1 A INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES: avaliação competitiva e proposições políticas para o desenvolvimento local Ana Luísa de Souza Soares RESUMO Entre as décadas de 80 e 90 a indústria naval brasileira passou por uma profunda crise que acabou por comprometer sua posição no ranking mundial de construtores navais; e principalmente, comprometeu a incorporação de tecnologias, a especialização da produção, e a identificação de novos nichos de mercado. Em 2003, o governo federal visando incentivar a produção naval criou linhas de financiamento à construção de embarcações de apoio à PETROBRÁS e embarcações pesqueiras. Frente a isto, se objetivou a avaliação da capacidade competitiva da indústria naval de Itajaí e Navegantes- SC a partir de sua capacitação tecnológica, de modo a atender as demandas por construção e modernização de embarcações. Utilizando-se de levantamento bibliográfico, e dados primários coletados através de questionário, obteve-se dados e informações que permitiram a descrição e análise da indústria naval. A avaliação mostrou que a indústria naval possuía vantagens competitivas estáticas, baseadas em formas tradicionais de produção e projetos, e numa mão-de-obra qualificada; a indústria apresentou baixa atualização tecnológica e tinha comprometida sua capacidade de aprendizagem e inovação pela falta de um fluxo contínuo de informações com os demais agentes locais. A atualização tecnológica da indústria naval local e sua inserção em novos mercados será possível no momento em que o governo do Estado de Santa Catarina assumir a governança local, discutindo e promovendo ações que possibilitem maior interação entre os agentes locais, a busca de maior conhecimento, e no desenvolvimento de competências que caracterizem a especialização produtiva. PALAVRAS CHAVES: indústria naval, vantagens competitivas, capacitação tecnológica. 2 LISTA DE QUADROS E GRÁFICOS Fluxograma 1 - Cadeia Produtiva da Indústria da Construção Naval.............................12 Gráfico 1– Concentração das Atividades Navais por uso de Insumos em MPEs...........15 Gráfico 2 – Fatores que Influenciam nas Perdas e Descartes na Produção com Aço.....17 Gráfico 3– Fatores que Influenciam nas Perdas e Descartes na Produção com Madeira.......................................................................................................................... .18 Gráfico 4 – Principais Exigências nos Mercados de Atuação.........................................21 Gráfico 5 – Fatores que Influenciam na Determinação dos Fornecedores......... ............21 Gráfico 6 – Fatores que Determinam a Competitividade entre as Empresas do Setor.................................................................................................................................23 Gráfico 7 – Principais Fontes Externas de Informações..................................................23 Gráfico 8 – Fatores que Levam a Incorporação de Inovações.........................................24 Gráfico 9 – Melhoria no Desempenho da Empresa pela Incorporação de Inovações.........................................................................................................................25 Gráfico 10 – Vantagens Locacionais...............................................................................26 Gráfico 11 – Problemas Referentes à mão-de-obra.........................................................28 3 SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO......................................................................................01 1.1 OBJETIVOS..............................................................................................................01 1.1.1 Objetivo Geral.....................................................................................................01 1.1.2 Objetivos Específicos..........................................................................................01 1.2 METODOLOGIA......................................................................................................02 1.3 CONCEITUALIZAÇÃO...........................................................................................03 2 A INDÚSTRIA NAVAL NO BRASIL E NO MUNDO....................07 2.1 HISTÓRICO..............................................................................................................07 2.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA INDÚSTRIA NAVAL BRASILEIRA............................................................................................................08 2.3 COMPETITIVIDADE E CARACTERÍSTICAS TECNOLÓGICAS DA INDUSTRIA NAVAL NACIONAL........................................................................10 2.4 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PRODUTORES MUNDIAIS......................11 3 DESCRIÇÃO DA INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES- SC.............................................................................14 3.1 CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO.................................................................15 3.2 FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS.............................................................19 3.3 MERCADOS.............................................................................................................20 3.4 COMPETITIVIDADE...............................................................................................22 3.5 FONTES DE INFORMAÇÃO..................................................................................22 3.6 INOVAÇÕES............................................................................................................24 3.7 VANTAGENS LOCACIONAIS...............................................................................26 3.8 INSTITUIÇÕES LOCAIS.........................................................................................27 3.9 CARACTERÍSTICAS DA MÃO-DE-OBRA...........................................................27 4 ANALISE DOS RESULTADOS SOBRE A INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES......................................................................29 5 PROPOSIÇÕES POLÍTICAS PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES................35 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ...................................................38 . 1 1 INTRODUÇÃO A indústria naval esta inserida na categoria de material de transporte, segundo classificação oficial do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esta indústria caracteriza-se como sendo intensiva em mão-de-obra, a atividade é incorporadora de economias de escala com fortes impactos a montante na cadeia produtiva, e conseqüentemente tendo forte efeito multiplicador de empregos. A produção é dependente de encomendas com longo prazo de maturação. Embora o Brasil tenha sido considerado na década de 70 o segundo maior pólo mundial de construção naval, ao longo das últimas duas décadas a indústria naval sofreu intensamente os reflexos da crise econômica, que reduziu a demanda por embarcações devido à falta de financiamento e as altas taxas de juros. O único documento histórico, sobre a indústria naval de Itajaí e Navegantes, identificado mostrou que em 1968 estavam instalados na região cinco estaleiros dos oito presentes no Estado. Esses construíam e reparavam embarcações de madeira usando equipamentos rudimentares, apontando à necessidade de reestruturação produtiva; além de apoio financeiro principalmente para suprir a necessidade de capital de giro (CONSELHO DE DESENVOLVIMENTO DO EXTREMO SUL- CODESUL, 1968). Com a perspectiva de dinamização desta indústria visto a iniciativa do governo federal em financiar a construção e a modernização de embarcações petrolíferas e pesqueiras; propõe-se a avaliação dos potenciais e restrições competitivas da indústria naval de Itajaí e Navegantes, identificando se esta pode vir a se beneficiar a partir do surgimento de demanda interna decorrente desses financiamentos aos armadores nacionais. 1.1 OBJETIVOS 1.1.1 Objetivo Geral Avaliar a capacidade competitiva da indústria naval de Itajaí e Navegantes a partir de sua capacitação tecnológica de modo a atender as demandas por construção e modernização de embarcações navais. 