Clima e sociedade:
Rumo a um uso mais eficaz das informações
de clima e tempo no Ceará
FUNCEME / IRI-Univ. Columbia / Univ. Arizona
Janeiro de 2006
Renzo Taddei
IRI-Univ. Columbia
Terra em transe
2005 foi ano intenso no que se refere a eventos climáticos:
– Furacão Katrina na América do Norte
– Perdas econômicas por impactos do clima: US$ 200 bilhões;
– Tornados no sul do Brasil: Santa Catarina, Indaiatuba;
– Secas no Rio Grande do Sul e no Amazonas;
– Discussões sobre mudanças climáticas (como Reunião de Montreal, no
Canadá);
Tornado de Criciúma
Santa Catarina
Tornado de Indaiatuba
Furacão Katrina
Meteorologia e sociedade
Ceará em transe: aproximação da quadra chuvosa para 2006:
• Reação social típica: ansiedade. Atenções voltadas para os
prognósticos:
– Previsões científicas da meteorologia;
– Práticas populares de previsão de chuvas e os profetas da chuva;
• Mas nem sempre os prognósticos são usados da forma mais
eficiente:
– Dificuldade de compreensão e aplicação das previsões;
– Existência de preconceitos e idéias estereotipadas quanto à
meteorologia;
– Existência de outras formas de entender o clima: abordagens políticas,
religiosas, culturais, etc.
• Abordagem multidisciplinar nos estudos de aplicação do
conhecimento climático;
• Mas faz-se necessário, em primeiro lugar, um esforço de melhoria
na comunicação entre a meteorologia e a sociedade.
A previsão de chuvas no Ceará
Esclarecendo conceitos e desfazendo confusões: o que é o “inverno” no
Ceará?
– Senso comum: período que vai das primeiras às últimas chuvas;
– Meteorologia: três momentos diferentes de chuva.
Momento em que chove
Nome dado pela
meteorologia
Sistemas meteorológicos
principais
Previsibilidade
Dezembro-Janeiro
Chuvas de pré-estação
Frentes frias e Vórtice
ciclônico
Baixa
Fevereiro a Maio
Estação de chuvas
propriamente dita
Zona de Convergência
Inter-Tropical
Alta
Maio-Junho
Chuvas de pós-estação
Ondas de leste
Baixa
CHUVAS DO NORDESTE BRASILEIRO
Dezembro
Março
Maio
Zona de Convergência Inter-Tropical
(ZCIT, ITCZ em inglês)
Influência do Oceano Pacífico nas chuvas causadas
pela Zona de Convergência Inter-Tropical
CIRCULAÇÃO DE WALKER
Temperaturas usuais da
superfície do oceano
Temperaturas da superfície
do oceano mais altas que o
usual – presença do El Niño
Influência do Oceano Atlântico nas chuvas causadas
pela Zona de Convergência Inter-Tropical
(A)
P
200N
200N
+ QUENTE
ITCZ
SECO
00
200S
00
+ FRIO
P
800W
600W
400W
200W
00
200E
200S
(B)
P
200N
200N
+ FRIO
CHUVOSO
ITCZ
00
00
+ QUENTE
P
200S
800W
600W
400W
200W
00
200E
200S
A previsão de chuvas no Ceará - II
•
O que é que se prevê?
– O que percebemos? Os eventos de chuva,
ou os efeitos acumulados das chuvas de
um período.
– Eventos de chuva: curto prazo, chamado
de TEMPO pela meteorologia;
– Chuvas totais de um período: longo prazo,
chamado de CLIMA pela meteorologia.
•
TEMPO - meteorologia contribui com:
– Monitoramento: uso de fotos de satélite, radares meteorológicos, medidores de chuvas
(pluviômetros) e de condições atmosféricas, medidores de condições dos oceanos
(bóias no Pacifico e no Atlântico – Projeto PIRATA);
– Previsão: uso de modelos matemáticos para previsão do tempo para até duas
semanas no futuro;
– Compartilhamento de dados, modelos e tecnologias: meteorologia é um campo
verdadeiramente globalizado. Previsões realizadas em conjunto com institutos
nacionais e internacionais (INPE-CPTEC, INMET, IRI, UK Met Office, COLA, etc.).
