Encontro Nacional de Pesquisa em Comunicação e Imagem - ENCOI
24 e 25 de novembro de 2014 • Londrina, PR
“Luíza está no Canadá”: a construção imagética das celebridades da web como
resultado das manifestações em rede1
Deborah Susane Sampaio Sousa2
Resumo: A pesquisa analisa as condições em que se desenvolvem os fenômenos
midiáticos virais na internet capazes de construir prodígios, como as celebridades
virtuais, a partir do compartilhamento de imagens pelos usuários das redes sociais
online. Tomando o fenômeno “Luíza está no Canadá” como estudo de caso – referente a
uma jovem que ensejou o primeiro viral do ano de 2012 no Brasil –, o trabalho aborda
como se dão os efeitos em cadeia na internet a partir da replicação das imagens no meio.
Para tanto, perpassa pela definição de redes sociais proposta por Raquel Recuero, ainda
pela discussão acerca da cultura participativa, de Henry Jenkins. Também faz um
levantamento das figuras dos memes, a partir de Richard Dawkins, as quais ocorrem
insistentemente na web, destacando-se e se tornando pauta na mídia e nos públicos.
Palavras-chave: Internet. Celebridades virtuais. Cultura participativa. Memes.
Abstract: The research examines the conditions in which they develop viral media
phenomena on the Internet can build wonders how virtual celebrities from the image
sharing by users of online social networks. Taking the phenomenon "Luiza is in
Canada" as a case study – concerning a young man which caused the first virus of the
year 2012 in Brazil –, the paper addresses how to provide the effects chain on the
internet from the replication of images in medium. For both, embraced by the definition
of social networks proposed by Raquel Recuero, yet the discussion of participatory
culture, Henry Jenkins. Also makes a survey of the figures of memes, from Richard
Dawkins, which occur repeatedly in the web, highlighting and making agenda in the
media and public.
Keywords: Internet. Virtual celebrities. Participatory culture . Memes.
Introdução
Luíza Rabello, uma jovem brasileira, de 17 anos, que, participando de
intercâmbio estudantil no Canadá, em janeiro de 2012, tornou-se o primeiro viral do ano
no Brasil, tendo eclodido de forma absolutamente inusitada na internet e na mídia
nacional. O fenômeno diz respeito a um vídeo que rapidamente circulou nas redes
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Trabalho apresentado no GT 5- Comunicação nas Interfaces Digitais, do Encontro Nacional de Pesquisa
em Comunicação e Imagem - ENCOI.
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Mestranda em Comunicação e Linguagens pela Universidade Tuiuti do Paraná (UTP), participante do
grupo de pesquisa Interações Comunicacionais, Imagens e Culturas Digitais do PPGCOM/UTP, jornalista
do Instituto Federal do Ceará, e-mail: [email protected]
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sociais, rendendo à adolescente grande fama, em função da mobilização midiática
gerada no twitter, sendo estendida ao facebook. O nome de Luíza estampou manchetes
de grandes veículos de comunicação, em decorrência de uma mensagem publicitária
protagonizada por seu pai, com o propósito de pôr à venda um empreendimento
imobiliário na cidade João Pessoa-PE.
Dado o fenômeno, observa-se que no novo contexto de comunicação,
com a modernização dos meios, não há autores nem espectadores atuando unilateral ou
independentemente. Todos dependem de todos para serem vistos, recebidos e
replicados. Entre em vigor, na verdade, uma comunicação multilateralizada, em que os
conceitos de emissores e receptores se entrelaçam. Se a origem da informação parte dos
meios convencionais para a “massa”, também a massa origina as discussões
compartilhadas, agora fortemente por meio das mídias sociais, as quais ensejam grandes
destaques na mídia tradicional. Foi o que ocorreu com o episódio em apreço neste
artigo, uma vez que os sujeitos sociais emergiram como grandes responsáveis pela
insurgência da cobertura midiática na história da jovem Luíza.