2 1.1.2 Objetivos específicos a. identificar a constituição da indústria naval brasileira, suas características produtivas e tecnológicas, e as características gerais dos principais produtores mundiais; b. descrever as características da indústria naval de Itajaí e Navegantes destacando: o processo de produção, investimentos, mercados, competitividade, fontes de informação e inovação, vantagens locacionais, presença de instituições locais e características da mão-de-obra; c. analisar os potenciais e restrições competitivas da indústria naval local; d. estabelecer proposições políticas para o desenvolvimento da indústria naval em Itajaí e Navegantes. 1.2 METODOLOGIA Propôs-se o levantamento bibliográfico para contextualizar de forma mais profunda o panorama da indústria naval brasileira ao longo das últimas duas décadas, e também para avaliar as vantagens competitivas de seus principais concorrentes externos. Para a identificação das características produtivas e competitivas dos estaleiros de Itajaí e Navegantes, se fez levantamento de dados primários pela aplicação de questionário junto as empresas de grande, médio, pequeno e micro porte, de Itajaí e Navegantes compreendendo um total de 22 estaleiros identificados junto as Prefeituras Municipais de Itajaí e Navegantes. O questionário foi composto por questões objetivas de múltipla escolha. Contendo questões quantitativas e qualitativas, abrangendo vários aspectos que permitissem um diagnóstico da indústria com base na conceitualização aplicada a identificação de arranjos produtivos locais enfocando principalmente os processos de aprendizagem e inovação. 3 Os dados foram tabulados em planilhas eletrônicas, e analisados pelo método dedutivo e comparativo. As informações foram agregadas considerando a estrutura das empresas, pois se observou comportamentos semelhantes para as empresas de micro e pequeno porte (MPEs) e para as médias e grande empresa (MGEs). 1.3 CONCEITUALIZAÇÃO A atenção que vem sendo destinada aos benefícios provenientes de aglomerações industriais e da proximidade espacial, segundo Amin e Cohendet (2003) se dá pelo fato de no local haver um fluxo de conhecimento propício ao processo de aprendizado e inovação; além da presença de um mercado de trabalho especializado que permite a mobilidade de habilidades e circulação de idéias que promovem a difusão (spillovers) de conhecimento. Quando se estuda uma aglomeração industrial remonta-se `a Alfred Marshall (1982) que entre os diversos aspectos condicionantes da concentração espacial da indústria destaca: os fatores naturais, o mercado de trabalho especializado, o caráter industrializante do povo e das instituições sociais e políticas. Mas o aspecto vinculado a competitividade dos aglomerados industriais, que é ressaltado como fator determinante na atualidade, é a atmosfera propícia à cooperação; pela formação local de uma identidade produtiva comum baseada no compartilhamento de valores, cultura e organizações que favorecem as interações sócio-econômicas e o aprendizado tecnológico. Segundo Giuliani (2003) os aglomerados favorecem o aprendizado por se apresentarem como um repositório de conhecimento tácito e idiossincrático incorporado nas firmas e instituições locais; além destas firmas constituírem elos produtivos interligados que incorporam as possibilidades sociais pela aprendizagem e interação, pela troca de informações que fomenta trabalhos inovativos. A proximidade espacial permite ao sistema territorial apostar em economias de escala ligadas ao conjunto dos processos produtivos, sem que este perca sua flexibilidade e adaptabilidade frente aos diversos acasos do mercado (BECATTINI, 1999). 4 A competitividade é um elemento dinâmico que condiciona as organizações à criação e renovação de suas vantagens competitivas de modo a possibilitar a estas a conservação sustentável de suas posições no mercado; sendo que as vantagens competitivas associam-se a capacidade de aprendizado, a sustentação da qualidade, especialidade e produtividade dos recursos humanos e a capacidade produtiva inovadora, conforme expõem Cassiolato e Lastres (2002). A proximidade locacional entre os agentes favorece a obtenção das vantagens competitivas, acima descritas, pela maior coordenação das ações que agilizam e facilitam o processo de aprendizado e, conseqüentemente, o processo inovador. Ou seja, a capacidade competitiva de indivíduos, organizações, regiões e nações não se centram no estoque de conhecimento acumulado pelas práticas sócio-econômicas ao longo do tempo, mas na capacidade desses adquirirem novas habilidades e competências a partir de processos interativos locais. É de suma importância obter uma especialização flexível combinada com unidades de produção especializadas, não esquecendo de uma mão-de-obra treinada, presente numa estrutura e ambiente social adaptável. Esta mão-de-obra adaptável vai de encontro com a atmosfera inovadora, a velocidade de reação e atitude de co-operação (SENGENBERGER e PIKE, 1999). Conforme Cassiolato e Lastres (2002), nas redes que se especializam localmente em atividades de uma mesma base técnica, surgem um número significativo de empresas que aproveitam de economias simples de aglomeração relacionadas à existência de mão-de-obra disponível. Essas redes podem evoluir de duas maneiras, a primeira seria através da especialização da produção, com empresas locais reestruturando-se e mantendo “a mesma organização da produção e padrão de relações interfirmas”; a segunda através da diversificação em produtos e setores de produção, incorporando atividades produtivas “para frente” e “para trás” e estabelecendo novas relações com instituições locais. Entende-se inovação numa perspectiva mais ampla onde, além de se considerar o papel do conhecimento resultante dos gastos com Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), aceita-se os esforços das firmas em modificar, em implementar o desenvolvimento de transformações, em seus produtos e processos, independentemente destas transformações já serem dominadas ou conhecidas pelos seus concorrentes (CASSIOLATO e SZAPIRO, 2002). Enquanto tecnologia é entendida como o 5 conhecimento que se apresenta corporificado em máquinas, equipamentos e produtos; ou ainda, que se apresenta como “conhecimento abstrato” que pode ser codificado em manuais e patentes, por exemplo; e intangível ou tácito sob controle de indivíduos e organizações fixados em locais específicos, sendo este decisivo como determinante competitivo (DALCOMUNI, 2001; LINS, 2000). Barquero (2001) salienta que as interações estabelecidas entre as atividades econômicas, se diferenciam de uma localidade para outra, por estas serem construídas historicamente e serem parte de uma cultura social e produtiva local; e que estas atividades estão estruturadas localmente em sistemas internos de redes que favorecem a cooperação e a competitividade das empresas pelo intenso intercâmbio de informações e conhecimentos que circulam nesses sistemas locais. Segundo Aage (2003) as interações cooperativas em redes de produção baseiamse no fato de existir diferentes conhecimentos e informações, e o compartilhamento do conhecimento através da linguagem, instituições e sistemas interpretativos comuns permite a criação e a absorção do conhecimento e de informações, principalmente a cerca de formas de produção e mercado. As formas que caracterizam o processo de aprendizado são bastante diversificadas, e novas combinações e possibilidades surgem com freqüência. Gregersen e Johnson (2001) destacam: a. aprendizagem técnica – relativa a introdução de inovações de produto e processos; dada a redução no ciclo de vida dos produtos, de forma contínua se desenvolve novos produtos e equipamentos; b. aprendizagem organizacional – as inovações em processos e produtos requerem adaptações e novas formas organizacionais, havendo forte sinergia entre estas práticas que acabam por condicionar a performance das firmas. Destaca-se a crescente importância da “habilidade de comunicação, interação e cooperação intra e interorganizacional doméstica e entre redes internacionais”; c. aprendizagem institucional – a estrutura institucional permite a regularidade nos padrões de comportamento e interação entre os agentes, através de sistemas de normas, incentivos, entre outros; reduzindo os riscos e conflitos, promovendo a cooperação; 6 d. políticas para o aprendizado - visam integrar de forma combinada e sistêmica ações que permitam a inovação e o aprendizado, através de ações coordenadas para áreas específicas que promovam a distribuição das capacidades de aprendizagem. Torna-se evidente que a competitividade não se restringe a eficiência técnica, passando a ser determinada por variáveis comportamentais estabelecidas numa intensa rede de relações locais. A intensidade dessas relações e o seu desenvolvimento, influenciam deterministicamente a inserção das empresas no mercado e seu potencial competitivo, sendo responsável também pela diversidade e heterogeneidade visualizada na estrutura industrial. 