O SUCESSO ACADÊMICO COMO PRÁTICA DE INCLUSÃO NA EDUCAÇÃO SUPERIOR ANA P. DA SILVA [email protected] UFF ERIKA S. LEME [email protected] UFF KÁTIA R. X. DA SILVA [email protected] COLÉGIO PEDRO II/FCM-UERJ MARTA C. GUEDES [email protected] UNIABEU MICHELE P. DE S. FONSECA [email protected] UFRJ RESUMO O presente relato refere-se a uma experiência de inclusão no Ensino Superior, numa instituição privada da baixada fluminense, cujo foco é o percurso de estruturação de um programa institucional que visou à preparação dos estudantes para as práticas sociais e para o mundo do trabalho, através de cursos de otimização do conhecimento e da aprendizagem. Dentre as conclusões provenientes dessa experiência, destaca-se o valor das atividades de extensão como espaços profícuos para o desenvolvimento de reflexões e ações que incidem sobre o sucesso acadêmico dos estudantes, no sentido de conscientizá-los sobre a importância de valorizar e aprimorar o que se sabe e investir no preenchimento das lacunas existentes no âmbito do conhecimento acadêmico. PALAVRAS-CHAVE: Enriquecimento Curricular – Inclusão em Educação – Ensino Superior. 1 INTRODUÇÃO Segundo SILVA & SILVA (2014), o sucesso acadêmico está relacionado a três aspectos essenciais: (1) o desenvolvimento de habilidades de pensamento analíticas, criativas e práticas; (2) a criação de uma cultura institucional que promova a participação efetiva dos diferentes atores (alunos, professores, gestores) no processo de aprendizagem; e (3) a reavaliação e reflexão sistemáticas sobre a organização dos currículos. Diferentes pesquisas demonstram que a forma como as instituições universitárias se organizam reflete na formação do aluno, sob diferentes pontos de vista, entre os quais o profissional, cognitivo e social (FERREIRA, ALMEIDA & SOARES, 2001; MONTEIRO, ALMEIDA & VASCONCELOS, 2012, SILVA & SILVA, 2014). Neste sentido, as atividades extracurriculares favorecem o desenvolvimento de competências acadêmicas, cognitivas e pessoais que subsidiam formação técnica e profissional e servem de preparação para o enfrentamento dos obstáculos futuros. Outro aspecto a ser destacado é que os índices de retenção e evasão são mais proeminentes nos primeiros semestres dos cursos superiores. As dificuldades de adaptação dos estudantes ao mundo acadêmico podem ocasionar sentimento de fracasso e insatisfação nos novatos em função da “falta de recursos pessoais, inapropriado repertório acadêmico básico, inexistência de um projeto profissional definido e ausência de apoio da instituição” (IGUE, BARIANI & MILANESI, 2008, p.157). Assim como Silva (2013) e Ferreira, Almeida & Soares (2001), compreendemos o conceito de sucesso sob o ponto de vista multidimensional. Não é possível, portanto, falar de sucesso sem considerar o contexto pessoal e social que abrangem, por sua vez diferentes aspectos da vida do estudante. Sendo assim os aspectos educativos e pessoais interagem e refletem na forma como o estudante se relaciona com o conhecimento, como percebe as próprias competências acadêmicas e cognitivas, a qualidade das relações interpessoais estabelecidas com os colegas e, sobretudo, no tipo de projeto profissional que almejam para si. Neste sentido, o enriquecimento curricular é benéfico para todos os estudantes, seja para aqueles que possuem habilidades especiais, seja para aqueles que apresentam alguma dificuldade de 2 aprendizagem ou mesmo aqueles que querem aprimorar aquilo que sabem (SILVA, OLIVEIRA & SOUZA, no prelo). Não é possível, portanto, determinar um parâmetro universal de sucesso acadêmico. Por outro lado, é dever da instituição de ensino proporcionar espaços para o desenvolvimento de estratégias de aprendizagem eficazes por parte dos alunos e promover métodos de ensino e avaliação que se ajustem às necessidades destes e que os desafiem a superar as próprias dificuldades. Segundo Silva (2013), “os resultados deste processo poderão servir de base para a tomada de decisões a respeito do que fazer para melhorar a aprendizagem dos estudantes” (p.350). Para Silva & Silva (2014), o investimento em atividades extracurriculares que focalizem o processo de aprendizagem “pode colaborar para balizar as expectativas e fomentar o desenvolvimento e o aprimoramento do repertório necessário ao sucesso acadêmico” (p.11). Além disso, esse tipo de