A previsão de chuvas no Ceará - III
•
CLIMA: o que a previsão da meteorologia pode dizer sobre a quadra
chuvosa?
Probabilidades para:
1 - Total de chuvas dentro da quadra chuvosa;
2 - Sobre todo o estado do Ceará (ou amplas regiões dentro dele,
como ao norte ou ao sul do estado);
3 - Associadas às categorias:
“acima da média histórica” ou
“chuvoso”
faixa de quantidade de chuva, em milímetros,
definida pelos 10 anos em que mais choveu
nos últimos 30 anos*
“abaixo da media histórica” ou
“seco”:
idem para os 10 anos em que menos choveu
“dentro da media histórica” ou
“normal”
para 10 anos intermediários
* Alguns autores usam os 35% dos anos com mais chuvas para “chuvoso”, 35% com menos chuvas para “seco”, e os 30%
intermediários para “normal”.
“Acima da media histórica”
ou “chuvoso”
1891
“Dentro da media
histórica” ou “normal”
“Abaixo da media histórica”
ou “seco”
.1
Chuvas no Ceará de 1975 a 2005
1900
1800
1700
.3
1066
.8
1075
.2
1,09
5.30
1118
.3
1,15
5.50
1156
.6
1167
.5
1168
.5
1263
.1
1323
.5
1500
1400
1200
1100
775.
8
783.
5
802.
90
846.
5
500
739
600
421.
2
430.
6
528
700
663.
4
683.
9
685.
6
695.
6
708.
7
716.
3
620.
7
657.
7
800
19
900
19
1000
905.
86
0
858.
7
951.
7
965.
1
1065
1300
19
Precipitação (chuvas) em milímetros
1600
400
300
200
100
0
86
89
04
94
88
75
84
77
95
00
96
03
02
99
78
76
80
91
87
97
82
01
92
79
81
05
90
98
83
93
di a
Mé
85
19
19
19
20
19
19
19
19
19
19
20
19
20
20
19
19
19
19
19
19
20
19
19
20
19
19
19
19
Anos
Abaixo da média histórica ≠ seca
- Percepção humana (sentidos): não é uma boa forma
de medição quantitativa.
- Ansiedade afeta percepção.
- Muitas vezes a população entende “média” ou
“normal” com “chuva suficiente”, mesmo em regiões
onde historicamente chove pouco.
A “media histórica” é um conceito estatístico. Desta
forma, a categoria “abaixo da media histórica” não é
necessariamente sinônimo de seca!
90 mm
90 mm
Por quê o prognóstico é probabilístico?
Analogia com o jogo infantil de bolinhas e hastes
Bolinhas
Condições iniciais
Trajetória de
cada bolinha
Hastes de madeira
Condições de
contorno: fatores que
afetam o curso dos
eventos em
determinada direção
Distribuição de
resultados mostra
probabilidades
associadas a cada
um deles.
7
bolinhas
21
bolinhas
7
bolinhas
20%
60%
20%
abaixo
da média
média
acima da
média
Por quê o prognóstico é probabilístico? - II
50% de chance: muito ou pouco?
Moeda: 2
resultados
possíveis. 50%
de chance cada.
100% de certeza?
Impossível, segundo
a ciência.
Dado: 6
resultados
possíveis. 17%
de chance cada.
Previsão: 3
resultados
possíveis. 33% de
chance cada.
1) Sistemas atmosféricos são caóticos, isto é, complexos
demais; modelos de computadores não são perfeitos, mas
simplificações dos fenômenos naturais.
