1 UFMA UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM POLÍTICAS PÚBLICAS III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍCAS PÚBLICAS QUESTÃO SOCIAL E DESENVOLVIMENTO NO SÉCULO XXI ASSISTÊNCIA À SAÚDE NO HUOL: limites e possibilidades na efetivação de direitos Adriana Paula da Silva Eleutério1 Joseneide Costa Soares2 RESUMO Este trabalho objetiva analisar a assistência à saúde no Hospital Universitário Onofre Lopes, município de Natal/RN, considerando o atendimento aos usuários internados e aos advindos dos ambulatórios. A metodologia utilizada compreende coleta de dados fundamentada na observação, em entrevistas realizadas no momento de internação de usuários e no sistema informacional de registro de ambulatório e internação, no período de janeiro a dezembro de 2006. Identificouse que, apesar das dificuldades de acesso, de integralidade e de resolutividade dos serviços, o Hospital continua atendendo um grande número de usuários, advindo de todo o Estado, sendo esta uma expressão da efetivação de direitos. Palavras chaves: Saúde, Direitos, Dificuldades, Possibilidades. ABSTRACT this work has the aim to analyze the assistance to the health at the Onofre Lopes university hospital, in Natal RN, observing the way that it attends the patients. The methodology used understands the collect of datas based in its information. In some interviews noticed when the patients were being interned and in the informational system of registers of ambulatories and intemment. From January to December of 2006. Identified that despite of the difficulties of have access, of completeness and services decided, the hospital still attends a lot of people who come from all the state, it’s a way to show that everything is being opted. Key words: Health, Rights, Difficulties, Possibilities 1 POLÍTICA DE SAÚDE As mudanças ocorridas nas últimas décadas do século XX, em decorrência da crise capitalista, introduziram novas tecnologias com a utilização da robótica e microeletrônica que flexibilizaram produção, processo e mercado de trabalho. (IAMAMOTO, 1999) A reestruturação produtiva, a globalização da economia e o neoliberalismo têm levado a transformações no processo de acumulação de capital em que a sociabilidade do capital ganha proporções devido à globalização financeira. 1 Mestre em Serviço Social. Mestranda em Serviço Social. 2 III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 2 Sob a ótica do neoliberalismo o Estado passa a reduzir seus investimentos no campo social, diminuindo sua intervenção nas políticas sociais, o que significa que o Estado é mínimo para as ações sociais. Tem-se que “para a política social, a grande orientação é a focalização das ações, com estímulo a fundos sociais de emergência”. (BEHRING, 1998, p.187) Diante do exposto, a política de saúde tem sido colocada em segundo plano, recebendo um percentual mínimo de recursos públicos, o que tem dificultado a implementação do que foi idealizado no movimento de Reforma Sanitária3. Este Movimento teve como marco a realização da VIII Conferência Nacional de Saúde, em março de 1986, em Brasília/DF, cujo temário central foi: l) A saúde como direito inerente à personalidade; II) Reformulação do Sistema Nacional de Saúde, em consonância com os princípios de integração orgânicoinstitucional, descentralização, universalização e participação, redefinição dos papéis institucionais das unidades políticas (União, estados, municípios, territórios) na prestação dos serviços de saúde; III) Financiamento setorial. (BRASIL, 1987) Apesar dos avanços legais relativos à saúde garantidos pela Constituição Brasileira promulgada em 1988 e percebidos em seu artigo 196 que dispõe a saúde como direito de todos e dever do Estado (BRASIL, 1988), da implantação do SUS nos anos de 1990 e pelas leis 8.080 de 19 de setembro de 1990 e 8.142 de 28 de dezembro de 1990, não se tem a materialização da política de saúde, consubstanciada nos dispositivos legais, o que se pode perceber diante do cenário de instituições públicas, que aponta limites na efetivação de direitos garantidos legalmente. A política de saúde implementada na cidade de Natal, Estado do Rio Grande do Norte, segue a orientação do nível nacional, com algumas especificidades, conforme a articulação de forças políticas, planejamento, orçamento, controle social e gestão. Apresenta dificuldades na realização das ações que limita o acesso, a integralidade e resolutividade dos serviços de saúde, o que obstaculiza aos usuários o direito social à saúde. 