iniciativa é responsável, também, pelo “desenvolvimento de competências transversais, necessárias a qualquer área do conhecimento, permitindo assim a autonomia da aprendizagem e a reflexão sobre as responsabilidades a serem assumidas no processo de construção do próprio conhecimento” (idem). O presente relato refere-se a uma experiência de inclusão no Ensino Superior numa instituição privada da baixada fluminense. O foco da experiência em tela é o percurso de estruturação de um programa institucional que visou à preparação dos estudantes para as práticas sociais e para o mundo do trabalho, através de cursos de otimização do conhecimento e da aprendizagem. Os referidos cursos, em essência, tinham como objetivo principal o resgate, o aprimoramento e a ampliação de conhecimentos básicos e essenciais ao desenvolvimento dos estudos em nível superior e intentavam suprir possíveis lacunas no processo de aprendizagem, que tinham relação direta com a formação escolar anterior ou com um longo período de afastamento da realidade escolar. As reflexões sobre o caminho trilhado por esse programa, ao longo de sua (re)construção denotam o amadurecimento acerca de questões como a cultura institucional, a necessidade de investir no desenvolvimento de hábitos de estudo e a 3 importância de se analisar as relações entre os conteúdos acadêmicos e as habilidades necessárias ao processo de aprendizagem. PROGRAMA DE NIVELAMENTO DISCENTE (PRONIDI): CONTRIBUIÇÕES PARA A INCLUSÃO NO ENSINO SUPERIOR O lócus do presente relato é uma instituição de ensino superior (IES) privada, de natureza filantrópica, localizada no Estado do Rio de Janeiro, mais especificamente na região da Baixada Fluminense. A instituição atende, em média, 6000 estudantes, matriculados nos 17 cursos de graduação oferecidos. Assim como as demais IES brasileiras, a IES vive as consequências da expansão das taxas de acesso ao ensino superior, entre as quais a diversificação do público atendido, em relação aos aspectos econômicos, sociais, culturais e sobretudo acadêmicos. Muitos alunos, veem no curso superior, a possibilidade de ascensão social e econômica e uma forma profícua de conseguir uma posição privilegiada no mercado de trabalho atrelada ao reconhecimento profissional. Para Almeida et. al. (2006), “importa conhecer a ‘nova’ composição desta população, para que as instituições possam atender às suas características e necessidades” (p. 509). Os referidos autores argumentam, ainda, que a diferença entre os custos de investimento empreendidos determinam o efeito de dissuasão para abandonar os estudos, concentrando no filho do operário as maiores chances de iniciar e sair do curso de ensino superior. Neste sentido, a partir de uma Portaria específica a IES criou o Programa de Nivelamento Discente (Pronidi) como uma forma de colaborar para a permanência e sucesso dos estudantes. Esse Programa traduz-se em um mecanismo institucional para promover a inclusão dos estudantes, na medida em que se propõe em identificar e combater processos de exclusão e aumentar a participação destes na arena da formação acadêmica (SANTOS, 2010). No ano de sua implantação, no segundo semestre de 2008, o Pronidi tinha como objetivo resgatar, aprimorar e ampliar os conhecimentos básicos essenciais ao desenvolvimento dos estudos de nível superior. De certo modo, a proposta inicial, denominada nivelamento, visava equiparar os conhecimentos dos ingressantes que 4 tinham dificuldades em áreas específicas, dotando-os de informações que os permitiriam prosseguir os estudos. Motivar os estudantes a participar do programa pode ser destacada como uma das maiores dificuldades encontradas pela coordenação no processo de implementação do programa, tendo em vista que a adesão aos cursos parece ter encontrado resistência na própria ideia de que a condição para participar era estar “fora” ou “abaixo” do “nível” desejável ao de um aluno universitário. A divulgação do programa, no referido ano, não contou com nenhuma campanha específica, ficando apenas a cargo das informações veiculadas boca a boca nos campi. Os coordenadores dos cursos de graduação foram orientados pela coordenação geral de graduação a incentivar os alunos dos três primeiros períodos a participar, sob a justificativa de que seria uma oportunidade, gratuita, para melhorar o desempenho