UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
CURSO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
JERN´s:
A EDUCAÇÃO E O ESPORTE NAS ESCOLAS PÚBLICAS E
PARTICULARES DA CIDADE DO NATAL/RN
PRISCILA BEZERRA DE MELO
NATAL/RN
2009
PRISCILA BEZERRA DE MELO
JERN´s:
A EDUCAÇÃO E O ESPORTE NAS ESCOLAS PÚBLICAS E
PARTICULARES DA CIDADE DO NATAL/RN
Monografia de Conclusão de Curso
apresentado ao Curso de Ciências
Sociais da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte, como requisito para
obtenção do título de bacharelado em
Ciências Sociais.
Orientador(a): Profª Drª Norma Missae Takeuti
Natal/RN
2009
PRISCILA BEZERRA DE MELO
JERN´s:
A EDUCAÇÃO E O ESPORTE NAS ESCOLAS PÚBLICAS E
PARTICULARES DA CIDADE DO NATAL/RN
Monografia de Conclusão de Curso
apresentado a banca designada pela
Coordenação do Curso de Ciências
Sociais da Universidade Federal do Rio
Grande do Norte.
Natal, ____/____/ 2009.
Banca Examinadora:
_____________________________________________
Profª Drª Norma Missae Takeuti
Orientadora
_____________________________________________
Profª Drª Maria Isabel Brandão de Souza Mendes
2° Examinadora
_____________________________________________
Profª Ms. Julimar da Silva Gonçalves
3° Examinadora
Dedico este trabalho a minha mãe,
Francisca Bezerra de Melo, que esteve
sempre comigo, incentivando a começar,
a prosseguir e concluir este estudo.
AGRADECIMENTOS
Dedico meus sinceros agradecimentos `aqueles que de forma direta ou
indiretamente contribuíram para a conclusão desta monografia e do referido curso. Em
especial aos meus familiares pelo incentivo e apoio durante toda essa caminhada.
Em particular, quero agradecer à Prof. Dr. Norma Missae Takeuti, orientadora
deste trabalho, pelos seus conhecimentos, sua atenção e sua boa vontade.
Aos professores e coordenadores das escolas estudadas pela prestação das
valiosas informações que serviram de estudo para o caminhar desta pesquisa.
Aos funcionários da Coordenadoria de Desporto do Rio Grande do Norte
(CODESP-RN) pela atenção e cordialidade com que me receberam em seus setores.
A todos meus colegas de turma e professores que fizeram parte desse processo
de aprendizagem. A Virgínia, Thiago, Pamela, Jociara e Paulo Ricardo amigos que
compartilharam as horas boas e ruins da vida acadêmica.
A todos aqueles que porventura tenha esquecido e que de alguma forma
estiveram presentes nesta caminhada.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................ 09
2 Conceito de esporte ................................................................................................. 12
3 História dos JERN´s................................................................................................ 15
4 Significado do esporte............................................................................................. 19
4.1 Para escola particular.............................................................................................. 19
4.2 Para escola pública................................................................................................. 23
5 Esporte rendimento X esporte escolar................................................................... 28
6 Considerações finais................................................................................................ 37
7 Referências ............................................................................................................... 40
8 Anexos....................................................................................................................... 42
RESUMO
O universo desta pesquisa é o esporte praticado no âmbito escolar. Para esta
investigação elegemos como campo de estudo duas escolas da cidade do Natal/RN, uma
pertencente à rede pública e a outra à rede particular de ensino. Para escolher tais
escolas, tivemos como base a classificação geral dos Jogos Escolares do Rio Grande do
Norte (JERN´s), no ano de 2008. Nosso objetivo principal é analisar por que tais escolas
têm desempenhos tão distintos nos JERN´s, tendo em vista, que desde a década de
1980, as escolas particulares de Natal-RN estão no topo da classificação final desses
jogos e as escolas públicas na parte inferior. A partir dos relatos de experiência colhidos
em campo, por meio de entrevista semi-aberta e gravada em formato MP3, realizada
com docentes de Educação Física e um gestor dos JERN´s, efetuamos análises do
esporte escolar, procurando descobrir como essas distintas instituições de ensino
trabalham a questão esportiva, como tal trabalho influencia nos resultados finais dos
JERN´s e como se articulam as dimensões esporte e estudo no âmbito do campo
educacional. Constatamos que as escolas não oferecem a iniciação esportiva como
educação física, enquanto disciplina curricular aos alunos, mas como esporte de
rendimento, principalmente nas escolas particulares que investem no treino dos atletas,
devido ao recurso financeiro disponível nessa instituição, o que não ocorre na escola
pública. Tal ensino do esporte com vistas ao rendimento gera a exclusão dos ―piores‖
(atletas das escolas públicas) em favor dos ―melhores‖ (atletas das escolas particulares).
Verificamos também uma desconexão na relação esporte-estudo. Podemos concluir que,
existe nas escolas uma elevada valorização do esporte rendimento em detrimento do
esporte para fins pedagógicos.
Palavras-chave: esporte, escola, esporte rendimento, esporte pedagógico.
ABSTRACT
The universe of this research is the sport practiced in the school ambit. For this
investigation we chose as field of study two schools of the city of Natal/RN, a
belonging to the public net and the other to the net peculiar of teaching. To choose such
schools, we had as base the general classification of the Jogos Escolares do Rio Grande
do Norte (JERN´s), in the year of 2008. Our main objective is to analyze why such
schools they have such different actings in JERN´s, tends in view, that since the decade
of 1980, the schools peculiar of Natal-RN they are at the top of the final classification
of those games and the public schools in the inferior part. Starting from the reports of
experience picked in field, through half-open interview and recorded in format MP3,
accomplished with physical education teachers and a manager of JERN´s, we made
analyses of the school sport, trying to discover as those different teaching institutions
works the sporting subject, as such a work it influences in the results ends of JERN´s
and as they pronounce the dimensions sport and study in the ambit of the educational
field. We verified that the schools don't offer the sporting initiation as physical
education, while it disciplines curricular to the students, but as revenue sport, mainly in
the private schools that invest in the athletes' training, due to the available financial
resource in that institution, what doesn't happen at the public school. Such teaching of
the sport with views to the revenue generates the exclusion of the ―worse‖ (athletes of
the public schools) in favor of the ―better‖ (athletes of the private schools). We also
verified a disconnection in the relationship sport-study. We can conclude that, it exists
at the schools a high valorization of the sport revenue in detriment of the sport for
pedagogic ends.
Key-words: sport, school, sport revenue, pedagogic sport.
9
1-INTRODUÇÃO
Sabe-se que o tema esporte, nas Ciências Sociais, foi por muito tempo
considerado pela ―dignidade científica‖, menor ou insignificante. Porém, esse
comportamento ou preconceito diante do esporte foi frontalmente repudiado por Nobert
Elias (1992) que junto com seu aluno, o sociólogo inglês Eric Dunning (1992), passou a
tratar o esporte como tema sociológico, inaugurando dessa forma a sociologia do
esporte.
Elias e Dunning (1992a, p. 39), declaram que as investigações sociológicas
realizadas acerca do desporto têm como tarefa sanar alguns de seus aspectos que não
eram ainda, ou eram vagamente conhecidos. Percebe-se, nesse ponto, que havia uma
grande necessidade em mostrar o desporto como um fator contributivo para a sociedade,
para que deixasse de ser tratado como um objeto de estudo vulgar.
Nos últimos tempos, estudos envolvendo esporte e sociedade têm sido temas
constantes em pesquisas científicas, muito provavelmente em razão da relevância que o
esporte vem alcançando como um fenômeno gerador de importantes dinâmicas sociais e
por ser um campo de significativas e diversificadas formas de sociabilidade.
Considerado como ―fenômeno sociocultural‖, o esporte incorpora valores sociais,
culturais e econômicos de uma dada sociedade historicamente organizada, sendo
realizado em diferentes espaços sociais, e a escola é um desses espaços de realização e
de apropriação da prática cultural do esporte.
Para muitos, a importância de ter o esporte presente no âmbito educacional
está na afirmativa de que o ―esporte educa‖, uma vez que ele ensina a criança e o jovem
a conviver com a vitória e a derrota, a respeitar as regras do jogo, a vencer através do
esforço individual ou pela cooperação, a competir, além de fixar a idéia de que todos
são iguais e, portanto, todos têm a oportunidade de vencer. Dessa forma, atualmente no
contexto escolar podemos perceber o uso do esporte vinculado à competição, à seleção,
à comparação, à busca da vitória a qualquer custo, despertando nos jovens atletas
valores que levam a excluir, a discriminar, os mais fracos e não à solidariedade, à
cooperação, ao convívio com as diferenças.
Tendo a clareza de tal realidade, na qual o esporte escolar se inscreve na
contemporaneidade, esperamos, a partir desse trabalho, contribuir aos profissionais de
Educação Física nos debates atuais, questionando os aspectos referentes aos
10
significados da prática esportiva no âmbito escolar, de uma nova ação pedagógica do
esporte. Além disso, direcionaremos a discussão para a construção de uma relação
harmoniosa entre a prática esportiva e o aprendizado escolar do aluno (relação entre o
esporte e o estudo).
O interesse em desenvolver esta pesquisa partiu da implicação do próprio
sujeito pesquisador no campo do esporte escolar: uma ex-atleta da rede particular de
ensino, participante de algumas edições dos Jogos Escolares do Rio Grande do Norte
(JERN´s), competição onde vivenciamos alegrias, tristezas e criamos vários vínculos de
amizades. Desde a infância, tivemos uma ligação muito forte com o esporte e não
demorou muito para, que na escola, iniciássemos no mundo das competições esportivas.
Posteriormente, quando ingressamos na Universidade, no curso de Ciências Sociais, já
estava germinado o desejo de fazermos essa ligação entre o esporte e as análises
sociológicas de modo que intentamos o projeto de pesquisa nesse campo que nos é
familiar e caro. A familiaridade com essa competição, fez com que retornássemos a esse
contexto não mais como atleta, mas como pesquisadora, com um olhar mais
distanciado, mais imparcial, porém sem deixar de lado as experiências e as lembranças
de situações que nos deixaram alguns questionamentos.
