A prática do jornalismo cor - de- rosa na produção da revista Atual Helker Patrik Cami noto ALVES1 Pedro Henrique Silva Souza PEREIRA Resumo O presente estudo tem como objetivo analisar o jornalismo da revista Atual. Procura identificar na linguagem da revista um jornalismo sob forte influencia da publicidade, identificado por Marshall (2003) como gênero cor-de-rosa. Será utilizado ainda conceitos de mídia local, com a finalidade de averiguar se as características desse tipo de mídia influi no conteúdo final do produto jornalístico atrelado ao produto publicitário. Conclui-se que a proximidade com o público-alvo e com o anunciante possibilita a ocorrência dessa prática redacional descompromissada de jornalismo crítico, direcionado apenas aos interesses do me rcado. Visto que, a relação de familiaridade entre o leitor e a revista, e da revista com o anunciante, aliado a uma fácil leitura da produção cor-de-rosa, faz com que essa prática torna-se ainda mais frequente em impressos similares. Palavras-chave: Jornalismo cor-de-rosa. Comunicação Regional/Local. Revista Atual. . Graduandos em Comunicação Social com Habilitação em Jornalismo ou Publicidade e Propaganda, UEMG – Universidade do Estado de Minas Gerais, Campus de Frutal, Minas Gerais. Orientadora: FERREIRA, Jociene Carla Bianchini, Mestre em Comunicação. 1 Introdução Marshall (2003) identifica um novo gênero na linguagem da imprensa, o jornalismo cor-derosa, que nada mais é que a mescla entre as técnicas jornalísticas e publicitárias para promover um produto ou serviço anunciado. O recente estudo pretende analisar como a revista Atual, situada na cidade de Frutal (MG), de circulação bimestral, utiliza esse recurso em suas páginas, promovendo um novo conceito de conteúdo jornalístico. No jornalismo cor-de-rosa, a publicidade influencia diretamente a prática redacional objetivando retornos financeiros. A informação, no caso, se apresenta como um produto comercial, com o dever de agradar primeiramente um empresário (anunciante), para depois se apresentar interessante para o leitor. É fundamental ainda não perder de foco os parâmetros em que a revista está inserida. Trata-se da definição de mídia local, argumentados por Peruzzo (2003), diante da necessidade de situar a revista Atual no contexto típico deste tipo de mídia. Ao final da pesquisa conclui-se que a prática do gênero cor-de-rosa pela revista Atual, não procura valorizar as matérias da revista com a finalidade de torná-las apreciáveis ao leitor. O propósito é apenas atrair anunciantes por meio de matérias descomprometidas com uma visão crítica da realidade, mas propícias para criar um ambiente desejado por anunciantes. 1. A revista Atual A revista Atual é uma revista bimestral com circulação em Frutal (MG) e região, sua primeira edição foi lançada em junho/julho de 2006. Inicialmente, a tiragem divulgada era de oito mil exemplares, com distribuição gratuita em pontos estratégicos da cidade. Depois da quinta edição, esse dado passou a não ser veiculado, por uma opção editorial da revista. Até a terceira edição, um dos principais atrativos da revista era a coluna “aplauso”, em parceria com a rádio 102 FM. Nela havia fotos dos principais eventos sociais ocorridos na cidade. A partir do quinto lançamento, em março de 2007, com a criação de uma home page www.agitofrutal.com - as fotos que até então eram vistas apenas na revista, podiam ser acessadas também no site oficial da Revista Atual. No quarto exemplar, a cobertura de eventos sociais da cidade continuou sendo veiculada em páginas espalhadas, mas sem ocupar alguma sessão específica. A então coluna “aplauso” deixava a revista juntamente com o patrocínio da rádio frutalense. A equipe da Atual sofreu poucas mudanças. O publicitário Brenno Oliveira ocupa desde a fundação da revista, em julho de 2006, o cargo de diretor geral. Desempenha também o cargo de diretor de arte e diagramador, função dividida com outros dois profissionais, além de atuar ativamente no departamento comercial. Por sua vez, a edição e revisão dos textos era, até o décimo número, de responsabilidade de Pollyana Dalariva, Gilmário Martins e Vilma C. Pereira. Desde então, essas funções passaram a ser apenas dos dois primeiros citados. Em 2008, a revista foi idealizadora do evento chamado “Premio Excelência – Os melhores da Revista Atual”, em que por meio de uma pesquisa via internet, pelo site www.agitofrutal.com, várias empresas de Frutal (MG), distribuídas por setores, foram homenageadas pelo prêmio. Ao todo 72 empresas foram agraciadas. Hoje o prêmio da revista Atual é referência na cidade e atrai o público empresarial. 