Partindo disso, a pesquisa analisar o case como produto midiático não
planejado, resultante da replicação em rede das imagens referentes aos vídeos por
usuários das mídias sociais. O episódio, que gerou repercussão emblemática nos
veículos noticiosos do Brasil, suscitou a ideia de estudar os fatores em que se
desenvolvem os fenômenos midiáticos virais na internet, construindo verdadeiros
prodígios, intituladas aqui de celebridades virtuais, a partir do compartilhamento de
imagens pelos usuários das redes sociais online. Assim, a pesquisa retrata o caminho da
informação “do povo para a mídia” analisando a força desses novos meios
comunicacionais como fontes “informais”, alheios à indústria noticiosa tradicional,
transformando ainda os internautas em “pauteiros” das redações, estas que por sua vez
extraem das linguagens e movimentações sociais os novos “furos” de reportagem.
A formação de redes na era da conexão
A comunicação humana faz parte da trajetória do homem desde os
primórdios, sendo vetor responsável pelo desenvolvimento social, passando pela
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complexidade dos discursos entre os sujeitos – por meio do compartilhamento direto dos
saberes – e até pela própria aplicação do silêncio – resultante da inércia de manifestação
expressa na relação entre eles. De toda forma, a comunicação entre os homens abrange a
ideia de interação, promovendo algum tipo de linguagem e de reação perceptiva sobre ações
ou omissões entre os envolvidos, de modo que a origem dela tem a ver com a necessidade
de transferência de sentidos, inclusive, a partir da interpretação dos signos.
Assim, o conceito de comunicação não se exaure, portanto, no diálogo
interpessoal efetivamente, sob a ótica simplista da existência da confabulação imediata
entre dois sujeitos. Por comunicação, tem-se que as mais variadas formas simbólicas
produzidas, quais sejam a verbal, a não verbal, a corporal, a presencial ou mesmo a
mediada, tendo ela, por excelência, uma múltipla possibilidade de ser exercida. É nesse
sentido que se percebe a comunicação humana como um meio de divagar por símbolos,
compreensões e interlocuções sociais de repercussões emblemáticas, através de uma
complexa rede de práticas que permitem a construção das interações entre os sujeitos
sociais, incluindo as imagens midiatizadas no contexto atual.
Desse modo, a pesquisa justifica o interesse por navegar nesse universo, a
partir da ideia de que a comunicação não se restringe nem mesmo a determinadas
comunidades ou a determinados modos de comungar práticas rotineiras. Para além dessa
concepção, sugerida pela junção dos termos “comum” mais “ação”, estamos diante de
situações que extrapolam a aproximação efetiva dos seres humanos para sua existência.
Portanto, a comunicação tende a ser tão ampla quanto é o seu poder de disseminação,
especialmente com o advento da internet, a qual tem favorecido um verdadeiro predomínio
de conexão permanente entre os sujeitos em formato de redes de interação, segundo
corrobora Castells (1999) quando fala conclusivamente sobre seus estudos das estruturas
sociais emergentes:
(...) como tendência histórica, as funções e os processos dominantes na era da
informação estão cada vez mais organizados em torno de redes. Redes
constituem a nova morfologia social de nossas sociedades, e a difusão da
lógica de redes modifica de forma substancial a operação e os resultados dos
processos produtivos e de experiência, poder e cultura. (CASTELLS, 1999,
p. 497)
Afastando-se da vertente do determinismo tecnológico, mas admitindo a
existência de mudanças no contexto social em função do uso dos meios de comunicação
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em rede, pode-se aferir que o advento da internet viabilizou mudanças para a sociedade
no que diz respeito às formas de sociabilidade e de exercício das funções diárias, em
especial,
aquelas
desenvolvidas
no
âmbito
do
trabalho
e
das
finanças.
Significativamente, o avanço da popularização da grande rede mundial de computadores
trouxe também uma acentuada interação online entre os sujeitos dada a comunicação
integrada a qualquer lugar e a qualquer tempo, como apregoa Lemos (2004), quando
menciona o conceito da conexão permanente no mundo moderno.
Segundo o autor, são todas essas características da nova sociedade que
fazem a estrutura vigente ser identificada por uma “cultura da conexão”, ou seja, a partir
da presença dos sujeitos em uma dinâmica que permite “estar” em vários lugares ao
mesmo tempo (nesse sentido, dada a impossibilidade da onipresença física, o termo
implica um modo de pertencer e de experimentar os espaços de forma ampla). Isso tudo
favorecido pela disseminação de meios de conexão nos mais diversos locais, a citar as
linhas de rede sem fio wireless e wifi dispostas nas residências, nos estabelecimento e,
inclusive, em diversos espaços públicos das cidades.
