malónico 0,29 8197,33 AFRS 1,76 53236,66 Ácido azelaico 0,02 510,16 Total 12,96 402263,25 Corrente 123 Oxigénio+vapor de água+ vapor 5,27 147639,70 40,00 orgânico+ partículas Total 5,27 147639,70 20,00 Total saída 549902,95 87 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.4.2. Reactores R-102/103/104 Reportando a representação esquemática da secção de reacção à Figura 6-7, o balanço energético foi desenvolvido tendo em conta o facto de no primeiro reactor se dar o aquecimento da corrente rica em ácido oleico de 40ºC à temperatura de operação desta unidade. Esta estratégia revela o facto de, o primeiro reactor funcionar simultaneamente como permutador e unidade de reacção, explorando uma integração de processos que pode eventualmente ser objecto de optimização. Por outro lado, configura a necessidade de fornecer uma boa parte do calor requerido pela secção na unidade R-101. É certo também, que após o start-up da reacção, e uma vez que esta é altamente exotérmica ocorre a libertação de calor que preenche os requisitos de aumento da temperatura da corrente de entrada. Nos reactores R-102/103/104 entra a corrente 107, a 40ºC e uma corrente com o oxigénio necessário à reacção de oxidação, à temperatura ambiente de 20ºC (proveniente do sistema geração de ozono). Para induzir a reacção, mais especificamente à reacção de cisão dos ozonídeos é necessário elevar a temperatura da mistura à sua temperatura de cisão, cerca de 60ºC. O aquecimento é efectuado com recurso a água quente. No entanto, este passo da sequência é apenas requerido no start-up do processo e não será aqui analisado, uma vez que ele representa um regime trasiente. De qualquer modo, cálculos efectuados apontam para a necessidade de 4,14 ton/h de água quente a 98ºC. Tal como já tinha sido enfatizado (Figura 6-5), a operação do reactor envolve a geração de calor, uma vez que as duas reacções que ocorrem são exotérmicas, envolvendo por isso o aumento da temperatura. Analisando informação constante na literatura verificou-se que a energia libertada nas duas reacções é grande e que não varia consideravelmente de espécie para espécie de ozonídeo. A energia de activação dos ozonídeos é de 20 kcal/mol (Reusch, 1999), valor idêntico ao apresentado por Huang & Wang (2008). Neste último estudo, observa-se que para o composto fulereno (C70) a energia de activação ronda as 16,5 kcal/mol (Huang & Wang, 2008) . Ora, este composto tem um número de carbonos elevado e contudo a energia de activação não varia muito relativamente ao valor mencionado por (Reusch, 1999). O mesmo se pode constatar no trabalho referente à ozonólise do eteno, cuja energia de activação é de 18 kcal/mol (Disselkamp & Dupuis, 2001). Apesar das diferenças dos compostos a barreira energética que os ozonídeos têm de vencer para reagir é muito semelhante. Esta informação torna-se importante, uma vez que não foi possível obter dados para os ozonídeos dos ácidos em estudo, contudo, a energia, neste caso libertada pelas reacções, pelos factos acimas mencionados, poderá aproximar-se aos valores reportados por Disselkamp & Dupuis (2001) para o caso do propeno. 88 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Os calores de reacção listados na Tabela 6-10 foram estimados com base na ozonólise do propeno (Disselkamp & Dupuis, 2001). Tabela 6-10 – Valores de entalpia da reacção cisão (1) e oxidação (2) (Disselkamp & Dupuis, 2001) Reacção Ácido oleico Ácido linoleico Ácido linolénico Outros ácidos Σ∆Hreacção 1+2 (kJ) ∆Hreacção1 (kcal/mol) -55,6 -55,6 -55,6 -55,6 ∆Hreacção2 (kcal/mol) -115,6 -115,6 -115,6 -115,6 -19760293,1 Como se pode observar a entalpia das duas reacções é consideravelmente elevada. Assim, a exotermicidade das reacções leva a que se verifique um aumento de temperatura da massa nos reactores. Deste modo, e como se pretende controlar a temperatura a cerca de 100 C, nos reactores nesta fase, valor que proporciona melhores rendimentos de ácido azelaico, uma corrente de água fria circulará numa camisa de arrefecimento para assegurar que tal seja conseguido. Esta corrente entrará no reactor à temperatura de 15ºC e virá da torre de refrigeração, onde será novamente devolvida. Na Figura 6-7 ilustra-se o balanço ao sistema de reacção. É de referir, que a massa reaccional ao passar de reactor em reactor vai tendo cada vez menos ácido oleico, linoleico e linolénico capazes de reagir. Ora, isto leva a prever que no primeiro reactor, sendo a extensão da reacção significativamente maior, vai ocorrer uma potencial maior libertação de calor, o que configura a necessidade de aqui o caudal de água de arrefecimento a usar ser maior. Marta Nunes 89 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Na Tabela 6-11 encontra-se o balanço energético ao reactor R-102. Tabela 6-11 - Balanço energético ao reactor R-102 Entrada Componentes Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Total Corrente 107 Massa Entalpia (ton) (kJ) 0,09 2697,41 4,81 152184,50 3,00 92052,44 1,28 40689,82 1,18 36219,24 Saída T (ºC) 40,00 0,53 16475,69 0,29 8197,33 0,02 1,76 12,96 510,16 53236,66 402263,25 Corrente 124 Oxigénio Total 0,49 0,49 -2263,97 -2263,97 Água Total Calor reacção Corrente 132 24,81 -1053032,18 24,81 -1053032,18 10743454,25 Total entrada 10090421,34 90 20,00 15,00 Componentes Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Oxigénio Compostos voláteis Total Água Total Total saída Corrente 108 Massa Entalpia (ton) (kJ) 0,04 7827,48 2,20 401690,86 1,37 254583,23 2,33 418669,36 0,54 100191,84 T (ºC) 100,00 0,97 173097,80 0,53 94504,70 1,73 3,26 0,09 311870,47 584617,34 6545,30 0,40 49688,01 13,45 2403286,40 Corrente 133 24,81 7687134,95 24,81 7687134,95 10090421,34 98,00 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 O balanço ao reactor R-103 é apresentado na Tabela 6-12. Tabela 6-12 – Balanço energético ao reactor R-103 Componentes Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Entrada Corrente 109 Massa Entalpia (ton) (kJ) 0,04 7827,48 2,20 401690,86 1,37 254583,23 2,33 418669,36 0,54 100191,84 100,00 0,97 173097,80 Ácido malónico 0,53 94504,70 Ácido azelaico ARFS Oxigénio Compostos voláteis Total 1,73 3,26 0,09 311870,47 584617,34 6545,30 0,40 49688,01 13,45 2403286,40 Oxigénio Total Corrente 126 0,27 -1230,90 0,27 -1230,90 Corrente 134 Água 16,53 -701499,60 Total 16,53 -701499,60 Calor de reacção 5841098,04 Total entrada Marta Nunes T (ºC) 7541653,93 Componentes Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico ARFS Oxigénio Compostos voláteis Total Saída Corrente 110 Massa Entalpia (ton) (kJ) 0,01 2756,85 0,77 141475,98 0,48 89664,50 2,90 520930,76 0,19 35287,68 1,20 215377,52 0,66 117587,79 2,67 4,07 0,15 479804,19 731014,80 10103,91 0,62 76702,84 13,72 2420706,82 T (ºC) 100,00 20,00 15,00 Água Total Total saída Corrente 135 16,53 5120947,11 16,53 5120947,11 98,00 7541653,93 91 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Na Tabela 6-13 encontra-se o balanço energético ao reactor R-104. Tabela 6-13 – Balanço energético ao reactor R-104 Entrada Componentes Ozonídeos ác. linolénico Ozonídeos ác. oleico Ozonídeos ác. linoleico Ácido pelargónico Outros ozonídeos Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico AFRS Oxigénio Compostos voláteis Total Oxigénio Total Saída Corrente 111 Massa Entalpia (ton) (kJ) 92 Componentes Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico Ácido azelaico 0,01 2756,85 0,77 141475,98 0,48 89664,50 2,90 520930,76 0,19 35287,68 1,20 215377,52 0,66 2,67 4,07 0,15 117587,79 479804,19 731014,80 10103,91 Oxigénio Total 0,62 76702,84 Oxigénio 13,72 2420706,82 Corrente 128 0,15 -669,23 0,15 -669,23 Corrente 136 Água 9,34 -396255,87 Total 9,34 -396255,87 Calor de reacção 3175740,82 Total entrada T (ºC) 5199522,55 100,00 Corrente 112 Massa Entalpia (ton) (kJ) 3,21 576529,17 1,33 238364,54 0,73 130137,82 3,18 571107,90 ARFS 4,52 810609,49 Total 12,96 2326748,92 Corrente 129 0,15 10569,29 0,15 10569,29 T (ºC) 100,00 100,00 Corrente 130 Compostos voláteis Total 0,02 1469,40 0,73 91390,50 0,76 92859,91 100,00 20,00 15,00 Água Total Total saída Corrente 137 9,34 2892667,84 9,34 2892667,84 5199522,55 98,00 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.4.3. Coluna de destilação CD-101 A representação esquemática da coluna de destilação CD-101 está na Figura 6-8. O ácido azelaico e restantes produtos são provenientes da secção de reacção à temperatura de 100ºC. O balanço energético foi desenvolvido com base em alguns parâmetros utilizando o modelo Radfrac da package Aspen Engineering Suite 2006. Este modelo foi sobretudo usado numa perspectiva de dimensionamento do equipamento em causa (secção 6.5.3). No entanto, alguns dados físicos foram estruturados por recurso a ele, nomeadamente capacidades calorificas e calores de vaporização. Nesta instância o modelo permitiu, para além da estimativa das composições das correntes de destilado e resíduo (secção 6.3.3), a estimativa do perfil de temperaturas na coluna por forma a obter-se a separação