2. A cidade de Frutal Com cerca de 52 mil habitantes, Frutal está localizada na região oeste do Estado de Minas Gerais e completa, em 2009, 122 anos de fundação. No setor educacional, Frutal possui 14 escolas municipais, seis estaduais e seis escolas privadas. Entre elas está a Universidade do Estado de Minas Gerais, na qual possui cinco cursos de nível superior. Dentre eles, Administração, Comunicação Social, Direito, Geografia, Sistemas de Informação e dois de nível técnico: Ciência e Tecnologia de Laticínios e Curso Superior de Tecnologia em Processos Sucroalcooleiro. A UEMG – Universidade do Estado de Minas Gerais – conta com um corpo discente de aproximadamente 1300 alunos. Outra faculdade que compõe o ensino educacional da cidade é a FAF – Faculdade de Frutal, que possui os cursos de Administração, Pedagogia, Nutrição e Serviço Social, somando assim 396 alunos. Em parceria com o governo, o município viabiliza o projeto para a implantação do Centro Internacional de Educação Capacitação e Pesquisa Aplicada em Águas (Instituto Hidroex) que está em discussão desde 2001. A proposta foi apresentada pelo Governo de Minas, com apoio do governo federal e também de entidades do terceiro setor e organismos internacionais ligados ao Meio Ambiente, como o Conselho Mundial de Águas e a Green Cross International. O Instituto está sendo criado a partir de uma parceria entre a Unesco, o Governo Federal e o Governo do Estado e será um centro de estudos e referência para conservação do patrimônio hidrológico da América Latina. Frutal sempre teve em sua história vários veículos de comunicação, entre eles está o Jornal de Frutal, Jornal Pontal e o Jornal Diário, todos impressos com veiculação semanal. As rádios da cidade são ao todo quatro: três são FM e uma AM. Apresenta ainda, como meios de mídia impressa, revistas como a Atual, que circula na cidade desde Julho de 2006, e a recém lançada Alta Sociedade in Revista, que tem como principal objetivo os eventos sociais que ocorrem em Frutal, além de várias reportagens sobre saúde, educação e conscientização social. A cidade conta ainda com muitas usinas de álcool e boa parte de toda economia vem também do gado de corte. O setor agropecuário apresenta grande força em Frutal, além do poder empresarial, que possui 7 indústrias extrativas e 163 indústrias de transformação. Já o comé rcio local também merece destaque, pois se trata de um grande aliado no desenvolvimento da cidade, gerando emprego e qualidade de vida. 3. A Revista Atual enquanto mídia local Apesar da dificuldade de definição de mídia local, regional e nacional, sobretudo em tempos de globalização e das dimensões proporcionadas pela grande rede, a internet, estudos não faltam acerca deste tema. Peruzzo (2003) define como mídia local aquela na qual ocorre a abordagem de assuntos não apenas próximos de um grupo de pessoas, mas que lhes reportam, pela familiaridade, a idéia de “autêntico”. No caso, essa autenticidade se limitaria a um território onde prevalece uma unidade envolvendo códigos linguísticos, laços culturais e raízes históricas que possam ser distinguidos por todos os cidadãos ocupando um espaço menor que o regional, como o de uma cidade, por exemplo. Dessa forma, enquadra-se a revista Atual nos conceitos de Peruzzo (2003), já que a revista mostra elementos íntimos de seus leitores, apresenta personagens conhecidas na cidade e utiliza termos léxicos específicos da cidade. Para ilustrar tal afirmação, a página 16 da revista mostra duas matérias que contém siglas identificadas pelo seu público (“ACIF/CDL”) que muito provavelmente seriam estranhas se vistas por pessoas que não conhecessem a revista Atual. Tanto é verdade a ponto do periódico não se preocupar em explicar o significado da abreviatura. Diferente disso, na mesma edição da revista, outra matéria jornalística de cunho nacional já traz essa preocupação, trata-se da sigla ANS – Agência Nacional de Saúde, que a edição da revista Atual faz questão