EXTRACÇÃO, CARACTERIZAÇÃO E UTILIZAÇÃO DAS CARRAGENANAS
Leonel Pereira
Departamento de Botânica, Laboratório de Microscopia e Ficologia, Universidade de Coimbra,
3000 Coimbra, Portugal. Email: [email protected]
Introdução
Hoje as algas marinhas são usadas em muitos países para fins diversos:
directamente na alimentação, extracção de ficocolóides (entre os quais, as
carragenanas), na extracção de compostos com acção antivírica, antibacteriana ou
antitumoral e como biofertilizantes. No entanto, é necessário potenciar os escassos
recursos tecnológicos e financeiros e, sobretudo, coordenar os esforços, quer em áreas
ligadas à utilização das algas, quer da investigação fundamental. Tal como Bernard
Kloareg (Director de pesquisa da estação biológica do CNRS em Roscoff, França)
afirmou “podemos continuar a descobrir novos usos para as algas mas, na realidade, as
pesquisas fundamentais são necessárias se pretendermos aproveitar plenamente as suas
propriedades”. O objectivo a seguir será o de aplicar às macroalgas todas as abordagens
da genética e biologia molecular utilizadas com os vegetais superiores. “Para conhecer
melhor as enzimas que actuam na formação de certos produtos úteis (em especial os
famosos polissacarídeos) é preciso descobrir a estrutura das paredes celulares, onde se
forma o essencial dessas substâncias e, também, a estrutura dos seus genomas”. Então o
homem poderá manipular à vontade os genes e as enzimas das algas a fim de melhorar a
qualidade e a quantidade das suas aplicações.
Cerca de quatro milhões de toneladas de algas são colhidos anualmente em todo
o mundo. Os principais produtores são os chineses e os japoneses, seguidos pelos
americanos e noruegueses. A França, que na década de 70 importava algas japonesas,
dez anos depois passou a produzir algas para a indústria alimentar e para os adeptos de
produtos biológicos. Ao contrário do que acontece na Ásia oriental, o ocidente
interessa-se mais pelas propriedades gelificantes e espessantes das algas. Assim, a
França é o segundo produtor mundial de carragenanas e quinto de alginatos (E407 e
E400).
No entender dos mais fervorosos partidários das “plantas” aquáticas, todo o
nosso quotidiano deveria mergulhar nas algas marinhas, não apenas em benefício da
pele mas, tal como acontecia na Bretanha, durante a Idade Média, na preparação de
verdadeiros festins para qualquer “Neptuno vegetariano”. Longe de ser insípida ou
muito iodada, as algas marinhas acentuam o sabor das substâncias que acompanham: é
o que os especialistas chamam de um eficiente potenciador do sabor.
Mais do que a sua natureza vegetal, as algas constituem, devido à conjunção da
sua variedade de cores (e formas) e do azul do oceano, um formidável argumento de
venda, tanto para os produtos alimentares, como para os cosméticos, sobretudo depois
de certas substâncias de origem animal se terem tornado suspeitas de transmitir vírus
como os do ‘prurigo lombar’ dos carneiros e da ‘encefalopatia bovina’, tal como Patrick
Durand (Investigador do Departamento de Valorização do IFREMER, França) refere.
Segundo os ficologistas, as algas são uma rica mina de saúde - oligoelementos e
vitaminas - oferecendo também uma estonteante variedade de sabores, perfumes e
texturas.
Nos E.U.A., sempre à frente nas práticas higienistas, o “McDonald’s” lançou os
“McLean”, um hambúrguer de baixas calorias, à base de Eucheuma, uma
Rhodophyceae cultivada em grande escala nas Filipinas. De facto, as macroalgas para
além de constituírem um tesouro de minerais e vitaminas, são pobres em lípidos,
característica essencial para o “negociante” de regimes de emagrecimento. E mais, são
ricas em fibras alimentares, o que pode facilitar o trânsito intestinal, baixar a taxa de
colesterol no sangue e reduzir certas afecções como o cancro do cólon (García et al.,
1993).
As potencialidades alimentares das macroalgas são enormes. À mesa, os
franceses consomem-nas em quantidade mil vezes menor que os japoneses. E embora
em plena expansão (o mercado totalizou em 1992 cerca de 210 milhões de Euros), a sua
viabilidade económica ainda não foi comprovada. As macroalgas não estão a salvo de
uma reviravolta de opinião; basta que as marés verdes ou vermelhas venham a aumentar
ou que as algas tóxicas comecem a proliferar nos locais de ostreicultura e a bela imagem
de pureza dessas “plantas” aquáticas poderá muito bem “desbotar”. Uma possibilidade
que sem dúvida justifica a cautelosa política de contemporização adoptada pelas
grandes companhias agroalimentares.
As Macroalgas e a Biotecnologia - Companheiros Inseparáveis
Os maiores avanços na moderna biotecnologia não teriam sido possíveis sem a
utilização dos polissacarídeos extraídos das macroalgas marinhas (agarose, agar,
carragenanas).
Para a separação e fragmentação dos genes é indispensável a electroforese, não
só à base de agarose mas também com recurso aos seus derivados hidroxietílicos com
baixas temperaturas de gelificação/fusão. A agarose também é indispensável na cultura
de protoplastos e na regeneração celular. A insulina recombinante, o activador
plasmogénico tecidular, o Factor VIII, os interferões, etc., todos eles foram
desenvolvidos usando, pelo menos numa etapa do seu desenvolvimento, os géis de
agarose. É questionável se as recentes descobertas nas áreas de investigação médica, em
particular na investigação do cancro (na descoberta e na compreensão dos oncogenes) e
da SIDA, teriam sido possíveis sem a agarose e/ou os seus derivados (Renn, 1990).
O agar continua a ser o meio ideal para a cultura e selecção de hospedeiros
microbiológicos na engenharia genética, assim como na cultura de tecidos in vitro. A
bioconversão mais eficaz é resultado da tecnologia de encapsulação com base em sais
insolúveis de algina e de carragenana.
O termo ‘biotecnologia’ tem significados diferentes consoante o autor - desde o
“modificar e cultivar sistemas vivos de forma a fornecerem produtos úteis”, até aos
“clones humanos”, tudo pode ser considerado ‘biotecnologia’. Como definição geral, a
biotecnologia é “a manipulação e/ou utilização de parte ou de todo um sistema
biológico específico com o fim de fornecer um determinado produto”.
A biotecnologia não é uma ciência em si mesma, mas tão somente o conjunto de
instrumentos e técnicas que podem ser usados na resolução de problemas, criar produtos
e/ou processos. Esses instrumentos incluem a engenharia genética, a tecnologia de
recombinação de DNA, a cultura de tecidos, as enzimas, as fermentações, os
bioreactores imobilizados, a bioquímica e a imunologia. A biotecnologia não é nada de
novo, pois já se utiliza desde há milhares de anos nos processos de fermentação (na
fabricação da cerveja e do pão, entre outros) e na produção de vinho. De facto, a
biotecnologia nasceu quando o homem primitivo tentou, pela primeira vez, entender os
processos da vida. As recentes descobertas catapultaram a biotecnologia para uma
posição proeminente no panorama científico actual (Renn, 1990).
Extracção e Caracterização das Carregenanas
As carragenanas são substâncias mucilaginosas presentes na parede das algas
vermelhas pertencentes à ordem das Gigartinales. As galactanas (isto é, polímeros de
galactose) diferenciam-se do agar pelo seu carácter francamente iónico, consequência
do elevado teor em radicais OSO-3 . As galactanas diferem também dos alginatos, pois
estes últimos devem o seu carácter iónico aos grupos carboxílicos COO-.