requerida, correspondente às fracções de corte previamente objectivo. Foi assumido que a coluna opera a 0,2 bar, tendo o modelo Radfrac permitido estimar a temperatura do destilado (no condensador), cujo valor é 185,49ºC e a temperatura do resíduo, 291,71ºC. O calor requerido é fornecido na forma de vapor. A Tabela 6-14 apresenta o balanço à coluna de destilação CD-101. Dos resultados é evidente que esta unidade é largamente consumidora de energia. Nesta perspectiva, é conveniente proceder à optimização da unidade e haverá aqui algum espaço para integração energética. Tabela 6-14 - Balanço energético à coluna de destilação CD-101 Entrada Componentes Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico Outros ácidos Total Corrente 113 Massa Entalpia (ton) (kJ) 3,18 739609,90 3,21 712209,17 1,33 303147,65 0,73 4,52 12,96 185453,55 1059262,75 2999683,02 Calor a fornecer 4285031,96 Total entrada 7284714,97 Marta Nunes Saída T (ᵒC) Componentes Corrente 118 Massa Entalpia (ton) (kJ) Ácido azelaico Ácido pelargónico 100,00 Ácido hexanóico 0,04 18541,63 3,21 1389340,44 1,33 584384,07 T (ᵒC) 185,49 Ácido malónico 0,73 341932,84 Outros ácidos 4,39 1964696,46 Total 9,70 4298895,43 Corrente 114 Ácido azelaico 3,13 2871716,45 Outros ácidos 0,12 114103,09 Total 3,26 2985819,54 Total saída 291,71 7284714,97 93 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.4.4. Permutador de calor PC-101 Na Figura 6-9 encontra-se a representação esquemática do permutador de calor PC-101. Nesta unidade entram as correntes 119 e 138 e sairão as correntes 120 e 139. Com este equipamento pretende-se arrefecer a corrente 119, proveniente da coluna de destilação, mais especificamente pretende-se a diminuição da temperatura de 185,49ºC para 96,28ºC. Este arrefecimento é promovido por uma corrente de água que entra a 15ºC e sai a 90ºC, o que representa a necessidade de 7,88 ton/h de água. 139 119 120 PC-102 138 Figura 6-9 – Esquema representativo do permutador de calor PC-101 Na Tabela 6-15 encontra-se o balanço efectuado ao permutador de calor PC-101. Tabela 6-15 – Balanço energético ao permutador de calor PC-101 Entrada Componentes Corrente 119 Massa Entalpia (ton) (kJ) Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico 0,04 18541,63 3,21 1389340,44 1,33 584384,07 0,73 341932,84 Saída T (ºC) 185,49 Outros ácidos 4,39 1964696,46 Total 9,70 4298895,43 Corrente 138 Água 7,88 -354769,58 Total 7,88 -354769,58 Total entrada 94 3944125,85 15,00 Componentes Ácido azelaico Ácido pelargónico Ácido hexanóico Ácido malónico Outros ácidos Total Água Total Corrente 120 Massa Entalpia (ton) (kJ) 0,04 7040,20 3,21 543611,41 1,33 224479,60 0,73 121925,29 4,39 741067,05 9,70 1638123,55 Corrente 139 7,88 2306002,30 7,88 2306002,30 Total saída 3944125,85 T (ºC) 96,28 90,00 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.5. Dimensionamento Nesta secção é apresentado o dimensionamento preliminar dos equipamentos envolvidos na linha de produção sintetizada. Este cálculo visa a determinação das principais características específicas de cada uma das unidades da linha de produção, que possibilitem, posteriormente, estimar custos de instalação e de operação da unidade industrial. É importante referir que as estratégias de dimensionamento usadas se sustentam por modelos estacionários de processo, não garantindo, naturalmente, a optimização da performance e dos custos. A maioria dos equipamentos é de aço inoxidável, pois este material tem elevada resistência à oxidação e apresenta uma boa resistência à corrosão, mesmo quando exposto a condições adversas, como sejam temperaturas e pressões elevadas. É, ainda, um material inerte, de limpeza fácil, tendo baixa rugosidade superficial. 6.5.1. Tanques de armazenamento TA-101/102/103/104 O dimensionamento dos tanques de armazenamento consiste na determinação do volume, diâmetro, altura e espessura, bem como a selecção do material de construção. Relativamente a este último aspecto, um dos principais factores a ter em conta é a resistência do material à corrosão. No processo de dimensionamento de um tanque de armazenamento é necessário tomar as seguintes considerações (Coulson & Richardson, 1988): Existe uma espessura mínima que garante a estabilidade estrutural dos tanques, para que suportem o seu próprio peso, o peso do fluido no seu interior e eventuais cargas acidentais. Essa espessura inclui também uma margem de corrosão, normalmente de 2 mm. As tampas dos tanques são de formato elipsoidal e a sua espessura é igual à espessura do respectivo tanque; Uma razão de altura de líquido/diâmetro do tanque igual a um, de modo a obter-se o design óptimo, assumindo que o mesmo material é usado para tampa e abas; Uma margem de 20% de segurança relativamente ao volume óptimo, de modo a acautelar eventuais situações extremas ao nível da operação; Os tanques de armazenamento iniciais (TA-101/102) possuem um tempo de residência de 2 dias por prevenção, caso ocorram atrasos na entrega da matéria-prima, prevenindo desta forma paragens de produção. O tanque de armazenamento TA-103 possui um tempo de residência de 1 dia; Os tanques de armazenamento operam à temperatura ambiente (20ºC) e à pressão atmosférica; Marta Nunes 95 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima material escolhido para todos os tanques foi aço inoxidável, pelas suas propriedades (robustez e resistência à corrosão) e custo. O algoritmo usado para o cálculo dos tanques consiste, basicamente, na assunção de um tempo de residência e no cálculo do volume requerido (com 20% de sobredimensionamento). De seguida, considerando geometria cilíndrica, são dimensionados o diâmetro e a altura. De referir que as dimensões resultantes não foram standardizadas. A Tabela 6-16 apresenta os parâmetros obtidos para o dimensionamento dos tanques de armazenamento. Tabela 6-16 – Dimensionamento dos tanques de armazenamento Tanque Material (ton/dia) τ (dias) Vtanque (m3) Di (m) Htanque (m) etanque (mm) De (m) etampa (mm) onde, TA-101 TA-102 TA-103 TA-104 Aço inoxidável 93,11 2 253,00 6,36 7,95 12,00 6,39 12,00 Aço inoxidável 93,11 2 253,00 6,36 7,95 12,00 6,39 12,00 Aço inoxidável 139,69 1 189,79 5,78 7,23 12,00 5,81 12,00 Aço inoxidável 78,18 1 106,22 4,77 5,96 12,00 4,79 12,00 é o caudal mássico que neles passa, τ é o tempo de retenção, Vtanque é o volume do tanque, Di é o diâmetro interno, Htanque é a altura, etanque é a espessura da parede, De é o diâmetro externo e etampa é a espessura da tampa. 6.5.2. Reactores R-101/102/103/104 Em termos genéricos os reactores químicos são as peças de equipamento ondem ocorrem as transformações químicas dos reagentes em produtos. Para o dimensionamento dos reactores da linha de produção é fundamental conhecer à partida o caudal de alimentação, o número de unidades e o seu modo de operação. Estas dimensões de decisão foram definidas na secção 6.2, onde com base em critérios comummente usados na síntese de processos químicos e em informação bibliográfica relevante, se considerou que a secção de reacção é formada por 3 unidades em série a operar continuamente, que se seguem ao reactor de absorção de O 3. A literatura disponível, tanto quanto é do nosso conhecimento, não define cinéticas para as reacções de cisão e oxidação. Este facto levou a que o dimensionamento das unidades de reacção tivesse sido feito com base no conceito de tempo de retenção e em dados bibliográficos onde valores para este parâmetro são referidos (Goebel, et al., 1957). 96 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 O dimensionamento de um reactor envolve o cálculo: Do volume do vaso onde ocorre a reacção Das condições de operação que maximizam a performance, nomeadamente temperatura e pressão; Das características mecânicas do vaso, nomeadamente da espessura da parede; Das características do sistema de agitação, nomeadamente a tipologia do agitador e a sua potência; Das características do isolamento do reactor, quando necessário; Das características dimensionais das camisas de arrefecimento, nomeadamente quando é necessário aquecer ou arrefecer a massa reaccional. Na indústria é frequente a associação de reactores contínuos perfeitamente agitados (continuous stirred tank reactors – CSTR), principalmente quando as reacções são lentas. Associando reactores em série permite diminuir o volume de cada um deles e também a potência da agitação necessária para obter uma mistura homogénea, diminuindo assim os custos (Walas, et al., 2010). A medida usada para estimar o tamanho de reactores contínuos é o tempo de retenção (τ). Este corresponde ao tempo necessário para processar em média um volume de alimentação definido e atingir um dado grau de conversão. No caso vertente, é referido que as reacções de cisão e oxidação requerem um tempo de retenção 6 horas (Goebel, et al., 1957), tendo-se assumido que os reactores são geometricamente iguais e, por isso, cada um deles tem um tempo de retenção de 2 horas. Quanto ao reactor para a absorção do ozono foi