de deixar claro ao seu leitor. Nem por isso, assuntos de caráter global deixam de ganhar espaço na revista Atual, sobretudo em tempos globalização, em que qualquer pessoa conectada ao ciberespaço pode ter acesso a fatos ocorridos no mundo todo. Mesmo em periódicos preocupados em se aproximarem de seu nicho comercial, como o de uma pequena cidade, torna-se evidente os leitores estarem inseridos num mundo globalizado e interligado por um número infinitos de home pages. Prova dessa interligação é a atual crise na agricultura norte-americana que, por incrível que pareça, influencia diretamente o valor do produto ofertado pelo produtor de uma cidade no interior do Brasil, como é o caso de Frutal. A revolução em marcha, que tem na Internet o paradigma da comunicação total, anuncia câmbios importantes nas relações entre pessoas, na cultura e na economia, com especial incidência nos espaços locais. Entramos na era digital e avançamos na construção de um sistema de referência ciberespacial, que situa a sua referência no global, mas se alimenta do local. (GARCIA, 2004, P. 11) A Atual sempre traz matérias extraídas da internet com questões falando claramente para um público atento aos acontecimentos do mundo todo, inseridos diretamente nos problemas enfrentados por qualquer cidadão de um mundo globalizado, como questões ambientais e crises financeiras. Como pode ser visto no exemplo abaixo: Ao refletir sobre mídia local, Peruzzo (2003) acentuou a semelhança com a mídia comunitária, em vista do conteúdo análogo delas em muitas ocasiões. A local, por exemplo, aborda o cotidiano dos cidadãos, mas com a função precípua de informar motivada por interesses comerciais; já a comunitária trata dos mesmos problemas, mas com o dever de mobilizar o grupo ao qual fala, “movida por interesses em contribuir para o desenvolvimento comunitário e sem objetivos lucrativos” (Peruzzo, 2003, p. 27). Outra diferença nos dois tipos de mídias acima expostos é a prática de um jornalismo atendendo aos interesses políticos ou de personalidades com influência no espaço ocupado pelo leitor da mídia local com a clara intenção de atrair a publicidade. Na revista bimestral em estudo, o caso fica evidente numa matéria de promoção de um clube frutalense. A notícia não se preocupa em mostrar a opinião de algum associado do clube, muito menos apresenta teor investigativo, nem ao menos entrevista fonte alguma. Mais se assemelha a uma peça publicitária, querendo vender a imagem do local como um clube remodelado, com muitas novidades para os associados. Da mesma forma, enquadra-se ainda na proposta de mídia local, o jornalismo que atende aos interesses de empresas, políticos influentes na área – principalmente os que têm maior influência no poder e lideranças locais. A Atual abre espaço para cidadãos participarem ativamente na produção da revista. No entanto, exclusivamente, o campo é ocupado por empresários e o tema de seus artigos são sempre relacionados à área de atuação profissional deles. Outrossim, nas sete ocasiões apresentadas na edição de janeiro da revista, adiante da matéria assinalada aparece a publicidade promocional do profissional que assina o artigo. Por conseguinte, apesar de inúmeros limites impostos por diversos estudiosos, a revista Atual se enquadra no perfil de “mídia local” proposto por Peruzzo (2003), diante de todos os argumentos já demonstrados. Pelo simples fato de se tratar de um veículo composto por notícias de interesse de seu público, a revista possui campo fértil para atrair mais publicidade local do que de qualquer outro gênero. Não seria viável para anunciantes de pequeno porte terem suas campanhas de divulgação veiculadas em mídias de grande alcance. Dificilmente disporiam de recursos necessários para esse tipo de publicação, além de não atingir diretamente seu público alvo. As publicidades da empresa local [...] refletem, de antemão, um conhecimento preliminar do público, e das suas necessidades. Discursivamente, elas sinalizam esse domínio comum e, por esse motivo, atuam no sentido de preencher essas lacunas (CASTRO, 2005, p. 14). Sobre o objeto em análise, é evidente não haver desvelo na produção de textos críticos e comprometidos com a ética reivindicada na imprensa. A produção jornalística da revista Atual é baseada apenas em flashes