A denominação “carragenana” provém da palavra “carraigeen” que significa
“alga” em gálico, ou do nome “carraghen”, distrito irlandês onde, desde há cinco
séculos se colhe a alga vermelha Chondrus crispus (devido à sua característica
particular que lhe permite coagular o leite).
Na França, país com grande tradição na colheita de algas, o C. crispus é
denominado por “lichen blanchi” (líquene branco) no norte da Bretanha, “picot”
(esgalho) no sul e “goemon blanc” na Vendée. Numa das receitas tradicionais francesas,
uma mistura de leite com C. crispus é aquecida, durante cinco minutos, até os 80º C; ao
arrefecer, o leite gelifica e dá origem a um flan chamado “blanc mange” (Gayral &
Cosson, 1986; Perez et al., 1992).
Na língua portuguesa o Chondrus crispus é conhecido por botelha, cuspelho,
musgo e limo-folha (Oliveira, 1995). Noutras partes do mundo é conhecida sob
diferentes nomes: “pearl moss”, “irish moss”, “lichen curly moss”, “jelly moss” e
“lichen” (Ribier & Godineau, 1984; Gayral & Cosson, 1986).
A extracção industrial das carragenanas iniciou-se em 1930, em Nova-Inglaterra,
a partir de talos de Chondrus crispus e Mastocarpus stellatus, para a preparação de
leite achocolatado. A interrupção das importações de agar durante a II Guerra Mundial,
levou à sua substituição pela carragenana; esta situação constituiu o ponto de partida
duma indústria florescente (Ribier & Godineau, 1984).
O produto extraído no seu estado puro é denominado “carragenina”, mas é
extremamente instável e difícil de obter; consequentemente, a carragenina liga-se a um
ou mais catiões, para constituir diversos sais de carragenina: as “carragenanas”. Por
recomendação do “comité sobre a nomenclatura da divisão ‘química orgânica’ ” (ACS),
deve ser usada a terminação “ana” em vez da terminação “ato”, pois esta última diz
respeito a sais cristalizáveis; ora, os sais de carragenina nunca cristalizam (Perez et al.,
1992).
Estrutura Química das Carragenanas
Aspecto: As carragenanas, em estado puro seco, apresentam-se sob a forma de um pó,
inodoro e sem sabor. A solução e o gel de carragenana apresentam-se, normalmente,
translúcidos e a sua incorporação noutras soluções não modifica nem o gosto nem a
coloração original destas. Em solução, os polímeros de carragenana comportam-se
como colóides hidrófilos aniónicos (Ribier & Godineau, 1984; Craigie, 1990).
Formulação Química de Base: As cadeias moleculares destes polissacarídeos
apresentam duas características fundamentais: são constituídas a partir dum monómero
(a galactose) e contêm uma forte proporção de radicais OSO-3 (24 a 26%), aos quais se
deve a carga negativa apresentada pelo composto.
A galactose (a), em solução aquosa, fixa uma molécula de água ao carbono 1, o
que conduz a uma estrutura (b) instável, que se autociclisa em forma de piranose, para
formar uma ponte de oxigénio entre o carbono 1 e o carbono 5 (c). A ciclisação pode-se
efectuar de três maneiras distintas: sob a forma de β-D-galactopiranose (d), ou sob a
forma de α-D-galacto-piranose (e), ou então, sob a forma de 3,6 anidro-α-Dgalactopiranose (f), por intermédio da criação duma ponte de oxigénio entre C3 e C6 da
α-D-galactopiranose (Fig. 1).
Figura 1 - Carragenanas - formulação química de base: a) galactose desidratada; b) a galactose liga-se a
uma molécula de água em C1 ; C) ciclisação da molécula (formação de uma ponte entre o oxigénio, C1 e
C5 ); d) β-D-galactopiranose; e) α-D-galacto-piranose; f) 3,6 anidro-α-D-galactopiranose (Segundo Perez
et al., 1992).
As duas unidades β-D-galactopiranose-α-D-galactopiranose (ou β-Dgalactopiranose-3,6 anidro-α-D-galactopiranose) ligam-se por intermédio duma ponte
de oxigénio, entre o carbono 1 da β-D-galactopiranose e o carbono 4 da α-Dgalactopiranose, sob a forma duma ligação do tipo β (ou da 3,6 anidrogalactopiranose),
com a libertação duma molécula de água. O conjunto β-D-galactopiranose-α-Dgalactopiranose (ou β-D-galactopira-nose-3,6 anidro-α-D-galactopiranose) constitui um
“dímero” ou uma “sequência”. A cadeia de carragenana é formada pela sucessão de
sequências deste tipo. Uma sequência está ligada à seguinte por uma ponte de oxigénio,
entre o C1 duma e o C3 da seguinte, com a libertação duma molécula de água (Fig. 2),
segundo uma ligação do tipo α (McCandless, 1981; Perez et al., 1992).
Num trabalho realizado em 1954, Smith & Cook constataram que, ao juntar-se
cloreto de potássio a uma solução de carragenana, havia a separação de duas fases: uma
solúvel (lambda carragenana) e outra insolúvel (kappa carragenana). A solução de
kappa carragenana (κ carragenana) conduz, após aquecimento, à formação dum gel,
enquanto que a solução de lambda carragenana (λ carragenana) não permite nunca a
formação dum gel aquoso.
Figura 2 – Formação de uma cadeia de carragenana (Segundo Perez et al., 1992).
Lambda Carragenana: a hidrólise ácida da λ carragenana revela a sua constituição
química: esta carragenana é constituída por β-D-galactopiranose, sulfatada em C2 e por
α-D-galactopiranose, sulfatada em C2 e em C6 , o que conduz à formulação do dímero
seguinte:
β-D-galactopiranose-2-sulfato-O-α-D-galactopiranose-2,6-sulfato
Numa representação no espaço, em razão do ângulo de valência do carbono,
cada monómero toma uma disposição espacial dita “em cadeira”.
A presença de três substituições ésteres sulfúricos (-O-SO3 -), responsáveis pela
forte electronegatividade dos dímeros, provocam a repulsão das cadeias umas em
relação às outras. Por outro lado, a disposição no espaço em forma de “zig-zag” não
permite a formação duma estrutura em hélice. As cadeias de λ carragenana permanecem
dispersas na água, qualquer que seja o catião que entre na sua constituição. Esta é a
razão porque a λ carragenana não forma nunca um gel em solução aquosa, mas eleva,
em contrapartida, a sua viscosidade. Esta carragenana é solúvel a frio ou a baixas
temperaturas (15 - 20º C) (McCandless, 1981; Perez et al., 1992).
Kappa Carragenana: A hidrólise da κ carragenana revela a presença de β-Dgalactopiranose-4-sulfato e de 3,6 anidro-α-D-galactopiranose:
β-D-galactopiranose-4-sulfato-O-3,6 anidro-α-D-galactopiranose
Cada monómero apresenta, no espaço, uma disposição “em cadeira” e, a
sequência, apresenta uma estrutura em hélice.
A presença da ponte de oxigénio (CH2 -O-C) entre o carbono 3 e o carbono 6 da
3,6 anidro-α-D-galactopiranose constitui uma formação hidrófoba. Esta tendência é
compensada pela presença do radical OSO3 - da β-D-galactopiranose. A cadeia de κ
carragenana dispõe-se, no espaço, numa sucessão de hélices. Cada cadeia aproxima-se
da vizinha para proteger os grupos hidrófobos das moléculas de água. Em consequência,
a κ carragenana, em certas condições, gelifica a solução onde se encontra (McCandless,
1981; Perez et al., 1992).
Outras Carragenanas Obtidas por Extracção Alcalina
A iota carragenana (ι carragenana) é vizinha da κ carragenana, mas possui um
éster sulfúrico suplementar substituído, situado ao nível do carbono 2 da 3,6 anidro-αD-galactopiranose. A presença de dois ésteres sulfatados reduz o carácter hidrófobo da
carragenana: o gel produzido por esta carragenana é mais brando e não tem sinérese.