7 2 A INDÚSTRIA NAVAL NO BRASIL E NO MUNDO Nos últimos 30 anos ocorreram importantes transformações na indústria naval mundial, a começar pela reorientação das ações voltadas à busca da identificação de nichos de mercado e da especialização da produção. A produção naval foi caracterizada por processos contínuos, produção sob encomenda, com longo prazo de maturação, intensivo em mão-de-obra, e dependente de ações governamentais, principalmente da concessão de financiamento para a construção, e por vezes também de subsídios à indústria. Destaca-se nesse capítulo um breve histórico da indústria naval no país; as características gerais da indústria naval, suas vantagens competitivas e as características gerais dos principais produtores mundiais. 2.1 HISTÓRICO A indústria naval começou a se constituir no Brasil no século XIX, porém foi a partir do governo de Juscelino Kubitschek que começou a se observar o crescimento da indústria, uma vez que esta se articulava dentro das propostas formuladas para a indústria de base no Plano de Metas (1958) (BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL- BNDES, 1997). Na década de 70 a indústria naval também teve destaque nos Planos Nacionais de Desenvolvimento (PND I e II), figurando em 1975 como o segundo maior pólo de construção naval no mundo. E em 1979 a indústria atingiu seu maior nível de emprego com 39.155 trabalhadores diretos, e segundo o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio Econômicos- DIEESE (1998) para cada emprego direto gerado na construção naval cinco outros empregos indiretos eram gerados; logo, no auge a indústria gerou cerca de 240.000 trabalhos diretos e indiretos. A indústria naval entra em crise em meados da década de 80 devido à redução nas encomendas, resultantes da crise financeira a qual foram submetidos os armadores nacionais, sendo estes os principais demandantes da indústria (BNDES, 2002; DIEESE, 1998). E também em decorrência de fatores externos como a crise do petróleo, pois os 8 petroleiros eram na época o principal tipo de embarcação produzida, e a crise afetou a estrutura de custos de transportes de petróleo levando a modificações no porte e velocidade dos navios. E, também, a concorrência acirrada dos estaleiros asiáticos que tinham seus custos de produção subsidiados resultando em preços finais mais atrativos. O Plano Real e a abertura do mercado nos anos 90 não permitiram a recuperação da indústria naval devido à falta de financiamento para a construção de embarcações e a alta taxas de juros praticadas no mercado (DIEESE, 1998). Embora entre janeiro de 1990 e setembro de 1997 tenham sido contratadas construções de embarcações no valor de U$ 1.748 milhões de dólares, a indústria naval operou com capacidade ociosa superior a 30% (BNDES, 1997). Havendo a redução de cerca de 70% dos empregos entre 1989 e 1996 (DIEESE, 1998). Atualmente, o governo de Luis Inácio Lula da Silva vem incrementando a atividade na indústria naval nacional, através do financiamento para construção de embarcações de apoio a PETROBRAS e pesqueiras. Destaca-se o Programa Nacional de Financiamento da Ampliação e Modernização da Frota Pesqueira Nacional - Profrota Pesqueira , pelo impacto que pode gerar na indústria naval de Itajaí e Navegantes. Este programa irá permitir a concessão de financiamentos para a aquisição, construção, conversão, modernização, adaptação e equipagem de embarcações pesqueira costeira e continental, com o objetivo de reduzir a pressão de captura sobre estoques sobre explotados, abrindo uma nova fronteira para a pesca no país, proporcionando a sustentabilidade e o aumento da produção pesqueira nacional, melhorando a qualidade do pescado produzido, além de promover o máximo de aproveitamento das capturas, utilizando-se dos estoques pesqueiros na Zona Econômica Exclusiva brasileira e em águas internacionais, e estabilizando a frota pesqueira oceânica nacional (BRASIL, 2004a, 2004b). 2.2 CARACTERÍSTICAS GERAIS DA INDÚSTRIA NAVAL BRASILEIRA Embora a indústria naval brasileira tenha ocupado o 2º lugar entre os construtores mundiais até o início dos anos 80 (BNDES, 1997); em 1988, ocorreu a 9 estagnação da indústria naval, prejudicando a cadeia produtiva brasileira e fechando várias indústrias específicas do setor naval, além da migração da mão-de-obra para outros setores da indústria. A fragilidade econômica e financeira levou os estaleiros à não investirem em tecnologias, modernização das instalações e melhoramento das técnicas de trabalho (DIEESE, 1998). O setor de construção naval caracteriza-se pela instabilidade em suas atividades, pois trabalha por contratação de obras, produção sob encomenda, de armadores nacionais e de empresas estatais de petróleo e gás. Uma embarcação de médio porte possui um longo prazo de maturação, tardando até 36 meses para ficar pronta. Sendo importante o cumprimento de contratos e prazo de entrega de cada embarcação (MINISTÉRIO DESENVOLVIMENTO, INDÚSTRIA e COMÉRCIO EXTERIORMDIC, 2000). O processo da construção naval deve ser contínuo e deve refletir as encomendas dos armadores, consistindo no somatório das atitudes assumidas pelas organizações públicas, empresas privadas optando pelas condições de preço, financiamento e prazo mais conveniente (DIEESE,1998). Segundo o DIEESE (1998), 90% das atividades da indústria naval estão relacionadas à navegação mercante, atuando no mercado interno e externo. Os outros 10% dividem-se na atividade pesqueira, portuária e navegação militar. Supõe-se que 80% da demanda para os próximos anos realizar-se-á para repor a frota obsoleta. Já que atualmente a frota nacional vem decrescendo e a frota mundial tem mais de 15 anos necessitando renovação; e 20% para ampliar a frota face ao crescimento esperado do comércio mundial. Há uma expectativa de se conquistar em torno de 5% o mercado externo. Cada emprego direto gerado na construção naval representa mais cinco empregos indiretos em setores relacionados a indústria naval, e 40% do custo do navio são destinados para o pagamento do salário dos empregados (MDIC, 2002). A atividade específica da construção de embarcações de pesca nos estaleiros de pequeno porte, hoje, no Brasil está afetada pela concorrência estrangeira, necessitando de imediata modernização e capacitação da mão-de-obra existente (MDIC, 2000). Várias empresas brasileiras do setor de construção naval passaram por fusões e incorporações com empresas estrangeira a fim de superar a situação econômica e 10 financeira das empresas envolvidas, proporcionando um upgrade tecnológico. O que fragilizou econômica e financeiramente o setor naval, pois outros estaleiros, de menor porte, não investiram em atualização tecnológica e em novos métodos de trabalho para adequar-se a nova direção tomada pela construção naval mundial. Para que uma recuperação no setor ocorra, faz se necessário à estimulação do mercado interno de navios; além da implantação de um programa de exportação de navios (MDIC, 2000). 2.3 COMPETITIVIDADE E CARACTERÍSTICAS TECNOLÓGICAS DA INDÚSTRIA NAVAL NACIONAL Os preços dos equipamentos navais nacionais são maiores que os dos similares estrangeiros, e os custos elevados das navi-peças são atribuídos ao fato de que só podem ser fabricados fora de uma linha seriada de produção. A carga tributária é um elemento importante na determinação do preço das navi-peças e do custo do navio (MDIC, 2000). Os insumos básicos produzidos no Brasil são competitivos no mercado internacional em preço e qualidade. O fluxograma 1, demonstra a cadeia produtiva da indústria da construção naval (MDIC, 2002). Os insumos básicos que o Brasil produz em grande quantidade e possui preços mais competitivos são: o aço, o alumínio e derivados de petróleo (MDIC, 2002). Segundo a Unicamp (2002), o aço é um dos principais componentes de custo do navio, seguido pelas navi-peças e a mão-de-obra. Já os componentes elétricos e eletrônicos e os sistemas anti-corrosivos e de acabamento são produzidos no país com boa tecnologia e qualidade, porém com preço mais elevado que o da concorrência (MDIC, 2002). Após a estagnação que a indústria naval enfrentou nos anos 80 devido à redução das encomendas, e com o fechamento de grandes indústrias fabricantes de motores navais, hélices e navi-peças, o país começou a importar estes e outros equipamentos específicos para a indústria de construção naval e para navegação (MDIC, 2002). Sendo que, segundo a Unicamp (2002), a indústria das navi-peças é a principal fonte de tecnologia no setor naval. 