UNIVERSIDADE DO EXTREMO SUL CATARINENSE - UNESC
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO ESPECIALIZAÇÃO EM HISTÓRIA SOCIAL E
CULTURAL
ODÉCIA ALMEIDA DE SOUZA
CONFLITOS E MUDANÇAS – OS XOKLENG E OS IMIGRANTES
EUROPEUS NO VALE DO RIO ARARANGUÁ DURANTE A
SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX
Criciúma, dezembro de 2005
ODÉCIA ALMEIDA DE SOUZA
CONFLITOS E MUDANÇAS – OS XOKLENG E OS IMIGRANTES
EUROPEUS NO VALE DO RIO ARARANGUÁ DURANTE A
SEGUNDA METADE DO SÉCULO XIX
Monografia apresentada à Diretoria de Pósgraduação da Universidade do Extremo Sul
Catarinense- UNESC, para a obtenção do título
de especialista em História Social e Cultural.
Orientadora: Prof. Dra. Deisi Scunderlinck Eloy
Farias
Criciúma, dezembro de 2005
Dedico esta monografia aos meus pais que
compartilharam os ideais e os alimentaram,
incentivando a prosseguir a jornada fossem
quais fossem os obstáculos.
AGRADECIMENTOS
Sinceros
agradecimentos,
em
especial,
à
professora Deisi S Eloy Farias, que incentivou e
orientou esta pesquisa. Com carinho aos
professores
da
pós-graduação
e
sua
coordenação. A todas as pessoas que direta
ou indiretamente contribuíram para a realização
desta pesquisa. Que ela seja um passo para
identificação e valorização da cultura dos
grupos que ocuparam no passado à região do
Vale do Rio Araranguá.
“Assim é que a civilização se impõe,
primeiro, como uma epidemia de pestes
mortais. Depois pela dizimação através de
guerras de extermínio e da escravidão.
Entretanto esses eram tão-só os passos
iniciais de uma escalada do calvário das
dores inenarráveis do extermínio genocida e
etnocida.”
Darcy Ribeiro
RESUMO
A presente monografia volta seu foco de interesse para a abordagem dos embates
ocorridos na região do Vale do Araranguá entre os Xokleng e os imigrantes
europeus na segunda metade do século XIX. Pois se percebe a carência de
identificação, preservação e de registros nesta região que ofereçam visibilidade aos
grupos indígenas que ocuparam este território antes da colonização. Para isso farse-á necessário tratar de aspectos relacionados à ocupação pré-colonial do Vale de
Araranguá e os aspectos que favoreceram esta ocupação. Analisam-se bibliografias,
documentos e relatos orais regionais identificando os contatos ocorridos entre os
Xokleng e os colonizadores. A partir de uma discussão teórica sobre história,
memória e metodologia da história oral pretende-se absorver os conceitos
necessários para justificar o tema proposto e as metodologias desenvolvidas no
decorrer da pesquisa. Possibilitar o entendimento e a valorização da cultura indígena
faz parte do processo de educação que é continuo e permanente. Por isso ao
término da pesquisa discute-se a questão indígena na sala de aula e relatam-se
experiências desenvolvidas tratando desta temática. A pesquisa revela que os
conflitos entre estas culturas intensificaram-se gradativamente com a ocupação do
espaço que era naturalmente utilizado pelos grupos que ali viviam. Tornando-os
constantes e violentos. As empresas de colonização incentivavam e financiavam a
organizavam de grupos de extermínio denominados bugreiros para “limpar os
terrenos”.
Palavras-chave: Xokleng; conflitos; imigrantes; violência, visibilidade;identificação.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1- Palestra sobre arqueologia e ocupação do território do Estado.................48
Figura 2 – Aula no museu análise de material arqueológico......................................49
Figura 3 – Construção de maquete.......................................................................... 50
Figura 4 – Alunos expressando os conhecimentos adquiridos com a construção de
maquetes................................................................................................................... 50
Figura 5 – Construção de maquetes......................................................................... 51
Figura 6 – Produção de material cerâmico............................................................... 51
Figura 7 – Exposição e explicação do projeto para a comunidade escolar...............52
Figura 8 – Exposição e explicação do projeto para a comunidade escolar...............52
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................11
2 CONFLITOS E MUDANÇAS – OS XOKLENG E OS IMIGRANTES EUROPEUS
NO VALE DO RIO ARARANGUÁ DURANTE A SEGUNDA METADE DO SÉCULO
XIX..............................................................................................................................13
2.1 Os Xokleng..........................................................................................................14
2.2 Ocupação Pré-colonial do Vale de Araranguá.................................................16
3 OCUPAÇÃO E CONFLITO: OS EUROPEUS ENTRAM EM CENA......................23
4 HISTÓRIA, MEMÓRIA E METODOLOGIA DA HISTÓRIA ORAL.........................32
4.1 História Cultural..................................................................................................32
4.2 Memória...............................................................................................................34
4.3 Metodologia da História Oral.............................................................................39
5 A QUESTÃO INDÍGENA NA SALA DE AULA.......................................................43
5.1 Uma Proposta de Educação Patrimonial.........................................................45
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS....................................................................................53
REFERÊNCIAS..........................................................................................................56
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1 INTRODUÇÃO
A região do Vale de Araranguá demonstra praticamente uma invisibilidade
dos indígenas na história dos municípios, existe geralmente uma exaltação do
elemento colonizador europeu: desbravador, responsável pelo progresso da região.
Nesta monografia pretende-se identificar os principais embates ocorridos
entre os imigrantes europeus e os Xokleng no Vale do Rio Araranguá na segunda
metade do século XIX. Avaliando a partir de dados etnohistóricos a ocupação PréColonial do Vale do Araranguá e elaborando registros a partir de relatos orais e
documentos sobre os contatos ocorridos entre os Xokleng e os colonizadores.
Os objetivos principais voltam-se para interpretação do impacto causado
pela ação colonizadora ás sociedades indígenas da região e a verificação das
modificações ocorridas na cultura dos grupos Xokleng e dos imigrantes.
O presente trabalho divide-se em quatro capítulos. No primeiro momento,
relata-se aspectos da história da ocupação do território do Vale de Araranguá e a da
cultura Xokleng. Trata-se, no segundo capítulo, especificamente do contato entre
europeus e Xokleng, quando as empresas colonizadoras impulsionam o extermínio
deste grupo que para eles era uma ameaça constante a posse do território.
Analisam-se documentos deste período histórico e entrevistas com moradores
antigos da região. Estar-se-á também estabelecendo um vínculo com as bibliografias
da região procurando identificar estes contatos e a resistência dos imigrantes
europeus frente à presença Xokleng.
Julga-se de suma importância a discussão de alguns conceitos e teorias
que são fundamentais para a compreensão do tema abordado, por isso, no terceiro
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capítulo, discute-se “História” inserida no contexto historiográfico na Nova História
Cultural e Memória como elemento resignificador da história, antídoto do
esquecimento”. Relatam-se os objetivos e a justificativa da utilização da Metodologia
da História Oral.
No quarto e último capítulo, organiza-se uma discussão sobre a questão
indígena na sala de aula, ressaltando as versões equivocadas de muitos livros
didáticos de história. Buscando justificar a aplicação de novas metodologias,
percebendo a abrangência deste tema e a fundamental importância da abordagem
nos espaços de educação. Reflete-se o ensino de história e aponta-se a utilização
de recursos metodológicos variados, no ensino de história e demais disciplinas,
percebendo diferentes fontes de pesquisa, cita-se por fim algumas experiências
Educação Patrimonial desenvolvidas na Rede Municipal de Ensino de Maracajá
dando visibilidade a cultura indígena enfatizando uma perspectiva de diversidade
cultural.
Pesquisar a cultura popular, além da história oficial, já registrada significa
preservar memórias, histórias de homens, de mulheres e de crianças de uma época,
que deixaram suas marcas registradas na materialidade e imaterialidade.
13
2 CONFLITOS E MUDANÇAS – OS XOKLENG E OS IMIGRANTES EUROPEUS
NO VALE DO RIO ARARANGUÁ DURANTE A SEGUNDA METADE DO SÉCULO
XIX
O assalto se dava ao amanhecer. Primeiro, disparava-se uns tiros.Depois
passava-se o resto no fio do facão. O corpo é que nem bananeira corta
macio. Cortavam-se as orelhas. Cada par tinha preço. Às vezes, para
mostrar,a gente trazia algumas mulheres e crianças. (Depoimento do
bugreiro Ireno Pinheiro a Silvio Coelho dos Santos em 1972)
Os europeus ao chegarem à América, deram aos seus habitantes a
denominação de índios por “pensarem” estar pisando as terras das Índias. Mesmo
depois de suas explorações, demonstrando que a América constituía um continente
á parte, distinto da Ásia, os habitantes do “Novo Mundo” continuaram a ser
chamados de índios. Entretanto, com este termo, “índios”, os conquistadores
rotulavam as populações mais diversas desde o norte até o sul do continente
americano tais populações diferiam umas das outras tanto no aspecto físico como
nas suas tradições (MELATTI, 1994, p.19).
No início da colonização no Sul do Brasil. As empresas de colonização e
os colonos “limpavam o terreno”. Organizavam, grupos de extermínio dos assim
denominados “bugres”. Abatiam-nos a tiros ou degolavam-nos a facão sem o menor
escrúpulo, como relata em suas pesquisas Santos (1997).