Dessa forma, a era da informação passa a ser qualificada como um
ambiente de convergência tecnológica, mediante a informatização intensa da sociedade,
que, segundo Lemos (2004, online) “passa hoje por uma nova fase, a dos computadores
coletivos móveis, que chamaremos aqui de „era da conexão‟”. Lemos (2004) apreende
que a fase inicial desse processo – a qual envolvia o mero acesso às redes – está
superada, sendo essa condição atinente apenas ao início da geração informatizada. No
século XXI, portanto, vive-se a “era da conexão” que não se caracteriza mais apenas
pela “expansão dos contatos sobre forma de relação telemática” (LEMOS, 2004,
online), uma vez que isso representaria apenas o primórdio da internet (com os
computadores coletivos).
Trata-se de transformações nas práticas sociais, na vivência do espaço urbano
e na forma de produzir e consumir informação. A cibercultura (...) solta as
amarras e desenvolve-se de forma onipresente, fazendo com que não seja
mais o usuário que se desloque até a rede, mas a rede que passa a envolver os
usuários e os objetos numa conexão generalizada. (LEMOS, 2004, online)
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O mundo se insere, portanto, na fase dos “computadores coletivos móveis”
(LEMOS, 2004, online), sendo o fato justificado pelos sinais de rede espalhados nas
cidades, nas ruas, nas lojas, nos aparelhos celulares. Diante disso tudo, a internet e suas
possibilidades configuram-se como a inserção da internet na sociabilidade dos sujeitos uma
extraordinária aventura humana, segundo fortalece Castells (2004). O surgimento da
internet deu margem a uma comunicação livre, uma vez que possibilita a qualquer sujeito
inserido no meio tanto o acesso às informações disseminadas como à replicação delas por
meio das ferramentas disponibilizadas. A expansão desse sistema de redes – que passou de
locais e regionais para o mundo – viabilizou essa conexão global que, de linhas telefônicas
acopladas a computadores providos de modens, modernizou-se a ponto de ser exercida
pelos aparelhos portáteis com acesso sem fio.
É diante disso que Lemos (2004) defende ainda que o século XXI chega
marcado pela experimentação dos computadores coletivos móveis, estabelecendo o que
chama de era da conexão representada por “transformações nas práticas sociais, na vivência
do espaço urbano e na forma de produzir e consumir informação” (LEMOS, 2004, online).
Isso porque a onipresença não é dos sujeitos, mas das redes, pois não são eles que buscam
mais a conexão. Pelo contrário, é esta que “passa a envolver os usuários e os objetos numa
conexão generalizada”, a partir das novas tecnologias nômades proporcionadas, por
exemplo, pelos laptops, palms e celulares, colocando as “máquinas e objetos
computacionais imersos no quotidiano de forma onipresente” (LEMOS, 2004, online).
Essas aglomerações permanentes de sujeitos favorecidas pelos usos de novas
tecnologias conectadas à internet são vistas por Recuero (2014) como “redes” de interação
na web, em especial, proporcionadas pelas mídias sociais. Assim, a autora destaca que os
sujeitos unidos a esses agrupamentos exalam suas expressividades estabelecendo entre si
uma interlocução por meio das afinidades, replicando e divulgando conteúdos, formando
ainda o que ela identifica como “redes sociais”. Diante disso, resta nítida a expressividade
da comunicação mediada por computador, a qual representa uma influência nos fluxos em
rede dos formatos participativos de transmissão de informações.
Para a autora, “essa comunicação, mais do que permitir aos indivíduos
comunicar-se, amplificou a capacidade de conexão, permitindo que redes fossem criadas e
expressas nesses espaços: as redes sociais mediadas pelo computador” (RECUERO, 2014,
p. 17). Assim, ela define essas redes como espaços de representação utilizados pelos
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usuários da internet em “nós” (ou nodos) que os envolvem formando perfis de atuação – a
exemplo do twitter e do facebook – pelo que são identificados através de imagens e
símbolos que constroem suas silhuetas identitárias online.
Participação na produção dos objetos midiáticos
Dados os formatos de interação a partir das redes, é interessante observar
“quem informa quem” na recente plataforma de comunicação midiática, sedimentada
pelos novos meios surgidos da evolução da internet e fortalecidos pelas mídias sociais.