considerado um tempo de retenção de 1 hora. O dimensionamento mecânico do vaso foi determinado de modo análogo ao dos tanques de armazenamento. Considerando a geometria cilíndrica dos reactores procedeu-se também ao cálculo do diâmetro e altura de cada um, admitindo, tal como nos tanques, uma relação altura de líquido/diâmetro do reactor igual a um. O volume do agitador foi desprezado para o cálculo do volume total de cada reactor, mas teve-se em conta a margem de segurança de 20%. O material escolhido para o dimensionamento dos reactores foi o aço inoxidável. Reactor R-101 O R-101 encontra-se à pressão atmosférica e a temperatura de operação entre os 20 e os 40ºC. Na Tabela 6-17 encontram-se listados os parâmetros referentes às dimensões da unidade R101. Marta Nunes 97 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Tabela 6-17 – Características mecânicas do reactor R-101 Reactor R-101 Material τ (h) Q (m3/h) Vreactor Di (m) Hreactor (m) ereactor (mm) De (m) etampa (mm) Aço inoxidável 1,00 10,88 13,60 2,40 3,00 9,00 2,42 9,00 onde, Q é o caudal volumétrico, τ é o tempo de retenção, Vreactor é o volume do reactor, Di é o diâmetro interno, Hreactor é a altura do reactor, ereactor é a espessura da parede do reactor, De é o diâmetro externo e etampa é a espessura da tampa. - Sistema de agitação O agitador a instalar depende do tipo de mistura requerida, da capacidade do recipiente e, principalmente, das propriedades do fluido, nomeadamente a viscosidade. Para fluidos pouco viscosos utilizam-se agitadores de pequenas dimensões e elevadas velocidades e para fluidos muito viscosos usam-se princípios de escolha opostos (Walas, et al., 2010). O uso de agitação é fundamental neste processo industrial, ela tem como função principal homogeneizar a mistura reaccional, garantindo o contacto máximo entre o líquido e o gás. Nesta etapa a agitação determinará em grande medida a eficiência da absorção do ozono e, consequentemente, o aumento de peso dos ácidos gordos. O sistema de agitação escolhido para o R-101 foi uma turbina do tipo Rushton com seis pás planas. Esta escolha justifica-se pelos valores relativamente baixos de viscosidade da mistura. É de referir que o sistema de agitação permite genericamente obter uma mistura perfeitamente homogénea. De forma a minimizar os vórtices formados, sugere-se uma estrutura de quatro anteparos dispostos verticalmente a toda a altura do tanque e imediatamente adjacentes à parede do mesmo. O dimensionamento do sistema de agitação foi levado a cabo com base no algoritmo referido em (Walas, et al., 2010). Na Tabela 6-18 encontram-se listadas as principais características do sistema de agitação da unidade R-101. 98 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Tabela 6-18 – Dimensionamento do sistema de agitação do reactor R-101 Agitação R-101 Tipo agitador DA (m) HA N (rps) Nº anteparos Largura dos anteparos (m) Largura das pás (m) Altura das pás (m) S (m) Potência agitação (kW) Turbina com 6 pás planas 0,80 0,80 1,71 4,00 0,24 0,20 0,16 0,1 6,23 onde DA é o diâmetro do agitador, HA é a altura do agitador ao fundo do reactor, N é o número de rotações por segundo e S é o comprimento da pá do agitador montada no disco central. - Espessura do isolamento do reactor O último passo do dimensionamento do reactor será estimar a espessura do isolamento. Para a determinação da espessura do isolamento do reactor é necessário ter em conta o perfil de temperaturas e a transferência de calor do interior do reactor para o exterior. Considerou-se que o topo e a base do cilindro estão perfeitamente isoladas, apenas existindo transferência de calor pela parte lateral do cilindro. Admitiu-se ainda que a temperatura ambiente era cerca de 20ºC. Para o dimensionamento da espessura do isolamento do reactor foi utilizado um método iterativo até se obter uma temperatura exterior no isolamento aceitável, próximo da temperatura ambiente (Geankoplis, 2003; Johnson, 1999). Na Tabela 6-19 apresentam-se os parâmetros obtidos para as dimensões do isolamento do reactor R-101. Tabela 6-19 – Dimensionamento da espessura do isolamento do reactor R-101 Isolamento Material isolamento hint (J/(sKm2)) hext (J/(sKm2)) Treactor (ᵒC) Text (ᵒC) TS,e (ᵒC) eisolamento (m) r3 Marta Nunes R-101 Fibra mineral com reforço metálico 95,36 5,00 40,00 20,00 22,41 0,05 1,27 99 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima onde, hint é o coeficiente de transferência de calor no interior, hext é o coeficiente de transferência de calor no exterior , Treactor é a temperatura no interior do reactor, Text é a temperatura no exterior do reactor, TS,e é a temperatura da superfície externa do reactor, eisolamento é a espessura do isolamento e r3 é o raio exterior do reactor envolvendo o isolamento. Reactores R-102/103/104 Os reactores R-102/103/104 foram dimensionados de modo semelhante ao reactor R-101. De acordo com o que foi definido na secção 6.2, onde se apresentou a análise que levou à definição do diagrama de processo, o tempo de retenção desta unidade de reacção é de 6 horas, com cada unidade tendo um valor de horas. Na Tabela 6-20 encontram-se os parâmetros obtidos para o dimensionamento dos reactores R-102/103/104. Tabela 6-20 – Características mecânicas dos reactores R-102/103/104 Reactor R-102 R-103 R-104 Material τ (h) Q (m3/h) Vreactor Di (m) Hreactor (m) ereactor (mm) De (m) etampa (mm) Aço inoxidável 2 3,97 29,80 3,12 3,90 12,00 3,14 12,00 Aço inoxidável 2 3,97 29,80 3,12 3,90 12,00 3,14 12,00 Aço inoxidável 2 3,97 29,80 3,12 3,90 12,00 3,14 12,00 onde, Q é o caudal volumétrico, τ é o tempo de retenção, Vreactor é o volume do reactor, Di é o diâmetro interno, Hreactor é a altura do reactor, ereactor é a espessura da parede do reactor, De é o diâmetro externo e etampa é a espessura da tampa. 100 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 - Sistema de agitação O sistema de agitação escolhido foi uma turbina do tipo Rushton com seis pás planas. Na Tabela 6-21 encontram-se os parâmetros obtidos para o dimensionamento do sistema de agitação dos reactores R-102/103/104. Tabela 6-21 - Dimensionamento do sistema de agitação dos reactores R-102/103/104 Agitação Tipo agitador DA (m) HA N (rps) Nº anteparos Largura dos anteparos (m) Largura das pás (m) Altura das pás (m) S (m) Potência agitação (kW) R-102 R-103 R-104 Turbina com 6 pás planas 1,04 1,04 1,71 4,00 0,31 0,26 0,21 0,13 33,39 Turbina com 6 pás planas 1,04 1,04 1,71 4,00 0,31 0,26 0,21 0,13 36,40 Turbina com 6 pás planas 1,04 1,04 1,71 4,00 0,31 0,26 0,21 0,13 39,41 onde DA é o diâmetro do agitador, HA é a altura do agitador ao fundo do tanque, N é o número de rotações por minuto e S é o comprimento da pá do agitador montada no disco central. - Camisa aquecimento/arrefecimento As reacções que ocorrem nos reactores R-102/103/104 são extremamente exotérmicas. Para contornar essa situação é necessário arrefecer os reactores, de modo a que a temperatura não ultrapasse os 100ºC. Este arrefecimento vai ser efectuado por meio de uma camisa de arrefecimento, onde circulará água, que entrará a 15ºC. As camisas foram dimensionadas tendo em conta a quantidade de água necessária para arrefecer a massa reaccional, valor apresentado anteriormente nos balanços energéticos (secção 6.4). A camisa de arrefecimento envolverá o reactor (excepto o topo), de modo a aumentar a eficiência da transferência de calor. A Tabela 6-22 apresenta as características das camisas de arrefecimento dos reactores R102/103/104, a qual foi calculada tendo por base os valores dos coeficientes de transferência de calor obtidos dentro da camisa, ou seja, quando foram considerados aceitáveis. O calor a retirar a partir das camisas vem do balanço energético (secção 6.4.2.). Marta Nunes 101 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Tabela 6-22 – Dimensionamento das camisas dos reactores R-102/103/104 Camisa R-102 R-103 R-104 Material τ (h) Aço inoxidável 0,33 Aço inoxidável 0,33 Aço inoxidável 0,33 Tentrada água (ᵒC) 15,00 15,00 15,00 Qágua (m3/h) 24,81 16,53 8,99 Vcamisa (m3) 8,19 5,46 2,97 ecamisa (m) 0,40 0,27 0,15 eparede camisa (mm) 12,00 12,00 12,00 Hcamisa (m) 3,90 3,90 3,90 onde τ é o tempo de retenção, Tentrada água é a temperatura de entrada da água na camisa, Qágua é o caudal volumétrico, Vcamisa é o volume da camisa, ecamisa é a espessura da camisa, eparede camisa é a espessura da parede da camisa e Hcamisa é a altura da camisa. - Espessura do isolamento do reactor O isolamento dos reactores foi dimensionado de modo análogo ao isolamento do reactor R101, com a diferença, de que estes têm uma camisa de arrefecimento. O material seleccionado foi fibra mineral com reforço metálico para os três reactores. É de salientar que o isolamento foi calculado admitindo uma temperatura média da água de arrefecimento na camisa, 56,5ºC, valor médio entre a temperatura de entrada e de saída da água da camisa. O calor perdido em cada reactor rondará os 700 W. Na Tabela 6-23 apresentam-se as dimensões do isolamento dos reactores R-102/103/104. Tabela 6-23 – Dimensionamento da espessura do isolamento dos reactores R-102/103/104 Isolamento Material isolamento Treactor (ᵒC) Text (ᵒC) TS,e (ᵒC) eisolamento (m) Raio total (reactor+camisa+isol) R-102 R-103 R-104 Fibra mineral com reforço metálico 100 20 22,89 0,08 Fibra mineral com reforço metálico 100 20 22,88 0,08 Fibra mineral com reforço metálico 100 20 22,88 0,08 2,06 1,94 1,81 onde, Treactor é a temperatura no interior do reactor, Text é a temperatura no exterior do reactor, TS,e é a temperatura da superfície externa do reactor e eisolamento é a espessura do isolamento. 