V Encontro Nacional da Anppas
4 a 7 de outubro de 2010
Florianópolis – SC – Brasil
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Consumo e Meio Ambiente: Como a Educação
Ambiental Brasileira Aborda Essa Relação?1
Fátima Portilho (CPDA/UFRRJ)
Professora Adjunta do CPDA; Membro do Grupo de Estudos do Consumo; [email protected]
Camila Batista Marins Carneiro (CPDA/UFRRJ)
Mestranda do CPDA; Membro do Grupo de Estudos do Consumo; [email protected]
Flávia Luzia Oliveira da Cunha Galindo (CPDA/UFRRJ)
Doutoranda do CPDA; Membro do Grupo de Estudos do Consumo; [email protected]
Resumo
Um processo de ambientalização e politização do consumo que enfatiza estratégias de
enfrentamento da crise ambiental na esfera do consumo parece estar em curso na sociedade
brasileira. Ambíguo e multifacetado, tal processo tem sido alvo de debates em diversos setores
sociais e áreas de investigação acadêmica, o que nos motivou a analisar se e como a educação
ambiental brasileira aborda a relação entre meio ambiente e consumo. Utilizando o referencial
teórico da Antropologia e da Sociologia do Consumo, construímos, para tanto, três hipóteses: (1) a
educação ambiental não considera a centralidade dos padrões e níveis de consumo para a crise
ambiental e, portanto, o tema não é enfatizado nos debates da área; (2) a educação ambiental
enfatiza a crítica ambiental ao consumo, vê o consumidor como culpado ou vítima, não tendo
nenhuma agência política e, portanto, questiona as propostas de consumo sustentável; (3) a
educação ambiental enfatiza a crítica ambiental ao consumo e considera as ações do consumidor
como uma solução para a crise socioambiental, defendendo, portanto, as estratégias de
consumo sustentável. Para responder a esta questão, desenvolvemos uma pesquisa que, em sua
primeira etapa, analisou o conteúdo dos trabalhos apresentados sob a forma de pôster no VI
Fórum Brasileiro de Educação Ambiental, promovido pela Rebea e realizado em 2009, na cidade
do Rio de Janeiro/RJ. Os resultados encontrados, ainda que parciais, nos permitem concluir que o
tema é marginal dentro dos debates da educação ambiental brasileira, fornecendo indícios que
apontam para a primeira hipótese e, em menor escala, para a terceira.
Palavras-chave: Consumo; Educação ambiental; Ambientalização do consumo
1
Trabalho apresentado no GT 13 (Consumo e Meio Ambiente), do V Enanppas, coordenado por Fátima Portilho (CPDA/UFRRJ) e Zina
Cárceres (UESC).
Introdução
Um processo de ambientalização e politização do consumo2 parece estar em curso na sociedade
brasileira, embora em grau bastante diferente do que vem ocorrendo em outros países3. Trata-se
de uma tendência à reaproximação de valores cívicos e ambientais com a cultura de consumo,
apontada por diversos autores4 que chamam a atenção para o fato de que os anos recentes têm
visto uma redução das fronteiras entre as categorias consumo e cidadania, simbolizada pela
construção do vocábulo consumidor-cidadão.
Trentmann (2007) aponta o fato de que, até a uma geração atrás, tais categorias eram localizadas
em esferas opostas e competitivas entre si (esfera privada e esfera pública) e, portanto, debatidas
em corredores diferentes das universidades, com tradições às vezes rivais de pesquisa.
Atualmente, no entanto, estas têm sido cada vez mais reconhecidas como categorias porosas,
com sobreposição de domínios. Tudo isso nos leva à necessidade de fomentar o diálogo,
considerar as tensões e realinhar os estudos do consumo, os estudos ambientais e os estudos de
cidadania e participação política, inclusive no que se refere à participação nas questões
ambientais.
Tal processo de ambientalização e politização do consumo pode ser observado em propostas,
estratégias e discursos que enfatizam a centralidade dos padrões e níveis de consumo para a
crise ambiental e propõem, como forma de enfrentamento, práticas como consumo verde,
responsável, consciente, ético ou sustentável5.
No Brasil, alguns indícios desse processo podem ser observados em fatos como: (1) a criação de
ONGs voltadas especificamente para esta temática, como o Instituto Faces do Brasil, o Instituto
Kairós, o Instituo Akatu para o Consumo Consciente e o Instituto para o Consumo Educativo
Sustentável do Pará (ICONES), entre outros; (2) a freqüente publicação de reportagens sobre
consumo “sustentável”, “responsável” ou “consciente” em diversos veículos de comunicação de
massa; (3) a elaboração de programas de “Educação para o Consumo Consciente”, tanto na
esfera governamental, quanto na não-governamental e empresarial; (4) a profusão de sistemas de
certificação e rotulagem e, ainda, (5) o fortalecimento dos chamados novos movimentos sociais
econômicos (economia solidária, agricultura orgânica, comércio justo e slow food, entre outros),
que pressupõem a existência e a ação de “consumidores conscientes”.
Ambíguo e multifacetado, tal processo levanta uma nova gama de questões que exigem reflexões
teóricas e investigações empíricas. Tais questões vêm sendo debatidas em diferentes setores
2
Portilho, 2005.
Uma pesquisa quantitativa sobre consumo político, de autoria de Lívia Barbosa, Fátima Portilho e John Wilkinson, ainda não
publicada, aponta a baixíssima frequência de ações de consumo político entre jovens brasileiros, em comparação com pesquisa similar
desenvolvida por Stolle et al (2005) na Suécia, Bélgica e Canadá.
4
Canclini, 1996; Halkier, 1999 ; Paavola, 2001; Portilho, 2005; Trentmann, 2007; Stolle et al, 2005.
5
Não há possibilidade, neste paper, de refletir sobre as possíveis diferenças entre estas propostas, aparentemente similares (Portilho,
2005). Optamos, pois, por usar a expressão “consumo sustentável”, considerando que, ao usá-la, estamos nos referindo,
genericamente, às propostas de práticas de consumo que considerem o impacto social e ambiental dos produtos e serviços escolhidos
e das formas de usá-los.