2 HUOL E SUS O Hospital Universitário Onofre Lopes – HUOL, Instituição vinculada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, é considerado Hospital Escola que tem como 3 Vide Bravo e Matos, 2004. III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 3 finalidade o ensino, a pesquisa e a extensão, integrando e sendo referência terciária para o Sistema Único de Saúde – SUS4. A Instituição oferece serviços de clínicas médicas e cirúrgicas, exames laboratoriais, de imagem e hemodinâmica e, atendimento de profissionais qualificados para responder ao agravo à saúde, apresentados pelos usuários. Assim, a saúde deve ser entendida em seu sentido mais abrangente, considerada como: resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente, trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a serviços de saúde. É assim, antes de tudo, o resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes desigualdades nos níveis de vida. A saúde não é um conceito abstrato. Define-se no contexto histórico de determinada sociedade e num dado momento de seu desenvolvimento, devendo ser conquistada pela população em suas lutas cotidianas. (BRASIL, 1987, p. 382) No atual contexto, o Hospital se fundamenta no sistema de referência e contrareferência, no qual os usuários são atendidos pelas unidades básicas de saúde, e quando necessita da consulta com um especialista do qual a unidade não dispõe, faz-se o agendamento pela Central de Regulação. O acesso a esta marcação se dá pelo sistema online, que distribui as consultas conforme as vagas disponíveis. Os exames também têm agendamento pelo sistema de referência e contra-referência. Neste sistema de referência e contra-referência, o HUOL oferece seus serviços, sendo contratados pela Secretaria Municipal de Saúde de Natal/RN aqueles que ela julga necessários à realização da assistência à saúde dos usuários, do seu município, e dos municípios que realizaram com esta Secretaria a pactuação5. Neste sentido, “... o HUOL, por apresentar maior resolutividade aos problemas trazidos pelas pessoas, tem grande importância na atenção à saúde no estado do Rio Grande do Norte, servindo, inclusive, como referência para a maioria das clínicas especializadas”. (BEZERRA, 2001, p. 54/55) Parcela significativa dos serviços do Hospital atende, exclusivamente, pelo sistema de referência e contra-referência, tendo alguns serviços atendimento tanto pelo sistema de referência e contra-referência quanto demanda espontânea. Além disso, um pequeno percentual dos serviços atende apenas como demanda espontânea. 4 O SUS constitui-se como o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais, da Administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo poder público; e tem entre seus objetivos formular a política de saúde. (Lei 8.080. LOS/SUS, 2006). 5 Pactuação referisse a um “convênio” estabelecido entre a Secretaria Municipal de Saúde de Natal/RN e as secretarias municipais de saúde dos municípios que pretendam utilizar os serviços de saúde do HUOL, ou de outras instituições de saúde vinculadas à Secretaria Municipal de Saúde de Natal/RN. III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 4 Outro atendimento ambulatorial realizado pelo Hospital é o dos programas de Transplante Renal, Serviço de Cirurgia da Obesidade e Doenças Relacionadas, Oftalmologia, Unidade de Tratamento de Álcool e outras Drogas – UTAD, Hipertensão Arterial e Diabetes Mellitus, os dois últimos em fase de desmame, já que o atendimento primário deve ser realizado nas unidades básicas de saúde. No tocante às internações a maior parcela é advinda de atendimentos ambulatoriais quando o profissional avalia que o usuário necessita de tratamento mais qualificado que deva ser realizado através de internação hospitalar ou que haja necessidade de intervenção cirúrgica, necessitando, algumas vezes, da realização de exames quando internados para concluir diagnóstico da doença do usuário. Estes procedimentos definem a necessidade de realização de tratamento ou cirurgia. 