Do ponto de vista dos estudos sobre as mídias tradicionais – as identificadas como mass
medias – haveria duas instâncias bem definidas de entes nos processos
comunicacionais. Seriam eles os “produtores” e os “consumidores” de mídia. Ocorre
que, para compreender as mobilizações e o envolvimento dos sujeitos sociais no
contexto atual, é preciso verificar como esses sujeitos de apresentam a partir das
mudanças sociais e dos estudos da nova sociedade, agora inserida em redes online.
Para tanto, há que se compreender o mundo atual como sendo um espaço
das ideias, das informações instantâneas. Ou seja, sendo passa a ser um ambiente cuja
liberdade de expressão tem sido levada ao extremo, não estando mais engessada aos
moldes tradicionais dos fluxos de informação propostos pelos mass media. Neste
formato, haveria uma minoria determinando o direcionamento e o modo de propagação
das informações para a suposta “massa”. Entretanto, essa coletividade tem hoje se
representado de forma mais relevante, tendo em vista as expressões fortemente
disseminadas nas redes sociais.
A web tem sido um meio de manifestação democrática dos sentimentos,
das ideologias, dos anseios e dos desejos dos mais diversos segmentos, de forma que as
blindagens impostas pelos mas media já são superadas por aqueles que se utilizam da
rede para exprimir seus pronunciamentos, os quais, por vezes, alcançam visibilidade
extrema. Nesse contexto, os sujeitos passam a construir objetos midiáticos a partir de
suas expressões e, uma vez que os instala nesse ambiente virtual – sobre aquilo que é
curioso, incomum ou vistoso – acabam obtendo grande repercussão com as replicações
e os compartilhamentos em cadeia pelos demais usuários da rede.
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É exatamente essa nova condição da comunicação em rede a responsável
pela construção social e pelas formações simbólicas inseridas na cultural atual. Às
novas mídias credita-se o surgimento de uma maior abrangência das interações
introduzindo aquelas online e, portanto, grandes possibilidades de repercussão dos fatos
de forma célere e global. Portanto, os produtores modernos de conteúdos e feitos
midiáticos – que são os usuários da rede segundo definição de Jenkins (2009) – passam
a estar revestidos de potenciais catalisadores desses fenômenos a partir de suas
contribuições em rede. Isso significa que os anônimos provindos das redes sociais – ou
seja, sujeitos alheios às indústrias de mídia – já não são mais inertes, estando em uma
cultura participativa de feitos simbólicos.
A expressão cultura participativa contrasta com noções mais antigas sobre a
passividade dos espectadores dos meios de comunicação. Em vez de falar de
produtores e consumidores de mídia como ocupantes de papéis separados,
podemos agora considerá-los como participantes interagindo de acordo com
um novo conjunto de regras, que nenhum de nós entende por completo.
(JENKINS, 2009, p. 30, grifo original)
Para Jenkins (2009), o mundo está inserido dentro de uma cultura voltada
para a convergência midiática, que justifica como sendo um momento no qual os fluxos de
conteúdos perpassam por diversas plataformas. Assim, vigora uma cooperação dos
mercados midiáticos com o comportamento migratórios dos públicos que vão em busca de
experiências de entretenimento para esses espaços. “Convergência é uma palavra que
consegue definir transformações tecnológicas, mercadológicas, culturais e sociais, de
pendendo de quem está falando e do que imagina estar falando” (JENKINS, 2009, p. 29).
Desse modo, o autor apregoa que as experiências dos consumidores de mídia já não é
inativa ou estática, pelo contrário, já passam pela contribuição deles nesses processos na
medida que podem ser também produtores midiáticos.
Segundo o autor, a característica da produção está no fato de que os
consumidores dos feitos modernos não se encaixam mais no perfil de seres amorfos. Pelo
contrário, eles passam a ser participativos e a contribuir com os feitos midiáticos em um
processo coletivo e mútuo, criando um novo aspecto da cultura, denominada de
participativa. A atuação desses sujeitos pode ser ousada, inclusive, uma vez que se utilizam
das mídias sociais para exprimir insatisfações com entidades e organizações representativas,
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podendo tomar proporções desastrosas para elas se não observarem esses movimentos. Nas
palavras do autor, se “os antigos consumidores eram indivíduos isolados, os novos
consumidores são mais conectados socialmente”. Ainda, se “o trabalho de consumidores de
mídia já foi silencioso e invisível, os novos consumidores são agora barulhentos e públicos”
(JENKINS, 2009, p. 47).