102 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.5.3. Coluna de destilação CD-101 No dimensionamento da coluna de destilação pode considerar-se que esta é constituída por uma série de andares em equilíbrio que vão promovendo, sucessivamente, o enriquecimento nos componentes mais voláteis, da fase vapor que sobe na coluna, e nos componentes menos voláteis, da fase líquida que desce na coluna. Deste modo, considera-se que uma coluna de destilação se encontra dividida em duas secções, a zona de empobrecimento, que se localiza por baixo da alimentação, onde os componentes mais voláteis são transferidos para a fase de vapor e a zona de rectificação localizada acima da alimentação, onde ocorre a concentração dos constituintes mais voláteis na fase de vapor (Seader & Henley, 2006). Na linha de operação do processo descrito na secção 6.2, a coluna de destilação tem como objectivo separar o ácido azelaico dos outros constituintes, saindo o ácido azelaico na corrente de resíduo. O conceito base para o dimensionamento da coluna destilação CD-101 é a assunção de pratos de equilíbrio como representação dos andares físicos da coluna. No prato de equilíbrio assume-se a existência de equilíbrio termodinâmico entre as composições dos componentes em ambas as fases. O projecto da coluna de destilação foi desenvolvido no módulo Radfrac do software Aspen Engineering Suite 2006. O modelo utilizado para a estimativa das propriedades dos componentes e dos dados de equilíbrio foi o UNIFAC. O módulo Radfrac modela a coluna como um conjunto de equações algébricas não lineares, envolvendo os balanços mássicos a cada prato e fase (M), os balanços entálpicos em cada prato (H), as restrições decorrentes de cada fase e prato, o somatório das fracções molares ser 1 (S) e as equações que permitem calcular o coeficiente de actividade de cada constituinte em cada fase e prato (A). A agregação das equações algébricas dá origem ao modelo, vulgarmente designado por MASH, é resolvido no módulo Radfrac à custa de métodos exactos (Seader & Henley, 2006). O método usado é baseado no algoritmo do tipo Newton para a resolução do sistema de equações algébricas. A eficiência do método é optimizada por uma estratégia envolvendo a adaptatividade do factor de aceleração α. Com base no software mencionado foram realizadas várias simulações para determinar as características da coluna, sendo que inicialmente foram feitas algumas considerações relativamente à coluna: Tem condensador total; Tem reebulidor do tipo kettle; A queda de pressão ao longo da coluna é de 0,01 bar; A % pureza aproximadamente de 96%; Opera próximo de 0,20 bar; O caudal de alimentação e a composição da corrente de alimentação são as que resultam do balanço mássico (secção 6.3.3); Marta Nunes 103 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima A composição do destilado e o respectivo caudal são impostos de forma a satisfazer os requisitos da unidade; A razão de refluxo foi igualmente imposta. Note-se que o design final foi obtido após a optimização relativamente a um conjunto de cenários simulados, em que se variou a razão de refluxo e o número de andares de equilíbrio. É de salientar que a coluna operará com condições bastantes rigorosas, que se prendem pelo facto de haver componentes a separar do ácido azelaico com volatilidades relativas próximas da sua. Isto é, a eficiência de separação do ácido azelaico relativamente a outros componentes é baixa (Douglas, 1998). Por outro lado, é de destacar que sendo o ponto de vaporização dos vários constituintes relativamente elevado, a temperatura de operação é elevada, podendo ser reduzida com o intuito de haver poupança económica ao nível dos custos energéticos, pelo uso de vácuo. Foi constatado, que enquanto o ácido malónico é facilmente separado, saindo na corrente de destilado, ácidos de grande cadeia saem como resíduo, formando potenciais impurezas do ácido azelaico. No entanto, a simulação de diferentes condições e arquitecturas para a coluna permitiu chegar a uma unidade capaz de satisfazer os requisitos de pureza do mercado (96%). Na Tabela 6-24 apresentam-se os parâmetros de dimensionamento da coluna de destilação CD-101. Tabela 6-24 – Características da coluna de destilação CD-101 Coluna destilação CD-101 F (ton/h) Nº pratos Andar da alimentação Talimentação (ᵒC) Palimentação (bar) Ptopo (bar) Queda pressão (bar) Taxa destilado (ton/h) Razão refluxo (mássica) Tipo condensador Tipo reebulidor Ttopo (ᵒC) Tbase (ᵒC) Qcondensador (kW) Qreebulidor (kW) 12,96 14 7 100 1 0,19 0,01 9,44 2 total kettle 185,49 291,71 -3699,72 4640,56 onde Talimentação é a temperatura de entrada da alimentação, Palimentação é a pressão da corrente de alimentação, Ptopo é a pressão no topo da coluna, Ttopo é a temperatura no topo da coluna, Tbase é a temperatura na base da coluna, Qcondensador é o calor que é necessário retirar no 104 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 condensador e Qreebulidor é calor que é necessário fornecer ao reebulidor. Note-se que a corrente de alimentação antes de entrar na coluna é passada num compressor, de onde sai a 0,20 bar. - Características mecânicas Após se ter calculado as características da coluna foi possível efectuar o seu dimensionamento mecânico, como se demonstra na Tabela 6-25. Os pratos escolhidos foram do tipo fluxo cruzado, por serem os mais utilizados, e mais concretamente pratos-peneiro (Coulson & Richardson, 1988). Tabela 6-25 – Dimensionamento mecânico da coluna de destilação CD-101 (Coulson & Richardson, 1988) Coluna destilação CD-101 Material coluna Material prato Espaçamento entre pratos (m) Espessura dos pratos (m) Altura da represa (m) ρv (kg/m3) ρL (kg/m3) QV (kg/s) L (kg/s) V (kg/s) FLV k1 uF (m/s) uV (m/s) Dc (m) Ae (m2) As (m2) Altura que vai desde a base até ao último prato (m) Altura que vai desde o topo até ao primeiro prato (m) Hcoluna (m) ecoluna (mm) Aço inoxidável Aço inoxidável 0,500 0,003 0,006 0,743 851,318 13,877 6,451 8,436 0,023 0,100 3,382 2,368 3,168 7,883 8,759 1,2 1,2 9,526 12,7 onde ρv é a massa volúmica do vapor, ρL é a massa volúmica do líquido, QV é o caudal mássico de vapor admissível, L é o caudal da corrente de líquido descendente acima do andar de alimentação, V é o caudal da corrente de vapor ascendente acima do andar de alimentação, FLV é o factor de caudal líquido-vapor, k1 é uma constante obtida a partir do figura 11.27 referido em (Coulson & Richardson, 1988), uF é a velocidade de inundação, uV é a velocidade Marta Nunes 105 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima de inundação do vapor, Dc é o diâmetro da coluna, Ae é a área efectiva, As é a área da secção transversal, Hcoluna é a altura da coluna e ecoluna é a espessura da parede da coluna. 6.5.4. Permutador de calor PC-101 Permutadores de calor são equipamentos utilizados na indústria para promoverem a transferência de calor entre dois fluidos. Os mais utilizados na indústria são os permutadores de carcaça e tubos, essencialmente pelas suas vantagens, nomeadamente, a grande área de superfície num pequeno volume, que oferece boa facilidade de fabrico e limpeza. O dimensionamento do permutador PC-101 foi feito por recurso ao software Aspen Engineering Suite 2006, mais concretamente ao módulo HTFS, sendo para tal necessário especificar as características das correntes de entrada e saída. Na Tabela 6-26 listam-se os parâmetros característicos do permutador de calor PC-101. Tabela 6-26 – Dimensionamento do permutador de calor PC-101 Permutador de calor PC-101 Diâmetro da carcaça (mm) Comprimento dos tubos requerido (mm) Comprimento dos tubos actual (mm) Diâmetro externo dos tubos (mm) Espessura da parede dos tubos (mm) Padrão dos tubos Queda de pressão (carcaça) (bar) Queda de pressão (tubos) (bar) Espaço de chicanas (mm) Nº chicanas Nº passagens no tubo Nº tubos Coeficiente transferência calor carcaça (W/m2K) Coeficiente transferência calor tubo (W/m2K) Coeficiente global transferência calor (W/m2K) Resistência total (W/K) 211,56 4626,2 4650 19,05 1,24 Triangular 0,034 0,029 215 20 1 47 982,8 1592,7 574,4 0,00174 6.5.5. Aglomerador A-101 - “flaker” O aglomerador (flaker) terá como papel promover a formação de flocos de ácido azelaico à custa da sua solidificação. Nesse processo é removido calor. Na Figura 6-10 ilustra-se genericamente uma unidade de aglomeração. 