3.SITUANDO A PESQUISA No processo de realização da pesquisa a metodologia utilizada para a coleta de dados fundamenta-se na observação, em entrevistas realizadas no momento de internação de usuários e no sistema informacional de registro de ambulatório e internação do Hospital, no período de janeiro a dezembro de 2006. Note-se que a metodologia expressa uma relação intrínseca entre teoria e prática. Neste sentido, como afirma Minayo: A metodologia inclui as concepções teóricas de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da realidade e o sopro divino do potencial criativo do investigador. (MINAYO, 2000, p.16) A coleta de dados apontou que o HUOL realizou 148.203 atendimentos, tendo o ambulatório um volume superior a 100.000 atendimentos. Constata-se que a especialidade que registrou maior número de atendimentos foi a Oftalmologia, sendo responsável por 23.678 atendimentos. Cabe ressaltar que a Oftalmologia realiza procedimentos cirúrgicos que não necessariamente demandam internação. Especialidades como a radiologia, serviço social, cardiologia, dermatologia, urologia/nefrologia, cirurgia geral, otorrinolaringologia, nefrologia, gastroenterologia, clínica geral, endocrinologia, neurologia, reumatologia, psicologia, proctologia, cirurgia vascular, III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 5 ortopedia/traumatologia, psiquiatria, neurocirurgia, entre outras apresentaram um grande número de atendimentos. As várias especialidades oferecidas expressam que o HUOL realiza atendimentos das especialidades mais simples, que pode dispor uma unidade básica de saúde no setor primário, dando resolutividade ao problema de saúde apresentado, até a mais complexa que requer um nível de intervenção mais específico e profundo. Outro aspecto pesquisado foi à faixa etária, sendo constatado que os usuários atendidos no Hospital se agrupam da seguinte forma: sem Faixa 56, de 0 a 21 anos incompletos 16.822, de 21 anos a 40 anos incompletos 37.742, de 40 anos a 60 anos incompletos 54.656, acima de 60 anos 38.927, contabilizando 148.203 usuários. Isto significa dizer que a população atendida pelo HUOL encontra-se elevadamente entre adultos e idosos, tendo como um dos fatores resultante o fato da Universidade dispor de outras duas instituições, uma que atende o público feminino, nas especialidades de ginecologia e obstetrícia, e outra que atende criança e adolescente. Neste período, o Hospital registrou o atendimento a usuários provenientes de inúmeros municípios do Estado, sendo a maior parcela residente em Natal/RN, totalizando 96.175 usuários, dado este que mostra que os usuários residentes no município mencionado têm mais facilidade de buscar o acesso nesta Instituição. Além disso, 200 municípios do Rio Grande do Norte e de outros estados tiveram usuários atendidos no HUOL. Buscar o que está subjacente a grande demanda colocada ao HUOL é ter como pressuposto que “o concreto é concreto porque é a síntese de muitas [sic] determinações, isto é, unidade do diverso”. (MARX, 1990, p.116) O quadro exposto revela que o HUOL apresenta uma diversidade de especialidades e de usuários que são provenientes de vários municípios, o que mostra no contato com o Serviço Social que estes usuários concebem muitas vezes ser o atendimento do Hospital a única e a melhor assistência à saúde que estes dispõem. Esta situação advém da inserção subordinada dos usuários no sistema de produção, com remuneração baixa ou, às vezes, sem fonte de renda, o que aponta que os integrantes das classes subalternas constituem o principal público atendido pelo HUOL. Os usuários procuram os serviços desta Instituição por não terem atendimento assegurado em seus municípios de origem em virtude dos municípios não conseguirem administrar suas demandas por falta de infraestrutura e profissionais qualificados, levando-os a considerar o Hospital referência na realização de encaminhamentos que não são realizados por III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 6 outros hospitais e clínicas. Isto revela que apesar da grande demanda e das dificuldades enfrentadas pelos usuários e pelo Hospital, o HUOL vem tentando assegurar o direito à saúde. 4 BREVES CONSIDERAÇÕES É possível perceber que o atendimento ambulatorial no HUOL a partir do sistema de referência e contra-referência pela Central de Regulação, via sistema on-line, melhorou o atendimento em virtude de não ter mais fila de usuários e facilitou o trabalho do Serviço de Arquivo Médico e Estatístico – SAME, responsável pela marcação de consultas. Esta nova forma de marcação para o usuário tornou mais difícil a concretização de sua consulta, tendo em vista que a partir desse momento o usuário não participa do processo de marcação, pois apenas tem atendimento na unidade de saúde e a consulta para um profissional especializado fica sob a responsabilidade de um profissional da referida unidade, que marcará pela Central de Regulação. Assim, o concreto torna-se abstrato, sendo a marcação de consulta realizada por um sistema on-line. Nesta perspectiva, o usuário tem aguardado muito tempo pela marcação de consultas, dificultando