3
2
acadêmicos que passaram a tratá-la como objeto de pesquisa No entanto, tais pesquisas
costumam se concentrar na literatura e nas reflexões de suas fronteiras disciplinares, raramente
lançando mão do conhecimento produzido dentro dos Estudos do Consumo, abordagem que
defendemos aqui.
Uma das primeiras questões de debate nos parece ser o fato de que esta ênfase nos padrões e
níveis de consumo para a crise ambiental e sua solução não é consensual. Assim, embora
possamos apresentar acima alguns indícios desse processo, não podemos desconsiderar a
existência de um questionamento sobre a centralidade do consumo para a crise ambiental e sobre
os limites e possibilidades da agência política de consumidores individuais (Portilho, 2005).
Ao imaginar que na área de educação ambiental, considerada tanto um campo de reflexões e
práticas educativas quanto um campo de investigação acadêmica, isso não seria diferente, nos
propomos a analisar se e como a educação ambiental brasileira aborda esta relação, como
percebe as sociedades e culturas de consumo e, ainda, o papel do consumidor como ator no
processo de melhorias sociais e ambientais.
Questões como essas ainda carecem de reflexões teóricas e estudos empíricos que nos ajudem a
compreendê-las de forma a ir além das visões de senso comum sobre o consumo, de reduzida
utilidade para a compreensão da questão. Tal debate, muitas vezes, é objeto de posições
apaixonadas, baseadas mais nas ideologias e valores de seus defensores e críticos, do que numa
compreensão do fenômeno (Barbosa & Campbell, 2006).
Em uma primeira observação de caráter exploratório, levantamos a hipótese de que a educação
ambiental aborda esta relação, principalmente, de três formas.
A primeira não considera a centralidade dos padrões e níveis de consumo para a crise ambiental,
uma vez que os problemas seriam causados na esfera produtiva e a influência do consumo seria
apenas marginal. Nessa visão, o tema não é enfatizado, pois esta seria uma forma de desviar a
atenção dos problemas realmente importantes, que ocorrem na esfera produtiva.
A segunda abordagem retoma uma antiga crítica moral e social ao consumo, incluindo agora a
critica ambiental, para mostrar que os valores e hábitos “consumistas”, promovidos pela cultura de
consumo, são o principal responsável pela crise socioambiental e pelas atuais condições de
anomia, individualismo e despolitização das sociedades contemporâneas. Nessa visão, o
consumidor é visto ora como culpado, ora como vítima passiva e manipulada pelo sistema
capitalista, não tendo nenhuma agência política. Tal abordagem questiona as propostas de
consumo sustentável.
A terceira abordagem também retoma a crítica moral, social e ambiental ao consumo, mas as
possibilidades de mudança dos padrões e níveis de consumo são tratadas como uma solução
para a crise socioambiental. O consumidor é elevado à categoria de cidadão e de principal ator
para a superação da crise ambiental tendo, portanto, agência política capaz de transformar a
3
sociedade em direção a um modelo mais sustentável. Esta abordagem enfatiza discursos e
práticas de consumo sustentável.
Para responder a essa questão, com base em dados empíricos, poderíamos optar por diferentes
caminhos metodológicos. Inicialmente, pensamos em selecionar e analisar o conteúdo das
reportagens e matérias publicadas nas principais revistas utilizadas pelos educadores ambientais
em seu processo de busca de informação e atualização, verificando se e como tais revistas
abordavam a temática. Concluímos, no entanto, que embora essa opção possa trazer bons
indícios, dificilmente conseguiria captar a percepção dos próprios educadores ambientais, pois, ao
contrário, nos forneceria a percepção dos “formadores de opinião”, ou seja, jornalistas, editores e
personalidades entrevistadas nas matérias e reportagens.
Abandonamos a idéia inicial e decidimos amadurecer melhor a questão a partir das nossas
leituras e das reflexões sobre a experiência de cada pesquisador da equipe na área de educação
ambiental. Foi quando uma das autoras desta pesquisa6 relatou sua experiência como participante
do VI Fórum de Educação Ambiental, promovido pela Rebea (Rede Brasileira da Educação
Ambiental) e realizado na cidade do Rio de Janeiro/RJ, em julho de 2009. Durante o evento, além
de assistir às conferências e mesas redondas e participar de três mini-cursos, dois deles sobre
consumo7, observou a enorme quantidade de pôsteres enfocando diferentes assuntos, todos
certamente relevantes nos debates da área de educação ambiental.
Considerando a importância da Rebea como fórum privilegiado de debates e atualização dos
educadores ambientais, optamos por analisar o conteúdo dos pôsteres apresentados no evento,
acreditando que essa estratégia nos permitiria captar alguns indícios da percepção dos
educadores ambientais sobre a relação entre meio ambiente e consumo. A inscrição de pôsteres
para apresentação no VI Fórum, conforme detalharemos adiante, era aberta a educadores
ambientais de diferentes níveis de formação e experiência e de diferentes lugares institucionais,
abordando uma enorme variedade de temas divididos em 14 Eixos Temáticos, com os quais os
pôsteres deveriam estar alinhados.
Tal opção também encontrou limitações que, no entanto, não nos impediram de levar a proposta
adiante: importantes informações que poderiam nos ajudar em uma compreensão mais apurada
sobre a percepção dos educadores não estavam disponíveis no site do evento. Tal dificuldade de
acesso aos dados relativos aos trabalhos apresentados em eventos acadêmicos, no entanto, não
é característica do VI Fórum, mas, ao contrário, tem se mostrado uma constante em eventos
acadêmicos que, em diversos casos, não primam pela preservação da memória dos debates8.
Isso nos impossibilitou a análise, pelo menos nesse estágio da pesquisa, da correlação entre os
6
Camila Batista Marins Carneiro.
Mini-curso 1 (Consumo crítico - a práxis emancipatória da educaçãoambiental), coordenado por Thomas Enlazador, e Mini-curso 2
(Sociedade moderna, consumo e meio ambiente), coordenado por Maria Cristina Pereira Bernardo, Caroline Montezi, Valéria Lempé e
Flavia Barros.
8
Dificuldade semelhante foi encontrada pelas autoras no levantamento de dados para a pesquisa “Estudos do consumo no Brasil: A
construção de um novo campo nas Ciências Sociais brasileiras”, ainda não publicada.