11 O Brasil é um dos poucos países a fabricar de forma competitiva equipamentos para utilização em submarinos, como manifolds, árvore de natal e umbilical. Já os sistemas de navegação para submarino e embarcações em geral são importados. Segundo a Unicamp (2002) há dois problemas a serem enfrentados: a escassez da mão-de-obra, principalmente de soldadores e a expansão física e modernização dos estaleiros. O Brasil é capaz de conquistar o mercado da navegação marítima, pois possui uma infra-estrutura industrial organizada e uma força de trabalho disponível. A perspectiva da indústria naval é influenciada pela situação da marinha mercante. Os ciclos de negócios das duas atividades são complementares. Os armadores possuem forte poder de permuta sobre a indústria naval, pois podem fazer suas encomendas em qualquer parte do mundo, optando pelas condições de preço, financiamento e prazo que sejam mais convenientes. Os estaleiros de maior porte são verticalizados sendo pouco provável que ocorra um processo de terceirização significativo. A competitividade das empresas deriva de sua competência para gerenciar a produção fortemente dependente de força de trabalho e para estabelecer contratos de fornecimento e programas de compra sintonizados com o ritmo de produção (FREITAS, 2003). 2.4 CARACTERÍSTICAS GERAIS DOS PRODUTORES MUNDIAIS Os principais produtores mundiais receberam apoios específicos do Estado através de importantes programas governamentais para incorporação de tecnologias e para a busca de novos mercados, às vezes usando de vantagens comparativas espúrias como o uso de subsídios que tornaram o preço de venda muito abaixo dos custos de produção, ou ainda pelo uso de mão-de-obra de baixíssimo custo. De qualquer forma, o setor naval foi sempre entendido como um setor estratégico, e sendo assim necessitando de programas políticos específicos. Na Ásia a indústria naval caracterizou-se pela produção seriada de embarcações; o que otimizou o uso dos estaleiros, porém não permitiu a produção de embarcações ou estruturas navais que atendessem as necessidades especificadas pelos clientes (UNICAMP, 2002). 12 CADEIA PRODUTIVA DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO NAVAL INSUMOS BÁSICOS PRODUTOS SISTEMAS Escotilhas, estruturas metálicas; escadas; tubulações, etc. Sistema Estrutural casco e subestrutura. Aço em chapas; perfis e barras. Guindastes; guinchos; bombas; válvulas; flanges; conexões, etc. Sistemas Operacionais e Oil Recovery. Alumínio em chapas; perfis e barras. Motores principais; propulsores laterais; propulsores azimutais, hélices; máquina do leme; eixos propulsores. Material de solda eletrodos; gases industriais. Componentes elétricos e eletrônicos. Motores auxiliares: geradores; quadros elétricos. Equipamentos Eletro Mecânicos Eletro Eletrônicos Derivados do Petróleo. Manifolds; Arvores de natal umbilicais e equipamentos para operação submarina. Polímeros, Solventes, Lubrificantes, Graxas. Sistema de Propulsão. Sistema Gerador de Energia. FONTE: MDIC, 2002. EMBARCAÇÕES EM GERAL: Sistema submarinos para plataformas e Sistema de navegação Sistema de Automação - PLATAFORMA, EMBARCAÇÕES DE APOIO; E EQUIPAMETOS “offshore” PARA EXTRAÇÃO DE PETRÓLEO; - REPAROS NAVAIS LEGENDA: Equipamentos para Navegação: sonares, radares; gps, etc. Sistema de Posicionamento Dinâmico Sistema Anticorrosivo e Acabamento Abrasivos para jateamento. INTEGRADORAS Produzido no Brasil de forma competitiva. Produzido no Brasil com preço mais alto. Importado. Produzido no Brasil com restrições no preço e na qualidade naval. 13 A Coréia do Sul se especializou na produção de navios de grande porte; a principal fonte de tecnologia para o setor esteve na produção de navi-peças, conferindo vantagens competitivas internacionais para os produtores locais (UNICAMP, 2002). Já Cingapura se especializou na produção de plataformas e estruturas off-shore; enquanto o Japão e a China se especializaram em todos os tipos de embarcações (UNICAMP, 2002). Em todos os países asiáticos a presença do Estado na indústria naval foi intensivo, através de subsídios à produção e da participação acionária nos estaleiros. Na União Européia, a indústria naval foi identificada como uma indústria de alta tecnologia onde as empresas do setor operavam em rede, compartilhando os riscos e investimentos no desenvolvimento de inovações (UNIÃO EUROPÉIA- UE, 2004). A indústria européia operava em nichos de mercado principalmente no desenvolvimento e implementação de projetos específicos aos seus clientes. A UE se especializou na produção de transporte de passageiros, reforma de navios e estruturas petrolíferas que operaram no Mar do Norte, e navios militares (UE,2004). 14 3 DESCRIÇÃO DA INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES- SC Foram entrevistados 22 estaleiros nos Municípios de Itajaí e Navegantes -SC, entre outubro e novembro de 2004. Destes 15 são microempresas, 04 são pequenas empresas, 02 são empresas de médio porte e uma grande empresa. Na indústria naval de Itajaí e Navegantes estavam contratados, em novembro de 2004, 1.635 funcionários, e segundo declarações de 86% das empresas seus funcionários eram formais, ou seja possuíam registro em carteira. Das empresas localizadas em Itajaí e Navegantes cerca de 33% destas foram fundadas na década de 90, 29% na década de 80, e 14% eram remanescentes da década de 70. Devido as características comuns apresentadas pelas micro e pequenas empresas (MPEs) essas terão seu comportamento apresentado de forma agregada, o mesmo ocorrendo com as médias e grande empresa (MGEs). A estrutura organizacional das MPEs era bem simplificada, estando concentrada na figura do proprietário ou do responsável geral. Questões onde se solicitavam informações quantitativas sobre custos de produção, percentuais sobre faturamento em mercados, entre outras, não foram respondidas pela grande maioria das empresas mostrando a falta de conhecimento ou preparo dos encarregados. Já nas MGEs, a estrutura organizacional verticalizada, dividida entre vários departamentos, também dificultou a resposta as questões quantitativas, demonstrando a falta de visão da empresa no todo, estando cada encarregado por setor e/ou departamento a par do que passa apenas neste. A verticalização da estrutura organizacional e produtiva é resultante do tipo do produto, que exige a produção em processos contínuos. 15 3.1 CARACTERÍSTICAS DA PRODUÇÃO A indústria naval concentra as atividades de construção naval, reparos navais, processamento de materiais e desmanche de sucata. Entre as micro e pequenas empresas (MPEs) locais 58% atuaram na construção e reparo de embarcações, e 32% operaram apenas com reparos navais. Já as 2 empresas de médio porte atuaram na construção e reparos navais; apenas a empresa de grande porte concentrou todas as atividades da indústria. Duas entre as MGEs passaram por aquisição na década de 90. Enquanto as empresas de maior porte (MGEs) processaram embarcações de aço (principal insumo); as micro e pequenas empresas (MPEs), predominantemente, processaram madeira. Pois 58% destas declararam a madeira como o principal insumo básico utilizado na sua atividade, enquanto 29% declararam o aço como insumo básico. Ressaltasse que a combinação de madeira e fibra vinculou-se a construção e reparos de embarcações de lazer (gráfico 1). Processamento de Materiais e Reparos Navais Construção e reparos Reparos Navais aço madeira Construção Naval 0% aço e madeira 20% 40% 60% 80% 100% Gráfico 1- Concentração das atividades navais por uso de insumos em MPEs madeira e fibra 16 As empresas de micro e pequeno porte caracterizaram-se pela construção e reparos de embarcações de madeira (11 das 19 MPEs); 72,72% dessas o insumo utilizado foi basicamente madeira, o uso de aço representou apenas 9% dos insumos básicos. A construção de embarcações de aço foi realizada pelas empresas de médio e grande porte. O resultado apresentado na segunda coluna do gráfico 1 foi representativo, uma vez que os municípios em questão são juntos um dos principais pólos pesqueiros do país; e na indústria pesqueira predomina a frota composta por embarcações de madeira, com aparelhos de metal e acabamentos em fibra (ex: casco e estrutura em madeira; guinchos, tangones e mastros em metal; e cabines e porões revestidos em fibra). As perdas ou descartes de aço no processo produtivo foram significativamente menores quando comparados ao uso da madeira. Considerando apenas as empresas que responderam sobre perdas e descartes na produção; 54,54% responderam não haver descartes no uso do aço, e 22,72% responderam que o descarte foi inferior a 5%. Ou seja, os percentuais apresentados para perdas e descartes no processo produtivo de insumos básicos mostraram que estes foram inerentes as características do insumo quando se tratou de aço, na produção das MGEs (gráfico 2). Já o uso da madeira como insumo básico no processo produtivo levaram à perdas e descartes maiores. Cerca de 33% das empresas apontaram perdas de 11 a 20% no processo produtivo; e 50% perdas superiores, entre 21 e 30%. A justificativa foi atribuída a falta de qualificação da mão-de-obra na manipulação do insumo (100%), e a equipamentos inapropriados (fator alto em 26,6% e médio em 20% das respostas) (gráfico 3). Apenas 32% das empresas declararam sua capacidade total de produção em toneladas porte bruto (TPB). Resultando em 23.480 TPB, ou seja ficou subestimada a capacidade de produção dos estaleiros em Itajaí e Navegantes. Nos últimos 5 anos a capacidade ociosa das empresas foi inferior a 5 % para 50% das empresas, e para 27% das empresas esta oscilou entre 11 a 20% . 