Bugres, índios, silvícolas, bárbaros, selvagens, nativos, assaltantes,
aborígenes, desalmados, pagãos, senhores das florestas, filhos das matas. Na Bacia
do Rio Araranguá esses homens apareceram na imaginação e nos relatos dos
descendentes de colonizadores, imigrantes ou não. Pertencentes a grupos na
maioria das vezes tidos como violentos, perigosos e sanguinários. Mas quem eram
eles? Que tanto do Estado, quanto na região sul eram surpreendidos e cruelmente
assassinados sem chance de defesa. Darella (1997 apud Dall´Alba, 1997, p. 514).
14
Era uma guerra, surgida num momento histórico onde colonizadores e índios
estavam a mercê de um governo inoperante e irresponsável.
A historiografia brasileira pouco se refere à presença indígena, quando é
apresentada, muitas vezes, mostra a figura do índio como um sujeito indolente,
preguiço e selvagem. A História não deve ser vista apenas como uma trajetória de
europeus que colonizaram e conquistaram as terras. Deve-se tornar conhecidas as
populações que anteriormente ocuparam o território. A história das populações
indígenas é hoje quase a história de povos invisíveis. É preciso dar visibilidade ao
passado e enxergar novos sujeitos da história
2.1 Os Xokleng
No decorrer da história catarinense, os Xokleng receberam diversas
denominações. Eram conhecidos como Botocudos, Bugres, Aweikoma, Xokrén e
Kaingang. Cada termo denota um significado. “Bugre” é uma denominação comum a
todos os grupos indígenas e possui caráter pejorativo, significando selvagem,
inimigo.
A provável origem deste termo seria proveniente de um grito de espanto
(ou alerta) dado pelos índios quando avistavam os brancos; no momento do alarme
pronunciavam a palavra “pucri” (MABILDE, 1983, p. 08). “Botocudo” relaciona-se ao
enfeite labial – tembetá – utilizado pelos homens. Von Ihering utilizou a expressão
“Aweikoma” por acreditar ser esse o nome adotado por eles próprios; entretanto, é
uma parte da frase destinada a convidar uma mulher para a cópula. “Xokrén”
significa taipa de pedra. Já o termo Kaingang quer dizer homem, qualquer homem.
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Segundo Santos (1973, p. 31), o grupo não se auto-designa, não sendo,
portanto, essas denominações inerentes à cultura Xokleng. Usaremos, conforme sua
sugestão, o termo comumente usado por diversos autores, ou seja, Xokleng
(FARIAS, 2005).
Traçando um breve histórico da ocupação do território catarinense pela
Coroa portuguesa, verificamos que a capitania de Santa Catarina foi instalada no
século XVI por razões estratégicas e respondia às necessidades do governo
português de estender seus domínios até o rio da Prata. As áreas povoadas,
inicialmente por açorianos, localizavam-se no litoral, sendo que “as terras
catarinenses situadas a 10 km da costa eram designadas como sertões incultos e
que muito poucas concessões se haviam feito dessas terras, mesmo no vale do
Itajaí e Tubarão”. Lede (1843 apud Santos, 1969, p. 21). Esse dado indica que, a
princípio, os Xokleng não interessaram aos bandeirantes dessa região.
Segundo Santos (1973, p. 43), esse desinteresse ocorreu devido ao fato
de o grupo ser “...seminômade, (viverem) dispersos em pequenos grupos; (falarem)
uma língua diferente e (não possuírem) maiores tradições em trabalhos agrícolas”.
Era mais viável submeter o guarani do litoral, com o qual os portugueses não
sentiram, inicialmente, muita dificuldade em dominar. Sendo assim, a sociedade
Xokleng começou a ter contato com a sociedade nacional no momento da abertura
do caminho das tropas, no século XVIII.
O contato efetivo, porém, ocorreu somente a partir do século XIX, quando
pressões internacionais eliminaram a escravidão negra e fomentaram a imigração de
contingentes europeus como alemães, italianos, poloneses e outros como mão-deobra. Nesse período, o governo provincial tenciona a ocupação dos vales que
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margeavam os grandes rios, entre eles Itajaí, Tubarão e Araranguá, onde
encontrariam a região ocupada pelos Xokleng (Santos, 1969, p. 22).
O contato acentuado com o branco trouxe logo de início: doenças
desconhecidas pelo organismo dos índios, o que provocou um verdadeiro
holocausto. Males como a gripe, o sarampo, a malária, a coqueluche atingiram os
Xokleng: que tentaram curar a base de ervas e antigas práticas tribais, sem sucesso.
Em relação aos conflitos é difícil definir que os iniciou pode tanto ter sido
um Xokleng que matou um boi dos colonos para comer, como pode ter sido um
branco que atirou em um índio por medo, mas é fácil perceber quem saiu perdendo
nessa história. Foi dessa forma que começou uma matança institucionalizada em
nosso país: em 1808, uma carta régia de D. Pedro VI já decretava “guerra aos índios
de Lages”. O massacre, bancado e legitimado pelo Estado, se propôs a eliminar o
que era considerado um entrave à civilização. Grupos de homens conhecidos por
bugreiros saíam em expedições de extermínio, até poucos anos. Bastava o menor
indício da passagem de um índio por um lugar para os colonos ou criadores se
juntarem em bandos bem armados e pôr-se em seu encalço, escreveu Ribeiro,
(1986) em um capítulo dedicado aos Xokleng do livro Os Índios e a Civilização. “O
índio era considerado fora-da-lei, seu assassinato era não somente impune, mas
estimulado e reverenciado como obra meritória”.
2.2 Ocupação Pré-Colonial do Vale de Araranguá
A região que hoje abriga o município de Araranguá no início do século XIX
tinha alguns moradores, como por exemplo, barqueiros ou balseiros, que se fixaram
às margens do grande rio. Conforme Campos (1987, p. 10), porém em 1810 sabe-se
das primeiras sesmarias concedidas ás margens de um rio que ainda não possuía
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nome fixo: Ariringuá, Araringuá, Araranguá. Posteriormente formou-se o vilarejo da
povoação, na margem direita, seguindo pelo povoado de Cangicas, atualmente
Hercílio Luz. A guerra dos Farrapos traz muitos refugiados para esta região. Então o
governo preocupa-se em fundar uma vila talvez pretendendo garantir segurança.
Mandando uma comissão procurar uma localidade com boas condições de
habitação. Por volta de 1848 esta comissão decide-se por uma localidade em mata
densa, chamada pelos tropeiros de Capão da Espera. Surgiu uma minúscula
povoação a que deu o nome de Campinas do Sul. Apesar de uma população
pequena espalhada em um imenso território a freguesia é elevada a categoria de
vila e recebe o nome Araranguá e em 1883 é instalado o município.
Ali [no Capão da Espera]. Pela fartura da frondosa mata e da aguarda, a
gadaria e os tropeiros encontravam o seu paraíso. O entreposto era
movimentado e álacre. As esporas dos tropeiros tilintando, o resfolegar
nervoso dos cavalos, o gado todo descansado deitado na relva. Os
homens afiavam as facas, escolhiam uma rês e a sacrificavam para o
churrasco. Começava então, a única parte divertida daquela vida de
canseiras e monotonia. (MACHADO, apud COELHO, 2003, p. 123).
Compreendendo a o início da colonização do território percebe-se que o
povoamento ocorreu inicialmente em áreas que ofereciam boas condições de
sobrevivência: proximidade de matas que ofereciam madeira e caça; margens do rio
que propiciava a pesca, a navegação entre outras características.
Enfim, da mesma forma a ocupação pré-colonial se deu devido aos
recursos oferecidos pelo território, as proximidades dos rios e dos morros com mata
fechada inspiravam a sobrevivência destes povos.
A descrição geográfica e geomorfológica do território em estudo é um
elemento de considerável utilidade para a compreensão da ocupação do território
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por grupos pré-coloniais, no caso o estudo se restringe à segunda metade do século
XIX e início do século XX.
Por exemplo, as características do litoral catarinense favoreceram e
atraíram os assentamentos humanos: a geomorfologia das praias arenosas de curta
e média extensão, separadas por costões rochosos, lençóis conchíferos, uma fauna
marinha e terrestre extremamente exuberante, enfim, um ecossistema que oferecia
abundantes fontes de alimentação.
Campos, (1987, p. 164-165), descreve o Vale de Araranguá no ano de
1909 como município com 78 quilômetros de norte a sul e 65 de leste a oeste, dando
uma área superior 5.000 quilômetros quadrado, sendo desta, mais ou menos, a 5ª
parte cultivada. Com população de 17.000 habitantes. Cita que o litoral possuía solo
plano em toda sua extensão, desde a foz do Rio Urussanga, limite norte do
município, até o rio Mambituba limite sul sendo, além disso, arenoso. Transporta a
Praia do Mar Grosso, começa o terreno a ser coberto de pastagens, denominadas
“Campos”, encontrando-se ali muita lagoa, matas capões e, de vez em quando,
banhados maiores ou menores. Assim estende-se esta planície de norte a sul, em
direção a oeste, encontrando-se também em diversas lagoas navegáveis, como a de
Urussanga, do Estevão, da Mãe Luzia, da Serra do Caverá do Sombrio, quase todas
ligadas por sangradouros. Em direção a oeste há alguns morros e morretes isolados,
como Morro Agudo, Conventos, Mãe Luzia, Morretes, Cortado, todos, porém,
aproveitáveis para o plantio do café e da bananeira.
No litoral as culturas principais são a mandioca, a cana-de-açúcar. Na
parte acidentada, terreno argiloso, nas proximidades da Serra. Cultivam milho, feijão,
arroz, etc. Na parte colonial, muito próximo da Serra, seu clima difere do litoral,
apropriado para outras culturas, como a vinha e frutas européias. Os principais rios
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são Araranguá e seus afluentes, Itopaba e Mãe Luzia. Verifica-se ainda que neste
período o rio Araranguá oferecia franca navegação, entretanto possuía uma barra
ingrata quase sem água.