A beta carragenana (β carragenana), extraída da Eucheuma gelatinae, ao
inverso, difere da κ carragenana devido à ausência do radical éster sulfúrico OSO3 - no
carbono 4 da β-D-galactopiranose. Esta ausência acentua o carácter hidrófobo da
molécula, no que se traduz na produção de um gel mais duro do que o induzido pela κ
carragenana e com uma sinérese mais pronunciada.
A estrutura espacial destas duas carragenanas é idêntica à da κ carragenana
(cadeias em hélice). No processo de gelificação, as cadeias estão mais próximas na β
carragenana do que na κ carragenana e mais alongadas na ι carragenana (McCandless,
1981; Perez et al., 1992).
Carragenanas intratecidulares
O estudo das carragenófitas por espectroscopia RMN, as modificações químicas
por acção do periodato e as análises por espectroscopia de infravermelhos, revelaram a
existência, nas algas, de outros tipos de carragenana cuja fórmula química é parente do:
- tipo kappa: mu carragenana;
- tipo iota: nu carragenana;
- tipo beta: gamma carragenana.
Estas carragenanas diferem das primeiras, pois o segundo elemento da sequência
que, nas carragenanas do tipo kappa, iota e beta, é o 3,6 anidro-α-D-galactopiranose,
encontra-se entre a α-D-galactopiranose-6-sulfato. Os tipos mu, nu e gamma
carragenanas são os percursores metabólicos dos, respectivamente, tipos kappa, iota e
beta. A transformação dá-se pelo desaparecimento do grupo éster sulfato do C6 e pela
formação duma ponte de oxigénio entre o C3 e o C6 . Esta “mutação” é provocada, no
interior da célula, pela acção da enzima “dekinkase” ou, exteriormente, pela extracção
alcalina. Devido a este facto não é possível encontrar as mu, nu e gamma carragenanas
em soluções provenientes duma extracção alcalina.
Foi possível identificar um outro tipo de carragenana: o tipo ksi (ξ carragenana).
Esta carragenana resulta, sem dúvida, da evolução metabólica da λ carragenana e
encontra-se tanto na célula como nas soluções resultantes da extracção alcalina,
representando, no entanto, uma percentagem muito reduzida.
Nalgumas Gigartina a λ carragenana extraída difere da λ carragenana típica
devido à presença dum radical piruvato em vez do sulfato do primeiro monómero da
sequência; alguns autores designaram esta carragenana por “pi carragenana” (π
carragenana).
A natureza de cada carragenana pode ser determinada pelo estudo em
espectroscopia de infravermelhos (Fig. 3 e Tabela 1), de Raman (Fig. 4 e Tabela 2) e
RMN (Fig. 5).
(a)
(b)
(c)
Figura 3 - Espectros característicos da kappa (a), iota (b) e lambda (c) carragenana.
(Segundo Genu Ltd., 1985).
Tabela 1 – Grupos funcionais característicos de cada carragenana e as respectivas absorvâncias
(Espectroscopia de Infravermelho) (Adaptado de McCandless et al. 1983 e Genu Ltd., 1985).
Comprimento
de
onda (cm -1 )
1210 - 1260
1010 - 1080
928 - 933
840 - 850
820 - 830
810 - 820
800 - 805
Absorvância
Grupo
Funcional
Éster Sulfato
Ligação
Glicosídica
3,6-anidro-Dgalactose
D-galactose-4sulfato
D-galactose-2sulfato
D-galactose-6sulfato
3,6-anidro-Dgalactose-2sulfato
kappa
muito elevada
muito elevada
iota
muito elevada
muito elevada
lambda
muito elevada
muito elevada
elevada
elevada
média
média
nula ou
reduzida
nula
nula
nula
média
nula
nula
média
nula ou
reduzida
média
nula
1075
IR
a
1268
815850
600
Raman
1400
Wavenumber / cm-1
931
IR
1081
b
852
1258
805
925
Raman
600
Wavenumber / cm-1
1400
Figura 4 – Espectros de IR e Raman da lambda carragenana (a) e de uma mistura de iota e kappa
carragenana (b).
Tabela 2 – Grupos funcionais característicos de cada carragenana e as respectivas intensidades
(Espectroscopia de Raman).
Comprimento
de onda (cm -1 )
1250 - 1268
1075 - 1081
920 - 930
845 - 852
830 - 840
810 - 815
800 - 805
Grupo
Funcional
Ester sulfato
Ligação
Glicosídica
3,6 anidro-Dgalactose
D-galactose-4sulfato
D-galactose-2sulfato
D-galactose-6sulfato
3,6 anhydro-Dgalactose-2sulfato
Kappa
elevada
muito
elevada
reduzida média
muito
elevada
nula
nula
nula
Intensidade de Raman
Iota
Lambda
elevada
elevada
muito
muito
elevada
elevada
reduzida nula
média
muito
nula - reduzida
elevada
nula
reduzida média
nula
média
média
nula
Figura 5 – Espectro RMN de uma mistura de iota e kappa carragenana (Segundo Pereira & Mesquita,
2000).
O Papel das Carragenanas na Alga
As carragenanas são os constituintes principais da parede esquelética e da
matéria intercelular das macroalgas da ordem Gigartinales. O teor e a qualidade varia de
acordo com a estação do ano, a espécie, o meio e a idade da planta (Figs. 6 e 7). Na
Bretanha (França), as plantas infralitorais de Chondrus crispus contêm mais
carragenanas do que os talos médiolitorais. Existe para esta espécie uma variação
significativa da quantidade total entre o Inverno e o Verão: a alga produz mais
ficocolóides durante o Inverno. Paradoxalmente, a recolha desta alga é feita, sobretudo,
entre Maio e Setembro. Para as outras espécies, a variação quantitativa, de acordo com a
estação do ano, é pouco acentuada.
Durante o período de crescimento da alga, a cadeia molecular permanece
relativamente pouco polimerizada; neste período a carragenana produzida é de
qualidade média. A sua qualidade aumenta no período de Inverno, quando o
crescimento dos talos é reduzido ou nulo.
Figura 6 - Evolução do teor em carragenanas no decurso do ano (C. crispus): a - talos femininos; b esporófitos; c - talos não frutificados; d - no conjunto da população. (Segundo Kopp & Perez, 1979).
Para a mesma planta, a carragenana obtida a partir das partes jovens (ramos
terminais), submetidas a um grande crescimento, apresenta-se com menor qualidade do
que a contida nas outras porções mais velhas (na base da planta). A organização da
colheita das Eucheuma na Ásia toma em conta esta particularidade.
Qual é o papel das carragenanas no interior da alga ? Constituem uma reserva de
glícidos ? São elementos de suporte que só se polimerizam no fim do alongamento
celular ? São permutadoras de iões ? São reguladoras do cálcio ou do potássio ? São
percursores metabólicos ? Percival (1968) afirma que as carragenanas mantêm a “força
flexível” da planta. Para Fuller (1972), se a hipótese anterior tivesse correcta, deveria
constatar-se um teor em carragenanas maior nas plantas das zonas expostas à ondulação.
Ora, não é esse o caso, pois a taxa de polímeros é mais elevado nas zonas calmas do que
nas zonas expostas. Sugeriu-se, igualmente, que as propriedades hidroscópicas das
carragenanas permitiriam, ao Chondrus crispus e às outras carragenófitas, resistir à
dessecação, aquando da sua emersão na maré baixa. Neste caso, o teor de
polissacarídeos deveria variar inversamente à profundidade das algas. Na realidade
passa-se o contrário: as populações litorais têm um teor em carragenana inferior ao das
populações sublitorais.
