59 1ª Jornada Científica de Comunicação Social A pesquisa em Comunicação: tendências e desafios OS PARADIGMAS DA IMPRENSA EM PAUTA: BIODIVERSIDADE, BIOCOMBUSTÍVEIS E AQUECIMENTO GLOBAL1. Katarini Miguel2 Palavras-chave: Meio ambiente. Comunicação. Análise de Conteúdo. INTRODUÇÃO - Ao longo dos anos nota-se que o assunto ambiental ganhou inúmeras vertentes e interpretações, que apresentam a questão de maneira ora romantizada, ora catastrófica, ora antropocêntrica ou ainda banalizam a temática para criar uma realidade ambiental autônoma, isolada e desvinculada do conjunto das relações de interdependência que se estabelecem entre natureza e sociedade, como avalia Ramos (1996). Ainda quando se considera o exercício político sobre as questões ambientais, faz-se necessário analisar a construção destas notícias para reconhecer paradigmas que ainda persistem nas mensagens, e conseqüentemente, influenciam a visão do leitor e podem comprometer políticas públicas. A prática do jornalismo relacionado às questões ambientais, mostra-se, na maioria das vezes, carregada de estereótipos, impedindo uma concepção contextualizada do tema. Assuntos que exigem mais apuração e conhecimento como o processo de política ambiental, acabam marginalizados. O trabalho em questão propõe justamente averiguar o tratamento dos textos informativos relacionados à temática ambiental, no jornal impresso O Estado de S.Paulo, a partir dos temas Biodiversidade, Biocombustíveis e Aquecimento Global, utilizando a Análise de Conteúdo para avaliar o tratamento das notícias e sinalizar para as principais características da construção jornalística. METODOLOGIA - A análise de conteúdo é uma técnica de investigação sistemática e quantitativa, que pode ser utilizada para avaliar as notícias ambientais, na medida em que vai proporcionar elementos de comparação para sugerir os paradigmas predominantes nos meios de comunicação de massa. Bardin (1977) explica que este tipo de abordagem permite a análise quantitativa, que avalia a freqüência de certas características no conteúdo, como a qualitativa, que percebe a presença ou ausência de indicativos, que valoram o texto, sempre fundamentada na presença de um indicador. A análise de conteúdo, segundo a autora, proporciona a ultrapassagem da incerteza e o enriquecimento da leitura de tentativa exploratória. Segundo Bardin, reiterada por Fonseca Junior (2008), a análise quer induzir os conhecimentos relativos às condições de produção ou recepção, e para isso, recorre a indicadores. Os autores sugerem que, inicialmente, seja feita uma pré-analise, com 1 Trabalho apresentado na 1ª Jornada Científica de Comunicação Social, sob o título A pesquisa em Comunicação: tendências e desafios, realizada na Universidade Sagrado Coração – Bauru – SP, no período de 27 a 29 de agosto de 2009. 2 Jornalista, mestre em Comunicação Midiática pela Universidade Estadual Paulista (Unesp), campus de Bauru, coordenadora do Programa de Comunicação do Instituto Vidágua. E-mail: [email protected] 60 formulação de hipóteses, objetivos e indicadores; exploração do material para constituição do corpus e tratamento do resultado/inferência e interpretação. A categorização também é colocada pela autora, na medida em que classifica os elementos constitutivos de um conjunto, que podem ser semânticos, léxicos e expressivos. Mas ela (p.134) lembra que “qualquer análise conteúdo deve passar pela análise da mensagem em si”, porque é necessário compreender as significações como mitos, símbolos e valores. A autora explica que a análise pode ser feita a partir do desmembramento do texto em unidades de significação. Desta forma, só os enunciados que exprimem avaliação são submetidos à analise. E estes componentes relevantes podem ser objetos de atitude, que podem recair sobre pessoas, grupos, idéias e termos avaliativos, o que permite também averiguar o enquadramento das mensagens. Este procedimento pode ser feito, através da escolha de unidades de registro (como palavras chaves e temas), escolha das unidades de contexto e recorte do texto em fragmentos, codificando e avaliando a presença ou ausência de cada unidade e o realçar destes elementos. PRINCIPAIS RESULTADOS - A partir da metodologia da Análise de Conteúdo e categorizações quantitativas foram analisadas as matérias, com o objetivo de compor um quadro preliminar da cobertura da mídia nos assuntos relacionados à temática ambiental. Em oito dias de análise foram constatadas 40 matérias sobre a temática, em uma média de 5 matérias por dia de tamanhos superiores a 2 mil caracteres, evidenciando a centralidade da questão e o espaço que a temática