17 Infra-estrutura Infra-estrutura Falta Qualificação Característica Insumo Alto Médio Equipamentos inapropriados Baixo Sem importância 0% 20% 40% 60% 80% 100% Sem resposta Gráfico 2- Fatores que influenciam nas perdas e descartes na produção com aço Entre as MPEs, 52% delas tiveram capacidade ociosa inferior a 5% nos últimos 5 anos; e 31,5% a capacidade ociosa oscilou entre 5 e 10%. Para 42% dessas empresas a capacidade ociosa foi atribuída a redução das encomendas, e os restantes 56% não conseguiram identificar o fator responsável pela redução na capacidade de produção. Já nas MGEs, um estaleiro teve capacidade ociosa inferior a 5% e dois deles entre 5 e 10%; para essas empresas a capacidade ociosa foi atribuída a redução das encomendas e a falta de financiamento para a construção de embarcações . Observou-se que de modo geral a capacidade ociosa da indústria naval nos últimos 5 anos foi relativamente baixa se comparada com outros pólos navais no país. A presença local da indústria pesqueira, e a presença do Porto de Itajaí contribuíram para a manutenção das atividades navais locais, principalmente pela manutenção e reparos que as embarcações exigiram nas entre safras pesqueiras, e também eventuais reparos em cargueiros atracados no Porto de Itajaí. 18 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% 30% 20% 10% 0% Sem resposta Sem importância Baixo Médio sem resposta Infra-estrutura Falta Qualificação Característica Insumo Equipamentos inapropriados Alto Gráfico 3- - Fatores que influenciam nas perdas e descartes na produção com madeira Apenas 19% das empresas arrendaram a infra-estrutura para execução de projetos de terceiros. Enquanto 28,6% já foram sub-contratadas para produzir parte de projetos de outra empresa. Quando questionadas para avaliar o desempenho da empresa nos últimos 20 anos frente à crise que passou a indústria naval nacional, 38,10% declararam ter um desempenho satisfatório; 14,3% consideraram excelente enquanto, apenas, 9,5% das empresas consideraram ruim. Dentre as empresas que declararam terem tido um desempenho satisfatório ou excelente, 42,9% responderam que o principal fator que contribuiu para este desempenho foi à proximidade com um dos maiores pólos pesqueiros do país, que permitiu a continuidade das atividades pela construção e reparos de embarcações pesqueiras. 19 3.2 FINANCIAMENTO E INVESTIMENTOS Durante a década de 90 os financiamentos para a construção de embarcações foram bastante restritos, como também o financiamento à indústria. Apenas o estaleiro de grande porte pediu financiamento para a construção de embarcações entre 1999-2004. E este alegou que as garantias exigidas para a concessão do financiamento foram muitas, fator que assumiu grau de importância maior que os juros cobrados pelas instituições financeiras. As demais empresas, 95% no total, não recorreram a fontes de financiamento; declarando também as exigências de garantias o maior empecilho ao financiamento (68% das respostas), seguido dos juros altos (59% das respostas). Porém, 59% das empresas alegaram ter realizado investimentos nos últimos 5 anos. Investimentos em expansão foram realizados por 36% das MPEs, 42,1% destas investiram em infra-estrutura, ou reposição; e apenas 10,5% realizaram investimentos em modernização. As empresas de médio e grande porte realizaram investimentos em modernização e reposição. Como não houve tomada de financiamento pelos estaleiros locais, pode-se afirmar que os investimentos realizados foram financiados com recursos acumulados pelas empresas. Mas, dada a inconstância na produção de embarcações, e a redução das encomendas na última década, o que acabou por reduzir a capacidade de acumulação das empresas, pode-se supor que os investimentos realizados foram muito inferiores aos necessários para manter a infra-estrutura constituída e para a modernização da indústria. Quanto a investimentos futuros, 50% das empresas pretendem investir em infraestrutura, 36% em expansão e 26% em modernização. Observou-se que investimentos na modernização da estrutura produtiva foram sempre um fator secundário na tomada de decisões por parte dos estaleiros, o que pode agravar a desatualização tecnológica, afastando a indústria local do horizonte tecnológico que vem sendo estabelecido na indústria mundial. 20 3.3 MERCADOS Para as MPEs o principal mercado de atuação foi o local, o mercado nacional vinha sendo atendido apenas por 37% dessas empresas por período superior a 3 anos. Já para as MGEs o principal mercado foi o nacional, onde além de atenderem a construção de embarcações de pesca o fizeram para embarcações de apoio e gaseiros da PETROBRÁS. As MPEs identificaram como as principais exigências de seus mercados de atuação: a qualidade dos serviços e projetos, o preço de venda, o cumprimento de contratos e os prazos de pagamento das embarcações. Já as MGEs identificaram como principais exigências do mercado nacional: a qualidade na execução dos projetos, o preço de venda a regularidade na execução do projeto e o cumprimento de contratos. De qualquer forma o que se observou (gráfico 4), foi que as empresas identificaram como principal exigência, de qualquer mercado que venham a atuar, a qualidade na execução do projeto, seguido do preço de venda e do cumprimento do contrato. Os fornecedores de insumos básicos, aço e madeira eram nacionais. No local existem vários representantes de insumos e componentes, sendo estes em sua maioria importados. A determinação dos fornecedores esteve baseada na qualidade dos insumos (95,2%), seguido do preço (76,2%) e regularidade na entrega (66,7%) (gráfico 5). A regularidade de compras no mercado nacional foi superior a 3 anos para 45,5% das empresas. 21 Regularidade na execução e entrega da embarcação mercado externo Atendimento a normas internacionais de construção Qualidade do projeto da embarcação mercado nacional Preço de revenda mercado estadual Cumprimento Contratos Prazos de pagamento mercado local Não resposta 0% 20% 40% 60% 80% 100% Gráfico 4- Principais exigências nos mercados de atuação. Amizade ou parentesco Assistência técnica Troca de informações Especialização dos fornecedores Prazos de Pagamento Cumprimento de contratos Confiança Regularidade entrega Alto Médio Qualidade Baixo Preço Sem importância 0% 20% 40% 60% 80% 100% Gráfico 5: Fatores que influenciam na determinação dos fornecedores Não resposta 22 3.4 COMPETITIVIDADE Para 68% das empresas a competição foi alta no setor. Os principais aspectos determinantes da competitividade foram: o preço (81%), qualidade (57%), prazos de pagamento e entrega favoráveis aos clientes 42,9% (gráfico 6). As inovações nos projetos e nos produtos foram para 52,4% das empresas fator sem importância. As MGEs atribuíram importância média à inovação. As MPEs não conheciam as vantagens dos concorrentes estrangeiros. Já as MGEs atribuíram as vantagens competitivas dos concorrentes estrangeiros a qualidade dos projetos e a infra-estrutura. Embora as empresas reconhecessem a qualidade na prestação do serviço de construção e nos projetos como a maior exigência de seus mercados de atuação, essas ainda competiram por preço; provavelmente esta contradição justifica-se pela baixa atualização tecnológica na maioria das empresas, que impede a busca por maior qualidade, produtividade e redução dos custos que por sua vez reflete-se em preços de venda menores. As empresas locais produziram por processos e projetos tradicionais. 