Figura 7 - Evolução do teor em carragenanas kappa e lambda nos gametófitos femininos e nos
esporófitos de C. crispus. As plantas designadas como “neutras” são plantas que nunca foram observadas
frutificadas, que correspondem sobretudo a gametófitos masculinos. (Segundo Perez et al., 1992).
Admite-se, hoje em dia, após os trabalhos de Christiaen (1986) sobre o agar de
Gracilaria verrucosa, que todos os ficocolóides têm um papel fundamental no
metabolismo da célula algal, na regulação das relações, mais ou menos abertas, com
meio exterior. A síntese das carragenanas foi estudada por MacCandless & Richter
(1971) por intermédio (da técnica) do carbono 14, introduzido no meio nutritivo sob a
forma de NaH14 CO3 . A sua incorporação é muito mais rápida na lambda carragenana do
que na kappa carragenana. Com 24 H de intervalo, a radioactividade da lambda
carragenana é dez vezes maior do que a da kappa carragenana; é possível concluir
então, pela análise dos resultados obtidos, que estas duas carragenanas têm vias de
síntese distintas (Craigie, 1990).
Extracção das Carragenanas
Extracção laboratorial (extracção alcalina)
As amostras de algas são lavadas em água doce destilada, para as libertar do sal
e de outros detritos, sendo em seguida secas numa estufa a 60º C durante um período
mínimo de 24 horas. Para a extracção são necessárias 2x1 g de alga (peso seco). O
material algal (1 g) é depois colocado num copo (200 ml), juntamente com 150 ml de
água destilada, durante 12 horas a 4ºC. As algas são depois submetidas a uma mistura
de metanol com acetona (75 ml de metanol e 75 ml de acetona), durante 12 horas à
temperatura ambiente, para as libertar da fracção organosolúvel. A extracção
propriamente dita é feita numa solução de NaOH (1M), em banho-maria, (80ºC) durante
3 horas. A mistura é filtrada através de um funil com poros largos, provido de um filtro
de tecido branco, para um frasco, sob sucção pelo vácuo. Filtra-se tudo novamente
através de um filtro de papel Watman e um funil de sílica, para o interior de um frasco,
sob sucção pelo vácuo.
A mistura é recuperada para o interior do balão de um evaporador rotativo
(100ºC, no vácuo), no qual se procede à evaporação de 50 ml de água. As carragenanas
precipitam sob a forma duma teia de fibrosa branca pela adição de 200 ml de álcool
etílico absoluto (etanol 100%). Com o auxílio de uma vareta de vidro retiram-se as
carragenanas para o interior de um copo limpo e espremem-se, de forma escorrer o
líquido embebido; juntam-se 100 ml de álcool etílico absoluto (12/24 horas).
Finalmente retira-se o álcool e colocam-se as carragenanas numa estufa a 50/60ºC
durante 24 horas, para esta secarem (Pereira & Mesquita, 2000).
Extracção industrial
A extracção das carragenanas é feita, sobretudo, a partir de algas secas. Antes de
se iniciar a operação de extracção propriamente dita é necessário determinar as
características do material algal: a taxa de humidade, o teor em areia, os sais presentes,
as algas epífitas, o teor em carragenana e a qualidade do extracto. Estes elementos
permitem ajustar os processos de extracção.
Extracção clássica: A primeira etapa consiste na depuração da matéria prima. As algas
(sobretudo as algas secas já há algum tempo) são mergulhadas e agitadas de forma a se
desembaraçarem da areia, das conchas, dos peixes mortos e de outros detritos. Durante
esta operação poderá haver a dissolução duma pequena parte das carragenanas, que se
perderá com as lavagens. É possível evitar este inconveniente administrando às algas
uma solução de cloreto de cálcio, que torna as carragenanas insolúveis. Após a primeira
lavagem, procede-se à descoloração pela adição de hipoclorito de sódio, que será
eliminado por um ligeiro excedente de hidrogenosulfito de sódio (Genu Ltd., 1985;
Perez et al., 1992).
Extracção da solução de carragenanas: As algas são em seguida mergulhadas numa
solução alcalina de C2 (OH)2 ou de NaOH a 0,1 N, à razão de 100 l por Kg; a matéria
vegetal desagrega-se progressivamente sob a pressão de um martelo pilão.
Junta-se, habitualmente, uma pequena quantidade de fosfato solúvel (cerca de 1
kg para cada 10.000 l), afim de aumentar o rendimento final em carragenanas. O
tratamento alcalino tem por objectivo “inchar” e amolecer as algas, para que se
desagreguem com maior facilidade. Para além disso, o tratamento alcalino visa a
transformação dos monómeros de α-D-galactopiranose-6-sulfato em unidades
hidrófobas de 3,6 anidro-α-D-galactopiranose, que eleva a força do gel e a reactividade
das carragenanas.
A lambda carragenana dissolve-se a baixas temperaturas (15 a 20º C), enquanto
que a kappa e a iota carragenana só se dissolvem a temperaturas mais elevadas (60 a 95º
C). A temperaturas superiores poderá haver a dissolução doutros polissacarídeos, tal
como o amido florídeo (Genu Ltd., 1985; Perez et al., 1992).
Isolamento da Solução de Carragenanas: É extremamente difícil separar a solução de
carragenanas das partículas sólidas de reduzida dimensão. O método correntemente
usado pelas indústrias de extracção consiste numa filtração feita no interior de cilindros,
a quente e sob pressão; a mistura, á qual se adicionou, previamente, terra de
diatomácaes, é filtrada através de sacos de tela com malha muito fina. A mistura obtida
contém de 1 a 2% de carragenanas (Genu Ltd., 1985; Perez et al., 1992).
Isolamento das Carragenanas: O maior problema do isolamento consiste na separação
das carragenanas a partir da mistura aquosa (1 a 2 g de carragenana por cada 48 g de
água). Alguns produtores reduzem a quantidade de água, por evaporação parcial,
fazendo passar a solução por cilindros aquecidos, até obterem uma concentração de 4%
em carragenanas.
Na maior parte dos casos, a solução de carragenanas é vertida numa bacia com
álcool isopropílico. As carragenanas precipitam sob a forma de um aglomerado fibroso
e esbranquiçado. O álcool isopropílico e os coágulos formados são, em seguida,
projectados por uma bomba em direcção a um crivo vibrador, que deixa passar o álcool
mas retém os coágulos de carragenana; estes são depois submetidos a uma série de
lavagens em álcool. Neste estado, a cadeia polissacarídica é extremamente frágil.
Alguns produtores submetem o coágulo a uma centrifugação, numa máquina de
secagem provida de grandes cestos; outros, para obterem uma melhor qualidade final,
procedem a uma desidratação da pasta de carragenanas, por intermédio de baixas
temperaturas (entre os 0 e os 5º C), ou de microondas.
O álcool utilizado, durante as diferentes fases de extracção, é recuperado e
enviado para uma coluna de destilação, com vista á sua purificação; de qualquer modo,
perde-se, em cada ciclo de utilização, 10 a 15% do volume inicial.
A pasta fibrosa (seca) de carragenanas, assim obtida, é moída em partículas de
80 a 270 µ, embalada e submetida a um controle que verifica a sua composição e as
suas propriedades funcionais: humidade, pureza, viscosidade e força do gel (Genu Ltd.,
1985; Perez et al., 1992).
As Indústrias de Transformação e de Extracção
A maior parte das operações relacionadas com a extracção das carragenanas
necessitam de muita água; assim, a unidade fabril deve dispor de:
- uma fonte de água de boa qualidade (pouco túrbida);
- uma fonte de energia abundante e com o menor custo possível;
- uma fonte de produtos filtrantes: terra de diatomáceas ou rochas vulcânicas
micro-moídas;
- um sistema de depuração eficaz.