7
4
temas e abordagens dos pôsteres com informações soiciodemográficas de seus autores: gênero;
nível de formação (graduação, pós-graduação); área de formação (ciências naturais, ciências
humanas, ciências sociais aplicadas etc.); região geográfica; área de atuação profissional (ensino,
gestão, planejamento, treinamento, pesquisa, avaliação, divulgação etc.) e setor institucional no
qual atua (escola, ONG, governo, empresa, universidade etc.).
De posse da relação dos pôsteres apresentados no VI Fórum de Educação Ambiental, disponível
no website da Rebea9, demos início aos seguintes procedimentos de pesquisa, desenvolvidos
com base na metodologia proposta por Bardin (1977): (a) selecionamos aqueles que continham o
radical “consum” no título, resumo ou palavra-chave10; (b) categorizamos e sistematizamos os
dados obtidos; (c) analisamos o conteúdo dos resumos dos pôsteres. Após esses procedimentos,
(d) concluímos esta etapa da pesquisa com a extração de significados relacionados ao tema
proposto.
Os Estudos do Consumo e suas possíveis contribuições para a
compreensão da relação entre meio ambiente e consumo
A relação entre meio ambiente e consumo vem sendo debatida e pesquisada em diferentes
setores acadêmicos que, no entanto, nem sempre buscam fundamentação teórica e empírica nos
Estudos do Consumo.
O que designamos por Estudos do Consumo refere-se a um campo de investigação acadêmica
relativamente recente e ainda em construção no Brasil, embora já bastante consolidado em outros
países (Miller, 1995 e 2001; Barbosa, 2006), voltado para a reflexão sobre temas como a
constituição das sociedade e culturas de consumo, as novas formas de comercialização, a cultura
material, as práticas de consumo, os usos sociais dos bens, as transformações na cultura de
consumo contemporânea, entre outros.
Campbell (2001:18) lembra que o consumo, apesar de sua “penetrante presença em todo o
mundo moderno” foi desprezado pela Sociologia. Isso pode ser explicado, de um lado, pelo viés
produtivista das Ciências Sociais que, desde o século XIX, baseou-se no pressuposto de que a
compreensão das modernas sociedades capitalistas se daria, exclusivamente, a partir do
complexo institucional necessário à produção de riquezas. Somando-se a este viés produtivista,
um viés de cunho moralista e moralizante das Ciências Sociais também nos ajuda a explicar essa
ausência, pois trabalho e produção sempre foram considerados moralmente superiores ao
consumo, fazendo com que a crítica e o julgamento moral das práticas próprias a esta esfera
acabasse se sobressaindo à sua análise sociológica. Segundo o autor, isso acabou gerando
9
http://forumearebea.org/
Optamos pelo radical “consum” para obter palavras como consumo, consumismo, consumidor etc. A seleção foi feita com base no
uso da ferramenta de filtro em uma planilha Excell contendo os dados de todos os pôsteres apresentados no evento.
10
5
“uma visão do comportamento do consumidor moderno como uma forma de
conduta que é, ao mesmo tempo, ‘irracional e repreensível’. (...) Tal visão é
injustificável, pois, se o comportamento não é apreendido como ‘racional’, então a
culpa cabe aos cientistas sociais, por deixarem de ver a estrutura dos significados
utilizada, e são eles, não os consumidores, que deveriam ser repreendidos
(CAMPBELL, 2001:88).
Em sua análise sócio-histórica sobre a gênese do consumismo moderno, no entanto, Campbell
(2001) mostra que a chamada Revolução Industrial foi, na verdade, tanto uma revolução
dramática das forças produtivas quanto uma revolução igualmente dramática dos hábitos de
procura. Para que isso acontecesse, segundo o autor, duas éticas sociais e opostas coexistiram: a
ética ascética do trabalho e a ética hedonista e romântica do consumo (CAMPBELL, 2001:52).
A partir da década de 80 do século XX, no entanto, o consumo passou a ser visto, pouco a pouco,
como um fenômeno central em todas as sociedades (e não apenas nas sociedades ocidentais
capitalistas).
Assim, o desenvolvimento dos Estudos do Consumo tem apontado para uma agenda de pesquisa
que se propõe a refletir e buscar compreender as mudanças pelas quais a esfera do consumo
vem passando no contexto das grandes transformações globais do fim do século XX e início do
XXI (EDWARD, 2000).
Uma dessas transformações pode ser chamada de politização ambientalização do consumo,
processo que promove uma aproximação entre valores cívicos e a cultura de consumo, entre as
esferas pública e privada, entre consumo e cidadania, diluindo a rigidez de tais fronteiras.
Assim, encontramos, de um lado, uma vertente da Teoria Social Contemporânea que se dedica a
denunciar a degradação social, moral e, agora, ambiental provocada pelos hábitos conspícuos de
consumo, tendo como referência os estudos de Thornstein Veblen11 e dos teóricos da Escola de
Frankfurt12 e a sociedade americana afluente da golden era dos anos 50 e 60, que ficou conhecida
como “a” sociedade de consumo. Para esta vertente, o consumo é visto como algo universalista e
descontextualizado da cultura. Mensurar o quanto estamos perto ou longe de tal modelo, e criticálo, parece ser a principal forma de abordagem (TRENTMANN, 2006).
Outra vertente, ao contrário, enfatiza a crescente reflexividade da esfera privada que transforma o
consumo de um ato concebido como essencialmente privado que sofre restrições étnicas,
religiosas e de classe, entre outras, para outro em que as ações de consumo são vistas como
tendo conseqüências públicas e originando-se da própria esfera pública. Nessa vertente, o
consumidor passa a ser visto como sujeito ativo e as escolhas e decisões individuais passam a
ser vistas como escolhas políticas, em muitos casos informadas por valores e ideologias como
sustentabilidade, saudabilidade, justiça social, ética animal e solidariedade. Esta vertente segue
11
12
Veblen (1987).
Principalmente Theodor Adorno, Max Horkheimer e Herbert Marcuse.
6
as referências do campo teórico dos novos movimentos sociais (NMS) e considera as análises
sobre as mudanças na cultura política contemporânea e os novos repertórios de participação
política13.