de festas, de moradores notáveis e informações sobre eventos na cidade. Logo nas primeiras edições, a revista tinha como foco principal a cobertura de eventos sociais. As fotos ocupavam a antiga coluna Aplauso. Nos dias de hoje, a Atual é bastante preenchida por esse tipo de cobertura, no entanto a coluna Aplauso foi substituída pelo Agito Frutal.COM., devido o rompimento da parceria com a rádio 97,2. Abaixo algumas páginas sociais da coluna AgitoFrutal.Com. Assim, a revista Atual pode ser considerada como sendo uma mídia local, de acordo com os conceitos de Peruzzo (2003) ao se apresentar próxima de seu leitor, o cidadão frutalense, por meio de códigos lingüísticos e laços familiares, contando a história de seu povo, com personagens da própria cidade. 4. O jornalismo cor-de-rosa e a revista Atual Marshall (2003) identifica um novo gênero jornalístico sucessor das famigeradas imprensa amarela e marrom, o jornalismo cor-de-rosa. A primeira surgiu nos Estados Unidos e se expandiu na década de 80, sendo caracterizada pela valorização da notícia com o intuito de ampliar o número de leitores. “Os fatos eram superdimensionados para que se garantisse um caráter de especularidade e curiosidade” (MARSHALL, 2003, p. 91). Já a imprensa marrom seria a dedicada ao sensacionalismo, com amplo predomínio de fofocas, escândalos e denúncias, com caráter meramente especulativo. Nesse contexto, a figura do jornalista ganhou destaque junto aos leitores. De acordo com Marshall (2003), o jornalismo cor-de-rosa é aquele em que impera a lógica do mercado ultraliberal – mercado do mundo globalizado, pouco regulamentado, em que a necessidade de vender se impõe sobre a ética. O jornalista estaria cada vez mais próximo do publicitário, o “intelectual orgânico“ como nomeia Gramsci (1999). Segundo o autor italiano, os intelectuais orgânicos desenvolvem trabalhos vinculados aos interesses da classe dominante, utilizariam seus conhecimentos científico e tecnológico na motivação do consumo. De acordo com ele, com os jornais funcionando influenciado pela tônica mercadológica, a notícia foi se assemelhando cada vez mais a um produto, devendo estar apreciável aos olhos do leitor, ou melhor, consumidor. O teórico da escola de Frankfurt, Habermas (1984), aponta que nos primórdios da imprensa, toda sua organização era baseada no artesanato de pequenas empresas e a notícia construída por meio de correspondências privadas. No caso, o lucro era modesto, mas mesmo assim havia interesses puramente comercial. Conforme a industrialização se tornava importante, os trabalhadores migravam para a cidade e uma burguesia cada vez mais ávida por mudanças ganhava corpo. Os periódicos serviram para orquestrar as aspirações dessa classe e foram de suma importância na organização do proletariado urbano, “de modo que muitas de suas esperanças residiam na direção que iria tomar no desenvolvimento da educação, o progresso científico e, pelo menos na França, as urnas” (WILLIANS, 1992, p.16). O jornalismo opinativo trouxe essa mudança, quando passou a emitir o pensamento e as vontades da elite. Logo, a burguesia, dona das empresas jornalísticas que se formavam, passou a privilegiar conquistas políticas em detrimento das conquistas econômicas, proporcionadas com a venda dos periódicos. Porém, não demorou muito a conciliação das duas conquistas. Quem possibilitou isso foi a publicidade. Com ela ganhando espaço nos jornais, o gasto passou a ser abatido e havia menos esforço para obter lucro com as vendas dos impressos: Quando a laissez -faire entronizou no mundo dos negócios, junto ao liberalismo, a publicidade ganha ainda mais força e a linguagem jornalística fica submissa também a ela e vai perdendo, pouco a pouco, seu sentido original. Em sua dimensão global, o mercado controla uma produção oligopolística de notícias por meio das agências internacionais e nos apresenta o mundo atual como uma fábula. Em suas dimensões nacional e local, o mercado, agindo como mídia, segmenta a sociedade civil, influi sobre o fluxo e a hierarquia do noticiário e aconselha a espetacularização televisiva de certos temas, confundindo os espíritos em nome de uma estratégia de vendas adotada pelos jornais como forma de sobrevivência. O remédio, aqui, é um veneno, num círculo vicioso que acaba por ser seu principal