[...] Já no tempo do Pe. Anchieta, no fim do século XVI foi visitada pelos
padres Jesuítas, que em diversas tentativas, iniciaram a catequização dos
índios carijós. A seguir foi devassada pelos bandeirantes em busca de
minas de ouro e de prata. Missionários Franciscanos, sediados em Vila
Nova, também se dedicaram à catequização dos índios. Então chegaram
os vicentistas preadores de bugres para suas lavouras. Expulsam os
missionários e capturam dezenas de milhares de pacíficos carijós
despovoando completamente nossas praias. No interior, nas florestas,
campeia livre, por longo tempo ainda, o indômito índio Kaingang, botocudo.
Pertenceriam a Portugal estas terras? Por muitos anos ficaram em
completo abandono, não sendo ocupadas nem pelos espanhóis nem pelos
portugueses. Em 1728, esta região obtém notoriedade nacional ao se
traçar por ela o início da primeira estrada ligando o sul ao centro, caminho
de tropas que recebe o nome de Estrada dos Conventos. (DALL´ALBA,
1986, apud CAMPOS, 1987, p. 9).
Analisado obras da região do vale de araranguá observam-se citações que
relatam a presença e a forma como os “índios” eram tratados e como se
relacionavam com os colonizadores. Ainda percebe-se a maneira como atualmente
são encarados aqueles que inicialmente ocuparam o território.
Falando sobre a História de Praia Grande Ronsoni, (1999, p. 26) descreve:
O elemento indígena não se perdeu para o povoamento atual. Enquanto
uma parte ia pouco a pouco diluindo-se quase imperceptivelmente uma
outra ia ficando a margem até desaparecer completamente. Os carijós
desapareceram bastante cedo. No fim do século passado infestaram as
margens do grande sertão Praiagrandense, descendo às vezes até o litoral.
Os bugres ou botucudos eram avessos à assimilação pelos brancos e dos
mais atrasados do Brasil, ao contrário dos carijós. Até 1900 havia ainda
bastante selvagens, entre São João do Sul, Praia Grande e o município de
Mambituba. Não eram certamente carijós provavelmente bugres. Como os
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bugres do planalto de Lages, Rio do Sul e Blumenau foram também
prejudicados pelos brancos, entre os quais celebrizou Martinho Bugreiro.
Mas, logo desapareceram.
No livro Assim Nasceu Sombrio de Coelho (2003, p.187) remontando a
história de um dos primeiros povoadores João José por volta de 1825 relata:
Além do isolamento dos campos de dentro, outra dificuldade enfrentada por
João José era o convívio com os Xokleng, que foram conquistados aos
poucos até que se tornassem seus amigos. Para agradá-los, João sempre
lhes deixava comida em um descampado, atrás de seus engenhos. Após
meses de tentativas, conseguiu estabelecer os primeiros contatos através
de sinais, mas deixava claro – vez por outra dando tiros de pistola em
animais – que não admitia qualquer excesso por parte dos indígenas.
Narra ainda Coelho, (2003, p.196) que a partir do mês de novembro do
ano de 1827 que os anos de convivência pacífica estavam por acabar, João José
deixou de presentear os indígenas com comida e começaram a ocorrem conflitos os
índios atacavam o engenho e as casa do colono, posteriormente, flechando entes da
família de João José Guimarães:
Foi uma tragédia, uma coisa que nunca tinha visto. A patroa du João José,
muito gorda, caiu ali na frente da casa i não conseguiu se levantá mais ,
era flecha de todo o lado...(Gentil Valério da Cunha 1928/2001, tataraneto
materno de João José Guimarães)
Em entrevistas com moradores do vale de Araranguá Dall’Alba (1997, p.
434) reuniu depoimentos que mostram a presença dos indígenas na região referida:
O Senhor Pompeu Francisco Lummertz residente em Passo do Sertão (São João do
Sul) narrou em entrevista no ano de 1986 que “Aqui existia bugre, mas não houve
ataques, nem se sabe de matanças feitas pelo povo daqui contra eles.
21
Encontravam-se coisas de bugres. Aqui perto tem um cemitério de índios. Andaram
lavrando umas terras e acharam urnas de bugres. Ninguém conservou nada.”
Dall’Alba, (1997, p. 421) em sua vasta obra Histórias do Grande Araranguá
reúne vários depoimentos de diferentes localidades onde a presença indígena é
citada. Em relação ao território que hoje compreende o município de Turvo o Sr. Lino
Honorato Fernandes narra:
O mane Cambão me contava muitas histórias de bugres. Ai nós
perguntávamos porque eles fizeram essa traição e mataram os bugres.
Dizia que começaram porque os bugres tinham matado uma mulher
grávida ali no Manoel Alves. Dizia que pediram autorização e até armas do
governo para matança.
No município de Maracajá várias pessoas relembram as histórias que os
pais ou avós contavam sobre os “bugres”.
O senhor Astir Demétrio da Rocha morador antigo do município de
Maracajá em entrevista concedida dia 02 de setembro de 2005 relata:
Meu avô Francilino Machado quando eu conheci ele já tinha 100 anos,
durou 107. Ele contava muita história de índio. Dizia que eles eram
obrigados a trabalhar com uma pistola na cinta porque eles avançavam, se
pudessem saquear as casa deles eles saqueavam roubavam eram uns
malandros roubavam mulher, a bisavó da Márcia do Deni foi roubada lá no
Meleiro, ela tava lavando roupa era recém casada roubaram ela e levaram
mato a dentro ela sabia ler e escrever, ai tinha o falecido Berto Rocha que
era caçador deles, bugreiro.
As senhoras Alvina (83 anos) e Alcedina Celso Freitas (81 anos) em
entrevista concedida no dia 04 de abril de 2005, filhas de Celso Freitas um dos
primeiros moradores do município de Maracajá lembram que sua mãe contava que
tinha índios no costa do morro Maracajá, que eles assobiavam paras os seus
companheiros. Elas tinham medo relataram que quando caminhavam em mata
22
fechada ou em torno do rio na comunidade de Volta Curta sua mãe mandava ficarem
bem quietas para não despertar os bugres.
Portanto, observa-se que os grupos humanos que ocupavam o território do
vale do rio Araranguá antes da chegada dos colonizadores circulavam por diversas
áreas do litoral ao interior com a presença dos novos “Donos das Terras” iniciaramse os embates entre os mesmos e os chamados “bugres”.
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3 OCUPAÇÃO E CONFLITO: OS EUROPEUS ENTRAM EM CENA
Analisando documentos do século XIX enviados pelos delegados e
subdelegados de polícia na província de Santa Catarina aos administradores e ao
Governo Imperial observam-se afirmações referentes ao contato entre colonizadores
e indígenas:
[...] é assunto que deve merecer-vos particular atenção a medição e
demarcação das terras concedidas a Província pela lei nº 514 de 28 de
outubro de 1848 medidas e demarcadas estas terras, estará a província
habilitada a fundar núcleos coloniais, por sua conta, ou por empresas
particulares, conforme as circunstâncias aconselharem. O governo imperial,
por aviso de 18 de junho de 1859 expedido pelo ministro do Império, em
deferimento a uma representação desta Assembléia já autorizou medir-se e
demarcar-se por conta das seis léguas em quadro concedidas, uma légua a
margem direita do rio Araranguá, acima do lugar denominado Itapeva no
município de Laguna, e outro na várzea das navalhas e Taquara, a quem da
Boa Vista, no Município de São José. Serviços desta ordem que resultarão
vantagem não devem ser adiados. O futuro da província prende-se a
colonização de suas terras, mateiros, embrenharão-se nas matas e
afugentara os selvagens, restituindo a paz nas famílias”. (SCHEIBE,
1996).
Outros relatórios dos delegados e sub-delegados narram ataques de
indígenas saqueando estabelecimentos comerciais e casas em diferentes regiões do
estado.
Analisando-se documentos oficiais do ano de 1882 da província encontrase dados referentes ao financiamento de medidas de prevenção contra os “índios
selvagens” para garantir a propriedade e a vida dos habitantes em diferentes pontos
da província e a participação dos próprios índios nestas ações.
[...] o cidadão Manoel Alves da Rocha, indicado pelo referido cônsul,
propõe-se, com índios mansos, moradores nos Campos de Palmas da
Província do Paraná afugentar completamente os selvagens de toda a
região que compreende as colônias de Santa Thereza e Theresopolis e os
sertões de Capivary, Gravatal e Braço do Norte, nos municípios de Laguna
e Tubarão mediante aquela somo de 3:000$000 rs. [Trecho do relatório
24
com que o Exm. SR Dezembargador João Rodrigues Chaves passou a
administração da província ao Exm. Sr. DR. Joaquim Augusto do
Livramento 3º Vice presidente em 9 de março de 1882 em Desterro].
(SCHEIBE, 1996).
Vieira e Nötzold (2004, p. 63-64) enfatizam que foi a partir do
estabelecimento de uma Companhia colonizadora, que ocorreram os primeiros
contatos entre os colonos e a população nativa. A concessão de terras aos
imigrantes, desconsiderando a presença do indígena, fatalmente levaria ao
“estranhamento”, seguido pelo enfrentamento, e a medida que o contingente
europeu aumentava , aumentavam também os embates.