Sendo os JERN´s uma competição que abarca tanto as escolas da capital
quanto do interior, para a realização dessa pesquisa, o esporte praticado no âmbito
escolar, elegemos como campo de estudo escolas públicas e particulares da cidade do
Natal/RN da educação infantil ao ensino médio. Para efeito de entrevistas com
responsáveis das escolas e docentes, focamos duas escolas: a Escola Estadual Floriano
Cavalcante (FLOCA), pertencente à rede pública e o Complexo Educacional
Contemporâneo pertencente à rede particular de ensino. Escolhemos tais escolas, com
base à classificação1 geral dos Jogos Escolares do Rio Grande do Norte (JERN´s), no
ano de 2008, jogos esses que existem desde 1970, e que se tornou o maior evento
escolar do país.
Nosso objetivo principal é analisar porque que tais escolas têm desempenhos
tão distintos nos JERN´s, tendo em vista, que desde a década de 1980, as escolas
particulares de Natal/RN estão no topo da classificação final desses jogos e as escolas
públicas na parte inferior. A partir desse objetivo geral, delineamos os objetivos
específicos, por meio dos quais nos propomos: a) a descobrir como essas distintas
1
Ver classificação geral dos JERN´s no ano de 2008 em anexo
11
instituições de ensino tratam à questão esportiva; b) como tal tratamento influencia nos
resultados finais dos JERN´s; c) e como se articulam as dimensões esporte e estudo no
âmbito do campo educacional.
As entrevistas foram colhidas através de gravação em formato MP3.
Utilizamos a técnica da entrevista semi-estruturada, de modo que o próprio entrevistado
pudesse privilegiar conteúdos dentro do tema abordado e que o entrevistador pudesse
acrescentar perguntas não estabelecidas previamente. Além disso, tomamos como dados
empíricos, também, o ―material‖ de observação participante da época em que estivemos
implicados nos JERN‘s, enquanto aluna. Um último esclarecimento relativo aos dados
de campo convém deixar, aqui, explicitado: as entrevistas foram direcionadas
unicamente para docentes de Educação Física e um gestor dos JERN‘s, não
contemplando, nesta esta etapa de nosso estudo, uma coleta mais sistematizada do ponto
de vista e da vivência dos próprios alunos engajados em competições esportivas, na
medida em que essa coleta nos demandaria um prazo maior de execução que ultrapassa
o âmbito da defesa da monografia.
No intuito de organizarmos a análise do fenômeno, no recorte definido,
dividimos este trabalho em quatro capítulos. No primeiro, trataremos as considerações
existentes acerca da gênese e evolução do esporte. No segundo capítulo, faremos um
resgate histórico dos Jogos Escolares do Rio Grande do Norte (JERN´s). No terceiro,
apresentaremos os dados colhidos no campo empírico, a fim de descobrir qual o
significado do esporte para as instituições particulares e públicas de ensino e sua relação
com a competição JERN´s. E finalmente, no quarto capítulo, faremos uma reflexão a
respeito da relação escola e esporte, focalizando as implicações do esporte rendimento
no âmbito escolar.
12
2-CONCEITO DE ESPORTE
Tornou-se uma tarefa muito complexa, tanto para estudiosos da Educação
Física quanto das Ciências Sociais, encontrar uma definição precisa para a expressão
esporte. Por se tratar de um fenômeno sociocultural multifacetado, atualmente, existem
vários significados e compreensões do termo.
Para Bourdieu (1983, p. 137), essa imprecisão, quanto à conceituação da
palavra esporte, só pode ser encerrada quando houver a produção de uma história social
do campo do esporte, e assim entender a partir de que momento se pode
verdadeiramente falar de esporte ―em oposição ao simples jogo‖.
Somente ela pode responder a esta questão - que nada tem a ver com uma
questão acadêmica de definição - de saber a partir de que momento (não
se trata de uma data precisa) se pode falar em esporte, isto é, a partir de
quando se constitui um campo de concorrência no interior do qual o
esporte apareceu definido como prática específica, irredutível a um
simples jogo ritual ou ao divertimento festivo.
Como tal precisão de conceito não acontece, o autor utilizando como base o
pensamento de Norbert Elias (op. cit.), se mostra descontente com comparações que
levam os jogos primitivos a serem considerados como práticas pré-esportivas e
esclarece:
Isto leva ao questionamento de todos os estudos que por um anacronismo
essencial, aproximam os jogos das sociedades pré-capitalistas européias
ou não, tratados erroneamente como práticas pré-esportivas, aos esportes
propriamente ditos cuja aparição é contemporânea à constituição de um
campo de produção de ―produtos esportivos‖. Esta comparação só tem
fundamento quando indo exatamente na direção inversa da busca das
―origens‖, tem como objetivo, como em Norbert Elias, apreender a
especificidade da prática propriamente esportiva, ou mais precisamente,
de determinar como alguns exercícios físicos pré-existentes passaram a
receber um significado e uma função radicalmente novos...(p.138)
Nesse caminho, várias são as divergências quanto às origens do que
conhecemos hoje como esporte. Bracht (1997) resume esse debate em duas teses que
ele chamou de continuidade e descontinuidade. A primeira vê o esporte como natureza
essencial, há idéia de que ele sempre existiu em todas as culturas (apenas se atualiza em
diferentes contextos e momentos históricos) já, a segunda vê o esporte como natureza
histórico-social, como um fenômeno datado, surgindo no século XVIII na Inglaterra,
por meio de uma ruptura com as outras atividades físico-competitivas.
13
Os jogos existentes anteriormente à formação dos Estados Modernos, dada à
ausência de controles estáveis e centralizados, eram considerados menos ―civilizados‖
por serem mais sujeitos as práticas de violência. Desses jogos ao esporte moderno teria
ocorrido um processo de ―civilização‖ que, através da criação de regras específicas,
aumentavam a tensão, mas também diminuía a prática da violência nas atividades
físicas.
Para Elias e Dunning (1992b), a teoria do ―processo civilizador‖ trata do
processo de ―cortenização‖ e/ou parlamentarização dos guerreiros medievais, onde a
violência imbricada no cotidiano dos guerreiros dá lugar ao debate e ao refinamento das
atitudes dos cortesãos. Esse era um processo ―cego‖, não planejado, que foi
conseqüência do crescimento da economia e do estabelecimento do Estado. Um
exemplo que explica bem essa passagem é a caça à raposa, um tradicional passatempo
inglês que para atender as exigências do processo civilizatório sofreu mudanças, assim
ao invés de só matar a raposa foram criadas regras para prolongar a atividade e excitar
os participantes.
Já segundo Hobsbawm (1984), o esporte moderno teve surgimento na
Inglaterra, junto com as profundas mudanças ocorridas na conjuntura econômica, social
e política desse país. Para ele esse esporte se insere no que ele chamou de ―tradição
inventada‖, colaborando para a tese da descontinuidade ou da ruptura. Dessa forma, o
desenvolvimento e expansão do esporte aconteceram tendo como pano de fundo o
processo de modernização dos séculos XIX e XX, processo que compreende
industrialização, urbanização, tecnologização dos meios de transporte e comunicação,
aumento do tempo livre, surgimento dos sistemas nacionais de ensino etc.
Nesse contexto, não demora muito a surgir, principalmente, na Inglaterra,
organizações que congregam grupos de clube, as federações, como a de futebol, que
promoviam competições em nível regional e nacional, propiciando o surgimento de
novos esportes, ou seja, ―esportivizam-se‖ uma série de práticas corporais e, logo,
aproveitando-se a possibilidade de explorar comercialmente os eventos esportivos,
fazendo surgir o ―profissionalismo‖.
Bracht
(op.cit.,
p.100)
destaca
que
na
base
da
questão
do
profissionalismo/amadorismo está presente o ―conflito social básico da sociedade
capitalista‖, o conflito capital X trabalho:
14
As classes dominantes (burguesia aristocracia) fizeram da apologia ao
―amadorismo‖ uma estratégia de distinção social; nele, no amadorismo,
estava presente o ethos aristocrático - atividade realizada pelo simples
prazer de realizá-la, sem fins úteis, desinteressada, arte pela arte.
Ou seja, o ideário amadorista, associada à elite burguesa, do esporte como
atividade desinteressada era um ideal que confrontava os interesses dos trabalhadores,
que viam, muitas vezes, no esporte um meio de ascensão social, o profissionalismo.
Assim, o ideário amadorista acabava sendo um instrumento de distinção de classe.
Podemos captar que muitos elementos característicos da sociedade moderna,
no caso capitalista industrial, vão ser incorporados e/ou estão presentes no esporte: o
rendimento e a competição, a cientifização do treinamento, a quantificação, os recordes
a especialização de papéis, entre outros. Dessa forma, Brohm (apud PRONI, 2002, p.39)
acredita que a essência do esporte moderno ―é a ideologia democrática típica de uma
sociedade que precisa cultivar um ideal humanitário (liberdade, igualdade, fraternidade)
e, ao mesmo tempo, velar sua estrutura de classe e seus mecanismos de dominação‖.
Bourdieu (1983, p.141) complementa essa idéia ao associar o esporte moderno a um
ethos ligado a segmentos sociais dominantes em sociedades capitalistas:
[...] sem dúvida não poderíamos esquecer que a definição moderna do
esporte, freqüentemente associada ao nome de Coubertin 2, é parte
integrante de uma ―idéia moral‖, isto é, de um ethos das frações
dominantes da classe dominante realizado através das grandes instituições
de ensino privado, destinado a prioritariamente aos filhos dos dirigentes
da indústria privada [...]. Valorizar a educação contra a instrução, o
caráter ou a vontade contra a inteligência, o esporte contra a cultura, é
afirmar, no interior mesmo do mundo escolar, a existência de uma
hierarquia irredutível à hierarquia propriamente escola (que privilegia o
segundo termo destas oposições)
Vê-se que as competições esportivas, principalmente as praticadas no âmbito
escolar, têm como suporte a ―ideologia da igualdade de oportunidades‖, que tem como
discurso a idéia de que todos os competidores têm a mesma chance de vitória.