106 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Figura 6-10 –Flaker ( Proton Engineering Works, 2011) Um flaker de tambor rotativo consiste num tambor cilíndrico que é refrigerado internamente, neste caso por meio de água. Enquanto o cilindro gira, um filme líquido solidifica-se, adere à parte externa do tambor e é posteriormente removido da superfície por uma lâmina, na forma de flocos ou de filme, no caso do ácido azelaico será em flocos. Este equipamento operará de modo contínuo ( Sharpenn Technologies, 2011). Sabendo que o ponto de fusão do ácido azelaico se dá a 111ºC é necessário remover 2314153 kJ/h, o que equivale a 6,9 ton/h de água a entrar a 20ºC e a sair a 99ºC. 6.5.6. Gerador de ozono O sistema de geração de ozono será introduzido no presente trabalho de forma sucinta, devido à sua complexidade e ao facto de o seu dimensionamento ter de ser feito em colaboração com o fornecedor, no sentido de se adquirir uma solução capaz de preencher os requisitos em causa. Os dois princípios fundamentais usados na geração de ozono são luz UV e a descarga corona. A geração de ozono por descarga corona é mais comum e tem mais vantagens, como sejam a maior sustentabilidade da unidade, a maior produção de ozono e a maior rentabilidade em relação ao custo. O método baseado no uso de luz UV pode ser viável para a produção de pequenas quantidades de ozono (laboratórios, por exemplo). Assim prevê-se que na linha de produção de ácido azelaico, o equipamento funcionará por descarga corona. No processo do efeito corona, para além do gerador de ozono, são necessários outros equipamentos complementares, nomeadamente o precipitador electroestático, o condensador e o secador, para purificar o oxigénio que circula no sistema de modo a garantir uma geração de ozono eficiente. O electrofiltro visa eliminar pequenas partículas e gotículas que provenham das unidades de reacção e separação nas correntes recicladas. O condensador e o secador visam retirar do sistema alguma água que pode potencialmente reduzir a eficiência da produção de ozono a partir de O2. Marta Nunes 107 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima O gerador de ozono consiste basicamente num tubo (dieléctrico) no qual passa o oxigénio e onde uma descarga eléctrica constante (efeito corona), gerada através de um transformador nele existente, promove a reacção da molécula de oxigénio com um ião O- formando-se uma molécula de ozono. A Figura 6-11 representa o gerador de ozono com base em descarga eléctrica. Eléctrodo Fonte de alta voltagem Dieléctrico O2 Abertura de descarga Ozono Eléctrodo Figura 6-11 – Representação esquemática de um gerador por descarga corona, adaptado de (Lenntech, 2011) Factores importantes que influenciam a geração de ozono são a qualidade do oxigénio, nomeadamente a presença ou não de humidade e a sua pureza, parâmetros eléctricos e temperatura da água de arrefecimento. A geração de ozono é acompanhada pela formação de calor e por isso é necessário que o ozonizador seja arrefecido, no caso em estudo será por meio de água. A reacção do ozono é reversível, sendo favorecida pelo aumento da temperatura. Para limitar a decomposição do ozono, a temperatura na abertura de descarga não deve ser superior a 25 °C. Na Figura 6-12 apresenta-se um gerador de ozono de grande capacidade, 250 – 350 kg ozono/h. Para a linha de produção satisfazer as necessidades considera-se que serão necessárias cinco unidades similares a esta (Degrémont Technologies, 2011). Figura 6-12 – Gerador de ozono (Degrémont Technologies, 2011) 108 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.6. Análise económica A análise económica é um ponto fulcral na determinação da viabilidade de um projecto que requer investimento de um montante considerável. É um conjunto sistematizado de informação que vai permitir avaliar a viabilidade do projecto a priori. Mais uma vez se alerta para o facto de a análise levada a cabo no presente trabalho não ter veleidades de ser exaustiva e contabilizar todos os factores relevantes a ter em linha de conta. Antes, é seu objectivo, fornecer uma gama de custos associados aos aspectos mais relevantes, referentes à operação de uma linha de produção de ácido azelaico a partir de OAU. Na análise económica que se segue, foram utilizados preços constantes, quer do produto, quer da matéria-prima. A análise de performance estática visa sobretudo dar uma ideia da viabilidade do projecto no cenário actual. As métricas usadas para caracterizar economicamente a linha são estáticas, considerando-se concretamente que as decisões estratégicas associadas à unidade são estabelecidas no início do período de vida da mesma. A análise económica é baseada nos seguintes pressupostos: O projecto tem um tempo de vida de 20 anos; Tem um tempo associado às depreciações das instalações de 10 anos; No ano 1 a fábrica encontra-se em construção; No ano 2 a fábrica opera apenas a 50% da sua capacidade, sendo que no ano 3 e restantes, opera na capacidade máxima; Toda a produção é vendida; O capital circulante utilizado é 30% do capital requerido; O valor investido na fábrica no primeiro ano é de 70% do capital requerido e no segundo ano é de 30%; A taxa de rentabilidade é 8,51%. Para avaliar a viabilidade económica do projecto é necessário determinar o custo dos equipamentos e a sua instalação, assim como os custos de operação intrínsecos ao processo. Estes custos podem ser estimados com base em diferentes métodos, nomeadamente com base em dados de fornecedores, heurísticas baseadas em factores dimensionais característicos ou em dados de produção instalada em unidades concorrentes. As três estratégias serão usadas na presente análise. Por outo lado, é de realçar que a tónica foi posta na estimativa dos custos f.o.b. (free on board) das peças mais relevantes envolvidas no processo, a partir das quais se calculou uma estimativa do custo de instalação da unidade. Marta Nunes 109 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.6.1. Custos de instalação Para determinar o custo dos equipamentos recorreu-se ao software disponível online da McGraw-Hill e também a algumas heurísticas disponíveis na literatura (Walas, et al., 2010). Estas últimas foram utilizadas como base de comparação dos valores obtidos pelos simuladores e também para estimar o custo da torre de refrigeração. Uma vez que, os valores obtidos são em dólares dos Estados Unidos (USD) houve a necessidade de os converter para euros (€), utilizando a taxa de câmbio referente à média mensal de Outubro de 2011, em que 0,7296 € equivale a 1 USD ( Banco de Portugal, 2009). De referir ainda que os permutadores de calor foram determinados a partir do módulo HTFS do Aspen Engineering Suite 2006. O custo f.o.b. de cada equipamento apresenta-se na Tabela 6-27. Tabela 6-27 – Custo das peças de equipamentos mais relevantes Equipamento Custo (€) R-101 R-102 R-103 R-104 CD-101 PC-101 TA-101 TA-102 TA-103 TA-104 Torre refrigeração OZ-101 PE-101 S-101 C-101 A-101 206550 312998 312998 312998 86562 8926 76170 76170 68545 58656 239309 35020800 168346 72960 7296 1000000 Total 38029285 A unidade de produção para além dos equipamentos atrás mencionados envolve um conjunto de bombas. Apesar do seu custo estar envolvido no custo de equipamento geral, pelo facto de não ter sido feita uma análise muito detalhada à sua real necessidade, elas não foram englobadas no equipamento considerado mais relevante. Da Tabela 6-27 há que reter que o sistema de geração de ozono é a parcela mais relevante do custo do equipamento, o que decorre directamente da complexidade e inovação tecnológica associada a este tipo de sistemas, ainda hoje em dia. 110 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 6.6.2. Custos de operação Nesta secção pretende-se quantificar os custos que estão directamente relacionados com a produção de ácido azelaico, particularmente os referentes a termos que dependem do nível de produção, vulgarmente da classe dos custos variáveis. Ou seja, o custo referente às matériasprimas e ao consumo de utilidades. Utilidades O aquecimento e arrefecimento das correntes num processo industrial é essencial, para isso recorre-se a diversos equipamentos. No presente trabalho as utilidades consistem essencialmente em energia eléctrica e água, portanto o único equipamento necessário para satisfazer as necessidades é uma torre de refrigeração. Esta terá como objectivo refrigerar a água proveniente do arrefecimento dos reactores, dos permutadores de calor e do gerador de ozono. Matérias-primas Na linha de produção as matérias-primas para a produção de ácido azelaico são o óleo alimentar usado e o oxigénio. Como apresentado no Capítulo 2, o óleo terá um custo de recolha de 350 €/m3 e de tratamento de 2 €/m3, ou seja, tem um custo total de 352 €/m3. O oxigénio circulará num circuito fechado e portanto é necessário apenas introduzir uma quantidade de oxigénio continuamente. Este valor é a soma do oxigénio ozonizado gasto na