Essa movimentação dos novos produtores tem permitido o enaltecimento de
pessoas como celebridades, aqui chamadas de “celebridades virtuais”. Os fenômenos em
questão surgem recorrentemente da visibilidade que a internet dá a pessoas envolvidas em
fatos rotineiros ou de entretenimento lançados na rede, tornando-se figuras conhecidas
como memes. Esses elementos têm sua origem nas definições de Dawkins (2014), quando
menciona são ideias que se propagam “pulando de cérebro para cérebro por meio de um
processo que pode ser chamado, no sentido amplo, de imitação” (DAWKINS, 2014, p. 112,
online). Assim, são objetos simbólicos tidos como verdadeiros vírus, os quais “parasitam” a
mente do outro, ficando sobremaneira em destaque de modo a enaltecer pessoas e sujeitos
provindos das redes sociais.
Diante disso tudo é perceptível que a possibilidade de produzir em “grande
escala” por qualquer sujeito na era da conexão torna as ferramentas da internet grandes
propagadores dos feitos produtivos. Exemplo disso é o Youtube, que segundo Burgess e
Green representa “um dos maiores cases da cultura participativa do mundo” (2009, p. 9).
Trata-se de uma mídia social que possibilitada a distribuição de vídeos caseiros feitos pelos
usuários da web – muitas vezes anônimos – como forma de expressar suas múltiplas
expressões e linguagens através de imagens não estáticas. Esses produtos são muitas vezes
disseminados de forma viral, com infinitas replicações em rede, repercutindo inclusive na
formação dos memes mencionados.
O fascínio da imagem atinge seu ápice quando nós somos a própria
mensagem. Talvez por isso o YouTube seja um irresistível local dessa
enorme ágora virtual que, independentemente dos seus problemas e formatos,
permite a cada um ser a própria mídia, celebridades do nosso cotidiano .
(BURGESS; GREEN, 2009, p. 9)
Portanto, o estudo de caso “Luíza está no Canadá” vem a ser um esboço
de como esses efeitos da internet podem tomar conta dos meios de comunicação,
tornando as manifestações em rede destaques, ainda que surjam de forma
desinteressada. É possível analisar a partir do case relatado como fenômenos do gênero
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podem deixar de repercutir apenas localmente – entre aqueles que comungam afinidades
pessoais e afetivas com os envolvidos diretamente nesses virais – e ganhar
extraordinária repercussão midiática, atingindo até os noticiosos. Essa construção da
repercussão emblemática partindo do ambiente das mídias sociais vem a eclodir as
“celebridades virtuais” que emanam do a partir dos usos das ferramentas digitais
conectadas à web, a citar o Youtube.
Segundo Burgess e Green (2009, p. 21, grifo original) o negócio dessa
mídia está em ser “uma plataforma conveniente e funcional para o compartilhamento de
vídeos on-line: os usuários (...) fornecem o conteúdo que, por sua vez, atrai novos
participantes e novas audiências”. Desse modo, sempre teve seus serviços sendo
direcionados para o compartilhamento de conteúdos, inclusive, os comuns e amadores,
ao invés de focar em vídeos de alta qualidade, ou seja, sem a preocupação de se ater
necessariamente a conteúdos mercadológicos. Assim, sendo um espaço fortemente
gerido pela comunidade, tem sido conduzido também pelos efeitos da cultura
participativa.
Luíza além do Canadá: a construção imagética das celebridades na web
A repercussão de diversos vídeos viralizados após suas publicações no
Youtube demonstram como ações das redes sociais ganham destaques e “importância”
sendo pauta inclusive de noticiosos, a exemplo do case “Luíza está no Canadá”. O
episódio materializa um modelo de replicação espontânea de virais que ensejam ainda a
formação de fenômenos memes na internet. Assim, são potencializados e passam a
enaltecer inclusive sujeitos comuns que viram as verdadeiras “celebridades virtuais” –
defendidas na pesquisa. Ainda, é perceptível como as manchetes dos veículos de
comunicação tradicionais se alimentam das discussões acerca desses fatos fortificados
pelas redes sociais fortalecendo um enaltecimento dessas pessoas para além do meio
online.