Dall’ Alba (1983 p. 57-58) subscrevendo documentos do período da
imigração italiana e relatórios das empresas colonizadoras propicia, como ele
mesmo escreve “...uma janela aberta sobre um período que parecia perdido para a
memória.” transcrevendo o relatório do Cav. Alberto Roti Cônsul Real em
Florianópolis no mês de outubro de 1895:
[...] os índios, vulgarmente chamados bugres espalhados pelo Estado, são
nômades, em estado selvagem, e não contam como elemento social.
Pertencem ao grande troco Tupi-guarani, formando tribo não muito
numerosa, que habita o alto da Serra Geral e do Mar, ocupando
especialmente as cabeceiras das bacias do rio Itajaí-guassu...De qualquer
maneira, sua presença nas costas da serra é constante. Vivem da caça e
de frutas, fogem do homem civilizado, e se retiram diante da colonização e
da civilização que avança. Só assaltam as colônias quando desprovidas de
caça e de frutas, e após longa observação, para estar seguros de não
encontrar residências. Por isso sempre atacam as casa das linhas mais
longínquas. Em raras ocasiões agrediram viajantes. Nunca foram vistos
fazer atos de agressões durante a noite. Não é fácil estabelecer relações
com estes seres, mas é preciso constatar que bem pouco se fez com este
intento. Os colonos limitavam-se a persegui-los depois de correria,
matando alguns, geralmente trazendo crianças, que são depois mantidas e
educadas. As agressões mais raras, à medida que aumentam as
derrubadas e a população do território. É impossível conhecer-lhe o
número, pessoas práticas supõe que não superam o meio milhar.
Lavina (2004, p. 5) também afirma que a partir do início do século XIX,
com o incremento da migração européia em SC, o território dos Xokleng vai ser
25
invadido por colonos alemães, no vale do Itajaí, e italianos no sul do estado. No
confronto com europeus com armas modernas, os Xokleng vão ser exterminados,
principalmente em massacres promovidos por bugreiros.
Dall’ Alba (1983) transcrevendo trecho do livro caixa de uma Empresa
Colonizadora: Companhia Metropolitana da Colônia de Nova Veneza Santa Catarina
subsidiária da Empresa Angelo Fiorita e Ciacom sede no Rio de Janeiro. No Termo
de Abertura, de 4 de Janeiro de 1891 consta, “nem tudo é paz na colônia. Há
colonos que se retiram revoltados. Dois são presos e levados a tubarão. Giácomo
Razzolo foi roubado pelos índios e a Companhia lhe dá auxilio de 17$000.”
A caracterização dos Xokleng como “selvagens desalmados” que tudo
faziam para matar ao branco, foi comum e necessária para se justificar as ações que
sobre eles deflagravam os bugreiros e os colonos. (SANTOS, 1973, p.98).
Várias histórias sobre a agressividade dos Xokleng foram usadas para
considerá-los indomesticáveis, traiçoeiros, inclinados ao roubo, sendo seu maior
prazer matar os brancos Outro dado sobre o contato dos colonizadores italianos com
os índios é encontrado no livro caixa da Companhia colonizadora Metropolitana.
Colônia de Nova Veneza em 1891. “Natal Coral recebe salário de março a outubro
de 1892 como feitor. Era bugreiro famoso. Em março houvera um ataque de bugres.
Deve ter havido uma hecatombe em meio às selvas”. (DALL’ ALBA, 1983, p. 59).
Analisando dados etnográficos e etnohistóricos Farias (2005) avalia que
os Xokleng não tinham noção de propriedade. Eles só não se apropriavam mais de
vários outros objetos das propriedades rurais porque temiam as represálias. Para
eles era totalmente normal pegar um barco, uma roupa e levar para a aldeia. Os
colonos tinham duas opções: ou os tratavam com hostilidade, para que ficassem
26
sempre longe, ou tentavam lhes agradar com presentes, para que se tornassem
amigos.
Escrevendo generalizadamente sobre a importância do território para as
sociedades indígenas, Ramos (1994, p. 13) destaca que para eles a terra é muito
mais do que simples meio de sobrevivência, representa sim, o suporte da vida social
e está diretamente ligada ao sistema de crenças e conhecimento. Não é apenas um
recurso natural, mas, e tão importante quanto este, um recurso sociocultural.
Enfatiza ainda que sendo um recurso natural vinculado à vida social como um todo,
a terra não é e não pode ser objeto de propriedade individual. É enfática quando
afirma “De fato, a noção de propriedade privada da terra não existe nas sociedades
indígenas.”
Marzano (1985, p. 70-73) narrado os desafios dos colonos e missionários
no sul do Brasil destaca que, por volta de 1878 quando iniciaram os italianos, nova
vida em plena mata virgem na região de Urussangua: Os brasileiros, ou seja, os
portugueses, pois nesta época quase todos tinham nascidos no Brasil, sendo
perfeitos conhecedores da mata maravilhavam-se ao ver nossos colonos caminhar,
sozinhos e sem armas, pelas picadas abertas em plena floresta virgem e não só
homens, mas também mulheres e crianças. Mais de uma vez avisaram os italianos
que estivessem em guarda e que não entrassem sozinhos e sem armas na mata,
porque havia muitos selvagens. Mais dias, menos dias, iria conhecê-los e
experimentar-lhes as terríveis flechas.
Destaca ainda Marzano (1985, p. 72) “Os colonos por sua vez incapazes
de providenciar uma arma por falta de dinheiro, seja também por sua coragem,
passaram quatro ou cinco anos despreocupados, sem pensar absolutamente nos
indígenas”.
27
Santos (1973, p. 60-61) informa que até os finais do século XVIII são raros
os dados a respeito de ataques de índios aos civilizados. As escassas notícias são
ainda prejudicadas pela falta de indicação para nos permitir saber qual o grupo tribal
responsável pelo ataque. Sabe-se que em trechos do “caminho de tropas” os
tropeiros costumavam contar com a proteção de vaqueanos, conhecedores exímios
das veredas e dos hábitos dos indígenas, para fazerem a travessia em segurança.
As noticias, entretanto, são bastantes vagas. Elas referem-se a ataques ou ameaças
de índios, mas não esclarecem sobre o que realmente aconteceu. É provável dado a
escassa população e ao tamanho da área, que vez ou outra o índio dava ares de
sua presença, ameaçando o civilizado. Contudo pouco ficou registrado. No inicio do
século XIX, 1808, aparecem as primeiras noticias concretas sobre os confrontos,
mas, é com a colonização que eles se intensificam.
Machado (2004, p. 58) afirma que normalmente, a população “branca”
procedia à eliminação dos bugres das regiões recém ocupadas como forma
preventiva de “limpeza de terreno”. Além da disputa óbvia por espaço, a população
colonizadora não reconhecia os indígenas como gente. Esta prática genocida dos
pioneiros foi mantida pela população posterior, que continuou resolvendo muitos de
seus problemas de terras por meio da violência física.
Hobold (1994, p. 19), enfatiza que nos primórdios, as relações entre os
forasteiros e os indígenas foram pacíficas. Chegara, porém, a época de sua
escravização e de seu extermínio, principalmente pelos portugueses paulistas. Não
há dúvida que, sobretudo, desde a segunda década de 1600, a economia dos
vicentistas repousava na caça ao índio e sua venda aos consumidores que se
situavam, em maior parte, no nordeste do Brasil, onde sempre houve enorme
demanda de mão de obra para as lavouras de cana de açúcar e os engenhos. O
28
tráfico tornou-se um comércio regular, o que contribuiu largamente para a dizimação
impiedosa de imensos contingentes indígenas.
As áreas todas do atual estado de Santa Catarina, inclusive, portanto, o
Vale do Rio Araranguá, foram atingidas pelos efeitos exterminadores, pois na época
da colonização havia apenas grupos residuais de colonizadores sediados em
trechos de matas litorâneas e planálticas.
Em carta do delegado de Laguna José Martins Vieira ao presidente João
José Coutinho, o primeiro informa que em 19 de janeiro de 1857 um grupo de
silvícolas assaltou duas casas em Araranguá. Alguns meses mais tarde, o
subdelegado suplente do distrito de Araranguá Manoel Pereira de Souza Elena
informa ao delegado de Laguna José Vieira Martins sobre o ataque dos Bugres às
moradas de José Pereira de Castro e Manoel Cardoso dos Santos, ocorrido em 26
de Dezembro de 1857 na localidade de Morro Cortado (SCHEIBE, 1996).
Notícias sobre os embates entre colonizadores e índios são narrados em
inúmeras entrevistas realizados por Dall´Alba (1997) para composição de seu Livro
Memórias do Grande Araranguá:
Felipe Honorato de Freitas morador da comunidade de Volta Curta limite
geográfico do município de Maracajá hoje, lembra que:
“os velhos contavam que os índios assustavam quando eles estavam
cortando cana. Até um dia, camarada foi lá cortar cana. Já estava alto o dia
e estava um índio dormindo na palhada. Bateu as mãos para acordá-lo.
Acordou e sumiu no canavial. Mas o índio não gostou daquilo e virou a
perseguir o homem... isto aqui na Volta Curta , mas na margem esquerda
do rio. Os índios eram perigosos, atacavam. Mas tinha caçador de bugre.
Meu pai contava de um tal de Joaquim Felisbino muito famoso perseguidor
de bugrada. Ficava negaciando os bugres. De noite atacava. Chegava lá
eles estavam dormindo com os pés para a fogueira. Diz que, dormindo,
eles assobiavam pelo beiço furado, uns roncavam . Aí caíam em cima de
surpresa. Degolavam uns, furavam, outros, tudo a facão. O bugreiro ia lá
com 4 ou 5, uma porção de homens armados de facão, de pistolão e
espingarda. Esse Joaquim Felizbino matou muito índio. Esse caso se deu
aí no morro do Maracajá, no Mãe Luzia (Dall’Alba, 1997, p. 194).