pecado. Estará a imprensa pecando em nome próprio ou e em favor do mercado? O resultado é o mesmo (SANTOS, 1997, p.55). Com o sucesso das produções audiovisuais, o newsmaking dos impressos se orienta à semelhança dessas e da publicidade. Passa a ser empacotado como um produto de barganha e interesses. Precisa obedecer a cultura da estética para ser apreciável e consumido. A imprensa fala a língua do dinheiro e o interesse público torna-se uma esfera de manipulações e licenciosidades. Nesse sentido, a linguagem cor-de-rosa assume os contornos do fazer jornalístico ao se render à venda. É preciso respeitar o olhar e os anseios humanos para se vender, do contrário as empresas midiáticas não sobreviveriam. Logo, se veem contínuas a uma lógica que as prendem e perdem o sentido precípuo: o conhecimento da verdad e. Finalmente, a notícia mescla-se à publicidade perante o laissez-faire de um mercado ultraliberal e sua carpintaria segue o arco mercantil. O ato de informar curva-se ao ato de vender, prevalecendo o poder do imagético e do desejo. Nessa ordem, o jornalista perde espaço e se torna mero escultor de um modelo já proposto por empresários. Em meio à mutações no campo da informação e da comunicação, caracterizado pelo produto publicitário ubíquo, o jornal, como empresa, torna-se notícia apreciável ao consumidor, contudo é prioridade primeiramente estar apetecível aos anunciantes. Na revista Atual, isso é feito de diversas maneiras. Ocorre a criação de um clima harmonioso para anunciar, noticiando algo capaz de se relacionar diretamente com a aspiração de comprar espaços publicitários; artigos assinalados por empresários ou profissionais liberais seguido da propaganda do comércio deles; e também matérias elogiando empresas, com a função de atrair o anúncio das mesmas. A própria busca inconstante pelo exagero é um traço marcante da linguagem cor-de-rosa, visto que o jornal não tem mais como traço fundamental a procura pela verdade, mas pelo fora do comum. Mesmo algo importante a ser conhecido pela sociedade, como uma medida do governo, poderá não ser noticiado caso não seja interessante. Esse olhar profissional do jornalismo, entretanto, foi adestrado para enxergar apenas o incomum, o anormal, o diferente, o insólido, o inusitado, o espantoso, o assustador, o super, o hipo, o extremo, o superlativo, o assimétrico, o anti, a ruptura, o conflito, o irregular. O que isso faz? Faz com que o indivíduo compreenda que, cada vez mais, tudo em torno de si seja potencialmente incomum, anormal, diferente, insólito, inusitado... (MARSHALL, 2003, p. 55). Não ocorre com a Atual a construção de notícias focadas no exagero, com a finalidade de vender. Até porque ela possui distribuição dirigida (gratuita). Portanto, nela se faz evidente a veiculação de fatos quase nulos – algo do senso comum ou já amplamente noticiado pela grande mídia. Em contrapartida, a linguagem televisual se faz presente na grande diversidade de imagens ilustrando as páginas e em textos de composição simples e imagéticos, tornando uma leitura mais agradável ao público da revista. As matérias da Atual correspondem perfeitamente ao exposto acima. Não apresentam teor crítico quando produzidas pela redação da revista, pois é comum a cópia do conteúdo da internet. Por sua vez, os artigos servem apenas de isca para tratar de algum assunto pertinente ao comércio ou serviço prestado pelo articulista e na maioria ocorre apropriação do texto de outros autores encontrados também na internet. Marshall (2003) identifica 25 variações do gênero cor-de-rosa: 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 Mimese Desfiguramento Composição Quinhentismo Releasemania Dirigismo Editorialismo Casamento fechado Casamento Aberto Demanda Condicionamento Business 13 14 15 Ambiguidade Indicidade Merchandising 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 Consumismo direto Consumismo indireto Chamariz Isomorfismo Integração Ideologia Sintonia Marketing Estética Vitrine Publicidade paga, disfarçada de notícia, sem identificação de informe publicitário Publicidade paga, disfarçada de notícia, com identificação de informe publicitário Notícia apresentada com caráter de publicidade Produção de notícia encomendada pelo setor comercial de uma empresa Produção de release Produção de notícia