acadêmico. Para a organização das atividades oferecidas, nesse primeiro momento, os coordenadores de graduação sugeriram cursos de nivelamento que tinham aderência com as suas respectivas áreas e/ou forneciam conhecimentos básicos comuns aos estudos em nível superior, a saber: Informática Básica, Língua Portuguesa, Matemática, História e Ciências Biológicas. Desse modo, a instituição selecionou coordenadores de área, os quais ficavam responsáveis pelos editais e seleções dos discentes bolsistas (monitores). Em seguida esses coordenadores de área elaboravam, junto com os monitores, os materiais didáticos, e os formavam para lecionar o conteúdo programado. No primeiro semestre de 2009 o Pronidi ofereceu somente cursos de Português e Matemática, devido a dificuldade de manter coordenadores de área e professores supervisores que dessem o suporte adequado aos monitores. Nesse período, a divulgação foi realizada via e-mails, banners e portal acadêmico e o programa atendeu, em média 70 a 80 alunos, no total. A maior dificuldade enfrentada, a exemplo do semestre da implantação do programa, foi manter os alunos até o final do curso, face ao grande índice de desistência. A partir do segundo semestre de 2009 e da avaliação dos resultados das duas primeiras edições, por parte dos estudantes, houve uma demanda por novos cursos 5 aliada ao reconhecimento, pela instituição, da necessidade de rever a imagem do nivelamento como elemento chave do processo. Em diálogo entre a coordenação do Pronidi e a coordenação geral de gradução, juntamente com os dados resultantes das avaliações dos estudantes, reconheceu-se que, no lugar de nivelar, a proposta deveria ser otimizar os conhecimentos. Sendo assim, alguns cursos foram reestruturados e outros foram criados e, em seguida, organizados em duas áreas, a saber: (1) Conhecimento Geral: Informática Aplicada à Educação Superior e Métodos de Estudos Independentes e (2) Conhecimento Específico: Interpretação e Produção Textual, Matemática, Biologia, Química, História Geral e História do Brasil. Nesse período, uma nova estratégia de divulgação e inscrição, além da tradicionalmente realizada no site da instituição e dos banneres expostos nos campi, contribuiu para a difusão da nova imagem do curso: foram disponibilizados stands com computadores nos campi, no horário do intervalo, para que os estudantes pudessem fazer suas inscrições. Nos anos de 2010 e 2011 o Portal Acadêmico, plataforma digital que congrega os conteúdos e atividades acadêmicas dos cursos de graduação, passou a fazer parte do processo de divulgação. Entretanto, o fato dos alunos não o utilizarem com frequência não contribuiu para o aumento da participação efetiva dos alunos. Os coordenatores de cursos de graduação foram, mais uma vez, convidados a participar mais ativamente do processo, indo às salas para divulgar os cursos para os alunos. No período em questão, a proporção de estudantes concluintes no Pronidi passou a ser a seguinte: para cada 10 alunos inscritos, 3 frequentavam o curso e 1 concluia. Uma das estratégias encontradas para diversificar o atendimento foi o oferecimento de cursos de férias dirigidos, especificamente, aos alunos ingressantes. No que se refere aos conteúdos abordados nos cursos, nos anos em questão, destacam-se: matemática, raciocínio lógico, produção textual, história, química e biologia. No ano de 2012, a nova coordenação manteve a estrutura do programa, num primeiro momento, a fim de conhecê-lo e entender suas demandas. Em parceria com a coordenação do curso de Educação Física, com a Coordenação do projeto de extensão 6 “Fluir – UNIABEU – Lubrizol” e o Centro de Apoio Psicopedagógico (CAPSI), o PRONIDI começou a expandir seus horizontes. O CAPSI, através de sua expertise, apresentou à coordenação do Pronidi uma técnica denominada Cloze, elaborada por Taylor em 1953, e que consiste na organização de um texto com cerca de 200 vocábulos, do qual se omite todo quinto vocábulo, substituindo-o por um traço (lacuna), que deverá ser preenchido pelo leitor com a palavra que ele julgar ser a mais adequada para completar o sentido do texto (SANTOS , 1990 aput SANTOS et. al., 2002). Através dessa técnica, o Pronidi vislumbrou outras possibilidades de conscientização dos estudantes acerca de seu próprio desempenho, a partir do reconhecimento do