29
Lídio Machado, 85 anos antigo morador de Maracajá relata que:
“Havia bugres aqui nos morros da Mãe Luzia. Aqui, para cá do São Pedro,
mataram uma mulher. Estava na roça e flecharam. Mas havia bugreiros. Falavam
nesses Coral. Quando cheguei aqui tinha. Lá no morro da toca era uma morada
deles”. (DALL’ALBA, 1997, p.300).
Antonio Patrício da Silva antigo morador da comunidade de Barro
Vermelho divisa territorial entre Maracajá e Araranguá também entrevistado
em 1986 narra: “Aqui no Morro do Barro Vermelho os bugres mataram uma
mulher. Ela era dos Leandro. Foram chamar o Daniel. Achou a mulher mais
acima coberta de folhas. E foi seguindo os bugres. Mas nesse tempo eles
já iam fugindo. Só encontrou o equipamento deles, tinha uns arcos, cortou.
Não sei se ele matou índios antes. ( DALL’ALBA,1997, p. 294-304).
Atualmente muitos moradores antigos do município e da região também
relatam as histórias repassadas de geração em geração sobre a presença indígena
em nossos territórios. O senhor José Bento da Rocha com 106 anos morador da
comunidade de Cedro relata a coluna História Viva do Jornal Folha Regional, escrita
por Moraes (2004, p. 3):
“Quando eu tinha, uns nove anos de idade a cidade tinha muito mato onde
os bugres viviam. [...] quando uma pessoa era atacada, se fosse encontrada morta
estaria sem roupas, eles também atacavam as roças para roubar alimentos”.
A senhora Avelina Henrique Felisberto com 87 anos moradora da
comunidade do Encruzo do Barro Vermelho em entrevista concedida no dia 16 de
março de 2005 revela outros dados sobre a presença dos índios na região.
“Eu sei que o meu avo Zé Pedro, pai da minha mãe foi morto por uma
flechada de índio, ele estava derrubando uma coivara, não sei eles
matavam índio ou queimavam os acampamentos deles, mas eu sei que o
meu avô foi morto por índio. E os índios também roubavam para comer.
Nos morávamos na comunidade de Volta Silveira perto do rio, mas,
pertencia a Araranguá”.
30
No Vale de Araranguá muitas são as histórias de embates entre os
colonizadores e os nativos verifica-se abaixo uma história ocorrida no município de
Praia Grande.
O índio e a lavadeira no século passado. Nos fins do século passado
residiam neste sertão praia grandense na localidade de “Molha Coco”, hoje
Vila Rosa, Florêncio Pereira Maciel ... e sua mulher Clarinda Fernandes de
Lima ... agricultores e proprietários de canaviais... na época ainda eram
posseiros ilegais destas terras ... Clarinda lavava as roupas da família no
Rio Molha Coco, próximo a velha subida da serra por tropeiros. Já
começou a ser vigiada por um índio, onde todos os dias jogava pedrinhas
na água defronte a sua tábua de lavar, não gostando nem um pouco da
brincadeira, contou ao seu marido Florêncio, este comentou com o seu
empregado Feliciano, que preparou ao índio uma emboscada dando-lhe
um tiro certeiro sobre o peito com uma espingarda antiga de se carregar
pela boca. Meia dúzia de balas ficavam cravadas no peito do índio,
deixando-o estendido no mesmo local. Em seguida os índios de sua tribo o
recolheram, mas iniciou a perseguição por parte dos índios, que durante a
noite apedrejaram sua casa e também não deixavam-no trabalhar no
engenho. Conseguiram amedrontar os índios. Pensando estar tudo
normalizado por parte dos Maciel, algumas semanas mais tarde a irmã de
Clarinda volta a lavar roupas no mesmo local. Passado muito da hora que
deveria regressar a casa, foram atrás da pobre moça, que estas horas já
estava com uma flecha atravessada em seu corpo, já agonizando, sendo
levada nos braços já chegou em casa sem vida. ( ROSONI, 1999. p. 67).
Esses relatos demonstram que o contato entre índios e colonizador não foi
dos mais amistosos. Ambos estavam a mercê de um governo inoperante e
irresponsável. Optando pela dizimação total dos grupos indígenas, incitando a
formação de “mateiros” e “bugreiros” que mataram impiedosamente milhares de
pessoas em ações de tocaia, esse governo não realizou nenhuma ação anterior de
apaziguamento ou reestruturação do espaço indígena.
Arns (2002, p. 51) relata sobre a falta de proteção contra os índios,
praticamente abandonados, sobretudo pelas autoridades brasileiras.
Os imigrantes alemães disputavam o espaço e até a vez, com os indígenas
da mata virgem. O governo se mostrava indiferente aos problemas
existentes até que se instaurou um clima de pânico entre os habitantes
devido a constantes ataques dos índios aos imigrantes. Foi somente então
31
que o presidente da Província, em 20 de agosto de 1862, determinou o
envio de praças, soldados, para “afugentar os gentios e pôr em segurança
e tranqüilidade, os colonos. Na verdade, colonos e indígenas disputavam o
mesmo espaço físico e estavam em pé de guerra literalmente. O governo
Imperial se eximiu de sua responsabilidade ao deixar de proporcionar a
estrutura básica para o desenvolvimento econômico da Colônia e a
proteção de seus habitantes.
32
4 HISTÓRIA, MEMÓRIA E METODOLOGIA DA HISTÓRIA ORAL
4.1 História Cultural
A discussão sucinta sobre os estágios do pensamento histórico se faz
necessária para compreensão de alguns conceitos. Apontando o pensamento de
Hunt (1992), o avanço para a história social foi estimulado por influências marxistas
e da escola dos “Annales”, com essa inspiração os historiadores das décadas de
1960 e 1970 abandonaram os mais tradicionais relatos históricos de líderes políticos
e instituições políticas e direcionaram seus interesses pra as investigações da
composição social e da vida cotidiana. Com Braudel, autor de destaque na escola
dos “Annales”, rejeita-se a história dos acontecimentos, segundo Braudel o que
realmente importa são as mudanças econômicas e sociais de longo prazo e as
mudanças geo-histórica de muito longo prazo. Dentro dos pensamentos dos Annales
a terceira geração de historiadores estabeleceu um modelo alternativo de história
regional total, pretendiam mudar o eixo da história para passar a estudar a história
do cotidiano. Para estes a vida política, cultural e intelectual configuravam um
terceiro nível. A história intelectual e cultural chamada pelos franceses de mentalités,
passou a ser contestada pela quarta geração dos Annales, historiadores como
Chartier e Revel. Chartier (1990, p. 9). Por sua vez explica que “a relação assim
estabelecida não é de dependência das estruturas mentais quanto a suas
determinações materiais. As próprias representações do mundo social são os
componentes da realidade social”.
A partir deste contexto de análise da evolução do pensamento histórico,
considera-se que a cidade é representada por seus monumentos, tradições, cultos,
33
religiosidade, ou seja, pelo seu patrimônio histórico, que se expressa pelos bens
móveis e imóveis, definindo a identidade individual e coletiva.
Chartier (1990, p. 17), afirma que “a história cultural, tem por principal
objeto identificar o modo como em diferentes lugares e momentos uma determinada
realidade social é construída pensada, dada a ler”. Este pensamento justifica a
investigação que se propõe nesta monografia: Como se deram às relações entre os
colonizadores e os ocupantes do território do vele de Araranguá.
Pesavento, (2004, p. 39) descreve sobre as mudanças epistemológicas
deste novo campo “história Cultural” destacando a representação como o primeiro
conceito que reorienta a postura do historia dor. Relata que:
Maus e Durkheim estudaram, nos chamados povos primitivos atuais, as
formas integradoras da vida social, construídas pelos homens para manter
a coesão do grupo e que propõem como representação do mundo.
Expressas por normas, instituições, discursos, imagens e ritos, tais
representações formam como que uma realidade paralela à existência dos
indivíduos, mas fazem os homens viverem por elas e nelas.
Chartier (apud Hunt, 1992, p. 25) reitera sua convicção de que “a cultura
não se situa acima e abaixo das relações econômica e sociais, nem pode ser
alinhada com elas”. Pois, todas as práticas, sejam econômicas ou culturais,
dependem das representações utilizadas pelos indivíduos para darem sentido a seu
mundo.
“As representações construídas sobre o mundo não só se colocam no
lugar deste mundo, como fazem com que os homens percebam a realidade e
pautem a sua existência”. Enfatiza Pesavento (2004, p.39).
As representações sociais mostram-se multifacetadas, o que determina,
de certa forma o caráter plural da Nova História Cultural. Abordagens ancoradas
nesse campo ampliariam o leque de problematizações acerca da história indígena.
34
Apesar de distintos, modelos de história cultural de Ginzburg, Chartier
e E. P.
Thompson, pontuam elementos teórico-metodológicos tão importantes quanto
necessários para a compreensão do processo histórico-cultural dos povos. É nesse
sentido, que se faz necessário um direcionamento epistemológico que possibilite a
resignificação histórica dos povos indígenas, considerando toda a sua complexidade
cultural. (MOUTINHO, 2004).
Conclui-se a partir dos pensamentos destes autores que na História
Cultural os indivíduos e grupos dão sentido a vida e ao mundo por meio das
representações que constroem sobre a realidade. E essas representações são as
matrizes geradoras de condutas e práticas sociais.