3.5 FONTES DE INFORMAÇÕES Nas MPEs a principal fonte interna de informação esteve no proprietário da empresa, enquanto que nas MGEs esta foi identificada pela gerência. Para 47,3% das MPEs os clientes foram uma importante fonte externa de informações, fornecedores e revistas especializadas também foram fonte de informações externas a empresa para 31% dessas (gráfico 7). Já duas das MGEs atribuíram ao cliente grau de importância médio como fonte de informações externas a empresa. Foram fontes externas de informação com alto grau de importância para essas empresas a participação em feiras e eventos navais nacionais e revistas especializadas, o uso da Internet também foi comum entre essas empresas. O compartilhar de informações dos estaleiros com seus clientes foi relativamente baixo, apenas 36% das MPEs o fizeram constantemente e outros 36% eventualmente; 23 enquanto a MGEs o fizeram apenas eventualmente, até porque o detalhamento dos projetos de execução das embarcações desta com seus clientes foi mais específico. Prazos Assistência técnica Especialização Propaganda Inovações Alto Qualidade Médio Baixo Preço Sem importância 0% 20% 40% 60% 80% 100% Sem resposta Gráfico 6: Fatores que Determinam a Competitividade entre as Empresas do Setor Cosultoria especializadas Feiras e eventos no exterior Feiras e eventos nacionais Internet Revistas e publicações especializadas Órgõas governamentais Sindicatos Universidades e centros de pesquisa Empresas do mesmo setor de atividade Alto Fornecedores de equipamentos Médio Fornecedores de insumos Baixo Clientes Sem importância 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100 % Gráfico 7: Principais Fontes Externas de Informações em MPEs Sem resposta 24 Quanto aos fornecedores de insumos esses foram fontes externas de informações para 32% das empresas, e os fornecedores de equipamentos para apenas 23% dessas. 3.6 INOVAÇÕES Na totalidade, 100% das empresas consideraram importante incorporar inovações no sistema produtivo. Com relação às inovações 31% das MPEs consideraram importante inovar em produto e 95% consideraram importante inovar em processos. Destas 74% afirmaram ter inovado em processo, porém apenas 23% conseguiram identificar a forma de inovação sendo esta relacionada a novas formas organizacionais e de gerenciamento de materiais. Entre as MGEs apenas uma considerou importante inovar em produto. Quanto às inovações em processo todas o fizeram nos últimos 10 anos, inclusive incorporando engenharia assistida por computador (CAE) e processo assistido por computador (CAD). Em 77% das empresas do setor naval a incorporação de inovações ocorreu por iniciativa própria da empresa, por sugestão de clientes em 28,6%; por sugestão de fornecedores 19% das empresas (gráfico 8). Por exigência da legislação Sugestão de fornecedores Sugestão de clientes Imitação de firmas concorrentes Alto Médio Por iniciativa da empresa Baixo Sem importância 0% 20% 40% 60% 80% 100% Gráfico 8: Fatores que levaram a incorporação de inovações Sem resposta 25 Para as empresas que inovaram no processo produtivo houve melhorias em 66,7% das empresas referentes a produtividade da mão-de-obra e maior qualidade da embarcação; em 47,6% a redução da perda de materiais, e em 47,6% a especialização da produção; 42,9% a eficiência na organização administrativa; e 52,4% o aumento do volume da produção. O aspecto que em menor grau foi melhorado pela incorporação de inovações foi a possibilidade de expansão dos mercados (gráfico 9). Aumento do volume de produção Eficiência na organização administ Expansão dos mercados externos Expansão dos mercados nacionais Especialização da produção Maior qualidade do produto Alto Médio Redução na perda de materiais Baixo Sem importância Produtividade da mão de obra Sem resposta 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Gráfico 9: Melhoria no Desempenho da Empresa pela Incorporação de Inovações A incorporação de inovações no processo produtivo ocorreu principalmente pela compra de equipamentos no mercado estadual para 43% das empresas, seguido das parcerias com os fornecedores de insumos. Já em relação à compra de máquinas no país e no exterior; parcerias com fornecedores de insumo e equipamento; com empresas clientes e concorrentes; parceria com outras instituições; laboratórios P&D; intercâmbio de funcionários com a matriz; e via licenciamento ou joint venture foram considerados aspectos sem importância 26 3.7 VANTAGENS LOCACIONAIS As principais vantagens atribuídas pelas empresas por estarem localizadas em Itajaí e Navegantes, deram-se em função da proximidade com principais áreas de pesca para 85,7% das empresas, do acesso à mão-de-obra qualificada e treinada para 66,7% das empresas; a proximidade com clientes /consumidores para 71,4%; e a proximidade com produtores de equipamentos e a disponibilidade de informações sobre a atividade para 42,9% das empresas (gráfico 10). Oram julgados fatores sem importância: o baixo custo com a mão-de-obra para 38,1% das empresas; a proximidade com os fornecedores de insumos para 47,6% das empresas; a disponibilidade local de infra-estrutura e serviços para 57,1%; e a proximidade com universidades e centros de pesquisa para 71,4% das empresas. PROXIMIDADES COM ÁREAS DE PESCA PROXIMIDADE COM OS CLIENTES MAIOR FACILIDADE PARCERIAS PROXIMIDADE COM UNIVERSIDADES DISPONIBILIDADE DE INFORMAÇÕES PROXIMIDADE COM PRODUTORES DISPONIBILIDADE LOCAL PROXIMIDADE COM FORNECEDORES BAIXO CUSTO MÃO DE OBRA BAIXO CUSTO MÃO DE OBRA Alto MÃO DE OBRA QUALIFICADA Médio PROGRAMAS GOVERNAMENTAIS Baixo Sem importância 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% Gráfico 10: Vantagens locacionais 90% 100% Sem resposta 27 3.8 INSTITUIÇÕES LOCAIS A maioria das empresas (66,7%) estava filiada a alguma associação de classe; 52,4% ao Sindicato dos Metalúrgicos, destas 19% às vezes participaram das atividades, deste, e 33,3% consideraram que o Sindicato representava bem os interesses da categoria. Já, 14,3% estavam filiadas a Associação Comercial e Industrial de Navegantes (ACIN) e destas 9,5% consideraram que a ACIN representava bem os interesses da categoria. Com relação à participação 9,5% das empresas às vezes freqüentaram as atividades da ACIN. Quanto ao grau de confiança em instituições, 38,10% das empresas desconhecia os trabalhos desenvolvidos pela Universidade; 47,6% confiavam em grau médio nos trabalhos desenvolvidos pelo Sindicato patronal; e em grau médio também estava a confiança nos Sindicatos dos Trabalhadores para 33,3% das empresas. 3.8 CARACTERISTICAS DA MÃO-DE-OBRA O setor foi caracterizado pelo uso intensivo de mão-de-obra local adaptável. Com relação às políticas voltadas a educação e qualificação da mão-de-obra 71,4% das empresas não as tinham, enquanto apenas 28,6% das empresas tinham algum tipo de incentivo interno ao treinamento e qualificação. Para as empresas que possuíam algum tipo de política voltada à educação e qualificação da mão-de-obra; 14,3% constantemente promoveram cursos internos, enquanto 14,3% eventualmente incentivaram à realização de cursos. A maioria das empresas (66,7%) não proporcionou nenhum tipo de benefício de saúde. Das 33,3% das empresas que proporcionaram algum tipo de benefício de saúde, 9,5% foi do SIPA, 4,8% proporcionaram benefícios ambulatoriais; 4,8% tinham um médico contratado e, 19% ofereceram planos de saúde. No último ano ocorreram acidentes de trabalho em 28,6% das empresas. Cerca de 66,7% das empresas promoveram a integração dos funcionários através de programas culturais e/ou esportivos; sendo que 4,8% possuíam sede social; 4,8% possuíam quadras poli -esportivas; 57,10% promoveram festas ou comemorações. 28 Os principais problemas referentes à mão-de-obra foram a resistência ao uso de novas tecnologias, e a falta de aptidão para lidar com as mesmas (gráfico 11). Para as MPEs a mão de obra apresentou problemas ao manipular insumos, com grau de importância médio em 26% das empresas, e em 36% destas, esse foi um problema inexistente, o mesmo percentual de respostas e importância foi dado para os problemas referentes à manipulação de equipamentos. Porém, todas essas empresas afirmaram que o desperdício na manipulação do insumo madeira tinha sido decorrente da falta de qualificação da mão-de-obra. Problemas resistência Problemas aptidão tecnologia Problemas normas organizacionais Problemas normas equipamentos Problemas normas técnicas Problema segurança no trabalho Problemas higiene no trabalho Problemas manipulação de produtos Problemas manipulação equipamentos alto Problemas manipulação de insumos baixo Problemas desperdício material medio Problemas Produtividade inexistente 0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100 % sem reposta Gráfico 11: Problemas Referentes a Mão-de-obra A maioria das empresas (66,7%) utilizou serviços terceirizados, dentre elas; 42,9% foram para manutenção de equipamentos; 28,6% para manutenção das instalações da empresa; 19% para suporte de software; 14,3% para limpeza das instalações e 9,5% para rastreamento de cargas e embarcações. 