etapa de absorção do ozono, correspondente a 1,32 ton/h (Tabela 6-2) e do oxigénio consumido e perdido na etapa de cisão e oxidação, correspondente a 0,76 ton/h (Tabela 6-3, Tabela 6-4 e Tabela 6-5) Isto dá origem a um consumo de 2,08 ton/h. O oxigénio tem um custo de 2412,7 €/ton (Remediation & Natural Attenuation Services, 1998). Na Tabela 6-28 lista-se o custo expectável anual das matérias-primas. Tabela 6-28 – Custo anual das matérias-primas Matéria-prima OAU Oxigénio Total Marta Nunes Necessidade (ton/ano) Custo anual (k€) 62008 16579 23724 39999 63723 111 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Custos com fornecimento de serviços externos Para além da matéria-prima, existem serviços que se tornam indispensáveis à produção de ácido azelaico, nomeadamente a água de arrefecimento e a electricidade que é requerida por todos os equipamentos. A água utilizada na linha de operação circulará em circuito fechado, admitindo que a necessidade de água fresca diária é de 10% relativamente à água circulante, para compensar eventuais perdas no sistema. Associado às necessidades de água fresca está ainda o custo de operação da torre de refrigeração. A tarifa da água considerada foi de 1,4141 €/m3 (EPAL, 2011). Na Tabela 6-29 encontram-se as necessidades anuais de água e o seu custo. Tabela 6-29 – Necessidade e custo anual da água Necessidade (m3/ano) Custo anual (€) 337415 477138 O custo de refrigerar a água na torre de refrigeração é 0,042 USD/m3 (Peters & Timmerhaus, 1991), sendo este valor referente ao ano de 1990, que actualizado para 2011 corresponde a 0,077 USD/m3. Anualmente é necessário refrigerar cerca de 2257057 m3 de água, sendo o seu custo de 126454 €. Na Tabela 6-30 encontra-se a estimativa das necessidades de electricidade e o seu custo anual. A tarifa de electricidade aplicada é referente à média das horas de ponta, cheias e vazio para longas utilizações, sendo o valor de 0,11 kWh (EDP, 2011). As estimativas das potências requeridas decorrem dos balanços térmicos apresentados na secção 6.4 e do dimensionamento (secção 6.5). Tabela 6-30 – Necessidade e custo anual de electricidade Equipamentos Necessidade (kW) Custo anual (€) R-101 R-102 R-103 R-104 A-101 OZ-101 PE-101 S-101 Iluminação Total 6,23 33,39 36,40 39,41 20 9000 10 20 2 9167 5480 29358 32004 34650 17582 7912080 8791 17582 1758 8059286 Total com margem de 20% 112 9671143 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 A partir da Tabela 6-30 verifica-se que energeticamente a unidade será muito exigente, destacando-se a unidade de geração de ozono. Reconhece-se que a potência energética requerida pelo gerador de ozono poderá potencialmente causar problemas de implementação da unidade de produção em causa. A energia requerida pela coluna de destilação CD-101 será fornecida por vapor de alta pressão, nomeadamente a 350ºC e a 4,5MPa. O custo do vapor é de 10,56 €/ton (IChemE Education Subject Group, 2002). A necessidade anual de vapor é de 43344 ton e o seu custo 457709 €. Matérias subsidiárias As matérias subsidiárias correspondem às embalagens usadas para embalagem e comercialização do produto final. Neste caso, considerou-se que a comercialização é feita em embalagens de 5 kg em média, com a forma de recipientes de polipropileno. O custo estimado para elas é 0,20 €/unidade. Isto traduz-se num custo total de 1041326 €. Custos de operação totais Os custos totais de operação apresentam-se na Tabela 6-31. Tabela 6-31 – Custos de operação Matérias/serviços Custo anual (€) Matéria-prima Serviços externos Refrigeração água Vapor alta pressão Matérias subsidiárias Total 63723329 10148281 126454 457708 1041326 75497099 Com base na análise da Tabela 6-31 consta-se que os custos de operação definem em grande medida a rentabilidade do projecto. Sem dúvida que o custo da água e da electricidade (serviços externos) constituem uma parcela fundamental para os custos da unidade de produção em causa. Como já referido, a unidade de geração de ozono é energeticamente muito exigente, reflectindo-se consideravelmente nos custos de operação. Marta Nunes 113 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.6.3. Vendas de ácido azelaico O preço de venda do ácido azelaico ficou estabelecido em 20 €/kg. Vários produtores praticam preços de venda superiores (City chemical, 2010; EBioChem, 2011). No entanto, assume-se um valor conservador. A razão prende-se com o facto de o ácido azelaico produzido nesta linha de operação ser proveniente de OAU e, portanto, de matéria-prima reutilizada. Para além de, eventualmente, ter uma pureza inferior, os preços praticados poderão ser também menores pela redução dos custos conseguida pela matéria-prima. Na Tabela 6-32 apresentam-se as vendas de ácido azelaico quando a linha de operação está a trabalhar na capacidade máxima (a partir do terceiro ano). Tabela 6-32 – Vendas de ácido azelaico Vendas Produção (ton/ano) Peso das embalagens (kg) Unidades produzidas Preço (€/unidade) Preço (€/ton) Vendas 26033 5 5206631 100 20000 520663092 Investimento de Capital Fixo Para a determinação do investimento de capital fixo a partir do custo do equipamento f.o.b. (estimado na Tabela 6-27) utilizou-se o método de Guthrie (Peters & Timmerhaus, 1991). Na Tabela 6-33 encontram-se os parâmetros que permitem calcular o factor correctivo . Tabela 6-33 – Parâmetros que permitem obter o factor correctivo Parâmetro Materiais para a instalação Overheads da construção Instalação de equipamentos Transporte, seguros e taxas 0,68 0,2 0,06 0,21 Despesas de engenharia contratada 0,21 Despesas gerais 0,25 Total 3,24 Assim, o valor do investimento de capital fixo é de 123 M€. Este valor é consideravelmente elevado, verifica-se mais uma vez a importância da unidade de geração de ozono. 114 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Taxa de actualização Para avaliar a viabilidade do projecto calcula-se a taxa de actualização (i), também designada de taxa mínima de rentabilidade do projecto. Esta taxa depende essencialmente de três parâmetros: taxa de juro nominal de uma aplicação sem risco (T1); prémio de risco (T2) que corresponde à taxa dependente da evolução económica, financeira, global e sectorial do projecto, assim como do montante total envolvido e da taxa de inflação (T3). A taxa de actualização (i) é calculada com base na Equação 6-5. (6-5) Na Tabela 6-34 apresentam-se os valores dos parâmetros envolvidos. Tabela 6-34 – Taxas aplicadas no projecto (Economia e Finanças, 2011; IG Markets, 2011) Taxas T1 (%) T2 (%) T3 (%) i (%) 4,25 7 2,8 8,51 A taxa de actualização determinada foi, assim, de 8,51%, sendo esta a taxa que um potencial investidor requer para investir no projecto. A Tabela 6-35 apresenta as considerações usadas para determinar a rentabilidade do projecto. Tabela 6-35 – Parâmetros obtidos para utilizar na demonstração de resultados Parâmetros Custo de capital (ICF) (€) Produção máxima (€/ano) Custo de equipamento (Cp) (€) Capital circulante (€) Capital Fixo (€) Valor investido no 1ºano (%) Valor investido no 2º ano (%) Capacidade de produção 1ºano (ton) Capacidade de produção 2ºano (ton) Capacidade de produção 3ºano e posteriores (ton) Taxa sobre o lucro (%) Taxa de actualização (i) Custos de operação (€/ano) Tempo de vida útil dos equipamentos (ano) Tempo de amortização dos equipamentos (anos) Marta Nunes 1,23E+08 2,60E+04 3,80E+07 3,69E+07 1,23E+08 70 30 0 1,30E+07 2,60E+07 34,5 8,51 7,55E+07 20 10 115 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Depreciação A depreciação expressa a perda de valor que os imóveis utilizados no decorrer da actividade empresarial sofrem ao longo do tempo, em resultado do desgaste ou perda de utilidade. Para determinar a depreciação teve-se em conta o método do balanço com dupla descida em que o valor é depreciado anualmente ao longo de 10 anos, período considerado como sendo o de amortização do equipamento. A depreciação, segundo esta metodologia, determina-se com base na seguinte expressão: (6-6) onde é a depreciação pelo método do balanço com dupla descida, é o investimento do capital fixo, é o somatório da depreciação dos anos anteriores e n o tempo de depreciação dos equipamentos. Na Tabela 6-36 estão apresentados os fluxos financeiros do projecto obtidos a partir das tabelas anteriores. O capital requerido diz respeito à quantidade mínima requerida para financiar a construção da linha de produção, tendo em conta neste caso, apenas os custos de capital. O taxado é o valor do lucro ao qual se retira a depreciação. A taxa paga é o valor do taxado ao qual se impõe a taxa sobre o lucro das empresas praticada em Portugal (34,5%). O cash-flow é a medida de rentabilidade do projecto. Os registos relevantes para a medida do cash-flow são as receitas e as despesas efectivas em numerário. Partindo do valor do cashflow actualizado de cada ano foi possível estimar o cash-flow actualizado e acumulado, essencial para averiguar a rentabilidade do projecto, com base em métricas de performance estática. 