4.2 Memória
Um dos instrumentos de análise da história cultural é a memória. Individual
ou coletiva ela auxilia na representação e na interpretação do acontecido. O
entendimento de memória seu conceito e função são fundamentais para o
desenvolvimento desta pesquisa, pois a partir de lembranças das experiências
selecionadas pela memória poderá se resignificar a história dando, por exemplo,
visibilidade a povos que habitaram região sul do estado de Santa Catarina e que, no
entanto são pouco citados, estudados ou considerados ocupantes do território.
A memória envolve processos de representação de si mesma e do
mundo. Funciona como o antídoto do esquecimento e está ligada diretamente à
afetividade e aos desejos. A memória narra os fatos vividos, ou que pensam ter
vivido, interpretando o que se viveu ou o que se pensa ter recordado. A relação
afetiva com o passado nos torna narradores, memorialistas – ou, na expressão
35
utilizada por Le Goff (1996), “homens-memória”. Ela memória narra os fatos que
vivemos, ou que pensamos ter vivido, interpretando o que se viveu ou o que se
pensa ter recordado. A memória configura-se como a matéria mais irrenunciável do
homem, aproxima-o da imortalidade.
Le Goff (1996, p. 469-470) em relação à memória afirma que:
A memória é um elemento essencial do que se costuma chamar
identidade, individual ou coletiva, cuja busca é uma das atividades
fundamentais dos indivíduos e das sociedades de hoje, na febre e na
angústia. Mas a memória é não somente uma conquista é também um
instrumento e um objeto de poder.
Além disso, a memória relaciona-se com a identidade individual ou
coletiva, porque a história é feita de coletivos. Segundo Veyne (1979, p.75), não
podemos considerar os indivíduos “fora das coalizões, das instituições, do corpo
político, pois quando ele aí entra já está modelado pela sociedade, ou seja, pela
história anterior”. Cultivamos a memória para nos identificar. Somos a única espécie
que preserva a memória para garantir a própria sobrevivência.
Assim como procuramos refazer a nossa história e reavivar a nossa
memória, também o fazemos em relação aos nossos espaços. Estes apontam para
uma comunicação simbólica, através de uma relação íntima estabelecida entre os
homens e os objetos. Em outras palavras, a materialização simbólica do espaço está
relacionada à história e memória de um determinado grupo social, identificando-o.
Na construção do depoimento das pessoas, estão presentes não só a
reconstrução do passado, mas expectativas do que deveria ter sido, além da seleção
de fatos e emissão de conceitos influenciados pelas disputas sobre qual memória é
válida como discurso de trajetória.
36
Ao fazer-se uso do conceito de memória em sua amplitude, dá-se direitos
ao passado dos índios, dos negros, dos brancos, dos pobres e dos ricos,
privilegiados ou não, enfim, para todos os agentes da história. Encontra-se, na
memória, a base para a construção da identidade, da consciência do indivíduo e dos
grupos sociais.
Muitas vezes uma imagem, um cheiro uma música, um objeto provocam
uma reviravolta em nossas vidas revivendo experiências que marcaram a sua
trajetória. A história de vida funciona como um instrumento de reconstrução da
identidade e não relatos factuais. Os objetos são, portanto evocadores da memória e
dão impressão de continuidade e podem revelar padrões de comportamento e a
própria vida do seu dono. (BOSI, 1987, p. 360).
A cultura material indígena traz lembranças de experiências vividas não
pelos entrevistados, mas, pelas gerações que o antecederam enfatizando assim a
presença desses povos no mesmo território que ocupam no presente. Algo
interessante acontece entre alguns entrevistados que simplesmente repetem
discursos extremamente excludentes e ideológicos, que associam a ocupação do
território apenas aos “heróicos” colonizadores europeus. Bosi, (1987, p. 360), explica
que quando queremos recordar do que nos aconteceu, pode-se confundir
seguidamente o que escutamos dos outros com nossas próprias lembranças.
Pode-se dizer segundo Pollak (1992, p. 212) que a memória é um
elemento constituinte do sentimento de identidade, tanto individual como coletiva na
medida em que ela é também um fator extremamente importante do sentimento de
continuidade e de coerência de uma pessoa ou de um grupo em sua reconstrução
de si.
37
Para os historiadores é de fundamental importância ter-se clareza da
amplitude de significados deste conceito. Para Halbwachs in Pollak (1992, p.200) a
memória deve ser entendida também, ou, sobretudo, como um fenômeno coletivo e
social, como um fenômeno construído coletivamente e submetido a flutuações,
transformações, mudanças constantes.
Diante de uma sociedade pós-industrial, as identidades regionais são
fortemente abaladas pelo movimento da globalização, e isto reflete no significado da
memória, como uma tendência de massificar e ocultar a memória popular e coletiva
das pessoas que ficaram fora da história oficial, como expectadores e não vistos
como agentes participativos deste processo histórico. Por isso,
[...] a memória rema contra a maré; o meio urbano afasta as pessoas que
já não se visitam, faltam os companheiros que sustentavam as lembranças
e já se dispersaram; Daí a importância da coletividade no suporte da
memória. Quando as vozes das testemunhas se dispersaram, se apagam,
nós ficamos sem guia para percorrer os caminhos da nossa história mais
recente: quem nos conduzirá em suas bifurcações e atalhos? Fica-nos a
história oficial: em vez da envolvente trama tecida a nossa frente só nos
resta virar a página de um livro, único testemunho do passado. (BOSI,
1992, p.145).
Segundo Bosi, (1987, p. 360), estas memórias humildes formam a
essência da cultura, diferenciando-se da história escrita, das datas, da descrição de
períodos, há correntes do passado que só desaparecem na aparência. As memórias
cotidianas nos demonstram resquícios de outras épocas, como uma maneira de
pensar, falar, sentir, arrumar as camas, cultivar o jardim, preparar alimentos e as
tradições religiosas.
38
Diante de uma sociedade industrial, os velhos são rejeitados e
desvalorizados. Quando as mudanças históricas se aceleram e a sociedade extrai
sua energia todo o sentimento de continuidade é arrancando do trabalho. Com tudo
isso se perde a arte de contar histórias e de trocar experiências.
Conforme Decca, (1992, p. 130), os suportes sociais da memória coletiva,
que sempre foram os elementos principais de criação do sentimento de continuidade
e de preservação das sociedades pré-industriais, foram sendo paulatinamente
destruídos e, hoje, o cidadão se sente cada vez mais mutilado em seus sentimentos
coletivos com relação ao passado. Pode-se dizer que hoje a memória coletiva
encontra-se refugiada em locais poucos visíveis, preservada, tenuamente, por meio
de rituais e de celebrações, em que alguns grupos a mantêm ciosamente
resguardada do assalto da história, ou então em lugares mais imperceptíveis ainda,
como em gestos, saberes do silêncio e em hábitos particulares. A própria produção
de lugares da memória, nestes dias atesta essa nova percepção de ruptura, onde o
cidadão tem plena consciência da impossibilidade de uma memória espontânea e
coletiva.
Portanto, concluí-se que o estudo de história e memória estão intimamente
associados. Refletindo sobre a relação dos europeus “colonizadores” e os habitantes
da região na segunda metade do século XIX verifica-se que, os Xokleng, por
exemplo, na área de referencia foram demasiamente desrespeitados e a visibilidade
da sua presença neste espaço pode ser evocada a partir das memórias coletivas da
comunidade em geral, memórias que inúmeras vezes são inutilizadas por interesses
ideológicos contribuindo assim para que os vínculos com o passado se desfaçam
definitivamente.
39
4.3 Metodologia da História Oral
Atualmente, muitos trabalhos acadêmicos de história vêm utilizando a
metodologia da História Oral, assim como nesta monografia. Abordar o fenômeno da
oralidade é ver-se defronte a aproximar-se bastante de um aspecto central da vida
dos seres humanos: o processo da comunicação, o desenvolvimento da linguagem,
a criação de uma parte muito importante da cultura e da esfera simbólica humana.
(LOZANO, p.143, 1994).
Prins (1992), explica que os historiadores das sociedades modernas,
industriais e maciçamente alfabetizadas, em geral são bastante céticos quanto ao
valor das fontes orais na reconstrução do passado. Paul Thompson, figura
proeminente no “movimento” da história oral, que defende o valor das fontes orais na
história social moderna, como proporcionando presença histórica àquelas, cujos
pontos de vista e valores são descartados pela “história vista de cima” escreveu
iradamente em seu manifesto, The Voice of the past que :
A posição à evidencia oral é muito mais fundamentada no sentimento do
que no princípio. A geração mais velha dos historiadores que ocupam as
cátedras e detêm as rédeas é instintivamente apreensiva em relação ao
advento de um novo método. Isso implica que eles não mais comandem
todas as técnicas de sua profissão. Daí os comentários depreciativos sobre
os jovens que percorrem as ruas com gravadores de fita.
(THOMPSON,1978, p. 63).
A história oral no Brasil, mesmo sendo introduzida na década de 70 tendo
expansão significativa somente nos anos 90, devido à multiplicação de seminários e
a incorporação pelos programas de pós-graduação em história de cursos voltados
para a discussão da história oral são indicativos importantes da vitalidade para a
discussão da área. Considerando também os contatos com pesquisadores
40
estrangeiros, as trocas de experiências criaram debates importantes sobre o
assunto. (FERREIRA; AMADO , 1996).
Ferreira e Amado
(1996) destacam ainda que o objeto de estudo do
historiador na história oral é recuperado e recriado por intermédio da memória dos
informantes; a instância da memória passa, necessariamente, a nortear as reflexões
históricas, acarretando desdobramentos teóricos e metodológicos importantes.