Uma fábrica só é rentável se produzir mais de 500 toneladas de carragenanas por
ano, o que corresponde ao tratamento de 1.400 a 2.100 toneladas de algas secas por ano.
O investimento para a instalação dos equipamentos de base, situa-se em torno dos 4,7
milhões de Euros, a preços de 1992 (Perez et al., 1992).
Propriedades das Carragenanas
Solubilidade: A carragenana exibe a solubilidade característica
hidrofílicos: é solúvel na água e insolúvel na maioria dos solventes orgânicos.
dos
colóides
Os alcoois e as acetonas, apesar de serem miscíveis em água, não são solventes
da carragenanas, no entanto, são tolerados em misturas com soluções de carragenana
superiores a 40%. Alguns solventes muito polares, como por exemplo a formamida e a
N,N-dimetilformamida, são tolerados, quando misturados com soluções de carragenana,
em elevadas proporções, mas promovem uma nítida tumefacção do polímero (Genu,
Ltd., 1985; Perez et al., 1992).
A solubilidade das carragenanas na água é influenciada por diversos factores,
entre os quais se destacam:
a) tipo de carragenana;
b) iões presentes;
c) outros solutos;
d) temperatura;
e) pH.
A solubilidade dos diferentes tipos de carragenana: Graças à variação de alguns
detalhes da estrutura das carragenanas, existe também uma grande variabilidade em
relação à sua solubilidade. No entanto, para fins práticos, é conveniente estudar este
fenómeno só em relação aos principais tipos de carragenana.
Assim, a λ carragenana que, por definição, não apresenta unidades 3,6-anidro-Dgalactopiranose, é facilmente solúvel, na maior parte das condições, desde que se
apresente bem sulfatada. A κ carragenana é menos solúvel pois apresenta na sua
estrutura unidades de 3,6-anidro-D-galactopiranose (unidades de carácter hidrófobo) e
alguns grupos sulfato. Com características intermédias, surge a ι carragenana, mais
hidrofílica do que a κ carragenana, devido à posição dos resíduos de 3,6-anidro-Dgalactopiranose e à presença de grupos 2-sulfato (Genu Ltd., 1985; Perez et al., 1992).
Efeito da presença de iões: A solubilidade é afectada também pela natureza do sal, dos
grupos éster sulfatados, particularmente no caso da κ carragenana. As formas com sódio
são geralmente mais solúveis do que as formas cujo catião é o potássio.
A κ carragenana de sódio é mais apropriada para situações em que é necessário
um solubilidade em água fria, passando-se com a κ carragenana de potássio.
O sal de potássio de ι carragenana é também insolúvel em água fria, embora
dilate marcadamente. O sal de λ carragenana é solúvel qualquer que seja a sua natureza
(Genu Ltd., 1985; Perez et al., 1992).
Outros Solutos: A solubilidade das carragenanas é afectada pela presença de outros
solutos; este efeito deve-se principalmente à competição entre os solutos e a água
disponível, da qual resulta uma alteração do estado de hidratação do polissacarídeo. De
todas as carragenanas, a do tipo κ, é a mais sensível à presença de solutos.
Os sais orgânicos são mais efectivos na alteração da hidratação das
carragenanas, particularmente aqueles cujo catião é o potássio: 1,5 a 2% de cloreto de
potássio é o suficiente para impedir a dissolução da κ carragenana, à temperatura
ambiente; soluções de 4 a 4,6% (ou valores superiores) de cloreto de sódio têm
exactamente o mesmo efeito.
A hidratação da κ carragenana é pouco afectada na presença de sacarose em
concentrações iguais a 50%; mesmo para valores superiores é necessária a presença de
glicerol em grandes quantidades para que efeitos apreciáveis possam ser observados.
Nos casos em que haja mais de um soluto presente, o seu efeito combinado, na
hidratação, é geralmente aditivo e pode ser previsto pelo conhecimento dos respectivos
efeitos separados. Por exemplo, na presença de grandes quantidades de glicerol, a
solubilidade é muito influenciada pela presença de vestígios de iões potássio.
A ι carragenana dissolve-se, após aquecimento, em soluções com altas
concentrações de sais, sendo possível, em consequência, promover a gelificação em
situações em que as grandes quantidades de sais impossibilitam automaticamente a
utilização de κ carragenana (Genu Ltd., 1985).
Dispersão (ver Tabela 3): Apesar da carragenana ser um polissacarídeo solúvel em água
é, no entanto, de difícil dispersão, devido à formação de uma membrana em torno de
cada partícula de carragenana, que leva à formação de grandes aglomerados.
Quanto menos solúvel for a carragenana mais fácil será a sua dispersão. Por
exemplo, a κ carragenana de potássio (insolúvel em água fria) é muito mais fácil de
dispersar em água fria do que a κ carragenana de sódio.
Todos os factores que diminuam/aumentem a solubilidade da carragenana têm o
efeito oposta em relação à sua dispersão.
Na maior parte das aplicações a carragenana tem de ser previamente misturada
com outros ingredientes, como por exemplo o açúcar (1 parte de carragenana para 10
partes de açúcar), de forma a facilitar a sua dispersão. Em aplicações onde a
carragenana não possa ser previamente misturada com outros ingredientes, é necessário
utilizar um misturador rotativo de alta velocidade, de forma a romper os aglomerados
entretanto formados pela adição da carragenana à água. A dispersão mecânica, por
intermédio de misturadores de alta velocidade, reduz em cerca de 3% a força (vigor) da
dispersão.
Embora as carragenanas de potássio e de cálcio se apresentem pouco solúveis
(ou insolúveis), estas dilatam em água fria, produzindo dispersões viscosas.
Em água quente (60-75º C) a carragenana pode dissolver-se até formar soluções
de 7 - 8% (Tab. 3) (Genu Ltd., 1985).
Tabela 3 - Solubilidade das diferentes carragenanas. (Segundo Genu Ltd., 1985).
Meio
kappa carragenana
iota carragenana
lambda carragenana
Água quente
Solúvel acima dos 60º C
Solúvel acima dos 60º C
Solúvel
Água fria
Sais de sódio solúveis.
Sais de sódio solúveis.
Solúvel
Sais de potássio e de cálcio,
Os sais de cálcio originam
insolúveis
dispersões tixotrópicas
Leite quente
Solúvel
Solúvel
Solúvel
Leite frio
Sais de sódio, cálcio e
Insolúvel
Solúvel
Solúvel a quente
Dificilmente solúvel
Solúvel a quente
Insolúvel
Solúvel a quente
Solúvel a quente
potássio, insolúveis, mas
apresentando uma dilatação
marcada
Soluções concentradas de
açúcar
Soluções concentradas de
sais
Reacções
Estabilidade em solução: Os agentes ácidos e oxidantes podem hidrolizar as
carragenanas em solução, levando à perda das suas propriedades físicas, devido à
clivagem de ligações glicosídicas. A hidrólise ácida depende:
- do pH;
- da temperatura;
- do período de tempo.
Para que a degradação, durante o processo, seja reduzida ao mínimo, é
necessário utilizar altas temperaturas e processos curtos. A carragenana em solução tem
máxima estabilidade a um pH=9, não sendo possível o seu processamento a quente para
valores de pH inferiores a 3,5. Para valores de pH iguais ou superiores a 6, as soluções
de carragenana apresentam-se estáveis, tal como acontece nos processos de esterilização
de peixe e na manufactura de produtos à base de carne, como é o caso da preparação de
comida para animais.