Entretanto, há algumas realidades escolares que parecem estar longe desse patamar
ideal. Passaremos, portanto, a partir do capítulo seguinte, a uma análise que busca
verificar como se dá, na prática, o investimento e o processo de preparação, dos
diferentes competidores, alunos pertencentes à rede privada e pública, tendo como foco
de atenção os JERN‘s.
2
Pierre de Coubertin pedagogo francês, presidente do Comitê Olímpico Internacional; fundou os Jogos
Olímpicos da era moderna.
15
3. História dos JERN´s3
Os Jogos Escolares do Rio Grande do Norte (JERN´s) tornaram-se o maior
campeonato estudantil do Brasil, entrando no ano de 2008 na sua 38ª edição. A
competição é uma promoção do Governo do Estado, através da Coordenadoria de
Desporto do Rio Grande do Norte (CODESP-RN) da Secretaria Estadual da Educação e
da Cultura.
Esses jogos tiveram seu início em 1970 denominado ―Jogos Estudantis‖,
inspirados numa competição anterior, os antigos Jogos Ginásio - Colegiais, realizados
nas décadas de 1950 e 1960.
A década de 1970 foi marcada pela disputa de duas escolas da rede pública de
Educação, o Atheneu Norte-Rio-Grandense e a Escola Técnica Federal do Rio Grande
do Norte (ETFRN), hoje Instituto Federal do Rio Grande do Norte (IFRN).
A primeira edição contou com dezoito escolas participantes - Escola
Doméstica, Atheneu Norte-Rio-Grandense, Instituto Padre Miguelinho, ETFRN,
Ginásio Augusto Severo, Colégio 7 de Setembro, Salesiano, Ginásio Reis Magos,
Imaculada, Neves, Auxiliadora, Ginásio São Luiz, Sagrada Família, Ginásio Batista,
Colégio Pré-Universitário, Colégio Municipal João XXIII e Senac.
Eram dois mil atletas que iriam se envolver, naquele ano, em nove
modalidades do dia 2 ao dia 13 de setembro: basquete, vôlei, futebol de salão, natação,
atletismo, tênis de mesa, futebol, xadrez (até aqui, todas "herdadas" dos Jogos GinásioColegiais) e handebol, que foi a novidade na época. Os locais de competição eram nos
ginásios Sylvio Pedroza, Palácio dos Esportes, São Luiz e Escola Doméstica, para as
modalidades de quadra; o América (para a natação); a AABB (para o tênis de mesa); o
Clube de Xadrez de Natal, o 16.o Regimento (hoje Batalhão) de Infantaria (para o
atletismo); e o Estádio Juvenal Lamartine.
Antes das competições realizava-se a abertura, sendo o evento algo inusitado
para a cidade do Natal/RN de 1970. O desfile de abertura - ao som de "A Banda", de
Chico Buarque - começava nas ruas da cidade e o destino final sendo o Estádio Juvenal
Lamartine, com a participação do então Governador do estado, Monsenhor Walfredo
Gurgel; o fogo simbólico sendo carregado por Aurino Fonseca (ETFRN), e o Juramento
3
Informações sobre história dos Jern´s colhidas no site: http://br.geocities.com/rtblau2002/Jerns/hjerns.html.
16
do Atleta foi de Maria Antônia de Melo (CPU). À noite, teve mais solenidade no
Palácio dos Esportes.
Logo depois, essa cerimônia de abertura, com os ritos necessários ao campo
esportivo (o desfile dos atletas, o fogo simbólico, o juramento do atleta, a presença de
autoridades estaduais que legitimam o evento) entrou no calendário da cidade, embora
hoje não esteja mais sendo realizada nas ruas. O evento esportivo integrava-se, de
maneira permanente, ao ritmo social da cidade, através de sua visibilidade. Para
DaMatta (1981, p.56), esses eventos que escapam da rotina na vida diária, teria um forte
caráter aglutinador de pessoas, grupos e categorias sociais, e ―os ritos seriam momentos
especiais construídos pela sociedade. São situações que surgem sob a égide e o controle
do sistema social, sendo por eles programados‖.
A escola campeã geral desse primeiro ano, considerando-se o número de
categorias conquistadas e divulgadas nos jornais, foi a ETFRN, por ter vencido em nove
categorias; o vice-campeonato ficou com a Escola Doméstica oito categorias e
dividindo o terceiro lugar ficaram o Atheneu, o CPU e o e Winston Churchill, com três
categorias cada.
Em uma revista comemorativa dos 35 anos dos JERN´s, lançada no ano de
2005, foram entrevistadas várias personalidades que contribuíram para a consolidação
dessa competição, entre elas Sebastião Cunha, criador desses jogos. Ele declara ter tido
dificuldades quando começou a coordenar os JERN´s, como a falta de recursos
financeiros, de estrutura física de materiais e o ―amadorismo‖, mas a competição foi se
consolidando. ―Além de mirim, infantil e juvenil, tínhamos ainda a categoria adulto,
para quem havia ultrapassado a idade. Eles disputavam e também nos ajudavam‖
(JERN´s, 2005, p. 5).
Segundo Maxwell Albuquerque, que dirigiu a Sub-coordenadoria de Esportes
do estado de 1975 a 1977, foi ―um privilégio coordenar os JERN´s numa época em que
o amor à camisa dos colégios fazia toda a diferença dentro das quadras, campos e pistas;
os competidores tinham de ser super-homens, disputavam várias modalidades, sempre
em honra dos colégios onde estudavam‖ (JERN´s, op.cit).
Apesar de essa competição ter se iniciado em 1970, só na década de 1980 é
que ela passou a ser mais conhecida. Foi nessa década que as vitórias deslocaram-se da
rede pública e o destaque passou a ser o Colégio Marista pertencente à rede particular
de ensino, com a queda do Atheneu e da ETFRN. Para alguns professores de Educação
Física, em entrevista dada a revista comemorativa dos JERN´s, o Atheneu e a ETFRN
17
decaíram bastante quando foram extintas as respectivas oitavas séries primárias,
normalmente usadas como base para as equipes infantis, que se mantinham unidas
durante o Segundo Grau - consequentemente mantinham-se unidas quando passavam a
Juvenis, o que proporcionava um entrosamento maior entre as equipe, convertendo-se
em bons resultados nos JERN´s.
Por sua vez, a atual coordenação dos JERN´s considera que a passagem das
constantes vitórias da rede pública para a rede particular foi motivada pela
especialização das modalidades esportivas nessa época, devido à concorrência e o
número de participantes que aumentavam a cada edição, o que fez com que os atletas
passassem a competir em uma única modalidade e não mais em várias delas. Somandose a isso, há a questão da proliferação de escolas particulares (em 1979 eram setes
escolas participando e em 1986 já eram quase 80 escolas).
Os anos 1980 também presenciaram a importante emergência do esporte
escolar no interior do estado. Em 1986, dos 14 Núcleos Regionais de Educação, os
NURES, nove já estavam envolvidos em competições. A participação nos jogos, porém,
dependia de recursos próprios, devido à falta de apoios financeiros.
Com a criação da Coordenadoria de Desportos da Secretaria Estadual de
Educação, em 1995, os JERN´s ganharam atenção especial. Sob o comando de Jamilson
Martins, até 2002, algumas iniciativas de caráter inovador parecem ter sido promovidas.
A primeira dizia respeito ao número de modalidades, que passou de vinte e uma para
trinta e duas. ―O pensamento era que quanto mais modalidades fossem incluídas, maior
o leque de campo de trabalho para os profissionais de Educação Física e maior a
participação dos estudantes‖, comenta o ex-coordenador (JERN´s 2005, p. 8), citando
que, nesse período, entraram na programação dos jogos o bodyboarding, o beach
handbol, o beach soccer, o futebol society, o mountain bike, a pesca, o pólo aquático, o
squash, o taekowondo e o vôlei de praia, além da maratona cultural. ―Também fizemos
experiências validas com a vaquejada e com o Kart‖, recorda o mesmo.
É nesse período que os JERN´s passaram a ser a maior competição estudantil
do Brasil. As estatísticas apontam que em oito anos as cifras aumentaram
significativamente: em 1994, participaram cento e setenta e quatro escolas e nove mil
atletas e, em 2002, a participação passou para trezentos e quatorze colégios e quinze mil
e quinhentos atletas.
No período de 1995-2002, novos incentivos surgiram nesse campo esportivo
como, por exemplo, a premiação do Atleta-Ouro, até hoje mantida pela CODESP-RN, e
18
a construção da Pousada do Atleta, localizada no CAIC Esportivo de Lagoa Nova. ―O
Atleta-Ouro é uma homenagem aos melhores atletas de cada categoria e que serve de
estimulo para que cresçam no esporte‖, conforme depoimento do ex-coordenador da
CODESP-RN. Quanto à Pousada, a iniciativa partira da necessidade de abrigar as
equipes que se deslocam do interior do estado para disputar os JERN´s na capital.
Sem dúvida, os JERN‘s tiveram uma verdadeira explosão no número de
participantes a partir de 1996. Nesse ano, estiveram inscritos aproximadamente doze mil
alunos-atletas. Em 1997, exatos quinze mil e seiscentos e sessenta e seis atletas; em
dezessete mil e setecentos e dez atletas. Nesse momento, os JERN‘s já despontavam
como o maior evento esportivo estudantil do país, exclusivamente com estudantes; em
1999, o número de participantes passou para vinte e um mil; em 2000, a participação
sendo de vinte mil atletas. Já em 2001, alcançou-se a marca de vinte e cinco mil
participantes, número, aliás, que fora projetado desde 1999.