29 4 ANÁLISE DOS RESULTADOS SOBRE A INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES A perspectiva de reativação da indústria naval no país é eminente, visto que o governo federal vem promovendo programas de financiamento para a substituição e expansão da frota nacional. No contexto atual, 90% da atividade naval volta-se a marinha mercante e os 10% restantes divide-se entre a atividade pesqueira e a construção militar e portuária. O processo produtivo na construção naval envolve na verdade pouca tecnologia de ponta (sistema estrutural- casco e subestruturas) operando como montadora de embarcações e estruturas navais. Na composição das embarcações e nas estruturas é que se incorporam grandes inovações e onde o conteúdo tecnológico é importante, como as navi-peças: motores, propulsores e sistemas de navegação; sistemas elétricos e eletrônicos. O Brasil possui vantagens competitivas relacionadas aos insumos básicos, enquanto um dos grandes produtores mundiais de aço, alumínio e derivados de petróleo, e uma mão-de-obra adaptável e de baixo custo. Quanto aos componentes elétricos e eletrônicos, sistemas anticorrosivos e de acabamentos, os fornecedores nacionais são especializados, produzem com qualidade mas os preços são elevados frente à concorrência internacional. Já os sistemas de navegação, propulsores e motores, como sistemas elétricos e eletrônicos não são produzidos no mercado interno, sendo importados. A indústria naval localizada em Itajaí e Navegantes estava composta por 22 empresas (outubro-novembro de 2004), com predomínio de micro e pequenas empresas (19 no total) que atuaram especificamente na construção e reparo de embarcações de pesca com casco de madeira. Já as médias e a grande empresa local construíram, repararam e processaram materiais para embarcações e estruturas navais de aço. A indústria naval empregou diretamente cerca de 1.630 funcionários em empresas fundadas predominantemente entre as décadas de 80 e 90; período em que se agravou a crise da indústria naval nacional. 30 A crise dos grandes estaleiros localizados no Rio de Janeiro deslocou a mão-deobra e futuros empreendedores para Itajaí e Navegantes; que vislumbraram nesses municípios a oportunidade de manterem-se na atividade naval, onde já detinham competências específicas e conhecimentos sobre a indústria, e pela identificação de oportunidades de mercado pela presença local de um dos maiores pólos pesqueiros nacional. As vantagens locacionais estavam claramente definidas na presença da indústria pesqueira, na mão-de-obra qualificada e na presença de fornecedores especializados; garantindo assim a redução nos custo de transação; e nas externalidades positivas pelo reconhecimento do mercado consumidor, pelo conhecimento tácito sobre a atividade que leva a existência no local de um fluxo de informações e conhecimentos importantes sobre a atividade naval e pesqueira. Como há um predomínio de micro e pequenas empresas na indústria naval de Itajaí e Navegantes, e empresas deste porte têm dificuldades de acesso ao crédito, os investimentos realizados nos últimos 5 anos não teriam sido suficientes para expandir a capacidade de produção e moderniza-la. Todas as empresas afirmaram ter realizado investimentos, e esses permitiram a manutenção da capacidade produtiva visto que investimentos em reposição foram predominantes. Como essas empresas não recorreram à financiamento externo, esses foram financiados com recursos acumulados. Todas as empresas planejam a realização de novos investimentos, porém entre as modalidades propostas, teve sempre caráter secundário entre as empresas de menor porte os investimentos em modernização; o que indica que a indústria naval em questão, produz de forma tradicional embarcações de pesca construídas de madeira, e avalia que seu principal mercado, o local, vai continuar demandando embarcações com as mesmas características. Porém, essa avaliação é falha, uma vez que o próprio Programa Profrota Pesqueira indica enquanto instrumento político a substituição da frota costeira que opera sobre os recursos tradicionais, por uma frota mais moderna envolvendo tecnologia pesqueira mais avançada e com maior conteúdo tecnológico na captura, armazenamento e até na possibilidade de processamento à bordo, de modo a reduzir as perdas nas capturas e armazenagem. 31 Por outro lado, ficou evidente que a atualização tecnológica no processo produtivo na indústria naval de Itajaí e Navegantes depende intimamente das decisões dos armadores pesqueiros, uma vez que estes especificam os projetos das embarcações, escolhem e contratam todos os fornecedores dos sistemas e equipamentos navais. Logo, a necessidade, destes, em obterem embarcações com características distintas da frota atual forçaria os estaleiros menores à atualização tecnológica. A incorporação de tecnologia nos estaleiros ocorreu pela compra de equipamentos de fornecedores estaduais, assim esses exerceram um importante papel no local na disseminação de informação e na divulgação das tendências que o setor vai assumindo ao longo do período. As micro e pequenas empresas consideraram importante incorporar inovações no processo produtivo; as que o fizeram introduziram novas técnicas organizacionais e de gerenciamento de materiais, por terem um custo significativamente mais baixo quando comparado as outras tecnologias. A incorporação da inovação ocorreu por iniciativa própria da empresa, sendo todas as decisões centradas na figura do proprietário. Já as médias e grande empresa modernizaram o processo de produção, pela incorporação de novas tecnologias como sistemas de engenharia assistida- CAE, e processo assistido por computador- CAD. Os municípios em questão possuem um ambiente favorável ao desenvolvimento da indústria naval, como já demonstrado. Porém o fluxo de informações entre clientes, empresas, fornecedores e instituições foi relativamente baixo; o que compromete significativamente o processo de aprendizagem e inovação nas empresas. Conseqüentemente, ficou comprometida a renovação e sustentação das vantagens competitivas das empresas de menor porte. Outro fator que agravou esse contexto foi a falta de conhecimento e confiança nas instituições locais, a quem cabe o papel de coordenar e potencializar o fluxo de informações entre os agentes locais. As micro e pequenas empresas identificaram a competição de seu mercado como alto, sendo a principal exigência desse, a qualidade na execução dos serviços e dos projetos. Porém, todas afirmaram competir por preço; essa contradição entre o que o mercado exige e o que as empresas tentam oferecer decorre especificamente da falta de 32 tecnologia adequada que permita tanto o aumento da qualidade, da produtividade e conseqüentemente na redução nos custos e por sua vez no preço de venda. Uma prova contundente da falta de tecnologia adequada para produção esteve no volume de perdas e descartes vinculados à produção com madeira que para 33% das empresas oscilou entre 11 a 20%, e para 50% das empresas entre 20 a 30%. Embora as empresas atribuíssem as perdas na manipulação dos insumos a falta de qualificação da mão-de-obra, nas questões específicas sobre esta, a revalidação da resposta não aconteceu. A mão-de-obra qualificada e treinada foi um importante fator de atração dos estaleiros aos municípios de Itajaí e Navegantes. Porém, essa mão-de-obra apresentou falta de aptidão para lidar com novas tecnologias e resistência ao uso de novos equipamentos e técnicas produtivas. Logo, ressalta-se que a mão-de-obra possuía conhecimentos tácitos, competências e habilidades para as formas tradicionais de produção, precisando ser treinada e qualificada para operar com técnicas mais modernas. O treinamento e qualificação da mão-de-obra foram promovidos por apenas 14,3% das empresas através de cursos internos oferecidos constantemente, o mesmo percentual de empresas disse ter incentivado eventualmente cursos de atualização. Como as transformações no processo produtivo da indústria naval foram significativas nos últimos 30 anos, e a indústria brasileira frente a crise por que passou aumentou seu gap tecnológico frente aos maiores produtores mundiais, torna-se imprescindível que se desenvolva programas contínuos de qualificação e treinamento da mão-de-obra nacional e local. Para que se mantenha e renove as competências e a produtividade de um dos recursos mais relevantes na produção; e que assim, se renove as vantagens competitivas da indústria local. A frota pesqueira localizada nos municípios de Itajaí e Navegantes é constituída principalmente por embarcações dos tipos: arrasteiro, cerqueiro e traineiras; que operam sobre recursos tidos pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca da-Presidência da República do Brasil (SEAP-PR) como sobre explotados (corvina, camarão, sardinha, bonito listrado). 