em conseqüência, a avaliação para uma possível internação tanto para tratamento clínico quanto para procedimento cirúrgico. Esta situação revela que o usuário está à mercê desse processo e não é partícipe ativo dele. As dificuldades encontradas pelos usuários na marcação de consultas e na demora nas internações têm levado inúmeros deles a procurar o Serviço Social do HUOL, colocando que o tempo de espera faz com que exames não tenham mais validade e por apresentarem determinados sintomas, afirmam que não podem mais esperar. O Serviço Social tem orientado os usuários como é esta nova forma de marcação, a que instituição deve procurar de forma a garantir uma assistência à saúde humanizada e com qualidade. Cabe ao Serviço Social informar aos usuários seus direitos, e aos setores e gestores da Instituição os limites encontrados pelos usuários na efetivação destes, visando contribuir com a eficiência do SUS e com a garantia de tais direitos. Assim, Importa ressaltar que, a despeito das contradições e das tensões que perpassam a inserção dos assistentes sociais, a emergência de novos vetores inclusão do assistente social nas equipes de saúde abre a possibilidade pela qual essa profissão possa interferir e redirecionar a sua inserção nos processos de trabalho na saúde elaborando estratégias de atendimento às necessidades imediatas como as ações voltadas para a construção da democratização do acesso e qualificação da atenção, com vínculo e responsabilização social, no sentido de dar respostas às necessidades de saúde III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 7 resultantes das desigualdades sociais existentes na sociedade brasileira a partir do fortalecimento das relações com usuários como sujeito de direitos”. (COSTA, 2006, p.349) Quanto aos usuários internados estes enfrentam dificuldades na integralidade e resolutividade dos serviços, tais como a permanência de usuários potenciais a receberem alta hospitalar em virtude de não contarem com assistência em suas residências por parte das Secretarias de Saúde, bem como pela inexistência de procedimentos essenciais para usuários que necessitam dar continuidade ao tratamento fora do âmbito hospitalar e, ainda, a demora na realização de exames e recebimento de resultados. A realização da assistência à saúde com qualidade esbarra em limites impostos pela forma de organização e implementação do sistema de saúde vigente, quando não há uma rede de serviços eficiente e eficaz, o que impõe obstáculos a um serviço de saúde participativo, de atendimento integral e de afirmação de direitos. Apesar desta realidade, o HUOL vem tentando contribuir para a efetivação de direitos dos usuários. REFERÊNCIAS BEHRING, Elaine Rossetti. Política social no capitalismo tardio. São Paulo: Cortez, 1998. BEZERRA, Nelma Gomes. Análise das relações saúde-doença segundo as determinações sócio-econômica e política. João Pessoa: UFPB/CCHLA, 2001. Brasil. Anais da VIII Conferência Nacional de Saúde, 1987. Brasil. Constituição federal. Brasília: Centro Gráfico do Senado, 1988. Brasil. Lei 8.080, LOS/SUS. In: Coletânea de leis. Natal: CRESS/RN, 2006. Brasil. Lei 8.142, LOS/SUS. In: Coletânea de leis. Natal: CRESS/RN, 2006. BRAVO, Maria Inês Souza. Serviço social e reforma sanitária: lutas sociais e práticas profissionais. São Paulo: Cortez; Rio de janeiro: Editora UFRJ, 1996. BRAVO, Maria Inês Souza; MATOS, Maurílio Castro de. Reforma Sanitária e Projeto ÉticoPolítico do Serviço Social: elementos para o debate. In: BRAVO, Maria Inês Souza. [et al.], (orgs). Saúde e serviço social. São Paulo: Cortez; Rio de Janeiro, UERJ, 2004. COHN, Amélia; NUNES, Edison; JACOBI, Pedro e KARSCH, Ursula S. A saúde como direito e como serviço. São Paulo: Cortez, 2. ed.,1999. III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007. 8 COSTA, Maria Dalva Horácio da. O Trabalho nos Serviços de Saúde e a Inserção dos(as) Assistentes Sociais. In: MOTA, Ana Elizabete [et al.], (orgs). Serviço social e saúde. São Paulo: OPAS, OMS, Ministério da Saúde, 2006. IAMAMOTO, Marilda Vilela. O serviço social na contemporaneidade: trabalho e formação profissional. 2. ed., São Paulo: Cortez, 1999. MARX, Karl. Para a crítica da economia política. Tradução de: José Arthur Giannotti e Edgar Malagodi. São Paulo: Abril Cultural, 1990. (Coleção Os Pensadores). MINAYO, Maria Cecília de Souza. (org). Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 17. ed., Petrópolis: Vozes, 2000. III JORNADA INTERNACIONAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS São Luís – MA, 28 a 30 de agosto 2007.