No ano de 2008, ano em que essa pesquisa tomou a classificação final da
competição como base na análise das escolas, o evento teve um número recorde de
escolas participantes. Na capital do estado foram quatrocentos e dezessete escolas
inscritas, entre elas estaduais, municipais, particulares e federais, com quatorze mil e
quinhentos atletas competindo em trinta e três modalidades esportivas, nas categorias
mirim, infantil e juvenil, no masculino e feminino. Devido o número recorde de
inscrições em todo o estado (nesse ano foram 964 escolas e mais de 33.700 atletas em
todas as etapas) foram criadas fases regionais em dez municípios do estado (João
Câmara, Santa Cruz, Umarizal, Apodi, Pau dos Ferros, Assu, Caicó, Currais Novos,
Nova Cruz, Mossoró e a fase de Natal) de modo a reduzir o número de atletas inscritos
que participariam da etapa final na capital do estado.
Para a atual coordenação dos JERN´s, os jogos têm como finalidade
proporcionar ―uma interação entre os atletas das diferentes escolas, promovendo autosuperação e o senso de cooperação como forma de desenvolvimento integral, usando
como meio a prática esportiva e o conhecimento intelectual‖.
19
4. Significado do esporte para escola
Neste capítulo, mostraremos, a partir dos dados colhidos no campo empírico,
como as escolas tratam a questão esportiva e a posição das mesmas na competição
JERN´s.
4.1. Escola particular
Durante a nossa conversa com o coordenador/professor de esporte do Colégio
Contemporâneo, da rede particular de ensino, acerca dos esportes na escola – conversa
realizada em uma das unidades esportivas da escola, numa sala em que milhares de
troféus são cultuados como verdadeiras relíquias – ouvimos, em todo o momento, a
ênfase que se dava à questão do esporte como uma prática pedagógica, como uma
ferramenta de formação integral do aluno.
Segundo ele, é através do esporte que o aluno vivencia, na prática, a ética e a
disciplina. O rigor seria aplicado na mesma medida, tanto em sala de aula como no
treinamento esportivo: da mesma forma que o aluno é cobrado na sala de aula, ele é
cobrado na sua atividade esportiva, uma vez que o atleta tem que aprender as regras,
cumprir o regulamento das competições, assim como as orientações do professor. E
complementa: ―A escola sabe que o caminho para complementar a parte acadêmica do
aluno é o esporte‖.
O coordenador/professor nos explicita sobre o processo de desenvolvimento
das competências esportivas do aluno, desde a tenra idade, quando o aluno realiza o seu
primeiro contato com o esporte,:
Há um trabalho de base com os alunos desde o mirim, os garotos de
educação infantil e do primeiro e segundo ano trabalham com o professor
de desenvolvimento motor, trabalho voltado para o equilíbrio e para o
domínio através do balé e das artes marciais; fechando esse cerco vem o
trabalho com o xadrez... xadrez ciência que trabalha o desenvolvimento
do raciocínio rápido e lógico, isso tudo sem pegar em bola, só no quarto
e quinto ano o aluno tem o contato com quatro esportes diferentes, chega
no sexto ano já trabalhado o desenvolvimento motor, ele já tem um préconhecimento de vários esportes com disciplina e raciocínio lógico. A
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receita de sucesso é essa. Quando o aluno vem de outra escola ele sente
essa diferença, ele não foi trabalhado dessa forma, muitas vezes
anteciparam, competiram cedo. (grifos nossos)
Percebe-se, assim, que o aluno, desde muito cedo, na escola particular, passa
por vários processos, trabalhando seu desenvolvimento físico-motor, para que só mais
tarde, o contato com o esporte escolhido seja bem sucedido. Todo esse processo é
realizado de modo a que, futuramente nas competições, ele possa obter resultado
desejado, ―a vitória‖, para sua escola.
Para o coordenador/professor, os JERN´S não seriam uma competição justa,
admitindo existir disparidades entre as escolas no tocante aos recursos disponíveis:
A disputa entre as escolas é desleal, se pára para observar, verá que
alguns profissionais ensinam nas duas instituições o que modifica é a
estrutura, os professores não têm condições de trabalhar, eles só têm o
aluno; não tem material, quadras cobertas; por isso nos últimos
quinze anos só dá escolas particulares. (grifos nossos)
Na entrevista, o coordenador/professor mostrou-se muito preocupado com a
tentativa de modificação do regulamento dos jogos, nos próximos anos. Segundo ele,
certas escolas particulares da capital, na tentativa de retirar a invencibilidade de sua
escola (que se encontra na condição de pentacampeã consecutiva, por exemplo)
estariam arquitetando a modificação do regulamento das competições:
As escolas que se diziam tradicionais se acomodaram, pararam de
trabalhar, perderam seus espaços, e estão tentando ganhar os jogos pela
modificação do regulamento e não pelo trabalho. Eles não querem que
tenham campeão geral... aqui o trabalho foi gradativo, investimos no
espaço físico e nos professores. (grifo nosso)
O motivo maior dessa rivalidade entre as escolas, principalmente entre as
escolas particulares da capital, estaria no fato de que – além de poder se afirmar como
―a melhor‖ nos esportes, dentre as 500 ou mais instituições de ensino representadas nos
JERN´S – a campeã geral desses jogos transforma esse título em peça de marketing, a
partir da valorização dos seus alunos, seus profissionais e sua própria imagem.
A lógica da competição aliada à lógica dos resultados empresariais estaria
levando os gestores das escolas particulares a contratar dirigentes e técnicos com
competências de garantir melhores resultados nas competições, a oferecer bolsas a
atletas (provenientes de escolas públicas, inclusive) e passar, também, a elaborar
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planejamentos de longo prazo, pensando os próximos jogos com quase um ano de
antecedência. Isso traria alguns deslocamentos na própria visão de pedagogia escolar
relacionada aos esportes. O meio tornar-se-ia um fim em si.
Desse modo, é comum entre as escolas particulares, desejosas de formar
equipes vencedoras, recorrerem aos atletas que se destacam em escolas públicas,
oferecendo-lhes bolsas de estudos para que eles participem dos jogos e obtenham
troféus para elas, isto é, para que elas possam assegurar uma boa posição no campo de
competição esportiva e obter lucros simbólicos e econômicos. Quando perguntado como
é feito esse procedimento, de oferecer bolsa para atletas de outras escolas, o
coordenador/professor explica:
O aluno é recebido por uma ação social, ele recebe um acompanhamento
pedagógico privilegiado, damos preferência a alunos carentes e não de
outras escolas particulares. Esse aluno passa por uma entrevista, e é
visto sua nota. O professor do esporte acompanha as notas de todos, sem
exceção. (grifos nossos)
Contudo, no depoimento da coordenação dos JERN´s, observa-se que nem
sempre a ―ação social‖ é priorizada na prática, pois haveria o privilégio da preparação
para a competição esportiva em detrimento dos estudos do referido aluno que foi
recebido por sua competência esportiva:
Não é só esporte, tem que ver o estudo. É justamente isso que nos
preocupa, os atletas das escolas públicas são levados para escola
particular e não há uma preocupação, um acompanhamento na sala
de aula, só se preocupa com atleta com o aluno não; quando chega no
último ano, e esse aluno se depara sem o esporte e chega na sala e ver que
perdeu o ano; há uma desmotivação, fica sem perspectiva, perdido. Mas o
contrário também acontece, alunos das escolas públicas se saem muito
bem nas particulares, se esforçam, pois vê ali uma oportunidade de
crescer, aprender, de ter um ensino melhor, coisa que não acontece
estando na escola pública. (grifos nossos)
Haveria, entretanto, nesse campo educacional, a preocupação em se manter a
relação esporte-estudo, embora a prática usual oriente-se privilegiadamente para o
esporte de rendimento. Por exemplo, segundo a coordenação a obrigatoriedade nos
JERN´s dessa relação esporte-estudo é verificável no momento da nomeação do
―melhor atleta‖ em cada modalidade, o conhecido ―atleta ouro‖. Esse reconhecimento
só será concedido ao aluno que tiver melhor nota: ―pegamos os quatro melhores atletas
e escolhemos o da melhor nota‖.
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Há nos JERN´s, algumas modalidades consideradas ―elitistas‖ como o
hipismo, o squash, o pólo aquático, o tênis de campo que para as escolas da rede pública
se tornam impraticáveis, por necessitar de uma estrutura física e outros recursos
adequados. Quando perguntamos ao coordenador de esportes, da escola particular, o
que ele achava das competições terem modalidades, tidas como ―elitistas‖ das quais as
escolas públicas não podem participar, obtivemos uma resposta deslocada em relação à
nossa questão:
Alguns questionamentos feitos a CODESP foi o Contemporâneo quem
fez, porque a competição estava longa, eram quinze dias de competição, o
que atrapalhava a parte acadêmica dos alunos, principalmente os alunos
do terceiro ano (pré-vestibular), algumas modalidades tinham que acabar
para desafogar. Também a questão dos esportes duais, surfe, boadboard,
ciclismo e mountain bike apesar de nossa escola se destacar nelas tem que
tirar uma, assim como os vários futebóis. A preocupação é o prejuízo
pedagógico.(grifo nosso)
Sem nenhuma intenção de generalização, a partir de uma única resposta dessa
natureza, podemos, ao menos, indagar sobre o interesse ou desinteresse do docente de
uma escola particular em relação à participação de escolas públicas no campo de
competição esportiva escolar, ou seja, quanto às desigualdades em jogo (no aspecto
cultural esportivo e econômico) entre competidores jovens. Segundo ele, os esportes
em que a sua escola mais se destaca são basket, ciclismo, xadrez, natação, vôlei, nado
sincronizado, squash, sendo que em esportes como futebol, a escola não tem tanta
―tradição‖. Fica bem evidenciada a sua preocupação quanto ao rendimento escolar em
sua correlação com a duração da competição, que pode afetar a parte pedagógica de sua
escola.