A abordagem de Douglas & Isherwood (2006) sobre os usos sociais dos bens pode nos ajudar a
compreender o fenômeno do consumo como sendo essencialmente comunicativo. Os bens
materiais tornam visíveis as categorias da cultura, manifestando concretamente valores, práticas e
rituais sociais. Para os autores, mais do que uma objetitificação desinteressada das práticas
culturais, o consumidor individual exerce uma escolha soberana que visa comunicar valores e
posicionamentos no mundo. As escolhas de consumo são, assim, também uma forma de escolha
política, pois expressam a visão de mundo dos atores.
O consumo, para essa vertente, vai além da aquisição, compra e posse de bens materiais, pois os
objetos intermedeiam relações sociais e expressam individualidades, pertencimento ou
distanciamento de determinado grupo social, podendo, assim, construir pontes ou muros,
afastando ou aproximando as pessoas. O campo do consumo é, neste sentido, relacional,
constituindo uma atividade cotidiana e rotineira de produção de significados e identidades.
Assume, neste contexto, um papel importante como mecanismo de produção e reprodução social.
Longe de defender ou condenar, a priori, as propostas de consumo sustentável, acreditamos que
a principal tarefa acadêmica que se apresenta é analisar o surgimento do fenômeno do consumo
sustentável e como o mesmo tem sido interpretado e reinterpretado, transformando-se em debate
e disputas.
A Rebea e o VI Fórum de Educação Ambiental
O surgimento da Rebea (Rede Brasileira da Educação Ambiental) e dos Fóruns de Educação
Ambiental estão intimamente relacionados:
“Nascida da vontade de manter viva a articulação nacional dos educadores
ambientais brasileiros, a REBEA teve origem no ambiente dos Fóruns de Educação
Ambiental promovidos em São Paulo nos anos 1990. A idéia de sua criação foi
lançada em 1992, durante o II Fórum, na efervescência que antecedia a Rio-92,
adotando-se como carta de princípios o ‘Tratado de Educação Ambiental para
Sociedades Sustentáveis e Responsabilidade Global’ e como padrão organizacional
a estrutura horizontal em rede.” (REVBEA, 2004, pág.4)
Os três primeiros fóruns foram realizados em São Paulo, nos anos de 1989, 1992 e 1994,
respectivamente. No entanto, a vontade de alcançar um âmbito nacional fez com que o IV fórum
fosse realizado na cidade de Guarapari/ES, em 1997, em conjunto com o I Encontro da Rede
13
Stolle et ali (2005); Portilho & Castañeda (2009).
7
Brasileira de Educação Ambiental. Este momento é considerado marcante para a consolidação da
Rebea que, a partir daí, assume a organização do V Fórum, realizado em 2004, em Goiânia/GO.
A Rebea constitui uma rede de redes de educação ambiental e educadores ambientais do Brasil,
reunindo mais de quarenta redes estaduais, municipais, regionais e temáticas.14
O VI Fórum Brasileiro de Educação Ambiental, realizado no Campus da Praia Vermelha da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na cidade do Rio de Janeiro/RJ, em julho de
2009, foi um evento de âmbito nacional, promovido e organizado pela Rebea, contando com um
público de cerca de três mil pessoas de todo o país15.
.A programação do fórum foi construída coletivamente pelos membros da Rebea em parceria com
outras redes e coletivos de educação ambiental brasileiros. A proposta principal do fórum era
promover um diálogo entre os educadores ambientais e entre estes e as demais redes ambientais,
tais como: Rede Brasileira de Agendas 21 Locais, Rede da Juventude pelo Meio Ambiente, Rede
de Justiça Ambiental, Rede Ecossocialista, Rede Brasileira de Informação Ambiental (REBIA),
Rede de Educomunicação Ambiental (REBECA), Fórum Brasileiro de Ongs e Movimentos Sociais
(ABONG) e Assembléia Permanente de Entidades em Defesa do Meio Ambiente (APEDEMA-RJ),
entre outras. O objetivo deste encontro era, portanto, o de promover “mais que um espaço de
divulgação de informação, mas um espaço interativo, de discussões, trocas e permanente
construção em prol da qualidade da educação ambiental brasileira”.16
Segundo informações do website do IV Fórum, o processo de construção do mesmo, de caráter
aberto e coletivo, possibilitou a reunião de inúmeras temáticas relacionadas com o meio ambiente,
tais como: governança mundial e justiça ambiental; juventude e EA; a importância da EA no
enfrentamento da mudança climática; EA no ensino formal, EA na gestão ambiental; EA, política e
territorialidade. Além disso, o evento contou com oficinas artísticas que visavam abordar a
temática ambiental de forma lúcida e interativa.
Tais temáticas perpassaram as discussões e foram debatidas, ao longo de quatro dias, nas
diferentes atividades: 10 Mesas Redondas, 20 Jornadas Temáticas, 100 Mini-Cursos e 524
Pôsteres.
Em relação às normas de envio dos pôsteres, o principal critério era a elaboração de um resumo
(até 500 palavras) enfocando uma relação direta com a educação ambiental. Foram propostos 14
Eixos Temáticos – nenhum deles abordando, explicitamente, a temática do consumo – com os
quais os pôsteres deveriam estar alinhados: educação ambiental e os marcos históricos;
educação ambiental e políticas públicas; educação ambiental em cenários globais; educação
ambiental e mudanças ambientais; educação ambiental no contexto escolar; educação ambiental
e formação; educação ambiental e movimentos sociais; educação ambiental e redes sociais;
14
15
16
http://www.rebea.org.br/arquivorebea/
De acordo com informações obtidas no website do VI Fórum: www.forumearebea.org/
De acordo com informações obtidas no website do VI Fórum: www.forumearebea.org/
8
educação ambiental e justiça ambiental; educação ambiental e diversidade; educação Ambiental e
movimentos de juventude; educação ambiental, territorialidade e identidade; educação ambiental,
arte e literatura; educação ambiental, espiritualidade e mitologia; educação ambiental e empresas;
educação ambiental e turismo; educação ambiental e unidades de conservação; educação
ambiental, manejo e gestão ambiental; educação ambiental, ciências e tecnologia; educação
ambiental e novas temáticas.
Não havia qualquer restrição quanto ao nível de formação do proponente. A avaliação para o
aceite dos pôsteres estava a cargo da Comissão Temática, composta por sessenta educadores
ambientais de todo o país.