No vídeo em questão, a jovem estudante Luíza Rabello, 17 anos,
participava de intercâmbio acadêmico no Canadá quando, em janeiro de 2012, seu pai
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protagonizou um vídeo publicitário no Brasil que ensejou o primeiro viral do ano no
País. O colunista da alta sociedade paraibana, Gerardo Rabello, fazia menção a um
imóvel de luxo voltado para o público elitizado da cidade de João Pessoa, tendo
eclodido de forma absolutamente inusitada na internet e na mídia nacional após
mencionar que fez questão de reunir toda a família na gravação da propaganda, “menos
Luíza que está no Canadá”. A justificativa sobre a ausência da filha no cenário que
compunha o vídeo, instantaneamente circulou nas redes sociais, em tom de ironia,
rendendo à adolescente grande fama por meio da mobilização midiática gerada no
twitter, a qual foi estendida ao facebook pelos usuários.
Com isso, nome de Luíza estampou manchetes de grandes veículos de
comunicação, em decorrência da mensagem ridicularizada nas redes sociais. O
acontecimento, que era para ser uma veiculação local da propaganda do residencial,
tomou a grande rede, explodindo de forma voluntária pelos usuários das novas mídias
em tom de sátira à colocação do pai da jovem. Assim, no caso em analisado, a internet
mostrou-se como uma plataforma ideal para a insurgência de grandes memes a partir da
repercussão em rede, fortalecida ainda pela repercussão midiática dos noticiosos, os
quais se apropriaram das interações sociais do público online, tidos como produtores
desse fenômeno.
Figura 1: momento em que o pai de Luíza menciona sua ausência no vídeo
Fonte: internet
Inicialmente, o assunto efervesceu no twitter – rede social em formato de
microblog que permite o envio de mensagens de texto com até 140 caracteres por meio da
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internet – tornando-se rapidamente o assunto entre os dez mais comentados do Brasil na
rede com a hashtag #LuizaEstanoCanada, em menos de 24 horas. Concomitantemente,
diversas montagens em formato de paródia foram reproduzidas na web e disseminadas no
facebook fazendo sátiras à história narrada pelo pai de Luíza. A repercussão rendeu,
inclusive, um comentário feito durante a abertura do show do cantor música popular
brasileira Lenine, quando disse em tom de brincadeira estar maravilhado com a platéia:
“está todo mundo aqui, rapaz, só não está a Luíza que está lá no Canadá” (G1, 2012,
online).
No vídeo, de 30 segundos de duração, os parentes da estudante (pai, mãe,
irmão e irmã) integram o cenário na sala social da residência da família em um ambiente
clássico e rústico, sugerindo a ideia de naturalidade. Os participantes usam roupas esportes,
favorecendo um ambiente tradicional, em que se sentem à vontade. Os homens vestem
calças jeans e tênis e as mulheres usam roupas leves aludindo a um momento de encontro
familiar aprazível. Interessante observar que, já no primeiro segundo da filmagem, há um
destaque à ausência da filha Luíza, tendo em vista que o plano de gravação inicia
enquadrando Gerardo Rabello e os porta-retratos da mesa de apoio, onde constam imagens
de Luíza como foco.
Esse enquadramento já indica que Luíza – embora não estivesse fisicamente
no vídeo – faria parte do anúncio, permanecendo durante toda a gravação nas imagens, uma
vez que sua foto aparece nas tomadas de câmera que ilustram a família. Assim, passou a ser
mais um personagem do cenário estando durante todos os takes ao lado dos demais
parentes, mais especificamente entre seu pai e aqueles que estavam sentados no outro sofá.
Assim, parece haver uma necessidade de fortalecer o que mais tarde iria compor a
publicidade: a menção da ausência física de Luíza como forma de justificar sua estada no
Canadá, o que certamente enriqueceria o estatus dos consumidores do imóvel apresentado,
por solidificar o perfil do empreendimento como algo voltado para a sociedade mais
abastada da Paraíba.