pelo setor comercial de uma empresa jornalística Publicidade acompanhada por material elogioso à empresa ou ao produto Notícia e publicidade casadas, em espaço fechado Notícia e publicidade casadas, em espaço aberto Criação de produtos jornalísticos para a “publicação” de publicidades Publicidade condicionadora ou indutora da linha editorial Notícia sobre ações econômicas, financeiras, empresariais, comerciais, industriais ou de serviços Notícia sobre anúncios publicitários Publicação de índice de anúncios Evocação intencional de uma empresa, de uma marca, de uma serviço ou de um produto no espaço editorial Estímulo ao consumismo direto Estímulo ao consumismo indireto, pelo estímulo a um modo de vida Notícia-isca para a publicidade Jornais publicitários A autocensura, a lavagem cerebral, a cooptação ou a “compra” de jornalistas A ideologia publicitária no produto do jornal A sintonia entre o espaço jornalístico e o espaço publicitário Estratégias de marketing para atração de leitores A estetização como estratégia de persuasão A visita de pessoas físicas ou jurídicas ao veiculo jornalístico com a intenção deliberada de gerar uma notícia A Atual de janeiro de 2009 traz quatro formas diferentes das apresentadas nos conceitos de jornalismo cor-de-rosa de Marchall (2003), todavia em edições anteriores puderam ser verificadas outras formas. Cabe neste trabalho, apenas analisar as inserções da edição de janeiro de 2009. Logo na página 16, encontra-se o que Marshall (2003) chama de Mimese. É patente se tratar de uma publicidade disfarçada logo no primeiro parágrafo do texto “Convênio em plena atividade em Frutal”: “A ACIF/CDL, sai na frente mais uma vez, disponibilizando aos seus associados, o melhor plano de saúde bucal do país; trata-se da UNIODONTO”. Ainda que a notícia “ACIF/CDL faz parceria com empresa especializada” também possa ser caracterizada como Mimese, nela não é evidente como é na notícia da mesma página. Por sua vez, a publicidade que segue pode ser descrita como Desfiguramento, pois é lançada de forma semelhante a uma notícia, trazendo inclusive um chapéu, levando o nome da empresa, no caso Banco do Brasil, e se assume como informe publicitário, informando o leitor sobre o seguro de vida daquele banco. Já o gênero Casamento fechado é um dos mais utilizados na Atual dentre os 25 identificados. Muitos até mesclam-se com outros gêneros. A página a seguir pode ser caracterizada como Casamento fechado, por apresentar uma notícia seguida de publicidade sintonizadas na mesma página. Primeiramente a revista apresenta uma matéria jornalística sobre pilates e esta atividade praticada por pessoas do sexo masculino. Logo abaixo da notícia, observa-se a propaganda da clínica de pilates, a mesma usada para fazer a matéria jornalística. Por fim, encontra-se ainda na edição de janeiro da revista bimestral o gênero Chamariz. Uma vez que, na página 18 aparece a matéria “Dirigindo Grávida. Atenção redobrada!” como forma de criar um ambiente propício para despertar a atenção do leitor interessado nos serviços oferecidos por auto-escolas ou por uma clínica que oferece avaliação psicológica exigidos nos exames de motorista. Já que a revista apresenta primeiramente uma matéria sobre gravidez e trânsito. Sendo assim, a aproximação da revista com a população criou laços capazes de permitir vigorar um gênero jornalístico que vem ganhando espaço na mídia em geral, mas já se encontra em sua fase aguda na Atual. Visto que, não é exceção a prática do gênero cor-de-rosa e sim regra. Contudo, o fato de se tratar de uma “mídia local” não deve ser visto como motivação principal. Deve-se, antes de mais nada, pensar na força da publicidade. Como braço direito do mundo capitalista, a publicidade é vista como ferramenta fundamental na venda de produtos. Portanto, o jornalismo cor-de-rosa estará presente na mídia cuja função de lucrar se sobrepõe a de informar. Bibliografia: CASTRO, Maria Lilia Dias. XV Anuário da COMPÓS. Bauru, 2005. COELHO, Cláudio Novaes Pinto. Publicidade: é possível escapar. São Paulo: Paulus, 2003. CORREIA, Fernando. Os jornalistas e as notícias. Lisboa: Caminho, 2007. HABERMAS, Jürgen. Mudança estrutural da esfera pública. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1984. 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