116 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Tabela 6-36 – Mapa de demonstração de resultados Ano 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 Capital Requerido Vendas (€) Custo de Operaçao (€) Lucros (€) 8,62E+07 7,39E+07 0 2,60E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 5,21E+08 0 3,77E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 7,55E+07 0 2,23E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 -3,69E+07 Marta Nunes Depreciação (€) 2,46E+07 1,97E+07 1,58E+07 1,26E+07 1,01E+07 8,07E+06 6,46E+06 5,17E+06 4,13E+06 Taxados (€) Taxa paga (€) Cash-flow (€) Cash-flow actualizado (€) Cash-flow actual acumulado (NPV) (€) 0 1,98E+08 4,01E+08 3,85E+08 3,72E+08 3,62E+08 3,54E+08 3,48E+08 3,43E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 4,45E+08 0 6,83E+07 1,38E+08 1,33E+08 1,28E+08 1,25E+08 1,22E+08 1,20E+08 1,18E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 1,54E+08 -8,62E+07 4,27E+07 2,31E+08 2,37E+08 2,41E+08 2,45E+08 2,47E+08 2,50E+08 2,51E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,16E+08 2,53E+08 -7,94E+07 3,62E+07 1,81E+08 1,71E+08 1,60E+08 1,50E+08 1,40E+08 1,30E+08 1,21E+08 9,55E+07 8,80E+07 8,11E+07 7,47E+07 6,89E+07 6,35E+07 5,85E+07 5,39E+07 4,97E+07 4,58E+07 4,94E+07 -7,94E+07 -4,32E+07 1,38E+08 3,09E+08 4,69E+08 6,19E+08 7,59E+08 8,89E+08 1,01E+09 1,10E+09 1,19E+09 1,27E+09 1,35E+09 1,42E+09 1,48E+09 1,54E+09 1,59E+09 1,64E+09 1,69E+09 1,74E+09 117 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima 6.6.4. Métricas de performance financeira A rentabilidade dos projectos de investimento é normalmente avaliada através de critérios que permitem decidir se esse projecto deve ou não ser implementado. Os critérios de avaliação de projectos mais usuais são: VAL – Valor Actualizado Líquido; TIR – Taxa Interna de Rentabilidade; PRI – Período de Recuperação do Investimento e IR – Índice de Rentabilidade. Valor Actualizado Líquido (VAL) O VAL avalia investimentos através da comparação entre os Cash-flows gerados por um projecto e o capital investido e é dado pela expressão: (6-7) em que, é o Cash-flow do ano t, n é o tempo de vida da fábrica, i a taxa de actualização. Para o projecto em questão obteve-se um VAL de 933.394.467 €. Taxa Interna de Rentabilidade (TIR) A TIR de um projecto que necessita de investimento é a taxa de actualização que anula o valor actual líquido ao fim do tempo de vida da unidade. Pode dizer-se que a taxa interna de rentabilidade é a taxa mais elevada a que o investidor pode contrair um empréstimo para financiar um investimento sem perdas. (6-8) Em termos de decisão, considera-se que se a TIR < Taxa de actualização, VAL < 0, o projecto não é atractivo, se a TIR > Taxa de actualização, VAL > 0, o projecto é atractivo e se a TIR = Taxa de actualização, VAL = 0, o projecto não gerará lucro nem perda considerável. A taxa interna de rentabilidade do projecto em questão é de 123% e, sendo, a taxa de actualização de 8,51%, verifica-se que o projecto é aceitável e economicamente viável. 118 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Período de Recuperação do Investimento (PRI) O PRI (ou payback period) é o tempo necessário para a recuperação do capital investido tendo como base os cash-flows actualizados e acumulados. Trata-se do período de tempo a partir do qual o cash-flow actualizado e acumulado passa de negativo a positivo. Assim, quanto maior o valor do PRI, maior é o risco do projecto. Cash-flow actualizado acumulado (M€) Na Figura 6-13 apresenta-se uma representação do Cash-Flow actualizado acumulado em função do tempo de vida do projecto (20 anos). E evidente que o período de recuperação do investimento é de 2,2 anos. 2,00E+03 1,50E+03 1,00E+03 5,00E+02 0,00E+00 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 -5,00E+02 -1,00E+03 Tempo (anos) Figura 6-13 – Cash-flow actualizado ao longo do tempo de vida do projecto Índice de Rentabilidade (IR) O índice de rentabilidade ou retorno do investimento (Return of Investement) é a medida da rentabilidade efectiva do projecto por unidade de capital investido e é determinado pela seguinte expressão: (6-9) onde I é o investimento. Em termos de decisão, se , o valor actual líquido do projecto é nulo, se , o valor actual líquido é superior a zero e, logo, o projecto é rentável e se , o valor actual líquido do projecto é negativo, o que indica que este não é rentável. Marta Nunes 119 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima Para o projecto em causa obteve-se um valor de IR igual a 14, o que indicia que o projecto é rentável. Deste modo, verifica-se que o projecto de produção de ácido azelaico é um processo rentável e economicamente viável, tendo um período de recuperação do investimento de apenas 2,2 anos. Os restantes indicadores financeiros confirmaram também esta ideia. Contudo, há que ter em conta que no presente trabalho não foram contabilizadas todas as parcelas dos custos de equipamentos, somente os mais importantes. Exemplo disso, é a existência de bombas na unidade de produção que têm um custo de aquisição e também de operação que pode ser considerável. A massa salarial dos funcionários da unidade de produção, o edifício e terreno também não foram tidos em conta. Apesar destes custos não serem contabilizados verifica-se que o processo em causa é energeticamente intensivo e, de facto, será o consumo energético ou de um modo geral os custos de operação que definirão a rentabilidade do projecto. De qualquer forma, a estrutura de custos indicia que são os custos de operação, particularmente os que estão associados à energia, que contribuem em grande parte para a viabilidade económica. É de salientar a importância da unidade de geração de ozono. Por outro lado, é por demais evidente que uma integração do processo optimizada poderá minimizar os custos energéticos. Outra consideração relevante nesta análise é a de que a procura permite consumir todo o produto processado, que este tem uma qualidade estável, passível de lhe conferir um valor de mercado de 20 €/kg. 6.6.5. Análise de sensibilidade da performance económica A análise de sensibilidade da performance económica tem como principal objectivo o estudo da influência da alteração das variáveis mais relevantes na viabilidade do projecto. Desta forma, a análise de sensibilidade permite traçar vários cenários de análise e verificar se a viabilidade do projecto se mantém face às alterações nas suas variáveis mais relevantes. As variáveis a ter em conta, neste caso, são o custo da matéria-prima e do produto. Na Figura 6-14 representa-se a análise de sensibilidade referente ao preço de venda do produto final. 120 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 Cash-flow actualizado acumulado (M€) 5000 4000 3000 2000 1000 0 0 10 20 -1000 30 40 50 Custo produto (€/kg) Figura 6-14 – Cash-flow actualizado em função do preço de venda do produto A partir da análise da Figura 6-14 verifica-se que o preço limite de venda do ácido azelaico é de 7,4 €/kg, valor a partir do qual o projecto deixa de ser rentável. Ora, o preço de venda considerado no projecto em estudo é de 20 €/kg, verificando-se que existe uma margem importante entre o valor limite e o preço praticado, não esquecendo que este valor (20 €/kg) é já bastante inferior à média do preço de outras unidades concorrentes. Na Figura 6-15 representa-se a análise de sensibilidade relativamente ao preço de aquisição da matéria-prima, neste caso apenas se considerou o OAU. Cash-flow actualizado acumulado (M€) 2500,00 2000,00 1500,00 1000,00 500,00 0,00 -500,00 0 1000 2000 3000 4000 5000 -1000,00 -1500,00 -2000,00 Custo matéria-prima (€/m3) Figura 6-15 - Cash-flow actualizado em função do preço da matéria-prima (OAU) Marta Nunes 121 Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima A partir da análise da Figura 6-15 verifica-se que o preço limite a partir do qual o projecto deixa de ser rentável é de aproximadamente 2268 €/m3. Este valor é em larga medida superior ao considerado no projecto. Após a caracterização de toda a unidade de produção de ácido azelaico verifica-se que esta é bastante exigente, principalmente ao nível energético, colocando questões do ponto de vista da implementação industrial. Deste modo, poder-se-á pensar nesta linha de produção a uma escala menor. De facto, tendo em conta a importância dos ozonizadores perspectiva-se que a redução da capacidade da unidade poderá permitir menos unidades de ozonização. Ora, isto, terá um impacto realmente importante quer nos custos de instalação, quer particularmente na potência eléctrica necessária, uma vez que se tratam de unidades de necessidades muitos relevantes. O projecto apresentado neste trabalho está desenvolvido para a capacidade máxima de produção de ácido azelaico a partir de OAU potencialmente disponíveis em Portugal. Contudo, sabe-se que, por agora, é difícil recolher todos os OAU produzidos e, portanto, a quantidade de OAU disponível como matéria-prima é também menor. A unidade para tratamento de uma produção inferior à apresentada, é uma solução, uma vez que os custos de operação diminuiriam e o processo seria mais fácil de controlar, continuando a ser economicamente viável. A Figura 6-16 ilustra esse facto. A análise de Break-Even demonstra o valor a partir do qual o projecto deixa de gerar lucros, designado por ponto crítico (Porfírio, et al., 2004). Esta análise permite, assim, avaliar a flexibilidade de um projecto face à incerteza do mercado (Porfírio, et al., 2004). Apesar do resultado da análise em causa, ela dará apenas uma ideia do valor de produção anual de ácido azelaico a partir do qual se gera lucro, devido ao facto de no processo existir um equipamento que é dependente da produção, o gerador de ozono, influenciando assim os custos fixos. A capacidade desta unidade é discretamente variável, tal como os custos de operação a ela associados. Para a representação da Figura 6-16 considerou-se o custo fixo como sendo igual à amortização, ou seja, 10% do ICF, que o custo variável é proporcional às quantidades produzidas e que o preço de vendas não sofre alterações com a capacidade de produção. 