Prins (1992, p.192), conclui que alguns historiadores acham que seu
ofício é descrever e talvez, explicar porque as coisas ocorreram no passado. Para
ele uma justificativa necessária, mas não suficiente. Cita dois outros componentes
essenciais da tarefa do historiador. A “continuidade” que deve ser explicada. A
continuidade histórica, especialmente nas culturas orais, requer mais atenção do que
mudança. A tradição é um processo – vive apenas enquanto é continuamente
reproduzida. Em segundo lugar ressalta a tarefa do historiador em proporcionar ao
leitor confiança em sua competência metodológica. Enfatiza que é preciso
demonstrar consciência das ciladas da tradição inventada e, a partir daí, das
explicações oferecidas e ainda, o historiador deve também revelar o que é provável
que exista.
Portanto, Prins (1992, p. 198), enfatiza que para essas partes vitais da
tarefa do historiador se faz necessária a História oral com seu detalhe, sua
humanidade, freqüentemente sua emoção e sempre seu muito desenvolvimento
ceticismo com relação a todo o empreendimento historiográfico.
Afirma categoricamente que sem acesso a tais recursos:
“Os historiadores das sociedades modernas, maciçamente alfabetizadas
e industriais, ou seja, a maior parte dos historiadores profissionais, vão
consumir-se em um poço de compreensão circunscrito por sua própria
cultura, como amantes abandonados colocados sob o círculo de luz
41
tremulante de um poste isolado em uma rua escura e varrida pelo vento.
(PRINS, 1992, p. 163).
Lozano (1994, p. 16) afirma que o estudo da oralidade veio sendo
ensaiado a partir da antropologia, no âmbito da pesquisa dos processos de
transmissão das tradições orais, principalmente aquelas pertencentes a sociedades
rurais, onde os modos de transmissão e conhecimento ainda transitam, de maneira
relevante, pelos caminhos da oralidade.
Mas a questão da oralidade ultrapassou o campo específico da
antropologia, e agora é objeto de estudo de outras disciplinas, como é o caso,
atualmente, da corrente historiográfica denominada “história oral”. Para ele a história
oral é mais do que uma decisão técnica ou procedimento; é antes um espaço de
contato e influencia interdisciplinares; sociais, em escalas e níveis locais e regionais;
com ênfase nos fenômenos e eventos que permitam, através da oralidade, oferecer
interpretações qualitativas de processos históricos – sociais. Para isso, conta com
métodos e técnicas precisas, em que a constituição de fontes e arquivos orais
desempenha um papel importante. Dessa forma, a história oral, ao se interessar pela
oralidade, procura destacar e centrar sua análise na visão e versão que dimanam do
interior e do mais profundo da experiência dos atores sociais.
A história oral compartilha com o método tradicional as diversas fases e
etapas do exame histórico.
De início apresenta uma problemática, inserindo-a em um projeto de
pesquisa. Depois, desenvolve os procedimentos heurísticos apropriados
á constituição das fontes orais que se propôs produzir. Na hora de
realizar essa tarefa, procede, com o maior rigor possível, ao controle e às
críticas interna e externa da fonte constituída, assim como das fontes
complementares e documentos. Finalmente, passa á análise e á
interpretação das evidencias e ai exame detalhado das fontes
recompiladas ou acessíveis. ( LOZANO. 1994, p. 16).
42
Portando, para Lozano, fazer história oral significa produzir conhecimentos
históricos científicos, e não simplesmente, fazer um relato ordenado da vida e da
experiência dos “outros”. E o historiador oral é algo mais que um gravador que
registra os indivíduos “sem voz”, pois procurar fazer com que o depoimento não
desloque nem substitua a pesquisa e a conseqüente análise histórica; que seu papel
como pesquisador não se limite ao de um entrevistador eficiente, e que seu esforço
e sua capacidade de síntese e análise não sejam arquivados e substituídos pelas
fitas de gravação.
Neste contexto Ferreira e Amado (1996), citam a importância da
metodologia considerando que a história oral assim como todas as metodologias,
apenas estabelece e ordena procedimentos de trabalho, funcionando como uma
ponte entre teoria e pratica. Mas segundo as autoras, na área teórica a história oral
é capaz apenas de suscitar, jamais de solucionar, questões; formula perguntas,
porém não pode oferecer as respostas.
Encarada como uma metodologia à história oral consegue enunciar
perguntas, porém, não dispõe de instrumentos capazes de compreender os tipos de
comportamentos descritos. Apenas a teoria da história é capaz de fazê-lo. Pois se
dedica entre outros assuntos, a pensar os conceitos de história e memória, assim
como as complexas relações entre ambos.
A interdependência entre a prática, a metodologia, e a teoria produzem o
conhecimento histórico; mas é a teoria que oferece os meios para refletir sobre
esses conhecimentos, embasando e orientado o trabalho dos historiadores, aí
incluídos os que trabalham com fontes orais. (FERREIRA; AMADO, 1996, p. 25).
43
5
5 A QUESTÃO INDÍGENA NA SALA DE AULA
Há muito tempo pesquisadores dedicam-se ao estudo de gerações que
viveram no mesmo território após a ocupação da América, mas se equivocam ao
menosprezar, com isso, as que viveram neste continente antes da ocupação
européia; gerações já desaparecidas e outras que ainda vivem. As informações que
existem, hoje, sobre esses grupos são pouquíssimas, devido à raridade de estudos
das sociedades pré-coloniais.
Este cenário se repete nas salas de aula muitas vezes, pois quando se
trata da imagem do índio brasileiro ou catarinense, se repete incontestavelmente as
ideologias apresentadas em alguns livros didáticos que simplesmente transmitem
mensagens generalizadas, equivocadas e enganadoras. Para exemplificar, podemos
constatar que muitos livros didáticos indicados para o ensino fundamental no estado
de Santa Catarina são oriundos da região sudeste do Brasil as informações remetem
a uma realidade que não é significativa para os alunos que deixam de se
apropriarem de conhecimentos específicos da sua região.
Telles (1987, p. 73), destaca que as idéias que têm-se sobre “nós” , a
sociedade e sobre os outros povos fixam-se quando crianças. O que aprende-se,
ouve-se e vê-se forma a imagem do mundo, torna-se fonte de fantasias e aventuras.
Mas também é nessa época que se formam, devido à insuficiência de informações
ou informações incorretas, os preconceitos e idéias distorcidas em relação a outras
culturas.
Os acervos das escolas trazem muitas informações distorcidas e
preconceituosas, pretendendo adaptar as idéias de modo a atender e satisfazer
outros ideais.
44
Em muitos livros didáticos constam histórias equivocadas dos povos que
habitavam as terras do Brasil. Descrevem que os europeus foram os primeiros povos
a pisar as terras brasileiras. Colocando a idéia que o índio não seriam seres
humanos, que não tinham cultura. Enfatizando certos aspectos da cultura ocidental
omitindo a existência de outras culturas.
Conforme Pereira, 2004:
O papel do professor de História (e das outras disciplinas) extrapola o
conteúdo de sua disciplina, levando-o à condição de mestre e de aprendiz.
A lousa não deixa de existir, as provas continuam a ser cobradas, o livro
didático permanece como ferramenta de aprendizado, mas o
conhecimento,
pela
dinâmica
transdisciplinar
adquirida
na
contemporaneidade, não se limita a esses elementos.
A sociedade está acostumada a ver índio com tinta na cara, pena na
cabeça e morando em oca. Acha estranho quando encontra imagens e pesquisas
que revelam dados que não se enquadram nestes estereótipos.
Essa invisibilidade das sociedades ágrafas é por muito tempo difundida
principalmente quando se referem à constituição histórica da identidade e da história
dos municípios.
Outrossim, é preciso afastar as possibilidades de folclorização da cultura
indígena, que em alguns momentos vem sendo tratada como elemento estático na
História do Brasil. A Cultura indígena deve ser pensada inserida em um contexto de
circularidades e inter-relações com outras culturas. Reduzir a contribuição da cultura
indígena a sua “herança” (vocabulário, comidas...), tal como vemos nos livros
didáticos, é empobrecer a sua. (MOUTINHO, 2004).
O conhecimento histórico e a pesquisa nas mais variadas fontes são
fundamentais para os educadores do ensino fundamental principalmente no trabalho
45
deste tema com os alunos do ensino fundamental, pois entendemos que, uma vez
elaborados
os
conceitos
de
preservação
e
de
construção
histórica
são
estabelecidos, estes transferem suas experiências para familiares e amigos.
Tecendo e ampliando assim o objetivo principal conhecer, identificar-se, preservar e
valorizar a história pré-colonial de um determinado território.
O conhecimento histórico é uma construção de vários sujeitos. A melhor
compreensão do cotidiano das pessoas é buscar através de projetos de pesquisa
possibilitando a capacidade de se compreender enquanto sujeito da história. À
medida que as crianças crescem pode-se ensinar História. No estudo do município é
a primeira oportunidade que a criança tem de estudar uma sociedade, para começar
compreender uma série de noções importantes para o conhecimento da ciência
história.
Portanto ensinar história atualmente significa impregnar de sentido a
prática pedagógica cotidiana, na perspectiva de uma escola-cidadã. Vale dizer, que
a escola é reprodutora, na medida em que trabalha com determinados
conhecimentos
produzidos
e
acumulados
pelo
mundo
científico,
mas
transformadora, visto que promove uma apropriação crítica desse mesmo
conhecimento tendo em vista a melhoria da qualidade de vida da sociedade global.