ambiental está adquirindo nos veículos de comunicação. Vale lembrar que esta autora realizou semelhante pesquisa há exatamente um ano e verificou em um período maior, 12 dias, apenas sete matérias com viés ambiental. A maioria das matérias constava no Caderno de Economia em editoras específicas de Economia e Negócios, Agroenergia, Produção de Combustível e Etanol. Do total de 40 matérias, metade, 20 delas, ocuparam o Caderno de Economia, fazendo uma estreita ligação de meio ambiente com economia, colocando, muitas vezes, o tema ambiental como fator limitante para os negócios. O Caderno Nacional (geral), editoria específica “Vida &” abordou assuntos relacionados à Biodiversidade, Aquecimento Global e qualidade de vida. Também foram encontradas notícias relacionadas ao tema ambiental no Caderno Cidades, evidenciando a abrangência do assunto, que não deve estar fixado em uma única editoria. O tema mais freqüente nas matérias analisadas foi a Produção de etanol, biocombustível e agroenergia, justamente no Caderno de Economia. Foram 19 matérias sobre a temática, quase metade do total. Também foram contabilizados 9 textos sobre biodiversidade, englobando unidades de conservação, florestas e povos tradicionais e 6 sobre aquecimento global e mudanças climáticas. As fontes de informação foram em sua maioria oficiais. Em 40 matérias, 31 tinham o posicionamento oficial, enquanto 14 também ouviram organizações não governamentais, associações e personagens envolvidos com o tema. Os empresários e investidores foram citados em apenas 5 matérias, apesar da predominância no Caderno de Economia com ênfase para negócios, enquanto pesquisadores e universidades foram fontes de informação em 4 textos .O jornal usou de generalizações atribuindo às informações e opiniões aos “ambientalistas”, “cientistas” e “negociadores internacionais” como se estas categorias fossem homogêneas e partilhassem da mesma opinião. Mas vale colocar que foi notada uma pluralidade de fontes de informações em grande parte das matérias, que ouviram governo, organizações não governamentais, personagens e pesquisadores. CONCLUSÃO - Ficou evidente a partir desta pequena amostra que O Estado de S.Paulo incorporou o discurso da preocupação ambiental, desenvolvimento 61 sustentável e produção de energia e combustíveis alternativos, mas deixou a desejar em suas abordagens. Para Castells (2002) a questão ambiental ganhou mais espaço justamente em virtude das publicações na mídia, e porque o movimento ambiental demonstrou grande capacidade de divulgação, criando elementos propícios para matérias e reportagens. Foi possível perceber um certo enquadramento conflituoso, ressaltando embates ao invés de explicar o assunto para seu leitor e uma forte predominância na relação econômica. Por não entrar em muitos méritos científicos, se restringindo a descrever os acontecimentos de maneira isolada, foi constatado um viés antropocêntrico nas matérias aqui analisadas, colocando o homem isolado do meio ambiente. Mas as raras exceções mostram assuntos mais voltados a uma realidade local. Devido às relações econômicas, escolha das editorias e abordagens, muitas vezes, pragmática de alguns assuntos, sobressaiu o paradigma positivista de ver a natureza de forma utilitária e isolada. Esse panorama prévio contribuiu para uma pesquisa mais ampla sobre o assunto, com uma amostra maior, que pode oferecer um quadro mais conclusivo a respeito dos paradigmas ambientais encontradas no jornal em questão. Freire (2003) avalia que a questão ambiental é interdisciplinar, em que se entrecruza o conhecimento técnico cientifico, as normas e valores, o estético cultural, regidos por razões diferenciadas. Para ele a solução dos problemas ambientais não é de natureza técnica, mas de uma opção político cultural e de um novo paradigma, que deve catalisar a formação de novos valores e promover a percepção em várias direções. A mídia mostra-se como um importante canal para esta mudança de paradigmas. REFERÊNCIAS BARDIN, L. Análise de Conteúdo. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1973. CASTELLS, M. O poder da identidade. 2. ed. São Paulo: Paz e Terra, 2000. (A Era da Informação: economia, sociedade e cultura, 2). FONSECA JÚNIOR, W. C. Análise Conteúdo. IN: DUARTE, J. BARROS, A. (Org.). Métodos e Técnicas de Pesquisa em Comunicação. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2008. RAMOS, L. F. A. Meio Ambiente e Meios de Comunicação. São Paulo: AnnaBlume, 1996. FREIRE, G. Educação Ambiental : princípios e práticas. São Paulo: Gaia, 2003. RAMOS, L. F. A. Meio ambiente e meios de comunicação. São Paulo: AnnaBlume, 1996.