2) Existe uma grande dificuldade para prever as
temperaturas dos oceanos (uma das condições iniciais);
A previsão de chuvas no Ceará - IV
Limitações existentes - as técnicas meteorológicas ainda não são capazes de
prever:
1 - Quando começam e terminam as chuvas, e
quando ocorrerão os chamados “veranicos”
(períodos de estiagem dentro da estação de
chuvas)
 Esta é a chamada
“variabilidade temporal das chuvas”;
2 - Em que lugares vai chover e onde não vai,
pontualmente.
 E esta é a chamada
“variabilidade espacial das chuvas”.
Alternativas de curto prazo: uso do monitoramento por imagens de
satélite e o uso de radares meteorológicos, e o uso de previsões de
chuvas de curto prazo com modelos matemáticos.
Pesquisa em andamento: técnicas de “regionalização” (ou
“downscaling”), que procura transformar a previsão para toda a região
em previsões para áreas menores (como municípios).
O que é uma “boa” previsão de chuvas?
A importância do fator social.
Vulnerabilidade: dimensão social.
Seca: fenômenos meteorológicos +
determinadas condições sociais
Exemplo: poucas chuvas e pouca capacidade de adaptação da sociedade.
A utilidade do prognóstico esta ligada ao contexto de cada grupo humano:
1) Necessidades
diferentes no uso que
faz de informações de
clima;
2) Distintas visões a respeito
do clima e de como ele afeta
suas vidas, e formas
específicas de tomada de
decisões;
3) Graus de liberdade e
possibilidade diferentes
quanto ao que pode fazer
para adaptar-se a um evento
climático previsto;
Conclusão: qualidade técnica ≠ utilidade. Mesmo um prognóstico de clima de alta
qualidade técnica pode não encontrar uso efetivo por setores da sociedade.
A previsão de chuvas no Ceará - V
Deve-se evitar confundir o prognóstico de chuvas com:
Prognóstico de produção agrícola
Prognóstico de eventos que necessitarão da ação da defesa civil
Prognóstico de recarga de açudes
Prognóstico de epidemias
Fatores intermediários
Chuvas não são os únicos fatores a determinar
estes eventos: pragas, mercado, políticas públicas, etc.
Pesquisa atual: desenvolvimento de técnicas para:
Fatores intermediários
Prognóstico de chuva
Prognósticos de safra, recarga de
açudes, epidemias, etc.
Novo paradigma, novas oportunidades
Grande salto nos conhecimentos climáticos na última década: modelos melhores;
Desenvolvimento de uma abordagem multidisciplinar: melhor conhecimento das formas
como a sociedade pensa e toma decisões ligadas ao clima.
Busca de formas de convivência com o semi-árido – redução da vulnerabilidade.
Produção de previsões e informações climáticas adequadas às necessidades de
cada tipo de usuário.
Informação genérica: pouca utilidade
Informação direcionada a comunidades ou setores específicos: muita utilidade
Aí vem mais um prognóstico. E agora?
Previsão de recarga de açudes (previsão de vazões)
FUNCEME
Software de previsão de probabilidade de lucro na agricultura;
Zoneamento geo-ecologico;
Estudos ligados à umidade do solo.
Estudo do ciclo de vida do mosquito em relação a variações de tempo e clima.
Que tipo de informação é mais qualificada para cada atividade? É preciso saber:
1) em quais momentos a atividade requer informações ligadas ao clima?
2) estas informações são de curto ou longo prazo?
Informação pontual para próximos dias (condução das atividades diárias): monitoramento do
tempo;
Informação pontual para próximos meses: não é produzida pela meteorologia;
Informação agregada para próximos meses (planejamento): prognóstico para a quadra chuvosa;
Como usar a informação probabilística para o planejamento de atividades?
1) antes de usar as probabilidades, o indivíduo precisa pensar quais as estratégias de ação
possui para situações de pouca chuva, de chuvas normais, ou de muita chuva;
2) uma vez que conhece estas estratégias, uma forma de minimizar os impactos negativos do
clima é usar cada uma destas estratégias proporcionalmente às probabilidades indicada pela
previsão.
FIM
Apresentação disponível no site
http://iri.columbia.edu/~taddei/ces
Email para contato:
[email protected]
Download

Document