5.1 Uma Experiência de Educação Patrimonial
Considerando a importância da abordagem da questão indígena no
ambiente escolar e na reconstrução da história do município. Desenvolve-se em
Maracajá município integrante da região do Vale do rio Araranguá uma pesquisa
46
científica com sobre a ocupação do território por grupos indígenas e as relações
entre estes grupos e os colonizadores que apropriaram-se deste espaço.
Sabendo que parcela considerável da história precisava ser resgatada e
revivida no tocante ao período pré-colonial e colonial. Para tanto a Prefeitura
Municipal de Maracajá, através do Departamento de Educação, Cultura e Esportes;
o
Curso de História
GRUPEP/Arqueologia
da
Universidade de Sul de Santa
(Grupo
de
Pesquisas
em
Educação
Catarina e
o
Patrimonial
e
Arqueologia), estabeleceram um convênio de cooperação técnica a fim de mapear e
identificar os sítios arqueológicos pré-coloniais do município visando garantir a
preservação arqueológica e ambiental, bem como o desenvolvimento de futuras
pesquisas na região.
O trabalho de campo foi realizado entre os dias 17 e 19 de setembro de
2004; na ocasião foram mapeados 9 sítios arqueológicos atribuídos a grupos
caçadores-coletores e ceramistas respectivamente Farias,2005. Foram meses de
pesquisas no laboratório de arqueologia do GRUPEP na UNISUL de Tubarão. Os
artefatos encontrados foram catalogados e identificados.
Toda essa pesquisa resultou em uma publicação científica de relevante
valor para a divulgação e o entendimento da ocupação pré-colonial e colonial do
município de Maracajá, bem como para a preservação e valorização do seu
patrimônio arqueológico. O livro Maracajá: Pré-história e arqueologia organizado por
Deisi S. E. Farias lançado dia 12 de maio de 2005. No Centro Histórico Cultural do
Município estão expostos os materiais arqueológicos encontrados nos 9 sítios
mapeados, que evidenciam e dão visibilidade aos grupos humanos que ocuparam o
território de Maracajá.
47
Antes da realização desta pesquisa a maioria da população de Maracajá
considerava que a história do município iniciava a partir de 1920, com a construção
da Estrada de Ferro Dona Tereza Cristina e com a chegada das primeiras famílias
de origem italiana e açoriana, as quais iniciaram o processo de desenvolvimento
econômico e social. Oficialmente não existiam registros da presença de grupos
indígenas no município e muito menos da relação destes grupos com os primeiros
colonizadores por volta da segunda metade do século XIX e início do século XX. No
município existia até o momento apenas um livro sobre a história de Maracajá escrito
por Agilmar Machado em 2000.
Neste contexto de pesquisa científica realizou-se um projeto muito
significativo na Rede Municipal de Ensino. O projeto Maracajá Pré-história e
Arqueologia – Ocupação Pré-colonial do estado de Santa Catarina.
Utilizando a metodologia de Educação Patrimonial entendida segundo
Grunberg e Horta (2001, p. 6), como um instrumento de “alfabetização cultural”, que
possibilita ao indivíduo fazer a leitura do mundo que o rodeia, levando-o à
compreensão do universo sócio-cultural e da trajetória histórico-temporal em que
está inserido. Professores de diferentes disciplinas organizaram o projeto com
estudantes do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Ensino que demonstraram
grande
interesse
quando
se
discutia
e
comentava-se
sobre
patrimônios
arqueológicos, alguns estudantes chegaram a trazer artefatos encontrados nos seus
bairros; outros relatavam entrevistas realizadas com avós sobre os embates
ocorridos neste território entre os chamados “Bugres e os brancos”.
Os objetivos do projeto envolviam o conhecimento do passado do território
da Maracajá antes da existência dos registros históricos. A visibilidade da cultura
indígena do município, desvinculando a pretensão de que os brancos colonizadores
48
foram os “descobridores do território” e o respeito à diversidade cultural existente na
constituição étnica do município.
Para exemplificar a utilização da metodologia de Educação Patrimonial
citam-se aqui algumas das Atividades desenvolvidas no projeto:
•
Palestra com a Arqueóloga Deisi S. Eloy Farias e o GRUPEP- Arqueologia
(Grupo de Pesquisa em Educação Patrimonial e Arqueologia);
Figura 1- Palestra sobre arqueologia e ocupação do território do Estado.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
•
Pesquisa para a formação dos conceitos de Pré-História, Arqueologia, Função
do Arqueólogo e Sítio Arqueológico;
•
Entrevista coma comunidade, moradores antigos sobre a presença destes
grupos e a relação dos mesmos com os antepassados da região;
•
Aula no Centro Histórico Cultural do município para a visualização dos
artefatos encontrados;
49
Figura 2 – Aula no museu análise de material arqueológico.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
•
Identificação dos sítios arqueológicos mapeados no município;
•
Estudo dos grupos que ocuparam o município no período pré-colonial;
•
Realização
alguns
procedimentos
arqueológicos
como
escavações
simuladas, higienização de artefatos e desenho das peças;
•
Construção de maquetes sobre as características de cada grupo que ocupou
o território do Estado de Santa Catarina;
•
Produção de objetos de cerâmica caracterizando os grupos ceramistas;
50
Figura 3 – Construção de maquete.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
Figura 4 – Alunos expressando os conhecimentos adquiridos com a construção
de maquetes.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
51
Figura 5 – Construção de maquetes.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
Figura 6 - Produção de material cerâmico.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
•
Divulgação de todos os resultados e trabalhos realizados durante o projeto
em uma exposição que recebeu todas as escolas municipais e a comunidade
em geral.
52
Figura 7
Figura 8
Exposição e explicação do projeto para a comunidade escolar.
Fonte: Acervo Particular de Odécia Almeida de Souza
Horta (1999, p. 36) esclarece que a metodologia da Educação Patrimonial
tem um amplo campo de atuação e propõe não somente uma nova maneira de
utilização dos bens culturais do passado e do presente, mas uma nova postura por
parte do educador, no sentido de incorporar os bens culturais ao processo de
aprendizado e como auxiliares no desempenho das funções de transmitir o
conhecimento.
Além de contribuir para a valorização da história indígena da região, este
tipo de proposta de trabalho inseri estudantes em um contexto de pesquisa cientifica
desde o Ensino Fundamental tornando a aprendizagem muito mais significativa.
53
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscou-se, nesta monografia, evidenciar os embates ocorridos na
secunda metade do século XIX entre os Xokleng e os imigrantes europeus na região
do Vale do rio Araranguá. Destacou-se a importância da identificação e da
valorização e do aprofundamento dos conhecimentos sobre a ocupação do território
no o período pré-colonial, pois os antigos habitantes, muitas vezes, são esquecidos
e desprezados pela historiografia tradicional.
Compreendeu-se os Xokleng como um povo que luta pela sobrevivência
antes mesmo do seu caminho cruzar como o dos europeus. Os considerados
maiores inimigos brancos dos Xokleng vieram de países europeus como Portugal,
Itália e Alemanha. Durante toda sua história, os Xokleng formaram um grupo seminômade que habitava um extenso território no interior do Brasil, nas matas de
araucárias que vão desde o Paraná até o Rio Grande do Sul. Os problemas dessa
gente só aumentaram quando os colonizadores avançaram o território, deixando o
litoral, habitado pela tribo carijó e tupi, para se fixarem no interior.
Analisou-se o contato entre as culturas diferentes, bem como as
transformações decorrentes em cada uma delas, por força desse contato. Entendeuse que o contato com o homem branco alterou a história dos Xokleng na região
estudada.
A partir da análise do discurso de pessoas entrevistas e de bibliografias
antigas percebeu-se a imagem criada em relação ao indígena ou “bugre” como
elemento
violento, preguiçoso,
perigoso
enfim uma
ameaça
à
vida
dos
colonizadores. Nestes estudos, constata-se a precariedade de fontes bibliográficas
54
publicadas sobre o assunto sendo necessária a utilização de fontes orais e
documentais.
Após analisar diferentes documentos e registros, buscando argumentos
para comprovar a intenção do governo em eliminar ou escravizar os indígenas para
a posse do território por parte dos imigrantes europeus conclui-se que este
estabeleceu uma política ineficiente e irresponsável de colonização.
Com o estudo da ocupação pré-colonial do Vale de Araranguá contribuiuse no intuito de estabelecer a visibilidade de uma diversidade étnica e cultural
identificando e destacando a presença dos Xokleng na formação étnica do Vale do
rio Araranguá, desvinculando assim a idéia construída de uma identidade
eurocêntrica. Percebendo se assim o elo de ligação entre as sociedades précoloniais e coloniais.
Esta monografia contribuiu para resignificar a história de grupos indígenas
da região para que esta deixe de ser vista como uma abstração, transformando-se
em objeto de interesse para todos vivem e compartilham o mesmo passado e o
mesmo território.
Utilizou-se
a definições e
os conceitos
específicos da corrente
historiográfica da Nova História Cultural, buscando assim uma abordagem histórica
que justifica a utilização de variadas fontes, a possibilidade de interação entre
memória e história e assim, portanto, resignificação histórica dos povos indígenas da
região em referência.
Discutiu-se por fim sobre o ensino e questão indígena entendendo-se que
os educadores devem buscar recursos para possibilitar o entendimento e a
valorização da cultura indígena que faz parte do processo de educação que é
55
continuo e permanente, pois, a partir do entendimento dos alunos, enquanto sujeitos
históricos inseridos neste processo de reconhecimento e identificação que se
formará gerações conscientes e capazes de aprender a conviver com as
diversidades étnicas e culturais.
56
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os xokleng e os imigrantes europeus no vale do rio araranguá