grau de compreensibilidade de textos. Segundo Santos et. al. (2002) a técnica de CLOZE vem sendo utilizada como uma estratégia eficaz para a aprendizagem de destrezas específicas da leitura, idiomas estrangeiros, disciplinas de estudo, escrita e trabalho de recuperação. O princípio central dessa técnica está baseado na teoria gestáltica de “closure”, que envolve o preenchimento de lacunas em padrões subconscientemente (HEATON, 1989 apud SANTOS et. al., 2002). Do ponto de vista prático a técnica se mostra eficaz, tendo em vista a facilidade de elaboração, aplicação e correção, bem como do ponto de vista empírico, em função dos altos índices de correlação positiva de seus resultados com o desempenho acadêmico; isto é, alunos com maiores percentuais no teste apresentam melhores resultados as médias das disciplinas (idem). Bormuth (1968) elaborou parâmetros para analisar o desempenho dos sujeitos na técnica de cloze apresentando três níveis de leitura. O nível de frustração, correspondente ao percentual de acerto de até 44% do total do texto, indica que o leitor conseguiu retirar poucas informações da leitura e, consequentemente, obteve pouco êxito na compreensão. O nível instrucional, que corresponde a um percentual de acertos entre 44% a 57% do texto, mostra que a compreensão da leitura é suficiente, porém indica a necessidade de auxílio adicional externo (do professor, por exemplo). Por fim, o nível independente, que corresponde a um rendimento superior a 57% de acertos no texto, equivale a um nível de autonomia de compreensão do leitor. Tomando esses parâmetros como referência, a coordenação do PRONIDI passou a dividir as responsabilidades de conscientização dos alunos com os 7 coordenadores dos cursos. No início de cada semestre, os alunos do primeiro período de todos os cursos de graduação passaram a realizar a técnica de cloze. Os resultados dessa participação eram analisados pela equipe de monitores e professores orientadores do Pronidi na busca por mapear o desempenho dos alunos. Em seguida, os coordenadores de curso de graduação eram informados sobre os resultados e, de maneira mais focada, buscavam conversar com os estudantes que apresentavam níveis mais expressivos de frustração, convidando-os a se matricularem no PRONIDI. CONSIDERAÇÕES FINAIS Ainda que parcialmente, este estudo trouxe novas informações sobre a viabilidade de utilização da técnica de Cloze, reafirmando sua relevância enquanto instrumento para a avaliação de compreensão em leitura. Nesse sentido, qualificando seu emprego no incremento de pesquisas institucionais que visem, não apenas o seu potencial de diagnóstico, como também, outra dimensão promissora, como técnica de intervenção psicopedagógica, que tem como potencial apontar as lacunas de aprendizagem, com vistas a orientar o planejamento e adotar ações pedagógicas que viabilizem a participação e a autonomia universitária. Tal procedimento representa um processo de relevância social e, sobretudo política, que viabiliza a inclusão de diferentes estudantes no ensino superior. Outro aspecto a ser destacado, refere-se ao processo de reestruturação da cultura institucional, na busca por envolver o aluno no processo de aprimoramento dos próprios conhecimentos, a partir da identificação das suas fragilidades e potencialidades. As atividades de extensão, conforme dito anteriormente, são espaços profícuos para o desenvolvimento de reflexões e ações que incidem sobre o sucesso acadêmico dos estudantes, no sentido de conscientizá-los sobre a importância de valorizar e aprimorar o que se sabe e investir no preenchimento das lacunas existentes no âmbito do conhecimento acadêmico. 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALMEIDA, L. S., GUISANDE, M. A., SOARES, A. P., SAAVEDRA, L. Acesso e Sucesso no Ensino Superior em Portugal: Questões de Género, Origem Sócio- Cultural e Percurso Académico dos Alunos. Psicologia: Reflexão e Crítica, 19 (3), pp. 507-514, 2006. BORMUTH, R. J. Cloze test readability: Criterion reference scores. Journal of Educational Measurement, 5, 1968, p. 189-196. SANTOS, A. A. A. et al. O Teste Cloze na Avaliação da Compreensão em leitura. Psicologia: Reflexão e Crítica, v.15, n. 3, p.549-557, 2002. SILVA, Kátia Regina Xavier da & SILVA, Ana Patrícia da. 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