122 Valor (€) Ácido Azelaico – Uso de OAU como matéria-prima CAPÍTULO 6 1,00E+08 9,00E+07 8,00E+07 7,00E+07 6,00E+07 5,00E+07 4,00E+07 3,00E+07 2,00E+07 1,00E+07 0,00E+00 0 1000 2000 3000 4000 5000 Produção (ton/ano) Custos fixos Custos variáveis Custos fixos + custos variáveis Vendas Figura 6-16 – Representação do ponto crítico de vendas A Figura 6-16, mesmo tendo por base uma análise linear simplista e desprezando o carácter discreto dos custos fixos e variáveis, permite confirmar que o projecto de produção de ácido azelaico a partir de OAU é economicamente viável para produções inferiores. O ponto a partir do qual o projecto deixa de gerar lucro é 616 ton/ano, sendo este valor bastante inferior ao considerado neste estudo (26000 ton/ano). Assim, valores acima do ponto crítico podem ser considerados para a linha de produção em causa e, tendo em conta que é substancialmente inferior ao projectado poderá tornar a implementação da unidade mais fácil, principalmente ao nível energético. Marta Nunes 123 CAPÍTILO 7 7. CONCLUSÕES GERAIS E TRABALHOS FUTUROS A valorização dos OAU apresenta-se como uma solução que permite uma gestão ambiental com benefícios sociais e económicos. Em Portugal, o consumo de óleos alimentares é, em termos europeus, elevado, e como tal há geração de uma grande quantidade de resíduos, que provoca impactes ambientais negativos quando não são devidamente encaminhados. Os OAU, pelas suas propriedades, tornam-se interessantes resíduos para valorização e a sua recolha é, neste momento, um factor crucial para a exploração das suas potencialidades. Espera-se que a criação de normas que visam a recolha, tratamento e valorização dos OAU e o envolvimento de todos os intervenientes no seu ciclo de vida possam contribuir para uma gestão integrada deste resíduo (Decreto-Lei n.º 267/2009 de 29 de Setembro, 2009). No presente trabalho, foram analisadas diversas vias tecnológicas passíveis de implementação por forma a valorizar os OAU. Apesar de se assumir que este é um estudo preliminar e que a sua industrialização requer ainda bastante mais conhecimento, das alternativas existentes, uma delas é a produção de biogás por via anaeróbia. Esta via tem como objectivo melhorar a performance dos digestores anaeróbios, permitindo um aumento do rendimento da produção de biogás através da co-digestão dos óleos com outros substratos. Actualmente existe um interesse crescente em fontes alternativas de energia como resultado do aumento da procura, do aumento do custo dos combustíveis disponíveis e da necessidade de valorizar bioresíduos em alternativa à sua deposição em aterros. A legislação actual (Directiva 2009/28/CE) reconhece o seu potencial, prevendo a sua implementação, tanto na gestão integrada de resíduos, como na produção de energia, pois em 2020 pretende-se atingir os 150 MW. Porém, reconhece-se que esta via permite escoar apenas uma fracção dos OAU, em virtude da quantidade passível de adicionar aos digestores anaeróbios existentes ser relativamente pequena. Outra possibilidade de valorização dos OAU é a sua incorporação em pesticidas. Os OAU seriam integrados como adjuvantes e/ou solventes. Neste campo, desconhece-se fontes bibliográficas reportando o seu uso, mas a integração de óleos vegetais é já conhecida e, portanto, espera-se que os OAU após pré-tratamento tenham papéis próximos. A fracção de óleos que se incorpora nos pesticidas é baixa, entre 0,05% e 0,5%, o que significa que esta alternativa teria apenas potencial para integrar uma pequena fracção do OAU recolhido. Contudo, permitiria a substituição dos óleos virgens, bem como a valorização de um resíduo. No quadro da análise da viabilidade desta alternativa foram realizados ensaios preliminares. Isto é, foi ainda analisada a integração de OAU como adjuvante em ensaios de teste de performance de um agente biocida. Nos primeiros testes efectuados verificou-se que a presença de óleo tem influência significativa na taxa de mortalidade, principalmente nas Marta Nunes 125 Conclusões Gerais e Trabalhos Futuros primeiras 48 horas, potenciando a acção do agente biocida. Observou-se ainda que, através da realização dos testes dose-resposta, o óleo tem maior influência para baixas gamas de mortalidade e portanto, neste caso, para concentrações de polyDADMAC baixas. Assim, verificou-se que concentrações maiores de óleo (gama de 100 mg/L) poderão potenciar um incremento da acção biocida. Outro método de valorização dos OAU explorado neste trabalho foi a sua utilização como matéria-prima para a produção de oleoquímicos. Foi dado especial destaque à produção de ácido azelaico, que no âmbito deste trabalho constitui a via tecnológica que melhor se adequa ao problema do resíduo em causa, pois perspectiva o seu consumo integral. A sua valorização em ácido azelaico constitui uma mais-valia, tanto ambiental como económica. Uma unidade de produção baseada num processo de oxidação por ozono foi projectada para 26000 toneladas anuais de ácido azelaico, implica um investimento de capital de 123 M€ e custos de operação na ordem dos 75,5 M€/ano. Esta capacidade está em sintonia com o potencial de recolha no país. O projecto tem um VAL de 933 M€ com um período de recuperação do investimento de 2,2 anos. Verificou-se que o projecto é economicamente viável, mas de facto do ponto de vista da implementação é mais atractivo para uma escala de produção menor, devido à exigência energética do processo. Foi ainda referida a utilização de OAU para a produção de ração animal, sabão e biodiesel. Estes métodos de valorização já se encontram implementadas em Portugal e, por isso foram aqui tratados com menor relevância. Ainda que não fizesse parte dos objectivos principais desta dissertação, a produção de biodiesel a partir de OAU, foi explorada de modo simplificado. Tendo em conta a quantidade de OAU que actualmente não está a ser recolhida, considerou-se a possibilidade de integrar parte dessa fracção em unidades de produção de biodiesel já existentes a partir de óleos virgens. Esta abordagem foi feita com o intuito de analisar o impacto económico que a utilização de OAU poderia trazer caso se substituísse parte dos óleos virgens por OAU. Deste modo, os custos considerados para esta estrutura foram os de recolha e de pré-tratamento dos OAU, tendo-se obtido uma diminuição nos custos da matéria-prima em cerca de 52%. É de salientar que o pré-tratamento dos OAU terá que ser efectuado sempre, independentemente da via tecnológica a seguir, para a remoção de sólidos e água. O pré-tratamento tem associados custos de operação no valor de 11862005 €/ano, correspondendo este valor a aproximadamente 2 €/m3. O trabalho subjacente a esta tese deixou em aberto várias questões que merecem ser abordadas em estudos futuros. Seria interessante dar continuidade ao estudo da potencialidade dos OAU como adjuvantes a incorporar em agentes biocidas, nomeadamente pela avaliação da selectividade do óleo perante outros organismos, assim como o estudo das quantidades de óleo adicionadas a partir da qual possam ser consideradas poluentes para os cursos de água. 126 Conclusões Gerais e Trabalhos Futuros CAPÍTULO 7 Do ponto de vista da produção de ácido azelaico, poder-se-ia fazer o estudo de uma unidade industrial para uma capacidade de OAU menor e verificar/confirmar a viabilidade económica do projecto. A área de oleoquímicos é muito vasta, e por isso os OAU têm nesse campo várias aplicações que poderão ser estudadas, sendo a síntese de compostos por conversão microbiana também de grande interesse. Marta Nunes 127 CAPÍTILO 8 8. REFERÊNCIAS Alves, M. et al., 2009. Waste lipidis to energy: how to optimize methane production grom long-chain acids (LCFA) - minireview. Microbial biotechnology, Volume 5, pp. 538-550. 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