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4.2. Escola pública
Dando continuidade à nossa pesquisa nas escolas, partimos para entrevistar um
coordenador ou professor de esportes em uma escola da rede pública da cidade do
Natal/RN participante dos JERN´s. Escolhemos, então, a Escola Estadual Floriano
Cavalcante, mais conhecida como FLOCA, pelo fato de ser uma escola que sempre se
sobressaiu nas competições entres as escolas da rede pública, e pelo fato, um tanto
curioso, de no ano da realização de nossa pesquisa ter tido um dos piores desempenhos
de sua participação.
A investigação empírica realizada nessa escola foi um pouco difícil, devido às
longas horas de espera até encontrarmos alguém que se disponibilizasse para a
entrevista. A conversa realizada com o professor foi realizada durante a sua aula de
karatê, o que nos proporcionou uma visualização mais concreta da relação entre o aluno
dessa instituição com o esporte.
Pelo fato do professor não ter um horário livre para que conversássemos com
mais tranqüilidade (segundo ele, após aquela aula tinha que ―sair correndo‖ para dar
aulas em outras escolas), ele nos solicitou que ouvíssemos também o professor
substituto, que o acompanha em todos os treinos, e um ex-aluno da escola. E foi dessa
forma, nessas múltiplas vozes, que se realizou a nossa conversa. Finalmente, o acaso
nos possibilitou ter depoimentos e visões diversificadas e melhor detalhadas em certos
aspectos.
Para o professor titular, os JERN´s são ―um modo de incentivo maior ao aluno,
que tem que treinar para mostrar o que aprendeu‖. Entretanto, segundo ele, a procura
pelo esporte não parte do aluno; geralmente, são os professores que tomam a iniciativa,
passando nas salas de aula, incitando os alunos a participarem dos treinos esportivos, e
dependendo do interesse desse aluno ele comparece no dia comunicado pelo professor.
Sabemos, de antemão, que há poucos atrativos, nessa área, para os alunos, tendo em
vista as precárias estruturas físicas para a prática de esportes diversificados.
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As sessões de preparação física e mental, que vimos, anteriormente, ser
realizadas em escolas particulares, começando em tenra idade, inexistem nessa escola, a
preparação ocorre somente antes dos JERN´s de maneira tópica:
As mudanças que acontecem são nos treinos, são mais puxados um
mês antes de alguma competição, se intensificam os treinos, para ficar
mais preparado, puxa pra não cansar rápido, pra ter resistência na hora da
luta. (grifo nosso)
Poucas possibilidades ou nenhuma de um planejamento antecipado, apenas um
preparo prévio intenso dos alunos visando às competições, um pouco tempo antes das
datas das competições.
Durante a conversa, comentamos sobre os resultados ruins que a escola
pública tem tido em competições, e notamos na fala do professor-substituto alguns
temas que nos parecem ser recorrentes (referimos aos dados de observação que
possuímos desde quando participávamos da competição dos JERN‘s), quais sejam, os
de frustração e decepção diante do ―livre arbítrio dos juízes‖, de relações de forças
desiguais dos competidores, da segregação social e o da ―corrida pelo lucro‖:
As competições nos JERN´S são muito desiguais, geralmente eles
excluem, quem é pública é pública, quem é particular é particular, é
lado A é lado B, só misturam em tempo de JERN´S, fora isso não, eles
visam muito dinheiro. Tem diferença, tem desigualdade sim, porque eles
[os árbitros] puxam mais para o lado particular do que para o lado
humilde, eles não respeitam nem eles e nem os atletas que estão
presentes.(grifo nosso)
O ex-aluno manifesta sentimento de revolta, no momento em que toca no
assunto da discriminação que sofrem alunos competidores de escolas públicas, durante
as competições, em virtude de sua pertença escolar. Sobre essa discriminação social, o
professor titular comenta que atitudes de desprezo pelas escolas públicas, como também
reações de desconfiança e de rejeição perante alunos ―pobres‖ não se manifestam
apenas ao nível dos discentes, mas também ao nível do corpo docente:
Não fale de JERN´s pelo amor de Deus não. Os JERN´s foi feito para as
escolas particulares, há muita discriminação com a escola pública, um
professor de um colégio chamou os alunos de favelado e imundice.
Eles não têm direito de discriminar a escola pública não, só porque
ensina em escola particular; a escola tem vários campeões dos JERN´s,
no Norte-Nordeste, do estado... então pra mim eu nunca mais participo
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dos JERN´s pela discriminação, discriminação da escola particular pela
pública. Se você vem da particular e tiver conversando com outro e chegar
um menino desse (aponta para o aluno treinando) eles saem de perto com
medo de roubar.... na final de uma competição uns tiraram os
materiais de perto da gente pensando que nos iríamos roubá-los...
perdi a vontade. Eu participei muito dos JERN´s mais a gente perde a
vontade. Não quero esquentar a cabeça com JERN´s não. Se o Karatê for
vai ficar jogado lá. A escola não quer mais participar não... (grifos nossos)
Embora haja, segundo o professor-substituto, uma espécie de ―exclusão‖ da
escola pública do campo de competição esportiva, quando um atleta de alguma
instituição pública consegue se destacar, há mudanças de atitude vis-à-vis do aluno (―já
muda o olhar‖), há uma aproximação em direção ao referido aluno com potencial de
campeão, pois as escolas particulares vêem nesses atletas uma ―fonte de renda‖.
Segundo o professor titular, muitos de seus alunos já foram levados para a rede
particular de ensino, com bolsas de estudo:
Muitos, muitos... Eles (escola particular) usam os JERN´s como olheiro,
pra levar os melhores alunos daqui, oferecem mil e uma coisa pra ele
disputar por eles, eles vêem como uma fonte de renda. Geralmente eles
vêem que os meninos têm futuro, e já muda o olhar, já muda o
conceito. (grifos nossos)
Justamente, interessante notar que na entrevista com a coordenação dos
JERN´s, o tema das desigualdades nos jogos, reaparece sob a forma de ―inclusão‖ dos
alunos da escola pública, permanecendo velada a questão da ―inclusão‖ ou da distinção
da própria escola na classificação geral dos JERN‘s que, por sua vez, remete para a
questão da competitividade econômica entre as escolas particulares.
É aí que ele aparece, é como futebol, quando você joga com um time de
fora de São Paulo, você não tem a técnica, mas a raça, a vontade faz
você superar. É uma vitrine, você querer aparecer naquele momento; os
JERN´s é uma maneira de fazer eles aparecerem; ou até ganhar uma
bolsa”. (grifos nossos)
Quer dizer que dependendo da ―raça e vontade‖ do aluno ele poderá vencer,
inclusive, sair de sua condição social e fazer uma mobilidade social via trajetória escolar
numa ―boa‖ escola particular? Nas entrelinhas, pode-se entender que os JERN‘s
funcionariam como um campo de chances e probabilidades para aqueles adolescentes
pobres e desejosos de mudar seu ―destino social‖?
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De toda forma, o esporte, dentro dessa visão de competição e de alguns
valores veiculados nesse próprio campo, parece se orientar pela idéia de se fazer esporte
contra o outro, um adversário a ser vencido, muitas vezes a qualquer custo, sabendo-se
que só um vence. Em razão disso, sempre haverá a presença de um derrotado, fora o
fato de que, essa ânsia em buscar ser o melhor, pode fazer aflorar nesses ―atletas‖ o
desejo de discriminar o outro, de menosprezar o mais ―fraco‖.
O ―mais fraco‖ está evidentemente posicionado num lugar no qual inexistem
praticamente recursos materiais e financeiros e estrutura física esportiva. Quando
perguntamos se a estrutura física esportiva faz diferença nas competições, o ex-aluno
afirmando que sim, comentou:
Os alunos das escolas particulares são bons, a gente não tá querendo dizer
que eles não sejam, mas muitos aqui podem ser melhor, que podem
não, que são melhores, só que não estudam num colégio particular, e
sim num estadual ou municipal. (grifo nosso)
Sobre isso, a coordenação dos JERN´s reconhece que a falta de uma estrutura
esportiva satisfatória nas escolas públicas corrobora para a saída do aluno dessa
instituição para a escola particular de modo que, qualquer tentativa de intervenção no
sentido de dotação de melhores recursos seria inócua:
Há um trabalho bom nas escolas públicas, o que não há é uma
continuidade, pois se um aluno se destaca já é retirado, levado para a
particular, às vezes se perde até três atletas de uma vez. Isso não é
interessante para gente que é gestora do Estado, a gente gostaria de dar
condições melhores para que ele continuasse na escola pública, mas
infelizmente não dá para impedir, as escolas particulares têm mais
estrutura. O aluno da escola pública tem muito mais vigor, muita
mais vontade, o que falta é uma estrutura esportiva melhor; no
atletismo em que eles dependem só deles as escolas vencem.(grifos
nossos)
Embora em teoria o esporte se baseie na igualdade formal de chances, na
prática as desigualdades estão na base da preparação esportiva. Basta observar as
enormes diferenças de estrutura para o treinamento presentes nos dois tipos de
instituições de ensino. Evidentemente, são as escolas da rede pública quem mais sentem
essas desigualdades durante as competições.
É manifesto o descontentamento do docente em face dessas desigualdades que
afetam o ensino como um todo. Em relação aos esportes, tidos como elitistas nos jogos,
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principalmente pela escola pública que não possui estrutura física e financeira para
treinar seus alunos nessas modalidades, o professor desabafa:
Esses esportes, hipismo não têm em escola pública, nem na particular
têm! Natação! Não tem uma escola pública que tenha, a não ser no CAIC.