Resultados
Com o objetivo de selecionar os pôsteres que abordavam a temática consumo, aplicamos um filtro
na planilha de dados dos pôsteres apresentados no VI Fórum, selecionando aqueles que
continham o radical “consum” no título, no resumo ou nas palavras-chave, conforme explicado
anteriormente.
Dos 524 pôsteres apresentados, apenas 13 (2,48%) abordavam o tema consumo, em suas
diversas variáveis e/ou conjugações. A baixíssima frequência da abordagem do tema consumo
pelos pôsteres apresentados no mais importante evento da área de educação ambiental já nos
permite apontar indícios que confirmam nossa primeira hipótese, ou seja, os debates da área de
educação ambiental parecem não considerar a centralidade dos padrões e níveis de consumo
para a crise ambiental e, talvez por isso, o tema não seja enfatizado.
Vale observar em quais Eixos Temáticos, classificação original do próprio evento, foram
apresentados os 13 trabalhos sobre consumo:
Tabela 1 – Quantidade de artigos por Eixo Temático
Eixos temáticos
(classificação original do evento)
Educação ambiental e empresas
Educação ambiental no contexto escolar
Educação Ambiental e Novas temáticas
Educação ambiental, arte e literatura
Educação Ambiental e turismo
Educação ambiental e redes sociais
Educação ambiental e políticas públicas
Educação Ambiental, manejo e gestão ambiental
Educação ambiental e movimentos sociais
Quantidade
de pôsteres
03
02
02
01
01
01
01
01
01
A Tabela 1 mostra que a maioria dos poucos trabalhos sobre consumo foram originalmente
classificados nos eixos temáticos “Empresas”, “Contexto escolar” e “Novas temáticas”.
9
Apresentamos na Tabela 2 a relação dos 13 pôsteres que abordaram o tema consumo. Tal
planilha serviu de base para nossa análise, representando o universo dos pôsteres que
abordavam a relação entre meio ambiente e consumo:
Tabela 2 – Pôsteres que contém o radical “consum” no titulo, resumo ou palavra-chave
Número
do Pôster
Pôster 25
Pôster 36
Pôster 39
Pôster 70
Pôster 82
Pôster 116
Pôster 143
Pôster 247
Pôster 298
Pôster 322
Pôster 479
Pôster 489
Pôster 497
Título do Pôster
Trabalho integrado dos empregados - Cesp: sensibilização, sustentabilidade e
responsabilidade social
Educação ambiental para o consumo consciente
Guias de ecoturismo: educação ambiental como possibilidade de trabalho
Coleção consumo sustentável e ação
Educação Ambiental na Alumar para o alcance da sustentabilidade ambiental e
perenização do negócio
Lixo e cidadania: a arte através da reutilização
Rede ecológica: uma experiência de reeducação
Educação Ambiental no monitoramento da qualidade de água nos campi da UFRN
Lixo na televisão: quem fala e o que fala sobre ele
Práticas cotidianas de consumo sustentável, uma utopia possível?
Responsabilidade sócio-ambiental um caminho para as empresas e para a floresta
Atlântica
Educação ambiental para o consumo consciente no âmbito da administração
pública
Educação ambiental para o consumo responsável: sacolas retornáveis
Continuando a análise dos dados levantados, a Tabela 3 mostra quais as palavras ou expressões
com o radical “consum” foram encontradas, em que frequência e em qual dos campos
pesquisados (título, resumo ou palavra-chave).
Tabela 3 – Palavras ou expressões que indicam a abordagem do tema consumo
Termo
Ocorrências
"consumo"
“consumo sustentável”
“consumo consciente”
"consumismo"
“consumo responsável”
"consumidor"
"lixo pós-consumo"
"sociedade do consumo"
"cultura de consumo"
Total
Título
0
2
2
0
1
0
0
0
0
05
Palavraschave
2
3
2
1
2
0
1
0
1
12
Resumo TOTAL
7
5
1
6
4
0
4
3
3
0
2
2
1
0
1
1
0
1
12
-
Através desta tabela, podemos observar que, dentre os 13 trabalhos que abordaram o tema, 05 o
indicam já no título. Em todos estes 05 casos, o termo vem qualificado como “consumo
consciente”, “consumo sustentável” e “consumo responsável”. No caso do resumo, 12 trabalhos
citam o tema, o que será discutido adiante. Finalmente, 12 trabalhos incluíram o radical “consum”
10
em uma das três palavras-chave. Destes, 07 usam termos como “consciente”, “responsável” e
“sustentável” para adjetivar o consumo, parecendo indicar que tratam do debate em torno das
propostas de mudança dos padrões e níveis de consumo.
Consideramos que as palavras-chave de um trabalho são de suma importância, pois indicam a
categorização temática do mesmo a partir do ponto de vista do próprio autor. Assim, decidimos
observar, também, as demais palavras-chave dos 13 pôsteres selecionados, o que pode ser
verificado na Tabela 4.
Tabela 4 – Outras palavras-chave
Outras palavras-chave
(além daquelas com radical “consum”)
educação ambiental
economia solidária
Responsabilidade ambiental
Guias de ecoturismo
Gestão ambiental
Educomunicação Socioambiental
Sensibilização
Comunicação
Ecoturismo
Sustentabilidade
Lixo
Recursos hídricos
Reposição florestal
Reciclagem
Sacolas retornáveis
Coleta seletiva
Educação
Sociedades Sustentáveis
Compras coletivas
Resíduos Sólidos
Alimentos saudáveis
Atitudes
Mudanças
Qtde
4
2
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
1
A tabela acima nos mostra os temas que aparecem combinados com o tema consumo nos
trabalhos apresentados sob a forma de pôster no VI Fórum de Educação Ambiental e que
abordaram a relação entre consumo e meio ambiente. Nos chamou a atenção o uso de termos
como lixo, reciclagem, sacolas retornáveis, resíduos sólidos e coleta seletiva, o que parece
apontar uma possível recorrência da tendência de associar, dentro da educação ambiental, a
temática do consumo com questões relacionadas aos resíduos sólidos. Já termos como atitudes,
mudanças, sensibilização, educação e educomunicação nos pareceu apontar uma associação da
temática do consumo com o debate sobre as possibilidades de conscientização e mudanças de
comportamento dos consumidores como uma solução para a crise socioambiental, embora não
11
seja possível inferir a forma de abordagem deste debate. Finalmente, termos como economia
solidária e compras coletivas pode indicar uma associação do nosso tema com o debate sobre a
construção de alternativas à economia e aos mercados convencionais.