33 A indústria naval desses municípios adquiriu ao longo de décadas competências, e vantagens competitivas para executar a construção e reparos nessa frota. A mão-deobra utilizada no processo produtivo, também, adquiriu as competências e habilidades para lidar com as formas tidas como tradicionais de produção, ou seja sem a incorporação de tecnologias e técnicas mais sofisticadas de produção. Porém, o Programa Profrota Pesqueira nega a possibilidade de construção de embarcações dos tipos predominantes na região, sinalizando para objetivos estruturais do governo federal de substituir e restringir a atuação de tal frota sobre os recursos sobre explotados. Logo, no âmbito do Profrota Pesqueira os estaleiros de menor porte teriam vantagens competitivas na execução de projetos de jumborização, conversão e adaptação da frota existente às novas pescarias. Enquanto as empresas de maior porte poderiam usufruir de todas as modalidades estabelecidas no programa, inclusive a construção de embarcações para a pesca oceânica, que exige projetos mais avançados. Mas, entre as três empresas aptas à construção, apenas uma demonstrou real interesse, e competência demonstrada, para esse tipo de construção; as demais estavam focando a construção de embarcações e estruturas navais financiadas pela Petrobrás. Os potenciais competitivos da indústria naval de Itajaí e Navegantes, estavam comprometidos pois as vantagens locais estavam baseados em fatores competitivos estáticos, voltados às formas tradicionais de execução dos projetos, na operação centralizada da estrutura organizacional, pelo baixo grau de incorporação de tecnologias e inovações na estrutura produtiva, pela incorporação de uma mão-de-obra que traz em si conhecimentos tácitos sobre a atividade, e pela baixa cooperação local na troca de informações. Porém, a renovação dos potenciais competitivos da indústria frente ao novo contexto que se apresenta, exigirá uma revisão das condutas empresariais pela busca de maior inserção numa rede formada por clientes, fornecedores, empresas e instituições. De modo, a se ampliar as informações sobre os rumos da atividade, tendências tecnológicas e novas oportunidades de mercado. Assim, num processo de aprendizagem coletivo será possível estabelecer a especialização produtiva à indústria local, calcada em maior conteúdo tecnológico e 34 inovativo, tornando estão os potenciais competitivos locais dinâmicos e passíveis de constante revisão. 35 5 PROPOSIÇÕES POLÍTICAS PARA O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA NAVAL DE ITAJAÍ E NAVEGANTES As políticas de desenvolvimento local são imprescindíveis para a obtenção e manutenção de vantagens competitivas. Sendo que essas possuem como elementos essenciais o conhecimento e a inovação, que por sua vez estão condicionadas aos processos interativos que ocorrem no âmbito local, destacam Cassiolato, Lastres e Szapiro (2000) . A estrutura descentralizada do Governo do Estado de Santa Catarina favorece a discussão ampla e transparente das necessidades locais, possibilitando a geração de uma “política consensual” para o setor naval uma vez que permite a integração dos agentes locais em torno de metas estabelecidas em conjunto, nos termos propostos por Cassiolato, Lastres e Szapiro (2000). A retomada da atividade naval pela demanda interna tem que se apresentar como elemento dinamizador que possibilite a atualização tecnológica e a eficiência produtiva, e simultaneamente deve ser discutida a especialização da produção visando à inserção no mercado externo de modo a manter a utilização da capacidade instalada, o que só será possível se for obtido um salto qualitativo na elaboração de projetos navais e na execução desses. Assim, pontuam-se alguns elementos a serem considerados nas políticas locais, para que se alcance o desenvolvimento da indústria naval: a. Especialização produtiva- a necessidade de aprofundamento da especialização produtiva, com aumento da qualidade do produto, redução de perdas de produção e identificação de nichos de mercado, permitirá a inserção da indústria local em mercados mais amplos garantindo a utilização da capacidade produtiva instalada e a ocupação da mão-de-obra; mantendo o dinamismo e o desenvolvimento local sem a dependência excessiva de financiamentos internos à construção naval; b. Difusão e seleção de tecnologias- melhorar a difusão e seleção de tecnologias pela aproximação de fornecedores estrangeiros do entorno. A cadeia de fornecedores navais é complexa e baseada em vantagens 36 competitivas internacionais. Uma ampla identificação e aproximação desses fornecedores favorecem a avaliação dos custos e benefícios na aquisição de componentes, aumentando, também, o valor agregado à embarcação e ampliando as relações técnicas com o exterior. Pois, segundo Lundval (2001) o relacionamento com empresas estrangeiras é crucial no processo de inovação regional; caso contrário este se torna estagnado em relação à incorporação de avanços tecnológicos; c. Atualização dos gestores- como as informações e as decisões estão centradas na figura de proprietários e alguns gerentes, faz-se necessário a requalificação e atualização das formas organizacionais aplicadas de modo a superar as deficiências históricas quanto à logística de aquisição de materiais, liberação dos financiamentos, e cumprimento dos prazos estabelecidos em contratos que acarretam em dificuldades financeiras durante o processo de construção, inviabilizando financeiramente as empresas. A compatibilização do fluxo financeiro com o processo de produção trará solidez às empresas eliminando obstáculos ao crescimento e favorecendo o processo de acumulação, além de torná-las competitivas no ambiente externo; d. Qualificação da mão-de-obra- a mão-de-obra tem que se adaptar ao uso de novas tecnologias no processo produtivo e no produto, portanto é preciso que se estabeleçam cursos freqüentes de atualização e qualificação. Observa-se também que com o crescimento da atividade naval decorrente dos financiamentos, ocorre a falta de trabalhadores aptos a desempenhar determinadas funções, logo cursos técnicos voltados à construção naval possibilitarão a inserção de novos indivíduos no mercado de trabalho; e. Governança- existe pouca interação e confiança nas instituições locais, não havendo governança por parte das instituições publicas e privadas locais, nem por parte de empresas de maior porte. Devido à dependência mundial da indústria naval de ações do estado, propõe-se que o Governo do Estado de Santa Catarina através da Secretaria Regional de Desenvolvimento estabeleça a governança local de modo a aglutinar os esforços e intermediar os conflitos, estabelecendo ações que permitam a formação de competências que não estejam no local; ampliado os conhecimentos e habilidades 37 presentes no entorno, favorecendo e assim possibilitando o desenvolvimento regional. 38 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AAGE,T. Absorptive capacity of industrial districts.I n: DRUID Summer Conference 2003 on Creating, Sharing and Transferring Knowledge. Copenhagen Disponível em:<http.druid.dk>. Acesso em: abr.2003. AMIN,A;COHENDET,P. Geographies of knowledge formation infirms.In: DRUID Summer Conference 2003 on Creating, Sharing and Transferring Knowledge. Copenhagen. Disponível em:<http.druid.dk>. Acesso em: abr.2003. BANCO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO E SOCIAL BNDES. 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Estudo sobre a competitividade de cadeia integradas no Brasil: impactos das zonas de livre comércio: cadeia industria naval. Campinas.: Unicamp, 2002 AUTORA: Identificação: Ana Luísa de Souza Soares Instituição: Universidade do Vale do Itajaí- UNIVALI Endereço: Avenida Valdemar Vieira 153, Florianópolis, SC- CP 88045-500 Telefones: (048) 3333-7225 – residencial (047) 3341-7665- comercial (048) 99583766- celular e- mail: [email protected] Registro Corecon-SC n.o.1959-3 40