Nossa escola se destaca no karatê, as outras modalidades são mais
passivas. Aqui (no karatê) a gente somos ignorantes e a gente rala pra
isso: pra eles não passarem por cima da gente nem a gente deles,
deixar sempre igual. (grifos nossos)
Segundo a coordenadora dos JERN´s, não houve uma mudança por parte da
CODESP-RN para produzir maior igualdade às competições, no sentido de mudar
regulamento, o que existe é um trabalho para melhorar os professores, um trabalho de
capacitação, implantado desde 2003:
Já houve uma melhora nesse sentido, os professores estarem passando
todo o ritual que envolve os jogos, os alunos não sabiam como entrar
em quadra, como pedir tempo, etc. Há um trabalho de capacitação que
envolve todos os professores do Estado, no interior e também é realizado
um fórum na capital com todos eles. O Estado está distribuindo material,
não existe material, não existe quadra, não existe espaço físico.(grifo
nosso)
Esse trecho da entrevista revela outro aspecto da competição: além da
competência técnica no esporte, o aluno necessita possuir competência cultural (no
sentido que Bourdieu (1998) argumenta referindo-se a qualquer campo específico
(religioso, político, universitário, artístico etc.), isto é, todo campo possui linguagens e
signos próprios que se traduzem em rituais, condutas e discursos que devem ser
apropriados por todo agente que deseja adentrar no campo em questão. Ora, o aluno
competidor, além de conhecer as normas técnicas específicas de como jogar na
modalidade de sua especialidade, ele precisa conhecer as regras sociais do campo
esportivo (como por exemplo, ―como entrar na quadra, como pedir tempo‖), caso
contrário a sua ―técnica‖ pode ser desclassificada pelo não cumprimento da regra social.
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5. Esporte escolar X esporte de rendimento
A partir dos relatos dos entrevistados e das reflexões oriundas do referencial
teórico, desenvolveremos nesse capítulo, a questão do ensino do esporte no âmbito
escolar, assim como a relação entre o esporte e o estudo.
Em sua obra Educação Física e aprendizagem social (1992), Bracht afirma
que a Educação Física nasce junto com os sistemas nacionais de ensino, típicos da
sociedade burguesa emergente dos séculos XVIII-XIX, e que será ela como prática
pedagógica, que introduzirá a temática do movimento corporal no interior da instituição
educacional.
Ainda segundo Bracht, foram inicialmente os filantropos como Guths Muths
(1759-1839) e Pestalozzi (1746-1827) que buscaram introduzir as atividades corporais
no currículo escolar, porém a influência destes pedagogos na Educação Física brasileira
foi superada pela influência da instituição militar. Assim os métodos inicialmente
adotados foram de caráter militar, tendo os ―instrutores‖ como os principais
―aplicadores‖ desses métodos.
Nesse caso, a instituição escola passa a ser palco de uma ação ―pedagógica‖
que se assemelha à preparação militar, que tem como base um exercício corporal com o
objetivo de desenvolver a aptidão física e a ―formação do caráter‖ (a autodisciplina,
hábitos higiênicos, capacidade de suportar a dor, coragem, respeito à hierarquia). Após a
II Guerra Mundial, que coincide com o fim da Ditadura do Estado Novo, os exercícios
corporais praticados no âmbito escolar sofrerão influência de outra instituição, a
esportiva. (Bracht.op.cit,p.19)
Portanto, para Bracht, a Educação física, como prática pedagógica, nunca se
regeu por princípios e códigos próprios, ao contrário, manteve-se ―subordinada‖ numa
relação histórica com instituições como a militar e a esportiva, embora o início da
década de 1980 marque o momento em que a visão hegemônica descrita anteriormente,
para buscar legitimidade na escola, começa a sofrer os primeiros abalos. Foi o início de
uma crise, que proporcionou várias reflexões sobre a disciplina, enfatizando as
dimensões psicológica, cultural, social, cognitiva e afetiva dos alunos.
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Para Bourdieu (1983, p.139) a passagem do jogo ao esporte acontece
primeiramente no interior da escola, nas grandes escolas reservadas às ―elites‖ da
sociedade burguesa: ―onde os filhos das famílias da aristocracia ou da grande burguesia
retomaram alguns jogos populares, isto é, vulgares, impondo-lhes uma mudança de
significado e de função[...]‖. Mais adiante ele afirma que é na escola:
Onde as práticas dotadas de funções sociais e integradas no calendário
coletivo são convertidas em exercícios corporais, atividades que
constituem fins em si mesmas, espécie de arte pela arte corporal,
submetidas a regras especificas, cada vez mais irredutíveis a qualquer
necessidade funcional, e inseridas num calendário específico (Bourdieu,
1983, p.139)
Dessa forma, verificamos que essa visão do esporte como uma prática de
tempo livre da aristocracia, atualmente encontra-se transformado e adequado à
sociedade como um todo, e principalmente regida pelo modo de produção capitalista.
Nesse sentido, percebemos que o esporte escolar, estimulado por esse modelo
característico da sociedade capitalista, incorporou valores que estão calcados justamente
em seus princípios: a competição, a seleção, a comparação, o máximo de rendimento, a
busca da vitória a qualquer custo. Anteriormente, já tivemos ocasião de apontar,
brevemente, a presença, senão a dominância, da lógica do lucro norteando a gestão e o
planejamento das atividades esportivas no âmbito privado escolar.
Bracht (op.cit.), aborda a escola não como um ―sistema‖ autônomo, mas como
um lugar de transmissão de um conhecimento produzido sempre fora dela, por um outro
sistema ―mais poderoso‖:
A instituição educacional é produto de um processo de complexificação
da sociedade — produzido fundamentalmente pelo desenvolvimento das
forças produtivas — que determinou uma diferenciação de sistemas, os
quais cumprem, no conjunto das relações sociais, determinadas funções: a
transmissão do saber social acumulado exigiu o surgimento de uma
instituição para cumprir tal tarefa — o sistema educacional (ibid., p.19).
Como a escola passa a ser vista como uma reprodutora de ações determinadas
por outro ―sistema‖, consequentemente, a Educação Física, por se realizar no interior do
sistema educacional, ―assume os códigos de uma outra instituição‖ mais poderosa: a
instituição esportiva. Bracht (op.cit., p. 22) explicita:
É importante citar que o desenvolvimento da instituição esportiva não se
dá independentemente do da Educação Física: condicionam-se
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mutuamente. A esta é colocada a tarefa de fornecer "a base" para o esporte
de rendimento. A escola é a base da pirâmide esportiva. É o local onde o
talento vai ser descoberto. Esta relação, portanto, não é simétrica.
Ou seja, embora o esporte e a Educação Física se condicionem mutuamente, a
Educação física na escola estará subordinada aos códigos do sistema esportivo, portanto
teremos não o ―esporte da escola‖ e sim o ―esporte na escola‖, visando revelar os
talentos para o esporte de rendimento.
No capítulo anterior, quando o coordenador esportivo da escola particular
afirma que desde a educação infantil, o aluno passa por processos de desenvolvimento
motor, para desenvolver o raciocínio rápido, lógico e assim obter êxito nas competições
futuras, ele estaria justamente indicando essa busca do máximo de rendimento que um
determinado atleta deve demonstrar futuramente nas competições escolares.
Segundo Huizinga (1996, p.221), estamos enfrentando na contemporaneidade
a perda do lúdico para o esporte sistematizado e regulamentado. Na sua concepção,
―temos uma atividade nominalmente classificada como jogo, mas levada a um grau tal
de organização técnica e de complexidade científica que o verdadeiro espírito lúdico se
encontra ameaçado de desaparecimento‖. Observa-se que, a Educação Física presente
nas escolas está sempre voltada para práticas desportivas, onde o professor opta por uma
prática sistematizada e direcionada para o esporte de movimento, sem muita ênfase do
lúdico. Sobre essa questão Korsakas (2002, p.85) afirma:
Não são raras as vezes em que a grande preocupação de ter equipes
competitivas nas escolas sobrepõe-se a intenção de ensinar o esporte
para os alunos. Assim, qualquer proposta pedagógica é facilmente
substituída por um determinado número de bolsas de estudos oferecidas
a alguns poucos talentos, e as aulas de educação física transformam-se
em celeiros.
Assim como acontece nos demais setores da sociedade capitalista, mais
particularmente no mundo empresarial, a escola também se inscreve numa produção de
valores pautados em princípios e significados de um esporte que seleciona, que
discrimina e que confere ―distinções‖ apenas aos vitoriosos, aos ―excelentes‖, aos ―the
Best‖, típicos códigos e valores capitalistas de organização social.
Justamente, Germano (ano 1994, p.93) observa que no Brasil, ―na área
educacional, apesar das reformas, o Estado se descomprometeu gradativamente de
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financiar a educação pública; os recursos estavam comprometidos com o capital
privado, repassando, ainda sim, verbas para as escolas particulares‖. Mais adianta, o
autor reforça a tese de que ―o que está em jogo realmente, na política educacional, é a
manutenção da estrutura da desigualdade social, na medida em que procura estabelecer
uma relação direta e imediatamente interessada com a produção capitalista‖
(GERMANO, ibid., p.181)
Os relatos do ex-atleta e do professor da escola pública, anteriormente citados,
exemplificam bem essas afirmações, quando eles comentam que haveria uma exclusão
dos atletas das escolas públicas nas competições, e que são constantes as discriminações
que partem tanto de determinados professores de escolas particulares (sendo que um
deles, numa ocasião de competição, teria chamado os alunos de ―favelados‖ e
―imundice‖) quanto dos alunos que procuram ficar distantes de seus colegas de escolas
públicas com receio de roubo de seus materiais.
Processos de segregação e discriminação sociais, tais como analisados por
Takeuti (2002), encontram-se, igualmente, presentes num espaço social que, a priori,
espera-se a promoção de relações de solidariedade e de reciprocidade. As contradições e
os conflitos inerentes às relações sociais da sociedade capitalista – muitas vezes,
manifestando-se pelo ódio, raiva, desprezo, menosprezo, estigmatização do outro –
atravessam o campo das relações educativas, relações que, por sua vez, permeando um
campo específico (esportivo) e interferindo nas relações grupais e individuais.