Nesse contexto, ao dizer a frase em análise, imediatamente o público
atentou-se para isso e os compartilhamentos em rede tornaram o vídeo um viral que deu
sequência a diversos memes e brincadeiras divulgados nas redes sociais. A repercussão
ganhou as pautas dos noticiosos brasileiros, pelo que os grandes veículos de comunicação
do país fizeram coberturas sobre o fenômeno, a exemplo da Rede Globo e da TV Record. A
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estudante foi inclusive recebida e ovacionada nos estúdios do Jornal Hoje – telejornal de
grande audiência que vai ao ar de segunda a sábado ao meio-dia na Globo – onde posou
como estrela ao lado de jornalistas como o âncora Evaristo Costa. O estrelato da jovem
rendeu ainda participação em comerciais de outros produtos e serviços, como o do parque
Beto Carrero World.
Figura 2: Meme indicando situação “No Canadá” para o Messenger de Luíza
Fonte: internet
Figura 3: Meme de Luíza em paródia de comercial de cerveja
Fonte: internet
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Figura 4: Meme da Luíza relacionado à visita do presidente
Fonte: internet
Desse modo, fica nítido como as experimentações e expressões dos
novos produtores interagindo em uma conexão permanente passam a implicar em uma
representatividade sobre as postagens nas redes sociais, à medida que ganham força e
são inseridas recorrentemente nos noticiosos. Podemos verificar que, a começar pelo
acesso, a grande rede se diferencia dos veículos de comunicação de massa, dadas as
peculiaridades que a tornam singular, insurgindo assim a possibilidade de esses
produtores passarem a construir fenômenos e celebridades virtuais a partir de suas
postagens e replicações de conteúdos diversos. A internet, portanto, se mostra uma
plataforma ampla e propulsora de mitos, de crises, de identidades, de emblemas, de
méritos de acordo com as atuações dos usuários.
Considerações finais
A pesquisa demonstra a incidência da construção imagética de
fenômenos midiáticos, intitulados “celebridades virtuais”, emergidos da internet a partir
das manifestações dos usuários por meio de suas redes sociais. Com isso, demonstra o
estudo de caso “Luíza está no Canadá” e sua replicação na web que tornou o caso um
viral, ensejando a construção de diversos memes, ainda o estrelato de Luíza como uma
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figura de destaque no País. Assim, ficou retratado como essa característica das redes
sociais de internet podem eclodir acontecimentos não planejados de estrelato, tendo
como base a mobilização dos usuários desse meio e suas afinidades com ocorrências do
dia a dia.
Resta claro como a internet vem a ser um meio de comunicação que
viabiliza a promoção de interatividade e de sociabilidade mediada por esses
mecanismos tecnológicos, influenciando diretamente a cultura coletiva, no que tange
aos aspecto da cultura participativa elencada. Desse modo, diagnostica-se um
firmamento das extensões das interações humanas mediadas por sistemas eletrônicos
por meio da conexão permanente de forma a fortalecer a ideia da cultura participativa
também, vez que os sujeitos podem lançar ideia e símbolos em escala global para serem
decodificadas e replicadas em rede.
O caso apresentado demonstra que é nesse ambiente de sociabilidade
virtual que muitas formas de interação vêm se formando e, por conseguinte, formando
grandes repercussões midiáticas. Dessa forma, por vezes, esses compartilhamentos
eclodem e direcionam inclusive pautas nos noticiosos, fruto da participação coletiva na
construção desses fenômenos, visto que essencialmente a internet é um espaço livre que
permite a qualquer um com possibilidade de acesso tenha a chance de publicar e
multiplicar significados expressivos no meio.
Essa dinâmica é o que permite a comunicação “de muitos para muitos”
em uma escala global, por meio da rede mundial de computadores. O impacto dessa
tendência reflete em vários ângulos da vida cotidiana, não apartando os meios de
comunicação de massa de também sentirem esse impacto. O alcance global desse
sistema eletrônico de comunicação pela web traz o peso da internet e dos novos
contextos de sociabilidade.
Conclusivamente, a observação do case “Luíza esta no Canadá” retrata
de forma clara como se dá a construção imagética das intituladas “celebridades virtuais”
na web, onde as redes sociais twitter e facebook foram usadas como espaços dessa
manifestação livre em rede.
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Referências
BURGESS, Jean; GREEN, Joshua. YouTube e a revolução digital: como o maior
fenômeno da cultura participativa transformou a mídia e a sociedade. São Paulo: Aleph,
2009.
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O
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1976.
Disponível
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“Luíza está no Canadá”: a construção imagética das