Contudo, os campos “título” e “palavras-chave” dos pôsteres não se mostraram capazes de gerar
informação suficiente para captar a forma de abordagem do tema consumo por parte dos autores
dos pôsteres.
Assim, partimos para a análise do conteúdo dos resumos, através da categorização dos mesmos,
seguindo a metodologia de Análise de Conteúdo proposta por autores como Bardin (1977) e
Freitas & Janissek (2000). Após uma primeira análise exploratória, chegamos às categorias que
emergiram dos próprios resumos dos pôsteres. Categorias são consideradas “rubricas
significativas em função das quais o conteúdo será classificado e eventualmente quantificado”
(Weber, 1990:56-57) e contribuíram para elaborar a grade de análise do conteúdo.
Da análise do conteúdo dos resumos emergiram duas categorias que se mostraram recorrentes,
claras e pertinentes: “Iniciativas empresariais em foco” e “O consumidor em foco”. Cada uma
dessas categorias gerou sub-categorias, colocadas ao lado do eixo temático (classificação original
do evento) na tabela abaixo. A declaração temática, inserida em outra coluna, se refere a um
extrato do resumo do qual cada categoria emergiu e contribui para compreender a categorização:
Tabela 5 – Categoria 1: Iniciativas Empresariais em foco
Subcategoria
Eixo
temático
(classificação
Declaração temática
original do
evento)
Empresas
"35% diz que cuidar (do meio ambiente)
melhora a imagem da empresa perante seus
consumidores (...)".
Manejo e
Gestão
Consumidor Ambiental
como ponta
final
Educação
ambiental e
empresas
"Com o intuito de monitorar os parâmetros
indicadores de qualidade dessa água e,
assim, informar e conscientizar a
comunidade universitária a partir da
disseminação das informações obtidas, o
Programa de Controle de Qualidade da Água
da UFRN (Proágua) consiste em um
conjunto de atividades de coleta e análise
de variáveis físico-químicas (pH,
condutância, nitrato) e microbiológicas
(coliformes totais e coliformes fecais)”.
“(...) as empresas têm que rever e adotar
novos processos de produção, investir na
pesquisa e no uso de produtos menos
agressivos ao meio ambiente (as chamadas
tecnologias limpas), reciclagem de resíduos,
sensibilização ambiental de funcionários,
Título e número do
Pôster
Trabalho integrado dos
empregados - cesp:
sensibilização,
sustentabilidade e
responsabilidade
social (Pôster 25)
Educação Ambiental
no monitoramento da
qualidade de água nos
campi da UFRN
(Pôster 247)
Educação Ambiental
na ALUMAR para o
alcance da
sustentabilidade
ambiental e
perenização do
12
Formatado: Cor da fonte:
Vermelho
fornecedores, parceiros, acionistas,
comunidade e consumidores”.
"Este artigo apresenta uma alternativa bem
sucedida de reposição florestal realizada por
pequenos e médios consumidores de
matéria prima florestal (lenha, tora e
carvão) que contribuem diretamente com a
conservação da Mata Atlântica. (...) Assim em
1990 foram criadas algumas Associações de
reposição florestal (...) que tem como
finalidade repor o consumo de matéria
prima florestal de pequenos e médios
empresários, atuando junto à
responsabilidade socioambiental dessas
empresas e possibilitando sua
sustentabilidade".
"(...) as mudanças de comportamento da
sociedade, principalmente no que diz respeito
a práticas de consumo sustentáveis,
visando à conservação do meio ambiente
bem como os benefícios, principalmente
financeiros, que estas práticas podem trazer
para a empresa e para o meio ambiente".
Empresas
Técnica e
Inovação
Consumo
sustentável
como
benefício
para as
empresas
Empresas
negócio (Pôster 82)
Responsabilidade
sócio-ambiental um
caminho para as
empresas e para a
floresta Atlântica
(Pôster 479)
Educação Ambiental
na ALUMAR para o
alcance da
sustentabilidade
ambiental e
perenização do
negócio (Pôster 82)
A análise da Categoria 1 (Iniciativas empresariais em foco) mostra que, dentre os 13 pôsteres
apresentados no VI Fórum que abordaram a temática do consumo, 04 o enfocam a partir da
perspectiva da empresa, o que corrobora com os dados da Tabela 1. Em alguns trabalhos, o
consumidor é simples ponta final de processos de inovação empresarial ou de programas de
conscientização ou disseminação de informações técnicas. Em outro, o termo “consumidor” é
usado para se referir a pequenos e médios empresários, “consumidores” de recursos florestais em
suas atividades produtivas17. Em todos estes casos, o foco está na esfera produtiva e não na
esfera do consumo em si.
Tabela 6 – Categoria 2: O Consumidor em foco
Subcategoria
Necessidade
de rever e
criar novos
hábitos de
consumo
Eixo
temático
Declaração temática
(classificação
original do
evento)
Contexto
"(...) a questão da geração e tratamento dos
resíduos sólidos propondo rever nossos
Escolar
hábitos de consumo.”
Empresas
"(...) as mudanças de comportamento da
sociedade,
principalmente
nocomo
queconsumidoras.
diz
Não há espaço para tratar aqui da abordagem que considera
as instituições
Ver,
trabalho de Douglas & Isherwood (2006). respeito a práticas de consumo
sustentáveis, visando à conservação do
meio ambiente (...)”.
17
Título e número do
Pôster
Coleção consumo
sustentável e ação
(Pôster 70)
Educação Ambiental
na ALUMAR para o
alcance da
sustentabilidade
ambiental e
perenização do
para isso, entre outros, o
13
Redes
Sociais
Políticas
Públicas
Arte e
Literatura
Arte e
Literatura
Movimentos
sociais
Crítica ao
consumismo
Contexto
Escolar
Movimentos
Sociais
Novas
Temáticas
"Frente a esses problemas enfrentados
atualmente há uma necessidade de
mudança de paradigma, levando os
cidadãos a um auto-exame de seu estilo
de vida, com especial ênfase no
consumo. A Rede Ecológica propõe a
reeducação dos cidadãos urbanos (...)"