Sobre essas relações, tivemos experiência própria na condição de uma exatleta de uma escola particular: como participante de algumas edições dos JERN´s,
pudemos observar e vivenciar algumas experiências, sob modo negativo, nos encontros
com colegas e professores de escolas públicas.
Num dado evento, como de costume, ao término de nossa competição numa
dada modalidade esportiva, nós e as colegas da mesma equipe permanecemos na escola
para assistirmos a alguns jogos. Um dos jogos envolvia uma escola da rede pública
(localizada na zona norte) e outra escola da rede particular (localizada na zona sul) que,
por sinal, jogava ―em casa‖, o que lhe garantia, sem sombras de dúvida, incentivo uma
torcida que, como sempre, encontrava-se em grande número no ginásio. No decorrer do
jogo, ouviam-se clamores e gritos, os chamados ―gritos de guerra‖, vindo dessa torcida
num tom de menosprezo: ―Ela, ela, ela volta para favela!‖. O fato de a escola ser da rede
pública e estar localizada na Zona Norte da cidade, a torcida associa-a à ―favela‖, e de
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modo inclemente dispensam todos os que a ela pertencem ou se associam, inclusive
pedindo a sua retirada daquele ambiente.
Esse incidente ilustra bem aquilo que Bourdieu, (2001, p.159) observa
relativamente a divisões e distinções do espaço social e a caracterização de cada
indivíduo ou grupo segundo a sua posição social: ―Não existe ninguém que não seja
caracterizado pelo lugar em que está situado de maneira mais ou menos permanente‖.
Mais adiante, ele completa:
O espaço social tende a se retraduzir, de maneira mais ou menos
deformada, no espaço físico, sob a forma de um certo arranjo de agentes e
propriedades. Por conseguinte, quaisquer divisões e distinções do espaço
social (alto/baixo, esquerdo/direita) se exprimem real e simbolicamente no
espaço físico apropriado como espaço social reificado (por exemplo, na
oposição entre os bairros elegantes, [...] e os bairros populares ou os
subúrbios)‖, isto é, somos sempre caracterizados pelo lugar que
ocupamos.
Com isso queremos introduzir mais um aspecto no rol de problemas
enfrentados pelas escolas públicas e seus membros (docentes e discentes). Acrescentese, então, todo esse processo de estigmatização e segregação sociais à lista de
dificuldades e obstáculos interpostos à escola pública no tocante à precariedade de
recursos materiais e financeiros e de estrutura física de treinos no seu empenho para
participar das competições. Além disso, há a perda de alunos, que se sobressaem no
esporte, para as escolas particulares, o que não é nenhum atrativo para docentes que se
empenham junto aos seus alunos.
Percebemos isso, no capítulo anterior, onde o professor da escola pública,
afirma que os alunos dessa escola que se destacam nos JERN´s, logo são levados pelas
escolas particulares, através de bolsas de estudo. Dessa forma, o aluno levado da escola
pública para a escola particular, terá como missão retribuir essa bolsa de estudo
―trazendo resultados positivos‖ nas competições para a sua atual escola. Esse fato
caracteriza bem a lógica do lucro, já o comentamos: seleciona-se o melhor atleta da
escola pública, inserindo-o na escola particular de modo que receba um treinamento
nunca obtido antes, um aprendizado composto de - várias técnicas, e toda uma estrutura
para desenvolver suas habilidades que nos jogos que, aliás, precisam ser traduzidos em
vitórias.
Fora o fato da alta visibilidade das escolas em programas de TV, durante os
JERN´s, é comum também, elas colocarem, ao final dos jogos, faixas na porta de
entrada da escola com nomes das modalidades em que foram campeãs, assim como
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nome dos atletas que se destacaram ou foram ―atleta-ouro‖. Tudo isso reforça a idéia do
marketing esportivo que, especificamente, as escolas particulares realizam durante e
depois dos JERN´s.
Isso vem corroborar com a idéia do esporte escolar exercer a função,
referendada na sociedade capitalista, de supressão dos mais fracos pelos mais fortes,
como afirma Romera (1999, p.78), ressaltando o importante papel do esporte na sua
Função de agente selecionador, onde os mais fortes, ágeis e velozes terão
sempre mais oportunidades e ascendência sobre aqueles que, por ventura,
não possuem, ou ainda não desenvolveram essas ‗valiosas‘ habilidades,
que se requer no mundo esportivo.
Já registramos anteriormente que a ―perda‖ de alunos para a escola particular é
vista pela atual coordenação dos JERN´s como uma espécie de inclusão social e
oportunidade para que certos jovens das camadas pobres possam também vir a fazer
parte do mundo da excelência e dos ―mais fortes‖. Inclusive, haveria total descrença na
estrutura do ensino público na medida em que afirma: ―uma oportunidade de crescer,
aprender, de ter um ensino melhor, coisa que não acontece estando na escola pública‖.
Esse gestor não participaria, então, da função que Romera (idem) designa de ―agente
selecionador‖? Parece haver ambigüidades referentes à dita inclusão social do aluno
―carente‖.
Primeiramente, o que garante aos alunos da rede pública de ensino, em sua
maioria, pertencentes às classes populares e médias, o ―privilégio‖ de estudar em uma
escola particular é a sua condição de atleta potencial campeão.
Segundo, não se trata de um programa de ―ação social‖ do setor privado
visando apoiar segmentos pobres, pois a dita ―inclusão social‖ constitui-se em, um meio
de inclusão baseado na individualidade e atinge uma porção mínima do conjunto de
alunos que participam das competições esportivas: nem todos se destacam nos jogos.
Terceiro aspecto: nem sempre o êxito no campo esportivo se traduz em
competências semelhantes em sala de aula; haveria, uma desconexão entre esporteestudo, muitas vezes, o aluno passa a ser mais cobrado nos treinos do que nos estudos.
Em vista da exigência de obtenção de um alto desempenho esportivo, o aluno necessita
seguir algumas regras precisas como: não faltar treinos, viajar para competir em
campeonatos fora da cidade, ou seja, cumprir certas ―obrigações‖ para que permaneça
34
com a bolsa concedida a ele. Nem sempre parecem ser conciliáveis as exigências de um
desportista e um aluno em seu aprendizado escolar.
Por último: o aluno pertencente à escola pública ao chegar nessa nova escola,
se depara também com conteúdos de ensino, métodos, técnicas de transmissão, e
principalmente critérios de avaliação, totalmente contrários ao da sua escola anterior, o
que prejudica seu aprendizado. Sobre essa diferença de cultura escolar, Bourdieu (apud
Nogueira e Catani, 1998, p.55) observa que:
A cultura da elite é tão próximo da cultura escolar que as crianças
originárias de um meio pequeno burguês (ou, a fortiori, camponês e
operário), não podem adquirir, senão penosamente, o que é herdado pelos
filhos das classes cultivadas[...].
Então, não haveria aí algumas contradições? A retirada do aluno que estuda na
rede pública para a rede particular de ensino, seria efetivamente o caminho para que ele
obtenha melhores condições de estudo? O que interessa à escola privada não é o aluno
que aí adentra, mas sim a sua condição de atleta.
Verifica-se nos JERN´s uma grande quantidade de modalidades esportivas que
muitas vezes estão muitos distantes da realidade das escolas públicas, se aproximando
mais das escolas particulares onde seus atletas podem ter um contato maior quando
freqüentam clubes, escolinha, como o hipismo e o tênis de campo, considerados por
muitos como esportes elitistas. Percebe-se que as escolas da rede pública, freqüentada
em sua maioria pelas ―classes populares‖, têm melhores resultados nos esportes tidos
como ―populares‖, como é o caso do futebol, assim como nos esportes individuais que
não necessitam de uma estrutura física para ser praticado, como o karatê.4
Os alunos da rede pública se destacam efetivamente em modalidades que
exigem uma mínima estrutura física nos próprios. Disso, estão conscientes os nossos
entrevistados: ―o aluno da escola pública tem muito mais vigor, muita mais vontade, o
que falta é uma estrutura esportiva melhor; no atletismo em que eles dependem só deles
as escolas vencem‖; e ―nossa escola se destaca no karatê, as outras modalidades são
mais passivas‖. Boltanski (2004, p.160) nota que esportes populares, como o futebol,
são mais praticados pelas classes populares porque não exigem dos que praticam uma
―aprendizagem
racional
de
movimentos
especiais‖,
enquanto
que
os
mais
frequentemente praticados pelas classes superiores como natação, tênis, requerem uma
―educação sistemática dos movimentos‖. Essa tese não pode ser generalizada se
4
Ver em anexo a tabela de classificação de algumas modalidades dos JERN´s 2008.
35
tomarmos o destaque dos alunos, conforme afirma o professor depoente, na modalidade
esportiva karatê, que é uma arte marcial que parece exigir a educação sistemática dos
movimentos, ou ainda mais.
È verdade que como campo que possui suas próprias regras, o campo
esportivo requer dos seus atletas um habitus, um ―senso prático‖, para que possa ter
competência, tanto técnica quanto cultural. Vimos anteriormente, a atual coordenação
dos JERN´S explicar que para produzir maior igualdade às competições está-se
realizando um trabalho de capacitação dos professores, onde esses ficam encarregados
em transmitir aos atletas da escola pública e do interior, instruções necessárias para que
possam se comportar de forma adequada nos jogos, uma vez que, ―os alunos não sabem
entrar em quadra‖, não sabem ―como pedir tempo‖, ou seja, eles devem estar cientes de
todos os rituais que os jogos possuem.
Se o objetivo dos JERN´s é provocar o encontro entre as escolas, ele
conseguiu atingi-lo, porém o que ocorre durante esse contato é o que nos mobiliza a
compreender inscrevendo o fenômeno no campo das relações sociais. Se encontro há,
não está havendo uma interação, uma vez que as relações são marcadas por conflitos
entre grupos distintos por sua posição social. Tais conflitos se manifestam em atitudes
de discriminação contra o ―aluno pobre‖ suspeito por ―roubos‖ e outros atos
delinqüentes. Isso tem por efeito produzir nos atletas das escolas da rede pública o
desânimo, desinteresse e apatia em participar dessa competição.