A hidrólise ácida ocorre quando a carragenana se encontra dissolvida e a
temperatura e/ou tempo de processamento são elevados. No entanto, quando a
carragenana se encontra sob a forma de gel, a hidrólise ácida não ocorre (Genu Ltd.,
1985).
Reacção com outros hidrocolóides carregados electricamente
A carragenana é uma galactana sulfatada com uma forte carga negativa, em toda
a amplitude de pH encontrada nos produtos alimentares.
A carragenana pode interagir com outras macromoléculas electricamente
carregadas, tais como as proteínas, para se obterem variações ao nível da viscosidade,
da gelificação, da estabilização e da precipitação. O resultado da interacção
carragenana/proteína depende do pH do sistema e do ponto isoeléctrico da proteína. Por
exemplo, quando se mistura a carragenana à gelatina, num sistema com um valor de pH
superior ao do ponto isoeléctrico da gelatina, a carragenana promove o aumento da
temperatura de fusão do gel, não influenciando significativamente a textura do mesmo
(Genu Ltd., 1985; Craigie, 1990).
Mecanismos da Gelificação
Efeito dos catiões
Tipo de gel
kappa carragenana
Gel mais forte com iões
de potássio
Forte e quebradiço com
sinérese
Elevado
Efeito sinergético com
a farinha de alfarroba
Estabilidade
na Não tem
congelação/descongela
ção
(Segundo Genu Ltd., 1985)
iota carragenana
Gel mais forte com iões
de cálcio
Elástico e coesivo sem
sinérese
Elevado
lambda carragenana
Não gelifica
Estável
Não tem
Não gelifica
Não tem
A estrutura da κ e ι carragenana apresenta-se sob a forma de hélices duplas, que
ao se associarem formam uma cadeia molecular tridimensional - o gel (Fig. 8). A λ
carragenana possui uma estrutura que não permite a formação de hélices duplas.
Gelificação da κ e ι carragenana: Se estiverem presentes catiões gelificantes, a κ e a ι
carragenana forma géis aquosos termo-reversíveis, em concentrações iguais ou
superiores a 0,5%. O gel apresenta algumas propriedades de sólido e outras de líquido;
assim, fica com o formato do recipiente mas mantém a pressão de vapor e a
conductividade do líquido de que é feito. A rigidez, a temperatura de fusão e de
gelificação do gel de κ carragenana aumentam com concentrações crescentes do ião
potássio (Smidsrod & Grasdalen, 1984; Genu Ltd., 1985; Rees, 1963, 1981 in Perez et
al., 1992).
Fig. 8 - Representação esquemática da gelificação das carragenanas (Segundo Genu Ltd., 1985).
Na prática, o uso do cloreto de potássio (para aumentar a consistência do gel e
modificar a temperatura de gelificação) é limitado, pois adiciona à solução um gosto
“amargo”. O percentagem máxima de cloreto de potássio, a adicionar a produtos
alimentares com sabor delicado, é de 0,1 a 0,2%. Em comidas salgadas (produtos à base
de carne) o cloreto de potássio pode ser substituído, com vantagem, pelo cloreto de
sódio.
O gel de κ carragenana mais consistente é produzido na presença de iões de
potássio e de cálcio. No entanto, a presença de iões de cálcio tornam o gel quebradiço,
enquanto que o gel com iões de potássio é elástico, transparente e coeso.
A adição de grandes quantidades de iões de sódio perturba a gelificação da
carragenana e reduz a consistência do gel, facto que deve ser levado em conta quando se
trata de produtos gelificados à base de carne, pois é usual adicionar-se cloreto de sódio,
como aditivo, a estes produtos.
A consistência, a textura e a temperatura de gelificação são influenciadas pela
presença de outros solutos, como por exemplo a sacarose. Este soluto aumenta a
temperatura de gelificação e de fusão do gel. A adição de sacarose implica a utilização
de altas temperaturas, para que a carragenana se dissolva e, em casos de pH ácido,
existe a possibilidade da carragenana se degradar. Por conseguinte, em misturas com
sacarose, as substâncias ácidas devem ser adicionadas o mais tarde possível. Na prática,
não é possível usar a κ carragenana em produtos alimentares cujo conteúdo em açúcar
(sacarose) seja superior a 60% (Genu Ltd., 1985).
Ao contrário da κ carragenana, o gel de ι carragenana apresenta a sua maior
consistência na presença de iões de cálcio. O gel formado é elástico, coeso e não exuda
água.
A ι carragenana é o único tipo de carragenana cujo processo de
congelação/descongelação é estável, ao contrário do que se passa com o gel de κ
carragenana, pois este forma um gel quebradiço e com sinérese (exuda água).
Interacções com outras “gomas”: Em situações onde a gelatina era tradicionalmente
preferida em relação às carragenanas (particularmente em sobremesas gelatinosas) a
indústria introduziu combinações de κ carragenana com outras gomas, de forma a
simular a textura produzida pela gelatina.
Reacção das Carragenanas com o Leite
A carragenana reage com uma fracção proteica do leite, chamada caseína, da
qual resulta a formação de uma rede tridimensional, onde a água, sais e partículas ficam
aprisionados. A interacção entre a caseína e a κ carragenana não é, no entanto,
responsável pela gelificação dos produtos lácteos. Aquando do arrefecimento da
carragenana (a temperaturas abaixo do ponto de gelificação), vários sectores das
moléculas de carragenana formam hélices duplas, como acontece nos sistemas aquosos.
A interacção caseína-carragenana manifesta-se na diminuição da quantidade de κ
carragenana necessária para a gelificação do leite: a quantidade de carragenana
necessária para gelificar o leite é muito menor (aproximadamente 1/5) da necessária
para gelificar um sistema aquoso.
Por outro lado, a
λ carragenana aumenta a viscosidade do leite, em
concentrações de 0,05 a 0,1%. Para se obter um efeito similar num sistema aquoso seria
necessário uma concentração de 0,5 a 1% (Genu Ltd., 1985).
Utilização das Carragenanas na Alimentação
A primeira menção do uso de carragenana na indústria alimentar é de meados
do século XIX, como agente clarificante da cerveja (Booth, 1975). A extensa lista de
características que as carragenanas apresentam, levaram ao aparecimento e à expansão
da indústria de derivados lácteos.
Estandardização das Carragenanas: A carragenana é usada numa extensa gama de
produtos, em concentrações que variam entre os 0,005% e os 3,0%. Os vários tipos de
carragenana estandardizada são usados sobretudo como agentes gelificantes em
sistemas aquosos e lácteos.
A estandardização obtém-se pela combinação de diferentes quantidades de
carragenana e/ou pela combinação com uma substância inerte, como por exemplo a
sacarose e a dextrose. A estandardização das misturas de carragenana com açúcares é
reconhecida e autorizada pela Comunidade Europeia e pela FAO/WHD. Um sumário da
especificações de pureza é apresentado na Tabela 4.
Tabela 4 - Especificações da pureza das carragenanas - E407
Especificações
Matéria volátil
Sulfato
Cinzas
Cinza ácida insolúvel
Resíduo
ácido
insolúvel
Metil-, Etil-, e Isopropanilalcool
Viscosidade (1,5% sol.)