"É necessária uma mudança urgente de
comportamento, atitudes e ações para
conservação / preservação e a
sustentabilidade no planeta Terra. (...) Com
o objetivo de Promover o consumo
consciente com mudanças de
comportamento e atitudes
ambientalmente corretas no dia-a-dia dos
servidores públicos. (...) Estabelecer meta
de redução de consumo"
"Este projeto apóia-se nos temas que dizem
respeito ao consumo consciente e coleta
seletiva vistos como práticas de
sustentabilidade pela sociedade industrial
e propõe ações de comunicação social
visando atuar e obter resultados".
Por isso, ele precisa ser capaz de
melhorar continuamente seu
entendimento para agir conscientemente
quando se trata de não atirar lixo – dos
produtos que acabou de consumir – ao
acaso.
“(...) difundem a mensagem da
necessidade de mudanças de postura,
de comprometimento com ambiente de
vida planetária”.
"A coleta seletiva e a reciclagem, no entanto
são apenas medidas paliativas. A EA sob a
perspectiva crítica, deve gerar uma reflexão
abrangente a respeito dos valores
culturais da sociedade sobre o consumo,
o consumismo, o industrialismo, o modo
de produção capitalista e os aspectos
políticos e econômicos da questão do lixo".
"A crise socioambiental tende a agravar-se
diante da manutenção do modelo de
produção e consumo, onde os hábitos e
atitudes individuais e coletivas estão
sedimentados na cultura do consumismo
e do desperdício. Esse comportamento está
presente no cotidiano das pessoas, que
continuam comprando sem importar-se com
o possível esgotamento de matérias primas
e recursos naturais (...)".
"O relatório ainda coloca que se nós
continuarmos consumindo no mesmo
ritmo de hoje, em 2030, serão necessários
dois planetas iguais ao nosso para suprir
negócio (Pôster 82)
Coleção consumo
sustentável e ação
(Pôster 70)
Educação Ambiental
para o consumo
consciente no Âmbito
da Administração
pública (Pôster 489)
Educação ambiental
para o consumo
consciente
(Pôster 36)
Educação ambiental
para o consumo
consciente
(Pôster 36)
Educação ambiental
para o consumo
responsável: sacolas
retornáveis
(Pôster 497)
Lixo e cidadania: a
arte através da
reutilização
(Pôster 116)
Educação ambiental
para o consumo
responsável: sacolas
retornáveis
(Pôster 497)
Lixo na televisão:
quem fala e o que
fala sobre ele
(Pôster 298)
14
Sugestões
de atividades
Contexto
Escolar
Movimentos
sociais
Ações
individuais,
resultados
coletivos
Arte e
literatura
Movimentos
sociais
Ações
coletivas
Consumidor
que
desconhece
ou ignora
boas práticas
Papel da
Mídia
toda essa nossa voracidade”.
“Nesta publicação também há sugestões de
atividades educativas que promovem o
consumo sustentável, sendo este dirigido
ao professor".
“Neste contexto, procuraram-se
alternativas técnico-educativas, visando
minimizar a geração de sacolas plásticas
descartáveis oriundas na compra de pães e
derivados nas panificadoras”.
“Na coleta seletiva ensinar que através de
uma ação individual, o resultado vem
para toda a comunidade”.
“São ofertados sacolas, aventais, estojos e
mochilas de ráfia, simples e customizadas,
onde é afixada a frase: ‘Meu jeito de Mudar
o Mundo’”.
Redes
sociais
Arte e
Literatura
Novas
Temáticas
Percepção
do
consumidor
Novas
Temáticas
Dilema e
desafios
Arte e
literatura
Abordagem
normativa e
Arte e
literatura
“Um dos princípios que regem a Rede
Ecológica é o de que a compreensão das
etapas de produção e a participação
coletiva dos consumidores na busca de
soluções para os desafios que cercam o
pequeno produtor, proporcionam um
processo educativo capaz de promover um
novo modelo de produção e consumo para
a sociedade”.
"(...) o descaso e/ou o desconhecimento
do consumidor”.
“Entre o modelo de consumo e a produção
de lixo, temos a atuação das Mídias e das
instituições de Ensino. A mídia ao mesmo
tempo em que incentiva o consumo
através das propagandas e do próprio
modelo de felicidade por ela difundido,
também se responsabiliza por informar,
conscientizar, educar".
"O objeto de análise aqui, é o consumidor.
O objetivo geral do trabalho é analisar a
percepção dos consumidores sobre a
relação entre sustentabilidade e consumo;
tendo como objetivos específicos não
menos importantes identificar
consumidores com práticas
sustentáveis".
“(...) isso amplia a dimensão do dilema e
dos desafios que devem ser enfrentados
por todas as sociedades que se baseiam no
consumo”.
“Por isso, ele precisa ser capaz de
melhorar continuamente seu
Coleção consumo
sustentável e ação
(Pôster 70)
Educação ambiental
para o consumo
responsável: sacolas
retornáveis
(Pôster 497)
Educação ambiental
para o consumo
consciente
(Pôster 36)
Educação ambiental
para o consumo
responsável: sacolas
retornáveis
(Pôster 497)
Rede ecológica: uma
experiência de
reeducação
(Pôster 143)
Educação ambiental
para o consumo
consciente
(Pôster 36)
Lixo na televisão:
quem fala e o que
fala sobre ele
(Pôster 298)
Práticas cotidianas de
consumo
sustentável, uma
utopia possível?
(Pôster 322)
Educação ambiental
para o consumo
consciente
(Pôster 36)
Educação ambiental
para o consumo
15
prescritiva
Relação
entre
consumidor
e produtor
Redes
sociais
entendimento para agir conscientemente
quando se trata de não atirar lixo- dos
produtos que acabou de consumir- ao
acaso”.