Ao realizar estudos a respeito do jogo e do esporte, Bruhns (1993, p.46)
constata que há uma negação da
Dimensão educativa da atividade lúdica, utilizando-se unicamente do
esporte, em que os mais ‗poderosos‘ merecem atenção e os inimigos
abatidos traduzem-se em pontos ganhos transformando-se nos fracos
inúteis ‗naturalmente eliminados‘.
Como foram percebidos em nossa pesquisa, os JERN´S são uma competição
desigual, e não existe no âmbito da Coordenadoria dos Desportos do Rio Grande do
Norte (CODESP-RN), organizadora desses jogos, ―o espaço para a discussão de
estratégias que permitam a participação de todos os alunos com as mesmas
oportunidades‖ e que não privilegie apenas ―os que apresentam melhor rendimento‖
(Bracht 1992, p.63/64).
36
Constatamos, então, a necessidade de se pensar, com maior acuidade,
envolvendo diversos responsáveis e interessados na questão dos desportos, o esporte
enquanto Educação, sendo esta mesma pensada como uma paidéia: ―daquele ideal de
‗formação de uma humanidade superior‘ nutrida de cultura e de civilização, que atribui
ao homem sobretudo uma identidade cultural e histórica‖. (Cambi, 1999, p.87). Dessa
forma, construir a idéia de um esporte que privilegie valores que contemplem princípios
do coletivismo e do lúdico, da solidariedade esportiva, da participação, do respeito à
diferença, e não valores para uma formação específica, que vise unicamente à obtenção
de títulos ou preparar os jovens para uma vida adulta orientada simplesmente para a
lógica competitiva.
37
6-Considerações finais
Ao problematizarmos sobre a relação das práticas esportivas na instituição
escolar, tivemos a pretensão de descobrir os motivos pelos quais estava havendo uma
predominância, há quase três décadas, das escolas particulares da cidade do Natal/RN
no topo da classificação final dos Jogos Escolares do Rio Grande do Norte, deixando
sempre as escolas da rede pública em uma posição inferior.
Para descobrirmos tais motivos, estabelecemos objetivos específicos a fim de
podermos nortear os caminhos da pesquisa e orientamo-nos por algumas indagações,
como as distintas instituições de ensino trabalhavam a questão esportiva e como esse
trabalho poderia interferir nos resultados finais desses jogos, e por nesse caminho saber
como se articulavam as dimensões esporte e estudo, no âmbito educacional.
Dessa forma, para entendermos essa relação, que envolve o campo escolar e o
campo esportivo, recorremos aos aportes teóricos de vários autores, em especial as
obras de Bracht e Bourdieu. O primeiro trouxe-nos reflexões no que concerne ao papel
da Educação Física/práticas esportivas no sistema educacional; o segundo nos ajudou a
entendermos o contexto do surgimento do esporte moderno e a relação do esporte com
as distintas classes sociais.
Podemos afirmar após esse estudo que os motivos que geram tanta
discrepância entre as escolas públicas e particulares participantes dos JERN´s têm como
base o fato das práticas esportivas nessas instituições estarem pautadas no esporte de
alto rendimento, principalmente as escolas particulares, levando a idéia de que o esporte
é basicamente a competição.
Vimos que as instituições particulares de ensino vêem no esporte uma forma
de adquirir prestígio, e para isso existe a necessidade de que vençam as competições, e
para tal resultado suas equipes devem ser fortemente treinadas. Essa lógica da
competição, como percebemos no estudo, passa a se aliar à lógica dos resultados
empresariais, porquanto essas escolas passam a elaborar planejamento a longo prazo,
contratando dirigentes, técnicos e oferecendo bolsas, por meio de uma dita ―ação
social‖ direcionada aos melhores atletas da rede pública.
Diferentemente, seguindo essa predominância do esporte de alto rendimento,
constatamos que as escolas da rede pública de ensino sofrem em vários aspectos:
processos de estigmatização e segregação sociais aos quais seus alunos estão
38
submetidos durante as competições; a precariedade de recursos materiais e financeiros e
de estrutura física de treinos; além disso, a perda de alunos, que se sobressaem no
esporte, para as escolas particulares, impedindo um trabalho de continuidade e
desmantelando as motivações do conjunto dos alunos em sua empreitada coletiva.
Ao apresentarmos os relatos dos entrevistados, pudemos constatar que o que
garante aos alunos da rede pública de ensino, em sua maioria, pertencentes às classes
populares e médias, o ―privilégio‖ de estudar em uma escola particular é a sua
competência esportiva individual, entretanto, nem sempre o seu êxito no campo
esportivo se traduzirá em competências semelhantes em sala de aula, gerando uma
desconexão na relação esporte-estudo. Muitas vezes, o aluno passa a ser mais cobrado
nos treinos do que nos estudos, uma vez que, ele deve ter um alto desempenho esportivo
e cumprir certas ―obrigações‖ para que permaneça com a bolsa concedida a ele.
Somando-se a isso, identificamos que o aluno pertencente à escola pública ao chegar à
escola particular, se depara com técnicas de transmissão e critérios de avaliação
totalmente contrários aos da sua escola anterior, o que afeta, sem dúvida, no seu
processo de aprendizado.
Como verificamos, a competição esportiva tem como suporte a idéia de que
todos os competidores têm a mesma chance de vitórias, a ―ideologia da igualdade de
oportunidades‖, porém como pudemos verificar nos JERN´s, essa idéia só se aplica
quando se leva em consideração as condições imediatas à competição e não as
condições sociais e econômicas dos atletas. Basta atentarmos para o fato de que as
modalidades ―elitistas‖ nesses jogos são mais próximas das escolas particulares o que
faz com que seus alunos tenham mais vantagens do que os da rede pública.
No nosso entendimento, a competição é desejável na medida em que os
competidores encarem seus opositores como companheiros de jogo; torna-se indesejável
na medida em que os competidores percebam seus oponentes como rivais, inimigos e
que precisam ser vencidos a todo custo. As escolas públicas não aparecem no topo da
classificação, mas aparecem para ―servir‖, através dos seus melhores atletas, às escolas
particulares. Esse é um ―ciclo‖ que se repete a cada edição dos JERN´s, por isso a
diferença na classificação final, levando ao desinteresse do aluno da rede pública em
praticar esportes e, consequentemente, em participar dos JERN´s. Será essa a tendência
das escolas públicas, a não participação nesses jogos?
Diante desse contexto, é premente a necessidade de se introduzir uma nova
visão do ensino do esporte no âmbito escolar, que por sinal já se realiza em algumas
39
escolas brasileiras, um ensino que não transmita unicamente os gestos técnicos ou
regras esportivas, e de competitividade agressiva, mas que leve em consideração os
interesses e as realidades sociais, econômicas e culturais dos ―jovens atletas‖.
Chegamos, ao final deste trabalho, cientes de que não demos conta da
totalidade de tal realidade, que trata da relação esporte e escola, um universo
extremamente complexo e dinâmico com vários aspectos a serem pesquisados.
Deixamos, pois, em aberto a possibilidade para que outros trabalhos acadêmicos,
inclusive um nosso, venham detalhar mais sobre o assunto, assim como tomem como
lócus de estudo o universo dos JERN´s, de maneira mais complexa e para outros fins.
40
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SITES
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www.educacao.rn.gov.br/codesp
42
ANEXOS
Tabela: classificação das escolas em algumas modalidades dos JERN´s no ano de 2008
Squash individual
1 Facex
2 Marista
3 Comtep. C. Verde
4 Contemporâneo
5 Contemporâneo
6 Contemporâneo
Futebol- infantil- Mas
1 A.Cavalcante- S-tomé
2 EE A.Monteiro-E.Santo
3 EMJ. Guio-Arês
4 CEFET
5 E.M. Veríssimo de Melo
Atletismo – infantil-mas
1 Marista
2 E.E.DR.Orlando F.J.Ayres
3 B.Fagundes
4 B. Câmara
5 Ana Julia
6 E.M.Prof Humberto Gama-CN
Hipismo- infantil
1 Impacto
2 Colégio N.S Das Neves
3 C.Alves
4 H Catriciano- NAT
Escola Pública
Escola Particular
43
CAMPEÃO GERAL DOS JERN´S 2008-NATAL
POSIÇÃO
1º
2º
3º
4º
5º
6º
7º
8º
9º
10º
11º
12º
13º
14º
15º
16º
17º
18º
19º
20º
21º
22º
23º
24º
25º
26º
27º
28º
29º
30º
31º
32º
33º
34º
35º
36º
37º
38º
39º
ESCOLA
CONTEMPORANEO
FACEX
CEI
H. CASTRICIANO
MARISTA
NEVES
AUXILIADORA
SALESIANO
SAGRADA
MUNDIAL
MARISTA CHAMPANGNAT
CONTEMP. C. VERDE - PAR
CELM - PAR
MARIE JOST
CDF CENTRO
CIC
O MESTRE
ENCANTO SANTARÉM
CESA
EM J. AYRES - T
EE W. GURGEL
CDF SUL
EE A. DANTAS
CEFET - NAT
CAP/HIP. Z. SUL
EM A. LIRA - MAC
ED
OBJETIVO
BEREIANO
IMPACTO
EE D. MARIZ
EE ATHENEU
APLICADAS
EM 4º CENTENÁRIO
MARISTELLA
POSITIVO
EE B. FAGUNDES
CCT - C. N
EE J. F. MACHADO
PONTOS
526
498
404
325
325
299
294
270
83
80
79
73
70
65
65
62
53
53
46
44
39
37
34
34
33
31
31
31
31
29
28
28
26
26
25
23
23
22
21
FONTE: CODESP-RN
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JERN´s: A EDUCAÇÃO E O ESPORTE NAS ESCOLAS PÚBLICAS