As, ppm
Pb, ppm
Cu + Zn, ppm
Zn, ppm
Total
de
metais
pesados ppm
FAO
max. 12%
15-40%
15-40%
máx. 2%
FCC
máx. 12%
18-40%
máx. 35%
máx. 1%
-
CE
máx. 12%
15-40%
15-40%
máx. 2%
-
-
-
máx. 1%
min. 5 cP
máx. 3
máx. 10
máx. 40
min. 5 cP
máx. 3
máx. 10
máx. 40
min. 5cP
máx. 3
máx. 10
máx. 50
máx. 25
-
FAO - FOOD AND NUTRITION 31/2
JECFA specifications for identity and puritty of food additives, 1984; (anticaking agents, buffering
agents, salts, emulsifiers, enzymes, extraction solvents, flavouring agents, and miscellaneous food
additives)
FCC - FOOD CHEMICAL CODEX, Third Edition, Washington, D.C., 1981
EC - ECONOMIC COMUNITY, Council Directive of 25 July 1978 laying down specific criteria of
purity for emulsifiers, stabilizers, thickeners, and gelling agents for use in foodstufs (78/663/EC)
Devido à sua reactividade específica com o leite, da qual resulta um gel suave e
agradável às papilas, 52% das aplicações das carragenanas são referentes à indústria de
lacticínios (indústria do leite e seus derivados). Em sobremesas lácteas gelificadas, o
agente gelificante usado é normalmente a κ carragenana, devido ao seu baixo custo: esta
carragenana é normalmente usada na preparação dos flans em pó. Nos flans “prontos a
comer”, a κ carragenana é insuficiente para manter a sua estrutura gelatinosa durante
várias semanas, pelo que, por vezes, é combinada com a ι carragenana ou com a LMpectina. Assim, é possível produzir, com o auxílio das carragenanas, sobremesas lácteas
e flans de consistência gelatinosa, sem recorrer ao uso de farinhas e ovos, levando à
criação de uma alimentação mais ligeira e com fins dietéticos (Tab. 5) (Morand et al.,
1991).
A utilização da iota carragenana em sobremesas oferece a vantagem de produzir
um gel de estrutura comparável à da gelatina, mas com um ponto de fusão mais elevado.
As sobremesas podem então ser comercializadas e consumidas em países de clima
tropical ou em locais sem sistemas de refrigeração (frigoríficos, etc.).
A estabilização de partículas de cacau e de suspensões gordas no leite
achocolatado, obtém-se com a adição de 0,02% - 0,03% de κ carragenana. O controlo
da viscosidade e da estabilidade do creme em preparações lácteas para pequenos
almoços é obtida pela incorporação de λ carragenana.
Nos gelados, a presença de baixas concentrações de κ carragenana (0,01 0,02%) permite a formação de um delicado gel que evita a separação da mistura
(aromas, nata, etc.).
A lista de utilizações na indústria dos derivados lácteos é longa: síntese de
diversos leites espessos, concentrados, achocolatados, aromatizados, produção de
cremes espessos, batidos de longa duração, flans de preparação a frio ou a quente,
mousses instantâneas, leites gelificados, flans de longa duração, iogurtes gelificados,
sobremesas ácidas e gelados industriais.
A estas aplicações, ligadas ao leite, é necessário juntar os géis aquosos
intervenientes na formação de coberturas ou na preparação de bebidas em pó, na
preparação de produtos reestruturados, tais como os frutos, legumes, salsichas (onde
substitui, com vantagem, os lípidos), peixes, crustáceos, na criação de novos produtos
para alimentação infantil, molhos emulsionados, para consumir a frio ou a quente, sopas
e caldos, preparações à base de frutos (bombons, compotas, marmeladas, patês, bebidas
e néctares) e, finalmente, como clarificante de vinhos e cervejas (Ribier & Godineau,
1984; Genu Ltd., 1985; Gayral & Cosson, 1986; Morand et al., 1991; Perez et al., 1992;
Jensen, 1993; Tardieu, 1993).
Tabela 5 - Principais funções das carragenanas na indústria alimentar
(Segundo Morand et al., 1991)
Produto
Alimentos enlatados
Gelados
Pudins lácteos instantâneos
Leite achocolatado
Sobremesas gelatinosas
Geleias pouco calóricas
Alimentos enlatados para animais
Xaropes
Imitações de “coffee creams”
Pudins
Coberturas artificiais de nata
Molhos
Alimentos reestruturados
Estabilizante/Emulsificante
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Agente Gelificante
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Receitas Culinárias
Geleia de carragenana: Pó de carragenana (40g); açúcar amarelo (20g); água
(100g); água de flor de laranjeira (5g). Obtém-se assim 125g de geleia (Saury, 1984).
Leite de carragenana: Leite de vaca (1 l); pó de carragenana (5g); açúcar amarelo
(30 g); canela (1,5 g). Ferver durante 10 minutos e passar (Saury, 1984).
Aplicação na Cosmética
A elevada taxa de difusão dos géis aquosos e a aptidão para formar películas são
algumas das propriedades que possibilitam a utilização das carragenanas em várias
aplicações não alimentares.
As carragenanas pode ser usadas na estabilização de pastas dentífricas. Neste
domínio entram em directa competição com a carboximetilcelulose, mas a carragenana
é normalmente preferida pois resiste às enzimas que atacam os colóides celulósicos. A
sua capacidade de formar géis aquosos altamente estáveis contra a degradação
enzimática, torna a carragenana única como agente espessante nesse tipo de pastas. A
sua estrutura permite, nestas circunstâncias, a libertação dos sabores e aromas durante a
lavagem dos dentes.
A indústria de cosméticos tem feito uso crescente das carragenanas na fabricação
de loções, cremes e géis perfumados. A aptidão para formar finas películas torna a
carragenana um excelente acondicionador de “shampoos” (Booth, 1975; Stanley, 1987;
Roeck-Holtzhauer, 1991; Indergaard & Ostgaard, 1991).
Uma das mais interessantes aplicações das carragenanas é feita em cremes de
beleza, pois a rápida evaporação da fase aquosa da emulsão, liberta, sobre a pele, um
microfilme oleoso, protector e medicinal (Blunden, 1991).
A utilização de carragenanas na impressão (estampagem) de tecidos tem vindo a
declinar desde 1970, devido á sua substituição por alginatos. No entanto, as
carragenanas impuseram-se, a partir de 1975, no domínio dos géis desodorizantes
(ambientadores sólidos), mercado que não cessa de progredir (Booth, 1975; Stanley,
1987; Roeck-Holtzhauer, 1991; Indergaard & Ostgaard, 1991).
Aplicação na Medicina, Investigação Científica e Indústria Farmacêutica
Podemos considerar que actualmente a alimentação representa cerca de 78% das
aplicações das carragenanas, onde:
- 52% são aplicadas em derivados do leite;
- 16% são aplicadas em géis aquosos;
- 10% são aplicadas noutros produtos alimentares.
Os 22% restantes são aplicados na indústria cosmética, de higiene pessoal, na indústria
farmacêutica (cerca de 10%) e na medicina (Smidsrod & Christensen, 1991; Morand et
al., 1991).
A indústria farmacêutica utiliza as carragenanas em especialidades laxativas e
em preparações com compostos insolúveis. Devido à sua viscosidade, estes ficocolóides
são usados no tratamento das úlceras do trato digestivo. Esta última propriedade resulta
da reacção carragenana-proteína: a dificuldade na cicatrização das úlceras gástricas
resulta do facto de, uma vez lesada a parede estomática, a pepsina (enzima gástrica
destinada a hidrolizar as proteínas) ataca também as células que constituem a parede;
tudo isto é agravado pela acidez do suco gástrico (García et al. 1993). A utilização de
sódio-carragenana desencadeia duas acções:
- a reacção carragenana-pepsina (proteína com carga positiva, num pH ácido)
conduz a uma neutralização da enzima;
- redução do ácido gástrico pela actuação do sódio.
Segundo o médico Alain Saury (Saury, 1984) as carragenanas têm as seguintes
indicações:
Uso interno: enterite, desinterite,
insuficiências
glandulares,
obesidade,
emagrecimento, bronquites e pneumonias.
diarreias, prisão de ventre crónica,
linfatismo,
escrofulose,
raquitismo,
Uso externo: vaginite, metrite, conjuntivite e blefarite.