“Tal lógica afasta cada vez mais o
consumidor do produtor, acarretando
alienação sobre a cadeia produtiva,
desmobilização política, encarecimento dos
produtos e, muitas vezes, falência dos
pequenos trabalhadores rurais”. “Para
alcançar tal objetivo, a Rede Ecológica
desenvolve as seguintes ações: (...)
agroturismo, aproximando os consumidores
dos produtores e possibilitando o
aprendizado sobre a vida no campo e
agricultura agroecológica”.
consciente
(Pôster 36)
Rede ecológica: uma
experiência de
reeducação
(Pôster 143)
A análise das sub-categorias, apresentadas na tabela acima, mostra que os pôsteres abordaram,
principalmente, questões como a necessidade de rever e criar novos hábitos de consumo (07
pôsteres), a crítica ao “consumismo” (03 pôsteres), sugestões de atividades educativas que
promovem o consumo sustentável (02 Pôsteres) e as ações individuais como forma de gerar
resultados coletivos (02 Pôsteres). Outras temáticas com baixa recorrência também merecem
destaque: ações coletivas, consumidor que desconhece ou ignora boas práticas de consumo
sustentável, o papel da mídia (como incentivadora do consumismo e, ao mesmo tempo,
conscientizadora), a percepção do consumidor sobre a relação entre sustentabilidade e consumo,
dilemas e desafios a serem enfrentados, abordagem normativa e prescritiva e, finalmente, a
relação entre consumidor e produtor.
As sub-categorias mais recorrentes parecem apontar para nossa terceira hipótese, pois, embora
enfatizem a crítica ao consumismo como uma das causas da crise socioambiental, os trabalhos
parecem defender as propostas de consumo sustentável como solução para a melhoria ambiental.
Nos chamou a atenção o fato de que apenas um trabalho se refere a uma pesquisa visando a
“analisar a percepção dos consumidores sobre a relação entre sustentabilidade e consumo” para,
só depois, “analisar possíveis incoerências entre discurso e prática”, “verificar se a escolha dos
consumidores são [sic] para intervir na realidade social e ambiental que os cerca”, “produzir
material ecopedagógico para orientação e difusão do consumo sustentável” e, assim,
“desmistificar o ‘suposto consumo consciente’” (Pôster 322).
16
Conclusões: Educadores ambientais e suas percepções sobre a relação entre meio
ambiente e consumo
Os dados coletados e analisados nesta pesquisa exploratória, ainda em fase inicial, nos levam a
crer que a relação entre meio ambiente e consumo é um tema muito pouco abordado pela
educação ambiental, pelo menos considerando o evento mais importante da área.
A pesquisa nos fornece indícios que apontam para nossa primeira hipótese, ou seja, os debates
da área de educação ambiental parecem não considerar a centralidade dos padrões e níveis de
consumo para a crise ambiental. Talvez esses debates considerem que os problemas ambientais
são causados, principalmente, na esfera produtiva e que a influência do consumo é apenas
marginal, mas isso não foi possível verificar nesta etapa da pesquisa.
Corroborou com tal conclusão o fato de que, dentre os 14 Eixos Temáticos propostos pelos
organizadores e com os quais os pôsteres deveriam estar alinhados, nenhum aborda,
explicitamente, a temática do consumo.
Os poucos trabalhos a abordarem esta questão foram alinhados, pelo evento e por seus autores,
principalmente, ao tema “empresa”. O uso de palavras-chave como “responsabilidade ambiental”
e “gestão ambiental”, associadas ao consumo, mesmo que com baixa frequência, também aponta
a tendência de continuar a pensar o consumo a partir da esfera produtiva, abordagem
crescentemente criticada dentro dos Estudos do Consumo. Da mesma forma, a análise da
Categoria 1 (Iniciativas empresariais em foco) mostrou que, dentre os 13 pôsteres apresentados
no VI Fórum que abordaram a temática do consumo, 04 o enfocam a partir da perspectiva da
empresa, o que reforça esta conclusão. Em alguns trabalhos, o consumidor é simples ponta final
de processos de inovação empresarial ou de programas de conscientização ou disseminação de
informações técnicas. Em outro, o termo consumidor é usado para se referir a pequenos e médios
empresários, “consumidores” de recursos florestais em suas atividades produtivas, dentro da
abordagem do “consumo institucional sustentável”. Tudo isso nos faz refletir se tais trabalhos, de
fato, estão abordando o tema consumo ou, ao contrário, continuam centrando sua análise na
esfera produtiva.
As palavras-chave utilizadas para indexar os resumos, combinadas com aquelas relativas ao
consumo, concentram-se em temas relativos aos resíduos sólidos (lixo, reciclagem, sacolas
retornáveis, resíduos sólidos e coleta seletiva), tema recorrente nos debates sobre a relação entre
meio ambiente e consumo dentro da educação ambiental. Da mesma forma, o uso de termos
como atitudes, mudanças, sensibilização, educação e educomunicação nos pareceu apontar para
o debate sobre as possibilidades de conscientização e mudanças de comportamento dos
consumidores como uma solução para a crise socioambiental, embora não seja possível inferir a
forma de abordagem deste debate.
17
Finalmente, termos como economia solidária e compras coletivas pode indicar uma associação do
nosso tema com o debate sobre a construção de alternativas à economia e aos mercados
convencionais.
No que se refere à análise da Categoria 2 (O Consumidor em foco) e suas sub-categorias,
podemos concluir que os pôsteres enfatizaram, principalmente, a crítica ao “consumismo” e a
necessidade de rever e criar novos hábitos de consumo, o que aponta para nossa terceira
hipótese, ou seja, a educação ambiental enfatiza a crítica ambiental ao consumo e considera as
ações do consumidor como uma possível solução para a crise socioambiental, defendendo,
portanto, as estratégias de consumo sustentável.
A análise nos permite apontar indícios de que a relação entre consumo e meio ambiente é
abordada através mais da crítica social ao consumo, presente no senso comum, do que da
análise do fenômeno. Com isso, os dilemas cotidianos enfrentados pelos sujeitos ambientalizados
ficam invisibilizados e o consumo sustentável é visto ou de forma totalmente negativa ou como
solução mágica. Em ambos os casos, trata-se de uma visão simplista que desconsidera a
complexidade do campo tema.
Finalmente, consideramos que essa pesquisa inicial serviu como um simples ponto de partida
para a confirmação da pertinência e necessidade de se investigar, com maior profundidade, se e
como a educação ambiental aborda a relação entre Consumo e Meio Ambiente, o que,
pretendemos, terá continuidade em pesquisas futuras.
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19
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