Modo de aplicação (uso interno): Decocação: uma colher de sopa de talo (de
carragenófitas) por litro de água; faz-se ferver até obter uma geleia; Leite fortificante:
leite (1 l), carragenana (5 g); açúcar (30 g), canela (1,5 g).
Modo de aplicação (uso externo): Decocação: em cataplasmas nos olhos
(conjuntivite, blefarite); em injecções vaginais (vaginite, metrite).
É de assinalar que, recentemente, se evidenciou uma acção antiviral dos
extractos de carragenana (Neushul, 1990; Carlucci et al., 1999). Após separação dos
diferentes tipos, por intermédio da cromatografia líquida (numa coluna PL5) de alta
temperatura e de alta pressão, demonstrou-se que a ι e λ carragenana, quando aplicadas
em pequenas concentrações, provocam uma simulação linfocitária capaz de inibir 80%
(ι carragenana) e 100% (λ carragenana) o desenvolvimento do vírus da herpes simplex
(HSV). As carragenanas também interferem na fusão das células infectadas com o vírus
da imunodeficiência humana (HIV) e inibem a enzima retroviral específica
“transcriptase reversa” (“specific retroviral enzyme reverse transcriptase”) (Neushul,
1990). Trabalhos recentes (Neushul, 1990) sugerem que as moléculas de carragenana
inibem as infecções por DNA- e RNA-vírus. Vários autores (Thomson & Fowler, 1981,
Abraham et al., 1985, Sellin & Oyarzabal, 1988 in Neushul, 1990) estão de acordo que
as carragenanas constituem um potente anti-inflamatório e produzem efeitos
prolongados no sistema imunitário.
Para além da actividade antiviral (Carlucci et al., 1999), os extractos de algas
(Gigartinaceae) e as carragenanas apresentam também actividade antitumoral (Noda et
al., 1990) (Tab. 6), anticolesterol, anticoagulante do sangue (Briones et al., 2000) e
efeito espermicida (Zacharopoulos et al., 1997; Maguire et al., 1998).
Tabela 6 - Actividade antitumoral do extracto de algas (Gigartinaceae) e das carragenanas no rato
(Segundo Noda et al., 1990).
Espécie
Carragenana
-
Percentagem máxima de
inibição do “Ehrlich
carcioma”
12,5 % (1)
-
Percentagem máxima de
inibição do “Meth-A
fibrosarcoma”
34,7 % (2)
Gigartina intermedia
Chondrus ocellatus f.
crispus
-
ι carragenana
22,2 % (3)
40,1 % (4)
κ carragenana
λ carragenana
49,0 % (5)
63,2% (6)
54,0 % (4)
45,8 % (4)
(1) administração de 1600 mg de pó de alga por Kg de rato, por dia, num período de 28 dias;
(2) administração de 50 mg Kg -1 d -1 , num período de 7 dias;
(3) administração de 150 mg Kg -1 d -1 , num período de 28 dias;
(4) administração de 40 mg Kg -1 d -1 , num período de 5 dias (7 dias para a ι carragenana);
(5) administração de 200 mg Kg -1 d -1 , num período de 28 dias;
(6) administração de 100 mg Kg -1 d -1 , num período de 28 dias.
Outras Aplicações das Carragenanas
A κ carragenana, devido à natureza rígida do gel que origina, tem uma aplicação
significativa nas novas áreas biotecnológicas.
A capacidade de formar géis fortes, transparentes e termo-reversíveis na
presença de sais de potássio, torna a κ carragenana num possível agente gelificante de
enzimas e células vivas: as células bacterianas e as leveduras podem ser encapsuladas
ou imobilizadas em pequenas esferas. Estas pequenas esferas podem depois ser usadas,
directa ou indirectamente (modificadas), em bio-conversões (Tab. 7) (Guiseley, 1989 in
Renn, 1990; Skjak-Braek & Martinsen, 1991).
Tabela 7 - Exemplos de células imobilizadas em κ carragenana (juntamente com outros produtos).
(Segundo Skjak-BraeK & Martinsen, 1991).
CÉLULAS
Bactérias
Acetobacter aceti
Bacillus subtilis
B. polymyxa
Brevibacterium flavum
Brevibacterium flavum
Clostridium acetobutylicum
Escherichia coli
Lactobacillus sp.
Pseudomonas dacunhae
P. putida
Zymonas mobilis
Fungos
Candida tropicalis
Conidiobolus sp.
Saccharomyces cerevisae
Penicllium chrysogenum
Pichia farinosa
Algas
Scenedesmus sp.
Células Vegetais
Daucus carota
PRODUTO ADICIONADO
Vinegar
α-Amilase
Butano-2,3-diol
L-Ácido Málico
L-Glutamato
Acetona/Butanol
L-Ácido Aspártico
Vinho
L-Alanina
L-Ácido Aspártico
Etanol
Ácido Cítrico
Proteases
Etanol
Penicilina-G
Glicerol
Água
-
Actualmente estuda-se a possibilidade de se usarem células vegetais,
imobilizadas em carragenana, na produção comercial de metabolitos secundários (Renn,
1990). Carragenanas especiais, que gelificam quimicamente, sem aplicação de calor,
podem ser usadas como agentes gelificantes para meios bacteriológicos sólidos (Genu
Ltd., 1985).
Novas aplicações surgem sem cessar: os americanos conservam o peixe, no
interior de barcos de pesca, através da administração de antibióticos; a adição de
carragenanas, antes da congelação, permite uma melhor repartição do antibiótico e um
consequente aumento da sua eficácia (Ribier, 1984).
Mercado Mundial de Carragenanas
O mercado mundial de carragenanas baseia-se, fundamentalmente, nos tipos
kappa (κ), lambda (λ) e iota (ι). A partir destes, por mistura com outros colóides e
substâncias (sacarose, glicose, guar, caruba, pectina, alginatos, agar, etc.), é possível
criar mais de 200 variedades e, cada uma, pode ser modificada de modo a se adaptar a
cada necessidade.
A produção mundial situa-se ao redor das 12.300 toneladas. Após uma
progressão espectacular entre 1975 e 1984, a produção actual tem crescido de forma
moderada. Entre 1975 e 1980 os fornecedores foram surpreendidos pelo brusco aumento
da qualidade da matéria prima ligada ao desenvolvimento da cultura de Eucheuma nas
Filipinas (Tab. 8). A produção passou então a ser superior à procura, o preço das algas
caiu e o mercado tornou-se instável. A situação evoluiu rapidamente, pois novas
aplicações para estes colóides foram criadas; de 1.200 utilizações passou-se, em dois
anos, para 4.200.
O mercado actual é caracterizado por uma procura superior à produção, o que
levou à implantação de novas culturas marinhas e à introdução de culturas em bacias.
Após os sobressaltos dos últimos 10 anos a procura deverá progredir mais lentamente (4
a 5% por ano) do que entre 1970 e 1985.
Perto de metade das carragenanas extraídas são utilizadas na Europa (45%),
enquanto que a América do Norte consome 23%, a América do Sul 12% e a Ásia
(sobretudo o Japão) 20%. O Japão decidiu em 1991 construir as suas próprias fábricas
para a extracção de carragenanas, o que deverá modificar, a curto e médio prazo, as
estruturas do mercado mundial (Perez et al., 1992).
Tabela 8 - Macroalgas usadas na extracção de carragenanas.
(Segundo Jensen, 1979, Michanek, 1975, FAO, 1978 in Tseng, 1981)
MACROALGAS
(Géneros)
Quantidade usada
(toneladas/ano - peso
fresco)
Chondrus
Gigartina
Iridaea
Eucheuma
45.200
4.500
6.500
200.000
Carragenanas
(toneladas/ano - peso
seco)
20.000
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O que são carragenanas?